I – Atenta a diversidade de factos que as declarações de parte podem abranger, o artigo 466.º, n.º 3 do CPC estabelece que estas serão livremente apreciadas pelo tribunal na parte em que não representem confissão, significando que a parte do depoimento, ou dos esclarecimentos do sujeito processual, que não assumam a natureza de confissão, com a amplitude referida, não tem que ser reduzida a escrito por não ser prova tarifada.
II – Porém, tal como já resultava do disposto no artigo 563.º, n.º 1, do regime pretérito, o actual artigo 463.º, n.º 1, continua a impor a redução a escrito da confissão do depoente, que pode ocorrer tanto em depoimento como em declarações de parte, bem como em prestação de informações ou esclarecimentos ao tribunal.
III – A desconsideração da formalidade da assentada na acta da audiência de discussão e julgamento implica que a declaração confessória da parte, mesmo que se encontre gravada, ao invés de ter o valor probatório de prova plena contra o confitente, que lhe atribui o n.º 1 do artigo 358.º do CC, passa a ser livremente apreciada pelo tribunal, nos termos do n.º 4 do mesmo normativo e ainda do artigo 361.º da mesma codificação, que rege sobre o valor do reconhecimento não confessório de factos desfavoráveis.
IV – Tal omissão constitui uma nulidade procedimental, consistente na omissão de um acto que a lei prescreve e que poderia ter influência no exame e decisão da causa – artº 195º. Estando a Apelante presente aquando da prática do acto em sede de audiência de julgamento, deveria ele tê-la arguido imediatamente, antes de finda esta diligência – art.º 199.º do CPC. Não o tendo feito, a nulidade ficou sanada, e dela não se podendo retirar qualquer relevância probatória para a confissão, nomeadamente deverem ter-se plenamente por provados os factos desfavoráveis para o depoente – art.ºs 352º e 358º nº1 do C. Civil.
V – Os recursos apenas visam a reapreciação ou reponderação da decisão de questões oportunamente suscitadas, salvo quando se trate de questões de conhecimento oficioso, ou seja, destinam-se à apreciação de questões já antes levantadas e decididas no processo e não a provocar decisões sobre questões que antes não foram submetidas ao contraditório e decididas pelo Tribunal recorrido.
(Sumário elaborado pelo Relator)
Acordam os Juízes da 1.ª secção cível do Tribunal da Relação de Coimbra:
1.Relatório
Autora: AA, casada, advogada, portadora do Cartão de Cidadão nº...84 e NIF ...91..., residente na Urbanização ..., Lote nº..., ......., ....
Ré: A..., S.A., pessoa coletiva nº ...11, com sede estatutária em ..., ... ..., e efectiva na Rua ..., ... ..., ... ....
Causa de pedir:
Na assembleia geral de sócios da Ré que teve lugar no dia 14 de Junho de 2023 foi tomada a deliberação de aprovação de contas e de aplicação de resultados do exercício de 2022.
Na assembleia geral da Ré de 17 de Fevereiro de 2023 o administrador único da Ré foi destituído por justa causa, através do voto nesse sentido da Autora. Esta deliberação não foi impugnada. O relatório de gestão foi elaborado pelo administrador única já destituído à data. O Fiscal único não convocou nova assembleia para eleição de órgãos sociais.
As contas e os relatórios de gestão relativas aos exercícios de 2014 a 2021 foram aprovadas na assembleia geral de 17 de Fevereiro de 2023, com o voto contra da Autora. Esta deliberação foi impugnada pela acionista Autora também por violação do seu direito a informação preparatória (processo nº1294/23....).
Assim, não podem ser aprovados os “relatórios de gestão” e contas relativas ao ano de 2022, sendo que o próprio Fiscal único emitiu um relatório de escusa. A falta de informação manteve-se para a assembleia em apreço.
O relatório de gestão relativo ao exercício de 2022 padece de várias irregularidades, designadamente não obedece ao disposto no nº5 do art. 65º, 66º, e 66º-A do CSC.
A carta enviada ao fiscal único não corresponde a um relatório de gestão, sendo que está eivado de falsas declarações, nomeadamente no que diz respeito à declaração de que não existem a correr contra a sociedade ações judiciais, e de que a sociedade está dotada de meios financeiros necessários e suficientes para que se mantenha em atividade.
O relatório de gestão foi elaborado em Abril de 2023 depois do termo final do prazo legalmente estabelecido.
O Fiscal único não cumpre devidamente as suas funções de fiscalização.
A deliberação de aprovação do relatório de gestão e das contas do exercício de 2022 é anulável nos termos do art. 69º do CSC.
Em consequência deverá também ser anulada a proposta de aplicação de resultados que a Autora desconhece quais sejam.
O administrador único tem exercido a administração violando “constantemente de forma reiterada, grosseira e ao longo de anos, os seus deveres de cuidado e diligência enquanto administrador.” Por isso, não se percebe em que se baseia o voto de confiança dado ao antigo “administrador único” BB, pelo sócio CC. Também não se entende o voto de confiança unanime conferido ao fiscal único, Dr. DD, pois este tem vindo a violar os deveres inerentes ao exercício das suas funções.
A Autora entende que a deliberação ser considerada nula de acordo com o art. 56º nº1, alínea d) CSC ou, pelo menos anulada de acordo com o art. 58º nº1, alínea b) do CSC por abusiva e por visar satisfazer os propósitos dos sócios BB e CC.
Pedido:
- Que se anulem as deliberações tomadas em 14 de junho de 2023, constantes da ata 91.
Contestação:
Não existiu qualquer deliberação de destituição do administrador único na assembleia geral de 17.02.2023. O voto expresso com vista à destituição não constituiu uma deliberação. Tal assunto não foi sequer posto a votação. Mas mesmo que tal tivesse ocorrido o administrador único manter-se-ia em funções até à eleição de novos órgãos sociais.
A deliberação em causa (aprovação das contas do exercício de 2022 e do relatório de gestão) não é afetada pela impugnação da deliberação que aprovou as contas dos exercícios anteriores. A deliberação impugnada continua a produzir efeitos na ordem jurídica, eventualmente, até ao trânsito em julgado da decisão que julgue procedente a impugnação. Efeitos imediatos só com o pedido de suspensão de deliberação em sede de procedimento cautelar para esse efeito instaurado.
A Ré considera não serem verdadeiras as acusações que são efetuadas ao fiscal único, mas abstém-se de quaisquer considerações porque este não é parte no processo e não se pode aqui defender.
A Ré é uma micro entidade pelo que, de acordo com o nº6 do art. 66º do CSC, não está obrigada a ter relatório de gestão. A Ré rejeita todas as acusações de violação dos deveres de lealdade e cuidado que são imputadas ao administrador único,
A declarada ausência de processos judiciais pendentes contra a Ré, não teve em linha de contas as ações instauradas pela acionista Autora.
A sociedade tem num efetivo problema de liquidez, todavia o administrador não lhe faz menção com vista a proteger o interesse da sociedade e dos acionistas. Em todo o caso, dois dos acionistas têm vindo a auxiliar sociedade nesta matéria.
As irregularidades remontam ao período em que a Autora foi administradora e advogada da sociedade.
A autora conhece os resultados exercício de 2022.
Pronunciou-se sobre o voto de confiança na administração.
As acusações da Autora contra o Fiscal Único são destituídas de sentido.
Nesta conformidade, e pelo exposto, o tribunal decide:
- Julgar improcedente a presente ação.
- Absolver a Ré A..., S.A. do pedido.
Custas pela Autora.
Registe e notifique.
(…).
(…).
A anulabilidade ou nulidade das deliberações tomadas na assembleia-geral da Apelada de 14 de Junho de 2023, plasmadas na ata 91, respeitante à aprovação de contas e aplicação dos resultados do exercício de 2022 e apreciação geral da administração e fiscalização.
2.1-Da nulidade da sentença;
No seu recurso a recorrente alega, desde logo, que a sentença recorrida é nula, invocando como fundamento legal os artigos 195.º, 615.º, alíneas c) e d) do Código de Processo Civil – será o diploma a citar sem menção de origem.
Na sua alegação:
15. Sabia, portanto, Tribunal a quo que a autora não fora administradora de facto, nunca nada decidiu, e que até fora expulsa em 2012, não podendo assim considerar precisamente o contrário, ignorando prova bastante, assinada – confessada pelos dois acionistas detentores da Ré, pelo que, incorrendo o Tribunal a quo numa nulidade nos termos do disposto no art.º 615º 1º, c) do CPC.
Direito à Informação Societária/Preparatória
16. Bem decidiu o Tribunal a quo quando no ponto 13 da matéria provada que na convocatória “…não consta que a documentação societária estaria à disposição dos acionistas, e onde;” bem como no ponto 18 que: “… Este relato foi efetuado através de uma minuta utilizada em anos anteriores.”
17. Mas já mal andou o Tribunal a quo quando considera como não provada que a Ré não prestou a informação preparatória à Autora para a Assembleia Geral e a insuficiência da informação já vem desde pelo menos 2014. Em vez disso devia ter considerado tais factos como provados, até porque o mesmo Tribunal a quo tem conhecimento da confissão da Ré, não só nos presentes autos como também e mais afincadamente no processo sucedâneo nº 1294/24....:
18. Tal constitui uma nulidade nos termos do disposto no art.º 615º nº1, d) CPC, considerando que sobre tal matéria controvertida, o Tribunal a quo apenas faz duas breves referencias, de passagem, uma das declarações da própria Ré em que fez constar na sentença que, “Referiu-se aos documentos enviados à Autora (relatório de gestão e os documentos contabilísticos balanço e demonstrações financeiras, e a certificação legal de contas) em 02 de Maio de 2023”.
