NULIDADE DA SENTENÇA
NULIDADE PROCESSUAL
JUSTO IMPEDIMENTO
DECLARAÇÕES DE PARTE
CAPACIDADE
Sumário


A regra prevista no artigo 495.º do CPC sobre a verificação da capacidade das testemunhas, dependente da aptidão para depor sobre os factos que constituem objeto da prova, é aplicável à aferição da capacidade para prestação de declarações de parte.

Texto Integral


Acordam na 2.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães:

I. Relatório

AA, instaurou, em 03-01-2023, ação de inventário por óbito de BB, falecido em ../../2021, no estado de casado com a requerente, sob o regime imperativo da separação de bens.
Requereu que fosse nomeada cabeça-de-casal e juntou relação de bens.
Por despacho de 05-01-2023, nomeou-se a requerente para o cargo de cabeça-de-casal.
Os interessados CC, DD e EE reclamaram da relação de bens, onde, além do mais, acusaram a falta de relacionamento.
A cabeça-de-casal respondeu à reclamação impugnando a facticidade nela alegada.
Em 09-05-2022, a cabeça de casal outorgou procuração a favor de EMP01... - Sociedade de Advogados RL, representada pelos advogados FF, GG, HH, II, JJ, KK e LL (advogada estagiária).
Nessa procuração vem exarado, além do mais, o seguinte: «(…) a quem, individualmente e com os de substabelecer, confere os mais amplos poderes forenses em Direito permitidos, bem como os poderes especiais para a representar (…)».
Pelo requerimento com a referência ...58 de 07-05-2024 foi junto, além do mais, substabelecimento com reserva do Ilustre Advogado Dr. HH para a Ilustre Advogada Sra. Dra. MM, substabelecendo os poderes forenses que lhe haviam sido conferidos pela recorrente no âmbito do presente processo.
No requerimento probatório apresentado, os interessados reclamantes requereram, além do mais, o depoimento de parte da cabeça de casal.
Na resposta apresentada à reclamação, a cabeça de casal nada disse ou requereu quanto ao requerimento probatório apresentado pelos interessados reclamantes, concretamente, quanto à possibilidade de prestação do respetivo depoimento de parte.
Por despacho de 29-04-2024 foi designado o dia 28-05-2024, pelas 09h30m para a tomada de declarações à cabeça-de-casal e aos reclamantes e, bem assim, para inquirição das testemunhas arroladas por reclamantes e cabeça-de-casal.
A cabeça de casal não compareceu na diligência probatória realizada no dia 28-05-2024, apesar de regulamente notificada.
Na ata de Inquirição de testemunhas de 28-05-2024 fez-se constar que, estando presentes os mandatários das partes, foi aberta a diligência pelas 09h50m, tendo o Ilustre mandatário da cabeça de casal dado conta de que a sua constituinte não se encontra presente, uma vez que foi a uma consulta médica, relegando para final o pedido de justificação.
Após a produção de prova, com inquirição de quatro testemunhas e dos interessados EE e EE, o Ilustre mandatário da cabeça de casal requereu o seguinte: «Considerando a ausência da Senhora Cabeça de Casal, requer a V. Exª se digne relevar que a mesma se encontra ausente uma vez que teve que se dirigir ao Centro de Saúde ..., por motivos de problemas de saúde, de doença, e que protesta juntar no prazo legal o respetivo documento comprovativo da sua falta e que seja considerada a falta justificada e possa prestar declarações de parte na data que vier a ser designada para a outra parte que faltou a Sra. D. CC.
Relativamente à testemunha cuja notificação se frustrou e que estava em prazo para se pronunciar relativamente à morada da mesma, requer a V. Exª se digno ordenar a notificação da testemunha NN para a Rua ..., ... ..., para efeitos de também ser inquirida na próxima data que vier a ser designada para as declarações de parte supra referidas».
Após, foi proferido o seguinte despacho: «Uma vez que as partes não prescindem das declarações de parte da Cabeça de Casal e da Interessada CC, suspende-se a presente diligência que continuará no dia 04 de Julho de 2024, pelas 09:30 horas, data previamente acordada com os Mandatários das partes, para declarações de parte da Cabeça de Casal e da Interessada CC e inquirição da testemunha NN.
Aguardem os autos a justificação das partes faltosas no prazo legal.
Notifique a testemunha na morada indicada.
Notifique».
Na ata de Inquirição de testemunhas de 28-05-2024 fez-se constar que pela Mandatária dos interessados foi ainda requerido: “Os reclamantes, aquando da dedução do incidente de reclamação à relação de bens, de entre outras pessoas arrolaram como testemunha o gestor das contas bancárias sediadas na Banco 1... SRL, S.A. de que o inventariado fosse titular ou cotitular junto daquela Instituição, na altura não identificou o gestor das contas por desconhecer a respectiva identificação, da informação que foi vinculada por uma das testemunhas que trabalha no balcão de ..., as mesma informou que a gestora seria uma colega de nome OO, com domicilio profissional junto da agência da Banco 1... de ... e portanto, uma vez apurada a identificação da gestora e uma vez que também foi oportunamente requerida a sua inquirição os reclamantes requerem que este Tribunal envide as diligencias necessárias com vista à notificação desta gestora para que comparece neste Tribunal na data já agendada para que possa prestar declarações”.
Na ata de Inquirição de testemunhas de 28-05-2024 fez-se constar que foi dada a palavra ao Mandatário da Cabeça de Casal pelo mesmo foi dito nada ter a opor ao requerido, após o que a Meritíssima Juíza proferiu despacho a deferir o requerido.
Consta da parte final ata de Inquirição de testemunhas de 28-05-2024, que logo, todos os presentes foram devidamente notificados dos despachos ali proferidos.
Em 04-06-2024, a cabeça de casal apresentou requerimento com o seguinte teor: «(…) na decorrência da audiência realizada no passado dia 28-05-2024, em que a Parte faltou por motivo de doença,
Requer a V. Exa. se digne relevar que a Cabeça-de-casal e herdeira sofre de vários problemas de saúde, entre os quais, inclusive, Oligofrenia, tremor essencial, perturbação depressiva, insónia, bócio multinodular, mucocele apendicular, insuficiência mitral, tricúspide ligeira, espondilartrose C4 e C5, dislipidemia, hipertrofia cornetos e desvio septo nasal, com diagnóstico de incapacidade, de acordo com a Médica Dra. PP (cfr. Documento n.º 1 ora junto e dado por reproduzido).
Nesse sentido, no dia 28-05-2024 deslocou-se ao Centro de Saúde por agravamento do seu estado de saúde, pelas razões acima descritas, porém, o Médico apenas esteve da parte de tarde, pelo que acabou por aguardar por consulta até à parte de tarde entre as 15h e as 17h10m do dia 28 de Maio de 2024 (cfr. Documento n.º 2 ora junto e dado por reproduzido).
Pelo que, tendo estado impossibilitada nessa data, requer se digne admitir a falta justificada.
Mais se requer se digne relevar que a Cabeça-de-casal irá verificar junto da médico se estará possibilitada de prestar o seu depoimento na próxima audiência agendada».
Consta do Doc. n.º 1 junto com o requerimento de 04-06-2024 a seguinte informação médica: «Declaro, por minha honra que AA (…) sofre de: Oligofrenia, tremor essencial, perturbação depressiva, insónia, bócio multinodular, mucocele apendicular (…), insuficiência mitral, tricúspide ligeira, espondilartrose C4 e C5, dislipidemia, hipertrofia cornetos e desvio septo nasal»
Consta do Doc. 1 junto com o requerimento de 04-06-2024, no espaço com a referência “Diagnósticos incapacitantes ou de situação de deficiência e/ou dependência”, o seguinte: «Oligofrenia, tremor essencial, perturbação depressiva, insónia, tiroidictomia total, esponda artrose (…)».
 Do doc. 1 junto com o requerimento de 04-06-2024, consta assinalado que a pessoa examinada não está impossibilitada de se deslocar.
Em 11-06-2024, foi proferido o seguinte despacho: «Referências ...56 e ...46
Atentos os motivos invocados e os elementos documentais apresentados, julgo justificadas as faltas das interessadas AA e CC, à diligência realizada no passado dia 28 de Maio de 2024».
Consta da parte inicial da ata referente à diligência probatória realizada no passado dia 04-07-2024, às 09h30m, o seguinte:
«À hora designada, constatei que o Ilustre Mandatário da Cabeça de Casal não se encontrava presente. Dado conhecimento desse facto ao Mm.ª Juíza de Direito, pela mesma foi ordenado que se contactasse o escritório do Ilustre Mandatário a inquirir do seu atraso, o que foi transmitido aos intervenientes presentes.
Face à não comparência do Ilustre mandatário da Cabeça de Casal, quando eram 09h40 o funcionário judicial ligou para o escritório do Dr. HH a informar que estava designado para o dia de hoje a diligência de inquirição de testemunhas e se havia algo motivo para a não comparência do Ilustre Mandatário na diligência, tendo a funcionária do escritório informado que iria entrar em contacto telefónico com o Mandatário para averiguar o que estava a suceder, cerca de 05 minutos mais tarde o Tribunal ligou novamente para o escritório do Ilustre Mandatário tendo a mesma funcionária informado que o Ilustre Mandatário estava doente e a Dra. MM que tem procuração conjunta nos autos o iria substituir na diligência.
Pelas 09h55m o Tribunal ligou para a Dra. MM tendo esta informado o Tribunal que ainda estava em ... e que iria sair nesse momento do seu escritório».
Consta da ata da diligência realizada a 04-07-2024 - «Auto de inquirição de testemunhas - continuação» - que estavam presentes os seguintes intervenientes: «Cabeça de Casal: AA. A Ilustre Mandatária da Cabeça de Casal: Dra. MM. A Testemunha da Cabeça de Casal: NN. A Interessada: CC. A Ilustre Mandatária da Interessada: Dra. QQ. A Testemunha da Interessada CC: OO».
Consta da ata da diligência realizada a 04-07-2024, entre o mais, o seguinte: «Declarada aberta a diligência pela Mm.ª Juíza de Direito quando eram 10h05m, foi de imediato ordenado que se iniciasse a tomada de prova que segue:
TESTEMUNHA DA INTERESSADA
OO, casada (…)
DECLARAÇÕES DE PARTE DA INTERESSADA
CC, casada (…)
Neste momento, pela Ilustre Mandatária da Interessada, a Dra. QQ, solicitou o uso da palavra, tendo-lhe sido concedida pela Mm.ª Juíza de Direito, e no seu uso, requereu:
“Na sequência das declarações prestadas pela interessada CC e uma vez que entendemos que assume especial relevo para o que se encontra em discussão no âmbito deste incidente à reclamação da relação de bens  (…), requer-se a este Tribunal que seja autorizada a junção aos autos do indicado extracto (…)”.
Dada a palavra à Ilustre Mandatária da Cabeça de Casal pela mesma foi dito:
“Vem deduzir oposição à junção dos documentos referidos (…)”

