PRESCRIÇÃO
PACTO DE NÃO CONCORRÊNCIA
CONTRATO DE TRABALHO
Sumário

Sumário: A prescrição de créditos decorrentes da posterior violação de pacto de não concorrência não corre a partir da cessação do contrato de trabalho e nem do início daquela violação.

Texto Integral

Acordam os juízes no Tribunal da Relação de Lisboa.

I.
A) Autor, também designado por A.:  Dreammedia Portugal, SA.
Ré (designada por R.): AA  (recorrente).
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No processo principal, tendo a autora demandado pagamento de créditos laborais, a ré na contestação invocou a prescrição do crédito peticionado, alegando que a acção teria de ter sido intentada no prazo de um ano após a cessação do contrato de trabalho celebrado da ré, a qual ocorreu em 31.12.2022, sendo que a presente acção deu entrada no tribunal no dia 25.12.2023 e a ré citada a 16.01.2024.
A autora respondeu dizendo que o prazo aplicável é o prazo geral constante do art.º 309.º CC. Contudo, independentemente do prazo de prescrição em concreto, o mesmo nunca poderia começar a correr na data da cessação mas apenas se inicia depois de poder ser exercido o direito à referida indemnização, nos termos do artigo 306.º CC.
O Tribunal a quo proferiu decisão onde concluiu pela improcedência da exceção.
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Inconformada, a R. recorreu, tendo apresentado alegações e concluído:
I. Através do despacho saneador em crise o tribunal a quo julgou improcedente a exceção da prescrição do crédito da recorrida invocado pela recorrente em sede de contestação, o que esta considera juridicamente incorreto, atenta à efetiva existência de prescrição, que determinará, a final, a revogação do despacho saneador.
II. O tribunal a quo fundamentou limitadamente a sua posição, bastando-se a arguir que, uma vez que o crédito da recorrida não pode ser exigido imediatamente após a cessação do contrato de trabalho, mas apenas quando ocorrer a violação do pacto de não concorrência, então o mesmo estará sujeito ao prazo geral da prescrição, constante do Código Civil (CC), nomeadamente no que se refere ao prazo ordinário da mesma, a saber, 20 anos.
III. Considera a recorrente que uma judiciosa interpretação da lei impõe que se analisem as seguintes questões:
a) deverá o crédito de um empregador emergente da violação de um pacto de não concorrência outorgado com um trabalhador, ser considerado um crédito laboral, para efeitos do art.º 337 do Código do Trabalho (CT)?
b) sendo o mesmo um crédito laboral, deverá o mesmo estar sujeito diretamente ao art.º 337 do CT ou a lei não responde à presente questão, sendo necessário integrar a lacuna legal?
c) constatando-se que há lugar à integração de uma lacuna, deverá esta ser integrada lançando mão do art.º 337 do CT ou através do art.º 309 do Código Civil?
d) independentemente de a lacuna legal ser integrada com recurso a uma daquelas normas, deverá a prescrição contar-se, nos termos do art.º 306 do CC, isto é, a partir do momento em que o credor possa exercer o seu direito?
e) O momento a partir do qual o credor pode exercer o seu direito será o momento em que este nasce ou, diversamente, quando o credor toma conhecimento da sua existência? Deve vigorar o sistema objetivo ou subjetivo da prescrição?
IV. No entendimento da recorrente o crédito de um empregador emergente da violação de um pacto de não concorrência, e, mutatis mutandis, da recorrida, tem a natureza de crédito laboral latu sensu, na medida em que o mesmo imerge numa relação de trabalho, existe numa ambiência jus laboral e os créditos laborais abrangem todos os créditos, quer do trabalhador quer do empregador, que tenham origem naquela relação laboral.
V. Não obstante a sua natureza jus laboral, o crédito da recorrida não é susceptível de ser exigível no dia seguinte à cessação do contrato de trabalho, porquanto nessa data poderia não estar em curso uma violação do pacto de não concorrência, a qual apenas poderá ocorrer posteriormente.