(…)
O NÃO DEBATE OU FALTA DELE
37. Não considerou o Tribunal a quo como matéria importante para a boa decisão da causa, inserir nos factos provados de forma inequívoca o debate ou falta dele, do ponto de aprovação de constas na Assembleia, o que é uma nulidade nos termos do art.º 615 nº 1 d) CPC
(…)
61. é falso e desde logo a autora o alertou, nos art.º 70, 71, e 72º da petição inicial, sendo que na realidade até são MAIS do que os elencados pela Autora. Pelo que, não pode nunca o Tribunal a quo interpretar tais falsas declarações no sentido em que o fez, fazendo suposições e adivinhações tentando desculpar o administrador, conhecendo questões e desculpas que nem foram invocadas pela Ré. Em violação do disposto no art.º 615º nº 1 d) do CPC
(…)
88. Assim Não se aceita a interpretação do Tribunal a quo quando considera que “não ficou provado que o Fiscal Único tenha violados os deveres legais”. Sendo certo que, a decisão é nula por violação do disposto no art.º 615 CPC e erro na apreciação da prova.
3º ponto da Ordem de Trabalhos
Votos de confiança FU e Administrador
89. Considera a recorrente que o Tribunal a quo deveria ter interpretado a aprovação do 3º ponto da Ordem de trabalhos como abusiva interpretando essa deliberação no sentido do art.º 58 n.º 1 alínea b) do CSC que estabelece que devem ser anuladas as deliberações apropriadas para satisfazer o propósito de um dos sócios (ou dos dois) de conseguir, através do exercício do direito de voto, vantagens especiais para si ou para terceiros, em prejuízo da sociedade ou de outros sócios ou simplesmente de prejudicar aquela ou estes. Violou assim o disposto no art.º 615 nº 1 d) do CPC
90. Em qualquer momento em ata consta quais serão os argumentos/fundamentos que demonstram que a gestão do administrador único e a fiscalização do FU foram exercidas em moldes que merecem louvores.
91. Assim; e diga-se ainda que repetidamente o Tribunal a quo deveria ter anulados as deliberações da Assembleia de 14 de junho de 2024 com base no art.º 69 n.º 2, do CSC ou seja, com base em contas irregulares.
Suprimentos à sociedade - provado em 23
92. Também Não pode o Tribunal a quo dar como provado em 23 “que os acionistas BB e CC têm vindo a efetuar suprimentos à sociedade”
93. Nada relativamente a tal matéria é alegada no processo, muito menos provado.
94. Nem o Tribunal a quo FUDAMENTA TAL DECISAO; ao longo da sentença não se vislumbra justificação para considerar provado os “factos” de 23, sendo tal decisão NULA por violação do disposto no art.º 615º nº 1 b), CPC
➢ como também não podia o Tribunal conhecer dessa mesma matéria ponto 23, sendo tal decisão NULA por violação do disposto no art.º 615º nº 1 d) CPC
➢ como também não existe qualquer prova da existência de suplementos, existindo erro na no julgamento da matéria de facto art.º 640 CPC
95. nem ao longo do processo existe prova nesse sentido, aliás na audiência de julgamento nenhuma prova se fez relativamente a tal facto!,
RESULTADO LIQUIDO - provado em 24
96. Também Não pode o Tribunal a quo dar como provado em 4 “ No exercício de 2022 a sociedade Ré apresentou um resultado líquido negativo de €41.528,00”. Nada relativamente a tal matéria é alegada no processo, nem o Tribunal a quo FUDAMENTA TAL DECISAO; ao longo da sentença não se vislumbra justificação para considerar provado os “factos” de 24, sendo tal decisão NULA por violação do disposto no art.º 615º nº 1 b), CPC
➢ como também não podia o Tribunal conhecer dessa mesma matéria ponto 24, sendo tal decisão NULA por violação do disposto no art.º 615º nº 1 d) CPC
➢ como também não existe qualquer prova da existência de suplementos, existindo erro na no julgamento da matéria de facto art.º 640 CPC
97. nem ao longo do processo existe prova nesse sentido, aliás na audiência de julgamento nenhuma prova se fez relativamente a tal facto!, contrariamente ao decidido,
PODE CONCLUIR-SE que o Tribunal a quo não procedeu a uma correta qualificação da matéria PROVA, atenta a prova produzida nos autos, (e contemporâneos, estes também sob a sua apreciação) e consequentemente tem de se declarar a nulidade da decisão recorrida, nos termos do art. 195º arts. 615º c ) d) , 639º e 640º do CPC por violação do disposto nos art.º 21, nº 1, c), 56, nº 1, d) 58, nº 1, c), 65º, 69º, 288º 289º, 290 e 291º, 397º, 421º, 422º, nº 1d) 452º, 455º, 463º, 518º, 615º nº 1 b) e d) do Código das Sociedades Comerciais o art.º 13 do Código de Registo Comercial e art.º 7 do CMVM.
Salvo o devido respeito, a Apelante não esmiuçou/compreendeu, devidamente, as normas supra descritas, confundindo os vícios invocadas - a construção da sentença é viciosa, uma vez que os fundamentos não/referidos pelo juiz conduziriam necessariamente a uma decisão de sentido oposto ou, pelo menos, de sentido diferente – com o eventual erro de julgamento, seja na decisão da matéria de facto - erro de facto-, seja na aplicação do direito aos factos - erro de direito-, em que o juiz, com base em determinada prova - ou falta dela - decide erradamente sobre determinado facto e/ou em que, com base em determinada factualidade ou falta dela, decide erradamente no sentido que juridicamente considera ser o correspondente ao direito aplicável.
Quanto à nulidade por falta de fundamentação - a que se refere a alínea b) do n.º 1 do artigo 615.º, do Código de Processo Civil –como é entendimento pacífico da Jurisprudência e Doutrina, só a falta absoluta de fundamentação, entendida como a total ausência de fundamentos de facto e de direito, gera tal nulidade. A mera fundamentação deficiente, incompleta, não convincente, medíocre ou errada afecta o valor doutrinal da sentença, sujeita-a ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, mas não produz a sua nulidade – neste preciso sentido, por ex. A. Varela, M. Bezerra, S. Nora, Manual de Processo Civil, 2ª edição, pág. 687-688; Acórdão do STJ de 14.12.2016, pesquisável em www.dgsi.pt.
Desde logo, como salientam quer Alberto dos Reis, quer A. Varela, não basta para que exista falta de fundamentação de facto e/ou de direito que a justificação da decisão seja deficiente, incompleta ou não convincente; é preciso que haja falta absoluta ou total de fundamentação, seja de facto, seja de direito - Assim sendo, para que haja falta de fundamentação, enquanto causa de nulidade da sentença, é necessário que o juiz não concretize os factos que considera provados e os não coloque na base da decisão, ou, ainda, quanto aos fundamentos de direito, que o juiz não explicite as razões jurídicas que servem de apoio à solução por si adoptada.
Mais, a nulidade por omissão de pronúncia sancionando a violação do estatuído no nº 2 do artigo 608.º, apenas se verifica quando o tribunal deixe de conhecer questões temáticas centrais suscitadas pelos litigantes - ou de que se deva conhecer oficiosamente -, cuja resolução não esteja prejudicada pela solução dada a outras, não se considerando como tal os argumentos, motivos ou razões jurídicas invocados, até porque o juiz não está sujeito às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito.
Por outro lado, só será nula a decisão quando os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível.
Ora, da leitura da sentença proferida resulta claramente que a 1.ª instância especificou os factos dados como provados e não provados, e motivou a sua convicção, tendo feito a análise crítica e conjugada da prova produzida e constante dos autos, discorrendo sobre as razões que conduziram à decisão. Ademais, não vislumbramos qualquer contradição real entre os fundamentos e a decisão, ou seja, não existe qualquer quebra no raciocínio lógico por parte da 1ª instância, tendo esta, com base nas premissas de que parte, retirado a conclusão lógica que, com base no seu raciocínio, se imporia no silogismo judiciário- as nulidades de sentença apenas sancionam vícios formais, de procedimento, e não patologias que eventualmente possam ocorrer no plano do mérito da causa.
O que verdadeiramente está em causa é o julgamento de facto – na alegação da Apelante, ignorando prova bastante, assinada – confessada pelos dois acionistas detentores da Ré; Em vez disso devia ter considerado tais factos como provados, até porque o mesmo Tribunal a quo tem conhecimento da confissão da Ré, não só nos presentes autos como também e mais afincadamente no processo sucedâneo nº 1294/24....; Também Não pode o Tribunal a quo dar como provado em 23 “que os acionistas BB e CC têm vindo a efetuar suprimentos à sociedade, etc, - e o direito aplicado aos mesmos, a dirimir na impugnação da matéria de facto e na decisão de direito. As alegadas nulidades baseiam-se, no essencial, na discordância da recorrente quanto à decisão.
Improcede, pois, a 1.ª conclusão.
Diz, desde logo, a Apelada, na sua resposta:
1. Vem a Ré/Recorrida apresentar contra-alegações ao Recurso interposto pela Autora/Recorrente, da decisão do tribunal a quo pela qual deu como totalmente improcedente a ação intentada pela qual se pede a nulidade/anulabilidade das deliberações tomadas na assembleia de 14/06/2023 plasmadas na ata 91.
2. Alegações essas com conclusões, que para a recorrida são inexistentes, atento o facto de se perderam em 97 artigos, alguns com página e meia e com transcrições!!
3. O que, salvo melhor opinião, não merecem, sequer o convite de concisão. E porque em nada foram cumpridos os deveres, desde logo, quanto ao recurso da matéria de facto, que cabiam à recorrente.
