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NULIDADE DE SENTENÇA
FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO
Sumário
1. Em cumprimento do dever de assegurar a todos os cidadãos um processo equitativo e justo, exige-se não só a indicação dos factos provados, como dos não provados e ainda, a indicação do processo lógico - racional que conduziu à formação da convicção do julgador, relativamente aos factos que considerou provados ou não provados, de acordo com o ónus de prova que incumbia a cada uma das partes, conforme o disposto no artigo 607/4 do CPC. 2. O fundamento de nulidade, previsto na alínea b) do artigo 615 do C.P.C., apenas se verifica quando exista absoluta falta de fundamentação, seja de facto ou de direito e não apenas fundamentação medíocre, deficiente, quiçá errada. 2. Questão diferente da falta de fundamentação é a existência de uma insuficiente fundamentação da resposta à matéria de facto que leve a deficiências no entendimento do raciocínio lógico que levou aos factos provados e não provados, e cuja consequência será a anulação da decisão e já não a sua nulidade. 3. A decisão em apreço não contém a descrição dos factos não provados, adotando uma formulação genérica e obscura referindo-se a “Estes os factos, nada mais se provou ”, sem que se possa extrair desta formulação a que factos concretos se refere o Sr. Juiz a quo, o que desde logo inviabiliza que possa a recorrente, nesta parte, lançar mão do disposto no artigo 640 do CPC, óbice que igualmente se verifica em relação ao tribunal ad quem, pelo desconhecimento da realidade fáctica que o Sr. Juiz recorrido, considerou não provada. 4. Esta omissão determina a nulidade da sentença recorrida, por se integrar nos fundamentos de nulidade previstos no artigo 615/1-b) do CPC.
Texto Integral
Acordam os Juízes que compõem a 8a Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa:
I. Relatório Oitante, SA, autora nesta ação de despejo, sob a forma comum, em que são réus AA e BB, e interveniente principal o Banif- Banco Internacional do Funchal, SA- Em Liquidação, interpôs o presente recurso de apelação da sentença proferida em 9 de julho de 2024, que concluiu com o seguinte dispositivo:
“V.1-julgo a presente acção parcialmente procedente por parcialmente provada e consequentemente:
a. reconheço que o contrato referido nos factos provados 10 a 14, na parte relativa ao arrendamento cessou em 30/04/2019por oposição à renovação;
b. Absolvo os RR. AA e BB do demais peticionado pela A. OITANTE, S.A..
V.2-julgo pedido reconvencional procedente por provado e consequentemente:
a. julgo oponível à A./reconvinda OITANTE, S.A., a opção de compra prevista na clausula 13. °, do contrato, referida nos factos provados 15 a 20, condenando a A. OITANTE, S.A., a cumprir a mesma pelo preço aí proposto (€85.000,00€) que será pago pelos RR. na data da escritura pública, devendo a A. proceder à marcação da escritura pública de compra e venda no mais curto prazo possível, devendo para o efeito avisar os RR./reconvintes AA e BB do local, dia e hora, em que o contrato será outorgado, por carta remetida com pelo menos 10 dias de antecedência.
b. Reconheço que assiste aos RR./reconvintes AA e BB o direito de deterem o imóvel, não o entregando ao senhorio, por força do direito de opção de compra por eles exercido.
V.3-Absolvo o BANIF - BANCO INTERNACIONAL DO FUNCHAL, S.A. - EM LIQUIDAÇÃO de qualquer pedido.
*
Custas pelos A. e Réus, na proporção de 80% para a A. e 20% para os RR (art.° 527.°, do CPC). "
A recorrente termina as suas alegações, alinhando as seguintes conclusões:
“1. A sentença proferida pelo tribunal é nula por violação dos disposto na alínea b) do n.° 1 do artigo 615.° do Código de Processo Civil, em virtude da omissão da indicação dos factos que não foram considerados provados (resulta da sentença recorrida quanto aos factos não provados apenas: ‘ ’estes os factos, nada mais se provou ’ ’).
2. A sentença recorrida não considerou factos de especial importância e relevância para a boa decisão da causa que foram alegados pela Recorrente na Petição Inicial e na Réplica, nomeadamente os artigos 21.°, 43.°, 45.°, 50.°, 53.°, 56.°, 71.° e 72.° da Petição Inicial.
3. Mais não contém a sentença a fundamentação dos factos que não considerou provados e quanto à motivação dos factos provados limita-se a parafrasear os depoimentos das testemunhas.
4. A necessidade imposta pela decisão, no que respeita ao apuramento cristalino do completo elenco dos factos não provados, consubstancia nulidade, nos termos do n°4 do artigo 607o, e alíneas c) e d) do n°1 do artigo 615. ° todos do Código de Processo Civil.
5. Não se verificando os requisitos necessários para a apreensão correta e clara dos factos dados como não provados, bem como da fundamentação dos factos dados como provados e não provados, a sentença enferma de nulidade, devendo a mesma ser anulada, e baixando os autos ao Tribunal a quo para que se proceda à reforma da decisão, o que desde já se requer.
6. A Recorrente discorda do facto 22 dado como provado.
7. A sentença proferida pelo Tribunal a quo a qual se demonstra, salvo o devido respeito, omissa quanto à análise dos factos dados como não provados, e bem assim como quanto à motivação expressa que levou o tribunal a considerar determinados factos como provados.
8. O tribunal a quo não teve em consideração todos os factos que foram alegados na Petição Inicial e na Réplica nem a totalidade do depoimento prestado pela testemunha Dr. CC.
9. O tribunal desconsiderou de todo a questão relacionada com a finalidade da criação da Oitante enquanto veículo de gestão dos ativos do ex-Banif que é alegada nas peças processuais e também explicada pela testemunha. Não se compreendendo se entendeu considerar esse facto como não provado, como bem acima se explicou.
10. Entende a Recorrente que deveria o tribunal ter considerado dar como provados os seguintes factos: (a) A Oitante adquiriu os ativos do Banif pelo valor de setecentos e quarenta e seis milhões de euros. (b) A Oitante foi criada com o objetivo de vender os ativos patrimoniais do ex-Banif e de evitar a criação de efeitos adversos nos mercados financeiros.
11. Quanto ao facto 22 não existe qualquer fundamentação na sentença que indique que este facto deveria ter sido dado como provado. Este facto não resultou das declarações de parte da Ré, e isso mesmo resulta da transcrição das declarações que é feita na sentença. Pelo que não existindo qualquer facto que tenha sido provado em sede de julgamento ou através de prova documental, não poderia o tribunal, muito menos sem justificação, dar este facto como provado.
12. Consta da sentença ora recorrida que foi dado como provado que: ‘’17. Se o arrendatário pretender exercer a opção, deverá notificar o senhorio dessa intenção por carta registada com aviso de recepção mínima de 60 (sessenta dias) (clausula 13. Ponto 3). (...) 19. A marcação da escritura pública de compra e venda incumbe ao senhorio, que para o efeito deverá avisar o arrendatário do local, dia e hora., em que o contrato será outorgado, por carta remetida com pelo menos 10 dias de antecedência (clausula
13. Ponto5). ’’
13. O tribunal não considerou desde logo foi que apesar de no contrato de arrendamento não constar expressamente essa questão, a ser verdade que a opção de compra era oponível à Autora, ora Recorrente,
a mesma teria que considerar quer a antecedência mínima de 60 dias quer a antecedência mínima para o agendamento da escritura pública de compra e venda (10 dias), e esse prazo não foi cumprido pelos Réus.
14. Ou seja, ainda que o tribunal a quo pudesse ter entendido que a opção de compra (entendimento que a Recorrente discorda, como abaixo se demonstrará), não poderia ter entendido que os prazos fixados no contrato de opção foram cumpridos, porque o prazo para a realização da escritura de compra e venda sempre seria em data posterior à do termo do contrato por força da oposição à renovação.