De seguida pela Meritíssima Juíza foi proferido o seguinte:
DESPACHO
A presente diligência destina-se à produção de prova, para que o Tribunal possa apreciar e decidir o incidente à reclamação à relação de bens que foi deduzido pelos interessados.
A interessada CC, prestou declarações, uma vez que tal diligência foi requerida e admitida pelo Tribunal, tendo mencionado ter na sua posse um extracto de uma conta bancária do seu pai, aqui inventariado, extracto esse reportado a um período em que o inventariado ainda se encontrava vivo.
(…)
Considerando as regras que se aplicam ao presente incidente e, como dissemos trata-se de um requerimento manifestamente extemporâneo. Indefere-se a pretendida junção aos autos do documento aqui em causa.
(…)
De seguida pela Mm.ª Juíza de Direito, ordenou em seguida que se iniciasse a tomada de prova que segue:
TESTEMUNHA DA CABEÇA DE CASAL
NN, divorciada (…)
DECLARAÇÕES DE PARTE DA CABEÇA DE CASAL
AA, viúva, residente em Caminho ..., ..., ..., deste município ....
Aos costumes disse que foi casada com o Inventário, facto que não a impede de dizer a verdade.
Foi advertida das sanções aplicáveis às falsas declarações de harmonia com o estatuído no artigo 459.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, tendo de seguida prestado o juramento legal.
Declarações registadas no sistema de gravação digital, disponível neste Tribunal, com início às 11h44 e termo às 12h24m. (…)».
Após a prestação das declarações de parte da cabeça de casal, pela Mm.ª Juiz de Direito foi proferido o seguinte despacho: «Tendo sido tomado depoimento de parte por parte pela cabeça de casal e interessada AA e nos termos das disposições conjugadas do disposto nos Art.º 463º e Art.º466º, ambos do Código de Processo Civil o Tribunal reduz a escrita à seguinte assentada:
“Que todo o dinheiro das contas bancárias em causa nos autos pertencia ao inventariado.
Admitiu ter concordado com os demais interessados na partilha dos € 80.000,00, existente na Banco 1..., recebendo cada interessado € 20.000,00 inclusive a cabeça de casal, que abriu uma conta, na qual depositou esses € 20.000,00.
Relativamente ao alegado no artigo 78º da reclamação à relação de bens, admitiu a existência na casa de todos os bens que estão elencados da alínea a) à alínea o), ficando esclarecido que a alinha o) é um barco, não de recreio, mas é um barco pequeno, sendo um objecto decorativo.
Quanto ao carro e ao tractor admite que os mesmos foram vendidos e o dinheiro (produto das vendas) foi repartido pelos quatro.”.
Notifique».
Seguidamente, o Tribunal recorrido deu a palavra aos Ilustres mandatários das partes, pelos mesmos foi dito nada a terem a requerer.
Após, foi lida a assentada à cabeça de casal, foi a mesma por esta confirmada.
Seguidamente, a Ilustre Mandatária da Cabeça de Casal, a Dra. MM, solicitou o uso da palavra, tendo-lhe sido concedida pela Mm.ª Juíza de Direito, e no seu uso, requereu:
«Face aos documentos juntos apresentados no dia 04-06-2024, que atestam que a aqui cabeça de casal padece de várias doenças que a tornam incapaz de depor vem impugnar o seu depoimento e todo o confessado nos termos dos artigos 495º e seguintes e 452º e seguintes do Código de Processo Civil, espera deferimento».
Pelas 11h24m do dia 04-07-2024, o Ilustre Advogado Dr. HH apresentou requerimento nos autos, com o seguinte teor: “(…) O Advogado signatário foi acometido de doença súbita na noite de 3 para 4 de Julho de 2024, presente data, concretamente de gripe, tendo ficado com várias dores gripais, febre e, consequentemente, impossibilitado de sair de casa.
(…)
Pelo que requer a V. Exa. se digne relevar a ausência por doença do Advogado signatário que, à primeira hora da manhã, solicitou a Colega Advogada do seu escritório para comparecer em sua substituição na referida diligência judicial, desconhecendo-se se o Tribunal relevou o atraso e aguardou pela sua presença, o também se requer.
Mais se requer se digne relevar o justo impedimento do Advogado signatário por motivo de doença e considerar justificada a sua falta, para todos e os demais efeitos (Cfr. Art.ºs 140.º e 603.º ambos do CPC).
Junta: Auto Declaração de Doença e comprovativo de medicação».
 (…)”
Por requerimento apresentado em 18-07-2024, a cabeça de casal requereu que fosse declarada a nulidade da audiência realizada no dia 4-07-2024 e anulados todos os atos subsequentes, ordenando-se a repetição da mesma ou, se assim não se entender, sejam invalidadas as declarações da cabeça de casal e, consequentemente, tudo o quanto por ela tiver sido confessado, por verificação de incapacidade para depor, por referência ao documento n.º 1 junto com o requerimento da Cabeça de Casal de 04-06-2024, Ref.ª citius 49105830.
Por despacho de 08-10-2024, o Tribunal a quo indeferiu a requerida impugnação do depoimento prestado pela cabeça de casal e respetiva confissão, com custas do incidente a cargo da cabeça de casal, fixando a taxa sancionatória excecional em 4 UC, mais indeferindo a suscitada nulidade da audiência realizada no dia 4-07-2024.

