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IMPUGNAÇÃO DO DESPEDIMENTO
JUSTA CAUSA
ILICITUDE
INDEMNIZAÇÃO
DANOS NÃO PATRIMONIAIS
Sumário
Em caso de acidente de trabalho de que resulte a morte ou lesão grave do trabalhador, ou que assuma particular gravidade na perspetiva da segurança no trabalho, a entidade executante deve suspender quaisquer trabalhos que sejam suscetíveis de destruir ou alterar os vestígios do acidente. Tal suspensão, tendo embora como finalidade principal a preservação dos vestígios, visa igualmente permitir à ACT a verificação das condições de segurança.
Texto Integral
“EMP01..., Ltª.”, e AA, responsável solidário, idf. nos autos, interpuseram recurso da decisão proferida pelo Juízo do Trabalho de Viana do Castelo, que julgando improcedente a impugnação deduzida pela arguida recorrente da decisão proferida pela AUTORIDADE PARA AS CONDIÇÕES DO TRABALHO (...), condenou a arguida no pagamento da coima de €3.570,00, pela prática de uma contraordenação p.p. no art.º 24, nº. 4, 25, nº. 3, al. c), do D.L. 273/2003, de 29/10, em conjugação com o artº. 166 do D.L. 41821, de 11/8/1958, sendo solidariamente responsável pelo seu pagamento o seu legal representante AA.
Em síntese sustentam:
A - A recorrente não violou o número 4 do artigo 24º do Decreto-Lei n.º 273/2003, de 29 de outubro, nem o artigo 166º do Regulamento de Segurança e Saúde no Trabalho da Construção Civil, aprovado pelo Decreto n.º 41821, de 11 de agosto de 1958;
B – A obrigação prevista no número 4 do artigo 24º do Decreto-Lei n.º 273/2003, de 29 de outubro, implica, apenas, a suspensão, pela entidade executante e de todos os intervenientes no estaleiro, de quaisquer trabalhos que sejam suscetíveis de destruir ou alterar os vestígios do acidente - sem prejuízo da assistência a prestar às vítimas – sendo que uma empreitada só terá que ser suspensa até à visita inspetiva dos serviços da ACT se a Inspeção-Geral do Trabalho o determinar, nos termos do número 6 do artigo 24º do Decreto-Lei n.º 273/2003, de 29 de outubro, devendo a entidade executante e todos os intervenientes no estaleiro ser notificados para esse efeito;
C - No caso concreto a ACT foi notificada do acidente grave no próprio dia, só passados dois dias do acidente é que o andaime foi desmontado pela recorrente, sendo que não consta dos factos provados o dia em que a ACT fez a visita inspetiva ao local;
D – A impugnante não praticou as contraordenações que lhe são imputadas.
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A Exmª PGA deu parecer no sentido da improcedência, referindo designadamente que até à deslocação da ACT ao local – entidade à qual está atribuída a competência para a realização de inquérito, nos termos do disposto no artº. 10º. nº. 1 al. e) do Decreto-Lei n.º 102/2000, de 02-06, artº. artigo 14.º n.º 2 da Lei n.º 102/2009, de 10-09 e nº. 7 do artigo transcrito – todos os trabalhos teriam, que ficar suspensos, com acesso vedado ao local.
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Colhidos os vistos dos Ex.mos Srs. Adjuntos, cumpre apreciar.
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Factualidade:
1 – A arguida desenvolve a atividade de comércio a retalho de combustíveis e teve em 2022 um volume de negócios de €1.386.232,00.
2 – No dia 27 de março de 2023, ocorreu um acidente de trabalho com o trabalhador ao serviço da arguida BB, de que lhe resultou fratura da coluna.
3 – O referido trabalhador, juntamente com um colega, encontrava-se a montar um ar condicionado numa moradia para turismo, estando em cima de um andaime e tendo caído ao solo.
4 – No mesmo dia, pelas 19,05 horas, a PSP, que se havia deslocado ao local do acidente, comunicou este à ACT via correio eletrónico.
5 – Nesse dia, a arguida não prosseguiu com os trabalhos no local do acidente.
6 – No dia seguinte, os trabalhadores da arguida concluíram a obra que estavam a desenvolver e, no dia 29/3/2023, desmontaram o andaime em causa.
