PROCESSO DE EXPROPRIAÇÃO
INDEMNIZAÇÃO
RECURSO INTERPOSTO PELA EXPROPRIANTE
LAUDO ARBITRAL
LAUDO PERICIAL
REFORMATIO IN PEJUS
Sumário

Entendendo o tribunal que a avaliação correta é a realizada no laudo maioritário dos peritos (os nomeados pelo tribunal, mais o perito da expropriada), não pode, depois, aplicar ao laudo de arbitragem um dos parâmetros constante do laudo pericial maioritário, se tal operação conduzir à fixação de um valor inferior para as parcelas expropriadas, contrário ao valor que o tribunal entende ser o correto, isto é, ao indicado no laudo pericial maioritário, que o tribunal só não aplicou ao caso, devido ao princípio da proibição da reformatio in pejus.
(Sumário elaborado pelo Relator)

Texto Integral

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Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra,


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Juiz relator……………...Alberto Augusto Vicente Ruço

1.º Juiz adjunto….……..José da Fonte Ramos

2.º Juiz adjunto…………João Manuel Moreira do Carmo


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Sumário: (…)

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Recorrente ………………….Município de Viseu;

Recorrido……………………A... – SGPS S. A.


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I. Relatório

a) O presente recurso insere-se num processo de expropriação e respeita à indemnização a atribuir pelas parcelas nº s 1 e 2, destinadas à construção da obra denominada «Alargamento do Troço da EN 229 – Rotunda do Matadouro», em Viseu.

O acórdão arbitral, datado de 13/11/2020, fixou a indemnização, quanto à parcela nº 1, em 67.009,83 euros e quanto à parcela 2 em 167.605,76 euros.

Apenas o Município de Viseu interpôs recurso quanto ao valor de ambas as parcelas.

Em sede de recurso da decisão arbitral, os peritos fixaram as seguintes indemnizações:

Parcela n.º 1

Perito da Expropriante: 114.544,77 + 12.728,41 =127.273,18 euros

Restantes peritos: 58.109,15 + 9.625,00 = 67.734,15 euros.

Parcela n.º 2

Perito da Expropriante: 114.544,77 +12.728,41=127.273,18 euros.

Restantes peritos: 140.793,98 +34.123,00 + 15.645,27 = 190.562,25 euros.

Realizou-se a audiência de julgamento e foi proferida sentença com o seguinte dispositivo:

«Nestes termos, decide-se julgar parcialmente procedente o recurso da entidade expropriante, o Município de Viseu, fixando o valor da justa indemnização para a parcela 1 em 67.009,83€ e quanto à parcela 2 em 133.747,76 €, no valor global de 200.757,59€, a pagar pela entidade expropriante.

Este valor terá de ser atualizado de acordo com a evolução do índice de preços no consumidor, com exclusão da habitação, publicado pelo Instituto Nacional de Estatística, relativamente ao local da situação dos bens, desde a data da publicação da declaração de utilidade pública até à disponibilização aos expropriados de parte do depósito da entidade expropriante e, quanto ao restante, até à data do trânsito desta decisão. e nos termos sobreditos.

Custas na proporção do decaimento – cfr. art.ºs 527.º, n.ºs 1 do Código do Processo Civil.»

b) É desta decisão que vem interposto recurso para o tribunal da Relação por parte da Expropriante, cujas conclusões são as seguintes:

«Não tendo a Expropriada recorrido das Decisões Arbitrais proferidas no âmbito dos presentes autos para as Parcelas n.º 1 e n.º 2 necessárias à construção da obra denominada “Alargamento do Troço da EN229 - Rotunda do Matadouro”, em Viseu, entendeu o Mmº Tribunal a quo – como, aliás, defendido pela Expropriante – não poder fixar um valor indemnizatório superior àquele que foi estabelecido nas mesmas, por força do princípio da proibição da reformatio in pejus.

B. Deste modo, o Tribunal a quo considerou como limite da condenação os valores fixados nos Acórdãos Arbitrais que para a Parcela n.º 1 foi fixado em €67.009,83 e para Parcela n.º 2 foi fixado em €167.605,76.

C. No que respeita às concretas questões suscitadas no recurso da Expropriante entendeu o Tribunal a quo que não sendo perito de engenharia, aderia ao que foi dito pela maioria dos Senhores peritos, à exceção da questão do reservatório de água que entendeu não considerar, por falta de outros elementos, que é uma benfeitoria e nem o seu valor.

D. Assim, decidiu que o valor a atribuir à parcela 1 se mantinha nos 67.009,83€; já no que concerne à parcela 2 entendeu ser parcialmente procedente o recurso da Expropriante, retirando do valor a indemnizar o que foi atribuído ao reservatório de água – 33.858,00€ (vide fls. 353), na medida em que, não se tendo apurado se  o mesmo funcionava e se tinha alguma utilidade, a sua existência, atenta a finalidade do solo, poderá até ser uma menos valia.                    

E. Donde, feitos os cálculos, entendeu que o valor da justa indemnização para a Parcela n.º 2 é de 133.747, 76€ (167.605,76 €-33.858,00€), e por conseguinte, fixou o valor global da justa indemnização de ambas as parcelas em 200.757,59€, a pagar pela entidade expropriante. (cfr. douta Sentença recorrida)

F. Ora, com o devido e maior respeito, entende-se que o Mº Tribunal a quo não só não podia ter acolhido alguns dos critérios constantes dos Acórdãos Arbitrais porque, por errados, conduzem consequentemente a uma indemnização injusta, como, também se entende, que embora o Tribunal a quo faça uma correcta valoração da prova produzida quanto à não consideração de benfeitorias na Parcela n.º 2 acaba por errar relativamente ao valor a deduzir a esse título ao montante global da indemnização. Vejamos então as razões que nos levam a discordar com o decidido, o que, por razões de facilidade de leitura, se fará para cada umas das parcelas de per si.

G. II. PARCELA n.º 1 - 1. Índice de Construção/Área Edificável: Relativamente ao índice de construção a Decisão Arbitral considerou um índice de 1,00/m2, entendimento que foi sufragado pelos Srs Peritos em sede de avaliação e acolhido pela douta Decisão em recurso, índice que se entende não estar devidamente fundamentado.

H. De facto, considerando os parâmetros e condicionantes previstos nos artigos 88º e 90º do PDM de Viseu, designadamente, o Índice volumétrico (≤ 3,5 m3/m2, com um máximo de 6 m no plano lateral), e o Índice de ocupação (≤ 50 %), e feitos os cálculos necessários para convolar o volume de área, em índice de utilização, 3,5:6, temos um valor final de índice de utilização para as parcelas expropriadas de 0,58m2/m2 de terreno.

I. Pelo que, para determinar qual a capacidade construtiva das parcelas expropriadas para efeitos de avaliação deve aplicar-se o índice de utilização correspondente a 0,58/m2 por m2 de terreno, único critério legal admissível e à data em vigor.

Ao decidir como decidiu o Tribunal a quo violou os artigos 88º e 90º do PDM, pelo que deverá ser revertida em conformidade.

J. 2. Quanto à aplicação do factor correctivo previsto no artigo 26º, n.º 10 do C.

Na aplicação deste critério os Sr.s Árbitros consideraram uma percentagem de 4,2%, (cfr. fls. 6/14 da D.A. - Parcela 1), quando todos os cinco peritos que procederam à Avaliação entenderam ser de aplicar uma percentagem de 10% em detrimento dos 4,2% constantes da Decisão Arbitral.

K. Ora, embora não resulte especificado é forçoso concluir que ao condenar a Expropriante no pagamento da indemnização global decidida no Acórdão Arbitral, é esta percentagem, de 4,2%, que acaba por ser acolhida pela douta Sentença recorrida.

L. Assim, considerando, como se transcreveu, que o Tribunal a quo diz ter aderido ao decidido pela maioria dos Senhores peritos, mas acaba por condenar de acordo com a Decisão Arbitral, parece-nos, salvo melhor opinião, estarmos perante uma causa de nulidade da sentença na medida em que os fundamentos estão em oposição com a decisão (cfr. art.º 615, n.º 1, alínea c) do CPC). Sem prescindir e ainda que assim não se entenda,

M. Nada existindo na Decisão em recurso que contrarie a posição defendida pelos Sr.s Peritos em sede de Avaliação, nem tendo o Mmº Tribunal a quo sustentado que se deve manter a aplicação da percentagem da Decisão Arbitral de 4,2%, para efeitos de aplicação do artigo 26º, n.º 10 do CE, entende-se que a Sentença  recorrida está ferida de nulidade por falta de fundamentação.

