AMPLIAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO
NULIDADE DA SENTENÇA
IMPUGNAÇÃO DA DECISÃO DE FACTO
ARRENDAMENTO
RESOLUÇÃO
ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA
LITIGÂNCIA DE MÁ FÉ
Sumário

Sumário:
I. Ampliação do objecto do recurso: Se a sentença fundamentou a resolução do contrato em apenas alguns dos fundamentos invocados na Petição Inicial, afastando outros, perante a pluralidade de fundamentos invocados pelo Autor é admissível a este requerer a ampliação do objecto do recurso interposto pela Ré porque se a Ré obtiver vencimento de causa em sede de recurso, apesar do Autor não ser parte vencedora, pode ainda ver deste modo apreciado um dos fundamentos invocados para se decretar a resolução (cfr. art. 636.º, n.º 1 e n.º 2, do CPC). Mas já quanto à parte da ampliação em que o Autor entende que deveria a Ré ser condenada ao pagamento de todas as rendas até entrega efectiva do imóvel, correspondente ao pedido da al. c) da P.I., uma vez que neste caso o Autor não é parte vencedora mas parte vencida e por isso estava obrigado a interpor recurso autónomo, ou subordinado e não o fez.

II. Nulidade da sentença por condenação em objecto diverso do pedido: pretendendo o Autor a declaração de resolução do contrato de arrendamento, no caso de procedência do pedido a condenação deve ter correspondência com esse mesmo pedido decretando-se a resolução (estando vedado decretar a sua extinção por caducidade ou denúncia), sendo irrelevante, para efeitos do art. 609.º, n.º 1 ou 615.º, n.º 1, al. e), do CPC, qual o fundamento ou fundamentos em que a mesma se baseou para tal efeito porque aí já estamos no domínio da causa de pedir e não do pedido, improcedendo a invocada nulidade.

III. Nulidade da sentença por omissão de pronúncia: os factos alegados pelo Autor na Petição Inicial não só foram tidos em conta na sentença como ainda resultaram provados, sendo assim incompreensível invocar desta omissão.

IV. Nulidade da sentença por contradição entre os factos e a motivação: os factos provados devem resultar dos factos alegados na Petição Inicial e não os factos que terão alegadamente ocorrido posteriormente e agora alegados pelo Autor em sede de recurso, como sucede com a alegação da falta de pagamento de rendas depois da entrada em juízo da Petição Inicial, já que a eventual falta de pagamento de rendas na pendência da acção poderá ser fundamento apenas para instaurar incidente de despejo imediato.

V. Impugnação da matéria de facto: os factos novos de que a parte não fez oportunamente uso no processo, não podem ser trazidos por ela aos autos apenas em sede de recurso, rejeitando-se a impugnação da decisão da matéria de facto.

VI. Dos pressupostos para decretar a resolução do contrato de arrendamento: a Ré não transmitiu qualquer estabelecimento comercial que possuía a terceiros, enquanto unidade económica composta de vários elementos como móveis, utensílios, mercadoria, empregados, freguesia, know-how, entre outros, como uma universalidade, mas antes e tão somente a Ré cedeu o espaço a terceiros através de múltiplos contratos, aliás, como a própria admite, para que estes ali exercessem, cada um deles, as suas respectivas actividades de que já era titulares, por isso, não se trata de cessão de estabelecimento comercial mas antes cedência não autorizada do gozo do imóvel, ou seja, de sublocação (cfr. artigos 1022.º e 1060.º, do Código Civil), por isso, pela sua gravidade e consequências, é fundamento de resolução do contrato, por ser inexigível a sua manutenção, a cessão do gozo do prédio em causa, ilícita, inválida e ineficaz perante o Autor, ao abrigo do disposto no art. 1083.º, n.º 1, al. e), do Código Civil.

VII. Verificam-se os pressupostos do enriquecimento sem causa: considerando que a Ré paga de renda ao Autor €120,00 mensais pelo arrendamento do locado e recebe de terceiros a quantia mensal de €800,00 pelo mesmo espaço significa que a Ré obtém a vantagem patrimonial correspondente à diferença daqueles montantes, ou seja, a quantia de €680,00 mensais (enriquecimento da Ré e correspondente empobrecimento do Autor à custa daquela); não existe uma relação que, à luz do direito legitime tal enriquecimento, antes pelo contrário, é proibido pelo disposto no art. 1062.º, do Código Civil (não existe uma causa justificativa); finalmente, não existe outro mecanismo legalmente previsto para o Autor obter a restituição daquelas quantias, já que, apesar ser fundamento de resolução do contrato de arrendamento, já vimos que este seria sempre resolvido com outros fundamentos como ainda não prevê qualquer norma para impor a restituição devida (ausência de acção apropriada para o efeito).

VIII. Não ocorre litigância de má fé quando se exercem os direitos previstos na Lei e na Constituição.

Texto Integral

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Apelação n.º 207/22.0T8SSB.E1

(1.ª Secção Cível)

Relator: Filipe César Osório

1.º Adjunto: António Fernando Marques da Silva

2.º Adjunto: Maria Adelaide Domingos

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ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA


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I. RELATÓRIO


Ação Declarativa, Processo Comum


Autor – AA, representado pelo seu procurador BB


Réu – "CC, Lda."


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1. Objecto do litígio – Cessação de contrato de arrendamento consubstanciado nos seguintes pedidos:


a) Declarar-se resolvido o contrato de arrendamento referido nos artigos 1º a 5º desta P.I., por comum acordo das partes e com efeitos de 1.07.2021;


b) Se assim se não entender deverá declarar-se a resolução desse mesmo contrato de arrendamento com fundamento na violação no artigo 1083, nº 1, nº 2 alínea c) e nº 3;


c) Mais deve a R. ser condenada a pagar ao A. as rendas vencidas e vincendas desde 1.07.2021 num total de (10 x 120,00 €) = 1.200,00 € (mil e duzentos euros);


d) Deverá ainda a R. ser condenada a entregar ao A. o montante mensal de 500,00 € (quinhentos euros) desde 1.01.2021, e até efectiva entrega do imóvel ao A., correspondente aos valores por ela recebidos injustificadamente, por se tratar de enriquecimento sem causa.


Para o efeito, o Autor alegou essencialmente que em 08/03/2018 BB e a Ré celebraram contrato escrito de arrendamento de loja para comércio desta, com a renda de €120,00 mensais, renovável anualmente, não podendo ser-lhe dado outro uso sem prévia autorização do senhorio, a arrendatária não pode fazer obras ou benfeitorias no local arrendado, sem autorização do senhorio dada por escrito; por escritura de dação em cumprimento celebrada em 17/02/2021 BB e mulher transmitiram a referida loja ao Autor que passou a ser o seu proprietário; o Autor constituiu seu procurador aquele BB a quem concedeu poderes para praticar quaisquer actos de gestão da fracção, nomeadamente, celebrar, denunciar ou resolver contratos de arrendamento.


Mais alegou que a Ré aumentou o número de divisões do arrendado, de onde resultou a constituição de 5 (cinco) salas que cedeu a terceiros e pelas quais passou a receber uma renda mensal total de 800,00 € (oitocentos euros), bem como, que o locado tem sido usado, há mais de um ano, para fins diversos daquele para o qual foi arrendado, tudo em contrário à lei.


Alegou ainda que as partes estabeleceram conversações em Fevereiro/Março de 2021 nas quais foi proposto à Ré que só poderia manter os subarrendamentos desde que a renda mensal fosse alterada para 500,00 € (quinhentos euros), o que a Ré aceitou, mas, em Junho de 2021 a Ré preferiu cessar, por acordo com o Autor, o contrato de arrendamento, mas não entregou o imóvel arrendado e não pagou as rendas correspondentes aos meses de Julho de 2021 e seguintes; os depósitos de 120,00 € feitos na conta do procurador do Autor não se reconhecem como pagamento de rendas, também por se entender que o contrato de arrendamento cessou por acordo das partes em fins de Junho de 2021.


O Autor entende ainda que os abusivos e ilícitos subarrendamentos têm-se traduzido num enriquecimento injustificado da arrendatária Ré, obtido à custa do Autor proprietário do imóvel locado, enriquecimento ilícito e sem causa, superior a 500,00 € mensais.


Em Contestação a Ré impugnou no essencial os factos invocados pelo Autor e pede a sua absolvição.


Foi proferido despacho saneador e agendada audiência final de julgamento


Foi proferida sentença.


A Ré interpôs recurso de apelação desta sentença.


O Autor interpôs recurso de apelação desta sentença.


O Autor apresentou contra-alegações e ampliou o objecto do recurso de apelação interposto pela Ré.


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2. Sentença em Primeira Instância:


Realizada audiência final foi proferido o seguinte dispositivo:


«Pelo exposto, julgo a presente ação parcialmente procedente, e decido declarar a cessação por resolução do contrato de arrendamento, com fundamento no uso do prédio locado para fim diverso daquele a que se destina e com fundamento na cedência do gozo a terceiros, sem autorização do senhorio.


No mais, vai a Ré absolvida dos pedidos feitos nas alíneas c) e d) da petição inicial (ou da ação).


Custas a cargo das partes na proporção de metade.


O valor da ação: €12.800,00.


Registe e notifique.».


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3. Recurso de apelação da Ré (Requerimento de 13/12/2023):


A Recorrente/Ré interpôs recurso de apelação da sentença com as seguintes conclusões:


«Conclusões (1):


1 - A celebração múltipla, no mesmo local arrendado, de contratos de locação financeira designados de cedência de espaço não constitui uma atividade económica suscetível de ser considerada comércio da sociedade inquilina, pela razão de ser das coisas, no caso, a celebração de contratos e atividade económica (de prestação de serviços), e por a celebração múltipla de contratos de locação de estabelecimento não estar incluída na classificação legal de atividades económicas.


2 – Como quer que seja, a clausula do contrato de arrendamento que destina o local arrendado ao comércio da inquilina não pode ser interpretada no sentido sem qualquer expressão no texto de que a atividade é restringida à que está descrita no objeto social da sociedade inquilina.


Conclusões (2):


3 – A sentença que declara a resolução com um fundamento não invocado nem peticionado pelo autor é nula e deve ser revogada.


4 – Os contratos de cedência de espaço celebrados entre a inquilina e terceiros configuram um contrato de locação de estabelecimento e estão submetidos a regime próprio que os afasta da verificação do fundamento da cedência do gozo do locado de forma … ilícita, inválida ou ineficaz perante o senhorio…».


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4. Recurso de apelação do Autor (Requerimento de 07/01/2024):


O Recorrente/Autor interpôs recurso de apelação da sentença com as seguintes conclusões1:


«I - O Autor AA, nesta ação representado pelo seu procurador, BB, intentou a presente ação declarativa, sob a forma de processo comum, contra "CC, Lda."


II - Alegando e pedindo em síntese, a resolução do contrato de arrendamento, por comum acordo das partes e com efeitos de 01/07/2021, ou, se assim se não entender, a resolução desse mesmo contrato de arrendamento com fundamento no incumprimento contratual da Ré consubstanciado no uso do prédio locado para fim diverso daquele a que se destina, ainda que a alteração do uso não implique maior desgaste ou desvalorização para o prédio.


III - Mais pede a condenação da Ré a pagar ao Autor as rendas vencidas e vincendas desde 01/07/2021 num total de (10x120,00€) = 1.200,00€ e a condenação da Ré a entregar ao Autor o montante mensal de 500,00€ desde 01/01/2021, e até efetiva entrega do imóvel ao Autor, correspondente aos valores por ela recebidos injustificadamente, por se tratar de enriquecimento sem causa.


