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MEDIDAS DE PROMOÇÃO E PROTECÇÃO
ALIENAÇÃO PARENTAL
ARQUIVAMENTO DOS AUTOS
Sumário
Numa situação em que dos relatórios periciais realizados aos progenitores nada há que levante dúvidas sobre as capacidades de cada um para exercer a parentalidade, mas em que se verifica um quadro de litigiosidade doentia entre eles, em que o filho de ambos está entregue à mãe, e é instrumentalizado permanentemente nesse conflito, sujeito a pressão psicológica e a um quadro de alienação parental em escalada, sujeito à inquirição e intervenção permanente de assistentes sociais, psicólogos, magistrados e advogados, entregas judiciais com a presença da força policial (PSP e GNR), durante anos, e em que com 16 anos de idade chegou a um ponto de exaustão em que se recusa a contactar e estar com o pai, não há outra solução que não o arquivamento dos autos, e esperar que, eventualmente, com o passar do tempo, o pai perceba que para se relacionar com o seu filho não precisa do Tribunal para nada, e esperar que o jovem perceba que só tem a ganhar com a reaproximação ao seu pai.
Texto Integral
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães I- Relatório
Estes autos de promoção e protecção (apenso N) tiveram início em ../../2018, por requerimento do MP, dando conta que o menor AA, nascido a ../../2008, que na altura residia com ambos os progenitores, por períodos semanais, conforme decisão proferida nos autos de alteração das responsabilidades parentais, era instrumentalizado pelos progenitores, estando sujeita a pressão psicológica e a um quadro de alienação parental em escalada que urgia colmatar, reportando a título de exemplo, uma actuação do progenitor (gravação em que a criança de forma induzida se pronuncia sobre alegados comportamentos da mãe e que aquele pretendia usar como meio de prova no processo judicial em curso), instrumentalização que, na perspectiva do requerimento, punha em causa a estabilidade emocional e saúde mental do menor.
Vamos reproduzir aqui quase na íntegra o relatório constante da decisão recorrida, expurgado de algumas considerações valorativas, porque o mesmo dá uma ideia clara do tipo de situação que está em causa nestes autos.
Por relatório elaborado em 17/04/2019, a segurança social propôs o arquivamento dos autos, considerando que o AA não se encontra em situação de perigo, porquanto a circunstância dos progenitores, na semana em que cada um tem o filho aos seus cuidados, levarem e entregarem o AA na escola, evita os conflitos directos, embora também não promova a proximidade entre os mesmos, sendo certo que o menor já convive bem com essa situação e os progenitores não revelam predisposição para uma maior aproximação entre ambos.
Entretanto, quando estava em vigor um regime de guarda partilhada, já o progenitor apresentava inúmeros requerimentos, manifestando a pretensão que, nos períodos de interrupção escolar a entrega e recolha do filho tivesse lugar num CAFAP, posição com a qual a mãe não concordava.
Por despacho de 12/06/2019, já depois de ter solicitado à Ordem dos Psicólogos a indicação de um psicólogo para intervir junto do menor em conferência que iria ser marcada (cfr. despacho de 22/05/2019), a Mª Juiz, então titular do processo, acabou por aderir ao relatório, tendo proferido despacho datado de 12/06/2019, ordenando o arquivamento dos autos, sustentando a inexistência de perigo para o menor.
Desse despacho foi interposto recurso pelo progenitor o qual veio a ser julgado procedente, ordenando-se que o despacho de arquivamento fosse substituído por outro que determinasse as diligencias necessárias tendentes a apurar as situações denunciadas, em conformidade com o que se havia já determinado e que aplicasse uma medida de apoio junto dos pais por forma a colmatar o conflito existente, verificado nos momentos de entrega e recolha do menor, através de intermediação e integração em programa de formação, visando o melhor exercício das suas responsabilidades parentais, por forma a acautelar o bem estar integral do menor.
Em cumprimento do doutamente ordenado, o novo titular dos autos, ordenou se solicitasse relatório social que focasse os aspectos visados no douto acórdão, atenta a longa conferência entretanto ocorrida no apenso O), na qual foram as partes sensibilizadas para necessidade de comunicar no âmbito da parentalidade estruturada e positiva, relegando para momento oportuno a decisão sobre o processado subsequente (a necessidade da subsistência da intervenção do CAFAP e de realização da diligência promovida).
Com data de 02/12/2019, foi elaborado relatório conforme ordenado, que concluiu nos seguintes termos: «Da entrevista com a mãe a (30/10/2019), e com o pai a (31/10/2019), resulta a existência de mútuas acusações, um discurso muito centrado no passado que parece não se encontrar bem resolvido. Sendo perceptível que a relação entre ambos os pais é caracterizada por ausência de diálogo, apresentando dificuldade em estabelecer canais de comunicação que seriam de extrema importância para o exercício da parentalidade positiva. É de salientar em relação ao pai, dificuldade em descentrar-se dos processos judiciais, aproveitando-se dos mesmos para fazer prevalecer as suas próprias convicções. Adoptando uma atitude de desconfiança, e cepticismo em relação às diferentes entidades envolvidas (e.g. segurança social, tribunal, escola, CAFAP). Destacam-se características muito específicas relativamente à forma como o pai lida com a situação, apresentando um pensamento rígido e inflexível, com uma atitude de impermeabilidade quanto à intervenção colocando em causa o trabalho desenvolvido pelas equipas técnicas, adoptando uma postura de contestação. No dia da entrevista (31/10/2019) o pai exigiu junto das técnicas fotocópias dos registos efectuados pelas mesmas, tendo sido informado que estes registos não são peças processuais, mas sim instrumentos de apoio na recolha de informação, que vai para posterior avaliação e elaboração do relatório que será remetido aos autos e que o mesmo poderá consultar. Agendamos junto do pai uma data para comparecer com o AA neste Centro Distrital, inicialmente não colocou nenhum problema, no entanto, por questões de serviço existiu necessidade de alterar a data, estabelecemos contacto telefónico para reagendarmos nova data, tendo o pai adoptado uma postura de recusa, referindo que não permite que o filho seja ouvido por técnicos da segurança social, alegando estar a aguardar que o tribunal lhe indique o Psicólogo que vai ouvir o AA como tinha ficado anteriormente decidido pelo tribunal» (sic).
Foi promovida a realização de data para conferência com audição da criança, nomeando-se psicólogo para acompanhar o menor.
O progenitor continuou a insistir nos autos com o assunto das entregas e recolhas do menor em período não lectivo, insistindo por uma decisão provisória que determinasse que tais entregas e recolhas fossem efectuadas fora das residências dos progenitores, requerendo a notificação da progenitora para esclarecer as razões do menor chegar atrasado à escola quando usa meios de transporte públicos.
Tal requerimento foi objecto de resposta da progenitora e de posição do M.P., sobre o qual recaiu despacho de 16/12/2019, indeferindo o requerido e sancionando o progenitor com taxa sancionatória, atenta a repetição do requerimento sem motivo atendível, tendo-se solicitado a nomeação de psicólogo ao menor.
Após solicitar a reparação do despacho, que não foi atendida, o progenitor interpôs novo recurso, que veio a ser julgado procedente, sendo revogado o despacho na parte em que condenou o recorrente em taxa sancionatória excepcional.
Os autos dão conta de um auto de denúncia efectuado na PSP ..., protagonizado pelo progenitor, no dia 18/01/2020, que motivou novo relatório datado de 24/03/2020.
Entretanto, sobreveio o período da pandemia, tendo o Tribunal solicitado relatório social actualizado, relegando para momento posterior a apreciação da promovida conferência.
Em 04/05/2020, a progenitora vem dar nota de que, no passado dia 01/05/2020, quando se iria iniciar a semana do menor junto do pai, o menor recusou-se a passar a semana com o pai, apesar das insistências da mãe, alegando não se sentir à vontade em casa do pai, sendo sistematicamente sujeito a castigos sem razão e pressionado sobre questões discutidas em tribunal, que não pode ouvir musica do seu grado e ser forçado a ingerir refeições que não são do seu agrado, pugnando para que tal situação não seja considerada incumprimento, tendo o progenitor pugnado pela improcedência do requerido e pela condenação da progenitora em multa.
É neste momento, quando o menor tem apenas 11 anos de idade, que se iniciam as alegadas manifestações de recusa do menor, alegadamente fundamentadas na aplicação infundada de castigos pelo progenitor, na pressão exercida pelo progenitor sobre o menor sobre assuntos pendentes em tribunal, a proibição de ouvir música do se agrado ou ser forçado a ingerir refeições que não gosta.
O progenitor veio denunciar aos autos posteriores incumprimentos protagonizados pela progenitora, designadamente ocorridos em 15 de Maio de 2020, consubstanciados na não entrega do menor pela progenitora, altura em que mais uma vez chamou as autoridades para que fosse lavrado auto.
Foi proferido despacho em 21/05/2020 que, apesar de ter considerado desnecessária a passagem de mandados de recolha e entrega do menor, consignou que o menor não tem direito de veto e que o regime em vigor teria de ser escrupulosamente cumprido, insistindo pelo relatório em falta, que entretanto foi junto em 22/05/2020.
O progenitor volta a dar conta de novo incumprimento em 22 de Maio, pugnando pela entrega imediata do menor pelas autoridades policiais.
Foi designada data para tomada de declarações ao menor, que teve lugar em 16 de Junho de 2020.
Nessa diligência a Exma. Psicóloga vincou que, após ouvir o menor, “acha que ele não deve fazer um luto de um pai vivo e que não se deve cessar os convívios, deverá também corrigir-se as situações que no presente estão a causar desconforto. Quanto ao referir que não tem saudades pode estar-se perante um conflito de lealdade, sendo que tal pode suceder mesmo sem influência directa, pois colocando-se uma criança no meio do conflito é mais fácil para uma criança tomar um dos lados do que tentar descentrar-se. Se houver um regime salutar o regime de residência alternada é adequado”.
Concordamos, por exuberância, com a posição assumida pela Exma. Psicóloga, pois na verdade, é profundamente lamentável que este menor tenha sido arrastado para o conflito judicial dos progenitores, que acabou por tomar o partido da progenitora, optando por cortar os vínculos com o pai, fazendo uma espécie de “luto de pai vivo”, o que obviamente não deixará de trazer consequências não despiciendas na vida deste jovem, até porque o arquétipo paterno não é fungível.
Ouvido o menor e demais intervenientes, foi aplicada por acordo, uma medida de apoio junto dos pais, passando o jovem a beneficiar de consultas psicológicas e assumindo os progenitores vários compromissos designadamente de não falar com o filho sobre os assuntos do tribunal, nem falar mal do outro.
Logo em 22/06/2020, vem o progenitor dar conta de novo incumprimento no dia 19/06, pugnando pela entrega imediata do menor através das forças policiais, a condenação da progenitora em multa e a sua compensação pelos períodos de privação de convívios com o menor.
Em resposta a progenitora admite o incumprimento justificando que o menor se terá recusado a estar com o pai.
O Tribunal proferiu despacho datado de 06/07/2020, determinando que a Técnica da EMAT se desloque à residência para mediar a entrega semanal da criança.
Em cumprimento do ordenado, a Exma. Técnica gestora do processo tentou mediar a entrega da criança no passado dia 10/07/2020, entrega que se mostrou inviável pelas razões que fez constar do relatório de diligências de 13/07/2020, tendo aí feito constar, além do mais: “não nos pareceu, que a posição do AA corresponda a manipulação da progenitora (atendendo á colaboração desta em sensibilizar o filho para a necessidade de cumprimento da decisão judicial), mas sim, ao medo demonstrado perante a possibilidade de ser alvo de castigos e represálias, mesmo informado que o pai se teria comprometido a não fazê-lo. Tendo em conta o medo demonstrado pelo jovem e o facto de se agudizar o mesmo, caso se recorra às forças policiais para fazer cumprir a decisão judicial, consideramos que tal solução poderá vir a condicionar ainda mais o relacionamento entre pai e filho, podendo causar lacunas ainda mais profundas à reaproximação entre ambos. Pelo facto, sugerimos que, apoiando-nos no início da intervenção do CAFAP - ..., se possa trabalhar a reaproximação entre pai e filho, apoiando de forma serena e gradual a retoma do regime convivial definido”.