N. Ao ter decidido como decidiu, a Decisão ora apelada decidiu mal, violando o art. 26º, n.º 10 do C.E, estando, ainda, ferida de nulidade nos termos do artigo 615º, n.º 1, al. c) e b) do CPC), devendo ser proferida Decisão que, para efeitos de aplicação do artigo 26º, n.º 10 do CE, considere a percentagem unanimemente considerada no Relatório pericial de 10%.

O. 3. Depreciação por divisão do prédio - Num único parágrafo e sem que procedesse aos cálculos exigidos no artigo 29º do CE, que prescreve como deve ser feito o cálculo do valor nas expropriações parciais - como é o caso sub iudice – a Decisão Arbitral atribuiu o valor de 14.689,51€ a título de desvalorização da parcela sobrante.

P. Não concordando com o decidido pelos Sr.s Árbitros - por não procederem ao referido cálculo, por não fundamentarem, nem esclarecerem que “condicionantes” pelo acesso e reposicionamento do parque de estacionamento determinaram a atribuição de uma percentagem de 3% e porquê – no seu recurso a Expropriante defendeu não haver lugar a qualquer indemnização a este título, entendimento seguido, de forma unânime, pelos cinco Senhores Peritos

Q. Acontece que, pese embora o Tribunal a quo diga ter aderido ao decidido pela maioria dos Senhores peritos - que não atribuem qualquer valor pela depreciação da sobrante - condena a Expropriante no pagamento da indemnização global decidida no Acórdão Arbitral, € 67.009,83, valor onde está incluído uma parcela no montante de € 14.689,51 respeitante à desvalorização da parcela sobrante.

R. Assim, considerando, como se transcreveu, que o Tribunal a quo diz ter aderido ao decidido pela maioria dos Senhores peritos, mas acaba por condenar no valor fixado na Decisão Arbitral, onde está incluída uma parcela de € 14.689,51 pela desvalorização da sobrante, parece-nos, salvo melhor opinião, estarmos perante uma causa de nulidade da sentença na medida em que os fundamentos estão em oposição com a decisão (cfr. art.º 615, n.º 1, alínea c) do CPC). Sem prescindir e ainda que assim não se entenda,

S. Nada existindo na Decisão em recurso que contrarie a posição defendida pelos Sr.s Peritos em sede de Avaliação, nem tendo o Mmº Tribunal a quo sustentado que se deve manter o entendimento da desvalorização da sobrante considerado na Decisão Arbitral e consequentemente a atribuição de um valor de € 14.689,51 a esse título, entende-se que a Sentença recorrida está ferida de nulidade por falta de fundamentação.

T. Ao ter decidido como decidiu, a Decisão ora apelada decidiu mal, violou o art. 29º do C.E, o Princípio da Justa Indemnização e da Proporcionalidade, estando ferida de nulidade nos termos do artigo 615º, n.º 1, al. c) e b) do CPC), devendo ser proferida Decisão em conformidade que conclua, tal como a unanimidade os Sr.s Peritos, pela não desvalorização da área sobrante e, consequentemente, não

ser devido qualquer montante indemnizatório a este título.

U. III. PARCELA 2, 1. Índice de Construção/Área Edificável - Relativamente ao índice de construção a Decisão Arbitral considerou um índice de 1,00/m2, entendimento que foi sufragado pelos Sr.s Peritos em sede de avaliação e acolhido na douta Decisão em recurso, índice que se entende não estar devidamente fundamentado.

V. De facto, considerando os parâmetros e condicionantes previstos nos artigos 88º e 90º do PDM de Viseu, designadamente, o Índice volumétrico (≤ 3,5 m3/m2, com um máximo de 6 m no plano lateral), e o Índice de ocupação (≤ 50 %), e  feitos os cálculos necessários para convolar o volume de área, em índice de utilização, 3,5:6, temos um valor final de índice de utilização para as parcelas expropriadas de 0,58m2/m2 de terreno.

W. Pelo que, para determinar qual a capacidade construtiva das parcelas expropriadas para efeitos de avaliação deve aplicar-se o índice de utilização correspondente a 0,58/m2 por m2 de terreno, único critério legal admissível e à data em vigor. Ao decidir como decidiu o Tribunal a quo violou os artigos 88º e 90º do PDM, pelo que deverá ser revertida em conformidade.

X. 2. Quanto à aplicação do factor correctivo previsto no artigo 26º, n.º 10 do C.  E - Na aplicação deste critério os Sr.s Árbitros consideraram uma percentagem de 5,4% (cfr. fls. 7/13 da D.A. - Parcela n.º 2), quando todos os cinco peritos que procederam à Avaliação entenderam ser de aplicar uma percentagem de 10% em detrimento dos 5,4% constantes da Decisão Arbitral.

Y. Ora, embora não resulte especificado é forçoso concluir que ao condenar a Expropriante no pagamento da indemnização global decidida no Acórdão Arbitral, é esta percentagem, de 5,4%, que acaba por ser acolhida pela douta Sentença recorrida.

Z. Assim, considerando, como se transcreveu, que o Tribunal a quo diz ter aderido ao decidido pela maioria dos Senhores peritos, mas acaba por condenar de acordo com a Decisão Arbitral, parece-nos, salvo melhor opinião, estarmos perante uma causa de nulidade da sentença na medida em que os fundamentos estão em oposição com a decisão (cfr. art.º 615, n.º 1, alínea c) do CPC). Sem prescindir e ainda que assim não se entenda,

AA. Nada existindo na Decisão em recurso que contrarie a posição defendida pelos Sr.s Peritos em sede de Avaliação, nem tendo o Mmº Tribunal a quo sustentado que se deve manter a aplicação da percentagem da Decisão Arbitral de 5,4%, para efeitos de aplicação do artigo 26º, n.º10 do CE, entende-se que a Sentença recorrida está ferida de nulidade por falta de fundamentação.

BB. Ao ter decidido como decidiu, a Decisão ora apelada decidiu mal, violando o art. 26º, n.º 10 do C.E, estando, ainda, ferida de nulidade nos termos do artigo615º, n.º 1, al. c) e b) do CPC), devendo ser proferida Decisão que, para efeitos de aplicação do artigo 26º, nº10 do CE, determine a percentagem unanimemente considerada no Relatório pericial de 10%.

CC. 3. Quanto às benfeitorias - Na Decisão Arbitral os Senhores Árbitros atribuíram ao depósito de água de 330m2 em betão armado uma indemnização de € 70.000,00 (setenta mil euros), valor que a Expropriante impugnou por entender que o mesmo não se encontrava minimamente fundamentado.

DD. Na Avaliação, os Sr.s Peritos nomeados pelo Tribunal e o Sr. Perito indicado pela Expropriada consideraram ser de atribuir, pelo referido depósito, o valor de € 33.123,00.

EE. Acontece, porém, que, quanto a esta matéria, entendeu o Mmº Tribunal a quo (na nossa óptica bem) que, por falta de elementos e atenta a prova produzida, não se poderia considerar nem que este reservatório de água configurava uma benfeitoria, nem, tão pouco, considerar o seu valor. E, assim, não atribuiu qualquer valor ao reservatório de água.

FF. Ora, pese embora se concorde com o decidido quanto a esta matéria pelo Tribunal a quo, não se pode de todo em todo concordar com o cálculo que foi feito e com o valor que pelo mesmo foi considerado deduzir ao montante global indemnizatório: o valor de € 33.858,00 atribuído pelos Sr.s Peritos.

GG. Ao julgar procedente esta parte do recurso, ao decidir não atribuir qualquer valor ao reservatório de água, considerando o raciocínio/cálculo efectuado, o Tribunal teria de retirar ao valor total do montante indemnizatório que entende ser de atribuir, não o valor de €33.858,00 considerado pelos Sr.s Peritos, mas o valor real e parcelar constante da Decisão Arbitral e que foi objecto de recurso, o valor parcelar de € 70.000,00, valor que corresponde - efectivamente - ao montante que foi dado pelos Sr.s Árbitros pelo depósito de água enquanto benfeitoria. Ao decidir como decidiu o Mmº Tribunal a quo violou o artigo 25º do C.E, estando a Sentença recorrida ferida de nulidade nos termos do artigo 615º, n.º 1, al. c) e b) do CPC).