IV - Porquanto as Partes inicialmente acordaram na subida do valor da renda para esse montante e posteriormente a Ré preferiu cessar, por acordo com o Autor, o contrato de arrendamento, mas não entregou o imóvel arrendado.


V - A Ré contestou, e realizada a audiência de julgamento observando os demais formalismos legais, foi proferida sentença que julgou a ação parcialmente procedente, decidindo declarar a cessação por resolução do contrato de arrendamento com fundamento no uso do prédio locado para fim diverso daquele a que se destina, e com fundamento na cedência do gozo a terceiros, sem autorização do senhorio.


VI – Foram dados os seguintes factos como provados na sentença de que se pretende apelar:


10. As salas, pelo menos até maio de 2021, estavam cedidas aos seguintes cessionários: Sala 1 - " Sala 2 - ... Sala 3 – dra. DD, Advogada Sala 4 – ... – EE Sala 5 – ...;


11. Mantendo-se ainda essas salas cedidas, algumas das quais a outros cessionários;


12. Uma dessas salas encontra-se cedida à Solicitadora, FF, e bem assim à ..., a qual se dedica à prestação de serviços na área do Direito Imobiliário, Direito Bancário e Financeira, e Registos e Notariado;


13. Segundo indicação da própria Ré, eram cobrados os seguintes valores, pela cedência das salas: - Salas 1, 2, 3 e 5 – 150 € acrescidos de IVA, no valor total de 184,50 €, para cada sala e - Sala 4 – 200 € acrescidos de IVA, no valor total de 246,00 €;


14. O imóvel arrendado tem sido usado como escritório de advogada, gestão de condomínios, serviços de higiene e segurança no trabalho, sala de estudos, escritório de solicitadora e prestação de serviços na área do Direito Imobiliário, Direito Bancário e Financeira, e Registos e Notariado (…).


VII - Não pode o agora Recorrente Autor, concordar com tal decisão, recorrendo expressamente da parte em que a Douta Sentença absolveu a Ré do pagamento dos valores indevidamente recebidos a título de enriquecimento sem causa.


VIII - Atendendo aos depoimentos prestados pelas testemunhas nos presentes autos deveriam ter sido dados como provados factos que a julgadora não levou em consideração na sentença, violando o disposto no artigo 645.º, alínea d) do CPC, porquanto, deixou de pronunciar-se sobre questões que devia apreciar.


IX - Relativamente ao Ponto 12 o mesmo omitiu o valor pago pela solicitadora Dra. FF que no seu depoimento concretizou a data que celebrou o contrato de cedência de sala com a Ré bem como o respetivo valor.


X - Pelo que o Ponto 12 deveria ter sido dado como provado com a seguinte redação: Provado que a Ré celebrou contrato de cedência de espaço sala 7 com a Dra. GG e bem assim à plataforma ..., a qual se dedica á prestação de serviços na área do Direito Imobiliário, Direito Bancário e Financeira e Registos e Notariado desde dezembro de 2021 e que paga o valor de 350,00€ euros acrescidos de IVA até á data em que foi ouvida em julgamento.


XX - Aliás esta matéria deveria ter sido dada como provada não só pelo depoimento da referida testemunha como também da confissão da Ré sustentada pela junção do documento 9 junto com a Contestação onde se encontra por reproduzido o contrato celebrado entre a Ré e a Testemunha Dra. GG que confirma o valor de 350,00€ acrescidos de IVA.


XI - Impugna o Autor expressamente a matéria de fato dada como provada nos referidos Pontos 10 a 13 porquanto não foi colocado em crise o depoimento de todas as testemunhas que tinham conhecimento direto e pessoal sobre os fatos (contratos de cedência pois neles intervieram com a Ré) coadjuvado pelos documentos juntos pela própria Ré sob o n.º 9 da Contestação.


XII - Ao não dar como provado os referidos fatos e que se mostravam relevantes para a descoberta da verdade material e boa decisão da causa, designadamente dos valores recebidos pela Ré pela cedência das cedas do imóvel sem autorização do Autor pedido do autor por enriquecimento sem causa.


XIII - Numa clara violação dos artigos 611.º e 615.º do CPC e não tendo posto em causa as declarações da testemunha GG e DD a douta sentença violou também o artigo 607.º do CPC.


XIV - Pois que era importante, senão fulcral, dar como provados os valores dos montantes recebidos pela Ré dos Cessionários tendo a julgadora à mão documentos complementados pela prova testemunhal e que deveria ter dado como provado e não o fez, designadamente quanto à data do início dos contratos como a sua duração que conforme depoimento da testemunha DD minutos 10:29 a 10:56; e GG minutos de 10:17 a 10:29 cujo contrato teve início em dezembro de 2021 e dura até à presente data, o mesmo ocorrendo com as restantes testemunhas, designadamente HH minutos 10:31 a 11:03 que confirmou que o contrato se iniciou em maio de 2020 e que se mantém até à presente data; II minutos 11:33 a 11:47 cujo contrato de iniciou em 2022 até à presente data e JJ minutos 14:51 a 15:35 que foi para o espaço em final de 2020 ou início de 2021, e que o contrato dura até à presente data.


XV - Como se pode confirmar nas declarações de todas as testemunhas as mesmas tinham conhecimento direito porque as mesmas estavam diretamente envolvidas tendo outorgado contratos de cedência de espaço com a Ré pelos valores constantes do doc. 9 junto com a Contestação e que se traduz na confissão integral da mesma de acordo com o disposto no artigo do 574.º do CPC.


XVI - Não tendo a douta sentença apreciado tal questão nem fazendo a liquidação dos valores recebidos pela Ré naqueles períodos, não se pronunciando sobre a pretensão do Autor e que foi devidamente enunciada nos pontos da PI n.ºs 12, 13, 14, 15 pela que a sentença violou o disposto no art.º 574 do CPC.


XVII - Tais factos eram fatos essenciais devidamente enunciados na PI e que foram confirmados pelas testemunhas e que foram omitidos na decisão agora em crise não tendo a mesma respeitado o previsto no art.º 615 do CPC.


XVIII - A julgadora alicerçou a sua a decisão considerando não existir qualquer autorização escrita ou aditamento ao contrato que legitima-se a Ré a exercer a atividade de cedência de espaços, com gerência de espaços das partes comuns e que o destino dado no contrato de arrendamento é para o comércio da Ré e a Ré não exerce o seu comércio no locado, pois tal atividade não está prevista no respetivo objeto social, nada tendo comunicado, nem ao anterior senhorio, BB, nem ao atual proprietário, o Autor, nos termos do art. 1038.º, n.º 1 alíneas f) e g) e 1047.º exvi do art. 1108 todos do CC.


XXX - A Ré foi absolvida do pagamento de rendas porquanto a mesma procedeu ao depósito das mesmas, bem como do pagamento mensal de 500,00€, pois não ficou provado que existiu conversações para manter os subarrendamentos para que a renda fosse alterada para 500,00€.


XXXI - Se nesta parte a douta sentença não merece censura, merece censura pelo contrário não pode o Autor aceitar a absolvição da Ré no pedido do pagamento das importâncias indevidamente recebidas.


XXXII - Não aceitando o Autor a fundamentação da Juíza a quo nos artigos 1053.º do CC, adiantando que não se provou a extinção do contrato acordado pelas partes, tendo assim afastado o pedido do Autor da condenação da Ré sobre as regras do enriquecimento sem causa, aplicando do caso sub judice o art. 437.º do CC.


XXXIII - Ora, esta disposição legal, não se aplica no caso presente, porquanto não existiu alterações normais das circunstâncias em que as partes contrataram, mas sim o incumprimento da Ré do contrato de arrendamento por culpa exclusiva da mesma, que sem qualquer autorização (conforme fundamentação da sentença) e com o intuito de tirar proveito da sua posição de arrendatária e à custa do património do credor numa atitude de abuso do direito fez suas quantias avultadas que a enriqueceram e que causaram prejuízo considerável ao Autor.


XXIV - Pois ficou provado que pelo menos desde 2019 até à presente data a Ré auferiu os montantes anuais no valor de 5.160,00€ referente às salas 1, 2, 3 e 5, e relativamente à sala 7, perfazendo anualmente 5.560,00€ entregando apenas de renda o valor de 120,00€ mensais.


XXXV - Estão assim reunidos os pressupostos para a condenação da Ré, alínea d) do pedido do Autor, de acordo com os arts. 473.º e 476.º do CC.


XXXVI - Foi assim erradamente aplicado pelo juiz a quo o art. 437.º do CC quando deveria ter sido aplicado o art. 473.º do mesmo dispositivo legal, dado que a lei no caso em apreço não faculta ao Autor, outro meio para que o mesmo possa ser ressarcido.


XXXVII - A consequência natural da resolução de contrato de arrendamento celebrado entre Autor e Réu, por violação da última e com os fundamentos da doutra sentença só podem ter como solução legal os efeitos de retroagir à data da violação do contrato pela Ré coma celebração dos contratos de cedência a terceiros, que remontam como já foi invocado, e consta da matéria provada desde 2021, conforme consta dos factos provados 10 a 14.».


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5. Resposta


A Ré não apresentou contra-alegações ao recurso de apelação do Autor.


O Autor respondeu ao recurso de apelação da Ré defendendo a improcedência deste e, em simultâneo, requereu a ampliação do objecto do recurso desta.


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7. Questão prévia – da in/admissibilidade da ampliação do objecto do recurso


No caso concreto em apreciação, no seu requerimento de ampliação do objecto do recurso, o Autor formulou essencialmente dois pedidos:


1.º- deveria ser deferida a resolução do contrato de arrendamento por falta de pagamento de rendas;


2.º- deveria a Ré ser condenada ao pagamento de todas as rendas até entrega efectiva do imóvel.


Para o efeito, alegou essencialmente a existência de contradição entre a matéria dada como provada e a motivação da sentença quanto aos factos provados dos pontos 28 a 32, bem como, que “desde junho de 2022, até janeiro de 2023 não foram pagas quaisquer rendas, só acabando por pagar 5 meses de renda do ano de 2023, designadamente, os meses de janeiro, abril, maio, junho, julho e agosto, nada mais tendo pago a título de ocupação do imóvel ou rendas (…)”.


A ampliação do âmbito do recurso a requerimento do recorrido encontra-se regulada no art. 636.º, do CPC, que dispõe o seguinte:


1 - No caso de pluralidade de fundamentos da ação ou da defesa, o tribunal de recurso conhece do fundamento em que a parte vencedora decaiu, desde que esta o requeira, mesmo a título subsidiário, na respetiva alegação, prevenindo a necessidade da sua apreciação.


2 - Pode ainda o recorrido, na respetiva alegação e a título subsidiário, arguir a nulidade da sentença ou impugnar a decisão proferida sobre pontos determinados da matéria de facto, não impugnados pelo recorrente, prevenindo a hipótese de procedência das questões por este suscitadas.


3 - Na falta dos elementos de facto indispensáveis à apreciação da questão suscitada, pode o tribunal de recurso mandar baixar os autos, a fim de se proceder ao julgamento no tribunal onde a decisão foi proferida.