O progenitor continuou a apresentar requerimentos nos autos insistindo pela entrega do menor através das autoridades policiais.
Foi proferido despacho datado de 03/08/2020, em consonância com promoção do M.P., solicitando informação urgente sobre se já foi iniciado acompanhamento psicológico ao menor e, na afirmativa, qual ao resultado da avaliação realizada sobre os comportamentos de rejeição do menor aquando das transições semanais, não obstante a intervenção dos técnicos e quais as repercussões da adopção de meios impositivos.
Da informação intercalar de 31/07/2020, resulta além do mais, que “a equipe técnica tem encontrado constrangimentos na realização das sessões uma vez que o interesse do progenitor se centra no cumprimento do regime convivial e cumprimento das transições do jovem, previsto no acordo de guarda partilhada, desvalorizando todo o processo psicossocial e de mediação com que se comprometeu em sede de tribunal.
Também a progenitora tem apresentado uma postura resistente e pouco flexível perante o cumprimento do regime convivial, alegando a recusa e o sofrimento do filho (…)”, sugerindo que o CAFAP possa trabalhar em simultâneo com a intervenção psicossocial dirigida ao jovem, iniciando-se uma intervenção de reaproximação gradual entre ambos, prevendo inicialmente visitas supervisionadas nas instalações do CAFAP, recurso a videochamadas, que gradualmente possam evoluir para convívios no exterior por algumas horas, pernoitas por alguns dias, até atingir o regime convivial previsto. Ou seja, esta informação intercalar dá nota que ambos os progenitores mantiveram uma posição inflexível que dificultou o trabalho de reaproximação.
Por despacho proferido em turno de férias de Verão, em 05/08/2020, ordenou-se que “face aos sucessivos incumprimentos, a entrega do menor no CAFAP, deverá operar-se, como promovido, com mandado de condução à autoridade policial, pelo menos para apresentar na ...”, despacho do qual foi interposto recurso pelo progenitor, que não foi admitido (despacho de 02/09/2020).
Consta dos autos informação intercalar de 11/08/2020, da qual resulta:
“tendo em conta que o jovem se apresentava amedrontado, choroso e resistente para acompanhar o pai, foi promovido um momento de diálogo entre pai e filho, com o objectivo de amenizar os ânimos e transmitir-lhe segurança e estabilidade. Foi solicitado ao progenitor que conversasse com o filho, no sentido de perceber os seus receios, de poderem conversar um pouco, esclarecer os motivos da rejeição e promover a aproximação entre ambos. Apesar do AA ter inicialmente reagido mal à presença do pai, foi possível, com a ajuda da técnica, que este se acalmasse, acabando ambos por se cumprimentar (com um toque de punhos). Quando tudo parecia encaminhar-se para o diálogo entre ambos, e o jovem começa por tentar explicar ao pai que não queria acompanhá-lo, este terá informado o filho, que teria que o acompanhar, que não poderia continuar com teimosias e que as regras são para serem cumpridas. O Sr. AA, perante o choro do filho, ter-lhe-á dito ainda que já não saía dali sem ele e que não o largava mais. Tendo a técnica informado o progenitor que o AA não sairia dali à força, solicitando-lhe novamente que dedicasse algum tempo a conversar com o filho, para tentar entender os seus motivos e receios, este ter-se-á apresentado irredutível, solicitando a presença da PSP. O jovem, visivelmente mais assustado e receoso, mantém a sua recusa em acompanhar o pai. Os agentes da PSP conversaram com o jovem, com a técnica do CAFAP e, telefonicamente com a gestora do processo, na tentativa de decidir qual a actuação adequada, concluindo que, atendendo à recusa do jovem, e ao facto de os mandados de condução (na posse da GNR) não preverem a entrega impositiva do mesmo ao pai, decidiu-se que deveria acompanhar a progenitora para casa, solicitando-se a sua presença no local. Em nosso entender, mantém-se imprescindível a implementação de um plano de reaproximação entre pai e filho, como aliás foi já sugerido em informações anteriores, tendo em conta o longo período de tempo de afastamento e a posição irredutível e pouco flexível do progenitor, tentando impor “à força” a concretização de um regime convivial, que ao que se consegue apurar, promove o sofrimento e o receio no jovem em causa. Em momento algum, corroboramos com qualquer tipo de incumprimento das decisões judiciais, no entanto, atendendo ao superior interesse do jovem, consideramos imprescindível o restabelecimento gradual da relação entre pai e filho, como forma de, em segurança, se poder recuperar o bem estar emocional e a confiança entre ambos. O desgaste de uma luta judicial, já longa, com sucessivos requerimentos e conflitos entre os progenitores, tem vindo a promover o agudizar do sofrimento no AA, que constantemente se vê envolvido e em tensão para não desiludir nenhum dos progenitores, o que poderá comprometer o seu desenvolvimento harmonioso e consequentemente o seu bem estar”.
Por despacho datado de 02/09/2020, o Exmo. Juiz titular proferiu despacho no qual consignou:
“(…) O Tribunal tentou, até à exaustão, que o regime fosse voluntariamente cumprido, sendo que se passaram mais de dois meses desde a última diligência, aos 16/06/2020. Mais do que saber se se trata de um incumprimento da progenitora ou de uma recusa do menor (independentemente das razões serem atendíveis ou não), distinção que é relevante, como notado pela defensora do menor, o que é um facto é que estamos num impasse de não convívio entre o menor e o pai. O pai pretende a imposição coerciva do regime, através de mandados, mas em três informações distintas do CAFAP e da EMAT (a fls. 343, 351 – em que se sugere a reaproximação gradual entre pai e filho, suspendendo-se provisoriamente o regime em vigor de residência alternada –, 368 e 380, de, respectivamente 31/07, 07/08 e 11/08) reporta-se aos autos a recusa do jovem por ter medo do pai, tendo sido sugerido ao pai que em vez de uma via impositiva adoptasse uma postura de maior transigência e pacificação, e de paciência, junto do filho, de modo a ultrapassar-se a angústia por este verbalizada e expressada em choro e em comportamentos de resistência. O dever-ser e o ser, o mundo ideal e o real, são distintos, não se confundem. As coisas deveriam ser como o tribunal antes referiu mas o decurso do tempo é, por si só, um facto juridicamente relevante, designadamente o enfraquecimento dos laços entre o pai e o filho (como o pai admite no seu contraditório de 10/08, fls. 371 v., ao dizer que os laços entre pai e filho já estão comprometidos) – isto não obstante ter vindo reiterar aos autos que pretende o cumprimento integral do regime e que não aceita a solução de reaproximação feita pela E.M.A.T.. A par disto, e na sequência do despacho proferido em Maio, não se crê que uma medida impositiva como o cumprimento de entrega mediante mandados fosse uma mais-valia para a reaproximação de pai e filho, pois poderia ter efeitos perniciosos, incluindo ao nível psicológico. Por outro lado, e como também dito, o menor não tem poder de veto para obstar ao cumprimento do judicialmente decidido. As posições estão extremadas, sendo que o acompanhamento psicológico recentemente iniciado ainda não produziu efeitos práticos. Como resulta do art.º 100.º da L.P.C.J.P., e 986º e 987.º do C.P.C., estes processos são de jurisdição voluntária, regendo-se por critérios também de oportunidade, o que legitima os considerandos que vêm sendo tecidos, designadamente quanto ao não ser adequado neste momento a passagem de mandados para entrega da criança ao pai. Neste momento, na prática, não tem havido contactos entre o pai e o filho, pelo que importa cessar esta situação através de uma reaproximação gradual entre pai e filho (com a inerente alteração do plano do CAFAP de fls. 331, de 10/07/2020), sendo esta a implementar nos moldes sugeridos pela EMAT a fls. 351, of. de 31/07/2020. Excepto da primeira vez, em que a progenitora faltou e levou o menor ao médico, a progenitora tem comparecido com o menor no CAFAP, o que deverá continuar a acontecer sob pena de multa faltando (e de voltarem a ser emitidos, se for o caso, mandados para comparência no CAFAP). Esta reaproximação deverá estar concluída em 3 meses, de modo a que nessa altura se mostrem ultrapassadas as resistências actuais, mantendo-se no entretanto, plenamente em vigor as injunções do acordo (que nem 3 meses tem…) de promoção e protecção de fls. 296 excepto na parte respeitante à al. d) (erradamente escrita “e)”, a seguir a “c)”) na referência a “em ambos os agregados familiares”. Solicite nova informação sobre o acompanhamento psicológico e informação intercalar da EMAT a enviar até 30/09. Apesar de o pai ter manifestado aos autos discordar desta opção, deverá cooperar, pois neste momento o que se passa é um afastamento total, que importa reverter, sendo que todas as informações constantes dos autos, enviadas pelos técnicos, desaconselham a entrega ao pai recorrendo a mandados. Notifique, comunique e demais D.N.”
Consta dos autos relatório pericial realizado à progenitora datado de 27/08/2020 que concluiu que a progenitora “se revelou globalmente ajustada, não manifestando sintomatologia psicopatológica ou perturbação da personalidade clinicamente significativa. Concluímos, deste modo, que a progenitora reúne condições psicoemocionais favoráveis à condução da educação do seu filho AA (…). Não obstante, a esta avaliação foi igualmente perceptível que a relação entre o ex-casal continua a pautar-se por uma escalada em termos de hostilidade, conflito e judicialização, culminando num comprometimento das relações paterno-filiais, perceptível pela alegada postura de recusa e rejeição de AA à figura paterna (…) A persistência no tempo destas dinâmicas poderá vir a comprometer o equilíbrio emocional do AA e impedir a resolução em absoluto do aludido litígio parental (…)”.
Este relatório pericial alerta para o risco de cronificação da recusa do menor, caso não haja uma inversão de postura por banda dos progenitores e para as consequências da rejeição da figura paterna, alerta que não surtiu qualquer efeito junto de ambos os progenitores.
Conforme ofício do GML de 02/12/2020, o pai do menor faltou ao exame marcado no dia 02/12/2020, na especialidade de psicologia forense.
Entretanto, na sequência de e-mail remetido pelo progenitor para a PGR e CSM, o Exmo. Juiz titular participou criminalmente do progenitor e suscitou a sua escusa, por se ter sentido atingido na sua honorabilidade pessoal e profissional, tendo os autos passado a ser tramitados pelo titular do J2.
Após pedido de informação do Exmo. Juiz substituto, a informação intercalar datada de 05/11/2020, informa que a realização de avaliação pericial ao progenitor continua a mostrar-se necessária.
Na sequência de requerimento de progenitor foi proferido despacho datado de 22/12/2020 que não autorizou que o menor fosse visitado pelo progenitor no dia do aniversário daquele e no período de passagem de ano, insistindo que importa insistir numa reaproximação gradual.
Em 20/01/2021, foi remetido aos autos relatório social de acompanhamento da execução da medida, do qual resulta que:
“se tornou inviável qualquer intervenção eficaz face á não alteração de comportamentos, não diminuição dos níveis de conflito e restabelecimento da comunicação entre os progenitores, enquanto de mantiverem e prolongarem os processos/acções judiciais. A exposição continuada ao conflito, poderá representar sequelas graves para a saúde mental das crianças/jovens, para a estruturação da personalidade e para seu equilíbrio psíquico. (…) Pelo facto, e considerando que o regime de residência alternada (em vigor), pressupõe a coparentalidade e capacidade de comunicação entre os progenitores, como salvaguarda do bem-estar e do interesse do AA, consideramos que não se encontram reunidos os pressupostos, tendo em conta elevado nível conflitual existente e sobejamente retratado nos autos. (…) Da avaliação realizada não se vislumbram sinais de qualquer situação de risco ou perigo para o jovem, enquanto integrado no agregado familiar da progenitora, à excepção da relação conflitual, discórdia, hostilidade e disputas judiciais existentes entre os progenitores, o que alegadamente terá levado o jovem a recusar os convívios com o progenitor e tendencialmente poderá vir a deteriorar o relacionamento e vínculo afectivo entre pai e filho (…)”.
Confrontado com o teor de tal relatório, o progenitor opôs-se ao arquivamento dos autos. Foi designada data para audição dos progenitores e do Técnico de Serviço Social.