A norma do art.º 639.º, n.º 1, impõe ao recorrente o ónus de formular conclusões, sancionando o incumprimento desse ónus com o indeferimento do requerimento de interposição do recurso - art.º 641, n.º 2, alínea b) -, sendo que, ainda que as alegações do presente recurso contenham formalmente uma parte ou segmento que ali se designou por conclusões, poderemos afirmar que elas, pela sua extensão, não cumprem, minimamente, aquele que, conforme previsto na lei, deveria o seu objectivo.
No entanto, não obstante, serem excessivas e confusas, pensamos não poder afirmar-se que não há conclusões para o efeito de indeferir/rejeitar o recurso nos termos previstos na alínea b) do n.º 2 do citado art.º 641.º, tal como foi já decido no processo 1294/24.... (ainda não publicado).
Como aí se escreve:
“Aquilo que conduz à imediata rejeição do recurso, nos termos da citada disposição legal, é a falta, em absoluto, de quaisquer conclusões; se o recorrente formula aquilo que designa por conclusões, os vícios de que elas padeçam (seja por excesso, deficiência, obscuridade ou complexidade) apenas poderão determinar, nos termos previstos no n.º 3 do citado art.º 639.º, o convite ao recorrente para que proceda à correcção desses vícios e só a omissão dessa correcção poderá vir a determinar a não apreciação do recurso na parte afectada1.
Não havendo, portanto, razões para rejeitar o recurso, também nos parece desnecessário formular qualquer convite à Recorrente para corrigir as conclusões, uma vez que, não obstante as deficiências apontadas, é possível, apesar de tudo – ainda com maior dificuldade –, identificar as questões suscitadas e o objecto do recurso”.
2.3.1 - A 1.ª instância alinhavou, assim, a sua matéria de facto:
Com interesse para a boa decisão da causa, provaram-se os seguintes factos:
1. A ré, A..., S.A., é uma sociedade comercial que tem por objeto a indústria, o comércio de equipamentos diversos, outros bens móveis e imóveis, direitos e serviços, importação e exportação.
2. Atualmente a Ré é detentora de um capital social de €93.750,00 (noventa e três mil setecentos e cinquenta euros), representado por 18750 ações nominativas, titulado da seguinte forma:
- O acionista BB, casado com EE, no regime de comunhão de adquiridos, é titular de 6.250 ações nominativas, no valor de €31.250,00 (trinta e um mil duzentos e cinquenta euros);
- o acionista CC, divorciado, é titular de 6.250 ações nominativas, no valor de €31.250,00 (trinta e um mil duzentos e cinquenta euros);
- e a acionista AA, casada com FF, no regime de comunhão de adquiridos, é titular de 6.250 ações nominativas, no valor de €31.250,00 (trinta e um mil duzentos e cinquenta euros).
3. A ré tem como administrador único o acionista BB, e como fiscal único, o ROC DD.
4. A Autora foi administradora da Ré durante o exercício de 2014 e até 2015.
5. No dia 17 de fevereiro de 2023, teve lugar uma Assembleia Geral da ré com a seguinte ordem de trabalhos:
“1º Discussão e votação sobre a viabilidade de efetuar um aumento de capital em montante a definir em Assembleia, por entradas de capital dos acionistas que permitam resolver com urgência a elevada falta de liquidez e a atual situação de capitais próprios negativos da sociedade;
2º Discussão e votação sobre a viabilidade de injeção de capital na sociedade por via de empréstimos dos acionistas que permitam resolver com urgência a elevada falta de liquidez da sociedade.
3º Discussão e votação sobre a viabilidade de venda de património imobiliário da sociedade aos acionistas e/ou as sociedades que os últimos participem, que possibilite encaixar de capital que permita resolver com urgência a elevada falta de liquidez e atenuar a situação de capitais próprios negativos da sociedade;
4º Deliberar sobre o Relatório de Gestão e Contas dos períodos findos em 31 de dezembro de 2014, 2015, 2016, 2017, 2019, 2019, 2020 e 2021; e
5º Deliberar sobre as propostas de aplicação dos resultados apresentadas pela gerência referente aos períodos findos em 31 de dezembro de 2014, 2015, 2016, 2017, 2018, 2019, 2020 e 2021.”
6. O Fiscal Único emitiu relatórios de certificação legal de contas relativos aos exercícios de 2014 a 2021, todos datados de Outubro de 2022, com escusa de opinião, declarando: “Não emitimos uma opinião sobre as demonstrações financeiras anexas. Devido à relevância da matéria referida na secção “Bases para a escusa de opinião”, não obtivemos prova de auditoria suficiente e apropriada que nos proporcionasse uma base para emitirmos uma opinião sobre as demonstrações financeiras anexas.”
7. Foram aprovados por maioria de 2/3 dos votos, pertencentes aos acionistas BB e CC, as contas dos 8 exercícios, isto é o ponto 4 e 5 da ordem de trabalhos, tendo a acionista aqui autora votado contra.
8. Na Assembleia Geral de 17/2/2023, a aqui autora emitiu a seguinte declaração que ficou a constar da ata respetiva: “a falta de apresentação atempada dos exercícios de 2014 a 2021, a incompletude, a falta de rigor e transparência na elaboração das contas incluindo a incompatibilidade de funções e conflito de interesse enquanto administrador único e técnica de contas certificado entre 2014 e 2018 inclusive; a recusa intencional de prestação de informação devida nos termos da lei à acionista, de forma completa, verdadeira e elucidativa; a prática de atos de gestão danosos e prejudiciais aos interesses patrimoniais da sociedade, e dos acionistas, nomeadamente a favor de outras sociedades de que é socio; a falta de prossecução de atividade da sociedade desde 2014, deixando de comprar e vender imóveis que é o objeto; o reconhecimento da existência de custos correntes da sociedade sem rentabilizar os imóveis da mesma, nomeadamente através de arrendamentos, antes os dando a utilização gratuita a empresa de que é gerente e que por via indireta detém a maioria com o acionista CC; outros comportamentos lesivos de interesses da sociedade e da acionista minoritária evidenciam a total falta de condições para continuar a exercer as funções de administrador com violação grave dos seus deveres de lealdade, de diligencia e de cuidado enquanto administrador, assim, exprimo o meu voto de total desconfiança em relação à administração e gestão do Administrador Único, BB considerando que não pode continuar a exercer as funções, votando por isso, na sua destituição por justa causa.”
9. A Autora intentou uma ação de anulação ou declaração de nulidade de deliberações sociais, que corre seus termos no Tribunal Judicial da Comarca de Viseu, juízo de comércio, J... com o processo nº1294/23.....
10. Na ação referida em 9 invocou como fundamento da nulidade/anulabilidade, entre outros, a falta de prestação de informação preparatória solicitada, para essa assembleia.
11. A Conservatória do Registo Comercial recusou o registo definitivo da destituição do administrador da Ré, BB, com base na ata referida em 8, o qual havia sido promovido pela Autora.
*
12. Mediante publicação no SITE “Publicações de Atos Societários e de outras entidades” o presidente da mesa da Assembleia publicou no dia 11 de maio de 2023, convocatória, embora esta datada de 09 de maio de 2023 para assembleia geral a realizar no dia 14 de junho de 2023 pelas 09:30, com a seguinte ordem de trabalhos:
“1º Deliberar sobre Relatório de Gestão e Contas de período findo em 31 de dezembro de 2022;
2º Deliberar sobre a proposta de aplicação de resultado apresentadas pela administração referente ao período findo em 31 de dezembro de 2022;
3º Proceder à apreciação geral da administração e fiscalização;”
13. Na convocatória de 9 de maio de 2023 publicada a 11 de maio de 2023 não consta que a documentação societária estaria à disposição dos acionistas, e onde;
14. No dia 14 de Junho de 2023 teve lugar assembleia geral da Ré na qual estiveram presentes os acionistas CC e BB, os quais votaram favoravelmente o ponto 1º e 2º. Quanto ao 3º ponto votaram ambos os acionistas um voto de confiança no que diz respeito ao Fiscal único, e o acionista não administrador emitiu um votou de confiança no que diz respeito ao administrador único
15. O Fiscal Único emitiu em relatório de certificação legal de contas relativo ao exercício de 2022 com escusa de opinião, declarando: “Não emitimos uma opinião sobre as demonstrações financeiras anexas. Devido à relevância da matéria referida na secção “Bases para a escusa de opinião”, não obtivemos prova de auditoria suficiente e apropriada que nos proporcionasse uma base para emitirmos uma opinião sobre as demonstrações financeiras anexas.”
16. O Fiscal único emitiu também o seguinte “Parecer: Face ao exposto e tendo em atenção que a Certificação Legal das Contas foi emitida com escusa de opinião, submetemos à Assembleia–geral os documentos de prestação de contas acima mencionados, os quais, no seu conjunto, proporcionam toda a informação para a necessária deliberação sobre as contas apresentadas pelo Administrador Único”
17. O administrador da Ré, BB, relatou a gestão do exercício de 2022 em carta dirigida ao fiscal único, DD, datada de 13 de Abril de 2022 (sic).
18. Este relato foi efetuado através de uma minuta utilizada em anos anteriores.
19. Nesta se refere que “Presentemente não temos conhecimento de que se encontre a decorrer qualquer processo judicial instaurado pela ou contra a Entidade” e ainda que “(…) não temos projetos ou intenções que possam por em causa a continuidade das operações da Entidade, pois considero que os acionistas dotaram a Entidade de meios financeiros necessários e suficientes para a manter em atividade”.
20. Na data em que foi redigida a carta referida em 17 (13 de Abril de 2023), existiam pendentes os seguintes processos, em que é parte a Ré A..., SA: Processo nº1049/21....; Processo nº4374/21....; e Processo nº5416/22.....