HH. Deste modo, deve ser proferida Decisão que não atribua qualquer valor ao reservatório de água, não podendo o montante indemnizatório contemplar qualquer parcela a este título, sendo que, a proceder o cálculo efectuado na Decisão recorrida sempre deverá ser deduzido o valor parcelar de € 70.000,00, valor que corresponde - efectivamente - ao montante que foi dado pelos Sr.s Árbitros pelo depósito de água enquanto benfeitoria.

II. 4. Depreciação por divisão do prédio - Num único parágrafo e sem que    procedesse aos cálculos exigidos no artigo 29º do CE que prescreve como deve ser feito o cálculo do valor nas expropriações parciais - como é o caso sub iudice - a Decisão Arbitral atribuiu o valor de 5.128,65€ a título de desvalorização da  parcela sobrante.

JJ. Não concordando com o decidido pelos Sr.s Árbitros - por não procederem ao referido cálculo, por não fundamentarem, nem esclarecerem que “condicionantes” pelo acesso e reposicionamento do parque de estacionamento determinaram a atribuição de uma percentagem de 3% e porquê – no seu recurso a Expropriante defendeu não haver lugar a qualquer indemnização a este título.

KK. Ora, ao condenar a Expropriante no pagamento da indemnização global decidida no Acórdão Arbitral, €167.605,76, valor onde está incluído uma parcela no montante de €5.128,65 respeitante à desvalorização da parcela sobrante, o Tribunal a quo decidiu erradamente estando a Sentença recorrida ferida de nulidade por falta de fundamentação.

LL. Ao ter decidido como decidiu, a Decisão ora apelada decidiu mal, violou o art. 29º do C.E, o Princípio da Justa Indemnização e da Proporcionalidade, estando ferida de nulidade nos termos do artigo 615º, n.º 1, al. b) do CPC), pelo que, deverá ser proferida Decisão em conformidade que conclua pela não desvalorização da área sobrante e, consequentemente, não ser devido qualquer montante indemnizatório a este título.

TERMOS EM QUE, Confiando-se no Douto suprimento de Vossas Excelências, Deve ser dado provimento ao presente recurso, com todas as consequências legais. ASSIM SE FAZENDO INTEIRA J U S T I Ç A.»

c) Foram produzidas contra-alegações, nos seguintes termos:

«1) A douta sentença recorrida, aderindo ao defendido pelo expropriante, entendeu que, não tendo a expropriada recorrido da decisão arbitral, não pode vir a ser fixado um montante indemnizatório superior ao que foi fixado por aquela decisão.

No caso presente, o acórdão arbitral fixou o valor da justa indemnização em 67.009,83 € para a parcela nº 1, e 167.605,76 € para a parcela nº 2.

Esses valores constituem, assim, um valor máximo indemnizatório que o tribunal estará obrigado a respeitar.

Nessa linha de entendimento, a douta sentença aderiu ao que foi dito e decidido pela maioria dos peritos, à excepção do depósito de água, por, segundo explicou, não dispor de elementos que lhe permitam classificá-lo como benfeitoria.

Desse modo, a douta sentença recorrida fixou os seguintes valores:

1. Quanto à parcela 1, aquele valor de 67.009,83 €;

2. Quanto à parcela 2, o valor de 133.747,76 €, correspondente àqueles 167.605,76 € menos o valor de 33.858,00 €, atribuído pelo relatório arbitral ao valor do depósito de água.

2) No seu recurso, o MUNICÍPIO recorrente não impugna a matéria de facto fixada pela douta sentença de1ª instância, a qual se deve, por isso, considerar definitivamente fixada.

Mas, não obstante isso, vem impugnar os valores indemnizatórios fixados por aquela sentença.

Fá-lo, porém, “atacando”, não a sentença propriamente dita, mas os relatórios arbitral e de perícia.

Ora, em 1º lugar, não se vê como, para além de, enquanto parte interessada, ver a sua isenção e a sua independência seriamente afectadas, possui o recorrente conhecimentos técnicos superiores aos dos peritos subscritores dos relatórios arbitral e pericial ao ponto de poder impôr o seu próprio entendimento ao tribunal, em desvalor ou anulação do juízo técnico dos peritos.

E, em 2º lugar, não se vê como possa o recorrente, não tendo impugnado a matéria de facto considerada provada pela douta sentença, que acolhe, sem reserva, o resultado do relatório arbitral e do relatório pericial, vir, pela via da discussão do mérito da sentença, pôr em causa factos e valores constantes daqueles relatórios, que, por sua vez, foram levados à matéria de facto provada e não impugnada.

3) Como já se notou, a douta sentença aderiu ao que foi dito e decidido pela maioria dos peritos, com excepção da questão do valor dado ao do depósito de água.

Fê-lo, como explicou, porque entende que o Tribunal “não é perito de engenharia”.

Com efeito, na linha do decidido pelo nosso STJ (Ac. de 02-05-2019, Proc. nº 1650/06, www.dgsi.pt), é uniforme, na nossa jurisprudência o entendimento segundo o qual, estando-se, como se está, no âmbito de matéria para a qual o julgador carece de adequados conhecimentos técnicos, na fixação do montante indemnizatório é de atribuir particular relevo ao laudo pericial, com especial destaque para o emitido pelos peritos designados pelo tribunal, dada a sua particular isenção.

… o referido entendimento não é ditado pela lei, sendo antes, e só, um critério a seguir pelas instâncias na apreciação da prova produzida e na subsequente fixação da factualidade provada.

Na verdade,

Muito embora a força probatória das respostas dos peritos seja fixada livremente pelo julgador, atendendo à especial conformação legal da avaliação em processo de expropriação, e aos especiais conhecimentos técnicos exigidos aos peritos nomeados para a efectuarem, caso o relatório pericial seja unânime ou maioritário, o tribunal só deve afastar-se dos valores por aqueles propostos com base em especiais conhecimentos que o mesmo não possui, se verificar a existência de erro ou incumprimento pelos peritos dos critérios legalmente estabelecidos e aos quais estes também se encontram vinculados. – Acs. da RC, de 15-1-2013, Proc. 637/10 e da RE de 10-9-2020, Proc. 84/18, ambos em www.dgsi.pt

Como também já entendia a Relação de Lisboa, no seu acórdão de 07-07-2009, proferido no processo n.º 61/1996.L1-1, acessível também em www.dgsi.pt, «[…] Apesar da sua liberdade de apreciação das provas, incluindo a pericial, o julgador não pode, sem fundamentos suficientemente sólidos, afastar-se do resultado das peritagens, sobretudo quando são unânimes ou quando os peritos formaram maioria e oferecem garantias de imparcialidade, ainda mais quando os maioritários são peritos do tribunal. […] Um tal afastamento só se justificará, por exemplo, quando o tribunal concluir que os peritos basearam o seu raciocínio em erro manifesto ou num critério ilegal. De contrário, não apresentando o relatório pericial qualquer desses vícios, e à falta de elementos mais seguros e objectivos, há que aceitar o valor proposto pelos técnicos.»

Revisitando o citado acórdão da RE de 10-9-2020,1

“O especial valor probatório do relatório pericial apenas será de excluir se outros preponderantes elementos de prova o infirmarem, mormente por padecer de erro grosseiro ou por ser contrário a normas legais vinculativas, caso em que o juiz deve pôr em causa o relatório técnico dos peritos, mas com recurso a argumentação técnica ou científica, eventualmente baseada noutros meios de prova divergentes, de igual ou superior credibilidade, e que podem, por exemplo, decorrer dos relatórios minoritários ou ainda do cotejo deste relatório com o laudo arbitral e o relatório de avaliação, todos efectuados por peritos igualmente integrados na referida lista oficial.

A perícia constitui um meio de prova de natureza técnica na medida em que ao perito, ao invés do que ocorre quanto às testemunhas, para além da narração dos factos que percepciona, está também cometida a tarefa de apreciar ou valorar esses factos de acordo com os especiais 1 Em linha com o posterior entendimento do Ac. da RG de 11-5-2022, Proc. nº 266/12, acessível em www.dgsi.pt. conhecimentos técnicos que possui na matéria, e que não são do conhecimento do julgador, podendo inclusivamente trazer ao tribunal apenas a apreciação e valoração dos factos.

… o Código das Expropriações, com vista à determinação do valor do bem objecto da expropriação, prevê a intervenção de peritos em todas as fases do processo, desde o procedimento relativo à declaração de utilidade pública, ao procedimento atinente à efectivação da posse administrativa, e, já no processo de expropriação litigiosa, quer na fase de arbitragem, quer no recurso desta, designadamente para efeitos dos respectivos artigos 61.º e 62.º, ou seja, designadamente, da avaliação.