Inconformada com tais decisões, a requerente/cabeça de casal apresentou-se a recorrer, terminando as suas alegações com as seguintes conclusões (que se transcrevem):
«A) O objecto do presente Recurso é o Despacho do Tribunal a quo proferido em 10-10-2024, Referência citius 52883485, e que decide indeferir o requerido pela Mandatária da Cabeça-de-Casal na audiência realizada no dia 04-07-2024, que consta em Acta com a mesma data, referência ...10, e em consequência condená-la no pagamento das custas pelo incidente, fixando taxa sancionatória excepcional em 4UC, bem como indeferir o requerido pela Cabeça-de-Casal em requerimento de 18-07-2024, Referência citius 453458, e condenar ao pagamento da taxa de justiça pelo mínimo legal.
B) Sendo a decisão imediatamente recorrível, nos termos das alíneas d), e) e h) do n.º 2 do art.º 644.º do CPC, porque o Tribunal a quo indeferiu o requerido pela Mandatária da Cabeça-de-Casal na audiência realizada no dia 04-07-2024, que consta em Acta com a mesma data, referência ...10, em que invoca a incapacidade de depor, medicamente atestada, da Cabeça-de-Casal e impugna o seu depoimento prestado na referida audiência, bem como todo o confessado.
C) Tendo, aliás, o Tribunal a quo, condenado a Cabeça-de-Casal no pagamento das custas pelo incidente, pelo que fixou taxa sancionatória excepcional em 4UC.
D) E decidiu ainda indeferir o requerido pela Cabeça-de-Casal em requerimento de 18-07-2024, Referência citius 453458, em que invoca a nulidade da audiência realizada a 04-07-2024 e reitera o requerido na aludida audiência mediante requerimento ditado para acta, onde invoca a incapacidade para depor da Cabeça-de-Casal e impugna o seu depoimento, bem como todo o confessado.
E) Além disso, as razões que justificam a admissibilidade da apelação autónoma e imediata das decisões prendem-se, para além da, desejável, celeridade processual, com a conveniência de atenuar os riscos de uma futura inutilização do processado.
F) Conforme se decidiu no Acórdão da Relação de Lisboa de 17-05-2017, Processo n.º 28048/15.3T8LSB.L1-4, disponível em www.dgsi.pt.
G) A procedência do recurso implica a inutilização e a repetição de todos os actos que sejam afectados por aquela procedência; entre esses actos inclui-se posterior Sentença como decisão final.
H) Julgada procedente a apelação autónoma tal determinará que o Tribunal tenha de julgar verificada a nulidade da audiência realizada no dia 04-07-2024, ou subsidiariamente, não efectuado o depoimento da Cabeça-de-Casal e por essa via não confessados os factos e assim valorados.
I) Nesse sentido o Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 17-05-2018 disponível em http://www.dgsi.pt/jtrg.nsf/86c25a698e4e7cb7802579ec004d3832/d0409c72191bc7c78025829f002e4650?OpenDocument.
J) Também por isso mesmo o recurso de apelação autónoma deverá ser admitido ao abrigo das alíneas d), e) e h) do n.º 2 do art.º 644.º do CPC.
K) Para além disso, tendo em consideração que o Tribunal a quo declarou aberta a audiência e deu início à mesma, antes da chegada ao Tribunal da Mandatária substabelecida, tendo procedido à audição do depoimento da Testemunha OO, arrolada pela Interessada, depoimento registado no sistema de gravação digital, disponível no Tribunal, com início às 10h09 e termo às 10h15, sem a presença do Mandatário com procuração nos autos ou da Mandatária com substabelecimento (cfr. Acta de inquirição de testemunhas de 04-07-2024, Referência citius 52500510).
 L) Foi coartada a possibilidade da Cabeça-de-Casal exercer o contraditório/contrainterrogatório, através do Mandatário com Procuração nos autos (impedido de forma imprevisível mas justificada nos autos) ou da Mandatária com Substabelecimento com reserva nos autos, o que acabou por influir na boa decisão da causa e nos actos subsequentes praticados na mesma audiência.
M) Omissão essa que os Mandatários da Cabeça-de-Casal apenas se deram conta existir quando se mostrou disponibilizada a Acta de inquirição de testemunhas de 04-07-2024, Referência citius 52500510, que terá sido disponibilizada em data coincidente ou posterior a 08-07-2024, conforme assinatura vertida na mesma, embora se encontre registada na plataforma citius a 04-07-2024.
N) Está em causa o previsto nos art.ºs 603.º n.º 1, 140.º, 195.º n.º 1, 199.º n.º 1, todos do CPC, conforme requerimento datado de 18-07-2024, Referência citius 49521388.
O) O despacho do Tribunal a quo presentemente em crise ao indeferir a invocada nulidade de todos os actos praticados na referida audiência realizada no dia 04-07-2024, e a anulação de todos os actos subsequentes, bem como a repetição daquela audiência, incorre igualmente em nulidade, nos termos do art.º 615.º, n.º 1, alíneas b) e c) do CPC.
P) Outrossim, por um lado, conforme resulta da Acta de Inquirição de Testemunhas, de 04-07-2024, com a Referência citius 52500510, assinada em 08-07-2024, que terá sido disponibilizada nessa data,
Q) Na referida data de diligência, 04-07-2024, à hora designada para a continuação da diligência de prova marcada para esse dia o Ilustre Mandatário da Cabeça de Casal não se encontrava presente, tendo sido contactado o seu escritório para esclarecer o motivo do atraso.
R) A funcionária do escritório informou que iria contactar o Mandatário para averiguar o que estava a suceder, e poucos minutos mais tarde voltou a informar que o Mandatário estava impossibilitado de se deslocar ao Tribunal por doença repentina e inesperada, pelo que seria a colega Advogada, Dra. MM a assegurar a diligência, através de Substabelecimento com reserva nos próprios autos.
S) O Tribunal contactou então a Dra. MM, que se encontrava em ..., tendo a mesma informado que se iria deslocar naquele preciso momento para o Tribunal, em respeito aliás pelo Tribunal, funcionários de justiça, colegas, demais sujeitos processuais e testemunhas presentes.
T) Sucede que o Tribunal declarou aberta a diligência antes mesmo da chegada da Mandatária substabelecida ao Tribunal, tendo iniciado a audição do depoimento da Testemunha OO, arrolada pelos Interessados, depoimento registado no sistema de gravação digital, disponível no Tribunal, com início às 10h09 e termo às 10h15, sem a presença do Mandatário com procuração nos autos ou da Mandatária com substabelecimento.  
U) Porém, tendo em conta o informado pelo escritório do Mandatário da Cabeça de Casal, bem como o teor do documento junto aos autos por e-mail pelo mesmo escritório no dia 04-07-2024, Ref.ª Citius 4516613, a sua falta à audiência considera-se justificada, por verificação de justo impedimento.
V) O Mandatário com procuração nos autos acordou na manhã do dia da diligência, imprevisivelmente com gripe, febres altas, dores no corpo, tonturas etc, juntando declaração de baixa médica ao processo, sendo bastante para constituir justo impedimento, tal como refere o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 01- 06-2011, Processo n.º 841/06.5PIPRT.P1, relatado por Ricardo Costa e Silva, disponível em https://jurisprudencia.pt/acordao/13814/.
W) Destarte, havendo justo impedimento do Mandatário com procuração nos autos e não sendo a diligência adiada porque a Mandatária com substabelecimento se dirigiu de imediato para o Tribunal, pelo menos teria o Tribunal que aguardar a sua chegada para iniciar a produção de prova. 
X) In casu, havendo justo impedimento do Mandatário não foi dada a possibilidade à Mandatária da Cabeça de Casal de interrogar a referida testemunha arrolada pelos Interessados e por via disso exercer o contraditório/contrainterrogatório, sendo cristalino que essa omissão influi na boa decisão da causa, bem como nos actos subsequentes praticados nessa mesma audiência, em clara violação dos art.ºs 3.º n.º 3 e 415.º n.º 1, ambos do CPC.
Y) A acta da audiência apenas terá sido disponibilizada em data coincidente ou posterior a 08-07-2024, conforme assinatura vertida na mesma, embora se encontre registada na plataforma citius a 04-07-2024, Ref.ª citius 52500510.
Z) Logo, os Mandatários da Cabeça de Casal, apenas quando verificaram o conteúdo da respectiva Acta de inquirição de testemunhas se aperceberam que o depoimento da testemunha OO decorreu anteriormente à chegada da Mandatária à sala de audiências, tendo apenas presenciado os actos subsequentes.
AA)E não o poderia ter feito na própria diligência, em que interveio, como refere o Tribunal a quo no douto Despacho ora recorrido, porquanto só se apercebeu depois da audiência terminar, ao ler a acta de inquirição de testemunhas disponibilizada na plataforma citius, que teria sido ouvida antes da sua chegada uma testemunha, sem lhe ser dada a possibilidade de exercer o contraditório/contra-interrogatório.
BB)Pelo que, estava a Cabeça-de-Casal por via dos seus Mandatários, ainda em tempo para invocar a nulidade aludida, nos termos dos art.ºs 149.º, n.º 1 e 199.º, n.º 1 ambos do CPC, tendo sido notificados a 09-07-2024, presumindo-se só a 12-07-2024, de acto posterior à audiência, o requerimento dos Interessados com a referência citius 4522949, conforme fez em requerimento datado de 18-07-2024, com a Referência citius 49521388.
CC)Assim, são nulos todos os actos praticados na referida audiência, havia já sido invocada a referida nulidade da audiência realizada no dia 04-07-2024, e requerida a repetição da mesma, por requerimento de 18-07-2024, Referência citius nos termos dos art.ºs 603.º n.º 1, 140.º, 195.º n.º 1 e 199.º n.º 1, todos do CPC.
DD)Pelo que, salvo o devido respeito, que é muito, não se vislumbra como poderá o Tribunal a quo ter chegado a outro entendimento que não o da nulidade da referida audiência, fazendo uma incorrecta interpretação e aplicação, bem como incorrendo em violação dos art.ºs 603.º n.º 1, 140.º, 195.º n.º 1 e 199.º n.º 1, todos do CPC. 
EE)Nesse sentido, vide o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 14-07-2022, Processo n.º 11669/16.4T8SNT-C.L1-7, relatado por Isabel Salgado, disponível em http://www.gde.mj.pt/jtrl.nsf/33182fc732316039802565fa00497eec/7b962f61c54f2879802588c20055e47f.