21. Os processos referidos reportam-se a questões societárias e foram instaurados pela acionista AA, ora Autora.
22. O administrador único já referiu em várias assembleias gerais que a sociedade Ré tem problemas de liquidez e que é urgente a injeção de capital (€300.000,00 (trezentos mil euros) (cfr. Ata 89) e posteriormente (cfr. ata 90) apenas €1.500,00 (mil e quinhentos euros).
23. Os acionistas BB e CC têm vindo a efetuar suprimentos à sociedade.
24. No exercício de 2022 a sociedade Ré apresentou um resultado líquido negativo de €41.528,00.
Daqueles com interesse para a boa decisão da causa, não se provaram os seguintes factos:
- Por deliberação tomada na assembleia geral de 17 de fevereiro de 2023 que deu origem à ata 89, o administrador único da Ré, A... S.A., BB, foi destituído com fundamento em justa causa.
- Tal facto foi objeto de registo na Conservatória do Registo Comercial.
- Até à data não foram remetidos à Autora os documentos de prestação de contas.
- A insuficiência de informação vem já desde, pelo menos, 2014.
- A Autora não tinha, nem tem, interesse num efetivo esclarecimento de qualquer questão concreta relativamente a atos ou omissões da administração da Ré, quer apenas passar a imagem de que a informação lhe é vedada.
- O adiamento na aprovação das contas foi deliberado em 2019 e contou com o voto favorável da Autora.
- Em 2019 a Autora entendia que a aprovação de contas dos exercícios de 2014 a 2018 deveria ser adiada.
- A Autora traçou as diretrizes para o registo contabilísticos dos valores que transitam desde 2013 até hoje, sem informação suficiente.
2.3.2- Da norma do artigo 421.º;
Escreve a Apelante que “(t)ambém conhecia o TRIBUNAL a quo, com prova abundante no processo contemporâneo nº 1294/24...., valorado nos termos do art.º 421 CPC, que a RE se recusa a prestar informação em que a própria Ré confessou ainda mais REPETIDAMENTE em audiência de julgamento de 14/2/24 que a autora não tem que ter a informação que pede! Portanto O BB em declarações de parte enquanto representante da Ré, prestadas a 14/02/2024 e gravadas em Habilus: às 09:54:19 até 10:10:09, declarou: (…)”.
Esclarece tal norma que os depoimentos e perícias produzidos num processo com audiência contraditória da parte podem ser invocados noutro processo contra a mesma parte, sem prejuízo do disposto no n.º 3 do artigo 355.º do Código Civil; se, porém, o regime de produção da prova do primeiro processo oferecer às partes garantias inferiores às do segundo, os depoimentos e perícias produzidos no primeiro só valem no segundo como princípio de prova - os factos relativos a processos judiciais apenas podem ser provados por documento escrito, designadamente certidão judicial, nos termos dos artigos 170.º e 568.º al. d) do Código de Processo Civil e 354.º al. a) e 364.º do Código Civil/assim decidiu o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 14.11.2006, processo n.º 1998/2006-7, pesquisável em www.dgsi.pt.
Como escreve a Apelada, nestes autos e nas suas contra-alegações:
“4. A Recorrente recorreu também da sentença proferida no processo 1294/23...., no qual era apreciada a ata 89, respeitante à assembleia de 17/02/2023, onde se aprovaram as contas e aplicação de resultados dos exercícios de 2014 a 2021, aguardando-se a decisão do recurso.
5. A Recorrente considerou erradamente decidida a matéria de facto dada como provada nos art.ºs 3.º, 4.º, 17.º, 23.º e 24.º.
6. Devendo dar-se como provada, no entender da Recorrente, a matéria de facto “a Ré não prestou a informação preparatória à Autora para a Assembleia geral” e “a insuficiência da informação já vem desde pelo menos 2014”.
7. Para tal alteração à matéria de facto a Recorrente remete para prova produzida no processo 1294/23.... (a interpretação da Recorrente da prova que ali se produziu) e documentação que foi mandada desentranhar no presente processo, meios de prova que no entender da Recorrida não podem ser apreciados no presente recurso.
8. Ora, no entender da Recorrida, da prova testemunhal, documental, das declarações das partes nada resultou que ordenasse decisão diferente ao tribunal a quo quanto à matéria de facto dada como provada e como não provada (…)
Ora, neste particular, foi proferido já acórdão (ainda não transitado) no dito processo 1294/23.... – sessão de 11.2.2025 – que negou provimento à Apelante, na qual pedia que sejam declaradas nulas e de nenhum efeito e/ou anuladas as deliberações da Ré sobre os pontos 4 e 5 da ordem de trabalhos, tomadas em Assembleia Geral de 17 de Fevereiro de 2023, de modo a não se considerarem aprovadas as contas dos exercícios de 2014, 2015, 2016, 2017, 2017, 2019, 2020 e 2021 e respectivos Relatórios de Gestão, bem como as Propostas de Aplicação de Resultados dos mesmos exercícios, tudo com as consequências legais daí decorrentes, alegando, além do mais, (que) a assembleia em questão não foi precedida da informação preparatória necessária, tendo sido recusada à Autora a prestação de um conjunto de documentos e informações que havia solicitado, incluindo a justificativa de operações financeiras e societárias e tendo sido incumprida a obrigação legal de, durante os 15 dias anteriores à data da assembleia geral, ser disponibilizada para consulta dos accionistas na sede social a informação constante das alíneas a) a e) do nº 1 do artigo 289º do CSC, uma vez que, ao tentar analisar os documentos na sede da sociedade, foi-lhe vedado o acesso a tais documentos, além de ter sido agredida pelo acionista CC (o qual lhe deu uma palmada na mão com força, quando a Autora pretendia consultar uma pasta), acabando por ser expulsa do local sem que tivesse conseguido exercer os seus direitos enquanto acionista.
Aí se decidiu:
“Em relação à primeira questão (relacionada com a junção do documento), importa dizer que é totalmente extemporânea a sua invocação neste momento, uma vez que o despacho em questão (de 06/03/2024) – onde se admitiu a junção do documento em causa (pretensamente sem tomar em consideração a oposição que a Autora/Apelante havia deduzido em relação a essa junção) – era susceptível de apelação autónoma e imediata conforme previsto no art.º 644.º, n.º 2, alínea d), do CPC. Nessas circunstâncias e não tendo sido interposto recurso, tal despacho transitou em julgado, sendo totalmente inútil a discussão da questão – que a Apelante pretende agora introduzir – referente ao facto de o Tribunal não ter considerado a oposição deduzida à junção desse documento. Era no âmbito de recurso a interpor desse despacho que tal questão podia e devia ter sido suscitada; não tendo sido interposto recurso, a decisão transitou em julgado, tornando-se, por isso, definitiva e insusceptível de qualquer alteração.
Apreciemos a segunda questão (relacionada com o levantamento do sigilo profissional).
Segundo a Apelante, o despacho em questão padece de nulidade/irregularidade, uma vez que não se pronunciou sobre o levantamento do sigilo profissional do Dr. DD que por ela havia sido requerido na audiência de 14/02/2024.
Antes de mais, importará notar que nem sequer se compreende se a Apelante pretende invocar uma nulidade do próprio despacho ou uma nulidade processual, sendo certo que se limita a dizer que o despacho está ferido de nulidade ou irregularidade sem aludir a qualquer disposição legal.
Em qualquer caso, não teria razão.
(…)
É certo que, no final da audiência de julgamento realizada em 14/02/2024, a Autora requereu ao Tribunal que determinasse a prestação de depoimento pelo Dr. DD, requerendo, em simultâneo (ainda que tal não tivesse ficado a constar da acta) o levantamento do sigilo profissional nos termos do art.º 10.º do Estatuto dos Contabilistas Certificados e é certo que o despacho de 06/03/2024 não apreciou esse requerimento.
(…)
Ora, no caso, a testemunha em questão ainda não havia invocado qualquer sigilo e, portanto, à data em que foi proferido o despacho em questão, era totalmente prematuro emitir qualquer pronúncia sobre essa matéria, sendo certo que não fazia sentido suscitar um incidente de dispensa do sigilo antes de ser recusada a prestação do depoimento com invocação desse sigilo, antes de se saber se as concretas questões que lhe iriam ser colocadas estavam ou não abrangidas pelo sigilo profissional e antes de se apurar se a recusa era (ou não) legítima.
A testemunha em questão apenas veio a prestar depoimento em 19/04/2024 e não invocou o sigilo profissional para o efeito de o recusar globalmente; a testemunha prestou declarações, respondeu às questões colocadas e, conforme se constata pela audição do respectivo registo, apenas recusou responder – com invocação do sigilo profissional – a três das questões que lhe foram colocadas.
Era, portanto, nesse momento, que se podia colocar a questão de eventual dispensa desse sigilo para o efeito de a testemunha responder às questões em causa, sendo certo, no entanto, que a Autora nada requereu nesse sentido.
(…)
Mas essa nulidade tinha-se como praticada e consumada com o encerramento da audiência de julgamento (onde a Autora se encontrava presente por intermédio da sua mandatária); com o encerramento da audiência e da produção de prova – no âmbito da qual havia ocorrido a recusa (ainda que parcial) da testemunha a depor com fundamento no sigilo profissional –, tornava-se certo que não havia sido apreciado o requerimento em que a Autora pedia o levantamento do sigilo e estava ultrapassada a fase processual própria e adequada para o efeito. A nulidade ficava, portanto, consumada e, portanto, era aí ou, quando muito, nos dez dias subsequentes, que a nulidade tinha que ser invocada, nos termos previstos no art.º 199.º do CPC. Não obstante, esse facto, a Autora deixou que a audiência fosse encerrada sem suscitar tal nulidade e sem requerer a apreciação daquela pretensão e nem sequer o fez no prazo de dez dias após esse facto; apenas o vem fazer agora – no âmbito deste recurso interposto em 30/09/2024 (vários meses depois) – de forma intempestiva e extemporânea.