Desta norma resulta essencialmente o seguinte2:


1. A parte recorrida pode suscitar nas contra-alegações do recurso a reapreciação das questões em que tenha decaído, prevenindo os riscos de uma eventual resposta favorável do tribunal de recurso às questões que tenham sido suscitadas pelo recorrente ou mesmo a outras questões de conhecimento oficioso (sobre o modo, cf. STJ 16-11-17, 768/08). Não tendo legitimidade para interpor recurso, dado que a decisão final lhe foi favorável, deve, no entanto, ser admitido a integrar no objeto do recurso interposto pela contraparte as questões em que decaiu, por forma assegurar por qualquer das vias a manutenção do resultado final.


2. Também pode alegar, com o mesmo propósito, nulidades da decisão recorrida, na medida em que o seu deferimento possa servir para reforçar a decisão que lhe foi favorável ou evitar a produção do efeito pretendido pelo recorrente.


3. A ampliação do objeto do recurso pode ainda abarcar a impugnação da decisão da matéria de facto que se mostrou desfavorável à parte vencedora, na medida em que daí decorra, ainda que por outra via, a manutenção da decisão recorrida.


Então, a questão que importa resolver é a de saber se a ampliação pretendida pelo Autor, recorrido, do objeto do recurso, feita na sua resposta a este, deve ou não ser admitida.


Vejamos os pedidos do Autor formulados na P.I.:


a) Declarar-se resolvido o contrato de arrendamento referido nos artigos 1º a 5º desta P.I., por comum acordo das partes e com efeitos de 1.07.2021;


b) Se assim se não entender deverá declarar-se a resolução desse mesmo contrato de arrendamento com fundamento na violação no artigo 1083, nº 1, nº 2 alínea c) e nº 3;


c) Mais deve a R. ser condenada a pagar ao A. as rendas vencidas e vincendas desde 1.07.2021 num total de (10 x 120,00 €) = 1.200,00 € (mil e duzentos euros);


d) Deverá ainda a R. ser condenada a entregar ao A. o montante mensal de 500,00 € (quinhentos euros) desde 1.01.2021, e até efectiva entrega do imóvel ao A., correspondente aos valores por ela recebidos injustificadamente, por se tratar de enriquecimento sem causa.


Daqui resulta essencialmente que o Autor pede a declaração de resolução do contrato, a condenação no pagamento rendas vencidas e vincendas e ainda a condenação a entregar ao Autor o montante mensal de 500,00 € (quinhentos euros) desde 01.01.2021 até efectiva entrega do imóvel a este.


Vejamos o dispositivo da sentença:


«Pelo exposto, julgo a presente ação parcialmente procedente, e decido declarar a cessação por resolução do contrato de arrendamento, com fundamento no uso do prédio locado para fim diverso daquele a que se destina e com fundamento na cedência do gozo a terceiros, sem autorização do senhorio.


No mais, vai a Ré absolvida dos pedidos feitos nas alíneas c) e d) da petição inicial (ou da ação).


A Ré interpôs recurso de apelação contra a decisão que declarou resolvido o contrato de arrendamento.


Então, importa distinguir as várias pretensões formuladas pelo Autor na sua ampliação do objecto do recurso:


1º- Entende o Autor que deveria ser deferida a resolução do contrato de arrendamento por falta de pagamento de rendas:


Neste caso o Autor pretende sindicar um dos fundamentos que invocou na sua Petição Inicial conducente ao pedido de resolução do contrato, do qual não pode autonomamente recorrer porque não é parte vencida, já que a sentença decretou efectivamente a resolução do contrato, contudo, sucede que, perante a pluralidade de fundamentos invocados pelo Autor, a sentença fundamentou a resolução do contrato com fundamento no uso do locado para fim diverso daquele a que se destina e ainda com fundamento na cedência do gozo a terceiros sem autorização do senhorio, mas não com fundamento na também invocada falta de pagamento de rendas, por isso, é admissível a ampliação do objecto do recurso interposto pela Ré (esta com fundamento na discordância de ter sido declarada a resolução do contrato) porque se a Ré obtiver vencimento de causa em sede de recurso, assim, apesar do Autor não ser parte vencedora, pode ainda ver deste modo apreciado o terceiro fundamento invocado para se decretar a resolução e que consiste na invocada falta de pagamento de rendas, assim, estão reunidos os pressupostos previstos no art. 636.º, n.º 1 e n.º 2, do CPC, que permitem admitir a ampliação do âmbito do recurso para apurar se deveria ser deferida a resolução do contrato de arrendamento com fundamento na falta de pagamento de rendas.


2.º- Entende o Autor que deveria a Ré ser condenada ao pagamento de todas as rendas até entrega efectiva do imóvel, correspondente ao pedido da al. c) da P.I.:


Este pedido já não é admissível, uma vez que neste caso o Autor já não é parte vencedora mas parte vencida e por isso estava obrigado a interpor recurso autónomo, ou subordinado, mas não o fez.


Aliás, o Autor interpôs recurso autónomo mas apenas da parte da sentença em que foi absolvido do pedido formulado na al. d) do seu petitório (pedido de condenação no pagamento do montante mensal de €500,00 correspondentes aos valores recebidos pela Ré injustificadamente), optando assim voluntariamente por não recorrer da parte da sentença que absolveu o Autor do pedido de condenação das rendas devidas (pedido da al. c)).


A este propósito, pode ser consultado o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 22/06/2022 (Mário Belo Morgado, proc. n.º 4280/17.4T8MTS.P3.S1, www.dgsi.pt3), onde de igual modo se considerou que “A ampliação do objeto do recurso não constitui alternativa à necessidade de interposição de recurso (principal ou subordinado) por parte daquele que fique prejudicado com uma decisão judicial, mas, diferentemente, permitir ao recorrido a reabertura da discussão sobre determinado fundamento por si invocado no processo e que tenha sido julgado improcedente: a ampliação do âmbito do recurso destina-se (apenas) a permitir que o tribunal de recurso possa conhecer de fundamento da ação ou da defesa não considerado ou julgado desfavoravelmente na decisão recorrida que, apesar disso, com base em diverso fundamento, tenha julgado procedente a pretensão do recorrido (assim se prevenindo a possibilidade de, por força do recurso, vir a ser considerado improcedente o fundamento com base no qual este obteve ganho de causa no tribunal a quo).”.


Aliás, importa ainda salientar que, paradoxalmente, no seu recurso de apelação autónomo o Autor aceitou a decisão que agora pretende contrariar:


«29


A Ré foi absolvida do pagamento de rendas porquanto a mesma procedeu ao depósito das mesmas, bem como do pagamento mensal de 500,00€, pois não ficou provado que existiu conversações para manter os subarrendamentos para que a renda fosse alterada para 500,00€.


30


Se nesta parte a douta sentença não merece censura, merece censura pelo contrário não pode o Autor aceitar a absolvição da Ré no pedido do pagamento das importâncias indevidamente recebidas.» [sublinhado nosso].


Deste modo, em suma, admite-se o pedido do Autor de ampliação do âmbito do recurso interposto pela Ré relativamente à reapreciação do fundamento da falta de pagamento de rendas para ser declarada a resolução do contrato de arrendamento e rejeita-se o pedido do Autor de ampliação do recurso interposto pela Ré relativamente à reapreciação do pedido de condenação nas rendas devidas.


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8. Objecto do recurso – Questões a Decidir:


Considerando que o objecto dos recursos está delimitado pelas conclusões neles insertas, salvo as questões de conhecimento oficioso (arts. 608.º, n.º 2, 609.º, 635.º n.º 4, 639.º e 663.º, n.º 2, todos do Código de Processo Civil), não estando o tribunal obrigado a apreciar todos os argumentos apresentados pelas partes para sustentar os seus pontos de vista, sendo o julgador livre na interpretação e aplicação do direito (artigo 5.º, n.º 3, do CPC) – são as seguintes as questões cuja apreciação aquelas convocam:


8.1. Recurso de apelação autónomo da Ré:

– Da nulidade da sentença por condenação em objecto diverso do pedido;

– Da reapreciação jurídica da causa – Dos pressupostos para decretar a resolução do contrato de arrendamento;

– Da ampliação pelo Autor do objecto do recurso de apelação da Ré – Da nulidade da sentença por contradição entre os factos e a motivação;

8.2. Recurso de apelação autónomo do Autor:

– Da nulidade da sentença por omissão de pronúncia;

– Da impugnação da matéria de facto (pontos 10 a 14 dos factos provados);

– Da reapreciação jurídica da causa – Do pedido de condenação da Ré nos valores indevidamente cobrados pela Ré, nos espaços do imóvel a título de enriquecimento sem causa, conforme pedido na alínea d) da PI;

– Da litigância de má fé.

Por questões de precedência lógica serão apreciadas em primeiro lugar as nulidades invocadas, de seguida a impugnação da decisão sobre a matéria de facto e, finalmente, as questões atinentes ao mérito da causa, como segue:

1.ª – Da nulidade da sentença por condenação em objecto diverso do pedido (recurso autónomo da Ré);

2.ª – Da nulidade da sentença por omissão de pronúncia (recurso autónomo do Autor);

3.ª – Da nulidade da sentença por contradição entre os factos e a motivação (ampliação pelo Autor do objecto do recurso da Ré);

4.ª – Da impugnação da matéria de facto dos pontos 10 a 14 dos factos provados (recurso autónomo do Autor);

5.ª – Da reapreciação jurídica da causa – Dos pressupostos para decretar a resolução do contrato de arrendamento (recurso autónomo da Ré);

6.ª – Da reapreciação jurídica da causa – Do pedido de condenação da Ré nos valores indevidamente cobrados pela Ré, nos espaços do imóvel a título de enriquecimento sem causa, conforme pedido na alínea d) da PI (recurso autónomo do Autor);

7.ª – Da litigância de má fé (recurso autónomo do Autor).

*

II. FUNDAMENTAÇÃO

FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

9. É o seguinte o teor da decisão de facto constante da sentença recorrida, destacando-se os factos objecto de dissenso do Recorrente/Autor:


«A. Factos Provados.


Com interesse para a decisão da causa está provado que:


1. Por contrato escrito celebrado em 08.03.2018, BB, deu de arrendamento à "CC, Lda.", uma loja, para comércio, sita na Av. Principal, Lote 11B, n.º 11, 1.º, na ...;


2. O arrendamento foi feito pelo prazo de um ano, com início em 1 de abril de 2018, renovável por iguais e sucessivos períodos;


3. Foi acordada a renda mensal de 120,00 € (cento e vinte euros) a pagar até ao dia 8 do mês anterior a que dissesse respeito;


4. Por escritura pública de Dação em Cumprimento, celebrada em 17.02.2021, BB e a sua mulher, KK, transmitiram para AA, a propriedade da fração arrendada à Ré;


5. O adquirente da fração, AA, constituiu seu procurador, BB, a quem concedeu poderes para praticar quaisquer atos de gestão da fração, nomeadamente, celebrar, denunciar ou resolver contratos de arrendamento;


6. O arrendamento destinou-se ao comércio da segunda outorgante, não podendo ser-lhe dado outro uso sem prévia autorização do senhorio;


7. A arrendatária tem como objeto a mediação imobiliária, compra e venda de bens imobiliários, construção civil, apartamentos mobilados para turistas, alojamento local;


8. A arrendatária não pode fazer obras ou benfeitorias no local arrendado, sem autorização do senhorio dada por escrito;


9. De onde resultou a constituição de 5 (cinco) salas que cedeu a terceiros e pelas quais passou a receber um valor mensal total de 800,00 € (oitocentos euros);


10. As salas, pelo menos até maio de 2021, estavam cedidas aos seguintes cessionários:

Sala 1 - "

Sala 2 - ...

