RECURSO DE REVISÃO
ACORDÃO DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA
IRRECORRIBILIDADE
RECURSO ORDINÁRIO
RECLAMAÇÃO
REJEIÇÃO
Sumário


I - O conhecimento do recurso de revisão, integra-se nas competências do STJ, como tribunal de revista que cuida pela correta aplicação da lei por todos os tribunais judiciais.
II - A decisão que negar ou autorizar a revisão, não admite recurso ordinário. É, possível, apenas, arguir eventuais nulidades (art. 118.º e segs. do CPP), ou, ocasionalmente, interpor recurso para o TC (art. 280.º da CRP e art. 70.º da LTC), ou recurso extraordinário.
III - Não é legalmente admissível, devendo ser rejeitado, o requerimento apresentado como reclamação do acórdão que negou a revisão, onde conclui e pede, a final, que “tem que se concluir que não existe nenhum fundamento para que a revisão seja rejeitada, e consequentemente, a revisão deve ser admitida seguindo-se os ulteriores termos”.

Texto Integral


Acordam, em conferência, na 3ª secção do Supremo Tribunal de Justiça

1.Relatório

1.1. Os assistentes/recorrentes Comprojecto, Projectos e Construções, Lda, AA, BB e CC, vieram nos termos (entre outros) do artigo 449.º, n.º 1, al. c), al. d) e al. g), do CPP, interpor recurso extraordinário de revisão do acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 30.06.2021, proferido no inquérito n.º 695/15.0TELSB.L1, que correu termos no Departamento de Investigação e Acção Penal – DIAP -, de Lisboa, que referiram ter transitada em julgado com o acórdão de 30.03.2023 proferido no processo n.º 166/2023, do Tribunal Constitucional.

Recurso que foi decidido por acórdão de 16.10.2024, com o seguinte dispositivo: “pelo exposto, acordam nesta Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça em negar a revisão pedida pelos assistentes Comprojecto, Projectos e Construções, Lda, AA, BB e CC.”

A 28.101.2024, os “recorrentes/reclamantes/assistentes” vieram juntar requerimento que é apresentado nos termos dos Art.ºs 105.º/1 do CPP, e 3.º/3, 4.º, 149.º e 643.º/1 e 2 do CPC, sendo relativo ao contraditório do Acórdão do STJ de 16-10-2024, que, em clara decisão-surpresa e infringindo os princípios do contraditório e da 'igualdade de armas' decidiu que o Acórdão do TRL de 30 de junho de 2021 (Proc.º 695/15.0TELSB.L1) é uma decisão interlocutória, e que, por isso, a revisão teria que ser rejeitada.”

A final, concluem que … “tem que se concluir que não existe NENHUM fundamento para que a revisão seja rejeitada, e consequentemente, a revisão deve ser admitida seguindo-se os ulteriores termos.”

Notificado desta “reclamação”, respondeu o Exmo. Procurador Geral Adjunto neste Tribunal, nos seguintes termos: “por acórdão proferido nestes autos, datado de 16.10.2024, foi negada a revisão pedida pelos assistentes Comprojecto, Projectos e Construções, Lda, AA, BB e CC.

Entendeu este Tribunal que “(…) que nem a decisão objeto de recurso (ac. do TRL de 30.06.2021) integra uma decisão recorrível para efeitos de recurso extraordinário de revisão, nem os recorrentes, enquanto assistentes, tem legitimidade para dela interporem recurso de revisão.

Ora, não se verificando os pressupostos da revisão requerida pelos recorrentes, é manifestamente infundado o presente recurso extraordinário (art. 456.º do CPP), desde logo por se verificarem as duas questões prévias apontadas.”

Veio agora a assistente Comprojecto, Projectos e Construções, Lda reclamar deste acórdão, nos termos dos Art.ºs 105.º, nº 1 do CPP, e 3.º, nº 3, 4.º, 149.º e 643.º, nºs 1 e 2 do CPC, em seu entender aplicáveis ex vi dos Art.ºs 4.º e 240.º do CPP.

Ora, tal como acontece na lei processual penal que regula esta matéria, o artigo 643º do CPC apenas admite reclamação do despacho que não admita o recurso.

No caso dos autos, estamos perante um acórdão que, conhecendo do mérito do recurso, o julgou improcedente por ser manifestamente infundado.

Esta decisão não é recorrível nem, muito menos, reclamável.

Assim, promovo se indefira o requerimento de 28.10.2024 por falta de fundamento legal.”

A esta promoção respondeu a “ofendida/recorrente/ reclamante/assistente”, concluindo, a final, que … “pelo exposto, também tem que se concluir que apenas infringindo o DIREITO comunitário suficientemente caracterizado e incondicional que não deixa ao Estado[s]-Membro qualquer margem de apreciação, assim como o que se determina nos art.ºs 379.º/1/al. c), 1.ª e 2.ª parte, do CPP, e 195.º/1 do CPC, 616.º/2 também do CPC, e 101.º, 103.º/1 e 266.º/1 da CRP, e o que se estabelece nos art.ºs 8.º/1, 9.º/1 e 13.º/1 da Lei 67/2007, e 6.º/1 - na parte em que se determina que todos têm direito a que a sua causa seja examinada, equitativa por um tribunal independente e imparcial - da CEDH, é que a conferência têm fundamento para não pronunciar os arguidos Millennium/BCP e outros dos crimes de branqueamento e de abuso de confiança.”