15. Assim, não restam quaisquer dúvidas que, o tribunal não poderia nunca ter considerado que os Réus cumpriram o prazo que se encontrava estipulado na opção de compra, porquanto a data para a formalização da escritura pública de compra e venda sempre seria posterior à data da cessação do contrato de arrendamento,
16. Os prazos e a teleologia de cada uma das cláusulas que são apostas a um contrato têm que ser lidas com uma ordem lógica e não de forma isolada, pelo que o prazo a ser considerado seria no mínimo de 70 dias e nunca apenas os 60 dias.
17. O tribunal teria que ter analisado de forma mais concreta tudo quanto fora alegado pela Ré, em sede de declarações de parte, e não apenas de forma sumária, nomeadamente quanto ao alegado exercício do direito de opção por várias vezes e que nunca foi cumprido pelos Réus (e não pela Recorrente).
18. O tribunal a quo não elaborou de forma adequada a redação da motivação dos factos, contendo- se a mesma única e exclusivamente com um parafrasear do que foi dito pelas testemunhas em sede de audiência de julgamento.
19. Ao tribunal a quo cabia analisar de forma critica os depoimentos das testemunhas e indicar de forma expressa quais os factos que foram dados como provados com base nos respetivos depoimentos, o que não resulta da leitura da sentença, nem a Recorrente consegue alcançar.
20. O tribunal considerou dar como provado o facto 22, não existindo qualquer ligação entre o mesmo e a ‘ ’motivação de facto ’ ’ que é exarada na sentença.
21. O facto 22 não resulta de qualquer dos depoimentos das testemunhas ou sequer das declarações de parte que foram prestadas pela Ré, pelo que este facto deveria ter sido dado como não provado.
22. O tribunal, apesar de ter considerado o depoimento da testemunha Dr. CC, apenas o fez de forma parcial, olvidando não só o que foi dito pela respetiva testemunha ao nível da finalidade para a qual a Recorrente foi criada e também o que resulta dos articulados apresentados pela Recorrente.
23. O tribunal deveria ter dado como provado os factos abaixo indicados e limitou-se a ignorá-los:
a. ‘A Autora não sucedeu o Banif - Banco Internacional do Funchal, S.A. quanto a todos os deveres que haviam sido assumidos por esta entidade; ’’ (apesar de o tribunal a quo ter transcrito nos factos dados como provados parte das deliberações do Banco de Portugal relativas à resolução do Banif não considerou na sua íntegra o conteúdo do Anexo 2 da respetiva Deliberação - Anexo esse que se reporta expressamente a todos os ativos e direitos que foram transmitidos à Recorrente. Se atentarmos à leitura do
respetivo Anexo é notório que resulta do seu título ‘'Direitos e Obrigações”, no entanto olvidou o tribunal que no número 1 do respetivo Anexo esses direitos e obrigações são antes transcritos em ativos e direitos! Quer os direitos quer as obrigações encontram- se de forma exaustiva descritos no Anexo, tanto que no respetivo Anexo é elencada a obrigação da Oitante de assumir a posição contratual de empregador (número 5 do Anexo 2))
b. ” a Autora nunca formulou qualquer subscrição aos contratos de opção de compra dos imóveis que tinham sido celebrados pelo ex-Banif, S.A '' (este facto deveria ter resultado provado do depoimento do Dr. CC, nomeadamente do indicado pela testemunha aos minutos 17”. Veja-se que nenhuma prova foi feita quanto à subscrição por parte da Recorrente a estes contratos de opção)
c. ‘ ’a Oitante é alheia ao acordo celebrado entre as Réus e o Banif- Banco Internacional do Banif
S.A.'' (mais uma vez, tal deveria ter sido dado como provado pelo tribunal a quo visto que resultou de forma expressa do depoimento da testemunha Dr. CC que não tinham mandato para ser parte em contratos de opção de compra, o que apenas poderia ser feito se tal mandato tivesse sido passado e não o foi)
d. ” A ora Autora adquiriu o ativo patrimonial do BANIF - Banco Internacional do Funchal, S.A. pelo valor total de setecentos e quarenta e seis milhões de euros.'' (este facto resulta de forma expressa da Deliberação do Banco de Portugal e não se encontra impugnado por nenhuma das partes, para além de ser facto de conhecimento público).
e. ” Em parte alguma consta da resolução do Banco de Portugal que essa aquisição era feita mediante condição, isto é que a aquisição do património estaria condicionada à aceitação do direito de propriedade estar reservado já a terceiros.'' (mais uma vez, este facto deveria ter sido como provado pelo que resulta da própria deliberação do Banco de Portugal, não estando expressamente definido que as obrigações aliadas aos imóveis (promessas ou opções) eram transmitidas para a Oitante, e também pelo próprio depoimento prestado pela testemunha Dr. CC)
f. ” A finalidade principal do Banco de Portugal foi a de permitir valorizar os ativos do BANIF” (Mais uma vez, também este facto resultou provado do conteúdo da Deliberação do Banco de Portugal e do depoimento da testemunha do Dr. CC)
g. ”a Autora não subscreveu nenhuma cláusula de opção de compra, em conformidade com o que decorre da própria resolução do Banco de Portugal''
h. ” a Autora nunca prometeu, por meio de contrato autónomo quer por meio de declaração de adesão, vender o imóvel aos Réus pelo valor que tinha sido prometido por parte do Banif.
24. Em adição aos factos acima indicados que foram tempestivamente alegados pela Recorrente também deveria o Tribunal a quo ter dado como provado o seguinte:
25. A Oitante foi criada com o objetivo de vender os ativos patrimoniais do ex-Banif e de evitar a criação de efeitos adversos nos mercados financeiros.Este facto para além de decorrer do próprio REGIME GERAL DAS INSTITUIÇÕES DE CRÉDITO E SOCIEDADES FINANCEIRAS, decorreu do depoimento prestado pela testemunha Dr. CC.
26. Ou seja, o tribunal desconsiderou por completo o depoimento do Dr. CC aos minutos 13’’17, 26’’24, 26’’30, 26’’33, 27’’28, 30’’51 e 36’’26.
Analisada a parte referente aos factos, impõe-se analisar a questão de direito,
27. a Recorrente discorda do tribunal a quo porquanto a conclusão tirada é senão precipitada. Decorre da Deliberação do Banco de Portugal que são transferidos os direitos e obrigações constantes do Anexo 2. E esta parte o tribunal desconsiderou, limitando-se a entender que são transmitidos todos os direitos e obrigações quando não é isso que decorre. O que decorre é que apenas são transferidos os direitos e obrigações que constam do Anexo 2.
28. Ignorou o tribunal a quo que apenas foram transmitidos para a Oitante os direitos, obrigações e ativos que constam do Anexo 2 e tinha que ser feita menção a obrigações porquanto existem obrigações especificas que foram transmitidas para a Oitante, tal como a questão associada aos trabalhadores do ex- Banif.
29. O tribunal não justifica em parte alguma o tribunal o motivo pelo qual entende que o contrato de opção é transmitido à Recorrente e muito menos donde tal transmissão decorre da Deliberação do Banco de Portugal, limitando-se a indicar que é transmitida a posição do ex-Banif porque tal não é excluído na Deliberação.
30. De acordo com o RGICSF, nomeadamente do artigo 145.°, é notório que cabe ao Banco de Portugal determinar quais são os direitos, obrigações e ativos que são transmitidos para os veículos de gestão de ativos e não, como entende o tribunal, quais os que não são transmitidos.
31. O mesmo decorre dos restantes contratos que haviam sido assumidos pelo ex-Banif e não resultaram expressamente transmitidos para a Oitante.
32. Ainda que a transmissão do imóvel não tivesse sido feita ao abrigo de um regime especial, também não se poderia considerar que o contrato de opção era transmitido para o adquirente do imóvel.
33. Por último sempre será de dizer que o contrato de opção de compra teria que revestir a forma do contrato que visa ser celebrado, in casu escritura pública, o que não se verifica. (vide Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, processo n.° 9778/18.4T8LSB.L1-6)
34. O tribunal a quo limitou-se a concluir, sem qualquer justificação para tal, que foram transmitidos os direitos e obrigações para a Recorrente, e como tal é incluindo o contrato de opção, mas tal não corresponde à verdade, porque apenas foram transmitidos os direitos e obrigações que estão elencados no Anexo 2 da Deliberação do Banco de Portugal e, ainda que assim não fosse, a opção de compra do imóvel não se encontra registada na conservatória do registo predial pelo que não é nem pode ser considerado um direito real dos Réus que seja oponível a qualquer terceiro (o que se impunha).