De todo o modo e sem prejuízo do que se disse, não poderemos deixar de acrescentar que as questões em relação às quais a testemunha recusou a resposta com invocação do sigilo são irrelevantes para a decisão, o que, só por si, tornaria inútil e injustificado o levantamento do sigilo (aliás, a circunstância de a Autora nada ter requerido após o termo do referido depoimento não deixa de indiciar que também ela considerou irrelevante ou de pouca relevância aquela matéria; caso contrário, não deixaria de insistir pela dispensa do sigilo).
Na verdade, a testemunha invocou o sigilo e recusou a resposta nos seguintes momentos:
- Quando foi questionada sobre a razão pela qual as contas referentes aos diversos anos em causa não foram aprovadas no tempo certo;
- Quanto foi questionado em relação às dúvidas que teve quando elaborou os relatórios enquanto oficial de contas;
- Quando lhe foi perguntado há quanto tempo não passava na sede da sociedade.
Ora, não vislumbramos qual o contributo útil que a resposta a essas questões pudesse trazer para a decisão da causa onde se discute a validade da deliberação que aprovou essas contas por alegada violação do dever de informação.
Improcedem, portanto, as questões suscitadas em relação ao despacho em causa.
(…)
Em relação ao ponto 20, resulta com clareza das alegações que, na perspectiva da Apelante, ele não devia ser julgado provado, uma vez que, segundo diz, é muita a prova do contrário, sustentando, portanto, que aquilo que resulta da prova produzida é que os referidos documentos NÃO foram colocados à sua disposição.
Invoca, para o efeito:
- A confissão da Ré através do depoimento do seu legal representante BB nos excertos que identifica;
- As suas (dela Apelante) declarações de parte;
- O depoimento da testemunha GG em excertos que identifica;
- A Acta 89 (as reclamações que aí apresentou e as declarações do presidente da mesa aí efectuadas das quais se infere – alegadamente – que o mesmo reconheceu o incumprimento do direito à informação);
- A carta de 20/03/2023 (onde, alegadamente, o representante da Ré confessa que não ter de enviar determinados documentos).
Importa ter presente, em primeiro lugar, que aquilo que está em causa no ponto 20 são os documentos que foram colocados à disposição da Autora/Apelante em 14/02/2023, na sede da Ré. Assim, o que está em apreciação – por via da impugnação do citado ponto de facto – é saber se nessa data e nesse local foram ou não colocados à disposição da Autora os documentos ali referidos (documentos contabilísticos e de suporte), sem que releve aqui apurar (porque isso já não se prende com o facto em análise) se a Autora chegou ou não a ver e consultar tais documentos.
Ora, sendo inquestionável (porque isso resulta com clareza de toda a prova produzida) que, nesse dia e local, foram disponibilizados documentos à Autora (a própria Autora reconheceu, no seu depoimento – o que foi confirmado pela testemunha GG – que estavam lá uma série de pastas em diversos sacos), o que importa saber é se foram disponibilizados todos os documentos em causa. É apenas neste sentido que pode ser entendida a impugnação deduzida pela Autora em relação ao citado ponto de facto.
Segundo declarou o legal representante da Ré (BB), nesse dia e local foi colocada à disposição da Autora toda a documentação da empresa referente aos anos que estavam em causa (2014 a 2021), designadamente os documentos de suporte ou comprovativos (facturas, recibos...) das despesas que constavam das demonstrações de resultado. Tais declarações foram confirmadas pela testemunha (também accionista da Ré) CC, declarando que naquelas pastas (que tinham ido buscar à contabilidade) estavam todos os documentos da empresa, incluindo os extractos bancários e os documentos de suporte referentes aos anos em causa (não apenas os referentes aos últimos três anos, mas toda a documentação dos anos de 2014 a 2021).
Ora, a verdade é que nem a Autora nem a testemunha GG evidenciaram qualquer conhecimento bastante para negar esse facto, uma vez que, conforme resulta dos seus depoimentos, a consulta da documentação foi interrompida pelo episódio referido no ponto 21 e subsequente intervenção da PSP e não foi retomada. A Autora e a referida testemunha não sabem, portanto, qual era a documentação que ali se encontrava e que, de início, foi colocada à sua disposição e, portanto, não estavam em condições de afirmar – como, de facto, não afirmaram – que não se encontrasse ali toda a documentação referente aos anos em causa.
Assim, ao contrário do que diz a Apelante, não há prova de que os documentos em causa não tenham sido colocados à sua disposição naquele momento e local, importando notar que, ao contrário do que parece pretender a Autora, o que está em causa no citado ponto é apenas o facto de os documentos terem sido colocados à sua disposição; a questão de saber se os consultou ou não e se os mesmos lhe foram ou não enviados correspondem a factos diferentes que excedem o âmbito daquilo que se julgou provado no citado 20 cuja impugnação estamos a analisar.
Tendo em conta o que se disse, importa referir que:
Para efeitos de alteração do citado ponto 20, não releva a pretensa confissão da Ré que a Apelante pretende retirar da circunstância de o seu legal representante ter declarado que a Autora não tem – nem que ter – acesso livre às instalações da empresa e que a Autora não tem que ter acesso a toda os documentos da empresa, porque, independentemente daquilo que o legal representante da Ré entende serem os direitos legais da Autora em relação à documentação, o que ele declarou com referência à matéria que estamos a analisar é que, no momento e local mencionados (14/02/2023 nas instalações da Ré), foram colocados à sua disposição (para que os consultasse) todos os documentos referentes aos anos em causa, declarando que ela teve acesso a mais do que a lei lhe permite porque lhe permitiu que “vasculhasse” todos os documentos da empresa; o que resulta deste depoimento é, portanto, a confirmação de que, naquele momento e local (a que se reporta o ponto 20), foram colocados à disposição da Autora todos os documentos contabilísticos e de suporte referentes aos anos de 2014 a 2021;
Para efeitos de alteração do citado ponto de facto, são também irrelevantes o depoimento da testemunha GG e o depoimento da Apelante, uma vez que, pelas razões acima mencionadas, não chegaram a ver toda a documentação que ali se encontrava e, portanto, não estavam em condições de afirmar que não estava lá toda a documentação referente aos anos em causa;
Para os efeitos referidos, é também irrelevante o teor da acta 89, as reclamações aí efectuadas pela Apelante e as declarações do presidente da mesa porque nada disso se reporta à concreta documentação que foi disponibilizada à Autora para consulta nas instalações da sociedade da Ré no dia mencionado, importando notar que o Presidente da Mesa não estava presente no momento e local a que se reporta o ponto de facto em análise e, portanto, não poderia saber qual a concreta documentação que aí foi disponibilizada à Autora;
Para efeitos de alteração do citado ponto 20, é também irrelevante a carta de 20/03/2023 (posterior à assembleia onde foram tomadas as deliberações cuja validade está em apreciação nos presentes autos) porque, ainda que essa carta possa envolver – como sustenta a Apelante – um eventual reconhecimento de que determinados documentos não haviam sido enviados à Autora antes da assembleia em causa nos autos (seja porque, através dela, se enviam documentos que já haviam sido pedidos pela Autora anteriormente e que supostamente seriam necessários para a assembleia anterior ou seja porque se recusa o envio de determinados documentos com a alegação de que a Autora apenas tem direito à informação referente aos últimos três anos), isso não interfere com o ponto 20 que estamos a analisar, tendo em conta que uma coisa é o “envio” de documentos – a que o legal representante não se sente obrigado por lei – e outra coisa é a disponibilização de documentos para consulta na sede ou instalações da sociedade e, em relação a esta disponibilização para consulta nas instalações da sociedade (único facto que está aqui em causa), o que o legal representante declarou em audiência é que foram disponibilizados todos os documentos referentes aos anos de 2014 a 2021.
Entendemos, portanto, não haver razões que justifiquem qualquer alteração ao citado ponto 20.
Deixamos ainda, a propósito, a seguinte NOTA: lendo as extensas (e confusas) alegações – com alusão a inúmeros factos, meios probatórios e considerações e ilações deles retiradas – fica a ideia de que a Apelante pretenderia, na verdade, que se julgassem provados outros factos (que entende terem resultado da prova produzida). Mas, se era essa a sua intenção, a verdade é que não o disse e não cabe, naturalmente, ao Tribunal fazer suposições a propósito de eventuais factos que a Apelante pretendesse ver incluídos na matéria de facto. Em conformidade com o disposto no art.º 640.º do CPC e em cumprimento dos ónus que aí são impostos ao recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto, cabia à Apelante delimitar e identificar os concretos factos aos quais dirige a impugnação que vem deduzir, identificando os factos que, na sua perspectiva, deveriam merecer decisão diferente daquela que foi proferida em 1.ª instância, seja porque foram julgados provados e não deviam ter sido ou seja porque devem ser julgados provados sem que o tivessem sido. Ora, a impugnação que a Apelante declara deduzir não se dirige a quaisquer outros factos que entenda deverem julgados provados; a impugnação que declarou deduzir foi apenas dirigida ao ponto 20 (sustentando que ele não deve ser julgado provado) e, em relação a este especifico ponto de facto (e à concreta matéria que nele se contém), entendemos, pelas razões apontadas, que não se justifica a sua alteração.