VI. Nessa medida, este tipo de crédito do empregador não pode estar diretamente sujeito ao art.º 337 do CT, que não responde a esta questão, existindo uma lacuna legal, a qual pode e deve, ainda assim, ser integrada com recurso a esta norma e não através das disposições gerais do Código Civil.
VII. Sendo aplicável o art.º 337 do CT, ao crédito laboral do empregador emergente da violação do pacto de não concorrência pelo trabalhador, tal significa que o prazo de prescrição é de 1 ano.
VIII. O prazo de 1 ano deverá assim contar-se de acordo com o art.º 306 do CC, i. é, deverá contar-se a partir do momento em que o credor em condições de exercer o seu direito, e não a partir do dia seguinte ao términos da relação laboral.
IX. Tal entendimento resulta da necessidade de estabelecer um equilíbrio entre as posições das partes, não podendo o empregador ser beneficiado face ao trabalhador e vice-versa.
X. O momento a partir do qual o credor empregador poderá exercer o seu direito será aquele em que o direito de crédito se constitui e não o momento em que o credor toma conhecimento da sua existência, prevalecendo um sistema objetivo do instituto jurídico da prescrição.
XI. Considerando todo o exposto, uma vez que a recorrente cessou funções para a recorrida no dia 31/12/2022, iniciou funções para outra empresa, alegadamente da concorrência, no dia 2/01/2023, a partir dessa data começou em marcha a alegada violação do pacto de não concorrência que, a provar-se, gera um direito de crédito na esfera jurídica da recorrida.
XII. O suposto direito de crédito da recorrida nasceu a 2/01/2023 e apenas poderia ser exigida a recorrente até ao dia 1/01/2024, sob pena de, a partir dessa data, poder aquela, legitimamente, recusar-se ao seu cumprimento.
XIII. A recorrida intentou ação no dia 25/12/2023 facto que, por si só não provoca a interrupção da prescrição, a qual só ocorreria com a citação da recorrente, de acordo com o disposto no n.º 1 do art.º 323 do CC, se o prazo da prescrição ainda se encontrasse a decorrer, como era o caso.
XIV. Para garantir que a situação tivesse lugar até ao dia 1/01/2024 a recorrida teria de ter requerido a citação urgente nos termos do n.º 1 do art.º 561 do CPC e assim beneficiar da regra constante do n.º 2 do art.º 323 do código civil.
XV. Ao não requerer a citação urgente, o prazo para o exercício do seu direito de crédito continuou a decorrer e o seu direito de escrever no dia 1/01/2024, tendo a recorrente sido apenas citada no dia 16/01/2024.
XVI. Quando a recorrente foi citada o crédito da recorrida já havia prescrito, recusando-se aquela, legitimamente, ao cumprimento da prestação.
XVII. Por todo o exposto, a recorrente defende a existência da prescrição do direito de crédito da recorrida e a revogação do despacho saneador em crise, substituindo-se por outro nos termos peticionados pela recorrente no âmbito da ação de condenação contra si intentada.
Remata pedindo que seja revogado o despacho saneador proferido pelo Tribunal a quo e proferido outro que decida pela procedência da excepção peremptória enfocada pela recorrente e absolva a recorrente do pedido.
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A A. contra-alegou pedindo a improcedência do recurso e concluindo:
1. A Recorrente defende a aplicação de um regime de prescrição que não corresponde nem ao prazo geral nem a qualquer prazo espacial, procurando aproveitar aspetos de cada regime prescricional como mais lhe convém, de modo a criar um regime de prescrição novo à sua medida, sem qualquer fundamento legal nem respaldo na doutrina e na jurisprudência.
2. Não obstante o pacto de não concorrência ter uma conexão com o contrato de trabalho, os créditos emergentes de um pacto de não concorrência não advêm da violação ou cessação do contrato de trabalho, mas antes de um acordo cuja vigência começa após a cessação do contrato do trabalho.
3. Não existe lacuna legal quanto ao prazo de prescrição dos créditos emergentes do pacto de não concorrência, nos termos do n.º 1 do artigo 10.º do Código Civil, na medida em que existe um regime geral de prescrição, previsto no artigo 309.º do Código Civil, e em que não é aplicável qualquer regime especial.