35. Pelo que não restam quaisquer dúvidas que mal andou o tribunal de primeira instância ao decidir da forma como decidiu, impondo-se a alteração da sentença no sentido de declarar procedente o pedido formulado pela Autora na sua totalidade e, bem assim como, declarar a inoponibilidade da opção de compra e improcedente o pedido reconvencional apresentado pelos Réus.
Termos em que deve o presente recurso ser julgado procedente, por provado, sendo a sentença proferida declarada nula, por omissão de pronúncia, oposição dos factos provados e por erro na aplicação dos factos. Assim decidindo farão V. Exas. a acostumada Justiça.
Os recorridos não apresentaram contra-alegações.
O recurso foi admitido.
Foram colhidos os vistos legais.
Cumpre apreciar e decidir.
II. Questão a decidir:
Decorre do disposto nos arts. 635.°, n.° 4 e 639.°, n.° 1 do CPC, que as conclusões delimitam a esfera de actuação do tribunal ad quem, exercendo uma função semelhante à do pedido na petição inicial (cfr., neste sentido, Abrantes Geraldes, in Recursos no Novo Código de Processo Civil, Almedina, 2017, pág. 105 a 106).
Assim, atendendo às conclusões supra transcritas, as questões essenciais a decidir consistem em saber:
a. - se sentença recorrida é nula por violação do disposto nas alíneas b), c) e d) do artigo 615/1 do CPC;
a) se deve ser alterada a matéria de facto;
c) o mérito da ação.
III. Fundamentação de Facto
A decisão recorrida considerou a seguinte factualidade: “111. Fundamentação de facto
Considero provados os seguintes factos:
1. Mostra-se descrito na ....aConservatória do Registo predial de Cascais com o n.°...6.../1991 o Lote ... situado em ...° ..., Rebelva natureza urbano composto de
edifício de rés-do-chão, 1,° e 2.° andares, lados direito e esquerdos composto pelas Frações Autónomas A, B, C, D, E, F inscrito na matriz sob n. ° ...
2. Mostra-se descrito na ....a Conservatória do Registo predial de Cascais com o n.° ...6.../1991 a fracção ... correspondente ao 1.° andar direito, do prédio urbano referido em 1.
3. Pela Ap. ...0.../07 mostra-se inscrita a aquisição por compra da fracção ... do prédio referido em 1 a favor de AA e BB tendo como sujeito passivo DD casado com EE no regime de comunhão de adquiridos.
4. Pela Ap. ... de ...0.../07 mostra-se inscrita a hipoteca voluntária a favor do Banif-banco Internacional do Funchal, SA tendo como máximo assegurado 29.211.000,00 escudos.
5. Pela Ap. ... de ...0.../10 mostra-se inscrita a hipoteca voluntária a favor do Banif banco Internacional do Funchal, SA tendo como máximo assegurado 5.235.000,00 escudos.
6. Pela Ap. ... de ...0.../11 mostra-se inscrita a aquisição por compra em processo de execução de A da fracção referida em 2. pelo Banif-banco Internacional do Funchal, SA, tendo como sujeito passivo BB.
7. Pela Ap. ... de ...1.../11 mostra-se inscrita a aquisição de A da fracção referida em 2. por adjudicação em execução a favor de Banif-banco Internacional do Funchal, SA, tendo como sujeito passivo AA.
8. Pela Ap. 810 de ...1.../07 mostra-se inscrita a aquisição de A da fracção referida em 2. A favor de Oitante, SA tendo como sujeito passivo Banif-Banco Internacional do Funchal, SA tendo como causa a transmissão em consequência das deliberações do Banco de Portugal tomadas em (1) 20/12/2015 nos termos dos art.°s 145. °,-S, n.° 1 e 5 e 145. °-T, n. °2 al. c) e em (2) 02/05/2016 nos termos dos art.°s 145. °-M, n. °1, 145.°-N, n. °3 e 145. °-Tn.° 1 e 7 todos do RGICSF (DL 298/92, de 31/12).
9. Não obstante não constar do registo a aquisição do outro A da fracção referida em 2. a favor de Oitante, SA tendo como sujeito passivo Banif-Banco Internacional do Funchal, SA a Oitante SA também o adquiriu por transmissão em consequência das deliberações do Banco de Portugal tomadas em 20/12/2015 nos termos dos art.°s 145.°, - S, n.° 1 e 5 e 145.°-T, n.°2 al. c) e em 02/05/2016 nos termos dos art.°s 145.°- M, n.°1, 145.°-N, n.°3 e 145.°-T n.° 1 e 7 todos do RGICSF (DL 298/92, de 31/12), cfr. as deliberações do banco de Portugal mencionadas em 21 e ss.
10. Por contrato de arrendamento para fins habitacionais com prazo certo celebrado em 01 de maio de 2015, o Banif, Banco Internacional do Funchal, S.A., deu de arrendamento aos Réus, a fração autónoma designada pela letra ‘C’, correspondente ao primeiro andar direito, do prédio urbano em regime de propriedade horizontal sito em ...° ..., destinada a habitação, concelho de Oeiras, descrita na .... a Conservatória do Registo Predial de Oeiras, sob o número ... da freguesia de Carcavelos e inscrita na matriz predial urbana sob o artigo ..., da união de freguesias de Carcavelos e Parede, conforme Documento 1 junto com a PI.
11. O contrato foi celebrado como arrendamento com prazo certo, com a duração de 1 (um) ano, com início a 01 de maio de 2015, renovável por períodos sucessivos e de igual duração se nenhuma das partes se tiver oposto à renovação no tempo e pela forma convencionados ou designados na lei.
12. A renda mensal era de €300,00 (trezentos euros), vencendo-se a mesma no primeiro dia útil do mês anterior àquele a que disserem respeito.
13. Em virtude das sucessivas atualizações anuais da renda, o valor mensal da renda é, à data da caducidade do contrato de arrendamento, €305,48 (trezentos e cinco euros e quarenta e oito cêntimos), conforme documento 3 que ora se junta.
14. o contrato de arrendamento para fins habitacionais foi celebrado com os Réus com prazo certo, pelo período de 1 (um) ano, com início a 01 de maio de 2015, renovável por iguais períodos de um ano, caso nenhuma das partes se opusesse à sua renovação.
15. No contrato de arrendamento para fins habitacionais com prazo certo junto com a p.i. (cfr. Doc. 1) está inserida uma cláusula de opção de compra do locado acordado entre o então senhorio e os RR.- Cláusula 13, mediante a qual pelo referido contrato o senhorio confere ao arrendatário uma opção de compra do imóvel, objecto do contrato, sendo que o arrendatário poderá optar pela compra do imóvel pelo preço de 85.000€ (oitenta e cinco mil euros).
16. A opção vigoraria entre o primeiro dia de vigência do presente contrato de arrendamento e caducaria no final do mesmo (clausula 13. Ponto 2).
17. Se o arrendatário pretender exercer a opção, deverá notificar o senhorio dessa intenção por carta registada com aviso de recepção mínima de 60 (sessenta dias) (clausula 13. Ponto 3).
18. Exercida a opção, a escritura de compra e venda do imóvel arrendado será outorgada no mais curto prazo possível, devendo cada uma das partes diligenciar por obter os documentos pessoais necessários à celebração desse acto(clausula 13. Ponto 4).
19. A marcação da escritura pública de compra e venda incumbe ao senhorio, que para o efeito deverá avisar o arrendatário do local, dia e hora., em que o contrato será outorgado, por carta remetida com pelo menos 10 dias de antecedência (clausula 13. Ponto5).
20. O direito de opção de compra previsto na presente clausula não poderá ser transmitido sem o acordo prévio e escrito do senhorio e cessará de imediato se o arrendatário incumprir as obrigações assumidas ao abrigo do presente contrato, nomeadamente por falta do pagamento de rendas devidas (clausula 13. Ponto 6).