1.2. Foram os autos aos vistos e à conferência,

Decidindo,

2.Fundamentação

2.1. O recurso de revisão densifica na lei ordinária a garantia constitucional assegurada pelo art.º 29.º, n.º 6, da CRP1.

Determina este preceito constitucional que “os cidadãos injustamente condenados têm direito, nas condições que a lei prescrever, à revisão da sentença”.

O conhecimento do recurso de revisão, integra-se nas competências do Supremo Tribunal de Justiça, como tribunal de revista que cuida pela correta aplicação da lei por todos os tribunais judiciais, a par de outros recursos extraordinários (como o recurso para fixação de jurisprudência (art.º 437º), o recurso de decisões proferidas contra jurisprudência fixada (art.446.º), e do recurso interposto no interesse da unidade do direito (art.447.º).

Interposto recurso de revisão, pode o STJ, (i)negar a revisão pedida pelo assistente, pelo condenado ou por qualquer das pessoas referidas no n.º 2 do art.º 450º (do CPP) – art.º 456º do CPP – ou pode o STJ (ii)autorizar a revisão, e, nesse caso, reenvia o processo ao tribunal de categoria e composição idênticas às do tribunal que proferiu a decisão a rever e que se encontrar mais próximo – art.º 457º do CPP.

Neste caso o STJ, como referido, por acórdão de 16.10.2024, negou a revisão, requerida pela ora reclamante.

Uma vez proferida decisão, esta, como é sabido, produz efeitos de ordem processual e substantiva, e, dentro daqueles, desde logo, esgotado fica o poder jurisdicional do juiz/tribunal.

O juiz, em princípio, não pode proferir nova decisão sobre a causa.

Além disso, a decisão do STJ que negar ou autorizar a revisão não admite recurso ordinário2.

A decisão tomada não pode ser impugnada. Aceita-se que “a intervenção do STJ, será, na perspectiva do legislador, garantia suficiente da bondade da decisão que seja tomada”3.

Assim, as únicas formas de reagir contra a decisão que foi tomada pelo STJ no acórdão de 16.10.2024, serão, (i)a arguição de eventuais nulidades (art.º 118º e segs. do CPP), se se verificarem, (ii)o recurso para o Tribunal Constitucional (art.º 280º da CRP e art.º 70º da LTC), ou eventualmente (iii)a interposição de recurso extraordinário para fixação de jurisprudência (art.º 437º do CPP), se se verificarem os pressupostos, (iii)o recurso extraordinário de decisões proferidas contra jurisprudência fixada (art.446.º), e do (iv)recurso interposto no interesse da unidade do direito (art.447.º)4.

2.2. Neste caso a Recorrente pretende que a revisão seja admitida seguindo-se os ulteriores termos, pois que, tem que se concluir que não existe NENHUM fundamento para que a revisão seja rejeitada.

Ou seja, insiste pela admissão do recurso e autorização da revisão, não arguiu quaisquer nulidades, não recorre para o Tribunal Constituciona nem interpõe qualquer outro recurso extraordinário.

Pretende uma nova decisão que autorize a revisão, o que como já dito não é possível em termos processuais, quer porque a decisão não admite reclamação, quer porque o juiz/tribunal não pode proferir nova decisão sobre a mesma questão, por se haver esgotado o poder jurisdicional.

Para além de que, na verdade, a recorrente não tem razão de facto e de direito como foi já decidido, no acórdão deste Supremo Tribunal de 16.10.2024.

Não resta senão rejeitar, por inadmissibilidade, o requerimento dos recorrentes/ofendida/reclamantes/assistentes, Comprojecto, Projectos e Construções, Lda, AA, BB e CC, atravessado nos autos em reclamação do acórdão proferido.

3. Decisão:

Pelo exposto, o Supremo Tribunal de Justiça, 3.ª secção criminal, acorda em,

- Rejeitar, por inadmissibilidade legal, o requerimento/reclamação atravessado nos autos pelos recorrentes/ofendida/reclamantes/assistentes, Comprojecto, Projectos e Construções, Lda, AA, BB e CC atravessado nos autos reclamando do acórdão proferido.

- Condenar em custas pelo incidente, os requerentes, fixando-se a taxa de justiça em 3 UCs – art.º 513º n.ºs 1 e 3 do CPP, art.º 7º, n.º 8, e tabela II anexa ao Regulamento das Custas Processuais.

*

Supremo Tribunal de Justiça, 05 de Março de 2025,

António Augusto Manso (Relator)

Horácio Correia Pinto (Adjunto)

José Luis Lopes da Mota (Adjunto)

Nuno António Gonçalves (Presidente da 3 ª secção criminal)

*

_____________________________________________

1- Também a Convenção Europeia dos Direitos Humanos, no Protocolo 7, art.º 4.º, refere que a sentença definitiva não impede “a reabertura do processo, nos termos da lei e do processo penal do Estado em causa, se factos novos ou recentemente revelados ou um vício fundamental no processo anterior puderem afectar o resultado do julgamento”.

2- v. João Conde Correia, Comentário Judiciário do Código de Processo Penal, Almedina, Coimbra, tomo V, pág. 610.

3-João Conde Correia, ob. cit. p. 610.

4-Idem.