Ponto 24
No citado ponto de facto, julgou-se provado o seguinte:
24. Na assembleia referida em 4 a Autora insistiu que não tinha recebido os seguintes documentos: Relatórios de gestão de 2016 a 2021 (com exclusão de 2018, 2019 e 2020), as contas de exercício de 2019 a 2021, balancete final de 2015, 2019 e 2021, Balanço de 2015 e 2016, existência de 2014, 2015, 2016, 2017, 2018, 2019, 2020, 2021, Modelo 22 de 2021, Relatório de contas de 2019, 2020 e 2021; DRP 2018, sendo que o administrador ripostou que tal documentação lhe foi integralmente facultada.
Sustenta a Apelante que mal andou o Tribunal quando julgou provado o facto em questão, uma vez que resulta o oposto da acta da assembleia em causa. Com efeito – diz – o que resulta da acta é: que a resposta do administrador é que as informações estão no IES e na demonstração dos resultados; que o administrador se incumbiu remeter a informação societária solicitada, a 20 de março de 2023; que mesmo a 20 de Março de 2023 o administrador se recusou a facultar a informação e os esclarecimentos e que, em audiência de julgamento, a Ré confessou que a Acionista não tem direito a ver aquela documentação.
Ora, salvo o devido respeito, o que resulta da acta é que, na sequência da referida afirmação da Autora (onde afirmou não ter recebido os documentos ali referidos), o Administrador referiu que toda essa informação lhe havia sido facultada (o que foi confirmado pelo accionista CC quando pediu a palavra para dizer que, aquando da consulta do dia 14, todos os documentos solicitados foram facultados). Assim, tendo em conta que o citado ponto de facto apenas se reporta ao que foi dito em acta e tendo em conta que ele reflecte aquilo que, de facto, ali foi dito e declarado, nenhuma alteração se impõe efectuar.
NOTA:
Ainda no que toca à matéria de facto, importa deixar uma última nota.
Nas páginas 61 a 80 do corpo das alegações e nas conclusões 63 a 88 (páginas 114 a 122), a Apelante faz transcrições extensas dos depoimentos das testemunhas DD e CC, pondo em causa a sua credibilidade, dizendo que o tribunal não pode considerar que essas testemunhas depuseram com isenção e objectividade, dizendo, no que toca à testemunha CC, que está de relações cortadas com a Autora, que a agrediu, que é administrador de facto da Ré e que, além do mais, foi instruído pela respectiva mandatária, aludindo, a propósito, a situação ocorrida durante a audiência de 14/02/2024 relacionada com o auto da PSP que estava na posse da testemunha e que veio depois a ser junto aos autos.
Não se percebe, contudo, qual o real propósito dessas considerações e da transcrição desses depoimentos, sendo que, aparentemente, a única conclusão que daí é extraída pela Apelante (cfr. conclusão 89) é: “Impunha-se, ao Tribunal a quo atentos os meios probatórios que proferisse decisão diversa da recorrida quanto à questão da VIOLAÇÃO do Direito à informação”.
Ora, os elementos probatórios – designadamente os depoimentos das testemunhas – apenas relevam para efeitos de fixação da matéria de facto e, portanto, a invocação desses depoimentos e da sua falta de credibilidade apenas relevaria para efeitos de impugnação e eventual alteração dessa decisão (da matéria de facto), recaindo sobre o recorrente o ónus de indicar os concretos pontos de facto que, por via da alegada falta de credibilidade desses depoimentos, pretende ver alterados, com indicação da decisão que, no seu entender, sobre eles deve ser proferida (cfr. citado art.º 640.º). Sucede que a Apelante não relacionou esses depoimentos (ou a sua falta de credibilidade) com qualquer ponto de facto que pretendesse ver alterado (além daqueles que já apreciámos), sendo certo que não identifica nenhum ponto de facto que tivesse sido julgado provado com base nesses depoimentos e que, por força da sua falta de credibilidade, não devesse ser julgado provado e também não identifica – de modo expresso e claro – qualquer facto concreto que devesse ter sido julgado provado com base nas considerações que faz a propósito desses depoimentos.
Os únicos pontos de facto que é possível identificar como impugnados pela Apelante (ainda que nem sempre correctamente e com cumprimento dos ónus legais) são os supra indicados (pontos 10, 11, 12, 15, 20, 22, 23 e 24) e esses já foram apreciados. Nada mais se impõe apreciar, porquanto – reafirma-se – a Apelante não indicou qualquer outro ponto de facto concreto que pretendesse impugnar e em relação ao qual pugnasse pela alteração da decisão que sobre ele havia sido proferida
Improcede, pois, esta conclusão.
2.3.3- Da assentada;
Diz a Apelante:
“22. Porém, ao contrário do que se impunha o Tribunal a quo, não procedeu à assentada, nos termos do art.º 463 nº 1, do CPC, e não reduziu a escrito, nem nos presentes autos nem no processo contemporâneo nº 1294/23.... na parte em que houve confissão do depoente ou que este narre factos ou circunstâncias que impliquem indivisibilidade da declaração confessória; 23. O QUE ao abrigo do art.º 195º nº 1 do CPC, constitui uma nulidade por omissão de um ato ou de uma formalidade que a lei prescreva!”
Sem razão.
Tal omissão constitui uma nulidade procedimental, consistente na omissão de um acto que a lei prescreve e que poderia ter influência no exame e decisão da causa – artº 195º. Estando a Apelante presente aquando da prática do acto em sede de audiência de julgamento, deveria ele tê-la arguido imediatamente, antes de finda esta diligência – art.º 199.º do CPC. Não o tendo feito, a nulidade ficou sanada, e dela não se podendo retirar qualquer relevância probatória para a confissão, nomeadamente deverem ter-se plenamente por provados os factos desfavoráveis para o depoente – art.ºs 352º e 358º nº1 do C. Civil.
Atenta a diversidade de factos que as declarações de parte podem abranger, o artigo 466.º, n.º 3 estabelece que estas serão livremente apreciadas pelo tribunal na parte em que não representem confissão, significando que a parte do depoimento, ou dos esclarecimentos do sujeito processual, que não assumam a natureza de confissão, com a amplitude referida, não tem que ser reduzida a escrito por não ser prova tarifada. Porém, tal como já resultava do disposto no artigo 563.º, n.º 1, do regime pretérito, o actual artigo 463.º, n.º 1, continua a impor a redução a escrito da confissão do depoente, que pode ocorrer tanto em depoimento como em declarações de parte, bem como em prestação de informações ou esclarecimentos ao tribunal.
A desconsideração da formalidade da assentada na acta da audiência de discussão e julgamento implica que a declaração confessória da parte, mesmo que se encontre gravada, ao invés de ter o valor probatório de prova plena contra o confitente, que lhe atribui o n.º 1 do artigo 358.º do CC, passa a ser livremente apreciada pelo tribunal, nos termos do n.º 4 do mesmo normativo e ainda do artigo 361.º da mesma codificação, que rege sobre o valor do reconhecimento não confessório de factos desfavoráveis.
Mais, os recursos apenas visam a reapreciação ou reponderação da decisão de questões oportunamente suscitadas, salvo quando se trate de questões de conhecimento oficioso - Vide, por todos, o acórdão do STJ de 15 de Dezembro de 2022 (processo n.º 125/20.6T8TND.C1-A.S1) pesquisável em www.dgsi.pt.
Dito de outra forma, os recursos destinam-se à apreciação de questões já antes levantadas e decididas no processo e não a provocar decisões sobre questões que antes não foram submetidas ao contraditório e decididas pelo Tribunal recorrido. As questões a apreciar em sede de recurso devem circunscrever-se às questões que já tenham sido submetidas ao Tribunal de categoria inferior e aos fundamentos em que a sentença se alicerçou e que resultaram da prova produzida e carreada para os autos, salvo, naturalmente, as questões de conhecimento oficioso, desde que o processo contenha os elementos imprescindíveis ao seu conhecimento” - cfr. José Lebre de Freitas e Ribeiro Mendes, CPC Anotado, Vol. III., Tomo 1, 2ª Ed., Coimbra Editora, pág. 8.), pelo que, nos acertados dizeres do acórdão do STJ de 17.11.2016 (proferido no processo 861/13.3TTVIS.C1.S2, disponível em www.dgsi.pt).
Improcede, pois, a alegação.
*
2.3.4- Da impugnação;
(…).
Mantendo-se a matéria de facto fixada na 1.ª instância, remetemos para a decisão proferida no Juízo de Comércio de Viseu - Juiz ..., que aqui reproduzimos:
“- A destituição do administrador único na AG de 17-02-2023 e as consequências para a deliberação que aprovou o relatório de gestão e as contas do exercício de 2022 por aquele elaboradas e apresentadas.
- A regra da continuidade dos exercícios e sua relação com a falta de aprovação das contas dos anos anteriores.
- O incumprimento das regras de elaboração do relatório de gestão e a anulabilidade da deliberação que o aprovou.
- A violação pelo Fiscal Único dos seus deveres funcionais e sua repercussão nas deliberações tomadas na AG de 14-06-2023.
- O voto abusivo dos acionistas BB e CC.
O enquadramento jurídico.
As deliberações sociais são decisões juridicamente imputáveis à sociedade porquanto tomadas pelo órgão social de formação da vontade. “… as deliberações dos sócios são, em regra, negócios jurídicos: actos jurídicos constituídos por uma ou mais declarações de vontade (votos), com vista à produção de certos efeitos sancionados pela ordem jurídica.”- Jorge Manuel Coutinho de Abreu, in Curso de Direito Comercial, Volume II, pag. 241, 4ª Edição.
As deliberações ilegais ou anti-estatutárias podem ser eliminadas ex tunc através da acção de anulação de deliberações sociais, proposta nos termos dos artigos 59º e 60º do Código das Sociedade Comerciais.