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Conhecendo do recurso:
Os recorrentes sustentam que não cometeram a infração pela qual foram condenados.
Defendem que os trabalhos ficaram suspensos logo após o sinistro, tendo ido ao local a PSP, e nesse dia, por esta comunicado à ACT.
O andaime foi desmontado dois dias depois, já sem obras a decorrer. Referem que a desmontagem deste não alterou nem destruiu os vestígios do acidente.
Ao contrário do que consta na fundamentação da sentença recorrida, a suspensão dos trabalhos não teria “que se manter até à autoridade competente, neste caso, a ACT, se deslocar ao local e, após as devidas averiguações.
Refere ainda os termos do nº 6 do artigo 24º do Decreto-Lei n.º 273/2003, de 29 de outubro, no sentido de que a ACT pode determinar a suspensão imediata de quaisquer trabalhos em curso que sejam suscetíveis de destruir ou alterar os vestígios do acidente, sem prejuízo da assistência a prestar às vítimas, o que não ocorreu.
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Refere o artigo 24º do D.L. DL n.º 273/2003, de 29 de outubro - CONDIÇÕES DE SEGURANÇA E DE SAÚDE NO TRABALHO EM ESTALEIROS TEMPORÁRIOS OU MÓVEIS
Acidentes graves e mortais
1 - Sem prejuízo de outras notificações legalmente previstas, o acidente de trabalho de que resulte a morte ou lesão grave do trabalhador, ou que assuma particular gravidade na perspetiva da segurança no trabalho, deve ser comunicado pelo respetivo empregador à Inspeção-geral do Trabalho e ao coordenador de segurança em obra, no mais curto prazo possível, não podendo exceder vinte e quatro horas.
2 - A comunicação do acidente que envolva um trabalhador independente deve ser feita pela entidade que o tiver contratado.
3 - Se, na situação prevista em qualquer dos números anteriores, o acidente não for comunicado pela entidade referida, a entidade executante deve assegurar a comunicação dentro do mesmo prazo, findo o qual, não tendo havido comunicação, o dono da obra deve efetuar a comunicação nas vinte e quatro horas subsequentes.
4 - A entidade executante e todos os intervenientes no estaleiro devem suspender quaisquer trabalhos sob sua responsabilidade que sejam suscetíveis de destruir ou alterar os vestígios do acidente, sem prejuízo da assistência a prestar às vítimas.
5 - A entidade executante deve, de imediato e até à recolha dos elementos necessários para a realização do inquérito, impedir o acesso de pessoas, máquinas e materiais ao local do acidente, com exceção dos meios de socorro e assistência às vítimas.
6 - A Inspeção-geral do Trabalho pode determinar a suspensão imediata de quaisquer trabalhos em curso que sejam suscetíveis de destruir ou alterar os vestígios do acidente, sem prejuízo da assistência a prestar às vítimas.
7 - Compete à Inspeção-geral do Trabalho, sem prejuízo da competência atribuída a outras entidades, a realização do inquérito sobre as causas do acidente de trabalho, procedendo com a maior brevidade à recolha dos elementos necessários para a realização do inquérito preliminar.
8 - Compete à Inspeção-geral do Trabalho autorizar a continuação dos trabalhos com a maior brevidade, desde que a entidade executante comprove estarem reunidas as condições técnicas ou organizativas necessárias à prevenção dos riscos profissionais.
Resulta desta norma que é o empregador que deve diligenciar para que a ACT tenha conhecimento da ocorrência, conforme resulta quer do número 1, impondo-se também tal obrigação à entidade executante, conforme nº 3. No caso, a executante é a própria empregadora – artigo 3º do mesmo diploma.
Compete ainda à entidade executante, independentemente de qualquer notificação para o efeito, impedir o acesso de pessoas, máquinas e materiais ao local do acidente, com exceção dos meios de socorro e assistência às vítimas, até à recolha de elementos pela entidade competente, o ACT – nºs 5 e 7.
Em consonância o nº 4 da norma refere que “a entidade executante e todos os intervenientes no estaleiro devem suspender quaisquer trabalhos sob sua responsabilidade que sejam suscetíveis de destruir ou alterar os vestígios do acidente, sem prejuízo da assistência a prestar às vítimas.”