FF) Por outro lado, a Cabeça de Casal sofre de vários problemas de saúde, que se vieram a agravar significativamente nos últimos tempos, tais como Oligofrenia, tremor essencial, perturbação depressiva, insónia, bócio multinodular, mucocele apendicular, insuficiência mitral, tricúspide ligeira, espondilartrose C4 e C5, dislipidemia, hipertrofia cornetos e desvio septo nasal, com diagnóstico de incapacidade, para o depoimento, de acordo com a Médica Dra. PP (cfr. Documento n.º 1 junto com o requerimento da Cabeça de Casal de 04-06-2024, Ref.ª Citius 49105830), e foi por isso que já se viu incapacitada para depor e estar presente na audiência realizada no dia 28-05-2024, à qual faltou justificadamente (cfr. Acta de inquirição de testemunhas de 28-05-2024, Referência citius 52307136).
GG)Para além disso, as referidas doenças aparecem ainda identificadas no campo reservado aos diagnósticos incapacitantes ou de situação de deficiência e/ou dependência.
HH)Posto isto, não é verdade e carece de fundamento, contrariando até o diagnóstico médico junto aos autos, que a Cabeça de Casal apenas padeça de limitações físicas e não cognitivas, inclusive medicamentada, porquanto as doenças apresentadas são sim suscetíveis de ter afectado gravemente a capacidade cognitiva e de discernimento da Cabeça de Casal nas declarações prestadas na diligência de 04-07-2024.
II) Quanto à aplicação dos art.ºs 453.º, n.º 1 e 495.º, n.º1, ambos do CPC, às declarações de parte, cfr. Acórdão do Tribunal da Relação de Évora, de 08-02-2018, Processo n.º 1516/15.0T8BJA-A.E1, relatado por Rui Machado e Moura, disponível em https://www.dgsi.pt/jtre.nsf/-/D9AC881818D48E2780258239003CAA64.
JJ) Sendo precisamente o que se verifica no presente caso, tendo em conta a incapacidade, para o depoimento, atestada medicamente e junta aos autos como Documento n.º 1 do requerimento da Cabeça de Casal de 04-06-2024, Ref.ª Citius 49105830, pois uma vez verificada a inaptidão para depor, não podem os factos confessados ser valorados.
KK)Tanto mais que, no referido documento junto aos autos invoca-se aí expressamente que a Cabeça de Casal iria verificar junto do seu médico se estaria possibilitada de prestar declarações na audiência designada para o dia 04-07-2024, precisamente por se desconfiar da sua incapacidade de depor.
LL)Sendo certo que, segundo o Tribunal da Relação de Évora, de 28-10-2021, Processo n.º1236/20.3T8PTG.E1, relatado pelo Exmo. Sr. Dr. Juiz Desembargador Mário Branco Coelho, disponível em https://www.dgsi.pt/jtre.nsf/134973db04f39bf2802579bf005f080b/ae4aed733b63418f802587e300718565?OpenDocument.
MM)Outrossim, era perfeitamente visível na audiência em causa que a Cabeça-de-Casal se encontrava profundamente debilitada, apresentava voz e corpo extremamente trémulo, e é perfeitamente audível pelas gravações da audiência disponibilizadas na plataforma citius que tinha muita dificuldade em expressar-se, encontrava-se confusa e ofegante.
NN)Em virtude disso, não soube explicar que a conta e o dinheiro que a mesma continha, dividido entre a Cabeça-de-Casal e os filhos do inventariado, não era só dele mas dos dois, confundindo as várias contas existentes, o que se depreende das declarações prestadas, como infra se cuidará melhor de explicar.
OO)Para o efeito, cumpre atentar ao que disse a Cabeça de Casal ao Tribunal na referida audiência: AA (Cabeça de Casal), declarações registadas no sistema de gravação digital, disponível no Tribunal, com início às 11h44 e termo às 12h24m (00:00:20 - 00:00:37).
PP)Contudo, momentos depois, já refere o contrário: AA (Cabeça de Casal), declarações registadas no sistema de gravação digital, disponível no Tribunal, com início às 11h44 e termo às 12h24m (00:04:48 - 00:05:15).
QQ)Contradições que aumentam ao informar que só o marido levantava dinheiro da conta e depois afirma que algumas vezes levantava ela, reconhecendo até que sofria de alguma limitação cognitiva, veja-se o que disse na audiência aqui em causa: AA (Cabeça de Casal), as suas declarações ficaram registadas no sistema de gravação digital, disponível no Tribunal, com início às 11h44 e termo às 12h24m (00:10:22h - 00:10:46h) e (00:12:48 - 00:13:13).
RR)A Cabeça-de-Casal contradiz-se e confunde completamente as contas bancárias a que se referia, não estando capaz de discernir com clarividência sobre o que sucedeu no passado quanto às mesmas, bem como sobre a titularidade das mesmas e a propriedade do dinheiro que nelas estava depositado.
SS)Existindo até nos próprios autos documentos oficiais do Banco a atestar a titularidade das contas em nome da Cabeça-de-Casal e do inventariado.
TT)Pelas razões supra expostas, ao contrário do que refere o douto Despacho ora sindicado, existem incongruências e incoerências nas declarações de parte prestadas pela Cabeça-de-Casal, na passada diligência de produção de prova realizada no dia 04-07-2024, fruto dos seus problemas de saúde acima mencionados.
UU)E mais se diga que não corresponde à verdade que a Cabeça-de-Casal atestou com as suas declarações que não tinha poupanças e que deixou de trabalhar quando casou, pois pelo contrário, referiu que já depois de conhecer e casar com o inventariado trabalhou nas limpezas de outras casas durante 14 anos, e o dinheiro que ganhava era para fazer face às despesas diárias do casal.
VV) Também não corresponde à realidade, como entende o douto Despacho ora recorrido, que tenha sido apenas nesta fase processual (na referida audiência e depois de ouvidas as declarações de parte da Cabeça de Casal), que se suscitou a questão da incapacidade da Cabeça-de-Casal para prestar o seu depoimento, uma vez que já anteriormente nestes autos, a Cabeça-de-Casal apresentou requerimento de 04-06-2024, Referência citius 49105830, em que juntou documentos médicos que atestam que a mesma padece de várias doenças que a impossibilitaram física e cognitivamente de estar presente na passada diligência do dia 28-05-2024, e que iria verificar junto do médico se estaria apta para estar presente e prestar declarações na diligência designada para o dia 04-07-2024.
WW) Aliás, decidiu fazê-lo depois da Cabeça-de-Casal falar porque só aí se apercebeu de que o que a mesma dizia ao Tribunal não era coerente com a verdade dos factos, em defesa dos quais aliás procurou o Mandatário e outorgou Procuração para sua representação.
XX) Pelo que era o dever e obrigação do Mandatário com Procuração/Mandatária com substabelecimento, até por cumprimento das disposições deontológicas que regem a profissão, efectuar o requerimento em causa, no superior interesse do seu representado!
YY) De facto, há mais de um ano que os Interessados requereram o depoimento de parte da Cabeça-de-Casal, como indica o douto Despacho recorrido.
ZZ) Acontece que o seu estado de saúde piorou consideravelmente na referida diligência, fruto das questões colocadas e dos seus problemas de saúde, o que de resto também já se deixou explícito no requerimento apresentado no dia 04-06-2024, antecedente ao seu depoimento de 04-07-2024.
AAA) Ademais, não poderia a Mandatária da Cabeça-de-Casal ter tomado posição, designadamente suscitando esta questão, por forma a impedir o início da tomada das declarações de parte, antes das mesmas se iniciarem, uma vez que não teve oportunidade de falar com a sua representada e confirmar o seu estado, em virtude de ter chegado ao Tribunal já depois do início da audiência, tendo-se dirigido imediatamente ao interior da sala de audiência.
BBB) Face ao exposto, igualmente se verifica uma inverdade quando se diz que em nenhum momento da tramitação processual até à referida audiência em Cabeça de-Casal.
CCC) Essa incapacidade para o depoimento verificada na diligência de 04-07-2024 resulta atestada por entidade médica dos documentos juntos aos autos com o requerimento de 04-06-2024.
DDD) Por fim, igualmente a Testemunha arrolada pela Cabeça-de-Casal NN, que acompanhou a Cabeça-de-Casal e o inventariado diariamente há cerca de ano e meio antes da data do óbito deste, claramente confirma a aludida incapacidade da Cabeça-de-Casal: NN, o seu depoimento ficou registado no sistema de gravação digital, disponível no Tribunal, com início às 11h13m e termo às 11h42m (00:02:53 - 00:03:17).
EEE) Termos em que, o Despacho ora recorrido faz uma incorrecta interpretação e aplicação, bem como incorre em violação dos art.ºs 495.º e seguintes e 452.º e seguintes do CPC, ao indeferir o requerimento ditado para acta pela Mandatária com substabelecimento nos autos, na audiência realizada no dia 04-07-2024, bem como o reiterado no requerimento de 18-07-2024, Referência citius 49521388, que visou impugnar as declarações prestadas nessa audiência pela Cabeça-de-Casal, bem como tudo o quanto por aquela foi confessado, pela verificada inaptidão para o depoimento.
FFF) Assim, o Despacho de indeferimento do Tribunal a quo, ora recorrido, de 10-10-2024, Referência citius 52883485, incorre em erro de julgamento, pela incorrecta interpretação e aplicação, bem como violação dos art.ºs 603.º n.º 1, 140.º, 195.º n.º 1, 199.º n.º 1, 495.º e seguintes e 452.º e seguintes, todos do CPC.
GGG) Ao veicular um entendimento contrário, salvo superior e respeitável entendimento, o Despacho recorrido labora em erro de julgamento, devendo, por isso, ser revogado e substituído por outro que decida pela nulidade da audiência realizada no dia 04-07-2024, a anulação de todos os actos subsequentes e a repetição da mesma, nos termos do art.ºs 603.º n.º 1, 140.º, 195.º n.º 1 e 199.º n.º 1, todos do CPC, ou subsidiariamente, caso assim não se entenda, o que só por mera cautela e dever de patrocínio se equaciona, decida pela incapacidade de depor da Cabeça-de-Casal, sendo invalidadas as declarações de parte prestadas pela mesma na audiência realizada e gravada no dia 04-07-2024, por verificação de incapacidade para depor, dando como não confessados os factos que constam em assentada redigida na Acta da referida audiência, Referência citius 52500510, por referência ao Documento n.º 1 junto com o requerimento da Cabeça-de-Casal de 04-06-2024, Ref.ª citius 49105830, consoante o disposto nos art.ºs 495.º e seguintes e 452.º e seguintes do CPC.
HHH) Fazendo assim este douto Tribunal a necessária e habitual Justiça!