“Esta diligência pericial, obrigatória, que visa essencialmente a avaliação dos bens em causa, com vista à determinação do montante indemnizatório concernente, é tão relevante para o efeito que a lei atribui a sua presidência ao próprio juiz.

A referida obrigatoriedade, ao invés do que decorre em relação aos outros meios de prova, deriva essencialmente da complexidade técnica da avaliação das várias espécies de bens, e, por isso, da necessidade de colaboração de pessoas com conhecimentos específicos de que a generalidade das pessoas não dispõe”.

Assim sendo, e “não dispondo o juiz de conhecimentos especiais na área a que respeita a perícia (…), salvo casos de erro grosseiro, não estará em condições de sindicar o juízo científico emitido pelo perito, …afigurando-se, por isso, bem mais ajustada às actuais realidades da vida, a norma do Código de Processo Penal relativa ao valor da prova pericial (artigo 163.º, n.º 1), que estabelece a presunção de que o juízo técnico, científico ou artístico, está subtraído à livre apreciação do julgador”.

Acresce que o Código das Expropriações estabelece para o efeito regras especiais, uma vez que esta avaliação é efectuada por cinco peritos - desde logo ressaltando desta imposição uma maior exigência do que a geralmente adoptada, porquanto dos artigos 468.º, n.º 1, e 469.º, n.º 1, do CPC, resulta que a perícia é, em regra, singular, e excepcionalmente colegial -, designando cada parte um perito e sendo os três restantes nomeados pelo tribunal, e escolhidos de entre os que constam da lista oficial – artigo 62.º, n.º 1, alínea a), e n.º 3, do citado diploma legal.

Ora, os peritos e árbitros constantes das listas oficiais estão sujeitos às especiais regras de recrutamento e às condições de exercício de funções - quer no âmbito dos procedimentos anteriores à declaração de utilidade pública quer no âmbito do processo de expropriação – que se encontram previstas no DL n.º 125/2002, de 10 de Maio, que aprovou o Estatuto dos Peritos Avaliadores (cfr. artigo 1.º). Assim, os mesmos são recrutados mediante concurso, tendo de possuir curso superior adequado, e sujeitos a provas de selecção – cfr. artigos 3.º, 5.º, 6.º e 7.º do EPA.

Seleccionados, efectuam um curso de formação no Centro de Estudos Judiciários, são sujeitos a classificação final, são ajuramentados perante o presidente do Tribunal da Relação do respectivo distrito judicial – artigos 9.º-A, 9.º-B e 11.º do EPA – e têm que frequentar obrigatoriamente duas acções de formação permanente, sendo excluídos se deixarem de cumprir os seus deveres funcionais – artigos 12.º e 13.º do EPA.

Tudo para dizer que os peritos que integram a lista oficial estão sujeitos a especiais exigências com vista a acautelar a sua qualidade técnica.

Acresce que os mesmos não podem intervir como peritos avaliadores indicados pelas partes em processos de expropriação que corram em Tribunal – artigo 15.º do EPA - e estão sujeitos aos impedimentos previstos no artigo 16.º e aos fundamentos de suspeição definidos no artigo 17.º, ambos do Estatuto dos Peritos Avaliadores, tudo com vista a garantir a sua isenção e imparcialidade.

Por fim, devem proceder à elaboração dos laudos periciais de acordo com as normas legais e regulamentares aplicáveis e devem fundamentar claramente o cálculo do valor atribuído – artigo 21.º do EPA - donde decorre, por exigência legal, que têm de se pautar por critérios objectivos.

Daí que os tribunais, de forma uniforme, e apesar de, como se disse, a prova pericial produzida não ser vinculativa, entendam que em processo de expropriação, sendo a peritagem obrigatória e tratando-se de um problema essencialmente técnico – a avaliação do bem expropriado -, o tribunal deve aderir, em princípio, ao parecer dos peritos, dando preferência ao valor resultante desses pareceres, desde que sejam coincidentes, e, por razões de imparcialidade e independência, quando não sejam coincidentes, optar pelo laudo dos peritos nomeados pelo tribunal porquanto este é o meio de prova que melhor habilita o julgador a apurar o valor do bem expropriado, com vista à atribuição da justa indemnização.

Na verdade, para além da presumida competência técnica que se lhes reconhece, a posição assumida pelos peritos nomeados pelo tribunal é aquela que, em princípio, oferece maiores garantias de independência e de imparcialidade, face à distanciação que mantêm em relação às posições do expropriante e do expropriado, os quais, amiúde, defendem a atribuição de valores, respectivamente inferiores e superiores aos atribuídos por aqueles.

Por todas estas razões, tem-se entendido que este especial valor probatório do relatório pericial apenas será de excluir se outros preponderantes elementos de prova o infirmarem, mormente por padecer de erro grosseiro ou por ser contrário a normas legais vinculativas, caso em que o juiz deve pôr em causa o relatório técnico dos peritos, mas com recurso a argumentação técnica ou científica, eventualmente baseada noutros meios de prova divergentes, de igual ou superior credibilidade, e que podem, por exemplo, decorrer dos relatórios minoritários ou ainda do cotejo deste relatório com o laudo arbitral e o relatório de avaliação, todos efectuados por peritos igualmente integrados na referida lista oficial.

4) Ora, no caso dos presente autos, não existem quaisquer elementos de facto que levem a desacreditar os valores indicados, quer pelos árbitros, por unanimidade, quer, depois, pelos peritos, neste caso por unanimidade dos peritos designados pelo tribunal, formando maioria com o perito indicado pela expropriada.

Ambos os relatórios, o arbitral e o pericial, mostram-se fundamentados e acompanhados das explicações devidas a perceber as suas conclusões.

5) Nas suas alegações do presente recurso, o recorrente MUNICÍPIO vem pôr em causa, perante o tribunal, e querer com este discutir, não a sentença em si, mas aspectos e questões de natureza técnica dos dois relatórios – o arbitral e o pericial.

Esquece-se, porém, que, como parte, não lhe são reconhecidos conhecimentos técnicos – nem a isenção e a independência – necessários e suficientes para poder pôr em causa o trabalho técnico e independente dos árbitros e dos peritos.

E que o tribunal, como já atrás se salientou, também não é portador desses conhecimentos.

Com efeito, estamos no âmbito de matéria para a qual o tribunal carece de adequados conhecimentos técnicos.

Ora o tribunal, justamente por o juiz não possuir conhecimentos técnicos, não pode pôr em causa o relatório técnico dos peritos, sem o recurso a argumentação técnica ou científica, baseada noutros meios de prova divergentes, de credibilidade igual ou superior aos relatórios e aos peritos que os subscreveram.

2 Entendimento uniformemente adoptado pelas instâncias, no uso de um critério sufragado pelo STJ, no seu referido Ac. de 02-05-2019, Proc. nº 1650/06, www.dgsi.pt.

E, não com base na argumentação da própria parte, por muito respeitável que seja.

Justamente porque as declarações/alegações da parte não fazem prova a seu favor e não é de presumir que ela tenha conhecimentos técnicos superiores aos dos árbitros e peritos.

E porque o expropriante, enquanto parte interessada, não reúne condições de objetividade e isenção. Muito menos para pôr em causa o relatório e a opinião técnica dos peritos.

Como já se disse, tem-se entendido que o especial valor probatório do relatório pericial apenas será de excluir se outros preponderantes elementos de prova o infirmarem, nomeada e especialmente por padecer de erro grosseiro ou por ser contrário a normas legais vinculativas, caso em que o juiz deve pôr em causa o relatório técnico dos peritos, mas com recurso a argumentação técnica ou científica, eventualmente baseada noutros meios de prova divergentes, de igual ou superior credibilidade, e que podem, por exemplo, decorrer dos relatórios minoritários ou ainda do cotejo deste relatório com o laudo arbitral e o relatório de avaliação, todos efectuados por peritos igualmente integrados na referida lista oficial.

Ora, no caso dos presentes autos, não ocorre nenhuma dessas circunstâncias que levassem a colocar em crise o valor técnico do relatório de avaliação subscrito, por unanimidade, pelos peritos nomeados pelo Tribunal.

Nem o relatório pericial enferma de erro grosseiro nem as alegações do Município, enquanto parte interessada, têm a natureza de prova de igual ou superior credibilidade.