Na data aprazada - 08/03/2021 - mantendo-se a oposição do progenitor ao arquivamento dos autos, foi ordenada a abertura de termo de vista, concluindo o Digno Magistrado do M.P., pela proposta de arquivamento e de realização de exames psicológicos ao menor e progenitor.
Com vista à prolação de decisão, foi designada data para a inquirição do jovem com a intervenção da psicóloga.
Na data aprazada - 29/04/2021 -, foi inquirido o jovem após o que se ordenou a abertura de termo de conclusão.
Em 16/06/2021 foi proferida decisão que concluiu nos seguintes termos: “Nos termos e pelos fundamentos expostos, decide-se manter por mais seis meses a referida medida de apoio junto da mãe decretada nestes autos a favor do referido menor, devendo a mesma ser acompanhada: a) pela execução de um plano de reaproximação do menor ao progenitor, a definir no prazo de quinze dias pela SS, e a executar em ambiente de CAFAP; b) pelo acompanhamento psicológico do menor; c) pela realização de perícia psicológica ao progenitor, de modo a aferir das suas personalidade e competências parentais, devendo o mesmo, no prazo de 10 dias, declarar se se dispõe a tal ou não; Continuará a caber à EMAT de ... o acompanhamento da execução da medida em causa, a qual deverá remeter novo relatório social no prazo máximo de cinco meses. Notifique e comunique à SS e CAFAP”.
Em cumprimento do decidido foi remetido pela SS, plano de reaproximação do menor ao progenitor, que passaria por visitas supervisionadas nas instalações do CAFAP (com a possibilidade de aumento gradual de tempo de convívio, consoante a confiança do jovem e a adequação do comportamento do progenitor, o permita); recurso a videochamadas; evolução gradual para convívios no exterior, com recolha e entrega do jovem nas instalações do CAFAP, pernoitas por alguns dias, intervenção junto dos progenitores promovendo a autonomia na entrega e recolha do jovem; acompanhamento psicossocial do jovem, trabalhando-se os seus medos, ansiedades e estabilidade emocional;
Por requerimento datado de 14/09/2021, o progenitor vem afirmar categoricamente que não aceita sujeitar-se a qualquer perícia psicológica, pretensão que foi indeferida por despacho de 14/10/2021, despacho do qual foi interposto recurso pelo progenitor, recurso que foi admitido por despacho de 05/07/2022.
A Exma. Psicóloga, Dra. BB veio informar os autos que o acompanhamento psicológico se iniciou e 9 de Agosto de 2021, bem como do resultado das sessões já realizadas, informando que as sessões irão continuar com frequência trissemanal até melhoria clínica.
De fls. 760 dos autos, resulta que o progenitor terá remetido exposição ao CSM visando a actuação do Juiz que, em substituição do titular originário, vinha tramitando os autos, exposição que mereceu despacho de arquivamento por banda do CSM.
O progenitor deduziu incidente de suspeição quanto ao Exmo. Juiz que em substituição do titular originário, vinha tramitando os autos.
Consta dos autos parecer técnico datado de 30/05/2022, do qual resulta que: “receamos que, confrontar o jovem novamente com a possibilidade de encetar um plano de reaproximação com o pai, sem a garantia do empenho e da vontade deste último, poderão não só condicionar a estabilidade e bem-estar do AA, como confrontá-lo com mais uma rejeição, caso este mantenha a recusa do pai. A estabilidade/recuperação terapêutica poderá ser posta em causa caso se confronte novamente o jovem com a possibilidade de se insistir na implementação do plano de reaproximação com o pai. O jovem manifestou sempre, ao longo do acompanhamento, a sua recusa e o receio perante o confronto com a figura paterna. Pelo faco, considera esta equipa que, antes de se voltar a confrontar o jovem, com o plano de reaproximação em causa, urge conhecer as conclusões da avaliação pericial a realizar ao progenitor, para além de se considerar imprescindível apurar, a real motivação e adequação do progenitor em relação aos convívios, nos moldes acima referidos”.
Entretanto, em face da disponibilidade manifestada pelo progenitor para finalmente se sujeitar à perícia, por despacho datado de 21/06/2022, foi realizada perícia ao progenitor, na especialidade de psiquiatria, destinada a apurar da capacidade para exercer as responsabilidades parentais.
Da perícia psicológica realizada ao pai em 03/12/2022, constam as seguintes conclusões:
“A avaliação psicológica realizada, não identificou sinais de perturbação emocional clinicamente significativa, no momento actual. Do mesmo modo, não surgiram indicadores de perturbação da personalidade. CC apresenta características de funcionamento psicológico seguro e estável, orientado para a tarefa e focado em objectivos concretos, consciencioso e persistente. Os momentos de nervosismo poderão ocorrer apenas em situações mais exigentes, como o actual processo judicial. Tenderá a ser sociável, activo e falador. Relativamente às necessidades do filho, demonstrou motivação e preocupação face à parentalidade, reconhecendo práticas educativas ajustadas. Valoriza, na educação do menor, o factor de controlo, imposição de regras e limites, podendo assumir uma postura de maior autoridade na relação com o filho. Esta perspectiva é fortemente influenciada pelo litígio face à figura materna, sobre a qual transmite uma percepção de incapacidade parental, permissividade e negligência. Apesar de manifestar o desejo de retomar o contacto com o menor, reconhece o afastamento actual na relação entre ambos como difícil e problemático. A conflitualidade relatada com a progenitora, é considerada como factor de interferência clara na relação paterno-filial. Quanto à paternidade, foi possível constatar que CC está motivado, interessado face ao acompanhamento do filho. Manifesta preocupação pelo seu bem-estar e segurança. Mostrou conhecer as práticas educativas mais ajustadas à educação, valorizando o cumprimento de regras e limites como orientadores do crescimento saudável do menor. Foi identificado um sentimento crescente de afastamento afectivo relativamente ao filho, que CC sente como muito negativo e difícil de ultrapassar e que relaciona com a influência que a figura materna terá sobre o filho. Concluímos que o progenitor reúne condições favoráveis à educação do filho e está motivado para exercer o seu papel parental. Contudo, é necessário cessar o litígio relativamente à figura materna, por se considerar que tem vindo a influenciar claramente a relação do menor com o pai. A longa judicialização do problema, a dificuldade de ambos os pais negociarem e encontrarem estratégias de articulação relativamente à educação do menor e a exposição do menor aos conflitos parece ser o principal factor que estará a impedir a resolução do afastamento do menor face ao pai. É essencial que ambos os progenitores sejam capazes de reconhecer no outro competências e capacidades e sejam capazes de transmitir ao filho uma imagem positiva de cada um dos pais, para que este se consiga posicionar face a ambos de forma livre e descomprometida”.
Do Relatório social de acompanhamento de execução da medida datado de 10/02/2023, constam as seguintes conclusões: “Mantém-se a medida aplicada, desde Dezembro de 2021, sem renovação, tendo sido, no nosso último relatório de revisão (10.12.2021), proposta a cessação da mesma, atendendo às dificuldades amplamente retratadas nos autos, na implementação de qualquer tipo de intervenção junto do progenitor, devido à sua atitude intransigente, de recusa e por vezes conflituosa com os técnicos dos vários serviços envolvidos.
O AA mantém-se até à data, conforme decisão judicial, integrado no agregado familiar da progenitora, sem qualquer tipo de contacto ou convívio com o progenitor.
Conforme informação junta aos autos (em 02.11.2021), o AA beneficiou de acompanhamento psicossocial no CAFAP, entre Julho de 2020 e Julho de 2021, e posteriormente na Associação de Defesa dos Direitos Humanos, entre 09.08.2021 e 04.01.2022, tendo-lhe sido declarada alta, por indicação de “ausência de prejuízo clinicamente significativo”, perante o contexto vivenciado à data.
Em articulação com a progenitora, é sua opinião que o filho se encontra mais descontraído, estável e equilibrado emocionalmente, tendo deixado de apresentar sintomatologia ansiosa (vómitos, dores de barriga, dores de cabeça, etc).
Considera que o filho tem apresentado uma evolução significativa em contexto escolar, não só no aproveitamento, mas também no comportamento.
O AA frequenta, no presente ano lectivo, o 8º ano de escolaridade, na Escola EB 2,3 ..., deslocando-se autonomamente de transporte público.
Mantém a frequência da actividade extracurricular de Futsal no Clube Recreativo de ..., com entusiasmo e motivação.
Segundo a mesma, o AA continua a recusar convívios com o pai, em sua opinião, pela frustração vivenciada perante a ausência prolongada de contactos; por não sentir no progenitor qualquer interesse em saber como está; em contactá-lo nas datas festivas; ou sequer ter mostrado interesse em colaborar com o plano de reaproximação frequentemente proposto, pelos serviços envolvidos.
No entanto, não se opõe a que o AA venha a manter contactos ou convívios com o pai, desde que os mesmos, respeitem o bem-estar e o equilíbrio do jovem.
Afirma ter informado o progenitor, por SMS (uma vez que considera ser a única forma de comunicação possível entre ambos) de todas as situações de saúde significativas do filho (ex: cirurgia ao ouvido e Covid). Assume, desde que o filho integrou o seu agregado familiar todas as despesas e necessidades do filho (alimentação, saúde, educação, vestuário, actividade desportiva, etc).
Ou seja, é proposta a cessação da medida, atendendo às dificuldades amplamente retratadas nos autos, na implementação de qualquer tipo de intervenção junto do progenitor, devido à sua atitude intransigente, de recusa e por vezes conflituosa com os próprios técnicos dos vários serviços envolvidos, ou seja, ao invés de cessar os conflitos, estava empenhado em multiplicá-los.
Foi designada nova data para inquirição dos progenitores, do Jovem e do técnico, tendo sido obtido acordo em 09/03/2023, no sentido de que o jovem se comprometeu a encontrar-se com o pai no café junto à escola que frequenta, às quartas-feiras entre as 13:40 e 14:40 horas, estabelecer contactos via telemóvel com o pai, medida essa com a duração de 3 meses.
Do relatório social de acompanhamento da execução da medida datado de 22/08/2023, constam as seguintes conclusões:
“Do passível de avaliação, e atendendo à posição actualmente assumida pelo AA (de nova cessação dos convívios), considera esta equipa técnica que, apesar da disponibilidade demonstrada pelo AA no estabelecimento de convívios semanais com o pai, bem como, da disponibilidade demonstrada pelo progenitor em aceitar e cumprir o acordado, parece não existir entre ambos, consenso quanto às razões que levaram o jovem a cessar os mesmos. O jovem transmite capacidade e maturidade para gerir autonomamente os convívios com o progenitor, pelos quais aliás, demonstrou alguma expectativa. No entanto, alega que não terão correspondido ao esperado, pelas razões já explanadas anteriormente. O progenitor apresenta rigidez no seu discurso e forma de interpretar os factos, mantendo a convicção de que é a progenitora a única responsável pela interrupção dos convívios e manipulação do descendente comum. Em nenhum momento o progenitor considera que esta tomada de posição seja convictamente tomada pelo jovem, alegando ter mensagens trocadas com este, que o comprovam e que fará chegar aos autos. Ao longo da avaliação e acompanhamento da medida aplicada, não aferiu esta equipa, qualquer comportamento ou atitude da progenitora que demonstrasse oposição aos convívios ou contactos entre pai e filho. Pelo contrário, sempre terá incentivado o AA a manter os contactos, a atender as chamadas e a agendar os convívios de forma autónoma e mediante a sua vontade e motivação. Apenas demonstra preocupação com o facto de todo este processo poder criar nova instabilidade emocional no filho. Tendo em conta a contrariedade do discurso e da posição de cada um dos elementos intervenientes (pai - mãe - filho), para além da rigidez de pensamento do progenitor, uma vez que, em nenhum momento considera a posição tomada pelo filho, como autónoma, é parecer desta equipa técnica, que não se prevê que qualquer plano de intervenção, seja eficaz, com vista à mudança futura de comportamentos, bem como, no estabelecimento de um regime convivial regular. Entendemos que a regularidade de um convívio paterno filial, dependerá sempre da capacidade de o progenitor conquistar a confiança do jovem e reforçar a relação/ interacção entre ambos. Para tal, somos de opinião que, deverá alterar o seu comportamento e demonstrar maior sensibilidade e isenção no seu discurso e nas suas exigências, principalmente em relação à progenitora, uma vez que é, por ora, a figura de referência do jovem e a pessoa com quem este pretende ficar a residir (desagradando-o um discurso inflamado acerca desta). Pelo facto, somos de opinião, que o jovem não apresenta qualquer sinal de risco e/ou perigo que justifique a manutenção da medida protectiva em vigor, considerando que o regime convivial deverá ser estabelecido no âmbito do processo de Alteração das Responsabilidades Parentais, em curso, sugerindo o arquivamento dos presentes autos”.