TERMOS EM QUE e nos demais do Direito Deve o presente recurso ser julgado procedente, por provado, e em consequência, pela nulidade ou pelo erro de julgamento, decidam pela revogação da decisão recorrida e a sua substituição por outra que julgue pela nulidade da audiência realizada no dia 04-07-2024, a anulação de todos os actos subsequentes e a repetição da mesma, ou subsidiariamente, caso assim não se entenda, o que só por mera cautela e dever de patrocínio se equaciona, decida pela incapacidade de depor da Cabeça-de-Casal, desconsiderando o depoimento prestado pela mesma na audiência realizada e gravada no dia 04-07-2024, dando como não confessados os factos que constam em assentada redigida na Acta da referida audiência, com data de assinatura de 08-07-2024, mas registada no citius com data de 04-07-2024, com a referência ...10».
O recurso foi então admitido como apelação, com subida imediata, em separado e efeito suspensivo.
Os autos foram remetidos a este Tribunal da Relação, confirmando-se a admissão do recurso nos mesmos termos.

II. Delimitação do objeto do recurso.

Face às conclusões das alegações do recorrente, e sem prejuízo do que seja de conhecimento oficioso - cf. artigos 608.º, n.º 2, 635.º, n.º 4, e 639.º, n.º 1, do Código de Processo Civil (CPC) - o objeto da apelação circunscreve-se às seguintes questões:
A) se o despacho que indeferiu a invocada nulidade de todos os atos praticados na referida audiência realizada no dia 04-07-2024, e a anulação de todos os actos subsequentes, bem como a repetição daquela audiência, padece de nulidade, nos termos do art.º 615.º, n.º 1, als. b) e c) do CPC.
B) saber se o Tribunal recorrido incorreu em nulidade processual ao ter iniciado a diligência antes da chegada da Mandatária substabelecida, procedendo à audição da testemunha OO sem a presença do Mandatário com procuração nos autos ou da Mandatária com substabelecimento; em caso afirmativo, quais as respetivas consequências;
C) na hipótese negativa, saber se houve erro na subsunção jurídica das concretas incidências fáctico-processuais que relevam quanto ao indeferimento da requerida invalidação das declarações da cabeça de casal e, consequentemente, tudo o quanto por ela tiver sido confessado, por verificação de incapacidade para depor, por referência ao documento n.º 1 junto com o requerimento da cabeça de casal de 04-06-2024.
Corridos os vistos, cumpre decidir.

III. Fundamentação.

1. Os factos
1.1. Os factos, as ocorrências e elementos processuais a considerar na decisão deste recurso são os que já constam do relatório enunciado em I. supra.
2. Apreciação sobre o objeto do recurso.
2.1. Das suscitadas nulidades.
Apesar de não apresentar quaisquer argumentos que sustentem a nulidade da decisão recorrida, vem a recorrente alegar que o despacho do Tribunal a quo presentemente em crise ao indeferir a invocada nulidade de todos os actos praticados na referida audiência realizada no dia 04-07-2024, e a anulação de todos os actos subsequentes, bem como a repetição daquela audiência, incorre igualmente em nulidade, nos termos do art.º 615.º, n.º 1, alíneas b) e c) do CPC - cf. conclusão O) da alegação de recurso.
Apreciando as nulidades suscitadas, importa considerar que as causas de nulidade da sentença encontram-se previstas no n.º 1 do artigo 615.º do CPC, segundo o qual é nula a sentença quando:
a) Não contenha a assinatura do juiz;
b) Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão;
c)Os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível;
d) O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento;
e) O juiz condene em quantidade superior ou em objeto diverso do pedido.
Tal como ressalta deste preceito, as nulidades de decisão são vícios intrínsecos (quanto à estrutura, limites e inteligibilidade) da peça processual que é a própria decisão (trata-se, pois, de um error in procedendo), nada tendo a ver com os erros de julgamento (error in iudicando) seja em matéria de facto seja em matéria de direito.
As nulidades da sentença são vícios formais, intrínsecos de tal peça processual, taxativamente consagrados no nº1, do art. 615º, sendo tipificados vícios do silogismo judiciário, inerentes à sua formação e à harmonia formal entre premissas e conclusão, não podendo ser confundidas com hipotéticos erros de julgamento (error in judicando) de facto ou de direito.
Assim, as nulidades da sentença, como seus vícios intrínsecos, são apreciadas em função do texto e do discurso lógico nela desenvolvidos, não se confundindo com a errada aplicação das normas jurídicas aos factos, erros de julgamento, estes, a sindicar noutro âmbito[1].
Como tal, as causas de nulidade taxativamente enumeradas neste preceito não visam o chamado erro de julgamento e nem a injustiça da decisão, ou tão pouco a não conformidade dela com o direito aplicável, configurando realidades distintas[2].
Por outro lado, conforme esclarecem Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta, Luís Filipe Pires de Sousa[3], em anotação ao artigo 615.º do CPC, «[i]mporta que se estabeleça uma separação entre nulidades de processo e nulidades de julgamento, sendo que o regime do preceito apenas a estas se aplica; as demais deverão ser arguidas pelas partes ou suscitadas oficiosamente pelo juiz, nos termos previstos noutros normativos».
A nulidade prevista na citada alínea b), do n.º 1, do artigo 615.º do CPC está diretamente relacionada com a violação do preceituado no artigo 154.º do CPC, que impõe ao juiz o dever de fundamentar as decisões proferidas sobre qualquer pedido controvertido ou sobre alguma dúvida suscitada no processo (n.º 1), sendo que a justificação não pode consistir na simples adesão aos fundamentos alegados no requerimento ou na oposição, salvo quando, tratando-se de despacho interlocutório, a contraparte não tenha apresentado oposição ao pedido e o caso seja de manifesta simplicidade (n.º 2).
O aludido artigo 154.º do CPC está em consonância com o artigo 205.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa o qual prevê que as decisões dos tribunais que não sejam de mero expediente são fundamentadas na forma prevista na lei.
Também o artigo 607.º, n.º 3 do CPC, aplicável nos termos do artigo 663.º, n.º 2, do CPC, impõe o dever de discriminar os factos que julga provados e de indicar, interpretar e aplicar as normas jurídicas correspondentes.
Neste contexto, a generalidade da doutrina e da jurisprudência vem sustentando que só a falta absoluta de fundamentação, entendida como a total ausência de indicação dos fundamentos de facto ou de direito, gera a nulidade prevista na al. b), do n.º 1 do citado artigo 615.º do CPC, não se verificando perante uma fundamentação meramente deficiente, incompleta, não convincente[4].
Revertendo ao caso em apreciação, desde logo se observa que a decisão recorrida recorrido permite evidenciar de forma clara e que julgamos exaustiva os critérios determinativos da decisão e os fundamentos, de facto e de direito, em que se alicerça.
Por outro lado, apesar de invocar genericamente a nulidade decorrente do aludido vício, a recorrente não esclarece qual a concreta omissão, de facto ou de direito, detetada.
Por conseguinte, não se verifica a invocada nulidade da decisão por falta de especificação dos fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 615.º, n.º 1, al. b), do CPC.
Passando agora à nulidade prevista na 2.ª parte da citada al. c), do n.º 1, do artigo 615.º do CPC - ocorrência de alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível -, deve entender-se que a decisão judicial é obscura «quando contém algum passo cujo sentido seja ininteligível e é ambígua quando alguma passagem se preste a interpretações diferentes»[5].
Em qualquer caso, no regime atual, a obscuridade ou ambiguidade da sentença limita-se à parte decisória e só releva quando gera ininteligibilidade, isto é, quando um declaratário normal, nos termos dos arts. 236-1 CC e 238-1 CC, não possa retirar da decisão um sentido unívoco, mesmo depois de recorrer à fundamentação para a interpretar[6].
Por seu turno, a nulidade prevista na 1.ª parte da alínea c) do n.º 1 do citado artigo 615.º do CPC - oposição entre os fundamentos e a decisão -, consubstancia um vício da estrutura da decisão, o qual se manifesta na «desarmonia lógica entre a motivação fáctico-jurídica e a decisão resultante de os fundamentos inculcarem um determinado sentido decisório e ser proferido outro de sentido oposto ou, pelo menos, diverso»[7] .
Neste domínio, deve entender-se que a referida nulidade ocorre «quando existe incompatibilidade entre os fundamentos e a decisão, ou seja, em que a fundamentação aponta num sentido que contradiz o resultado final. Situação que, sendo violadora do chamado silogismo judiciário, em que as premissas devem condizer com a conclusão, também não se confunde com um eventual erro de julgamento, que se verifica quando o juiz decide contrariamente aos factos apurados ou contra norma jurídica que lhe impõe uma solução jurídica diferente»[8].
No caso, revela-se evidente que não ocorre qualquer ininteligibilidade, decorrente de ambiguidade ou obscuridade da parte decisória do despacho recorrido, mostrando-se a mesma perfeitamente compreensível e clara, mesmo sem necessidade de recurso à respetiva fundamentação para proceder à delimitação dos termos enunciados no respetivo dispositivo.
Por outro lado, apesar de invocar a nulidade decorrente do aludido vício, a recorrente não refere qualquer incompatibilidade ou oposição entre o raciocínio expresso na fundamentação vertida na decisão e a consequência jurídica retirada na correspondente parte decisória, nem tal incompatibilidade decorre da análise da decisão impugnada.
Pelo exposto, cumpre concluir que a decisão recorrida não padece das nulidades invocadas, improcedendo nesta parte as conclusões da apelação.
 2.2. Atendendo ao objeto do recurso, importa apreciar, em primeiro lugar, se o Tribunal recorrido incorreu em nulidade processual, ao ter iniciado a audiência realizada em 04-07-2024 antes da chegada da Mandatária substabelecida, procedendo à audição da testemunha OO sem a presença do Mandatário com procuração nos autos ou da Mandatária com substabelecimento, como defende a apelante.
Quanto a esta questão, a apelante retoma em sede de apelação os fundamentos já enunciados no requerimento apresentado em 18-07-2024 e que foi objeto da decisão recorrida.
 Neste domínio, o Tribunal a quo entendeu que não se verificava a nulidade suscitada pela ora recorrente, enunciando, para o efeito, os seguintes fundamentos:
«(…)
Requerimento formulado pela cabeça de casal em 18-07-2024
Veio a cabeça de casal requerer que fosse declarada a nulidade da audiência realizada no dia 4 de Julho de 2024 e anulados todos os actos subsequentes, ordenando-se a repetição da mesma ou, se assim não se entendesse, fossem invalidadas as declarações da cabeça de casal e, consequentemente, tudo o quanto por ela tiver sido confessado, por verificação de incapacidade para depor, pelos motivos que constam do requerimento em apreço.
(…)
Cumpre apreciar.