21. O imóvel em causa já tinha sido adquirido, em 24 de Julho de 2000, pelos R.R., ao Banif-Banco Internacional do Funchal, S.A. (cfr. doc. 1 junto com a contestação)
22. A solução para os R.R. virem a comprar, de novo, o imóvel, começando com o arrendamento do mesmo, e com opção de compra, foi sugerida por funcionários do próprio Banif-Banco Internacional do Funchal, S.A., no âmbito da recuperação e renegociação do crédito.
23. O Banco de Portugal, em Reunião Extraordinária do Conselho de Administração, realizada no dia 19 de Dezembro de 2015, às 18h00m, ao abrigo do disposto nos números 1,3,5 e 9 do artigo 145°-Mdo Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, deliberou:
a. Declarar que o “Banif — Banco Internacional do Funchal, S.A.” se encontra «em risco ou em situação de insolvência» («failing ou likely to fail»), nos termos e para os efeitos do disposto pelo artigo 145°-E, n. °2, alínea a), do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras;
b. Iniciar o processo de aplicação da medida de resolução prevista na alínea a), do número 1 do artigo 145.°-E do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras ao Banif-Banco Internacional do Funchal, S.A.;
c. Promover diligências tendentes à alienação da actividade do “Banif - Banco Internacional do Funchal, S.A. ” junto do “Banco Popular Español, S.A. ” e do “Banco Santander Totta, S.A. d) Aprovar o conteúdo dos documentos a entregar aos potenciais adquirentes ... com a descrição do processo de alienação e com orientações relativas ao conteúdo e à submissão das propostas de aquisição, como anexos à presente deliberação; e)Dar acesso aos potenciais adquirentes ... a informações relevantes sobre a situação financeira e patrimonial do Banif, S.A.(...)».
24. Constam da medida de resolução, e dos seus considerandos, além do mais, o seguinte:
«11. Os fatos descritos nos números anteriores conduziram o Banif a uma situação de incumprimento dos requisitos para a manutenção da autorização para o exercício da sua atividade, com a consequente entrada em liquidação, e demonstram que o Banif se encontra em «risco ou em situação de insolvência» («failing or likely to fail»).
12. Nas presentes circunstâncias e em face das alternativas disponíveis, o Banco de Portugal considera que a aplicação de uma medida de resolução é a única solução capaz de proteger os depositantes e assegurar a continuidade dos serviços financeiros essenciais para a economia prestados pelo E... (...), salvaguardando a estabilidade do sistema
13. Não sendo tomada, com urgência, uma medida de resolução, o Banif caminharia inevitavelmente para a cessação de pagamentos e para a revogação da sua autorização para o exercício da atividade, a que se seguiria o regime de liquidação previsto na lei aplicável, o que representaria um enorme risco sistémico e uma séria ameaça para a estabilidade do sistema financeiro e dos interesses públicos em presença.
14. O elenco das medidas de resolução aplicáveis pelo Banco de Portugal a uma instituição de crédito, no exercício das suas funções de autoridade de resolução ao abrigo do art. 17°-A da Lei Orgânica do Banco de Portugal, consta do n.° l do art. 145°-E do RGICSF.
15. De entre as medidas aí previstas a alienação parcial ou total da atividade da instituição é a medida mais adequada a esta situação, tendo em consideração a existência de potenciais interessados na aquisição de parte do património do Banif, já manifestada no contexto do processo de alienação voluntária.
(...)
25. Na sequência da deliberação referida em 22, o Banco de Portugal, em reunião extraordinária do Conselho de Administração ocorrida em 20 de Dezembro de 2015, às 23h30m, deliberou, entre outros, o seguinte:
a. constituir a sociedade “Naviget, S.A." (cuja denominação foi, posteriormente, alterada para “Oitante, S.A."), cujos Estatutos constam do Anexo I da deliberação, nos termos e para os efeitos do disposto no n. °5 do art.° 145. °- S do RGIC.
b. transferir para esta entidade os direitos e obrigações correspondentes a activos do “Banif - Banco Internacional do Funchal, S.A.", constantes do anexo 2 à deliberação, nos termos e para os efeitos previstos no n.° 1 do artigo 145°-S e na alínea c) do n.°2 do artigo 145°-T, em articulação com o n.°1 do artigo 145°-L, todos do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras;
c. Determinar o pagamento pela Navigest, SA de uma contrapartida ao BANIF-Banco Internacional do Funchal, SA pelos direitos e que constituam ativos que lhe foram transferidos ao abrigo da deliberação, através da entrega de obrigações representativas de dívida emitidas pela naviget, SA no valor de 746 (setecentos e quarenta e seis) milhões de euros, apurado no âmbito da avaliação provisória realizada nos termos do n.°8 do artigo 145.°, H do RGICSF, nos termos do disposto nos n.°s 3 a 5 do artigo 145.°, R do RGICSF.
d. e alienar ao “Banco Santander Totta, S.A." os direitos e obrigações, que constituam activos, passivos, elementos extrapatrimoniais e activos sob gestão do “Banif - Banco Internacional do Funchal, S.A. ", constantes do Anexo 3 à deliberação;
26. Na sequência da deliberação de constituição da “Naviget, S.A." (posteriormente, renomeada “Oitante, S.A. ") e da transferência de uma parte muito significativa e substancial dos direitos e obrigações que constituem activos, passivos, elementos extrapatrimoniais e activos sob gestão do Banif para a “Naviget, S.A. " e para o “Banco Santander Totta, S.A. ", o Banco de Portugal, em reunião extraordinário do seu Conselho de Administração, realizada no dia 20 de Dezembro de 2015, pelas 23h45m, deliberou aplicar ao “Banif - Banco Internacional do Funchal, S.A." as seguintes medidas de intervenção correctiva: i. Proibição de concessão de crédito e de aplicação de fundos em quaisquer espécies de activos, excepto na medida em que a aplicação de fundos se revele necessária para a preservação e valorização do seu activo; ii. Proibição da recepção de depósitos;
27. No anexo 2 relativo a “Direitos e obrigações correspondentes a ativos do Banif-banco Internacional do Funchal, SA transferidos para a Naviget, SA:
l.Sem prejuízo do disposto no parágrafo 2 Infra, os seguintes ativos e direitos do Banif são objecto de transferência para a naviget, SA:
(a)Todos os ativos imobiliários que sejam propriedade do Banif, com excepção daqueles que estejam a ser utilizados ou ocupados pelo banif no exercício da sua actividadef...)
7.A transferência não pretende conferir a quaisquer contrapartes ou terceiros quaisquer novos direitos, nem permitir exercer quaisquer direitos que na ausência dessa transferência não existissem ou não pudessem ser exercidos sobre ou com relação aos ativos, passivos, elementos extrapatrimoniais e activos sob gestão do Banif ou transferidos para a naviget, SA ou transferidos para o adquirente nos termos da denúnciam, de resolução, de Alienação, incluindo quaisquer direitos e compensação (netting/set-off) nem dar lugar a (i) qualquer incumprimento (ii) alteração de condições, direitos ou obrigações (iii) necessidade de aprovação (iv) direito a executar garantias, ou (v) direito a efetuar retenções ou compensações (netting/set-off) entre quaisquer pagamentos ou créditos ao abrigo de tais ativos, passivos, elementos extrapatrimoniais e activos sob gestão. "
28. No caso concreto, o imóvel em causa não era utilizado nem ocupado pelo BANIF no exercício da sua atividade.
29. No anexo 3., sob a epígrafe “Direitos e Obrigações que constituam activos, passivos, elementos extrapatrimoniais e activos sob gestão do Banif - Banco Internacional do Funchal, S.A. transferidos para o Banco Santander Totta, S.A. ", estabelece-se serem objecto de transferência, de acordo com os critérios ali fixados, os activos, passivos elementos extrapatrimoniais e activos sob a gestão do Banif, registados na contabilidade;
30. O anexo 3., referido, estabelece, na sua alínea b), não serem transferidos para o “Banco Santander Totta, S.A. " os seguintes passivos:
(i) Quaisquer obrigações ou responsabilidades emergentes de instrumentos de dívida subordinada, emitidos pelo Banif, incluindo, entre outros, as que se encontrem identificadas no Anexo A.;
(...)