Cumprido o contraditório, o progenitor opôs-se ao arquivamento dos autos.
Foi designada para o dia 15/11/2023, data para audição dos progenitores, do jovem e do Técnico Social, sendo já o tribunal personificado pela aqui signatária que iniciou funções na Jurisdição de Família e Menores de Guimarães, J..., no dia 01/09/2023.
Nessa diligência, após uma longa tentativa de sensibilização dos progenitores, foi obtido acordo no sentido do jovem retomar as consultas de psicologia junto de psicóloga a indicar pela Exma. Técnica que acompanha o processo, acompanhamento esse que deveria iniciar-se tão breve quanto possível, ai se consignando que tal acompanhamento tinha em vista estabilizar os sintomas de ansiedade que o jovem evidencia quando está com o progenitor, por forma a que ao fim e um mês seja possível restabelecer os contactos com este; decorrido um mês, não havendo indícios em contrário, o jovem e o progenitor restabelecerão os contactos no CAFAP, nas tardes de 3ª ou 6ª feira em que o jovem não tem aulas, com a duração de duas horas; o progenitor compromete-se a abster-se de, no decurso dos convívios, fazer qualquer referencia negativa à progenitora a progenitora obriga-se a abster-se de questionar o menor sobre a forma como decorreram os convívios, acordo esse válido por 6 meses.
Foram prestadas informações nos autos, por insistência do tribunal que, foi possível iniciar o acompanhamento psicológico do AA em 16/02/2024, com a Dra. DD, tendo ainda sido prestada informação de que foi acordado que se realizariam dois convívios semanais (às terças e sextas-feiras) com a duração de uma hora cada um, que teriam lugar nos dias 23 e 26/04/2024; 03, 07, 10 e 14 e 22/05/2024; 04,07, 11, 18, 21 e 25/06/2024 e inda dois convívios extra em 10/05/2024 para participar no jantar de aniversário do progenitor e no dia 22/07/2024 para lancharem juntos.
Do relatório social de acompanhamento de execução da medida datado de 28/06/2024, constam as seguintes conclusões:
“Do passível de avaliação, conclui esta equipa técnica, reiterado pela equipa técnica do CAFAP que os convívios supervisionados, apesar de alguns percalços e interrupções pontuais, têm evoluído de forma positiva. Atendendo à necessidade de se manter a intervenção junto de todos os intervenientes, com o objectivo de se reforçar uma colaboração cooperante, neste processo que se pretende gradual e evolutivo, sugerimos a manutenção da medida actualmente em vigor, pelo período de 6 meses, com as seguintes injunções: -o jovem compromete-se a comparecer nas consultas de psicologia, com assiduidade e pontualidade, na ...; -o jovem compromete-se a comparecer nas sessões de convívios supervisionados, com assiduidade e pontualidade, no CAFAP - ...; -o progenitor compromete-se a manter a colaboração e a comparência assídua e pontual nas sessões de convívios supervisionados, no CAFAP - ...; -o progenitor compromete-se a abster-se, no decurso dos convívios (supervisionados e externos), de toda e qualquer referência à progenitora ou aos processos judiciais; -o progenitor compromete-se ainda a comparecer, sempre que notificado, em sessões individuais no CAFAP, na ... ou na Segurança Social; -a progenitora compromete-se a comparecer, sempre que notificada, em sessões no CAFAP, na ... ou na Segurança Social; -a progenitora compromete-se a abster-se de questionar o jovem sobre a forma como decorreram os convívios com o progenitor, tecer qualquer comentário acerca do progenitor ou interferir nos convívios agendados pelo jovem”.
Exercido o contraditório sobre a proposta de manutenção da medida, o jovem e a progenitora vieram opor-se à manutenção da medida.
Foi proferido despacho pela Mª Juiz de Turno datado de 22/07/2024, onde se escreveu:
“Do que se apresenta possível extrair do relatório elaborado pela SS, o processo de construção de regime convivial entre o menor AA e o respectivo progenitor – aspecto de central importância na promoção e protecção dos direitos do primeiro - tem conhecido evolução, francamente, positiva, sem que, contudo, se escamoteie a resistência que o menor foi, pontualmente, expressando e que, com o emprego das adequadas estratégias, foi possível superar, possibilitando, até, contactos fora de contexto supervisionado e que decorreram com normalidade. O antedito relatório dá, também, fé do empenho que ambos os progenitores vêm manifestando no sentido de contribuir para a efectiva promoção e promoção dos direitos do menor, colocando os interesses deste acima de eventuais diferenças que tenham tido, ou que mantenham, entre si, em postura que é, a todos os títulos, de exultar. Daí que não possa deixar de encarar-se com alguma surpresa o posicionamento manifestado pelo menor e respectiva progenitora – concedendo-se que a posição desta se ancore na resistência do primeiro, sendo, nessa medida, compreensível -, no convite de que foram destinatários para os fins previstos pelo artº 85º da LPCJP. Seja como for, e sem desvalorizar o quadro de ansiedade reportado pelo menor, não deixa de ser certo, também, poder dizer-se que o acompanhamento de que tem vindo a beneficiar está, justamente, orientado para a construção de estratégias e recursos individuais de superação dessa dificuldade, incluindo quanto aos receios futuros que, no requerimento em sua representação apresentado, expressa. Perante o cenário exposto, afigura-se-nos de toda a pertinência, e conveniência até, a convocação dos progenitores, do menor e da técnica encarregue do acompanhamento do caso, para conferência, o que se decide em conformidade. A diligência realizar-se-á no dia 07.08.2024, pelas 14h00m – data em que estará de turno a Mmª. Srª. Juiz titular do processo, pessoa com amplo conhecimento dos autos e que, em intermediação anterior, teve já contacto com os intervenientes, o que se antecipa venha a permitir sejam superadas as dificuldades que, entretanto, sobrevieram (…)”. Segundo informação de 19/07/2024, “apesar de todos os esforços desenvolvidos por ambas as equipas, junto de cada um dos progenitores e sobretudo do jovem, não tem sido possível dar continuidade aos convívios supervisionados, atenta a posição assumida pelo jovem. Mantém-se o acompanhamento psicológico do jovem junto da ... e da Dra. DD com o objectivo de trabalhar as questões internas que possam estar a impedir o relacionamento com a figura paterna”.
Realizou-se nova conferência (art. 110º,1,b e 112º da Lei 142/2015, de 08/09 – L.P.C.J.P), que começou a 20.9.2024. Foram ouvidos EE (Progenitora); disse que:
-Concorda com a medida aplicada, porém não concorda com os convívios exteriores ao CAFAP, ou seja não supervisionados.
-Seria de todo conveniente se fosse ouvida a técnica do CAFAP-..., que acompanhou o menor aquando dos convívios, bem como a Psicóloga da ....
FF (Progenitor); disse que:
-Nada a opor à convocação da técnica e da psicóloga.
Dada a palavra à Ex.ma Sra. Procuradora do M.P., pela mesma foi dito nada ter a opor.
De imediato foi proferido o seguinte despacho:
“Atenta a preocupação demonstrada pela progenitora e a necessidade se obter esclarecimentos com vista a uma melhor decisão, tendo em conta que em requerimento apresentado nos autos a progenitora havia requerido que o Jovem fosse ouvido na presença da Psicóloga, suspende-se aqui a presente diligência, designando-se para a sua continuação o próximo dia 04-10-2024, pelas 10.30, data acordada entre todos os presentes”.
GG (Assistente Social no CAFAP/...); disse que:
-É Assistente Social no CAFAP /... e Gestora do processo familiar.
-Acompanha as visitas supervisionadas entre o progenitor e o filho.
-O caso foi referenciado a 04 de Abril, e os convívios paterno-filiais iniciaram 23/04 e até ao momento foram realizadas 14 visitas supervisionadas.
-A maioria dos convívios paternos filiares correram de forma positiva, com excepção de algumas divergências que ocorreram entre pai e filho, mas que foram bem ultrapassadas por ambos.
-As divergências tinham a ver com algumas posturas da parte do pai, nomeadamente alguma postura corporal do pai, quando o filho oferecia resistência em aderir aos convívios fora do CAFAP.
-O pai foi sempre adequado durante as visitas, procurou sempre interagir com o filho, questionando alguns aspectos da vida do mesmo sem ser demasiado intrusivo. Porém revelava algumas dificuldades em interagir de forma espontânea com o filho, o que se devia a algum receio da parte do pai em abordar algum assunto em que o filho se sentisse mais fragilizado e que isso pudesse colocar em causa todo o processo de reaproximação.
-Houve algumas visitas que o jovem não compareceu porque esteve doente e porque esteve em viagens de finalistas, tendo informado o CAFAP, sendo que o progenitor propôs ao jovem ter visitas autónomas, ao que o jovem disse ser ainda cedo, o que provocou uma mudança no comportamento do pai (mais apática, sem reacção, sem interacção com o filho), que fez com que o jovem ficasse mais reticente.
-É prática do CAFAP, sempre que algum dos progenitores propõe visitas autónomas, abordar a questão com a equipa da EMAT, Dra. HH, sendo que esta referiu que desde que houvesse acordo entre as partes (pai e filho), uma vez que o que se pretendia era a evolução dos convívios, poderiam avançar com os mesmos, e foi o que o CAFAP fez, após conversa com o jovem que mostrou receptividade.
-O pai sugeriu estes convívios autónomos porque o jovem tinha manifestado incomodo pelo facto do pai não contactar fora do contexto dos convívios supervisionados;
-Depois dos convívios acontecerem o jovem manifestou algumas oscilações na opinião no que concerne à forma como decorreram os convívios autónomos com o pai, sendo que em alguns momentos o jovem aceitava estar com o pai fora do CAFAP, porém na visita seguinte já não queria estar com o pai fora do CAFAP, por ainda ser muito cedo, justificando que aceitava, com receio da postura do pai.
-Apesar do jovem verbalizar não acreditar na mudança do pai, ele aparenta sentir-se confortável, protegido, seguro nos convívios quando realizados no CAFAP.
AA (jovem), nascido a ../../2008; ouvido em declarações (na presença da Sra. Dra. DD, Psicóloga da ...), disse que:
-Os convícios no CAFAP/... correram bem.
-Todavia não quer continuar com os referidos convívios, mesmo que sejam supervisionados.
-Não se sente bem na presença do pai.
-Tem receio que se regresse à guarda partilhada.
-Durante os convívios não sentia afecto do pai.
-Quando está com o pai, sente-se ansioso e com medo que alguma coisa aconteça.
-Acha que o pai está diferente, porém tem dúvidas se tal comportamento se deve ao facto dos convívios serem supervisionados.
-O acompanhamento está a ser bom para si, porém o que o atormenta é o que se passou antes.
-Não quer continuar os convívios com o pai, mesmo supervisionados.
Foi então proferido o seguinte despacho:
“Tendo em conta a resistência do jovem, a sua idade, entende-se ser prudente suspender a presente diligência, com vista ao jovem ser psicologicamente trabalhado, no sentido de desconstruir o bloqueio emocional que manifesta quanto à aproximação com a figura paterna, designando-se como nova data o próximo dia 08-11-2024, pelas 14.00 horas, data combinada com todos os presentes, data em que se espera que o menor possa tomar uma diferente posição sobre a manutenção do regime de convívios paterno-filiais através de visitas supervisionadas”.
A 15 de Novembro de 2024 foi novamente ouvido AA:
-Não quer manter o regime, nomeadamente manter os convívios no CAFAP.
-Tem consciência que está a cortar o vínculo com o pai.
-Tem consciência que a figura da mãe tem um papel na sua vida, mas a figura do pai, bom ou mau, tem outro papel na sua vida.
-Não consegue estar na companhia do pai; não sente afecto.
-Já perdeu o afecto há muito tempo.