Sala 3 – dra. DD, Advogada

Sala 4 – ... – EE

Sala 5 – ...;

11. Mantendo-se ainda essas salas cedidas, algumas das quais a outros cessionários;


12. Uma dessas salas encontra-se cedida à Solicitadora, FF, e bem assim à ..., a qual se dedica à prestação de serviços na área do Direito Imobiliário, Direito Bancário e Financeira, e Registos e Notariado;


13. Segundo indicação da própria Ré, eram cobrados os seguintes valores, pela cedência das salas:

- Salas 1, 2, 3 e 5 – 150 € acrescidos de IVA, no valor total de 184,50 €, para cada sala

e

- Sala 4 – 200 € acrescidos de IVA, no valor total de 246,00 €;

14. O imóvel arrendado tem sido usado como escritório de advogada, gestão de condomínios, serviços de higiene e segurança no trabalho, sala de estudos, escritório de solicitadora e prestação de serviços na área do Direito Imobiliário, Direito Bancário e Financeira, e Registos e Notariado;


15. A sociedade arrendatária, tem como único sócio LL;


16. O local arrendado havia estado ocupado por um outro inquilino com a atividade ligada à estética e que havia fechado com pladur, do lado de dentro, todas as janelas, e alterado o posicionamento interno das divisórias, também, com pladur;


17. A ré retirou o pladur que fechava as janelas e repôs as divisórias aproximadamente como que constava na planta constantes do processo de construção e licenciamento que havia sido por aquele a esta facultada;


18. As alterações introduzidas pela sociedade ré não incluíram qualquer das portas ou qualquer da janelas pré-existentes, resultantes das obras do anterior inquilino, no local arrendado;


19. Após as obras os espaços resultantes são os que estão desenhados na planta do 1º andar, posteriormente alterados mediante colocação ou retirada de painéis de pladur para conseguir um espaço maior ou para dividir espaço pré-existente, à medida dos interesses e necessidades dos ocupantes;


20. A natureza leve e precária das divisórias em pladur, através da quais se concretizou o que foi desenhado na planta do 1º andar, permitiam essas alterações de espaços mediante deslocação, colocação ou retirada de painéis de pladur;


21. Nos diversos espaços resultantes da divisão interna do local arrendado, desde a celebração do contrato de arrendamento, que a sociedade ré instalou ou permitiu a instalação de estabelecimentos comercias para venda de bens e serviços por terceiros com quem celebrou contratos que designou por contrato de cedência de espaço, mediante um preço, acrescido de IVA;


22. Ao longo do tempo múltiplos estabelecimentos comerciais foram instalados e desinstalados no imóvel arrendado, sendo que estava vigentes, na data da contestação, os contratos de cedência de espaço celebrados com:


- ...;


- ...;


- MM;


- ....;


NN;


e


GG;


23. BB é companheira de LL e ajuda-o no exercício das suas funções de gerente da sociedade ré, sempre atuando nessa qualidade de companheira coadjuvante, nunca como representante da sociedade ré ou do seu gerente;


24. Em 17 junho de 2021, BB mudou a fechadura da porta da rua de acesso ao imóvel e entregou duplicados às pessoas dos estabelecimentos instalados no imóvel arrendado, na altura ali presentes;


25. A sociedade Ré, logo que se apercebeu dessa situação, de imediato, mudou a fechadura e passou a ter o controle da entrada;


26. Posteriormente, após o incidente da mudança de fechadura, BB passou a recusar o recebimento da renda furtando-se ao contacto para a entrega do dinheiro, como era habitual;


27. A Ré, através BB, passou a entregar as quantias das rendas por vales postais endereçados a BB, que os recebeu e fez suas as quantias correspondentes, mediante depósito na sua conta;


28. Estão pagas as rendas vencidas nos meses de julho, agosto e setembro de 2021;


29. A Ré procedeu ao depósito das rendas na Caixa Geral de Depósitos, encarregando como sempre BB;


30. Estão pagas, assim, as rendas dos meses de outubro de 2021 até abril de 2022 sendo que se verifica errada indicação por confusão entre rendas vencidas e mês a que respeitam a rendas;


31. BB, tinha poderes para receber as rendas em representação do autor;


32. A Ré procedeu ao depósito condicional da indemnização de 20% das rendas pagas por vales do correio e depósito na CGD.


*


B. Factos Não Provados.


Com interesse para a decisão da causa não resultou provado que:


1. A Ré por sua e livre iniciativa aumentou o número de divisões do arrendado;


2. O comércio contratualmente autorizado é o comércio a que a inquilina se dedica;


3. A administração da sociedade sempre foi exercida de facto por BB;


4. Em fevereiro/março de 2021 o procurador do A. e os representantes da R., mantiveram conversações, nas quais foi proposto à R. que só poderia manter os subarrendamentos desde que a renda mensal fosse alterada para 500,00 € (quinhentos euros);


5. Não obstante a Ré, ter admitido essa alteração da renda, viria posteriormente a acordar na entrega do arrendado ao A.;


6. Tendo esse facto, também sido comunicado às pessoas a quem haviam sido cedidas as salas do arrendado;


7. A R. comprometeu-se a desocupar o imóvel até ao fim de junho de 2021.».


*


FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA


10. – Da nulidade da sentença por condenação em objecto diverso do pedido (recurso autónomo da Ré):


A Ré/Recorrente considera essencialmente que os fundamentos da sentença para declarar a cessação do arrendamento por resolução são dois:


1º O uso do prédio locado para fim diverso daquele a que se destina; e


2º Cedência do gozo a terceiros, sem autorização do senhorio.


E entende que existiu uma condenação em objecto diverso do pedido no caso do segundo fundamento porque considera que não foi pedido.


Vejamos.


O princípio do dispositivo está plasmado no art. 3.º, n.º 1, do CPC nos termos do qual: O tribunal não pode resolver o conflito de interesses que a ação pressupõe sem que a resolução lhe seja pedida por uma das partes e a outra seja devidamente chamada para deduzir oposição


Na petição, com que propõe a ação, deve o autor, para além do mais, “Formular o pedido” (cfr. art. 552.º, n.º 1, al. e), do CPC).


A propósito da definição de “pedido”, Antunes Varela e outros4, referem que “O pedido é o meio de tutela jurisdicional pretendido pelo autor (o reconhecimento judicial da sua propriedade sobre determinada coisa; a entrega ou restituição dessa coisa; a condenação do réu numa prestação de certo montante; etc.)”, enquanto que “A causa de pedir é o facto concreto que serve de fundamento ao efeito jurídico pretendido”.


E dispõe o art. 609.º, n.º 1, do CPC que “A sentença não pode condenar em quantidade superior ou em objeto diverso do que se pedir.”.


Como refere ainda Alberto dos Reis5, aquelas regras, agora contidas no art. 609.º, do CPC, são corolário do princípio do dispositivo e resultam dos seguintes aforismos da sabedoria antiga: “Ne procedat judex ex officio, ne eat judex ultra petita partium, judex secundum alligata et probata decidere debet”.


Em anotação ao art. 552.º, do CPC, Abrantes Geraldes e outros6, referem com pertinência o seguinte:


«20. A “conclusão” é a parte da petição em que o autor indica a concreta tutela jurisdicional pretendida com a ação, devendo formular expressamente o pedido correspondente. Recordando as hipóteses acima colocadas: o autor pedirá a condenação do réu no pagamento da quantia relativa ao preço em dívida; a condenação da seguradora no pagamento de certo valor a título de indemnização; a resolução do contrato de arrendamento e a consequente condenação do réu a abandonar o locado; a execução específica do contrato-promessa pela prolação de sentença que produza os efeitos da declaração negocial do promitente-vendedor; a condenação do réu na restituição do imóvel; a declaração de nulidade do negócio em causa e, se for o caso, a restituição do que tenha sido prestado; a declaração de nulidade ou anulação do negócio jurídico ou o reconhecimento do direito real.


21. O pedido representa o corolário lógico dos factos descritos na narração, os quais são precisamente o fundamento do pedido, sob pena de ineptidão da petição inicial (art. 186.º, n.º 2, al. b)). É também o pedido que estabelece os limites da sentença, no caso de a ação vir a ser julgada procedente (art. 609.º, n.º 1) (cf. Paulo Pimenta, ob. cit., pp. 156 e 157, e Abrantes Geraldes, Temas cit., pp. 119 e ss., e anot. ao art. 186.º).» [sublinhado nosso].


E em anotação ao art. 609.º, do CPC, Abrantes Geraldes e outros7, referem o seguinte:


«1. As partes, através do pedido (art. 3.º, n.º 1), circunscrevem o thema decidendum, isto é, indicam a providência requerida, não tendo o juiz que cuidar de saber se à situação real conviria ou não providência diversa. Trata-se de uma esfera em que domina o princípio do dispositivo, o qual, em termos paralelos, também vigora em sede da sustentação fáctica da pretensão. Em ambos os casos prevalece a estratégia assumida pelo autor, sem que nela se deva imiscuir o juiz. Consequentemente, a sentença deve inserir-se no âmbito do pedido (e da causa de pedir), não podendo o juiz condenar (ou fazer a apreciação que corresponder ao tipo de ação em causa) em quantidade superior ou em objeto diverso do que se pedir.


2. A prática judiciária revelou situações cuja resolução implicou alguma atenuação da rigidez de tal regra, nos termos que foram objeto de uniformização:


a) No Assento no 4/95: “Quando o tribunal conhecer oficiosamente da nulidade de negócio jurídico invocado no pressuposto da sua validade, e se na ação tiverem sido fixados os necessários factos materiais, deve a parte ser condenada na restituição do recebido, com fundamento no n.º 1 do art. 289.º do CC”;


b) No AUJ no 3/01: “Tendo o autor, em ação de impugnação pauliana, pedido a declaração de nulidade ou anulação do ato jurídico impugnado, tratando-se de erro na qualificação jurídica do efeito pretendido, que é a ineficácia do ato em relação ao autor (n.º 1 do art. 616.º do CC), o juiz deve corrigir oficiosamente tal erro e declarar tal ineficácia, como permitido pelo art. 664.º do CPC [de 1961]” (cf. STJ 4-10-18, 588/12).


3. Mas essa rigidez já foi confirmada noutros arestos uniformizadores:


a) No AUJ no 13/96, depois de uma extensa e documentada conjugação entre o princípio do dispositivo e os limites do pedido, concluiu-se que: “O tribunal não pode, nos termos do art. 661.º, no 1, do CPC [de 1961], quando condenar em dívida de valor, proceder oficiosamente à sua atualização em montante superior ao valor do pedido do autor”.


b) No AUJ no 9/15: “Se o autor não formula na petição inicial, nem em ulterior ampliação, pedido de juros de mora, o tribunal não pode condenar o réu no pagamento desses juros”.


4. Tal não colide obviamente com a necessidade de proferir decisão que se insira nos limites quantitativos ou mesmo qualitativos da pretensão deduzida, assim tendo sido decidido, por exemplo, em STJ 11-2-15, 607/06, num caso em que foi formulado pedido de reconhecimento da titularidade de uma determinada parcela de terreno, acabando a sentença por reconhecer o direito à contitularidade da mesma. Em lugar de se considerar, como decorreria de uma perspetiva formal, que o reconhecimento da contitularidade representaria um objeto diverso do reconhecimento do direito exclusivo sobre a parcela de terreno, assumiu-se que se tratava, em boa verdade, de um minus relativamente ao pedido que o autor formulara, com isto resolvendo o litígio de forma definitiva que, de outro modo, demandaria a instauração de nova ação, agora sustentada na afirmada contitularidade da parcela.