Nos termos e pelos fundamentos expostos, e pelo mais de direito do douto suprimento, devem ser julgadas improcedentes as questões colocadas no recurso e este ser julgado improcedente, confirmando-se a douta sentença recorrida.

com custas e demais encargos conforme for de Direito.»

II. Objeto do recurso.

As questões que o recurso coloca são as seguintes:

1 –  Nulidades de sentença.

a) A recorrente argui diversas nulidades de sentença, as quais se reconduzem ao mesmo fundamento, ou seja, os fundamentos estão em oposição com a decisão (cfr. art.º 615, n.º 1, alínea c) do CPC), porquanto se afirma na sentença que a decisão segue o laudo da maioria dos peritos, mas acaba por condenar de acordo com a decisão arbitral, bem como à falta de fundamentação.

Exemplificando, nas alíneas «K» e «L» refere o seguinte:

«K. Ora, embora não resulte especificado é forçoso concluir que ao condenar a Expropriante no pagamento da indemnização global decidida no Acórdão Arbitral, é esta percentagem, de 4,2%, que acaba por ser acolhida pela douta Sentença recorrida.

L. Assim, considerando, como se transcreveu, que o Tribunal a quo diz ter aderido ao decidido pela maioria dos Senhores peritos, mas acaba por condenar de acordo com a Decisão Arbitral, parece-nos, salvo melhor opinião, estarmos perante uma causa de nulidade da sentença na medida em que os fundamentos estão em oposição com a decisão (cfr. art.º 615, n.º 1, alínea c) do CPC). Sem prescindir e ainda que assim não se entenda…».

b) Verificar se as questões suscitadas relativamente às nulidades da sentença são também alegadas em sede de mérito, porquanto também foram alegadas pela recorrente com a finalidade de obter a sua análise pelo tribunal.

2 – Do índice de construção.

A Recorrente argumenta que o índice de construção/área edificável de 1,00/m2, considerado pelos peritos e acolhido na decisão arbitral está errado, não podendo ser superior a 0,58m2/m2 de terreno, porquanto os artigos 88º e 90º do PDM.

3 – Para o caso de se entende que a argumentação jurídica não procede relativamente à arguição de nulidades, verificar se tal argumentação pode ser aproveitada para análise do mérito da causa, colocando-se então as seguintes questões:

(a) Quanto à aplicação do fator corretivo previsto no artigo 26º, n.º 10 do Código das Expropriações, a recorrente sustenta que deve aplicar-se a percentagem de 10% em detrimento dos 4,2% e 5,4% constantes da decisão arbitral, devendo ser aquela a taxa de correção aplicável a ambas as parcelas.

(b) Relativamente à Parcela n.º 1, saber se ocorre depreciação da parcela sobrante devido à divisão do prédio devendo-se entender que não, segundo a Recorrente, e, por isso, devem retirar-se da indemnização a verba atribuída a esse título pelos árbitros.

 (c) Relativamente à benfeitoria da Parcela n.º 2.

Na Decisão Arbitral os Senhores Árbitros atribuíram ao depósito de água de 330m2 em betão armado uma indemnização de €70.000,00 (setenta mil euros), valor que a Expropriante impugnou

Como o tribunal entendeu que não era devida qualquer indemnização, logo devia ter subtraído à indemnização fixada não os 33.123,00 indicados pelos peritos, mas os 70.000,00 fixados pelos árbitros.

III. Fundamentação

A) Nulidades de sentença

(I) A recorrente alega diversas nulidades de sentença as quais se reconduzem ao mesmo fundamento, ou seja, os fundamentos estão em oposição com a decisão (cfr. art.º 615, n.º 1, alínea c) do CPC), porquanto se afirma na sentença que a decisão segue o laudo da maioria dos peritos, mas acaba por condenar de acordo com a decisão arbitral.

Exemplificando, nas alíneas «K» e «L» refere o seguinte:

«K. Ora, embora não resulte especificado é forçoso concluir que ao condenar a Expropriante no pagamento da indemnização global decidida no Acórdão Arbitral, é esta percentagem, de 4,2%, que acaba por ser acolhida pela douta Sentença recorrida.

L. Assim, considerando, como se transcreveu, que o Tribunal a quo diz ter aderido ao decidido pela maioria dos Senhores peritos, mas acaba por condenar de acordo com a Decisão Arbitral, parece-nos, salvo melhor opinião, estarmos perante uma causa de nulidade da sentença na medida em que os fundamentos estão em oposição com a decisão (cfr. art.º 615, n.º 1, alínea c) do CPC). Sem prescindir e ainda que assim não se entenda…»

Vejamos.

Como referiu o Prof. Alberto dos Reis, «Quando os fundamentos estão em oposição com a decisão, a sentença enferma de vício lógico que a compromete. A lei quer que o juiz justifique a sua decisão. Como pode considerar-se justificada uma decisão que colide com os fundamentos em que ostensivamente se apoia?» e acrescenta, «Há contradição entre os fundamentos e a decisão quando «…os fundamentos invocados pelo juiz conduziriam logicamente, não ao resultado expresso na decisão, mas a resultado oposto» - Código de Processo Civil Anotado. Coimbra Editora, 1984. Vol. V (Reimpressão), pág. 141.

Esta nulidade ocorre quando o juiz conduz a argumentação que consta da fundamentação jurídica da sentença num certo sentido e, depois, no dispositivo da sentença, tira uma conclusão inesperada, isto é, contraditória com a argumentação anterior.

É nisto que consiste a contradição apontada nesta norma.

Ora, tal contradição não ocorre no caso dos autos, pela seguinte razão:

A Expropriante recorreu com o fim de obter a diminuição da indemnização a pagar à expropriada pela expropriação das duas parcelas.

O tribunal de 1.ª instância disse que aderia ao laudo maioritário em detrimento do laudo apresentado pelo Sr. perito indicado pela expropriante.

Sucede que o laudo dos peritos maioritários atribuiu uma indemnização superior à indemnização atribuída na decisão arbitral, o que implicou segundo o raciocínio do tribunal recorrido a improcedência do recurso apresentado pela expropriante.

O tribunal, referindo que não podia prejudicar quem recorre, colocando-o em situação mais desfavorável do que aquela em que estaria se não tivesse recorrido (princípio da reformatio in pejus consagrado no artigo 635.º, n.º 5, do Código de Processo Civil), fixou a indemnização, não nos valores indicados no laudo maioritário dos peritos, mas nos valores indicados na decisão arbitral.

Face ao que fica exposto, não ocorre a apontada contradição entre os fundamentos e a decisão, pois quando o juiz adere à fundamentação do laudo maioritário, adere à respetiva argumentação, que só não segue depois na fixação da indemnização porque, afirma, tal lhe está vedado pela norma da reformatio in pejus.

Não existe, por isso, qualquer contradição entre os fundamentos e a decisão.

Com efeito, se um leitor hipotético fizer o exercício de ocultar o dispositivo da sentença e ler de seguida apenas a respetiva fundamentação, se esse leitor tivesse de escrever a decisão após ter lido a fundamentação, concluiria no mesmo sentido que consta do dispositivo da sentença sob recurso, isto é, a conclusão (decisão) da sentença é a esperada face às premissas que o juiz fez constar da fundamentação.

Quando a parte discorda da fundamentação indicada na sentença, tal discordância insere-se na questão jurídica de fundo, de mérito, mas não respeita a matéria de natureza processual, como é o caso das nulidades de sentença.

Improcedem, pelo exposto, a invocada nulidade de sentença.

Esta argumentação é comum às demais nulidades de sentença arguidas, pelo que improcedem as apontadas nulidades de sentença.

(II) Estas questões suscitadas relativamente às nulidades da sentença serão analisadas mais abaixo em sede de mérito, porquanto também foram alegadas pela recorrente com a finalidade de obter a sua análise pelo tribunal.

É o que resulta das seguintes conclusões:

«… devendo ser proferida Decisão que, para efeitos de aplicação do artigo 26º, nº 10 do CE, determine a percentagem unanimemente considerada no Relatório pericial de 10%.» - Conclusão BB.

«… sempre deverá ser deduzido o valor parcelar de €70.000,00, valor que corresponde - efectivamente - ao montante que foi dado pelos Sr.s Árbitros pelo depósito de água enquanto benfeitoria.» - Conclusão HH.

«… pelo que, deverá ser proferida Decisão em conformidade que conclua pela não desvalorização da área sobrante e, consequentemente, não ser devido qualquer montante indemnizatório a este título» - Conclusão LL.