Estabelece o artigo 195º do C.P.C.:
“1 - Fora dos casos previstos nos artigos anteriores, a prática de um acto que a lei não admita, bem como a omissão de um acto ou de uma formalidade que a lei prescreva, só produzem nulidade quando a lei o declare ou quando a irregularidade cometida possa influir no exame ou na decisão da causa.
2 - Quando um acto tenha de ser anulado, anulam-se também os termos subsequentes que dele dependam absolutamente; a nulidade de uma parte do acto não prejudica as outras partes que dela sejam independentes.
3 - Se o vício de que o acto sofre impedir a produção de determinado efeito, não se têm como necessariamente prejudicados os efeitos para cuja produção o acto se mostre idóneo.”.

Compulsados os autos, verifica-se que a cabeça de casal outorgou procuração a EMP01... – Sociedade de Advogados RL, representada pelos advogados FF, GG, HH, II, JJ, KK e LL (advogada estagiária).
Pelo requerimento com a referência ...58 foi junto, além do mais, substabelecimento com reserva do advogado HH para a advogada Sra. Dra. MM.
No dia e hora designado para a continuação da diligência probatória designada no âmbito do incidente de reclamação à relação de bens, não se encontrava presente mandatário em representação da cabeça de casal, como não constava dos autos qualquer requerimento a comunicar qualquer impedimento.
O Tribunal, por uma questão de colaboração e cortesia, realizou os contactos telefónicos mencionados na acta com a referência ...10.
Nenhum dos mandatários da cabeça de casal contactou telefonicamente o Tribunal ou formulou requerimento atempado aos autos, como se impunha (só em momento posterior deu entrada de um requerimento com a referência ...13).
Na sequência do contacto telefónico realizado pelo Tribunal foi prestada a informação que viria uma mandatária em substituição do mandatário que estivera presente na diligência anterior (diligência do dia 28-05-2024).
A diligência do dia 4 de Julho de 2024 estava agendada para as 9h e 30m e o Tribunal aguardou 35 minutos pela chegada de mandatário. A diligência iniciou-se com um atraso de 35 minutos porquanto o Tribunal aguardou pela chegada de mandatário.
Não foi omitido qualquer acto previsto na lei. Não foi omitida qualquer formalidade que a lei prescreva.
Não obstante o seu atraso, a Mandatária da cabeça de casal interveio na diligência realizada - cfr. acta com a referência ...10. Apesar de ter comparecido e intervindo na diligência probatória não suscitou qualquer questão, como não arguiu qualquer nulidade, nomeadamente por o Tribunal ter iniciado a diligência em causa.
Neste contexto, é manifesta a falta de fundamento legal para a pretensão agora formulada de nulidade da diligência realizada no dia 4 de Julho de 2024.
Não se vislumbrando a verificação de qualquer nulidade, improcede a pretensão da cabeça de casal requerente.
(…)».
Apreciando, importa salientar que as nulidades processuais são habitualmente classificadas em principais, nominadas ou típicas, tal como previstas nos artigos 186.º, 187.º, 191.º, 193.º e 194.º CPC e, por outro lado, secundárias, inominadas ou atípicas[9], estas residualmente incluídas na previsão geral do artigo 195.º CPC[10], tendo como uma das particularidades o regime de arguição perante o Tribunal que omitiu o ato.
Ponderando as consequências decorrentes do concreto vício invocado pela apelante, parece estar em causa uma nulidade processual reportada ao citado artigo 195.º, n.º 1 do CPC, como tal dependente, como se viu, da omissão de um ato ou de uma formalidade que a lei prescreva, sendo certo ainda assim que tal omissão só produz nulidade quando a lei o declare ou quando a irregularidade cometida possa influir no exame ou na decisão da causa.
Com efeito, não configurando uma nulidade principal, nominada ou típica, nos termos previstos nos artigos 186.º, 187.º, 191.º, 193.º e 194.º CPC, a aludida nulidade processual inclui-se residualmente na previsão geral do artigo 195.º CPC, devendo ser classificada como secundária, inominada ou atípica.
Tratando-se de nulidade para a qual a lei não prevê um regime específico de arguição, é aplicável o regime previsto no artigo 199.º, n.º 1 do CPC, que estabelece a regra geral sobre o prazo de arguição de nulidades secundárias: se a parte estiver presente, por si ou por mandatário, no momento em que forem cometidas, podem ser arguidas enquanto o ato não terminar; se não estiver, o prazo para a arguição conta-se do dia em que, depois de cometida a nulidade, a parte interveio em algum ato praticado no processo ou foi notificada para qualquer termo dele, mas neste último caso só quando deva presumir-se que então tomou conhecimento da nulidade ou quando dela pudesse conhecer, agindo com a devida diligência.
Para o caso em análise, importa atender ao disposto no artigo 603.º, n.º 1 do CPC segundo o qual, verificada a presença das pessoas que tenham sido convocadas, realiza-se a audiência, salvo se houver impedimento do tribunal, faltar algum dos advogados sem que o juiz tenha providenciado pela marcação mediante acordo prévio ou ocorrer motivo que constitua justo impedimento.

Por seu turno, o artigo 151.º do CPC, com a epígrafe “Marcação e início pontual das diligências”, prevê o seguinte:
1 - A fim de prevenir o risco de sobreposição de datas de diligências a que devam comparecer os mandatários judiciais, deve o juiz providenciar pela marcação do dia e hora da sua realização mediante prévio acordo com aqueles, podendo encarregar a secretaria de realizar, por forma expedita, os contactos prévios necessários.
2 - Quando a marcação não possa ser feita nos termos do número anterior, devem os mandatários impedidos em consequência de outro serviço judicial já marcado comunicar o facto ao tribunal e identificar expressamente a diligência e o processo a que respeita, no prazo de cinco dias, propondo datas alternativas, após contacto com os restantes mandatários interessados.
3 - O juiz, ponderadas as razões aduzidas, pode alterar a data inicialmente fixada, apenas se procedendo à notificação dos demais intervenientes no ato após o decurso do prazo a que alude o número anterior.
4 - Logo que se verifique que a diligência, por motivo imprevisto, não pode realizar-se no dia e na hora designados, deve o tribunal dar imediato conhecimento do facto aos intervenientes processuais, providenciando por que as pessoas convocadas sejam prontamente notificadas do adiamento.
5 - Os mandatários judiciais devem comunicar prontamente ao tribunal quaisquer circunstâncias impeditivas da sua presença.
6 - Se ocorrerem justificados obstáculos ao início pontual das diligências, deve o juiz comunicá-los aos advogados e a secretaria às partes e demais intervenientes processuais, dentro dos trinta minutos subsequentes à hora designada para o seu início.
7 - A falta da comunicação referida no número anterior implica a dispensa automática dos intervenientes processuais.
Revertendo às concretas incidências processuais do processo em apreciação, resulta incontroverso que a data da continuação da audiência (dia 04-07-2024, pelas 09:30 horas) tinha sido designada na presença dos Ilustres mandatários dos interessados e com a anuência destes, conforme consta da ata da sessão realizada a 28-05-2024.
Deste modo, não tendo o Tribunal invocado qualquer impedimento, resulta indiscutível que apenas o eventual (justo) impedimento de um dos Exmos. Advogados poderia fundamentar o adiamento da audiência designada para o dia 04-07-2024, pelas 09:30 horas, nos termos permitidos pelo artigo 603.º, n.º 1 do CPC.

Prevendo a figura do Justo impedimento, dispõe o artigo 140.º do CPC, o seguinte:
1 - Considera-se «justo impedimento» o evento não imputável à parte nem aos seus representantes ou mandatários que obste à prática atempada do ato.
2 - A parte que alegar o justo impedimento oferece logo a respetiva prova; o juiz, ouvida a parte contrária, admite o requerente a praticar o ato fora do prazo se julgar verificado o impedimento e reconhecer que a parte se apresentou a requerer logo que ele cessou.
3 - É do conhecimento oficioso a verificação do impedimento quando o evento a que se refere o n.º 1 constitua facto notório, nos termos do n.º 1 do artigo 412.º, e seja previsível a impossibilidade da prática do ato dentro do prazo.