Dra. HH (Técnica da Segurança social), ouvida em declarações, disse que:
-Considera que se não houver nenhum contacto entre os pais, o jovem não corre perigo, pois este resulta da conflitualidade entre aqueles.
-Este processo já tem vários anos, já foram feitas tantas intervenções com vista à aproximação entre pai e filho e nada resultou; voltar ao inicio deste processo não faz sentido.
-O jovem já não aguenta ver tanto processo judicial do pai contra a mãe e desta contra o pai, o que também dificulta a relação.
-A Segurança Social não se importa de fazer mais intervenções, porém se não tem o aval dos intervenientes, nada pode fazer.
-Toda a intervenção, a nível psicológico e social que tem sido possível fazer, foi feita, porém não tem havido feedback do outro lado.
O MP promoveu:
“Tendo em conta que esta conferência ficou suspensa até hoje para que o jovem pudesse pensar melhor, interiorizar-se a ideia de retomar os convívios com o pai no CAFAP porém o mesmo foi peremptório em dizer que não quer.
Por outro lado aos 16 anos não se pode impor a um jovem a companhia do pai, que não quer.
Por sua vez a Ex.ma Técnica da Segurança Social disse que a situação de perigo para o jovem resulta da conflitualidade entre os progenitores, sendo que esta situação não pode ser trabalhada, uma vez que não existe qualquer medida para acautelar esta situação.
Face ao exposto e atentas as injunções, que iam no sentido de aproximar pai e filho, mas cuja efectivação não foi possível continuar, por o jovem assim não pretender, deverão os autos ser arquivados.
Dada a palavra às Ilustres Patronas presentes (do jovem e do Progenitor), pelas mesmas foi dito nada terem a opor à douta promoção que antecede, propondo o arquivamento dos autos.
Foi então proferida sentença que determinou o arquivamento dos autos.
Inconformado com esta decisão, FF (o Progenitor) dela veio interpor recurso, que foi recebido como de apelação, a subir imediatamente nos próprios autos e com efeito devolutivo nos termos dos arts. 32º e 33º do Regime Geral do Processo Tutelar Cível e arts. 637º, 633º 645º, 647º do Código de Processo Civil.
Termina com as seguintes conclusões: 1- O presente recurso vem colocar em causa e discordar da decisão de arquivamento dos autos, bem como, da fundamentação para a tomada de tal decisão, porquanto é entendimento do aqui progenitor que face a toda prova produzida nos presentes autos, o menor continua numa situação de perigo e por isso o presente processo não pode ser arquivado, devendo manter-se com aplicação de uma medida e respectivas injunções, como se demonstrará. 2- Começará por se referir que apesar - como salienta a douta sentença - da defensora do progenitor ter proposto o arquivamento dos autos, foi pedida à posteriori a palavra pelo progenitor que afirmou ser sua pretensão recorrer, por entender que o menor continuava em perigo, tendo o tribunal a quo concordado com a situação de perigo do menor. 3- Ademais, após a análise da fundamentação do Tribunal a quo para decidir pelo arquivamento dos autos, não se concorda com a mesma e dela se recorre, dado que esta é omissa relativamente ao facto de resultar provado que o menor continua numa situação de perigo por não ter contactos com o progenitor e aí se mencionar a possibilidade da recusa do menor ser induzida pela progenitora, ou seja, ser este o possível motivo para a recusa em conviver com o progenitor, mesmo que de forma supervisionada, e ainda assim, decidir-se pelo arquivamento sem se averiguar de tal possibilidade e, em consequência não ser tomada a decisão mais adequada para, caso se confirme, remover tal condicionalismo da vida do menor. 4- É verdade que, o progenitor tem a sua quota de responsabilidade em todo este processo, mas também é verdade que o progenitor mudou o seu comportamento e atitude perante o mesmo e os seus intervenientes, estando espelhado nos autos. 5- Não pode ficar esquecido que o progenitor ficou privado de contacto com o seu filho durante três anos sem que lhe fosse imputada qualquer responsabilidade para tal privação e sem que o tribunal tomasse medidas mais gravosas para reverter a situação e evitar que se agudizasse o afastamento entre ambos. 6- Em Maio de 2020, quando existia regime de guarda partilhada, o menor começou a recusar passar a sua semana em casa do aqui progenitor, tendo este deixado de ter contacto com o seu filho, que se manteve até ao ano de 2023. 7- Durante tal período, o progenitor, como é compreensível, não soube gerir da melhor forma a frustração da recusa do seu filho em continuar com o regime de guarda partilhada e da proposta de passar para convívios supervisionados pois foi tudo muito repentino e sem qualquer fundamentação para tal, a que acresce o facto de nessa data os conflitos entre os progenitores estarem bastante agudizados. 8- Acontece que, com o decorrer do tempo e ausência de contactos com o seu filho, o progenitor conseguiu amadurecer e mudou o seu comportamento no processo e na forma de encarar os convívios com o menor, como está vertido nos autos. 9- Diga-se que se concorda com todas as considerações tecidas na douta sentença relativamente ao direito de visitas do progenitor não guardião e ao superior interesse da criança, nomeadamente, que este último em caso de conflito prevalece sob o primeiro. 10- No entanto, tal entendimento não se pode aplicar ao caso concreto dos autos porque não está em causa o incumprimento do regime de visitas, mas uma questão de perigo para o menor face à recusa deste em ter qualquer tipo de contacto com o progenitor. 11- Pois no caso em concreto, o menor não se recusa a estabelecer convívios supervisionados com o progenitor por uma causa directa da sua relação com este, não conseguindo o menor explicar e concretizar nos autos uma razão relacionada directamente consigo que possa imputar ao progenitor, frisando sempre que a sua recusa se deve a motivos relacionados com a sua progenitora e a situações passadas vivenciadas entre os progenitores que o próprio não experienciou. 12- Resulta manifestamente provado nos autos - com maior intensificação a partir do ano de 2023, quando o progenitor consegue depois de três anos a reaproximação do seu filho - que existe uma grande e séria probabilidade de o menor estar a ser instrumentalizado pela progenitora quanto à sua recusa em manter uma relação filial com o progenitor e que existe um conflito de lealdade para com a progenitora que o impede de ter uma relação saudável com o pai. 13- Assim, não se devendo a recusa do menor a uma conduta directa do progenitor para consigo, que o coloque em perigo e estando “em cima da mesa”, como refere a sentença, que “a progenitora não é absolutamente alheia à alegada recusa que o menor verbaliza quanto aos contactos com o pai”, está criada uma situação de facto que é realmente potenciadora de real e muito provável perigo para o menor, já com um dano muito sério para a sua vida adulta. 14- Face à prova amplamente produzida nos autos, não podia o Tribunal a quo decidir arquivar os autos, sendo necessária a continuação da intervenção do Estado (directa ou indirectamente), por um lado, com vista a remover a situação de perigo que existe na vida do menor e por outro, a atingir o tal interesse superior do mesmo, aplicando-se uma medida de promoção e protecção eficaz e adequada ao caso em concreto. 15- Como se disse, no ano de 2023 o progenitor voltou a ter contacto com o seu filho e é desta premissa temporal e do acordo aí alcançado que se apresenta a presente motivação de recurso, pois só assim será possível tentar reverter o corte definitivo da relação paterno filial entre o progenitor e o menor. 16- Tal contacto adveio de o menor demonstrar junto das Técnicas da Segurança Social vontade em aceitar uma reaproximação com o progenitor, mediante algumas condições. 17- Nessa medida, no dia 9 de Março de 2023 o jovem foi ouvido em tribunal e aceitou passado três anos retomar os contactos com o progenitor, afirmando não ser necessária a supervisão de terceiros, bem como, nesse dia o menor aceitou facultar o seu contacto telefónico ao pai, tendo ficado decidido o menor encontrar-se com o pai no café junto à escola que frequentava, às quartas-feiras, entre as 13:40 e 14:40horas e estabelecer contactos via telemóvel com o pai, medida essa com uma duração de 3 meses. 18- Na data supra aludida o menor já começou a demonstrar a possibilidade de estar condicionado na tomada das suas decisões, dado que no momento em que lhe foi perguntado se o progenitor o podia começar a contactar via telemóvel, ficou atrapalhado, revelando não saber como devia decidir sobre tal assunto. 19- Já após os convívios se terem iniciado nos termos acordados e se terem realizado três convívios que correram com normalidade, o menor veio solicitar que os mesmos cessassem sem, no entanto, conseguir explicar o motivo que o levou a tomar essa decisão, só relacionando a mesma com mensagens trocadas com o progenitor que envolviam também a progenitora. 20- Face a tal circunstancialismo, no dia 15 de Novembro de 2023, foram ouvidos o jovem e os progenitores. 21- Nesse dia, a progenitora com as suas declarações deixou claro que não incentiva verdadeiramente os convívios entre o menor e o progenitor, que coloca sempre a sua figura no meio da relação destes, condicionando o menor nas suas decisões, e escuda-se sempre na vontade do menor, em total desprezo pela relação paterno filial destes. 22- A progenitora com as declarações vindas de transcrever, demonstrou que sempre apoiou - ou agarrou-se a essa desculpa - a vontade que o menor manifestava relativamente a conviver com o progenitor, mesmo sabendo que o menor face à sua tenra idade não tinha e ainda não tem, maturidade e capacidade de compreensão e consciência para tomar uma decisão clara, ponderada e esclarecida. 23- Por outro lado, no seu depoimento denota-se que a progenitora não conseguiu e ainda não consegue, separar a sua conflitualidade com o progenitor, da relação que o menor pode e deve ter com o pai, condicionando-a. 24- Acresce que, a progenitora utiliza sempre um discurso inflamado contra o progenitor, relacionando a recusa do menor em estar com o pai com o facto de este dizer mal de si ao menor, tecendo sempre considerações depreciativas quanto à figura paterna. 25- Fica demonstrado no depoimento que a progenitora sempre controlou e se intrometeu na relação do menor com o progenitor, desde o tempo da guarda partilhada até ao presente. 26- E que existe um conflito de lealdade do menor para com a progenitora quanto ao seu relacionamento com o progenitor, que esta alimenta e desvaloriza os efeitos nefastos que isso pode acarretar no presente e futuro do menor, em proveito próprio. 27- Existe, por isso, no depoimento uma desvalorização da parte da progenitora da importância para o superior interesse do menor de este manter, ainda que escassos, convívios com o progenitor. 28- Já no que concerne ao depoimento do menor prestado nesse dia 15 de Novembro de 2023, fica claro, como se pensa que ficou para o Tribunal a quo, que o menor gosta e tem afecto pelo progenitor, mas que se encontra num conflito de lealdade para com a progenitora e que existe uma séria probabilidade de o menor estar a ser instrumentalizado, não conseguindo tomar uma decisão consciente relativa aos convívios com o progenitor, encontrando-se em risco. 29- Ademais, o menor no seu depoimento não consegue justificar o motivo que o levou a cessar, de novo, os convívios com o progenitor, sendo parco nas palavras ou baralhando-se nas justificações que apresenta e que relaciona sempre com situações ocorridas com progenitora, quer sejam do passado, quer seja presentemente, mantendo sempre uma postura de lealdade para com esta, não conseguindo alcançar o sofrimento que a recusa nos convívios pode causar no progenitor e que o corte de laços com este lhe causará danos irreparáveis na sua vida. 30- Fica provado, pelo depoimento prestado pelo menor, que as suas recusas nos convívios com o progenitor se relacionam com a progenitora e também fica bem espelhado pelo depoimento do menor que, a progenitora não procura verdadeiramente sensibilizá-lo para o facto de ser muito importante não fazer cessar os convívios com o progenitor, sendo estes essenciais para o seu desenvolvimento emocional e pessoal. 31- Em virtude do depoimento do menor, verifica-se que existe uma séria probabilidade de este estar a ser instrumentalizado pela progenitora e que vive um conflito de lealdade, estando em risco e foi essa mesma posição que o tribunal a quo durante o depoimento do menor percepcionou e verbalizou, considerar existir conflito de lealdade e este estar em perigo. 