5. Aquele princípio também não tem obstado a que, em ações de responsabilidade civil, perante pedidos parcelares de indemnização, se considere que o limite de cada parcela se reporta ao valor global peticionado. Trata-se, aliás, de jurisprudência corrente e pacífica.».


Então, a consequência da violação do disposto no art. 609.º, n.º 1, do CPC é a nulidade da sentença: é nula a sentença, entre outros casos, quando “O juiz condene em quantidade superior ou em objeto diverso do pedido.” – cfr. art. 615.º, n.º 1, al. e), do CPC.


A propósito do significado e alcance do pedido formulado, Lopes do Rego, no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 07/04/2016 (proc. n.º 842/10.9TBPNF.P2.S1, www.dgsi.pt8) considera que “O que identifica a pretensão material do autor, o efeito jurídico que ele visa alcançar, enquanto elemento individualizador da acção, é o efeito prático-jurídico por ele pretendido e não a exacta caracterização jurídico-normativa da pretensão material, a sua qualificação ou subsunção no âmbito de certa figura ou instituto jurídico, sendo lícito ao tribunal, alterando ou corrigindo tal coloração jurídica, convolar para o decretamento do efeito jurídico adequado à situação litigiosa, sem que tal represente o julgamento de objecto diverso do peticionado.”.


Também Nuno Pinto Oliveira, no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 08/03/2022 (proc. n.º 21074/18.2T8PRT.P1.S1, www.dgsi.pt9) considerou que “Só pode equacionar-se a hipótese de haver nulidade por condenação em objecto diverso do pedido, por alteração da qualificação jurídica, desde que a convolação qualificativa seja tão ampla que conduza a um modo de tutela de conteúdo essencialmente diferente do pretendido pelas partes.”.


Ainda com toda a relevância para o caso concreto, um exemplo paradigmático da nulidade resultante da violação da regra de que a sentença não pode condenar em objecto diverso do pedido é-nos dado por Antunes Varela e outros10, do seguinte modo:


«… no caso de o autor ter requerido, em acção de cumprimento, o pagamento das rendas devidas pelo locatário e a sentença condenar este a despejar o imóvel, por falta de pagamento das rendas vencidas».


Revertendo ao caso concreto, à luz do acima exposto, constata-se que na sua Petição Inicial o Autor alegou os factos concretos que consubstanciam múltiplos fundamentos para poder ser declarada a pedida resolução do contrato de arrendamento:


- Por falta de pagamento de rendas;


- Pelo uso do prédio locado para fim diverso daquele a que se destina; e


- Pela cedência do gozo a terceiros sem autorização do senhorio;


- Por auferir com os subarrendamentos valor bastante superior a 20% da renda.


Perante isto basta ao Autor formular o pedido de resolução do contrato de arrendamento, não necessita de autonomizar um pedido para cada fundamento, sendo irrelevante se o Autor pede a declaração de resolução do contrato referindo expressamente qual o seu fundamento já que, de acordo com a melhor técnica processual, os fundamentos do pedido (a causa de pedir) devem estar contidos no corpo do articulado e não no pedido propriamente dito, configurando uma redundância.


Ou dito de outro modo, o que é relevante é que o pedido de resolução tenha correspondência com os fundamentos invocados pelo Autor, aliás, sob pena de ineptidão da petição inicial (cfr. art. 186.º, do CPC).


Por sua vez, pretendendo o Autor a declaração de resolução do contrato de arrendamento, no caso de procedência do pedido a condenação deve ter correspondência com esse mesmo pedido decretando-se a resolução (estando vedado decretar a sua extinção por caducidade ou denúncia), sendo irrelevante, para efeitos do art. 609.º, n.º 1 ou 615.º, n.º 1, al. e), do CPC, qual o fundamento ou fundamentos em que a mesma se baseou para tal efeito porque aí já estamos no domínio da causa de pedir e não do pedido.


Significando isto que é de igual modo irrelevante que no dispositivo da sentença se decrete a resolução do contrato especificando-se aí quais os fundamentos, já que estes devem estar e estão contidos na parte da fundamentação da sentença.


Além disso, paralelamente, a condenação deve declarar a resolução do contrato de arrendamento apenas com base no fundamento ou fundamentos alegados pelo Autor.


E os fundamentos apenas terão relevância para efeitos de caso julgado ou litispendência.


Nesta sequência, como o pedido formulado pelo Autor é de resolução do contrato de arrendamento, se a sentença declarou precisamente a resolução deste contrato não ocorre o apontado vício.


Ou dito de outro modo, se a sentença declarou a resolução do contrato de arrendamento há uma perfeita correspondência com o pedido formulado, precisamente de resolução do contrato – portanto, não ocorre qualquer condenação em objecto diverso do pedido.


Ao invés, se a sentença declarasse a verificação da denúncia ou caducidade do contrato, então, aí sim, estaria já a ultrapassar o objecto do pedido.


Questão diversa consiste em saber se os motivos ou os fundamentos para tal condenação foram, ou não, alegados pelo Autor, pois, se não foram alegados pelo Autor então aí já estaremos perante o vício do excesso de pronúncia (cfr. art. 615.º, n.º 1, al. d)) e não do vício de condenação em objecto diverso do pedido (cfr. art. 615.º, n.º 1, al. e), do CPC).


Vejamos então se ocorre o vício do excesso de pronúncia, ou seja, se o juiz conheceu de questões de que não podia tomar conhecimento – tratando-se de nulidade de sentença. Por isso de conhecimento oficioso.


No caso concreto, na sua Petição Inicial o Autor alegou os factos concretos que consubstanciam vários fundamentos para poder ser declarada a pedida resolução do contrato de arrendamento:


- Por falta de pagamento de rendas;


- Pelo uso do prédio locado para fim diverso daquele a que se destina; e


- Pela cedência do gozo a terceiros sem autorização do senhorio;


- Por auferir com os subarrendamentos valor bastante superior a 20% da renda.


Então, daqui resulta que os fundamentos em que se baseou a sentença para declarar a resolução foram todos alegados pelo Autor, não se verificando de igual modo a eventual nulidade de excesso de pronúncia.


Questão diversa consiste em saber se os factos alegados integram os fundamentos invocados e se são conducentes aos pedidos formulados, tratando-se já de matéria atinente ao mérito da causa e não ao âmbito da invocada nulidade.


Em suma, não ocorreu a invocada nulidade da sentença por condenação em objecto diverso do pedido porque foi pedida a resolução do contrato e foi decretada precisamente a resolução do contrato, bem como, não houve excesso de pronúncia na sentença porque o Autor alegou todos os factos concretos (a causa de pedir) que fundamentaram a condenação no pedido da sentença.


*


11. – Da nulidade da sentença por omissão de pronúncia (recurso autónomo do Autor):


No âmbito da impugnação da matéria de facto, o Autor alegou que a circunstância da sentença não se ter pronunciado sobre os valores recebidos pela Ré em determinados períodos de tempo e que tal foi devidamente enunciado nos artigos 12.º, 13.º, 14.º e 15.º da Petição Inicial, e por isso entende que a sentença violou o disposto nos artigos 574.º e 615.º, do CPC.


Apesar de sistematicamente inserida pelo Autor na impugnação da matéria de factos, deve ser autonomizada e conhecida previamente a invocação de omissão da invocada omissão de pronúncia por configurar uma nulidade de sentença.


Com relevância para o caso concreto, é nula a sentença, entre outros casos, quando “O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar …” – cfr. art. 615.º, n.º 1, al. d), do CPC.


Vejamos os factos alegados pelo Autor nos artigos 12.º a 15.º sua Petição Inicial:


“12º As salas, pelo menos até Maio de 2021, estiveram arrendadas aos seguintes subarrendatários: (Doc. 6)


Sala 1 - "


Sala 2 - ...


Sala 3 - Dra DD, Advogada


Sala 4 – ... – EE


Sala 5 – ...


13º Mantendo-se ainda essas salas subarrendadas, algumas das quais a outros subarrendatários.


14º Concretamente, uma dessas salas encontrasse actualmente subarrendada à Solicitadora FF, e bem assim a ... a qual se dedica à prestação de serviços na área do Direito Imobiliário, Direito Bancário e Financeira, e Registos e Notariado. (Doc. 6).


15º Segundo indicação da própria Ré, eram cobrados os seguintes valores, pelo subarrendamento das salas:


Salas 1, 2, 3 e 5 – 150 € acrescidos de IVA, no valor total de 184,50 €, para cada sala


Sala 4 – 200 € acrescidos de IVA, no valor total de 246,00 €”.


Vejamos agora os pontos 10 a 14 dos factos provados da sentença:


«10. As salas, pelo menos até maio de 2021, estavam cedidas aos seguintes cessionários:

Sala 1 - "

Sala 2 - ...

Sala 3 – dra. DD, Advogada

Sala 4 – ... – EE

Sala 5 – ...;

11. Mantendo-se ainda essas salas cedidas, algumas das quais a outros cessionários;


12. Uma dessas salas encontra-se cedida à Solicitadora, FF, e bem assim à ..., a qual se dedica à prestação de serviços na área do Direito Imobiliário, Direito Bancário e Financeira, e Registos e Notariado;


13. Segundo indicação da própria Ré, eram cobrados os seguintes valores, pela cedência das salas:

- Salas 1, 2, 3 e 5 – 150 € acrescidos de IVA, no valor total de 184,50 €, para cada sala

e

- Sala 4 – 200 € acrescidos de IVA, no valor total de 246,00 €;

14. O imóvel arrendado tem sido usado como escritório de advogada, gestão de condomínios, serviços de higiene e segurança no trabalho, sala de estudos, escritório de solicitadora e prestação de serviços na área do Direito Imobiliário, Direito Bancário e Financeira, e Registos e Notariado;».


Analisados os factos alegados pelo Autor enunciados nos artigos 12.º a 15.º da Petição Inicial, constata-se claramente que todos eles não só foram tidos em conta na sentença como ainda resultaram provados, sendo assim incompreensível a invocação desta omissão.


Deste modo, sem necessidade de outras considerações, não ocorre a nulidade por omissão de pronúncia invocada pelo Recorrente/Autor.


*


12. – Da nulidade da sentença por contradição entre os factos e a motivação (ampliação pelo Autor do objecto do recurso da Ré):


O fundamento invocado pelo Autor para ver reapreciado o pedido de resolução do contrato também com fundamento na falta de pagamento de rendas devidas estriba-se essencialmente na circunstância de entender que a esse propósito existe contradição entre a matéria de facto dada como provada e a respectiva motivação.


Para tal efeito o Autor faz uma comparação entre os factos provados dos pontos 28 a 32 com a correspondente motivação para daí concluir que não poderia a sentença afirmar que a Ré procedeu ao pagamento das rendas se se esta apenas depositou as rendas de outubro de 2021 até junho de 2022 e desde junho de 2022 até janeiro de 2023 alega que não foram pagas quaisquer rendas, só acabando a Ré por pagar apenas 5 meses do ano de 2023 e nada mais.


Nos termos do disposto no art. 615.º, n.º 1, al. c), do CPC, é nula a sentença, quando “Os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível”.