(iv) Todas as responsabilidades resultantes da, ou sejam relativas à, emissão, colocação, oferta ou venda dos instrumentos referidos nas subalíneas (b) (i), (iii), (v) e (vi), com excepção de responsabilidades perante sistemas de pagamento e de liquidação de valores mobiliários conforme definidos na Directiva 98/26/CE, aos seus operadores ou aos seus participantes, decorrentes da participação nesses sistemas;
(...)
(vii) Quaisquer responsabilidades, contingências ou indemnizações, nomeadamente as decorrentes de fraude ou da violação de disposições ou determinações regulatórias, penais ou contra-ordenacionais;
(...)
(x) Todas as obrigações, garantias, responsabilidades ou contingências assumidas na comercialização, intermediação financeira e distribuição de instrumentos de dívidas emitidos por
entidades que se incluam no Grupo Excluído ou por entidades que tenham tido participação, directa ou indirecta, igual ou superior a 2% do capital social do Banif nos dois anos anteriores à aplicação da medida de resolução ou por entidades que estejam numa relação de domínio ou de grupo (nos termos do disposto no artigo 21° do Código dos Valores Mobiliários) com essas entidades;
(ii)
(...)
(xii) Todas as responsabilidades não conhecidas e as responsabilidades contingentes e litigiosas e as responsabilidades no âmbito de alienação de entidades ou actividades, com excepção (A) das que respeitem às áreas de negócio, activos, direitos ou responsabilidades transferidos para o adquirente em resultado da presente deliberação, (B) bem como das que sejam constituídas pelo Banif no âmbito da sua normal actividade bancária (incluindo as obrigações do Banif ao abrigo de depósitos, cartas de conforto, garantias bancárias, performance bonds e outras contingências similares);
31. Sob a alínea d), do Anexo 3. foi estabelecido que as responsabilidades e elementos extrapatrimoniais do Banif que não são objecto de transferência para o adquirente nem para a Naviget, S.A. (posteriormente renomeada Oitante, S.A.) permanecem na esfera jurídica do Banif;
32. Em reunião do Conselho de Administração, a 04 de Janeiro de 2017, o Banco de Portugal deliberou mostrar-se necessário clarificar o sentido e o alcance de algumas disposições dos Anexos 2, 2B e 3 da Deliberação de Resolução do Banif
33. Por força da deliberação de 04 de Janeiro de 2017, a subalínea (x) da alínea b) do parágrafo 1., do anexo 3 passou a ter o seguinte conteúdo: (x) Todas as obrigações, garantias, responsabilidades ou contingências assumidas na comercialização, intermediação financeira e distribuição de instrumentos de dívidas emitidos por (a) entidades que se incluam no Grupo Excluído, (b) entidades que tenham tido participação, directa ou indirecta, igual ou superior a 2% do capital social do Banif nos dois anos anteriores à aplicação da medida de resolução, (c) entidades que estejam numa relação de domínio ou de grupo (nos termos do disposto no artigo 21° do Código dos Valores Mobiliários) com essas entidades ou (d) entidades que sejam qualificadas como pessoas especialmente relacionadas com as acima referidas nesta subalínea, nos termos do artigo 49°, do Código de Insolvências e Recuperação de Empresas ou nos termos da Norma Internacional de Contabilidade 24 (“Divulgações de Partes Relacionadas”), constante do Regulamento (EU) n. ° 632/2010 da Comissão, de 19 de Julho de 2019;
34. Por força da deliberação de 04 de Janeiro de 2017, a subalínea (xii) da alínea b) do parágrafo 1., do anexo 3 passou a ter o seguinte conteúdo: (xii) Todas as responsabilidades e garantias não conhecidas, as responsabilidades contingentes e litigiosas, as responsabilidades no âmbito de alienação de entidades ou actividades e as responsabilidades decorrentes de quaisquer outras actividades, com excepção das que hajam sido constituídas pelo Banif no âmbito da sua normal actividade bancária (incluindo as obrigações do Banif ao abrigo de depósitos, cartas de conforto, garantias bancárias, performance bonds e outrascontingências similares) e na medida em que respeitem às áreas de negócio, activos, direitos, ou responsabilidades transferidas para o adquirente em resultado da presente deliberação;
35. Foram transferidos para aquela sociedade Navigest, depois renomeada Oitenta, nos termos e para os efeitos do disposto no n.° 1 do artigo 145.°-S e al. c) do n.° 2 do artigo 145.°-T do RGICSF conjugados com o artigo 17.° da Lei Orgânica do Banco de Portugal, os direitos e obrigações correspondentes a ativos do BANIF - Banco Internacional do Funchal, S.A. constantes do anexo 2 à deliberação.
36. Por decisão do Registo Nacional de Pessoas Coletivas, o pedido de certificado de admissibilidade da firma “Naviget, SA." foi indeferido por se entender que a mesma é confundível com “Navigeste - Sociedade Gestora de Participações Sociais SGPS, S.A., " sociedade já constituída.
37. Colocada à apreciação do Conselho de Administração da sociedade, a nova firma - “OITANTE, S.A. " - foi esta aprovada e a sociedade devidamente registada.
38. Decorre da referida Deliberação do Banco de Portugal, conjugada com o art.145°-S e 145°-T do RGICSF, que, nos direitos e obrigações da instituição de crédito originária (Banif, S.A.), sucederá a OITANTE, S.A., conforme a seguir enunciado:
“Artigo 145.° S
1 - O Banco de Portugal pode determinar a transferência de direitos e obrigações de uma instituição de crédito ou de uma instituição de transição, que constituam ativos, passivos, elementos extrapatrimoniais e ativos sob gestão da instituição, para veículos de gestão de ativos para o efeito constituídos, com o objetivo de maximizar o seu valor com vista a uma posterior alienação ou liquidação.
(...)
7 - A decisão do Banco de Portugal prevista no n.° 1 produz, por si só, o efeito de transmissão da titularidade dos direitos e obrigações da instituição de crédito objeto de resolução ou da instituição de transição para o veículo de gestão de ativos, sendo este considerado, para todos os efeitos legais e contratuais, como sucessor nos direitos e obrigações transferidos.
(...)
9 - A decisão de transferência prevista no n.° 1 produz efeitos independentemente de qualquer disposição legal ou contratual em contrário, sendo título bastante para o cumprimento de qualquer formalidade legal relacionada com a transferência. "
39. A OITANTE, S.A., foi, assim, por força do RGICSF, investida na posição de titular dos direitos e obrigações correspondentes a ativos anteriormente detidos pelo BANIF - Banco Internacional do Funchal, S.A.
40. A OITANTE, S.A adquiriu a propriedade do imóvel, possuindo o imóvel enquanto proprietária, assumindo a posição contratual anteriormente detida pelo Banif - banco Internacional do Funchal, SA.
41. No dia 18 de dezembro de 2018, Proteus Asset Management, unipessoal, Lda, em representação da A. na qualidade de senhoria, comunicou aos Réus a sua intenção de se opor à renovação do contrato de arrendamento, com efeitos a partir de 30 de abril de 2019, “o contrato de arrendamento cessará os seus efeitos a partir de 30 de Abril de 2019, respeitando o prazo legal de antecedência data em que deverão entregar o locado livre de pessoas e bens no mesmo estado em que o receberam, bem como proceder à entrega das respectivas chaves” conforme Documento 4 junto com a PI.
42. Em resposta à missiva acima, vieram os Réus, por intermédio de advogada, a 20 de fevereiro de 2019, notificar o Banif - Banco Internacional do Funchal, SA, Oitante, SA e Proteus Asset management, unipessoal, Lda para o exercício da opção de compra, pelo preço de €85.000,00 (oitenta e cinco mil euros) do imóvel objeto do presente contrato, conforme Documento 5 junto com a PI nos seguintes termos “... serve a presente para nos termos do disposto nos pontos 1, 2 e 3 da Clausula 13 do contrato de arrendamento do locado acima identificado, notificar o senhorio que pretendemos exercer a opção de compra, pelo preço de 85.000,00€ da fracção autónoma destinada a habitação, designada pela letra “C”
Observamos desta forma, o decurso do prazo mínimo de sessenta dias em relação á efectiva realização da compra, como previsto no contrato em causa, mantendo-se, entretanto, o arrendamento.