4. Ainda assim, a existir uma lacuna, o que não se admite e só por mera cautela se concebe, o teria mais conexão co o caso dos Autos o regime de prescrição da responsabilidade civil extracontratual, previsto no artigo 498.º do Código Civil, do que o regime de prescrição dos créditos emergentes do contrato de trabalho ou da sua cessação, previsto no artigo. 337.º do Código do Trabalho.
5. No caso de indemnização decorrente da violação do pacto de não concorrência, as condições objetivas do titular para exercício do seu direito dependem necessariamente do conhecimento do seu direito, sob pena de se puder dar a situação absurda de o direito prescrever antes de o mesmo poder ser exercido.
6. A tese sustentada pela Recorrente explica o motivo pelo qual omitiu a nova situação laboral e o cargo exercido na empresa concorrente, quer na troca de correspondência com a Recorrida, quer mesmo no LinkedIn.
7. A Recorrida interpelou a Recorrente no dia 12 de maio de 2023, sendo que a Recorrente não alega qualquer facto do qual se possa retirar uma data anterior de conhecimento do incumprimento do pacto de não concorrência pela Recorrente.
8. Mantendo-se em incumprimento do pacto de não concorrência, sendo um facto ilícito continuado, a prescrição nunca se se iniciaria antes do terminar o prazo máximo de não concorrência, ou seja 31. De dezembro de 2024, pelo que o prazo de prescrição ainda nem sequer se iniciou.
9. O montante previsto a título de cláusula penal no pacto de não concorrência corresponde ao mínimo indemnizatório, pelo que a existência dessa cláusula não obsta a que, para exercício do seu direito, a Recorrida tenha de apurar a extensão dos danos provocados.
10. Ainda que fosse aplicável o prazo de um ano e que o mesmo, por absurdo, iniciasse no dia seguinte ao da cessação do contrato de trabalho, ou ao do início do incumprimento do contrato de trabalho, o mesmo prazo interrompeu-se decorridos 5 dias após a propositura da ação, nos termos do disposto no artigo 279.º do Código Civil.
11. Nesse cenário absurdo, o prazo prescricional terminaria a 2 de janeiro de 2024, tendo a prescrição sido interrompida a 31 de dezembro de 2023.
12. A citação urgente é aplicável nas situações em que a petição inicial é submetida dentro dos últimos 5 dias para operar a prescrição de um direito, não sendo aplicável ao caso dos Autos.
13. A Recorrida faz uma constante remissão de Doutrina e Jurisprudência que, ou têm conexão com o tema dos Autos, ou sustentam uma teses opostas às citadas pela Recorrida.
14. A decisão recorrida não merece qualquer reparo, devendo ser mantida integralmente.
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A DM do Ministério Público emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.
As partes responderam ao parecer.
Os autos foram aos vistos.
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II. Fundamentação
As conclusões delimitam o objeto do recurso, o que decorre do que vem disposto nos art.º 608º/2 e 635º/4 do CPC. Apenas se exceciona desta regra a apreciação das questões de conhecimento oficioso.
Nestes termos, considerando a natureza jurídica da matéria visada, importa decidir se se verifica a prescrição.
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Factos provados - o Tribunal a quo deu como provado:
i – No dia 2 de Março de 2022, autora e ré, subscreveram o escrito “contrato de trabalho por tempo indeterminado”, junto a fls. 49 a 53 e, cujo conteúdo se dá aqui por integralmente reproduzido.
ii – Consta do referido acordo, a cláusula décima primeira, com o seguinte teor:
“1. Durante os 24 meses posteriores à cessação por qualquer motivo do contrato de trabalho com a Primeira Contraente, o Segundo Contraente obriga-se a não desenvolver qualquer atividade, função ou cargo, por si ou por conta de outrem, direta ou indiretamente em empresas que se dediquem a atividade igual ou similar à prosseguida pela Primeira Contraente e cujo exercício lhe possa efetivamente causar prejuízo.