32- Não pode deixar de se frisar que ao contrário do que a progenitora tenta dar a transparecer no seu depoimento supra transcrito, e que também refere a douta sentença, a situação vivida entre o progenitor e a irmã do aqui menor não é um incómodo para este e em nada afecta a sua vontade de se relacionar ou não se relacionar com o progenitor. 33- Apesar do vindo de expor o tribunal a quo conseguiu retomar os convívios do menor com o pai, desta feita, ficou acordado que o menor retomaria as consultas de psicologia, que o acompanhamento psicológico visava estabilizar os sintomas de ansiedade que o menor evidencia quando está com o progenitor e que quando estivesse preparado iniciava os convívios com o progenitor no CAFAP nas tardes de terça e sexta feira, com duração de duas horas. 34- Os convívios vindos de referir acabaram por se iniciar e foi reportado nos autos pela Técnica da Segurança Social que os mesmos estavam a evoluir de forma positiva, propondo-se a manutenção da medida aplicada. Sucede, porém, que sem que nada fizesse prever e para surpresa do próprio tribunal o menor e a progenitora vieram-se opor-se a manutenção da medida, sustentando a progenitora a sua posição na posição do menor, de recusar continuar os convívios com o progenitor. 35- Por tal facto, 20 de Setembro de 2024, a progenitora foi de novo ouvida e mais uma vez ficou demonstrado pelo seu depoimento que quando diz incentivar os convívios do menor com o progenitor, não o faz de forma espontânea, pois aponta sempre falhas ao progenitor, dificulta o alargamento de convívios e critica a forma como decorrem. 36- Analisando o depoimento da Técnica do CAFAP, a própria salienta que os convívios decorreram com normalidade e que não existiram razões plausíveis para o menor querer fazer cessar, de novo, os convívios com o progenitor, tendo ainda, referido que nos convívios o menor demonstrava gostar de estar nos mesmos e relatou que o jovem muitas vezes tomava uma decisão na sua presença e do progenitor e no convívio seguinte já queria alterar a decisão. 37- Face ao vindo de expor, dúvidas não podem restar que andou mal a douta sentença ao decidir arquivar os presentes autos, pois resulta provado, quer testemunhalmente, quer documentalmente que o menor está em perigo, porque de forma induzida e instrumentalizada decidiu cortar relações com o progenitor sem motivo razoável para o efeito e, por isso, deverá promover-se a manutenção do presento processo e aplicar-se as competentes medidas de protecção e as respectivas injunções que melhor se adeqúem ao caso em concreto e sirvam para afastar o perigo e removê-lo da vida do menor, só assim ficando respeitado o superior interesse da criança. 38- Ao nível jurisprudencial, citamos ainda (dada a abrangência da síntese aí efectuada, no atinente à definição do critério superior interesse da criança) o acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães n.º 253/10.6TMBRG-A.G1, de 16/06/2016, “[p]or se tratar de um conceito jurídico indeterminado, o princípio só adquire relevância quando referido ao interesse de cada criança ou jovem, em concreto, defendendo-se mesmo que haverá tantos interesses quantos forem os menores. O interesse de uma criança não se confunde com o interesse de outra criança e o interesse de cada um destes é, ele próprio, susceptível de se modificar ao longo do tempo, já que o processo de desenvolvimento é uma sucessão de estádios, com características e necessidades próprias. Para Maria Clara Sottomayor «o conceito de interesse da criança comporta uma pluralidade de sentidos. Não só porque o seu conteúdo se altera de acordo com o espírito da época e com a evolução dos costumes, ou porque é diferente para cada família e para cada criança, mas também porque relativamente ao mesmo caso, é passível de conteúdos diversos igualmente válidos, conforme a valoração que o juiz faça da situação de [facto]». Caberá, pois, ao julgador densificar valorativamente este conceito, de conteúdo imprecisamente traçado, apreendendo o fenómeno familiar na sua infinita variedade e imensa complexidade e, numa análise sistémica e interdisciplinar da situação concreta de cada criança, decidir em oportunidade pelo que considerar mais justo e adequado. No fundo, significa que deve adoptar-se a solução mais ajustada ao caso concreto, de modo a oferecerem-se melhores garantias de desenvolvimento físico e psíquico da criança, do seu bem-estar e segurança e da formação da sua personalidade ou, como se refere no Acórdão do Relação de Coimbra de 16 de Março de 2004» quem, na verdade, define, em cada caso, o sentido dos conceitos intencionalmente deixados vagos na lei é o tribunal, no exercício da função que lhe cabe de a interpretar e aplicar, em face das realidades concretas da vida, nos termos dos artigos 8.º, n.º 3, e 9.º, ambos do Código Civil»”. 39- Ou seja, o superior interesse da criança ou do jovem é aferível sempre concretamente em função das circunstâncias de cada caso, havendo que determinar qual é o motivo pelo qual ele poderá estar a ser prejudicado e, uma vez determinado, ser tomada a decisão mais adequada a removê-lo. 40- Resulta mais do que provado nos presentes autos que o menor se encontra em perigo e que o motivo desse perigo está relacionado com o facto de existir instrumentalização pela progenitora no relacionamento com o progenitor. 41- É sabido que a passagem do tempo é um dos maiores aliados deste projecto da mãe, senão o maior de todos, por permitir o pagamento e o esvaziamento da imagem e da necessidade funcional que a criança sente do pai. Obtenção, pela mãe, através de uma inflexível pressão quotidiana, da adesão e da total lealdade da criança, uma vez que é detentora do poder, da orientação e da vivência quotidiana com ela, denegrindo a imagem do outro, dizendo que este não se interessa por ela, «avivando» factos passados ou avivando alguns que nunca existiram. 42- A, propósito dos artigos 1878.º, 1881 e 1885.º do Código Civil, ambos os progenitores têm o dever legal de velarem pela segurança e saúde dos filhos e proverem ao seu sustento, como resulta do disposto nos artigos 1874.º e 1878.º, n.º 1, do Código Civil (C.C.), cabendo-lhes também, de acordo com o art.º 1885.º do C.C., de acordo com as suas possibilidades, promoverem o desenvolvimento físico, intelectual e moral dos filhos, exercendo em comum as responsabilidades parentais desde que no interesse da criança assim não deva ser, como resulta dos artigos 1901.º e 1906.º do mesmo Código. 43- O reconhecimento do direito da criança a preservar as suas ligações psicológicas profundas «resulta do aprofundamento dos conhecimentos científicos, adquiridos a partir das evidências comprovadas por especialistas da infância, designadamente nas áreas da Medicina, da Psicologia e das Ciências Sociais, os quais asseguram que o respeito por esse direito é indispensável para a saúde mental da criança e para o desenvolvimento harmonioso da sua personalidade». 44- O direito da criança à preservação dos laços afectivos profundos, cuja violação é geradora de perigo, emerge, assim, como um direito fundamental para o seu desenvolvimento integral, que deve prevalecer, em obediência ao princípio do superior interesse da criança. 45- Como temos vindo a ver, independentemente da transversal igualdade dos progenitores quanto às crianças (no atinente aos direitos e deveres para com ela), há que atentar também na vertente psicológica do bem-estar da mesma, tendo presentes os considerandos antes tecidos a propósito do conceito de superior interesse da criança, e os reiterados pareceres técnicos de as crianças estarem em sofrimento psicológico e de não ser, de todo, benéfico o afastamento do pai, tornando-se, dizemos, como que “órfãos de pai vivo”. 46- Da abstracção ou dimensão conceitual do superior interesse da criança importa depois concretizar, objectivar, o conceito, o que implica definir qual é, no caso, o óbice à prossecução do superior interesse da criança e como, em concreto, a solução atingida pelo tribunal se afigura, pelo menos prima facie, adequada a removê-lo, promovendo assim o superior interesse da criança. 47- No caso concreto, o que está a prejudicar a plena realização do superior interesse da criança é a conflitualidade entre os progenitores, a instrumentalização do menor por parte da progenitora que se aproveita do conflito de lealdade que o menor padece para, ainda que de forma disfarçada, afastar o menor do seu progenitor. 48- A postura da mãe pautou-se, como temos vindo a ver, pela total falta de disponibilidade para o cabal desempenho das responsabilidades parentais no tocante a fomentar os convívios com a progenitor e acautelar o superior interesse do filho, isto por referência ao disposto, entre o mais, no art.º 1906.º, n.º 5, in fine, do C.C. 49- Cumpre deixar já uma nota sobre a pronúncia da mãe quanto ao crime de subtracção de menores, sendo uma coincidência ou não, conforme refere a Técnica do CAFAP, que após o conhecimento da referida pronúncia da progenitora, o menor tenha manifestado vontade de cessar os convívios com o progenitor, tendo-se mantido irredutível. 50- A sensação com que ficámos é que o tribunal a quo deixou passar tempo demais, não tendo chegado a constatar que inequivocamente tem de inverter o rumo do processado…, decretando (entre o mais) a manutenção dos autos e aplicando uma medida que melhor se ajuste a afastar o perigo.
Salvo melhor opinião, face ao vindo de expor, imponha-se uma decisão inversa em virtude da prova testemunhal e documental produzida, devendo o tribunal a quo dar como provado que o menor se encontra numa situação de perigo e, em consequência pugna-se pelo não arquivamento dos autos e pela aplicação de uma medida de promoção e protecção, bem como, aplicação das respectivas injunções que se venham a demonstrar mais adequadas ao caso concreto.
Notificado destas alegações de recurso, o menor AA veio apresentar resposta, oferecendo as seguintes Conclusões: I. O Recorrente apresentou recurso à decisão de arquivamento proferida nos presentes autos de promoção e protecção, por não se conformar com a mesma. II. Para o efeito, alega que o menor se encontra numa situação de perigo, devendo o processo manter-se com a aplicação de uma medida protectiva e respectivas injunções. III. Defende que mudou o seu comportamento, e que o facto de o menor não concordar com um regime de visitas supervisionadas deve-se ao facto da progenitora instrumentalizar o menor, aproveitando-se do conflito de lealdade do filho para com ela.
Sucede que, IV. Durante anos o menor viveu num clima de “guerra” entre os progenitores e o progenitor e a irmã, com constantes trocas de acusações e diversos processos judiciais. V. Durante anos, o menor ouviu o progenitor dizer “mal” da mãe, e conforme resultados diversos apensos, num ambiente de rigidez e austeridade.
Mais recentemente, VI. O menor quando se aproxima a hora de estar com o pai, começa a sentir-se ansioso, despoletando, por vezes, tal condição crises de ansiedade e ataques de pânico. VII. As referidas perturbações, ao contrário do que uma primeira análise possa parecer, justificam plenamente o facto do menor dizer que não se sente bem na companhia do pai e não conseguir explicar o motivo de tal situação. VIII. Conforme é consabido, numa grande maioria dos casos a pessoa que sofre de crises de ansiedade ou ataques de pânico, não consegue explicar o porquê (mesmo admitindo abstractamente que não existe motivo para tal), nem controlar as referidas patologias. IX. Termos em que, a imposição de convívios ao menor apenas agravaria o estado de saúde do menor, o qual deve ser tratado a fim de um dia, eventualmente, conseguir conviver com o pai e estabelecer com o mesmo uma relação de paterno filial, ultrapassando o passado. X. O que, infelizmente, o Tribunal jamais o poderá fazer. XI. Amor, Perdão, Afectos, Laços familiares, encontram-se na esfera das emoções, no nosso ser mais profundo - e nesse âmbito, os Tribunais não têm qualquer poder de actuação e intervenção. Têm de ceder! XII. Não se vislumbra como poderia tal medida ser exequível.
Finalmente, o MP também apresentou contra-alegações:
No recurso que interpôs, o recorrente insurge-se contra a Douta Decisão proferida a 22.11.2024, no apenso N dos autos à margem referenciados, de Promoção e Protecção, que considerou não existir fundamento para, nestes autos, impor ao menor o regime de visitas supervisionadas ou qualquer outro no âmbito da prorrogação da medida anteriormente aplicada e, nessa sequência, determinou o arquivamento dos autos.
O recorrente pugna pela revogação da Douta Decisão em apreço e manutenção dos autos com aplicação de medida de promoção e protecção e respectivas injunções adequadas ao caso concreto.
Salvo o devido respeito por opinião contrária afigura-se não merecer censura a Douta Decisão recorrida.