(III) Também não ocorre a falta de fundamentação da sentença porquanto, embora ligeira, encontra-se fundamentada, percebendo-se claramente as razões da decisão.

B) 1. Matéria de facto – Factos provados

1) A parcela nº 1 refere-se ao prédio registado a favor da R. com o nº ...52 e inscrito na matriz da freguesia ... com o art.º urbano ...98 (proveniente do art.º ...54º – docs de fls 3 e 4 dos autos principais.

2) a parcela nº 2 refere-se ao prédio da R., registado sob o nº ...18º e inscrito na matriz predial urbana sob o nº ...88º - vide fls 2 e 3 do apenso B

- Foi declarada a utilidade pública das parcela nº e da nº 2 por despacho do Sr SE de 27 feveriro 2019, publicado no DR , 2ª serie , nº 52, de 14 de março – fls 21 e 22

Parcela 1

3) O auto de vistoria ad perpetuam rei memoriam da parcela 1 encontra-se a fls 7 e segs e é datado de 10 de junho de 2019

4) A A. / Requerente, avaliou a parcela 1 em 51.854,58€ (fls 9 do apenso A) e a Ré, na altura a “B... SA”, em 245.787,00€ - fls 40- auto de posse administrativa em 11/12/2019

Parcela 2

-5) O AVAPRM da parcela nº 2 mostra-se a fls 8 e segs do apenso B e, após reclamação, foi complementado em agosto de 2019, designadamente a propósito do depósito de abastecimento de água

6) A entidade expropriante avaliou esta parcela em 89.015, 85€ - vide fls 26 – e, posteriormente em 97.236.97 – vide fls 53 verso

7) A expropriada, na altura a empresa “B... SA” avaliou esta parcela em 339.690,52€ - vide fls 41 do apenso B

8) O relatório pericial, cujo teor se dá por integralmente reproduzido, não foi unânime, tendo a oposição do perito da A.

Assim, fixa como valor de justa indemnização para a parcela 1 o perito da expropriante o valor de 42.277.46€ e os restantes, do tribunal e dos expropriados, 67.734,15€

E para a parcela 2, respetivamente, os valores de 127.273, 18€ e de 190.562€

9) No que concerne à Parcela 1, a expropriar, possui uma área total de 629.50 m2 com localização semelhante à do prédio, com as seguintes confrontações:

Norte - AA e parte restante do prédio

Sul – EN 229 e Estrada Municipal

Nascente – EN 229 e

Poente – Parte restante do prédio

10) Da expropriação resulta uma sobrante no sentido noroeste com a área de 7.100,50 m2.

11) De acordo com a V.a.p.r.m., foram descritos:

- “a sua configuração numa forma retangular com cerca de 70 m de extensão por 8 m de largura…

- a natureza habitacional da zona envolvente

- na área sobrante do prédio (da parcela) objeto de expropriação existem edificações de características industriais, administrativas, habitacionais e que não são afetadas

- Infraestruturas urbanas

- Benfeitorias – muros de vedação em alvenaria de blocos de granito fechada a argamassa de cimento com coroamento em laje de betão e um poço”

12) A parcela está inserida em “Unidades Operativas de Planeamento e Gestão Tipo 4

– Espaços de atividades económicas”.

13) Aquando da visita ao local os Peritos constaram que a parcela já estava ocupada pela obra já realizada que motivou a expropriação.

14) O prédio insere-se em zona com boa qualidade ambiental apenas prejudicada pelo tráfego da EN 229.

15) Quanto a infraestruturas em serviço junto/próximo do prédio, de acordo com o mesmo documento (V.a.p.r.m.), existiam as seguintes:

• • Acesso rodoviário, pavimentado em betuminoso, junto ao prédio e parcela, em bom estado de conservação;

• • Rede de abastecimento domiciliário de água, com serviço junto ao prédio e parcela;

• • Rede de saneamento com coletor em serviço, junto ao prédio e parcela;

• • Rede de distribuição de energia elétrica em baixa tensão, com serviço junto ao prédio e parcela;

• • Estação depuradora em ligação com a rede de coletores de saneamento com serviço junto ao prédio e parcela e

• • Rede telefónica junto ao prédio e parcela.

16) O Plano Diretor Municipal (PDM) de Viseu em vigor à data da DUP é o publicado no D.R., 2.ª série, n.º 188, de 30 de setembro de 2013. De acordo com este PDM planta de ordenamento – classificação e qualificação do solo, o terreno da parcela expropriada estava inserido em mancha classificada como Solo Urbano – Solo Urbanizado – Espaços de Atividades Económicas (fonte https://websig.cmviseu.pt/gomunicipal/viseu/geo)

As principais disposições genéricas referentes ao solo urbano são as seguintes:

O terreno da parcela expropriada integra ainda a UOPG 4

17) A metodologia seguida pelos senhores peritos para obtenção do valor da justa indemnização devida, contemplou:

1. Visita à parcela, prédio e análise de mercado;

2. Classificação do Solo, de acordo com art.º 25º do CE;

3. Definição dos critérios e cálculo do valor do solo, tendo presente a sua classificação;

4. Cálculo do valor das benfeitorias existentes, caso existam e se justifique;

O valor obtido é à data da Declaração de Utilidade Pública.

De acordo com o previsto no “Código de Expropriações” – C.E., aprovado pela Lei Nº 168/99 de 18 de setembro e posteriores alterações, no seu Artº 25º nº 1 define-se que, para efeitos de cálculo da indemnização por expropriação, o solo se classifica em:

• a) Solo apto para construção;

• b) Solo para outros fins;

18) O Valor do solo da parcela expropriada (629,50 m2) teve em conta os

seguintes parâmetros:

- Tipo de edificação possível de efetuar: Comércio e/ou Serviços

- Índice de construção:

- Acima do solo ..................................................................................1,00 m2/m2

- Acima do solo (Perito da Expropriante) ...............................................488 €/m2

- Acima do solo (Peritos do Tribunal e da Expropriada)………………12,84 €/m2

- Valor do terreno - percentagem sobre o valor da construção

Perito da Expropriante...................................................................................18 %

Peritos do Tribunal e da Expropriada……………………………………………20%

- Despesas com prolongamento de infraestruturas (n.º 9 art.º 26.º C.E.)……5%

Perito da Expropriante....................................................................................5 %

Peritos do Tribunal e da Expropriada.……………………………………………0%

- Percentagem referente ao n.º 10 do artigo 26.º do C.E. ……....................10 %

Segundo a maioria dos peritos “os índices de construção considerados tiveram em atenção o estipulado no Regulamento do PDM e o que os Peritos entendem ser o aproveitamento económico normal (que como é usual parte do máximo e melhor aproveitamento construtivo possível com respeito pelas disposições legais aplicáveis) tendo em atenção a localização do prédio. De acordo com a subalínea “a3” da alínea “a” do n.º 2 do artigo 90.º do Regulamento do PDM de Viseu, o índice máximo volumétrico é de 3,5 m3/m2.

Haverá, no entanto, que atender a que a altura lateral máxima é de 6 metros, a menos de situações específicas relacionadas com a atividade, e que o índice de ocupação máximo é de 50%, o que corresponde a edificar em cada piso acima do solo 0,5 m2 por m2 de área de terreno, pelo que da conjugação destes dois parâmetros resulta que o aproveitamento económico normal corresponde a um edifício com dois pisos e um índice de construção de: 2 pisos x 0,5 m2/m2 = 1,0 m2/m2 que é inferior ao índice máximo volumétrico possível.

De referir que este índice de utilização é possível de implementar respeitando os parâmetros exigíveis, nomeadamente o altimétrico, podendo, por exemplo, ser adotada uma cota para o 1.º piso ligeiramente abaixo em relação à cota de soleira principal de forma a ultrapassar qualquer constrangimento decorrente de pés direitos regulamentares.

Para além desta área de construção acima do solo possível de edificar e dentro do que é corrente considerou-se ainda a área possível de edificar abaixo do solo.

O custo da construção considerado teve como referencial a Portaria n.º 353/2013, de 4 de dezembro que fixou para o ano de 2014 o custo da construção na zona I (onde se insere o concelho de Viseu) em 801,06 €/m2 de área útil de construção.