2. Por atividade concorrencial entende-se, nomeadamente, a realização, produção, desenvolvimento, importação, exportação, comercialização ou qualquer forma de exercício profissional com o mesmo objetivo do desenvolvido pelo Primeiro Outorgante, incluindo a participação em sociedades que tenham objeto semelhante ao da Primeira.
3. Durante os 24 meses posteriores à cessação por qualquer motivo do contrato de trabalho com a Primeira Contraente e sem quaisquer limitações geográficas, o Segundo Contraente obriga-se a:
a) não contactar e/ou contratar, direta ou indiretamente, os clientes que hajam contratado com a Primeira Contraente no ano anterior à data da cessação do contrato de trabalho com a Primeira Contraente; e
b) não contatar e/ou contratar, direta ou indiretamente, os colaboradores – antigos, atuais ou futuros – da Primeira Contraente.
4. Em contrapartida das obrigações previstas na presente cláusula, o Segundo Contraente terá direito a uma compensação equivalente a 30% da sua remuneração ilíquida mensal à data da cessação deste Contrato, durante o tempo em que durar a limitação da concorrência.
5. A Primeira Contraente poderá eximir-se ao cumprimento da obrigação de pagamento a que se refere o número anterior, se desse facto der conhecimento por escrito ao Segundo Contraente até à data de cessação deste Contrato, ficando nesse caso o Segundo Contraente desobrigado de cumprir com o disposto nos números 1 a 3.
6. A violação do prazo de não concorrência, constitui ao Segundo Contraente a obrigação de indemnizar a Primeira Contraente nos termos gerais do direito, fixando-se, porém, como limite mínimo do montante indemnizatório, a quantia de € 50.000,00 (Cinquenta Mil Euros).”
iii – Por escrito de 12 de Dezembro de 2022, junto a fls. 62, a ré comunicou à autora o pedido de demissão do cargo de Sales Account Manager que ocupava na empresa ré desde 2 de  março de 2022.
iv – Autora e ré acordaram o desvinculo a 31.12.2022 sem prejuízo do aviso prévio legal.
v – A ré remeteu à autora o escrito de 3 de janeiro de 2023, junto a fls. 66 e 67 e, cujo conteúdo se dá aqui por integralmente reproduzido.
vi – A autora respondeu à ré por escrito de 20 de janeiro de 2023, junto a fls. 68 verso e 69, cujo conteúdo se dá aqui por integralmente reproduzido.
vii – A autora remeteu à ré o escrito de 12 de maio de 2023, junto a fls. 72 e verso, cujo conteúdo se dá aqui por integralmente reproduzido.
viii – A ré respondeu à autora por escrito de 23 de maio de 2023, junto a fls. 73 e verso e, cujo conteúdo se dá aqui por integralmente reproduzido.
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De Direito
O mero decurso do tempo pode ter reflexos na vigência das obrigações jurídicas: quer a prescrição (impium remedium lhe chamaram os antigos) quer a caducidade assentam no não exercício do direito durante determinado período (cfr. Mota Pinto, Teoria Geral do Direito, 3ª ed., 373); com a diferença que em regra na primeira o direito foi criado sem prazo de vida, mas extingue-se pelo não exercício duradouro; enquanto a caducidade (art.º 298/2, Código Civil) se prende com a morte de um direito já criado com um certo prazo de vida (neste sentido diz Dias Marques que “a prescrição «mata» o direito, enquanto na caducidade é o direito que «morre»” – cfr. Noções Elementares de Direito Civil, 7ª ed., 118). E ao contrário da outra, a caducidade opera com prazos cegos, valorativamente neutros (cfr, v.g., Manuel Domingues de Andrade, “Teoria Geral da Relação Jurídica”, vol. II, Almedina, 6.ª reimpressão, 1983, páginas 445 e 446; Vaz Serra, “Prescrição e caducidade”, BMJ 105, páginas 32 e 33).