Segundo alega a recorrente, o Mandatário com procuração nos autos acordou na manhã do dia da diligência, imprevisivelmente com gripe, febres altas, dores no corpo, tonturas etc, juntando declaração de baixa médica ao processo, sendo bastante para constituir justo impedimento. Conclui que, havendo justo impedimento do Mandatário com procuração nos autos e não sendo a diligência adiada porque a Mandatária com substabelecimento se dirigiu de imediato para o Tribunal, pelo menos teria o Tribunal que aguardar a sua chegada para iniciar a produção de prova
Porém, verifica-se que a comunicação de impedimento só foi remetida ao Tribunal recorrido às 11h24m do dia 04-07-2024, quando a audiência estava designada para o mesmo dia, pelas 09h30m.
Nos termos do disposto no artigo 151.º, n.º 5, do CPC, os mandatários judiciais devem comunicar prontamente ao tribunal quaisquer circunstâncias impeditivas da sua presença.
Como tal, estando a audiência regularmente convocada e designada para as 09h30m, resulta manifesto que a situação suscetível de configurar o justo impedimento (no caso, a doença do Ilustre mandatário da cabeça de casal) não foi comunicada atempadamente ao Tribunal, tanto mais que daquela comunicação também consta que a invocada doença surgiu na noite de 3 para 4 de Julho de 2024 e que, logo à primeira hora da manhã, o mesmo Ilustre mandatário solicitou a Colega Advogada do seu escritório para comparecer em sua substituição na referida diligência judicial.
É certo que antes de dar início à audiência em causa - que fora retardada aguardando a chegada do Ilustre mandatário que não se encontrava presente -, o Tribunal recorrido determinou que se contactasse o escritório do Ilustre Mandatário a inquirir do seu atraso, pelo que, quando eram 09h40 o funcionário judicial ligou para o escritório do Ilustre Advogado a informar que estava designado para aquele dia a diligência de inquirição de testemunhas e se havia algo motivo para a não comparência do Ilustre Mandatário na diligência, tendo a funcionária do escritório informado que iria entrar em contacto telefónico com o Mandatário para averiguar o que estava a suceder, cerca de 05 minutos mais tarde o Tribunal ligou novamente para o escritório do Ilustre Mandatário tendo a mesma funcionária informado que o Ilustre Mandatário estava doente e a Dra. MM, Advogada com substabelecimento nos autos, o iria substituir na diligência.
Depreende-se ainda das concretas incidências processuais em análise que o Tribunal continuou a aguardar a chegada da Ilustre mandatária com substabelecimento nos autos, sendo que, pelas 09h55m, o Tribunal ligou para a Dra. MM tendo esta informado o Tribunal que ainda estava em ... e que iria sair nesse momento do seu escritório. E, perante esta informação, o Tribunal ainda aguardou por mais dez minutos, após o que, sendo 10h05m foi declarada aberta a diligência pela Mm. ª Juíza de Direito, com a inquirição da testemunha OO.
Assim, perante a informação de que o Ilustre Mandatário estava doente e a Dra. MM, Advogada com substabelecimento nos autos, o iria substituir na diligência, ainda sem qualquer suporte documental que sustentasse o impedimento invocado, e depois de ter retardado por 35 minutos o início da audiência, entendemos que o Tribunal não dispunha de fundamento legal para retardar mais o início da sessão da audiência em causa, tanto mais que aquele Tribunal não dispunha de fundamento legal para adiar o julgamento, nem sabia ou poderia prever se e quando iria comparecer a Ilustre Advogada com substabelecimento nos autos, sendo certo que se encontravam presentes diversos intervenientes processuais convocados para a audiência designada.
Como se viu, a comunicação de impedimento só foi remetida pelo Ilustre mandatário da cabeça de casal ao Tribunal recorrido depois de iniciada a audiência em causa, sendo que na mesma nem sequer vinha requerido o adiamento da audiência, mas somente que havia solicitado a Colega Advogada do seu escritório para comparecer em sua substituição na referida diligência judicial.
Ora, não tendo a Ilustre Advogada com substabelecimento nos autos comunicado ao Tribunal quaisquer circunstâncias impeditivas da sua presença, e estando a audiência regularmente convocada e designada para as 09h30m, resulta manifesto que o Tribunal não dispunha de fundamento legal para retardar mais o início da sessão da audiência em causa.
Nos termos expostos, entendemos que não pode ser imputada ao Tribunal recorrido a prática de um ato que a lei não admita, bem como a omissão de um ato ou de uma formalidade que a lei prescreva, não se verificando a nulidade suscitada pela recorrente.
Como tal, não existem razões para censurar a solução adotada na decisão impugnada, relativamente à arguição de nulidade da audiência realizada no dia 04-07-2024, improcedendo nesta parte a apelação.
2.3. Face à improcedência da suscitada nulidade da audiência realizada no dia 04-07-2024, importa aferir se houve erro na subsunção jurídica das concretas incidências fáctico-processuais que relevam quanto ao indeferimento da requerida impugnação das declarações da cabeça de casal e, consequentemente, tudo o quanto por ela tiver sido confessado, face à alegada incapacidade para depor, por referência ao documento n.º 1 junto com o requerimento da cabeça de casal de 04-06-2024.
No caso, a impugnação foi suscitada pela própria cabeça de casal AA na audiência realizada no dia 04-07-2024, após a prestação das respetivas declarações de parte, com redução a escrito, pela Mm.ª Juiz de Direito, do correspondente depoimento, na parte em que o Tribunal recorrido considerou ter havido declaração confessória, nos termos previstos nos artigos 463.º e 466.º do CPC, sendo que a mesma assentada foi inclusivamente confirmada pela própria interessada/declarante.

Estando em causa a prestação de declarações de parte, importa considerar o disposto no artigo 466.º do CPC:
1 - As partes podem requerer, até ao início das alegações orais em 1.ª instância, a prestação de declarações sobre factos em que tenham intervindo pessoalmente ou de que tenham conhecimento direto.
2 - Às declarações das partes aplica-se o disposto no artigo 417.º e ainda, com as necessárias adaptações, o estabelecido na secção anterior.
3 - O tribunal aprecia livremente as declarações das partes, salvo se as mesmas constituírem confissão.