Vejamos:
Antes do mais, importa referir que conforme se alcança na acta de 20.11.2024, na conferência retomada nesse dia e que estava suspensa desde 04/10/2024, o jovem AA, nascido a ../../2008, com 16 anos de idade, manteve a sua postura irredutível de não prosseguir os convívios com o progenitor.
Nessa mesma conferência a Técnica da Segurança Social, Dra. HH declarou em suma que se não houver nenhum contacto entre os pais, o jovem não corre perigo, pois este resulta da conflitualidade entre aqueles; este processo já tem vários anos, já foram feitas tantas intervenções com vista à aproximação entre pai e filho e nada resultou; voltar ao inicio deste processo não faz sentido; o jovem já não aguenta ver tanto processo judicial do pai contra a mãe e desta contra o pai, o que também dificulta a relação; a Segurança Social não se importa de fazer mais intervenções, porém se não tem o aval dos intervenientes, nada pode fazer; toda a intervenção, a nível psicológico e social que tem sido possível fazer, foi feita, porém não tem havido feedback do outro lado.
Nessa sequência, uma vez que a medida aplicada de apoio junto da mãe e convívios entre o pai e o filho no CAFAP se mostraram ineficazes para aproximação entre pai e filho, atenta a relutância do jovem em manter esses convívios e que a conflitualidade entre os progenitores é que potenciam o perigo do jovem e se não existir contacto entre ambos esse perigo não se verifica, - o Ministério Publico proferiu em suma a seguinte promoção: “Tendo em conta que esta conferência ficou suspensa até hoje para que o jovem pudesse pensar melhor, interiorizar a ideia de retomar os convívios com o pai no CAFAP porém o mesmo foi peremptório em dizer que não quer.
Por outro lado aos 16 anos não se pode impor a um jovem a companhia do pai, que não quer.
Por sua vez a Ex.ma Técnica da Segurança Social disse que a situação de perigo para o jovem resulta da conflitualidade entre os progenitores, sendo que esta situação não pode ser trabalhada, uma vez que não existe qualquer medida para acautelar esta situação.
Face ao exposto e atentas as injunções, que iam no sentido de aproximar pai e filho, mas cuja efectivação não foi possível continuar, por o jovem assim não pretender, deverão os autos ser arquivados.”
As Ilustres Patronas do jovem, da Progenitora e do Progenitor ora recorrente alegaram no sentido de nada terem a opor ao promovido, ou seja, ao arquivamento dos autos.
Ou seja, todos os intervenientes concluíram, tal como o Ministério Público e, nessa sequência, pronunciaram-se pelo arquivamento dos autos.
Aliás, o recorrente pugna pela manutenção dos autos e aplicação de medida de promoção e protecção sem nunca referir qual a medida que entende mais adequada e deveria ser aplicada.
Importa também realçar como referido pela Exmª Técnica da Segurança Social que se não houver nenhum contacto entre os pais, o jovem não corre perigo, pois este resulta da conflitualidade entre aqueles e que, apesar das várias intervenções com vista à aproximação entre filho e pai efectuadas ao longo de vários anos, nada resultou e não tendo o aval dos mesmos nada pode fazer e que toda a intervenção possível foi efectuada quer a nível psicológico e social.
O interesse superior da criança e do jovem menores de idade passa por respeitá-los, enquanto cidadãos, com dignidades próprias, e por lhe ser assegurado um desenvolvimento são e normal no plano físico, intelectual, moral, espiritual e social, em
condições de liberdade e dignidade.
Como bem se refere na Douta Decisão em apreço não pode o Tribunal impor a um jovem de 16 anos o convívio com o pai como medida de promoção e protecção ainda que de apoio junto da mãe, ressaltando abundantemente dos autos que tal medida aplicada nos autos não teve o efeito desejado, atenta a resistência do jovem em conviver com o pai, acrescendo que este jovem não está em perigo, se não houver contacto entre os pais e é a conflitualidade entre os pais que potenciará esse perigo, conflitualidade que apesar das diligências efectuadas pela segurança social não possível pôr termo, atenta a ausência de receptividade dos progenitores para inverter essa conflitualidade.
Como bem refere a Mmª Juíza na Decisão em apreço, após a descrição pormenorizada das diligências e medidas de promoção aplicadas ao longo dos anos e da Jurisprudência ali mencionados ...no caso dos autos, em face da recusa do menor em contactar e estar com o pai, não pode o tribunal impor o regime de visitas supervisionadas, ou outro qualquer.
Em suma, após ter esgotado todas as possibilidades no sentido da reaproximação gradual do pai e do filho, o tribunal está ciente que fez o que estava ao seu alcance, restando-lhe aderir à proposta de todos os intervenientes, incluindo da defensora do progenitor, no sentido de que outra solução não resta senão determinar o arquivamento dos autos, aguardando que o tempo, a maturidade e a inevitável transformação que as adversidades promove, façam o seu trabalho, sem prejuízo do problema continuar a ser abordado, aprofundado e trabalhado, naturalmente à margem dos autos, a nível de acompanhamento psicológico, ao menor e até mesmo ao progenitor, sendo desejável que todos percebam que existirão modos de ultrapassar os ressentimentos e as desilusões...”.
Sempre se dirá ainda que se encontram pendentes os Apensos de alteração da regulação das responsabilidades parentais, os quais se mantinham suspensos, atento o acordo alcançado neste Apenso N e que agora seguirão os normais termos.
Em face do exposto, a Douta Decisão em apreço tem plena sustentabilidade na prova testemunhal e documental carreada para os autos.
Em face do exposto, salvo o devido respeito por opinião contrária, não merecerá censura a decisão recorrida.
II
As conclusões das alegações de recurso, conforme o disposto nos artigos 635º,3 e 639º,1,3 do Código de Processo Civil, delimitam os poderes de cognição deste Tribunal, sem esquecer as questões que sejam de conhecimento oficioso. Assim, e, considerando as referidas conclusões, a única questão a decidir consiste em saber se foi correcta a decisão de arquivar os autos.
III A decisão recorrida, para fundamentar o arquivamento dos autos, apresenta à seguinte fundamentação: “Relativamente ao conteúdo das responsabilidades parentais, prescreve o artº. 1877º do Cód. Civil que “os filhos estão sujeitos ao poder paternal até à maioridade ou emancipação”, competindo aos pais, “no interesse dos filhos, velar pela segurança e saúde destes, prover ao seu sustento, dirigir a sua educação, representá-los, ainda que nascituros, e administrar os seus bens” – cf., o nº. 1 do artº. 1878º. E, no que respeita aos deveres dos pais e filhos por efeitos da filiação, aduz o artº. 1874º, igualmente do Cód. Civil, que: “1.- pais e filhos devem-se mutuamente respeito, auxílio e assistência. 2.- O dever de assistência compreende a obrigação de prestar alimentos e a de contribuir, durante a vida em comum, de acordo com os recursos próprios, para os encargos da vida familiar”. O direito de visita/convívio, ora em equação, significa o direito de o progenitor sem a guarda dos filhos ou com quem não reside se relacionar e conviver com estes. O exercício deste direito funciona como um meio de este manifestar a sua afectividade pelos filhos, de ambos se conhecerem reciprocamente e partilharem os seus sentimentos, as suas emoções, ideias, medos e valores. Trata-se de um direito natural decorrente da relação biológica, por isso designado como direito de conteúdo altruístico ou poder funcional, por não servir exclusivamente o interesse do titular do poder, mas o interesse do outro, devendo ser exercido tendo em vista a realização do fim que está na base da sua concessão. Daqui decorre que deva ser atribuído àquele que, mesmo durante a constância da relação com o outro progenitor, não tenha desempenhado papel relevante na assistência à criança, pois pode a todo o momento querer aprofundar essa relação, ou até iniciá-la. Resulta também que a qualidade da relação pré-ruptura não possa, em princípio, influenciar a qualidade da relação de visita e que este direito de visita só possa ser limitado (ou excluído) se o relacionamento constituir perigo para o interesse da criança, uma vez que é exercido não no interesse exclusivo do progenitor mas, sobretudo, no interesse daquela. De qualquer modo, a restrição ao direito de visita, a ter lugar, tem que ser proporcional à salvaguarda do interesse da criança, ou seja, a exclusão daquele direito só pode ser tomada em ultima ratio. Desta forma, e como resulta do prescrito no nº 7 do citado art. 1906º, “sobrevaloriza-se o interesse da criança em detrimento do interesse do próprio progenitor visitante em se realizar na sua parentalidade”, pelo que o regime de visitas deve ser fixado, a não ser que excepcionalmente o interesse da criança o desaconselhe. No fundo, “tal direito é uma concretização da norma do artigo 36º, nº. 6, da nossa Constituição, segundo a qual os filhos não podem ser separados dos pais (podendo estes tê-lo junto de si, quer em termos de guarda, quer em termos de exercício de um amplo e regenerador direito de convívio), salvo quando estes não cumpram os seus deveres fundamentais para com eles e sempre mediante decisão judicial”. Urge, por outro lado, prevenir os danos causados com a limitação das visitas, designadamente o sofrimento, a angústia, a ansiedade, a depressão e o desequilíbrio emocional sentidos pela criança, por não ver um dos pais e, reflexamente, pelo outro progenitor por estar impedido de a visitar e de comunicar com ela. Para os prevenir, e caso nada obste, os convívios com os progenitores devem ser tão amplos quanto possível e hão-de, ainda, na medida do possível, alargar-se aos demais membros da família, de tal forma que a criança nunca venha a sentir que, em virtude da separação dos pais, perdeu uma estrutura familiar. É importante mostrar, agindo em conformidade, que os laços parentais se mantêm indissociáveis, pelo menos no que à criança diz respeito. Efectivamente, a decisão que fixa a residência da criança junto de um dos progenitores, não determina que o menor fique “pertença do progenitor residente, e este não fica seu dono: continua a ter dois progenitores”. Pelo que, “salvo circunstâncias excepcionais que o impeçam, a regulação do exercício do poder paternal deve assegurar, com a maior certeza e estabilidade possíveis, amplos contactos do menor com o progenitor não guardião, de sorte a que também ele possa continuar a exercer cabal e proficuamente, os seus poderes/deveres relativamente ao filho”. Deste modo, “sendo três os elementos que podem influenciar o julgador na determinação do conteúdo do direito de visita (as prerrogativas do guardião, o interesse do titular do direito da visita e o interesse da criança na manutenção daquela relação), entendemos que se devem, na prática, conciliar estes três pólos, dando primazia ao terceiro, em caso de grave incompatibilidade entre estes interesses”.