Não deixando de notar que o preço de 85.000,00€... foi contratualizado no nosso contrato de arrendamento e que um outro valor de 92.600,00€ que a Altamira-Proteus Asset management, Unipessoal, Lda nos indicou, mediante email de 23 de Fevereiro de 2018, como valor de venda, nada tem que ver com o acordado... ” cfr. Docs 5 da pi)
43. Ficou escrito pelos R.R., no DOC 5 da p.i. e sic “Dirigimo-nos à Oitante, S.A. porque é esta a empresa identificada ..., pela Proteus., como nossa senhoria e assim entendendo que no imóvel em causa possa ser um dos activos do Banif..., que lhe tenham sido transmitidos... e da sua constituição deliberada pelo Conselho de Administração do banco de Portugal em 20 de Dezembro de 2015”, (DOC 5 da p.i.)
44. No dia 23 de Fevereiro de 2018 FF da da “Altamira- Proteus”, enviou o email à R. GG junto como doc. 3 com a contestação onde além do mais comunica a 23 de Fevereiro de 2018 “na sequência da nossa conversa telefónica reitero que o proprietário não irá formalizar novo contrato de arrendamento. De acordo com a carta registada que recebeu, o contrato de arrendamento cessará no dia 30.04.2018 e reiteramos que o mesmo deverá ser entregue livre de pessoas e bens, no mesmo estado em que o recebeu. Assim, caso tenha interesse na sua aquisição muito agradeço que nos dirija uma proposta com maior celeridade.
O imóvel está registado com o valor de venda de 92.600€.
Como referiu, o Contrato de arrendamento prevê uma cláusula de opção de compra que poderá ser exercida até ao termo do contrato (30.04.2’18). Esta Cláusula estabelece ainda que, “se o arrendatário
pretender exercer a opção deverá notificar o Senhorio dessa intenção, por carta registada com aviso de recepção mínima de 60 (sessenta) dias...” (DOC 3)
45. Aquela comunicação referia que a opção de compra podia ser exercida até ao termo do contrato de arrendamento, e, naquela altura a A. pensava que o mesmo terminava a 30 de Abril de 2018, o que não aconteceu, por erro, da A., quanto ao aviso prévio da comunicação de oposição à renovação do contrato de arrendamento.
46. A Autora após ter recebido a carta acima indicada, replicou por carta datada de 07 de julho de 2019, no sentido de informar que não reconheciam a transmissão da opção de compra para a sua esfera jurídica e que o imóvel não havia sido entregue no termo do contrato, comunicando que “... a Oitante, SA não tem que a respeitar, atendendo a que a opção de compra não foi celebrado com a Oitante, SA (mas sim com o Banif- Banco Internacional do Funchal, SA), nem tão pouco foi registada no Registo Predial (para ser oponível a terceiros)...a Oitante, SA não se encontra vinculada ao valor da opção de compra que resultou do contrato de arrendamento, devendo a fracção ser transacionada por um valor superior (que estamos na disposição de negociar com V. Exa.)... solicitamos imediata desocupação do imóvel, através da entrega do locado livre de pessoas e bens, no mesmo estado em que o receberam, bem como das respectivas chaves...” conforme Documento 6 junto com a PI.
47. Os Réus, novamente por intermédio da sua advogada, responderam a 19 de julho de 2019, indicando que a Autora estava vinculada à opção de compra constante do contrato de arrendamento e que são detentores de um direito de retenção do imóvel enquanto não for celebrada a escritura de compra e venda do imóvel pela quantia de €85.000,00, comunicando, além do mais, “ ... O contrato - e os seus direitos e obrigações-foi integralmente transmitido para a Oitante, SA, que s encontra a incumpri-lo, no que concerne à opção de compra exercida pelos menus clientes... Razão pela qual não devem sair do local, enquanto o cumprimento não se realizar, ainda que com intervenção judicial..."conforme Documento 7 que ora se junta.
48. Ficou escrito pelos R.R. no DOC 7 da p.i. “...1. Regista-se que a Oitante, S.A. confessa que assumiu a posição de senhorio no contrato de arrendamento celebrado com os meus clientes e referente ao imóvel em causa...” (DOC 7 da p.i.)
49. A Oitante, S.A., que assumiu a posição contratual anteriormente detida pelo Banif - Banco Internacional do Funchal, S.A. no contrato de arrendamento celebrado pelo Banif SA com os RR. .
50. Por força das deliberações do banco de Portugal referidas em 21 e ss a Oitante, S.A., adquiriu o direito de propriedade sobre o imóvel objeto do contrato de arrendamento e consequentemente a posição de senhorio no âmbito do contrato de arrendamento.
51. A opção de compra do imóvel não consta da certidão de registo predial do imóvel em causa;
52. A tradição do imóvel para os RR. foi obtida por intermédio do contrato de arrendamento.
53. Não obstante as deliberações do banco de Portugal referidas em 21 e ss os R.R. continuaram a pagar as rendas para a conta com o ..., pelo menos até à entrada da contestação, como se vê dos documentos juntos sob o doc. 3 com a PI e o doc 2, junto com a contestação, passando posteriormente a depositar a quantia mensal acordada no contrato de arrendamento na Caixa Geral de Depósitos.
54. No dia 26/07/2023 foi proferida decisão pelo Dr. HH Vice-Governador do banco de Portugal relativa à “Nona retificação às listagens de bens e direitos sujeitos a registo transferidos do BANIF - BANCO INTERNACIONAL DO FUNCHAL, S.A. para a OITANTE, S.A e para o BANCO SANTANDER TOTTA, SA. nos termos e por força da deliberação do Conselho de Administração do Banco de Portugal de 20 de Dezembro de 2015 (23:30h) que aplicou medidas de resolução ao Banif", e destinado, conforme decorre da carta junta à mesma decisão, de 3 de março de 2023, a “proceder-se ao correto registo junto do SIR (Soluções Integradas de Registo)". Cfr. doc. junto com o req.° ref.a 47631471 de 12/01/2024.
55. Consta do considerando 1. Que “Por deliberação do Conselho de Administração do Banco de Portugal de 20 de Dezembro de 2015 (23:30h) que aplicou medidas de resolução ao Banif-banco Internacional do Funchal, SA (“Banif’) para a Oitante, SA (“Oitante") e para o banco Santander otta SA (“Santander");
56. A decisão adoptada foi no seguinte teor Cfr. doc. junto com o req.° ref.a 47631471 de 12/01/2024.
a. Aprovar a nona retificação às listagens de bens e direitos sujeitos a registo transferidos do Banif para a Oitante para o Santander nos termos e por força da Deliberação do Conselho de Administração do banco de Portugal de 2 de maio de 2016 e retificadas nos termos aprovados nas reuniões ordinárias do conselho de Administração do banco de Portugal de 2 de maio de 2016 e retificadas nos termos aprovados nas reuniões ordinárias do Conselho de Administração do banco de Portugal de 21 de Fevereiro de 2017, de 21 de Julho de 2017, 19 de dezembro de 2017 e 20 de novembro de 2018, 3 de junho de 2019, 21 de abril de 2020, 21 de setembro de 2021 e 22 de fevereiro de 2022-nos termos da comunicação conjunta remetida pelo Banif, Oitante e Santander, datada de 3 de março de 2023 e respetivos anexos, constantes do Anexo I à presente Deliberação e que desta fazem parte integrante;
b. Comunicar ao IRN, Banif, Oitante e Santander a adopção da presente decisão, juntando-se a cada uma dessas comunicações cópia da carta conjunta da Oitante, BANIF e Santander, datada de 3 de março de 2023 e dos respetivos anexos.... "
57. Consta da descrição do anexo IX à decisão referida em 54, relativamente aos imóveis que transitaram para a Oitante, SA ao abrigo da Medida de Resolução, o imóvel identificado no ponto dos factos 2. provados.