No caso, não existe controvérsia relativamente à aplicabilidade da regra prevista no artigo 495.º do CPC, sobre a verificação da capacidade das testemunhas para depor, à aferição da capacidade para prestação de declarações de parte.
Segundo este último preceito, têm capacidade para depor como testemunhas todos aqueles que tiverem aptidão mental para depor sobre os factos que constituam objeto da prova (n.º 1), incumbindo ao juiz verificar a capacidade natural das pessoas arroladas como testemunhas, com vista a avaliar da admissibilidade e da credibilidade do respetivo depoimento (n.º 2).
Ora, «[n]ão se prevendo uma incapacidade ipso iure para depor, cabe ao juiz aquilatar da capacidade natural da pessoa arrolada como testemunha para prestar o depoimento, como pressuposto da sua admissibilidade e como parâmetro da sua credibilidade, ponderando quer a idade do depoente, quer o seu estado de saúde ou as suas capacidades, quer também a matéria de facto sobre que recai o depoimento»[11], o que pode levar à inadmissibilidade  do depoimento de pessoa que revele incapacidade natural, física ou psíquica, para depor, mas podendo acontecer que a incapacidade natural para depor sobre certos factos da causa não impeça o depoimento sobre outros[12].
Saliente-se que, «[d]e um modo geral, não podem ser testemunhas as pessoas que não possuam capacidade física ou mental para se poderem exprimir e mostrar conhecimentos dos factos, como as portadoras de graves deficiências físicas e psíquicas que não lhes permita qualquer perceção dos factos ou como os que estejam debaixo de um estado de enfermidade de tal modo profundo que os incapacite de qualquer expressão com significado.
Diferentemente, será o caso de depoimentos prestados por pessoas que, não estando - ou melhor, não estavam - interditas por anomalia psíquica, apresentam-se, no entanto, como notoriamente dementes, fracos de espírito, toxicodependentes ou alcoólicos, entre outros, ou seja, indivíduos que mostrem possuir um estado de anormalidade que dificilmente se possa admitir que sejam capazes de produzir um depoimento merecedor de grande confiança. O depoimento de pessoas com estas particularidades não pode ser negligenciado, ainda que deva ser usado com a máxima cautela e sentido crítico. Como defende Fernando Pereira Rodrigues, suportando-se na doutrina de Alberto dos Reis, “até a pessoa notoriamente demente pode, apesar de tudo, ter momentos de alguma lucidez para relatar ou confirmar, ainda que com alguma perturbação à mistura, um qualquer facto de grande simplicidade de percepção e que seja de capital importância para a prova de um evento, como por exemplo, em face de dois indivíduos dizer qual deles viu em determinado local quando lá também se encontrava”»[13].
Na impugnação deduzida em audiência (04-07-2024), a ora recorrente, invocando o disposto nos artigos 452.º e 495.º do CPC, remeteu expressamente para os documentos apresentados no dia 04-06-2024, alegando que os mesmos atestam que a cabeça de casal padece de várias doenças que a tornam incapaz de depor, o que reiterou posteriormente, através do requerimento apresentado em 18-07-2024, no qual requereu que fosse declarada a nulidade da audiência realizada no dia 4-07-2024 e anulados todos os atos subsequentes, ordenando-se a repetição da mesma ou, se assim não se entender, sejam invalidadas as declarações da cabeça de casal e, consequentemente, tudo o quanto por ela tiver sido confessado, por verificação de incapacidade para depor, por referência ao documento n.º 1 junto com o requerimento da Cabeça de Casal de 04-06-2024, Ref.ª citius 49105830.
Porém, como - bem - salientou o Tribunal a quo na decisão recorrida, [q]uanto aos documentos juntos aos autos no dia 4 de Junho de 2024, os mesmos destinaram-se a justificar a falta da cabeça de casal à diligência do dia 28 de Maio de 2024, como de resto resulta de forma inequívoca do requerimento respetivo, com o seguinte teor: «(…) na decorrência da audiência realizada no passado dia 28-05-2024, em que a Parte faltou por motivo de doença,
Requer a V. Exa. se digne relevar que a Cabeça-de-casal e herdeira sofre de vários problemas de saúde, entre os quais, inclusive, Oligofrenia, tremor essencial, perturbação depressiva, insónia, bócio multinodular, mucocele apendicular, insuficiência mitral, tricúspide ligeira, espondilartrose C4 e C5, dislipidemia, hipertrofia cornetos e desvio septo nasal, com diagnóstico de incapacidade, de acordo com a Médica Dra. PP (cfr. Documento n.º 1 ora junto e dado por reproduzido).
Nesse sentido, no dia 28-05-2024 deslocou-se ao Centro de Saúde por agravamento do seu estado de saúde, pelas razões acima descritas, porém, o Médico apenas esteve da parte de tarde, pelo que acabou por aguardar por consulta até à parte de tarde entre as 15h e as 17h10m do dia 28 de Maio de 2024 (cfr. Documento n.º 2 ora junto e dado por reproduzido).
Pelo que, tendo estado impossibilitada nessa data, requer se digne admitir a falta justificada.
Mais se requer se digne relevar que a Cabeça-de-casal irá verificar junto da médico se estará possibilitada de prestar o seu depoimento na próxima audiência agendada».
Ora, a eventual impossibilidade de comparência da parte em Tribunal não significa necessariamente a impossibilidade de prestação de depoimento, como de resto resulta de forma clara do preceituado no artigo 457.º do CPC, relativo à impossibilidade de comparência em tribunal no âmbito do procedimento relativo ao depoimento de parte.
Por outro lado, apesar de ter mencionado na parte final do requerimento apresentado em 04-06-2024 a intenção de verificar junto do médico se estará possibilitada de prestar o seu depoimento na próxima audiência agendada, constata-se que a cabeça de casal acabou por compareceu nas instalações do tribunal na data agendada para a continuação da diligência.
E conforme salientou o Tribunal recorrido, iniciou o seu depoimento de forma voluntária, respondendo a todas as questões que lhe iam sendo colocadas, sem que, em momento prévio ao seu depoimento que lhe iam sendo colocadas, sem que, em momento prévio ao seu depoimento, a sua Mandatária presente tivesse tomado posição, designadamente suscitando esta questão por forma a impedir o início da tomada das suas declarações. Apenas o fez, como se disse, no final.
Note-se que uma eventual incapacidade para depor deve reportar-se necessariamente ao momento da inquirição, mas, como se viu, no âmbito da sessão realizada em 04-07-2024 não foi junto qualquer documento apto a atestar que a cabeça de casal estivesse incapacitada para depor nessa data em audiência de julgamento.
Aliás, da informação médica que consta do doc. n.º 1 junto com o requerimento de 04-06-2024 também não resulta que as patologias nele descritas ou os diagnósticos ali assinalados determinem, ou possam implicar, qualquer tipo de incapacidade de depor em julgamento e prestar declarações.
Com efeito, não pode deixar de se concluir, tal como fez a decisão recorrida, que dos documentos apresentados no dia 04-06-2024 não resulta que a cabeça de casal padeça de patologia que tenha por consequência qualquer incapacidade do foro cognitivo ou mental que a impeça de prestar declarações ou de estar por si em juízo.
Apenas em requerimento de 18-07-2025, apresentado subsequentemente à impugnação deduzida na audiência de 04-07-2024, vem a apelante invocar ser visível na audiência em causa que a cabeça de casal se encontrava profundamente debilitada, apresentava voz e corpo extremamente trémulo, que tinha muita dificuldade em expressar-se, encontrando-se confusa e ofegante, pelo que não soube explicar que a conta e o dinheiro que a mesma continha, dividido entre a cabeça de casal e os filhos do inventariado, não era só dele mas dos dois, confundindo as várias contas existentes, o que alega decorrer das declarações prestadas, nos segmentos que indica.
Ainda assim, após reapreciação que fizemos do registo de gravação das declarações de parte da cabeça de casal AA, entendemos que as respostas e reações às perguntas que lhe foram colocadas revelam discernimento bastante para entender todas as questões formuladas, não se detetando qualquer incapacidade de perceção, memória e/ou de manifestação de qualquer expressão com significado sobre os factos em apreciação, antes revelando aptidão para depor sobre os factos que constituem objeto da prova.
Tanto basta para que se considere infundada a impugnação deduzida pela recorrente ao depoimento prestado no âmbito da diligência probatória realizada no dia 04-07-2024, e correspondente declaração confessória, mantendo-se a validade de tal depoimento.
Nos termos e pelos fundamentos expostos, cumpre julgar improcedente a apelação e, em consequência, confirmar integralmente a decisão recorrida.

IV. Decisão.

Pelo exposto, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar improcedente a apelação, assim confirmando a decisão recorrida.
Custas da apelação pela recorrente.

Guimarães, 27 de fevereiro de 2025
(Acórdão assinado digitalmente)

Paulo Reis (Juiz Desembargador - relator)
Carla Maria da Silva Sousa Oliveira (Juíza Desembargadora - 1.º adjunto)
Maria dos Anjos Melo Nogueira (Juíza Desembargadora - 2.º adjunto)


[1] Cf. o Ac. TRG de 04-10-2018 (relatora: Eugénia Cunha), p. 1716/17.8T8VNF.G1, disponível em www.dgsi.pt.
[2] Cf. o Ac. TRL de 16-05-2024 (relatora: Ana Paula Nunes Duarte Olivença), p. 11769/19.9T8LSB-A. L1-8, disponível em www.dgsi.pt.
[3] Código de Processo Civil anotado, Vol. I., Almedina, 2018., p. 736.
[4] Neste sentido, cf. Alberto dos Reis - Obra citada -, p. 140; Antunes Varela, M. Bezerra e S. e Nora, Manual de Processo Civil, 2.ª ed. Coimbra, Coimbra Editora, 1985, p. 687; Lebre de Freitas-Isabel Alexandre Código de Processo Civil Anotado, 2.º Volume, 3.ª edição, Coimbra, Almedina, 2017, p. 736. Na Jurisprudência cf. por todos, o Ac. STJ de 02-06-2016 (relatora: Fernanda Isabel Pereira), proferido na revista n.º 781/11.6TBMTJ.L1. S1 - 7.ª Secção, acessível em www.dgsi.pt.
[5] Cf. Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta, Luís Filipe Pires de Sousa, obra citada, p. 738.
[6] Cf. José Lebre de Freitas/Isabel Alexandre, obra citada, p. 735.
[7] Cf. o citado Ac. do STJ de 02-06-2016.
[8] Cf. Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta, Luís Filipe Pires de Sousa - obra citada -, pgs. 737-738.
[9] Cf. Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta, Luís Filipe Pires de Sousa - obra citada -, p. 236.
[10] Dispõe o artigo 195.º do CPC, com a epígrafe Regras gerais sobre a nulidade dos atos:
1 - Fora dos casos previstos nos artigos anteriores, a prática de um ato que a lei não admita, bem como a omissão de um ato ou de uma formalidade que a lei prescreva, só produzem nulidade quando a lei o declare ou quando a irregularidade cometida possa influir no exame ou na decisão da causa.
2 - Quando um ato tenha de ser anulado, anulam-se também os termos subsequentes que dele dependam absolutamente; a nulidade de uma parte do ato não prejudica as outras partes que dela sejam independentes.
3 - Se o vício de que o ato sofre impedir a produção de determinado efeito, não se têm como necessariamente prejudicados os efeitos para cuja produção o ato se mostre idóneo.
[11] Cf. Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta, Luís Filipe Pires de Sousa - obra citada - p. 236
[12] Cf. José Lebre de Freitas/Isabel Alexandre - obra citada -, p. 354.
[13] Cf. Jorge Artur Costa, CAPACIDADE PARA DEPOR COMO TESTEMUNHA: AS ALTERAÇÕES AO ART. 495.º, N.º 1, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL PELA LEI n.º 49/2018, DE 14 DE AGOSTO (regime Jurídico do Maior Acompanhado), pgs. 723-724, acessível em https://portal.oa.pt/media/130257/jorge-artur-costa_roa_iii_iv-2018-revista-da-ordem-dos-advogados-11.pdf.