As razões de uma e de outra não são iguais: a prescrição assenta sobremodo na negligência do titular do direito (o que permite compreender que tenha por consequência um direito potestativo a recusar o cumprimento da obrigação, doravante convolada em mera obrigação natural – art.º 303, 304, 304 e 402[1]), enquanto a caducidade se estriba meramente em considerações de certeza e segurança jurídica[2], que acarretam a perda da titularidade do direito e, mais, a sua extinção.
Mas ainda assim, o elemento fundamental de uma e de outra prende-se com a necessidade de assegurar a certeza e a segurança do Direito, de modo que cada um possa saber com o que pode contar. 
A extinção de posições jurídicas pode ter lugar pela verificação do facto jurídico estrito que tenha essa eficácia (caducidade em sentido amplo) ou pelo mero decurso do prazo assinalado (caducidade strictu sensu), podendo a caducidade ser legal ou convencional (art.º 298/2) e respeitar a matéria disponível ou não, sendo que neste caso é de conhecimento oficioso (art.º 333).
Desta sorte, o não exercício durante o lapso de tempo estabelecido na lei pode determinar a prescrição de determinados direitos (n.º 1 do art.º 298.º do Código Civil), a qual permite ao respectivo beneficiário, em regra o devedor, recusar o cumprimento da prestação ou opor-se ao exercício do direito prescrito (art.º 303.º e 304.º n.º 1 do Código Civil): nas prescrições extintivas ou ordinárias, decorrido o prazo legal previsto para a prescrição, mesmo que não questione a existência da dívida, pode o devedor recusar-se ao pagamento, invocando a prescrição (este aspeto distingue estas presunções das chamadas prescrições presuntivas).
As prescrições extintivas ou ordinárias estao sujeitas a causas de suspensão e interrupção (artigos 318.º a 327.º do Código Civil).
Que acontece quando certo prazo é interrompido?
Dispõe nesta sede o art.º 326 do Código Civil, sob e epigrafe “efeitos da interrupção”: 1. A interrupção inutiliza para a prescrição todo o tempo decorrido anteriormente, começando a correr novo prazo a partir do acto interruptivo, sem prejuízo do disposto nos nºs 1 e 3 do artigo seguinte. 2. A nova prescrição está sujeita ao prazo da prescrição primitiva, salvo o disposto no artigo 311.
Começa – é esta a regra geral que se retira do n.º 1 – a correr novo prazo de interrupção.
Deste regime resulta, pois:
a) a inutilização do primeiro prazo[3];
b) o início de um segundo e ultimo prazo[4].
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Ponderou o Tribunal recorrido:
“Dispõe o artigo 337º, nº 1 do Código do Trabalho, o crédito de empregador ou de trabalhador emergente de contrato de trabalho, da sua violação ou cessação prescreve decorrido um ano a partir do dia seguinte àquele em que cessou o contrato de trabalho.
Este prazo de um ano é de prescrição atenta a qualificação legal, aplicando-se o regime dos artºs 300º e seguintes do Código Civil.
A questão que se coloca é saber, atenta a natureza do crédito reclamado pela autora – indemnização por violação do dever de não concorrência pós contratual – se é aplicável o regime da prescrição contido no preceito legal acima referido.
A autora alega que tomou conhecimento que a ré desenvolveria actividade para empresa alegadamente concorrente no dia 31 de janeiro de 2023.
Qualquer eventual crédito da ré decorrente da violação da cláusula acima referida apenas nasceria após a cessação da relação laboral.
Como se escreve no Acórdão do Tribunal do Porto de 19.10.20091, «Dado que os créditos decorrentes da violação do pacto de não concorrência, não têm como data limite de vencimento a data da cessação do contrato, não se vencem imediatamente por força da extinção do contrato e só se vencem após a cessação do contrato, não estando, por isso, em condições de ser plenamente exercidos nessa altura, não lhes pode ser diretamente aplicável o referido prazo de prescrição de um ano a que alude o citado artigo 381.º do Código de Trabalho».
Com efeito, os créditos emergentes da violação de um pacto de não concorrência pós-laboral, não são imediatamente exigíveis por força da cessação do contrato, vencendo-se após essa cessação e quando ocorrer a violação desse pacto. Por isso, não pode o direito correspondente ser exercido aquando da cessação do contrato de trabalho.