19) A Parcela 2, possui uma área total de 1.535,23 m2 com localização semelhante à do prédio, com as seguintes confrontações:

Norte - Regato

Sul – Matadouro Regional de Viseu

Nascente – Herdeiros de BB e

Poente – CC

20) Da expropriação resulta uma sobrante no sentido nordeste e outra no sentido sudoeste, ambas com a área de 2.824,77 m2.

21) De acordo com a V.a.p.r.m., foram descritos:

- “a natureza habitacional da zona envolvente

- O terreno de natureza granítica, pleno, fundo e fresco, abaixo do nívea da via pública…ocupado por árvores florestais de grande porte…choupos

- Infraestruturas urbanísticas (proximidade)

- Benfeitorias – depósito de abastecimento de água, construção de forma cilíndrica e com cobertura em laje de betão armado, com cerca de 10,30 m de diâmetro e 4,0 m de altura

12 choupos de DAP entre o,25 e 0,35 m

1 cedro de DAP de 0,30 m

1 cedro de DAP de 0,20 m”

23) A parcela está inserida em “Unidades Operativas de Planeamento e Gestão Tipo 4

– Espaços de atividades económicas”.

24) O prédio insere-se em zona com boa qualidade ambiental apenas prejudicada pelo tráfego da EN 229.

25) Quanto a infraestruturas em serviço junto/próximo do prédio, de acordo com o mesmo documento (V.a.p.r.m.), existiam as seguintes:

Acesso rodoviário, pavimentado em betuminoso, junto ao prédio e parcela, em bom estado de conservação;

Rede de abastecimento domiciliário de água, com serviço junto ao prédio e parcela;

Rede de saneamento com coletor em serviço, junto ao prédio e parcela;

Rede de distribuição de energia elétrica em baixa tensão, com serviço junto ao prédio e parcela;

Estação depuradora em ligação com a rede de coletores de saneamento com serviço junto ao prédio e parcela e Rede telefónica junto ao prédio e parcela.

26) O terreno da parcela expropriada estava inserido em mancha classificada como Solo Urbano – Solo Urbanizado – Espaços de Atividades Económicas (de acordo com o PDM em vigor)

27) o Valor do solo da parcela expropriada (1535,23 m2), calculada nos mesmos termos referidos quanto à 1

- Tipo de edificação possível de efetuar: Comércio e/ou Serviços

- Índice de construção:

- Acima do solo ................................................................................1,00 m2/m2

- Custos de construção por m2 de área bruta à data da DUP:

- Acima do solo (Perito da Expropriante) ..............................................488 €/m2

- Acima do solo (Peritos do Tribunal e da Expropriada) …………….512,84 €/m2

- Valor do terreno - percentagem sobre o valor da construção

Perito da Expropriante..................................................................................18 %

Restantes Peritos…………………………………………………………….…….20%

- Despesas com prolongamento de infraestruturas (n.º 9 art.º 26.º C.E.)

Perito da Expropriante......................................................................................5 %

Peritos do Tribunal e da Expropriada .…………………………………………....0%

- Percentagem referente ao n.º 10 do artigo 26.º do C.E…………..……..…..10 %

Os índices de construção considerados tiveram em atenção o estipulado no Regulamento do PDM e o que os Peritos entendem ser o aproveitamento económico normal (que como é usual parte do máximo e melhor aproveitamento construtivo possível com respeito pelas disposições legais aplicáveis) tendo em atenção a localização do prédio.

De acordo com a subalínea “a3” da alínea “a” do n.º 2 do artigo 90.º do Regulamento do PDM de Viseu, o índice máximo volumétrico é de 3,5 m3/m2.

Haverá, no entanto, que atender a que a altura lateral máxima é de 6 metros, a menos de situações específicas relacionadas com a atividade, e que o índice de ocupação máximo é de 50%, o que corresponde a edificar em cada piso acima do solo 0,5 m2 por m2 de área de terreno, pelo que da conjugação destes dois parâmetros resulta que o aproveitamento económico normal corresponde a um edifício com dois pisos e um índice de construção de:

2 pisos x 0,5 m2/m2 = 1,0 m2/m2 que é inferior ao índice máximo volumétrico possível.

De referir que este índice de utilização é possível de implementar respeitando os parâmetros exigíveis, nomeadamente o altimétrico, podendo, por exemplo, ser adotada uma cota para o 1.º piso ligeiramente abaixo em relação à cota de soleira principal de forma a ultrapassar qualquer constrangimento decorrente de pés direitos regulamentares.

O custo da construção considerado teve como referencial a Portaria n.º 353/2013, de 4 de dezembro que fixou para o ano de 2014 o custo da construção na zona I (onde se insere o concelho de Viseu) em 801,06 €/m2 de área útil de construção.

E é distinta, também nesta parte, a posição do Sr. Perito da expropriante.

28) Construções / Benfeitorias

Encontram-se descritas na Vistoria ad perpetuam rei memoriam como benfeitorias e construções afetadas pela expropriação:

a) Para a maioria dos peritos - O depósito de água com 10,3m de diâmetro e 4,0m de altura, teria uma capacidade de cerca de 300m3, teria um custo de reposição em novo de cerca de 81.000,00€. Usando a Tabela de ROSS-HEIDECKE para a depreciação das construções e admitindo que o depósito já tem 50% da sua vida útil e que o seu estado de conservação é “reparos simples e importantes” – Código F, a depreciação seria de 58,20%. Resultam as valorizações:

Depósito de água 81.000,00€ x 0,418 = 33.858,00€

12 Choupos 240,00€

2 Cedros 25,00€

34.123,00€

b) Para o perito da expropriante não é de considerar como benfeitorias nem os muros nem o poço, que terão de ser demolidos / entulhados.

29) Desvalorização da parcela sobrante: A área da parcela a expropriar representa mais de 35% do terreno original. Neste caso é considerado que a parte sobrante ficará com um interesse económico ainda mais reduzido. Então dadas dimensões da parcela sobrante ponderou-se a percentagem em 6% do valor do custo de construção considerado, donde resulta que o valor a fixar é de 15.645,27€ (posição da maioria dos peritos)

30) Donde, tudo calculado, a maioria dos senhores peritos, do Tribunal e dos Expropriados calculam a junta indemnização em 190.562,25€ e o Sr Perito da A. calcula-a em 127.273,18€

31) O depósito de água existente na parcela 2 não estava em funcionamento e era obsoleto, apresentando sinais de degradação pela idade.

2. Matéria de facto – Factos não provados

Era possível repor o depósito em funcionamento e o custo seria de 81.000,00 euros.

C) Apreciação das restantes questões objeto do recurso

1 – Não se farão considerações sobre o enquadramento jurídico geral dos factos, por estar já feito na sentença e não ter sido colocada em causa no recurso, seguindo-se diretamente para análise das questões colocadas no recurso.

Apenas se dirá que este Tribunal da Relação também adere às conclusões do laudo maioritário dos peritos por não encontrar razões de discordância.

2 – Questão relativa ao índice de construção.

A Recorrente argumenta que face a um índice volumétrico de ≤ 3,5 m3/m2, e o índice de ocupação de ≤ 50 %), «…os cálculos necessários para convolar o volume de área, em índice de utilização, 3,5:6, temos um valor final de índice de utilização para as parcelas expropriadas de 0,58m2/m2 de terreno.

Assim, o índice de construção/área edificável de 1,00/m2, considerado pelos peritos e acolhido na decisão arbitral está errado, não podendo ser superior a 0,58m2/m2 de terreno, porquanto os artigos 88º e 90º do PDM de Viseu, impõem uma altura máxima de 6 metros, o que implica que não possam ser construídos dois pisos, mas, quando muito, um pavilhão ou um bloco com um piso intermédio para albergar os respetivos serviços administrativos.

Não assiste razão à Recorrente.

O Regulamento do Plano Diretor Municipal de Viseu (Diário da República, 2.ª série — N.º 188 — 30 de setembro de 2013, pág. 29794) dispõem, efetivamente, no seu artigo 90.º n.º 1, que «As áreas inseridas em Unidades Operativas de Planeamento e Gestão Tipo 4, designadas por UOPG 4, e devidamente cartografadas na planta de ordenamento destinam -se a atividades económicas, e que no seu todo agregam o solo urbanizado e urbanizável.»

E, mais à frente, refere-se neste artigo que «a3) Índice volumétrico ≤ 3,5m3 /m2, com um máximo de 6 m no plano lateral, salvo situações específicas relacionados com a tipologia da atividade» e «a4) Índice de ocupação ≤ 50 %, desde que não seja em banda contínua;»

Verifica-se que quer os árbitros, quer os peritos, indicaram um índice de construção de 1,00/m2, no pressuposto de que era possível uma construção com dois pisos.