Resulta daqui que quer o local quer os elementos – andaimes máquinas etc… envolvidos no sinistro, devem ficar a coberto de qualquer interferência, e suspensos os “respetivos” trabalhos, até autorização da ACT – conforme flui do nº 8, que expressamente refere que “compete à Inspeção-geral do Trabalho autorizar a continuação dos trabalhos com a maior brevidade, desde que…”
Este número 8 dá igualmente uma importante nota sobre as finalidades pretendidas pelo legislador ao impor ao executante da obra a suspensão dos respetivos trabalhos. Não se trata apenas, como parece entenderem os recorrentes, de preservar os vestígios do acidente, mas também de garantir uma apreciação por parte da ACT relativamente às condições efetivas de segurança para essa continuação. Só assim ganha sentido a referência no nº 8 a que a ACT autorizará a continuação dos trabalhos, “desde que a entidade executante comprove estarem reunidas as condições técnicas ou organizativas necessárias à prevenção dos riscos profissionais.”
A autorização ocorrerá por regra após a realização da inspeção sequente ao sinistro, caso não se mostre necessárias quaisquer medidas, circunstância em que a ACT fará as recomendações devidas podendo suspender os trabalhos, ainda que não sejam os estritos trabalhos em que o sinistro ocorreu, desde que se mostre adequada a prevenir acidentes.
Certo que uma das finalidades é a preservação dos vestígios, como resulta também da norma do artigo 166º do Decreto n.º 41821/58, de 11 de agosto - REGULAMENTO DE SEGURANÇA NO TRABALHO DA CONSTRUÇÃO CIVIL, que refere:
“Se do acidente resultar morte ou lesões graves, as entidades competentes realizarão, com urgência, inquérito sumário sobre as causas do acidente, lavrando o respetivo auto.
§ único. Sem prejuízo da assistência a prestar às vítimas, o participante do acidente suspenderá, nestes casos, qualquer trabalho suscetível de destruir ou alterar os vestígios deixados.”
Mas, como resulta da norma do D.L. 273/2003, não é essa a única finalidade.
Tenham-se em atenção as funções da ACT constantes do Decreto Regulamentar n.º 47/2012, de 31 de julho, designadamente seu nº 2.
Assim e em sede de averiguação a ACT avaliará as condições de trabalho definindo medidas adequadas, fazendo advertências, recomendações, suspensão de trabalhos, e outras, nos termos dos artigos 5.ºss do DL n.º 102/2000, de 02 de junho - ESTATUTO DA INSPECÇÃO-GERAL DO TRABALHO.
Assim, e até autorização da ACT os trabalhos deveriam ter ficado suspensão e protegida toda a área, nos termos suprarreferidos, a fim de preservar os vestígios e permitir à ACT a elaboração de um relatório o mais fiável possível quanto à ocorrência e suas causas.
Ora isto não ocorreu. Não é correto afirmar que não foram alterados os vestígios, pois que, tratando-se de uma queda, presumivelmente do andaime, era de primordial importância manter este no estado em que estava, bem como o estado da obra no estado em que estava à data, pois só dessa forma poderão os inspetores formar uma ideia – investigar – sobre o que estaria o sinistrado a fazer, verificando visualmente o estado da obra, bem como verificando as condições de segurança oferecidas pelo andaime e outros meios disponíveis.
Não restando dúvidas, no caso, nem tal é posto em causa, que o sinistro assume a natureza de grave – queda em altura com fratura de coluna demandando intervenção do INEM e internamento -, a executante e também empregadora, não cumpriu a norma legal referenciada. Note-se que apenas pelas 19:00H do dia do acidente – que ocorreu da parte da tarde - a autoridade policial tomou conta da ocorrência, e logo no dia seguinte as obras prosseguirem, tendo tido seu término, e sequentemente no outro dia, 29, foi retirado o andaime.
Consequentemente é de confirmar a decisão.
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DECISÃO:
Acordam os juízes do Tribunal da Relação de Guimarães em julgar improcedente o recurso confirmando o decidido.
Custas pela recorrente com 2 UCs de taxa de justiça