Analisados os factos provados e a motivação constata-se desde logo que não existe qualquer contradição entre os factos provados indicados e a motivação, senão vejamos:


Factos provados em causa:


28. Estão pagas as rendas vencidas nos meses de julho, agosto e setembro de 2021;


29. A Ré procedeu ao depósito das rendas na Caixa Geral de Depósitos, encarregando como sempre BB;


30. Estão pagas, assim, as rendas dos meses de outubro de 2021 até abril de 2022 sendo que se verifica errada indicação por confusão entre rendas vencidas e mês a que respeitam a rendas;


31. BB, tinha poderes para receber as rendas em representação do autor;


32. A Ré procedeu ao depósito condicional da indemnização de 20% das rendas pagas por vales do correio e depósito na CGD.”.


Motivação correspondente:


A recusa da aceitação do pagamento das rendas e a liquidação das mesmas mediante depósitos bancários liberatórios, na Caixa Geral de Depósitos, à ordem do senhorio conforme documento oito junto com a contestação, e pagamento por vale postal, ficaram provados mediante a confissão do Autor, no artigo 45.º da p.i., e através do documento sete junto com a contestação equivalente a vales do correio das rendas pagas em julho, agosto e setembro de 2021 (factos provados 27. a 30.).


Para além das rendas em singelo, a sociedade Ré procedeu ao depósito condicional da indemnização de 20% das rendas pagas por vales do correio e depósito na CGD, conforme advém do documento oito junto com a contestação (facto provado 32).


Este comportamento da Ré é demonstrador de que a ... quis cumprir quer com o pagamento das rendas quer com as suas eventuais obrigações decorrentes do pagamento da contrapartida monetária do senhorio no âmbito do contrato de arrendamento.”.


Da análise comparativa entre os factos e a motivação não existe qualquer contradição, porque esta expõe a convicção do julgador para dar aqueles factos como provados, compreendendo-se perfeitamente a mesma, nada havendo a apontar.


Importa salientar ainda que os factos provados devem resultar dos factos alegados na Petição Inicial a qual deu entrada em juízo em 22 de abril de 2022 e não os factos que terão alegadamente ocorrido posteriormente e agora alegados pelo Autor em sede de recurso, como sucede com a alegação da falta de pagamento de rendas depois da entrada em juízo da Petição Inicial.


Com efeito, a eventual falta de pagamento de rendas na pendência da acção poderá ser fundamento apenas para instaurar incidente de despejo imediato (cfr. art. 14.º, n.º 5, da Lei n.º 6/2006, de 27/02), que, aliás, foi deduzido e julgado improcedente nos presentes autos (cfr. decisão proferida em 25/10/2024).


Deste modo, improcede a nulidade invocada de contradição entre os factos e a motivação (cfr. art. 615.º, n.º 1, al. c), do CPC).99


Em consequência, de igual modo, em face da factualidade provada não poderia ter sido outra a fundamentação jurídica e decisão final.


*


13. – Da impugnação da matéria de facto dos pontos 10 a 14 dos factos provados (recurso autónomo do Autor):


A impugnação da decisão sobre a matéria de facto está sujeita a determinadas regras ou ónus sob pena de rejeição e o incumprimento destas regras também deve ser oficiosamente conhecido.


Dispõe o art. 640.º, do CPC, sob a epígrafe “Ónus a cargo do recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto”, o seguinte:


1 – Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:


a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;


b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;


c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.


2 – No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:


a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes;


b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes.


3 – O disposto nos 1 e 2 é aplicável ao caso de o recorrido pretender alargar o âmbito do recurso, nos termos do no 2 do artigo 636.º.


Então, daqui resulta desde logo que o recorrente tem de especificar obrigatoriamente, sob pena de rejeição:


1.º - Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;


2.º - Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;


3.º - A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas;


4.º - E quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes.


A previsão destes ónus tem razão de ser, quer para garantia do contraditório, quer para efeito de rigorosa delimitação do objeto do recurso, até porque o sistema consagrado não admite recursos genéricos contra a decisão da matéria de facto, não é compreensível que a verificação do cumprimento de tais ónus se transforme num exercício meramente burocrático11.


É objeto de debate saber se os requisitos do ónus impugnatório devem figurar apenas no corpo das alegações ou se também devem ser levados às conclusões sob pena da rejeição do recurso. O Supremo tem vindo a sedimentar como predominante o entendimento de que as conclusões não têm de reproduzir (obviamente) todos os elementos do corpo das alegações e, mais concretamente, que a especificação dos meios de prova, a indicação das passagens das gravações e mesmo as respostas pretendidas não têm de constar das conclusões, diversamente do que sucede, por razões de objetividade e de certeza, com os concretos pontos de facto sobre que incide a impugnação (STJ 9-6-16, 6617/07, STJ 31-5-16, 1572/12, STJ 28-4-16, 1006/12STJ 11-4-16, 449/410, STJ 19-2-15, 299/05 e STJ 27-1-15, 1060/07). O STJ tem afirmado que, na verificação do cumprimento dos ónus de alegação previstos no art. 640.º, os aspetos de ordem formal devem ser modelados em função dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade (STJ 18-1-22, 701/19, STJ 6-5-21, 618/18, STJ 11-2-21, 4279/17, STJ 12-7-18, 167/11 e STJ 21-3-18, 5074/15)12.


No caso concreto em apreciação, o Autor inicia as conclusões discordando dos factos dados como provados nos pontos 10 a 14 da sentença, que, aliás, elenca, contudo, fornece as razões da discordância apenas dos pontos 10, 12 e 13 e nem no corpo das alegações especifica a decisão que em seu entender deveria ser proferida quanto aos pontos 11 e 14.


Nas conclusões entende que o ponto 12 devia ter a seguinte redacção:


“Provado que a Ré celebrou contrato de cedência de espaço sala 7 com a Dra. GG e bem assim à plataforma ..., a qual se dedica á prestação de serviços na área do Direito Imobiliário, Direito Bancário e Financeira e Registos e Notariado desde dezembro de 2021 e que paga o valor de 350,00€ euros acrescidos de IVA até á data em que foi ouvida em julgamento.”.


Quanto aos pontos 10 a 13 refere o Autor apenas que devia “dar como provados os valores dos montantes recebidos pela Ré dos Cessionários” e que sejam tidos em conta os factos constantes dos artigos 12.º a 14.º da P.I.


E apenas no corpo das alegações consta qual a redacção que o Autor entende deve ser dada aos impugnados pontos 10 e 13:


“10 - Provado que a Ré cedeu á cessionária Dra. DD a sala número 3 desde 2019 até setembro de 2021 e que pagava à Autora o valor de 150,00€ acrescidos de IVA no valor total de 184,50€.”.


“13- Provado que os cessionários ... pagava a quantia de 200.00 acrescidos de IVA com contrato de cedência à data em que foram ouvidos em julgamento e, ... e OO se encontravam à data do julgamento com contrato de cedência das salas e que cada um pagava a quantia de 150,00€ acrescidos de IVA.”.


Contudo, todos os demais factos que o Autor pretende ver provados não foram oportunamente por si alegados nos articulados. Senão vejamos:


O ponto 10 dos factos provados da sentença corresponde precisamente aos artigos 12.º e 15.º da Petição Inicial, agora o Autor pretende alterar/acrescentar datas.


O ponto 12 dos factos provados da sentença corresponde precisamente ao art. 14.º da Petição Inicial, agora o Autor pretende que se acrescentem os seguintes factos:


“…desde dezembro de 2021 e que paga o valor de 350,00€ euros acrescidos de IVA até á data em que foi ouvida em julgamento.”.


O ponto 13 dos factos provados da sentença corresponde precisamente aos artigos 12.º e 15.º da Petição Inicial, agora o Autor pretende que se acrescentem os seguintes factos:


“…os cessionários ... pagava a quantia de 200.00 acrescidos de IVA com contrato de cedência à data em que foram ouvidos em julgamento ...”.


Com efeito, os referidos factos invocados apenas em sede de recurso são factos novos, mesmo admitindo a hipótese abstracta de que pudessem resultar da prova produzida, não foram oportunamente alegados na Petição Inicial, por isso, não podem agora ser tidos em conta.


Então, como de igual modo se decidiu em recente Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 05/12/2024 (Carlos Portela, proc. n.º 9375/22.0T8VNG.P1,www.dgsi.pt13), os factos novos de que a parte não fez oportunamente uso no processo, não podem ser trazidos por ela aos autos apenas em sede de recurso.


Em suma, rejeita-se na totalidade a impugnação da decisão da matéria de facto pretendida pelo Autor.


*


14. – Da reapreciação jurídica da causa – Dos pressupostos para decretar a resolução do contrato de arrendamento (recurso autónomo da Ré):


Na fundamentação da sentença consta o seguinte a este propósito:


«Em face da factualidade dada por assente vemos o contrato de arrendamento celebrado entre a R. e BB, o qual passou, entretanto, a propriedade do locado para o A., AA, deve ser declarado extinto por resolução com fundamento em uso para fim diferente do destinado e constante do contrato, sem autorização prévia do senhorio – artigos 1038.º, n.º 1 alínea c), 1047.º e 1067.º, n.º 1 ex vi do artigo 1108.º, todos, do Código Civil.


Nenhuma autorização escrita se mostra junta à presente ação judicial, em aditamento ao contrato de arrendamento, que legitime a Ré a exercer a atividade de cedência de espaços, com gerência das partes comuns aos mesmos e pagamento dos consumos de eletricidade, internet, água de cada espaço cedido e da limpeza das partes comuns.


O destino dado no contrato de arrendamento é para comércio e a R. não exerce o seu comércio no locado, como já acima vimos, pois, tal atividade, exercida pela Ré no locado, não está prevista no respetivo objeto social.


Existe, igualmente, fundamento de resolução do contrato com base na cedência do gozo do locado a terceiros, sem autorização prévia do senhorio, AA consubstanciada nos referidos contratos de cedência de espaço em relação aos quais não existe autorização expressa pelo senhorio e nada quanto a tais contratos foi comunicado por escrito ao senhorio nem mesmo ao anterior senhorio, PP, nos termos do artigo 1038.º, n.º 1 alíneas f) e g) e 1047.º ex vi do artigo 1108.º, todos, do Código Civil, não sendo um caso de reconhecimento por este a que alude o disposto no artigo 1049.º do Código Civil.».


A Ré/Recorrente discorda, alegando essencialmente que “a celebração múltipla, no mesmo local arrendado, de contratos de locação financeira designados de cedência de espaço não constitui uma atividade económica suscetível de ser considerada comércio da sociedade inquilina, pela razão de ser das coisas, no caso, a celebração de contratos e atividade económica (de prestação de serviços), e por a celebração múltipla de contratos de locação de estabelecimento não estar incluída na classificação legal de atividades económicas” e ainda que “Os contratos de cedência de espaço celebrados entre a inquilina e terceiros configuram um contrato de locação de estabelecimento e estão submetidos a regime próprio que os afasta da verificação do fundamento da cedência do gozo do locado de forma … ilícita, inválida ou ineficaz perante o senhorio…”.


Para estribar a sua posição jurídica a Ré invocou a seguinte jurisprudência:


- Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 28/12/2012 (Teresa Pardal, proc. n.º 1289/09.5TBFUN.L1-6, www.dgsi.pt14), onde se sumariou o seguinte:


1. O contrato de arrendamento comercial e o contrato de cessão de exploração (ou de locação de estabelecimento) são diferentes, na medida em que o primeiro consiste na cedência temporária do gozo de um imóvel mediante retribuição, com o fim de aí ser exercida uma qualquer actividade comercial ou industrial, enquanto o segundo consiste na cedência temporária, mediante retribuição, da unidade económica constituída por um determinado estabelecimento comercial, do qual faz parte a fruição do imóvel onde ele está instalado.