A Ré A..., S.A. é uma sociedade anónima que, em assembleia geral convocada, deliberou aprovar os pontos da ordem de trabalhos constantes da convocatória (ponto 12 dos factos provados), deliberando aprovar os 3 pontos da ordem de trabalhos nos termos constantes do ponto 14 dos factos provados.
A Autora, enquanto sócia da Ré, detentora de uma participação social de 33,33% do capital social, não tendo participado na assembleia geral, veio propor a presente ação de anulação das deliberações aí tomadas. A Autora tem legitimidade para o efeito, atento o disposto no art. 59º, nº1 do C.S.C.
*
A Autora entende que são nulas/anuláveis as deliberações tomadas na assembleia geral ordinária da Ré A..., S.A. de 14 de Junho de 2023 que aprovaram todos os pontos da ordem de trabalhos.
A Ré A..., S.A. é uma sociedade comercial que adotou o tipo de anónima (art. 1º, nº2 do Código das Sociedades Comerciais - diploma a que nos referiremos de ora em diante sempre que não for mencionada a origem do preceito citado), com uma estrutura tradicional de administração (art. 278º, nº1, al. a) que é composta apenas por um administrador (art. 390º, nº2 e ponto 3 dos factos provados), e por um fiscal único (art. 413º, nº1, al. a) e ponto 3 dos factos provados).
A Autora é acionista da Ré com direito de voto, sendo a sua participação social superior a 1% do capital social.
“A estrutura das sociedades anónimas comporta normalmente a potencial intervenção da generalidade dos accionistas na vida social, através de deliberações, de ordinário tomadas em assembleia, para a formação das quais aqueles concorrem mediante o exercício do seu direito de voto, sendo o peso relativo do poder de voto dos accionistas computado em proporção do valor nominal das respetivas acções. Tais deliberações, nas legislações modernas, não respeitam, em princípio, à gestão empresarial (cf. o a. 373º, 3 do nosso Cod.. das Sociedades Comerciais), mas sim à apreciação anual da situação da sociedade (e em princípio das contas de exercício) e à aplicação dos resultados obtidos, bem como à designação directa ou indirecta, do órgão gestor e à eventual alteração dos estatutos.” - Vasco da Gama Lobo Xavier, in Polis Enciclopédia Verbo da Sociedade e do Estado, Vol. 5, pag. 922 e 923.
Com efeito, o nº2 do art. 373º estabelece que “Os acionistas deliberam sobre as matérias que lhes são especialmente atribuídas por lei.” J.M. Coutinho de Abreu in Código das Sociedades Comerciais em Comentário, Vol VI, pag. 17 a 19, identifica quatro tipos de competências deliberativas dos sócios, atribuídas por lei e de natureza imperativa: as estruturais ou estratégicas; as eletivas; de gestão; e de controlo.
A aprovação anual das contas (matéria relativa ao controlo da sociedade) é da competência exclusiva da assembleia geral dos acionistas (art. 376º, nº1). É, todavia, dever do órgão de administração, no caso do administrador único, “pedir a convocação da assembleia geral referida no número anterior e apresentar as propostas e documentação necessárias para que as deliberações sejam tomadas.” – art. 376º, nº4.
A Autora alega, desde logo, que a sociedade não tinha constituído, à data da elaboração dos documentos a apresentar à assembleia geral anual de aprovação de contas, órgão de administração, porquanto o seu administrador único havia sido destituído em assembleia geral datada de 17 de Fevereiro de 2023.
Vejamos.
De acordo com o ponto 8 dos factos provados a acionista AA pediu a palavra na assembleia geral de 17 de Fevereiro de 2023 tendo declarado: “… ; e outros comportamentos lesivos de interesses da sociedade e da acionista minoritária evidenciam a total falta de condições para continuar a exercer funções de administrador com violação grave dos seus deveres de lealdade, de diligência e de cuidado enquanto administrador,. Assim, exprimo o meu voto de total desconfiança em relação á administração e gestão do Administrador único, BB considerando que não pode continuar a exercer as funções, votando por isso, na sua destituição por justa causa. O presidente da Assembleia dá por encerrada a sessão …”
As deliberações de destituição de órgãos sociais são factos sujeitos a registo (art. 3º, nº1, al. m) do Código do Registo Comercial). A Conservatória do Registo Comercial recusou o registo definitivo da destituição do administrador da Ré, BB, o qual fora promovido pela Autora. Isto por existirem dúvidas acerca da existência da própria deliberação social, as quais não eram suscetíveis de serem removidas apenas pela análise dos documentos apresentados e registos anteriores, e em face das disposições aplicáveis, tal como prescreve o princípio da legalidade plasmado no art. 47º do Código do Registo Comercial.
Ora, não obstante as atas constituírem apenas uma formalidade ad probationem, o certo é que a Autora não fez mais nenhuma prova no sentido de que a destituição do administrador único foi um assunto submetido a votação na assembleia geral de 17-02-2023. Com efeito, só é possível formar-se uma deliberação sobre assunto relativamente ao qual sejam chamados a pronunciarem-se os sócios. No caso, era forçoso que a Autora solicitasse ao presidente da mesa da Assembleia Geral que submetesse à votação a destituição do administrador único com justa causa. Ora, a Autora emite uma declaração e um voto sobre um assunto que não foi submetido a deliberação. Nessa medida era insuscetível de, apenas com o seu voto, formar uma deliberação imputável à coletividade dos acionistas.
Não tendo sido feito prova para lá do que consta da ata, valem as considerações efetuadas pela Sra. Conservadora do Registo Comercial que recusou o registo desse facto. Assim, o administrador único desta sociedade à data da elaboração dos documentos de prestação de contas, à data da assembleia geral de acionistas de 14-06-2023, e até à presente data, é BB, sendo este que consta nessa qualidade da certidão da matrícula comercial da Ré A..., S.A. O facto da sua nomeação como administrador único, uma vez registado, constitui presunção que essa situação existe (e esta – a nomeação - não foi posta em crise) e é oponível a terceiros (art. 11º e 14º do Código de Registo Comercial).
Assim, quem pede a convocação da assembleia geral anual para apreciação e deliberação sobre o relatório de gestão e as contas do exercício do ano de 2022; sobre a proposta de aplicação de resultados; e para apreciação geral da administração e fiscalização da sociedade. – art. 376º, nº1 - foi quem tinha competência para o fazer, o administrador único. Trata-se de uma competência imperativa. – art. 65º, nº2 in fine
Logo, não se verifica o fundamento de nulidade a que alude a al. d) do nº1 do art. 56º, e eventualmente de anulabilidade a que alude a al. a) do nº1 do art. 58º
*
A Autora alega também que, por força da regra da sequência/continuidade dos exercícios, é inadmissível aprovar as contas de um exercício quando as contas do exercício anterior não estejam ainda aprovadas.
A contabilidade assenta no pressuposto da continuidade da entidade cuja atividade se projetará no futuro. Daí que a aprovação das contas de um exercício (por regra coincidente com o ano civil) seja indispensável à preparação e apresentação das contas do exercício seguinte.
Da factualidade provada resulta, porém, que as contas dos exercícios anteriores (2014 a 2021) foram aprovadas em assembleia geral de 17-02-2023 (ponto 7 dos factos provados). A validade desta deliberação foi impugnada através de ação judicial instaurada para o efeito (ponto 9 dos factos provados). A deliberação continua, no entanto, a produzir os seus efeitos na ordem jurídica, os quais cessarão apenas com o trânsito em julgado da sentença que julgar inválidas tais deliberações.
Não se encontra, por isso, posta em causa a regra da continuidade dos exercícios.
Assim, também não se verifica o fundamento de anulabilidade a que alude o nº1 do art. 69º ou até de nulidade nos termos do nº3 do mesmo artigo.
*
A Autora entende também que as deliberações tomadas na assembleia geral de acionistas de 14-06-2023 são anuláveis, nos termos da al. a) do nº1 do art. 56º, por violação do direito à informação, a qual se vem prolongando no tempo.
Neste particular há que considerar que as deliberações tomadas dizem respeito à aprovação das contas do exercício de 2022, e a aplicação do resultado respetivo. Nada mais.
Os documentos que, no nosso caso, o administrador único tinha o dever de elaborar e apresentar à assembleia geral de acionistas, são os seguintes:
- O relatório de gestão
- O Balanço, a Demonstração dos Resultados por Naturezas e por Funções (opcional), a Demonstração de Fluxos de Caixa, e a Demonstração das Alterações no Capital Próprio, e por fim o Anexo.
No nosso caso, por se tratar de uma microentidade é possível utilizar modelos reduzidos de Demonstrações Financeiras (art. 2º da Portaria nº986/2009), sendo o modelo de Informação Empresarial Simplificada substituto válido dos documentos de Demonstrações Financeiras, designadamente, para efeitos de registo das prestações de contas (art. 2º, nº1, al. c) e 3 do D.L. nº8/2007 de 17/01)
- Os outros documentos de prestação de contas são a Certificação Legal de Contas e o Parecer do Órgão de Fiscalização.
Ora, não se demonstra, nem a Autora verdadeiramente o invoca, que esta não estivesse na posse dos documentos acima referidos.
A violação do direito à informação a que a Autora se reporta são documentos de suporte à contabilidade respeitantes a negócios concretos, alguns geradores de dívidas, e a extratos bancários, entre outros. A eventual violação deste direito à informação, tal como a Autora o configura, não torna anulável a deliberação de aprovação das contas do exercício de 2022.
Não se verifica, portanto, o fundamento de anulabilidade a que alude a al. c) do nº1 do art. 58º.
*
A Autora alega que não foram cumpridas as regras legalmente previstas para a elaboração do relatório de gestão, embora não se debruce especificamente sobre quais foram as regras violadas. Refere, porém, que nelas estão espelhadas falsas declarações.