A recorrente não mostra, indicando alturas máximas dos pisos e espessura mínima do piso intermédio, que seja inviável essa construção em dois pisos.

Por outro lado, nem todas as construções para «atividades económicas» referidas no artigo 90.º do PDM implicam a construção de um pavilhão. Muitas empresas que prestam serviços não carecem de funcionar em pavilhões.

Será o caso de uma empresa que preste serviços, por exemplo, na área da informativa, do imobiliário, da arquitetura ou da topografia, etc., as quais não carecem de funcionar num pavilhão.

Improcede, pelo exposto, esta pretensão recursiva.

3 - Quanto à aplicação do fator corretivo previsto no artigo 26º, n.º 10 do C.E.

A recorrente alega que o tribunal aderiu ao laudo maioritário dos peritos e, por isso, quando optou por estabelecer a indemnização fixada pelos árbitros, quando devia ter seguido aquilo que os peritos referiram a respeito do mencionado fator corretivo.

Com efeito, quanto à Parcela n.º 1, os árbitros consideraram uma percentagem de 4,2% e 5,4% quanto à Parcela n.º 2, quando é certo que todos os cinco peritos que procederam à avaliação entenderam ser de aplicar uma percentagem de 10% em detrimento dos 4,2% e 5,4% constantes da decisão arbitral, daí que a Recorrente defenda que deva «… ser proferida Decisão que, para efeitos de aplicação do artigo 26º, nº 10 do CE, determine a percentagem unanimemente considerada no Relatório pericial de 10%.» - Conclusão BB.

Não assiste razão à Recorrente, pelas seguintes razões:

(I) Aceita-se que existindo, como existe unanimidade entre os peritos, o tribunal pudesse considerar, dado o conhecimento especializado destes técnicos, que a percentagem a aplicar seria essa de 10%.

Aplicando essa taxa, os resultados da aplicação, tendo em conta o laudo da arbitragem, seriam os seguintes:

▪ Parcela n.º 1

Índice fundiário =18.00% x (1- 0,10)

Índice fundiário =16,2%

Valor unitário do solo = 400,00€ x 0,162 x 1,00 = 64,80 €/m2

Valor do solo da Parcela

629,50 m2 x 64,80 € = 40 791,60 €

▪ Parcela n.º 2

Índice fundiário =16.00% x (1-0,10)

Índice fundiário =14,4%

Valor unitário do solo = 400,00€ x 0,144x1,00 =57,60 €/m2

Valor do solo da Parcela

1535,23 m2 x 57,60 € = 88.429,25 €

(II) Estes valores conduzem a valores inferiores ao da arbitragem, que estabeleceu o valor do solo da Parcela n.º 1 em 43.410,32 euros e o da Parcela n.º 2 em 92.912,11 euros.

Sucede, porém, que o valor atribuído pelos peritos ao valor do solo para a Parcela n.º 1 foi de 58.109,15 euros e de 140.793,98 euros para a Parcela n.º 2, valores estes superiores aos estabelecidos pelos árbitros.

Coloca-se a questão de saber se tendo o tribunal aderido à totalidade do laudo dos peritos, mas não podendo fixar o valor da indemnização na quantia indicada pelo laudo pericial, devido ao princípio de que o recorrente não pode ficar mais prejudicado que ficaria se não tivesse recorrido (reformatio in pejus), poderá servir-se de uma parte do laudo dos peritos para o enxertar na decisão arbitral e chegar a um valor mais baixo que o fixado na decisão arbitral, como resulta das contas que ficaram acima indicadas no ponto «(I)».

A resposta é negativa porque se o tribunal recorrido entendeu que a avaliação correta era aquela que foi realizada no laudo maioritário, como este tribunal da Relação também entende, o qual aplicando aquela taxa de 10%, mesmo assim, estabeleceu o montante de 58.109,15 euros como valor do solo para a Parcela n.º 1 e 140.793,98 euros para a Parcela n.º 2, então não pode depois aplicar esta percentagem de 10% aos restante parâmetros do laudo de arbitragem, porque tal procedimento conduziria a um valor inferior para as parcelas, contrário ao valor que o tribunal declarou ser o correto, isto é, ao indicado no laudo pericial maioritário, que o tribunal só não aplicou ao caso  devido à proibição da reformatio in pejus («…o parágrafo exclui a reformatio in pejus: o julgamento do recurso não pode agravar a posição do recorrente, tornando-a pior do que seria se ele não tivesse recorrido» - Prof. Alberto dos Reis,  Código de Processo Civil Anotado, Vol. V (Reimpressão), Coimbra/1984. pág. 311).

Daí, que, com base neste raciocínio, o tribunal recorrido tenha fixado o valor do solo em montante igual ao do laudo arbitral.

Por outras palavras, tendo o tribunal concluído que a avaliação correta era a indicada no laudo pericial, não podia depois, sob pena de contradição, retirar um dos parâmetros do laudo pericial para o aplicar ao laudo arbitral porque, procedendo assim, resultaria daí um valor de indemnização mais baixo e, por conseguinte, contrário aquele valor que tribunal tinha como adequado.

4 - Relativamente à Parcela n.º 1 – Depreciação da parcela sobrante devido à divisão do prédio.

Relativamente à Parcela n.º 1, a decisão arbitral atribuiu o valor de 14.689,51 euros a título de desvalorização da parcela sobrante.

No recurso, a Expropriante defendeu não haver lugar a qualquer indemnização a este título, entendimento seguido, de forma unânime, pelos cinco peritos, concluindo: «… pelo que, deverá ser proferida Decisão em conformidade que conclua pela não desvalorização da área sobrante e, consequentemente, não ser devido qualquer montante indemnizatório a este título» - Conclusão LL.

Por conseguinte, deve excluir-se esta verba de 14.689,51 euros da indemnização relativa à Parcela n.º 1.

Não assiste razão à Recorrente, pelas razões antes referidas.

A indemnização relativa à Parcela n.º 1 incluiu o valor do solo (43.410,32), das benfeitorias (8.910,00), não questionadas no recurso, e a desvalorização (14.689,51) agora contestada.

Como se disse atrás, se o tribunal entendeu que a avaliação correta era aquela que tinha sido realizada no laudo maioritário, que desconsiderou a existência de qualquer desvalorização, mas, mesmo assim, estabeleceu o montante de 58.109,15 euros para o valor do solo da Parcela n.º 1, mais 9.625,00 euros a título de prejuízo por benfeitorias, não pode depois o tribunal aplicar este juízo (não existência de desvalorização) aos restante parâmetros do laudo de arbitragem porque tal aplicação conduziria a um valor inferior para a Parcela n.º 1, contrário ao valor que o tribunal declarou ser o correto, isto é, o valor indicado no laudo pericial maioritário, que o tribunal só não aplicou devido à proibição da reformatio in pejus.

Daí, que, com base neste raciocínio, o tribunal recorrido tenha fixado o valor da indeminização para a Parcela n.º 1 em 67.009,83 euros, coincidente com o laudo arbitral.

Improcede, pelo exposto, este argumento recursivo.

5 – Relativamente ao valor da benfeitoria na Parcela n.º 2.

Na decisão arbitral os senhores árbitros atribuíram ao depósito de água, de 330 m2, em betão armado, uma indemnização de 70.000,00 euros, valor que a Expropriante impugnou.

Os peritos consideraram ser de atribuir, pelo referido depósito, o valor de 33.123,00 euros.

O tribunal entendeu que não era devida qualquer indemnização.

Por conseguinte, a Expropriante sustenta que o tribunal a quo devia ter subtraído à indemnização fixada não os 33.123,00 euros indicados pelos peritos, mas os 70.000,00 euros fixados pelos árbitros, e, por isso, pede que esta Relação restabeleça a coerência da decisão recorrida.

Também aqui não assiste razão à Recorrente, pelas mesmas razões.

Como o tribunal entendeu que a avaliação correta era aquela que tinha sido realizada no laudo maioritário, que considerou o valor das benfeitorias em 33.123,00 euros, então tinha de ser este o valor a deduzir e não o valor de 70.000,00 atribuído pelos árbitros.

Improcede, pois, este argumento recursivo, cumprindo manter a decisão recorrida.

IV. Decisão

Considerando o exposto, julga-se o recurso improcedente e mantém-se a sentença recorrida.

Custas do recurso pela recorrente.


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Coimbra, …