2. Para que o contrato seja qualificado como de cessão de exploração, é essencial que se pretenda a manutenção pelo cessionário da exploração do estabelecimento no respectivo ramo de actividade e que a transmissão seja acompanhada de elementos que integram o estabelecimento, mas não é necessário que o estabelecimento já tenha funcionado antes ou já esteja completo.


3. Antes do NRAU (Lei 6/2006 de 27/2), no âmbito dos artigos 1083º e seguintes do código civil na redacção anterior ao RAU (DL 321-B/90 de 15/10) e no âmbito do próprio RAU, não se aplicavam ao contrato de cessão de exploração as regras de denúncia próprias do contrato de arrendamento.


4. É um contrato de cessão de exploração aquele em que as partes declaram expressamente que cedem e aceitam a exploração de fracções de um prédio urbano para uma actividade hoteleira, encontrando-se as fracções equipadas com electrodomésticos para o efeito e mencionando-se ainda que há a possibilidade de renovar o contrato no fim do prazo e tendo a cessionária passado a explorar as fracções nos termos acordados.


4.[5.] É nulo por preterição da forma legal, o contrato de cessão de exploração celebrado em 1973 mediante um documento particular simples, pois à data o artigo 89º k) do código do notariado exigia a outorga de escritura pública.


- Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 27/04/2017 (Luís Cravo, proc. n.º 443/11.4TBSRT.C1, www.dgsi.pt15), onde se sumariou o seguinte:


1. O âmbito mínimo ou necessário na transmissão de um estabelecimento comercial, seja por via de trespasse seja por via de locação de estabelecimento, tem de possuir uma concordância temática com o estabelecimento que é transmitido, isto é, no estabelecimento transmitido têm de estar presentes os traços definidores e distintivos da actividade que aí era exercida, donde, o enquadramento da situação ajuizada (“estabelecimento de café e mercearias”) tem de ser feito à luz da realidade comercial vivida na década dos anos 90 do séc.XX, numa aldeia do interior da zona centro do País, onde a insipiência e a rudimentaridade do exercício dessa actividade comercial, era evidente.


2. Assim, importa dar-se resposta positiva – em termos de qualificação sobre ter ou não havido “locação de estabelecimento comercial” – mesmo quando nos termos e para os efeitos dessa transmissão do estabelecimento, a sociedade locatária unicamente passou a ter “à sua disposição para sua utilização um balcão frigorífico, mesas e cadeiras, máquina de café, copos e chávenas”.


3. A cessão de exploração pode recair sobre um estabelecimento de que nada ainda existe, como sobre um estabelecimento incompleto, que não está concluído, mas em via de formação bem como sobre um estabelecimento cuja exploração ainda se não tenha iniciado ou esteja interrompida.


- Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 27/09/2018 (Alcides Rodrigues, proc. n.º 1817/16.0T8VRL.G1, www.dgsi.pt16), onde se sumariou o seguinte:


I - A cessão de exploração de estabelecimento comercial – também chamada de locação de estabelecimento – é um contrato pelo qual o titular do estabelecimento proporciona a outrem, onerosa e temporariamente, o gozo e fruição do estabelecimento como um todo, integrando todos os elementos materiais e não materiais, ou seja, a sua exploração mercantil, demitindo-se o cedente ou locador temporariamente do exercício da actividade comercial e passando esta a ser assumida pelo cessionário ou locatário.


II - Configura um contrato de cessão de exploração de estabelecimento ou locação de estabelecimento, o contrato pelo qual uma das partes cede à outra, por determinado prazo e mediante pagamento duma contrapartida mensal, o direito de exploração de estabelecimento comercial de confeitaria, mercearia e snack-bar, transferindo para esta última todo o mobiliário e utensílios que o compõem indispensáveis ao seu funcionamento.


III - Compete ao cessionário fazer a prova do pagamento da prestação mensal devida como contrapartida da cessão de exploração (art. 342º, n.º 2 do Cód. Civil).


É preciso notar que em todos os casos concretos subjacentes aos Acórdãos citados pela Ré/Recorrente está sempre em causa a transmissão da exploração de um titular único para outro titular único e de todo o espaço existente para exercício de certa actividade comercial concreta e única, ao contrário do que sucede no caso concreto em que um único titular originário divide o espaço em várias salas e transmite cada uma das salas a terceiros para o exercício das mais diversas actividades diferenciadas por todos eles, ou seja, não se transmite qualquer estabelecimento comercial pré-existente.


Então não existe qualquer similitude do caso concreto com os casos tratados nos mencionados Acórdãos.


De todo o modo, talvez por lapso, a Ré/Recorrente começou por alegar estar em causa a celebração múltipla, no mesmo local arrendado, de “contratos de locação financeira designados de cedência de espaço”, pois, é patente que no caso concreto não estão em causa contratos de locação financeira (Decreto-Lei n.º 149/95, de 24 de junho, com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 265/97, de 2 de outubro, Decreto-Lei n.º 285/2001, de 3 de novembro, e Decreto-Lei n.º 30/2008, de 25 de fevereiro) já que a Ré não é uma instituição de crédito.


Coisa diferente é saber se estamos perante contratos de cessão de exploração de estabelecimento, como também alegou a Ré/Recorrente, ou antes contratos de subarrendamento, como entende o Autor.


A este propósito, decidiu-se no Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 28/09/2006 (João Marques, proc. n.º 891/06-2, 17www.dgsi.pt18) o seguinte:


«Tendo sido transmitido o espaço onde funcionava um estabelecimento comercial, ainda que acompanhado de alguns móveis e utensílios, mas já não da mercadoria, empregados e freguesia, tendo sido alterada a própria denominação, não deparamos com a transmissão dum estabelecimento considerado como universalidade e, consequentemente, não pode falar-se numa cessão de exploração dum estabelecimento comercial, mas sim duma sublocação.».


Com efeito, no caso concreto em apreciação a Ré não transmitiu qualquer estabelecimento comercial que possuía a terceiros, enquanto unidade económica composta de vários elementos como móveis, utensílios, mercadoria, empregados, freguesia, know-how, entre outros, como uma universalidade, mas antes e tão somente a Ré cedeu o espaço a terceiros através de múltiplos contratos, aliás, como a própria admite, para que estes ali exercessem, cada um deles, as suas respectivas actividades de que já era titulares, como resulta dos factos provados, por isso, não se trata de cessão de estabelecimento comercial mas antes cedência não autorizada do gozo do imóvel, ou seja, de sublocação (cfr. artigos 1022.º e 1060.º, do Código Civil).


Importa referir que qualificar a cedência de espaços a terceiros como actividade económica apenas releva para efeitos fiscais e não para a economia da presente decisão.


Deste modo, em suma, pela sua gravidade e consequências, é fundamento de resolução do contrato, por ser inexigível a sua manutenção, a cessão do gozo do prédio em causa, ilícita, inválida e ineficaz perante o Autor, ao abrigo do disposto no art. 1083.º, n.º 1, al. e), do Código Civil.


Finalmente, a Ré alegou ainda que afinal se cedeu o espaço a terceiros não está a exercer no locado a sua actividade por isso entende que não se pode afirmar que o usa para fim diverso como outro fundamento da resolução do contrato.


Contudo, a apreciação desta questão e das demais questões subjacentes, fica prejudicada em consequência da resposta dada à anterior questão, ou seja, já vimos que existe fundamento legal para ser declarada a resolução do contrato nos termos referidos.


Em suma, improcede o recurso de apelação interposto pela Ré.


*


15. – Da reapreciação jurídica da causa – Do pedido de condenação da Ré nos valores indevidamente cobrados pela Ré, nos espaços do imóvel a título de enriquecimento sem causa, conforme pedido na alínea d) da PI (recurso autónomo do Autor):


A este propósito o Autor alegou essencialmente que a alteração das circunstâncias prevista no art. 437.º, do CPC, não tem aplicação ao caso concreto, porquanto não existiram alterações anormais das circunstâncias em que as partes contrataram, mas sim o incumprimento da Ré do contrato de arrendamento por culpa exclusiva da mesma, que sem qualquer autorização (conforme fundamentação da sentença) e com o intuito de tirar proveito da sua posição de arrendatária e à custa do património do credor numa atitude de abuso do direito fez suas quantias avultadas que a enriqueceram e que causaram prejuízo considerável ao Autor, pois ficou provado que pelo menos desde 2019 até à presente data a Ré auferiu os montantes anuais no valor de 5.160,00€ referente às salas 1, 2, 3 e 5, e relativamente à sala 7, perfazendo anualmente 5.560,00€ entregando apenas de renda o valor de 120,00€ mensais, estando assim reunidos os pressupostos para a condenação da Ré, alínea d) do pedido do Autor, de acordo com os arts. 473.º e 476.º do CC, que foi assim erradamente aplicado pelo juiz a quo o art. 437.º do CC quando deveria ter sido aplicado o art. 473.º do mesmo dispositivo legal, dado que a lei no caso em apreço não faculta ao Autor, outro meio para que o mesmo possa ser ressarcido.


Na fundamentação da sentença, a este propósito, escreveu-se o seguinte:


«No que respeita ao pedido de condenação da R. a entregar ao A. o montante mensal de 500,00 € (quinhentos euros) desde 01.01.2021, e até efetiva entrega do imóvel ao A., correspondente aos valores por ela recebidos injustificadamente, por se tratar de enriquecimento sem causa; deve improceder, desde logo, porque não se ficou provado que em fevereiro/março de 2021 o procurador do A. e os representantes da R., mantiveram conversações, nas quais foi proposto à R. que só poderia manter os subarrendamentos desde que a renda mensal fosse alterada para 500,00 € (quinhentos euros) e dado que não se provou que não obstante a Ré, ter admitido essa alteração da renda, viria posteriormente a acordar na entrega do arrendado ao A., nomeadamente pela inexistência de escrito.


Posto isto não se mostra verificado qualquer enriquecimento sem causa por parte da Ré – artigo 437.º, n.º 1, a contrario, do Código Civil – sendo que aqui seria mais apropriado o enquadramento previsto no artigo 1053.º do Código Civil para peticionar o pagamento do valor equivalente à renda após a cessação do contrato de arrendamento, mas que também não tem aplicação ao caso concreto porque não se provou a extinção do contrato acordada pelas Partes.».


Então, está em causa saber se a circunstância do arrendatário receber de terceiros pela cedência do espaço locado um montante mensal de €800,00 enquanto paga de renda ao Autor apenas a quantia de €120,00, preenche os pressupostos do instituto do enriquecimento sem causa previstos no art. 473.º, e ss., do Código Civil.


Apreciando.


Sobre o enriquecimento sem causa, dispõe o art. 473.º, Código Civil, sob a epígrafe “princípio geral”, o seguinte:


1. Aquele que, sem causa justificativa, enriquecer à custa de outrem é obrigado a restituir aquilo com que injustamente se locupletou.


2. A obrigação de restituir, por enriquecimento sem causa, tem de modo especial por objecto o que for indevidamente recebido, ou o que for recebido por virtude de uma causa que deixou de existir ou em vista de um efeito que não se verificou.


Por sua vez, nos termos do disposto no art. 474.º, do Código Civil, sob a epígrafe “natureza subsidiária da obrigação”: Não há lugar à restituição por enriquecimento, quando a lei facultar ao empobrecido outro meio de ser indemnizado ou restituído, negar o direito à restituição ou atribuir outros efeitos ao enriquecimento.