Ao mesmo tempo, e um pouco contraditoriamente, considera que não foram sequer elaborados os relatórios de gestão, pois as cartas dirigidas ao Fiscal Único não poderão ser consideradas relatórios de gestão.
O art. 69º, nº1 prevê que “A violação dos preceitos legais relativos à elaboração do relatório de gestão, das contas do exercício e de demais documentos de prestação de contas torna anuláveis as deliberações tomadas pelos sócios.”
O relatório de gestão é um documento escrito da autoria do administrador e por ele subscrito “que tem por objeto a prestação de informação relativa à evolução dos negócios, à posição e aos resultados, ao desempenho da gestão, e à evolução futura previsível da empresa.”- José Engrácia Antunes in Direito da Contabilidade, Uma introdução, pag.113. Este documento deverá ser elaborado de acordo com as regras plasmadas no art. 66º, sendo que a sua complexidade deverá ser correspondente à complexidade da própria operação comercial da sociedade. E tanto é assim que as microentidades, tal como definidas no nº1 do artigo 9º do Decreto-Lei nº158/2009, de 13 de julho, alterado pela Lei nº20/2010, de 23 de agosto, pelo Decreto-Lei nº36-A/2011, de 9 de março, e pela Lei nº66-B/2012, de 31 de dezembro, e nº83-C/2013, de 31 de dezembro, ficam dispensadas da obrigação de elaborar o relatório de gestão. - art. 66º, nº6.
No nosso caso, trata-se de uma microentidade pelo que o seu administrador único estava dispensado de elaborar e apresentar relatório de gestão. Não obstante, existe um relato sobre a evolução do desempenho e sobre os problemas, essencialmente de ordem, financeira, com que a sociedade se debate. Não vislumbramos neste relato (cuja simplicidade corresponde a uma operação comercial incipiente) a violação das regras a que se refere a Autora. A questão das falsas declarações produzidas pelo administrador único no relato da gestão não é óbvia. O que nos parece poder dizer-se é que estas afirmações (não temos conhecimento de que se encontre a decorrer qualquer processo judicial instaurado pela ou contra a Entidade” e “(…) não temos projetos ou intenções que possam por em causa a continuidade das operações da Entidade, pois considero que os acionistas dotaram a Entidade de meios financeiros necessários e suficientes para a manter em atividades) ou estão incompletas, ou são dúbias. No primeiro caso a informação que poderia constar é a de que todas as ações pendentes se situam no domínio da relação dos acionistas com a sociedade. No segundo caso, seria mais percetível se o relator dissesse simplesmente que as necessidades de financiamento não colocam a projeção da atividade no futuro. Em qualquer dos casos, estas imprecisões não colocam em causa a fiabilidade do relatório da gestão. Não vemos, portanto, que essa irregularidade, chamemos-lhe assim, seja suficientemente relevante para se constituir em anulabilidade.
*
A Autora também alega que a falta de apresentação das contas do exercício de 2022 à assembleia geral pelo administrador único no prazo previsto no nº5 do art. 65º (três meses a contar do encerramento do exercício) é uma irregularidade que determina a anulabilidade da deliberação, nos termos do art. 69º, nº1.
O art. 69º, nº1 comina com a sanção da anulabilidade a violação das regras de elaboração do relatório de gestão, das contas do exercício e demais documentos de prestação de contas. A norma efetivamente violada no caso em apreço, é a ultrapassagem de um prazo. O administrador entra em mora pois não apresenta os documentos de prestação de contas ao órgão competente no prazo previsto na lei. Tal questão poderá, em tese, gerar uma situação de responsabilidade civil do administrador. Não afeta, contudo, a validade da deliberação que aprova as contas do exercício.
*
A autora também parece entender que a violação pelo Fiscal único dos deveres inerentes ao cargo, são suscetíveis de invalidarem as deliberações tomadas na Assembleia Geral de 14 de Junho de 2023.
Da factualidade provada não resulta que o Fiscal Único tenha violado os deveres legais a que se encontra vinculado, designadamente, o de convocar assembleia geral de acionistas para eleição de novos órgão sociais, etc.
A nosso ver a deficiente atuação do órgão de fiscalização não poderá afetar a validade das deliberações da coletividade dos sócios. O incumprimento dos deveres do órgão de fiscalização poderá apenas gerar responsabilidade civil dos seus membros perante a sociedade, os sócios, ou os credores sociais (art. 81º, nº1 e 2).
*
Quanto aos votos abusivos dos acionistas BB e CC.
A autora invoca ainda que o voto de aprovação das contas do exercício de 2022 é um voto abusivo.
Estipula a al. b) do nº1 do art. 58º do C.S.C. que “São anuláveis as deliberações que: a) …; b) Sejam apropriadas para satisfazer o propósito de um dos sócios de conseguir, através do exercício do direito de voto, vantagens especiais para si ou para terceiros em prejuízo da sociedade ou de outros sócios ou simplesmente prejudicar aquela ou estes, a menos que se prove que as deliberações teriam sido tomadas mesmo sem os votos abusivos; …”
Para concluir pelo abuso dos votos que fizeram aprovar a deliberação importa a verificação de um pressuposto subjetivo (o propósito do votante de alcançar vantagens especiais para si ou para terceiros). Este elemento exige o dolo, ao menos eventual, em que incorre o sócio que vota a deliberação, ou seja, este admite como possível que a deliberação seja apropriada a conceder uma vantagem especial a um dos sócios (ou a terceiros) e que essa vantagem cause um dano à sociedade. O mesmo sócio votante, não obstante admitir aquela possibilidade, não confia que aquela possibilidade se não concretize.
É necessário também a verificação de um pressuposto objetivo (a aptidão da deliberação para satisfazer o propósito ou que ela seja objectivamente adequada a satisfazê-lo) 3 Cfr. J.M. Coutinho de Abreu, in Curso de Direito Comercial, Vol. II, pag. 556.3.
Todavia, a deliberação só será anulável caso ela não fosse aprovada sem os votos considerados abusivos.
No caso em apreço, não resulta da factualidade provada que os votos dos acionistas CC e BB possam ser considerados abusivos.
O voto de confiança expresso na assembleia aqui em causa parte da avaliação do mérito da atuação do administrador único e do fiscal único que é efetuada pelo acionista votante com base nos seus próprios critérios. Uma avaliação de sentido contrário que, mais objetivamente, se possa fazer da atuação do órgão de administração e do de fiscalização não transforma, só por si, os votos emitidos em votos abusivos. Nem parece que os votos de confiança emitidos sejam apropriados para satisfazer o propósito dos sócios votantes de conseguir vantagens especiais para si ou para terceiros em prejuízo da sociedade ou de outros sócios ou simplesmente prejudicar aquela ou estes.
Assim deliberação não foi tomada com votos abusivos pelo que não se trata de uma deliberação anulável com esse fundamento (al. b) do nº1 do art. 58º)”.
Como se decidiu no já citado Acórdão desta Relação de Coimbra – Apelação nº 1294/23....;no qual se pede que sejam declaradas nulas e de nenhum efeito e/ou anuladas as deliberações da Ré sobre os pontos 4 e 5 da ordem de trabalhos, tomadas em Assembleia Geral de 17 de Fevereiro de 2023, de modo a não se considerarem aprovadas as contas dos exercícios de 2014, 2015, 2016, 2017, 2017, 2019, 2020 e 2021 e respectivos Relatórios de Gestão, bem como as Propostas de Aplicação de Resultados dos mesmos exercícios, tudo com as consequências legais daí decorrentes:
“Importa notar que, para efeitos de anulabilidade da deliberação, o que releva e constitui causa dessa anulabilidade é a circunstância de os documentos e informação preparatória da assembleia não terem sido colocados à efectiva disposição dos sócios/accionistas, para consulta, no local e durante o período designados na lei, sendo, para o efeito, absolutamente irrelevante o facto de o sócio/accionista não ter tomado conhecimento efectivo desses documentos e informação por ter abdicado dessa consulta.
Nessas circunstâncias, sabendo-se que, no referido dia 14/02/2023, foi colocada à disposição da Autora/Apelante um conjunto de documentação e não tendo resultado provado que tal documentação não incluísse todos os elementos que a Autora havia solicitado, não há fundamento legal para declarar a anulabilidade das deliberações que vieram a ser tomadas em assembleia geral de 17/02/2023. Ainda que a Autora não tenha tomado conhecimento efectivo de todos os elementos informativos que ali se encontravam, tal já não releva para efeitos de anulação da deliberação, na medida em que a situação ali ocorrida (totalmente inadmissível e perturbadora da calma e serenidade de quem pretende verificar e analisar documentos e informação contabilística com vista à preparação de uma assembleia geral) foi, apesar de tudo, ultrapassada e foi a Autora que entendeu, por vontade própria e ainda que já lhe tivessem garantido as condições necessárias para continuar a consulta, abandonar o local e prescindir da consulta daqueles documentos e elementos.
Não resultou, portanto, demonstrado o fundamento legal que era invocado para a anulação das deliberações em causa, ou seja, o facto de elas não terem sido precedidas do fornecimento à Autora (accionista da Ré) dos elementos mínimo de informação que eram exigidos e necessários para as concretas deliberações que ali foram tomadas.
Assim, com todo o respeito pelas razões invocadas pela Apelante, mantemos o decidido na 1.ª instância.
As conclusões (sumário):
(…).
4.Decisão
Assim, na improcedência da instância recursiva, mantemos a decisão proferida pelo Juízo de Comércio de Viseu - Juiz ....
Custas pela Apelante.
Coimbra, 25 de Fevereiro de 2025
(José Avelino Gonçalves - Relator)
(Catarina Gonçalves – 1.ª adjunta)
(Maria João Areias - 2.ª adjunta)