58. A A. Oitante SA tem por objecto a administração dos direitos e obrigações que constituam ativos do banif-banco Internacional do Funchal, SA que lhe foram transferidos em cada momento, por decisão do banco de Portugal, tendo em vista as finalidades enunciadas no artigo 145.°, -C do RGICSF, tendo sido Inscrita no registo comercial pela Ap.224/20160112 (cfr. certidão permanente junta aos autos.
Factos não provados.
Estes os factos, nada mais se provou ".
IV. Fundamentação de Direito
4.1. Nulidades da sentença
A este propósito a recorrente fez menção à verificação de três tipos de fundamentos de nulidade da sentença:
i. nulidade prevista na alínea b) do art. 615° n° 1 do CPC: sentença omissa quanto à indicação dos factos não provados e sua fundamentação e deficiente fundamentação da resposta à matéria de facto provada;
ii. nulidades previstas nas alíneas c) e d) do artigo 615/1 do CPC.
Sendo o elenco das alíneas do n.° 1 do art. 615° do CPC, um elenco taxativo, só nas hipóteses ali expressamente consignadas se coloca a hipótese de nulidade da sentença.
Refere o mencionado art. 615° n° 1 do CPC, para o que aqui importa decidir, o seguinte:
“É nula a sentença quando:
(...)
b. não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão;
c. Os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível;
d. o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento.”
Vejamos.
1.1 Nulidade do artigo 615/-b) do CPC. Invoca a recorrente que “1. A sentença proferida pelo tribunal é nula por violação dos disposto na alínea b) do n.° 1 do artigo 615.°do Código de Processo Civil, em virtude da omissão da indicação dos factos que não foram considerados provados (resulta da sentença recorrida quanto aos factos não provados apenas: ‘'estes os factos, nada mais se provou’’). (...) 3. Mais não contém a sentença a
fundamentação dos factos que não considerou provados e quanto à motivação dos factos provados limitase a parafrasear os depoimentos das testemunhas ”.
Em relação a este fundamento de nulidade, prevista na alínea b) do artigo 615 do C.P.C., esta apenas se verifica quando exista absoluta falta de fundamentação, seja de facto ou de direito e não apenas fundamentação medíocre, deficiente, quiçá errada.
Com efeito, ao juiz cabe especificar os fundamentos de facto e de direito da decisão que profere, nos termos do disposto no artigo 607/3 e 4 do CPC, a fim de que esta decisão seja perceptível para os seus destinatários e que estes, face à fundamentação exposta na sentença, possam impugná-la quer de facto (através do recurso previsto no artigo 640 do CPC) quer de direito.
Não cumpre esta norma, existindo falta absoluta de motivação, quando exista ausência total de fundamentos de direito e de facto. (Neste sentido vide Lebre de Freitas e Outros, Código de Processo Civil Anotado, II Vol., 2001, p. 669, Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 19 de outubro de 2006, Proc. n° 6814/2006-6; Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 26 de abril de 1995, Raul Mateus, CJ 1995 - II, p. 58, Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 2 de junho de 2016, Fernanda Isabel Pereira, 781/11., Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 17 de maio de 2012, Gilberto Jorge, 91/09, Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 29 de setembro de 2014, Proc. n° 2494/14.8TBVNG.P1). Já Teixeira de Sousa in Estudos Sobre o Novo Processo Civil, Lex, 1997, pág. 221 referia que: “o dever de fundamentação restringe-se às decisões proferidas sobre um pedido controvertido ou sobre uma dúvida suscitada no processo (...) e apenas a ausência de qualquer fundamentação conduz à nulidade da decisão (...); a fundamentação insuficiente ou deficiente não constitui causa de nulidade da decisão, embora justifique a sua impugnação mediante recurso, se este for admissível”, pelo que, conforme refere Tomé Gomes in “Da Sentença Cível”, in O novo processo civil, caderno V, ebook publicado pelo Centro de Estudos Judiciários, Jan. 2014, pág. 370, disponível emhttp://www.cej.mj.pt/cej/recursos/ebooks/ProcessoCivil/CadernoV_NCPC_Textos_Jurisprudencia.pdf, “a falta de fundamentação de facto ocorre quando, na sentença, se omite ou se mostre de todo ininteligível o quadro factual em que era suposto assentar. Situação diferente é aquela em que os factos especificados são insuficientes para suportar a solução jurídica adotada, ou seja, quando a fundamentação de facto se mostra medíocre e, portanto, passível de um juízo de mérito negativo. / A falta de fundamentação de direito existe quando, não obstante a indicação do universo factual, na sentença, não se revela qualquer enquadramento jurídico ainda que implícito, de forma a deixar, no mínimo, ininteligível os fundamentos da decisão.»
Este dever geral de fundamentação dos despachos e decisões (sentenças) proferidos no processo, está de acordo com o princípio constitucional contido no art° 205, n°1, da C.R.P., que exige que as decisões do tribunal, que não sejam de mero expediente, sejam fundamentadas na forma prevista na lei, de molde a assegurar a todos os cidadãos um processo equitativo e justo, conforme decorre do disposto no art° 20, n°4, da C.R.P.
Vamos então desdobrar a análise desta causa de nulidade nos argumentos referidos e analisar, cada um, de per si: - A falta de indicação de factos não provados.
Em cumprimento deste dever de assegurar a todos os cidadãos um processo equitativo e justo, exige-se não só a indicação dos factos provados, como dos não provados e ainda, a indicação do processo lógico - racional que conduziu à formação da convicção do julgador, relativamente aos factos que considerou provados ou não provados, de acordo com o ónus de prova que incumbia a cada uma das partes, conforme o disposto no artigo 607/4 do CPC.
Sendo imprescindível a um processo equitativo, por só através do seu escrupuloso cumprimento se salvaguardar as garantias das partes possibilitando a sua cabal reacção, em caso de discordância (mormente através do recurso ao disposto no art° 640 do C.P.C.), a sua não observância, pela total falta de indicação dos factos provados ou dos não provados, constitui fundamento de nulidade da decisão.
Com efeito, decorre do disposto no artigo 607/4 do CPC do C.P.C. que o juiz deve declarar quer os factos que julga provados, quer os que julga não provados. Esta indicação não se basta com meras remissões para os articulados, nem com a indicação de que os não provados são todos os que não resultarem provados. Tal afirmação equivale a nada dizer.
Cumpre ao magistrado judicial, em cumprimento do disposto no n° 4 do artigo 607 do CPC, indicar de forma concreta os factos relevantes e controvertidos que julgou não provados, fundamentando a sua decisão, em conformidade com o disposto nos n°s 4 e 5 deste preceito. A este respeito, conforme referem Abrantes Geraldes/Paulo Pimenta/Luís Filipe Pires de Sousa, em anotação ao artigo 607 do C.P.C. (Abrantes Geraldes, António Santos et all, Código de Processo Civil Anotado”, Vol. I, Almedina, pág. 17), impõe-se ainda que a factualidade apurada pelo tribunal deva “ser descrita pelo juiz de forma fluente e harmoniosa, técnica bem diversa de uma que continue a apostar na mera transcrição de respostas afirmativas, positivas, restritivas ou explicativas a factos sincopados, como os que usualmente preenchiam os diversos pontos da base
instrutória (e do anterior questionário). Se, por opção, por conveniência ou por necessidade, se inscreveram nos temas de prova factos simples, a decisão será o reflexo da convicção formada sobre tais factos, a qual deve ser convertida num relato natural da realidade apurada... [...]. O importante é que, na enunciação dos factos provados e não provados, o juiz use uma metodologia que permita perceber facilmente a realidade que considerou demonstrada, de forma linear, lógica e cronológica, a qual, uma vez submetida às normas jurídicas aplicáveis, determinará o resultado da acção." Especificados os factos provados e não provados, prossegue ainda Abrantes Geraldes (Abrantes Geraldes, António Santos, Recursos no Novo Código de Processo Civil, Almedina, 4a edição, 2017, págs. 296, 297, que “o dever de fundamentação introduzido pela reforma de 1961, reforçado em 1995 e agora transferido para a própria sentença que simultaneamente deve conter a enunciação dos factos provados e não provados e as respectivas implicações jurídicas” exige que “se estabeleça o fio condutor entre a decisão sobre os factos provados e não provados e os meios de prova usados na aquisição da convicção, fazendo a respectiva apreciação crítica nos seus aspectos mais relevantes. Por conseguinte, quer relativamente aos factos provados, quer quanto aos factos não provados, o juiz deve justificar os motivos da sua decisão, declarando por que razão, sem perda da liberdade de julgamento garantida pela manutenção do princípio da livre apreciação das provas (...), deu mais credibilidade a uns depoimentos e não a outros, julgou relevantes ou irrelevantes certas conclusões dos peritos ou achou satisfatória ou não a prova resultante de documentos. É na motivação que agora devem ser inequivocamente integradas as presunções judiciais e correspondentes factos instrumentais (...). Se a decisão proferida sobre algum facto essencial não estiver devidamente fundamentada a Relação deve determinar a remessa dos autos ao tribunal de 1a instância, a fim de preencher essa falha com base nas gravações efectuadas ou através de repetição da produção da prova, para efeitos de inserção da fundamentação da decisão sobre a matéria de facto." (No mesmo sentido vide Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 2 de outubro de 2008, relator Lázaro Faria, Proc. n° 07B1829; Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 5 de março de 2015, relator Aristides Rodrigues de Almeida, Proc. n° 1644/11.0TMPRT-A.P1 e Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 29 de junho de 2017, Proc. n° 13/15.8T8VCT.G1, todos disponíveis inwww.dgsi.pt).