Daqui resulta que a obrigação de restituição com fundamento no enriquecimento sem causa depende essencialmente da verificação de quatro pressupostos ou condições19:


Condições de ordem económica:

1. O enriquecimento – a obtenção de uma vantagem patrimonial, aumento do activo ou diminuição do passivo;

2. O empobrecimento – é sempre uma perda que tanto pode consistir num dispêndio em dinheiro, num sacrifício ou num serviço susceptíveis de avaliação pecuniária;

3. Nexo de causalidade entre o enriquecimento e o empobrecimento – o enriquecimento tem de ser obtido à custa do correlativo empobrecimento de outrem20;

Condições de ordem jurídica:

4. Ausência de causa justificativa – isto é, sem existir uma relação ou um facto que, à luz do direito, da ordenação jurídica dos bens ou dos princípios aceites pelo ordenamento jurídico, legitime tal enriquecimento21.


A ausência de causa justificativa subdivide-se, por sua vez, em três possibilidades (cfr. art. 473.º, n.º 2):


- Se a causa justificativa nunca existiu, então a obrigação de restituir tem por objecto o que for indevidamente recebido (ausência total de causa justificativa).


- Se a causa justificativa existia inicialmente, então a obrigação de restituir tem por objecto o que for recebido por virtude de uma causa que entretanto deixou de existir (ausência superveniente de causa justificativa).


- Se a causa justificativa era a produção de um efeito, então a obrigação de restituir tem por objecto o que for recebido tendo em vista um efeito que afinal não se verificou (a ausência de causa justificativa por falta de verificação dos efeitos pretendidos).

5. Ausência de acção apropriada – carácter subsidiário da acção para obter a restituição com base no enriquecimento sem causa, isto é, o autor só pode lançar mão desta acção quando não pode socorrer-se de qualquer outra (cfr. citado art. 474.º), o que implica uma análise jurídica do ordenamento jurídico no seu conjunto para assim se poder aquilatar da inexistência de outro mecanismo que não o enriquecimento sem causa.


Finalmente, importa referir que o ónus da prova das referidas condições compete ao autor por serem condições constitutivas do direito.


Com efeito, como se decidiu no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 29/04/201422 «A falta originária ou subsequente da causa justificativa do enriquecimento assume a natureza de elemento constitutivo do direito, pelo que, entregue uma quantia a uma pessoa e não tendo esta efectuado a restituição dessa importância, a simples prova da entrega não pode servir de fundamento para pedir a sua restituição, cabendo antes ao autor do pedido de restituição, por enriquecimento sem causa, o ónus da prova dos respetivos factos integradores ou constitutivos, incluindo a falta de causa justificativa desse enriquecimento, mesmo em caso de dúvida, cujo incumprimento se resolve em seu desfavor.».


No mesmo sentido se decidiu no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 02/07/200923.


Vejamos:


No caso concreto em apreciação, considerando que a Ré paga de renda ao Autor €120,00 mensais pelo arrendamento do locado e recebe de terceiros a quantia mensal de €800,00 pelo mesmo espaço significa que a Ré obtém a vantagem patrimonial correspondente à diferença daqueles montantes, ou seja, a quantia de €680,00 mensais – verificando-se consequentemente o enriquecimento da Ré e o correspondente empobrecimento do Autor à custa daquela, ou seja, verifica-se o nexo de causalidade entre o enriquecimento e o empobrecimento.


Por sua vez, não existe uma relação que, à luz do direito legitime tal enriquecimento, antes pelo contrário, é proibido pelo disposto no art. 1062.º, do Código Civil – verificando-se assim que não existe uma causa justificativa.


Finalmente, não existe outro mecanismo legalmente previsto para o Autor obter a restituição daquelas quantias, já que, apesar ser fundamento de resolução do contrato de arrendamento, já vimos que este seria sempre resolvido com outros fundamentos como ainda não prevê qualquer norma para impor a restituição devida - verificando-se assim a ausência de acção apropriada para o efeito.


No mesmo sentido em situação semelhante se decidiu no Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 28/09/2006 (João Marques, proc. n.º 891/06-2, www.dgsi.pt24), onde se considerou o seguinte:


«(…) Se aqueles que sublocaram tal espaço, sem autorização dos senhorios, perceberam uma quantia superior à renda que continuaram a pagar, terão que indemnizar os senhorios num montante correspondente àquilo que recebiam, sob pena de se locupletarem à custa alheia.


(…) Assim, não lhe tendo sido conferida a faculdade de sub-locarem, não podem obviamente beneficiar do direito a perceberem os frutos civis decorrentes da sub-locação, por isso que os mesmos só ao proprietário pertencem.


É este aliás, o entendimento que claramente transparece do acórdão do STJ de 22.05.2001, in CJ, STJ, Ano IX, Tomo 2, pag. 95-96, quando nele se afiram ser a fruição precisamente o aproveitamento dos frutos e produtos de uma coisa, seja de frutos materiais, seja de frutos jurídicos, e que "apenas integrando o contrato de locação em causa a restrição resultante dos seus próprios termos ao exercício daquele direito de fruição, esta mantém a sua plenitude e exclusividade na titularidade do proprietário, comprimida apenas pelos termos daquele contrato".


Resumindo, os apelantes estão a enriquecer-se por via de uma sub-locação ilícita, porque não autorizada, sem qualquer causa justificativa, com consequente empobrecimento dos senhorios, ao não receberem os rendimentos a que só eles têm direito.


Neste contexto, devem os apelantes, obviamente, restituir aos AA. o indevidamente recebido, ou seja a diferença entre o que lhes pagam a título de renda (€ 390,50) e o que vêm recebendo da R. “F” (€ 875), contexto em que nada há a censurar à correspondente condenação decretada na sentença.».


Em suma, estão verificados todos os pressupostos do enriquecimento sem causa, por isso, tem o Autor direito de obter da Ré a restituição de todas as quantias com que se locupletou à custa do Autor e, em consequência, de obter a condenação desta a pagar ao Autor não a mencionada quantia de €680,00 mensais, mas antes, no pedido formulado pelo Autor: “o montante mensal de 500,00 € (quinhentos euros) desde 1.01.2021, e até efectiva entrega do imóvel ao A.”, sob pena de ser excedida a quantia pedida, o que é proibido pelo disposto no art. 609.º, n.º 1, do CPC.


Em suma, na sequência de todo o exposto, verificam-se todos os pressupostos do enriquecimento sem causa e por isso a Ré está obrigada a restituir ao Autor a quantia de €500,00 (quinhentos euros) mensais desde 01/01/2021 até efectiva entrega do imóvel ao Autor.


*


16. – Da litigância de má fé (recurso autónomo do Autor):


O Autor entende que a Ré actuou com litigância de má fé, contudo, atento o disposto no art. 542.º, n.º 2, do CPC, constata-se que a Ré se limitou a exercer os direitos de defesa previstos na Lei e na Constituição, não actuando com litigância de má fé, nem com negligência grave nem com dolo.


*


17. Responsabilidade Tributária


As custas do recurso de Apelação da Ré são da responsabilidade desta.


As custas do recurso de Apelação do Autor são da responsabilidade do Autor e da Ré, na proporção de metade.


*


III. DISPOSITIVO


Nos termos e fundamentos expostos,

1. Acordam os Juízes da 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora em julgar totalmente improcedente o recurso de apelação interposto pela Recorrente/Ré.

2. Acordam os Juízes da 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora em julgar parcialmente procedente o recurso de apelação interposto pelo Recorrente/Autor e, em consequência revogar parcialmente a sentença nos seguintes termos:

– Mantém-se a decisão que declarou a resolução do contrato de arrendamento;

– Mantém-se a decisão que absolveu a Ré do pedido formulado na al. c);

– Condena-se a Ré a restituir ao Autor a quantia de €500,00 (quinhentos euros) mensais desde 01/01/2021 até efectiva entrega do imóvel ao Autor.

3. Custas do recurso de Apelação da Ré da responsabilidade desta.

4. Custas do recurso de Apelação do Autor da responsabilidade do Autor e da Ré, na proporção de metade.

5. Registe e notifique.


*


Évora, data e assinaturas certificadas

Relator: Filipe César Osório

1.º Adjunto: António Fernando Marques da Silva

2.º Adjunto: Maria Adelaide Domingos

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1. Manteve-se a numeração romana como no original, destacando-se que passa de XX para XI e de XVIII para XXX.↩︎

2. Abrantes Geraldes e outros, CPC Anotado, Vol. I, Almedina, pág. 823.↩︎

3. https://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/d8271931b452e7268025886e0036a553?OpenDocument↩︎

4. Antunes Varela e outros (Manuel de Processo Civil, 2.ª ed., 1985, pág. 245)↩︎

5. Alberto dos Reis (CPC Anotado, Vol. V, Coimbra Editora, pág. 51 e ss.)↩︎

6. Abrantes Geraldes e outros, CPC Anotado, Vol. I., Almedina, pág. 658 e ss.↩︎

7. Abrantes Geraldes e outros, ob. cit., pág. 783 e ss.↩︎

8. Acessível: https://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/144a6d40060b5b6c80257f920036c5fe?OpenDocument↩︎

9. Acessível: https://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/4fab4024455cc32a8025880000349e15?OpenDocument↩︎

10. Antunes Varela e outros (Manual de Processo Civil, 2.ª ed., Coimbra Editora, pág. 691)↩︎

11. António Abrantes Geraldes e outros, CPC Anotado, Vol. I, Almedina, 2022, pág. 831.↩︎

12. António Abrantes Geraldes e outros, ob. cit., pág. 832.↩︎

13. https://www.dgsi.pt/jtrp.nsf/56a6e7121657f91e80257cda00381fdf/f46c70c8d4b8931880258c030038a666?OpenDocument↩︎

14. Acessível: https://www.dgsi.pt/jtrl.nsf/-/F64A68CCB2392E8580257A69003576CF↩︎

15. Acessível: https://www.dgsi.pt/jtrc.nsf/c3fb530030ea1c61802568d9005cd5bb/409174d90c7876df80258121004f6378?OpenDocument↩︎

16. Acessível: https://www.dgsi.pt/jtrg.nsf/86c25a698e4e7cb7802579ec004d3832/9259312ff87f88a88025832b0030dcbd?OpenDocument↩︎

17. Acessível: https://www.dgsi.pt/jtre.nsf/134973db04f39bf2802579bf005f080b/af3419ef8fc44a1b80257de100574935?OpenDocument↩︎

18. Acessível: https://www.dgsi.pt/jtre.nsf/134973db04f39bf2802579bf005f080b/af3419ef8fc44a1b80257de100574935?OpenDocument↩︎

19. L.P. Moitinho de Almeida, Enriquecimento sem Causa, 3.ª ed., Almedina, pág. 51.↩︎

20. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 29/05/2007, relatado por Azevedo Ramos, proc. n.º 07A1302, www.dgsi.pt.↩︎

21. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 20/09/2007, relatado por João Bernardo, proc. n.º 07B2156, www.dgsi.pt.↩︎

22. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 29/04/2014, relatado por Hélder Roque, processo n.º 246/12.9T2AND.C1.S1, www.dgsi.pt.↩︎

23. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 02/07/2009, relatado por Serra Baptista, processo n.º 123/07.5TJVNF.S1, www.dgsi.pt.↩︎

24. Acessível: https://www.dgsi.pt/jtre.nsf/134973db04f39bf2802579bf005f080b/af3419ef8fc44a1b80257de100574935?OpenDocument↩︎