Donde resulta para nós evidente que os alegados créditos resultantes de pacto de não concorrência ou da sua violação não se subsumem ao regime do artigo 337.º CT mas antes sendo-lhes aplicável o prazo geral de prescrição nos termos do artigo 309.º Código Civil.
Ora, considerando o acima exposto, é inequívoco que o eventual crédito que a autora tenha sobre a ré, não se mostra prescrito, uma vez que a acção deu entrada em tribunal no dia 25 de dezembro de 2023”.
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Apreciando, afigura-se-nos que a decisão recorrida apontou ao ponto essencial ao ponderar que “os créditos emergentes da violação de um pacto de não concorrência pós-laboral, não são imediatamente exigíveis por força da cessação do contrato, vencendo-se após essa cessação e quando ocorrer a violação desse pacto”.
Com efeito, o pacto de não concorrência surge como uma limitação da atividade do trabalhador durante um período subsequente à cessação do contrato de trabalho (art.º 136, n.º 2, do CT).
De aí que, mais lista menos lista, as questões expostas pela recorrente não tenham sentido: o que interessa é apurar se a ratio do instituto da prescrição permite a sua aplicação nos termos propostos, a saber, começando a contar o prazo prescricional a partir do momento em que cessa o contrato de trabalho.
A resposta a esta questão é inequivocamente negativa: não pode começar a correr nenhum prazo de prescrição antes sequer do direito se constituir, uma vez que o seu titular não o podia demandar durante a existência do contrato de trabalho, na medida em que a eventual constituição do direito é posterior à cessação da relação laboral. E portanto em caso nenhum se pode falar em negligência do titular do direito, falta de cuidado que subjaz ao instituto da prescrição.
Em termos lógicos a questão também é manifestamente improcedente: o crédito em causa não emana da relação laboral mas da violação do pacto de não concorrência, pelo que não pode equivaler à violação de um crédito laboral em sentido estrito.
Acresce ainda que enquanto se mantiver a situação do devedor - a qual não é instantânea mas continuada – o credor, até ao limite do prazo acordado, está em tempo para reagir. Mais uma vez, a ratio da prescrição não permite que se que se possa afirmar existir negligência no exercício de direitos.
Portanto, e muito claramente, não se verifica qualquer prescrição.
Pelo que decidiu bem a decisão recorrida.
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III
Pelo exposto, o Tribunal julga o recurso improcedente e confirma a decisão recorrida.
Custas do recurso pela recorrente.

Lisboa, 12/03/2025
Silva de Almeida
Celina Nóbrega
Francisca Mendes
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[1] Neste sentido cfr Pedro Pais de Vasconcelos, Teoria Geral do Direito Civil – 7ª ed.ª: “ é um efeito jurídico da inércia prolongada do titular do direito no seu exercício, e traduz-se em o direito prescrito sofrer na sua eficácia um enfraquecimento consistente em a pessoa vinculada poder recusar o cumprimento ou a conduta a que esteja adstrita”.
[2] O que leva a que frequentemente os prazos de caducidade sejam curtos (em sentido convergente cf. a fundamentação do acórdão 2/97, de 30.01.97, do Supremo Tribunal de Justiça, que acentua o desiderato deste instituto de ver resolvidos os conflitos rapidamente, disponível em www.dre.pt/cgi).
[3] Pode, aliás, definir-se a interrupção da prescrição como “a inutilização do tempo decorrido para a prescrição, dadas certas circunstancias” (acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 27.5.86. BMJ n.º 357, pag. 377 e ss.)
[4] Por todos cfr. os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 5.11.2013, disponível, como todos os que forem citados sem menção da fonte, em www.dgsi.pt: “O prazo prescricional previsto no art. 498.º do CC apenas pode ser interrompido, através de notificação judicial avulsa, por uma vez, não tendo as eventuais e sucessivas notificações judiciais avulsas subsequentes qualquer eficácia interruptiva da prescrição”; e da Relação do Porto de 14.7.2003: “a prescrição só pode ser interrompida uma vez”.