Ora a decisão em apreço não contém a descrição dos factos não provados, adoptando uma formulação genérica e obscura referindo-se a “Estes os factos, nada mais se provou ”, sem que se possa extrair desta formulação a que factos concretos se refere o Sr. Juiz a quo, o que desde logo inviabiliza que possa a recorrente, nesta parte, lançar mão do disposto no artigo 640 do C.P.C., óbice que igualmente se verifica em relação ao tribunal ad quem, pelo desconhecimento da realidade fáctica que o Sr. Juiz recorrido, considerou não provada.
Esta omissão determina a nulidade da sentença recorrida, por se integrar nos fundamentos de nulidade previstos no artigo 615/1-b) do CPC.
Ora, ao contrário daquelas nulidades que podem e devem ser sanadas pelo tribunal ad quem, ao abrigo da regra de substituição do tribunal recorrido, prevista no artigo 665 do C.P.C., esta nulidade só pode ser sanada pelo tribunal e magistrado que proferiu a sentença, sob pena de violação do duplo grau de jurisdição em sede de matéria de facto (neste sentido vide Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 26 de fevereiro de 2019, relator Fonseca Ramos, proferido no proc. n° 1316/14.4TBVNG-A.P1.S2; Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 7 de dezembro de 20121, relator Ana Rodrigues da Silva, proferido no proc. n° 8513/09.2YYLSB- B.L2-7). - Da imprecisão da motivação dos factos provados e da ausência de motivação dos factos não provados a) ausência de motivação dos factos não provados:
Não indica igualmente o tribunal recorrido a fundamentação para os desconhecidos factos que deu como não provados, sendo a sentença, na parte da motivação da decisão da matéria de facto totalmente omissa a este respeito.
E claro que esta ausência impede que a parte que pretenda recorrer da decisão possa impugnar esta (inexistente) matéria de facto, por igualmente desconhecer as concretas razões pelas quais o tribunal recorrido considerou “estes os factos, nada mais se provou” como não provados. Exista aqui também a invocada nulidade prevista no artigo 615/1-b) do CPC. Como se refere no citado Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 26 de fevereiro de 2019, “Na ponderação da natureza instrumental do processo civil e dos princípios da cooperação e adequação formal, as decisões que, no contexto adjectivo, relevam decisivamente para a decisão justa da questão de mérito, devem ser fundamentadas de modo claro e indubitável pois só assim ficam salvaguardados os direitos das partes, mormente, em sede de recurso da matéria de facto, quando admissível, habilitando ao cumprimento dos ónus impostos ao recorrente impugnante da matéria de facto, mormente, quanto à concreta indicação dos pontos de facto considerados incorrectamente julgados e os concretos meios de prova, nos termos das als. a) e b) do n°1 do art. 640° do Código de Processo Civil.”
Recorde-se que em relação aos requisitos de admissibilidade do recurso quanto à reapreciação da matéria de facto pelo tribunal “ad quem”, versa o artigo 640/1 do CPC, o qual dispõe que:
«Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a. Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b. Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c. A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas. ”
b) imprecisão da motivação dos factos provados:
Questão diferente da falta de fundamentação é a existência de uma insuficiente fundamentação da resposta à matéria de facto que leve a deficiências no entendimento do raciocínio lógico que levou aos factos provados e não provados, e cuja consequência será a anulação da decisão e já não a sua nulidade. No que toca à especificação dos meios probatórios, «Quando os meios probatórios invocados tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes ” (Artigo 640/2-a) do CPC). Acresce que, conforme refere Teixeira de Sousa (obra cit., págs. 347), “Algumas das provas que permitem o julgamento da matéria de facto controvertida e a generalidade daquelas que são produzidas na audiência final (...) estão sujeitas à livre apreciação do Tribunal (...) Esta apreciação baseia-se na prudente convicção do Tribunal sobre a prova produzida (art.° 655. °, n. °1), ou seja, as regras da ciência e do raciocínio e em máximas da experiência”, sendo assim relevante que este raciocínio esteja devida e concretamente explicitado, de forma a que, quer o recorrente, quer o tribunal de recurso, saiba com exactidão em que meios de prova se baseou o tribunal recorrido para dar como adquiridos aqueles factos e não dar como adquiridos outros. No caso concreto, a súmula dos depoimentos das testemunhas ouvidas na audiência final e constantes da sentença recorrida dirigem-se a que facto provado? Provam, concretamente, que facto? Relembremos a este respeito as palavras de Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa in Código de Processo Civil Anotado, Vol. I, anotação ao artigo 607, ponto 18: “O Juiz deve, pois, expor a análise crítica das provas que foram produzidas, quer quanto se trate de prova vinculada, em que a margem de liberdade é inexistente, quer quando se trate de provas submetidas à sua livre apreciação, envolvendo os motivos que o determinaram a formular o juízo probatório relativamente aos factos considerados provados e não provados (em STJ 16-12-20, 4016/13, alude-se à especificação relativa das decisões decisivas)), não bastando fazer o resumo dos depoimentos”.
Não bastam, pois, meras formulações genéricas, para se considerar cumprido este ónus e assegurado o direito a um processo equitativo e justo.
Por isso, a motivação dos factos provados encontra-se deficiente e imprecisa, necessitando de ser aprimorada pelo Mm° Juiz a quo que deverá estabelecer a ligação entre cada facto provado e o meio de prova que o sustente.
Assim se conclui que o tribunal recorrido incorreu em nulidade da sentença, pela não especificação concreta dos factos não provados e sua concreta motivação, por reporte aos artigos 154, 607/4 e 615/1-b) do CPC, impondo-se a anulação da sentença recorrida, devendo os autos retornar à primeira instância, a fim de que seja proferida nova decisão, elencando os factos não provados e a sua concreta fundamentação, e motivando devidamente os factos provados, com apreciação crítica da prova produzida, e com observância do disposto no artigo 607/4 do CPC.
Prejudicadas ficam, em consequência da declaração de nulidade, as demais questões suscitadas pela recorrente, nos termos do artigo 608/2 do CPC.
As custas desta apelação serão pela parte vencida a final.
V. Decisão
Pelo exposto, acordam os juízes desta 8a Secção do Tribunal da Relação de Lisboa, em anular a sentença recorrida, determinando, em consequência, que os autos baixem à 1a instância, a fim de que aí seja fixada e motivada a matéria de facto nos termos expostos e, após, seja prolatada nova sentença.
Custas desta apelação pela parte vencida a final.
Notifique.
Escrito e revisto pela relatora.
Notifique e registe.
Lisboa, 13 de março de 2025
Maria Teresa Lopes Catrola
Maria Carlos Calheiros
Cristina Lourenço