O artº 40º do RGPTC, determina que: “1- Na sentença, o exercício das responsabilidades parentais é regulado de harmonia com os interesses da criança, devendo determinar-se que seja confiada a ambos ou a um dos progenitores, a outro familiar, a terceira pessoa ou a instituição de acolhimento, aí se fixando a residência daquela. 2- É estabelecido regime de visitas que regule a partilha de tempo com a criança, podendo o tribunal, no interesse desta e sempre que se justifique, determinar que tais contactos sejam supervisionados pela equipa multidisciplinar de assessoria técnica, nos termos que forem ordenados pelo tribunal. 3- Excepcionalmente, ponderando o superior interesse da criança e considerando o interesse na manutenção do vínculo afectivo com o visitante, pode o tribunal, pelo período de tempo que se revele estritamente necessário, ordenar a suspensão do regime de visitas. (…)”. A norma do nº 2, relativa ao regime de visitas e contactos com o progenitor não residente, insere-se na linha do que é determinado nos Princípios Fundamentais estabelecidos na Constituição da República Portuguesa que, no seu artº 30º nºs 5 e 6, estabelece que os pais têm o direito e o dever de educar e manter os filhos, não podendo estes deles ser separados, excepto quando os pais não cumprirem os seus deveres fundamentais para com eles e sempre mediante decisão judicial. Iguais princípios decorrem de outros diplomas internacionais como, por exemplo, o art. 23º da Carta de Direitos Fundamentais da União Europeia e do artº 9º nº 1 da Convenção Sobre os Direitos da Criança. Do mesmo modo, o artº 1906º nº 7 do CC determina, relativamente ao exercício das responsabilidades parentais, determina: “O tribunal decidirá de harmonia com o interesse do menor, incluindo o de manter uma relação de grande proximidade com os dois progenitores, promovendo e aceitando acordos ou tomando decisões que favoreçam amplas oportunidades de contacto com ambos e de partilha de responsabilidades entre eles”. Portanto, é incontroverso que todas as crianças têm o direito de manter regularmente relações pessoais e contactos directos com ambos os progenitores, excepto se isso for contrário aos seus interesses. Para manter uma relação de grande proximidade, assegurando o superior interesse da criança, impõe-se que ocorram contactos regulares e frequentes do progenitor com o filho, facultando que possa partilhar o seu espaço, passando com eles fins-de-semana, datas festivas, aniversários, períodos de férias (Cf. Jorge Duarte Pinheiro, O Direito da Família Contemporâneo, 4ª edição, pág. 313). Quando a norma se refere à relação de grande proximidade da criança com ambos os pais, está a fornecer ao juiz uma indicação que funciona como factor, entre outros, para determinar o interesse da criança. (Clara Sottomayor, Regulação do Exercício das Responsabilidades Parentais nos Casos de Divórcio, 7ª edição, 2021, pág. 95). E prosseguindo com a Lição desta Ilustre autora: “O direito de visitas consiste no direito de pessoas unidas entre si, por laços familiares ou afectivos estabeleceram relações pessoais. Num contexto de divórcio, o direito de visitas significa a possibilidade de o progenitor sem guarda e a criança se relacionarem e conviverem entre si, uma vez que tais relações não podem desenvolver-se, no dia a dia, em virtude da falta de coabitação. O direito de visitas tem uma forte componente humana e subjazem-lhe realidades afectivas que o direito não pode ignorar.” (Clara Sottomayor, Regulação do Exercício…cit., pág. 128). “O objecto do direito de visitas abrange, assim, um conjunto de relações, desde contactos esporádicos por algumas horas, os quais consistem na expressão mínima do referido direito a estadias por várias semanas e ainda qualquer forma de comunicação (correspondência por escrito, telefone, electrónica, etc.).” “O exercício do direito de visitas por parte do progenitor não guardião funciona como um meio de este manifestar a sua afectividade pela criança, de ambos se conhecerem reciprocamente e partilharem os seus sentimentos de amizade, as suas emoções, ideias, esperanças e valores mais íntimos. Alguns autores referem-se, sugestivamente à visita como um “ato de puro amor puramente gratuito” que constitui “a essência dos direitos parentais para o progenitor não guardião”. Se é importante que na ordem familiar e humana que a criança não veja a sua vida amputada de carinho, contacto, relação e comunicação, o mesmo acontece no plano jurídico. O direito não pode ficar indiferente a esta profunda realidade humana, simultaneamente biológica e psíquica”. (A e ob. cit., pág. 128 e seg.). “O aspecto mais importante desta figura e o seu fundamento reside na relação afectiva que une a criança ao progenitor, a qual merece tutela jurídica por consistir numa manifestação da personalidade da criança e do seu direito ao livre desenvolvimento.” (A e ob. cit., pág. 130). Portanto, o direito de visitas é pensado de modo a salvaguarda do superior interesse da criança, o seu desenvolvimento integral e harmonioso, psíquico e emocional, visando o estabelecimento de laços afectivos e emocionais com o progenitor não guardião e deve ser desenhado de acordo com as concretas circunstâncias do caso, nomeadamente da existência, ou não, de anteriores contactos e convivência, a idade da criança e até o posicionamento dos pais em relação aos filhos e contactos com o outro progenitor. Só excepcionalmente esse direito de visitas pode ser afastado ponderando o superior interesse da criança e considerando o interesse na manutenção do vínculo afectivo com o visitante (artº 40º nº 3 do RGPTC), designadamente quando as circunstâncias concretas do caso o desaconselhem, por existir algum tipo de risco efectivo, psicológico, emocional ou físico para a criança. Fez-se questão de tecer estas considerações acerca do Direito de Visitas ao progenitor não guardião, com intuito de todos os intervenientes no processo perceberem da relevância do Direito de Visitas. Porém, como se referiu acima, o Direito de Visitas ao progenitor não guardião, não pode estar dissociado do superior interesse do filho e do seu bem-estar psíquico e emocional. O mesmo é dizer que quando o direito de visitas entra em conflito com o interesse da criança é o interesse da criança que deve prevalecer. Perante a recusa do menor, que vai completar em Dezembro 16 anos, em estar e visitar o pai, mesmo em ambiente de visitas supervisionadas - ainda que se conceda que tal recusa com muita probabilidade foi induzida pela progenitora, facto é que o progenitor também teve a sua quota não despicienda de responsabilidade - os tribunais têm de aceitar que a criança, como qualquer adulto, tem direito a escolher as pessoas com quem querem ou não conviver, ainda que venham a pagar as facturas das suas escolhas, dos partidos que tomam e das rejeições que protagonizam, pois que hoje é filho, amanha será pai e corre o risco do padrão se repetir. Aliás, dos autos avulta que o progenitor abandonou a outra filha, porque não lhe terá perdoado uma escolha e agora colhe este triste e lamentável abandono de outro filho. Seja como for, meios coercitivos negam à criança o estatuto de pessoa e a liberdade mais profunda do ser humano: a liberdade de amar ou de não amar. Não cabe ao tribunal impor sentimentos e afectos, e perfeição moral aos cidadãos.” (Clara Sottomayor, Regulação do Exercício…cit., pág. 247). De resto, a jurisprudência tem decidido no mesmo sentido, como decorre, entre outros, dos seguintes arestos: -TRP, de 06/02/2023 (Teresa Fonseca, Proc. 524/16): “II - Os tribunais não dispõem de meios - nem tal sequer seria desejável - para obrigar uma adolescente de 16 anos a manter contactos com o pai através de meios de comunicação à distância, sendo que forçar encontros e saídas seria despropositado e mesmo contraproducente, por contrário à verdade afectiva de pai e filha, em nada contribuindo para o bem-estar da adolescente.” -TRC, de 22/10/2019 (Vítor Amaral, Proc. 1014/08): “2. - Havendo recusa de menor em se sujeitar às visitas ao seu progenitor, haverão de ser apuradas as razões desse comportamento de rejeição da figura paterna, para o que é adequada prova técnica/psicológica que capte os aspectos psicológicos/emocionais da menor, bem como a sua dinâmica familiar e eventuais constrangimentos aí existentes. 3. - Apurado que a recusa da menor assenta numa visão da figura paterna como violenta, em consequência de diversas agressões à mãe da menor, presenciadas por esta, o que a levou a perder a confiança no pai e a ter medo dele, percepção que o acompanhamento especializado da menor não logrou alterar, não é exigível à mãe que obrigue a filha ao contacto que ela peremptoriamente rejeita, não podendo a menor ser violentada na sua vontade, a tal se opondo o critério do superior interesse da criança ou do jovem. 4. - Nesse caso não encontra fundamento a conclusão de direito no sentido de o incumprimento do regime de visitas ser imputável à mãe, não se mostrando que esta tenha meios para poder persuadir a menor e vencer a sua resistência, pois que esta última, atenta a sua idade, tem a sua personalidade e vontade própria.” -TRG, de 08/10/2015 (Isabel Silva, Proc. 508/05): “a) Provando-se que é a menor, à data com 15 anos, quem recusa cumprir o regime de visitas estipulado para o pai, tal “incumprimento” não pode ser imputado à mãe.” Portanto, no caso dos autos, em face da recusa do menor em contactar e estar com o pai, não pode o tribunal impor o regime de visitas supervisionadas, ou outro qualquer. Em suma, ainda que se conceda que ambos os progenitores terão uma quota não despicienda de responsabilidade na alegada recusa do filho em estar com o pai, desde os 11 anos de idade, quando os primeiros indicadores começaram a surgir, não faltaram alertas dados aos progenitores para estancarem o conflito parental, preservarem o menor desse conflito, estreitarem a comunicação entre ambos. Os progenitores optaram por, em nome do putativo interesse do filho, permanecerem na sua “luta de egos”, deixando cronificar este processo irreversível de suposta rejeição, que se transformou num problema sem solução, restando a cada um dos intervenientes aguardar a colheita da triste semeadura que protagonizaram. Em suma, após ter esgotado todas as possibilidades no sentido da reaproximação gradual do pai e do filho, o tribunal está ciente que fez o que estava ao seu alcance, restando-lhe aderir à proposta de todos os intervenientes, incluindo da defensora do progenitor, no sentido de que outra solução não resta senão determinar o arquivamento dos autos, aguardando que o tempo, a maturidade e a inevitável transformação que as adversidades promove, façam o seu trabalho, sem prejuízo do problema continuar a ser abordado, aprofundado e trabalhado, naturalmente à margem dos autos, a nível de acompanhamento psicológico, ao menor e até mesmo ao progenitor, sendo desejável que todos percebam que existirão modos de ultrapassar os ressentimentos e as desilusões, mas que, talvez fosse salutar que cada qual apreendesse a enxergar as suas imperfeiçoes e sombras ao invés de as projectar no outro e que só o exercício do perdão - que obviamente não significa absolver quem supostamente nos faz mal, antes a libertação de sentimentos tóxicos como mágoa, raiva e ódio - é capaz de devolver aos envolvidos a paz familiar de que tanto carecem. Do que se expõe decorre que não há fundamento para, nestes autos, impor ao menor o regime de visitas supervisionadas ou qualquer outro, impondo-se o necessário arquivamento dos autos”.
IV Conhecendo do recurso.
Em primeiro lugar, convém ter presente que estamos perante uma forma processual (processo de promoção e protecção) que tem a natureza de jurisdição voluntária (art. 100º LPCJP). Isto significa, nos termos do art. 986º,2 CPC, que o tribunal pode investigar livremente os factos, coligir as provas, ordenar os inquéritos e recolher as informações convenientes; só são admitidas as provas que o juiz considere necessárias. Significa ainda que “nas providências a tomar, o tribunal não está sujeito a critérios de legalidade estrita, devendo antes adoptar em cada caso a solução que julgue mais conveniente e oportuna” (art. 987º CPC). Igualmente importante é o regime do art. 988º,1 CPC segundo o qual nos processos de jurisdição voluntária as resoluções podem ser alteradas, sem prejuízo dos efeitos já produzidos, com fundamento em circunstâncias supervenientes que justifiquem a alteração; dizem-se supervenientes tanto as circunstâncias ocorridas posteriormente à decisão como as anteriores, que não tenham sido alegadas por ignorância ou outro motivo ponderoso.
O princípio básico nesta matéria é óbvio: a escolha da medida de promoção dos direitos e protecção das crianças em perigo deve ser norteada, prioritariamente, pelos direitos e interesses da criança ou jovem, devendo ser aplicada a medida que, atendendo a esses interesses e direitos, se mostre mais adequada a remover a situação de perigo em que a criança ou jovem se encontra.
Por outro lado, segundo o art. 36.º da CRP, os pais têm o direito e o dever de educação e manutenção dos filhos e estes não podem ser separados daqueles salvo quando não cumpram os seus deveres fundamentais para com os filhos e sempre mediante decisão judicial.
Por outro lado, a intervenção para a promoção dos direitos e protecção da criança ou jovem em perigo deve ser proporcional e actual, no sentido de que deverá ser a necessária e a adequada à situação de perigo em que a criança ou o jovem se encontra no momento em que a decisão é tomada e só pode interferir na sua vida e na da sua família na medida do que for estritamente necessário a essa finalidade [cfr. artigo 4º, al. e), da LPCJP].
Aqui chegados, é tão óbvio para nós que o Tribunal recorrido tomou a decisão correcta, que pouco mais há a dizer.
Vamos só, para mostrar como aquela decisão era a única admissível, listar aqui todos os processos em que estes progenitores estiveram envolvidos no Juízo de Família e Menores de Guimarães.
Indo ao Citius, obtemos o seguinte quadro:
P. 233/13.... (divórcio sem consentimento do outro cônjuge)
P. 233/13.... (procedimento cautelar)
P. 233/13.... (regulação das responsabilidades parentais)
P. 233/13.... (acção de honorários)
P. 233/13.... (Incumprimento das responsabilidades parentais)
P. 233/13.... (Incumprimento das responsabilidades parentais)
P. 233/13.... (alteração da regulação das responsabilidades parentais)
P. 233/13.... (incumprimento das responsabilidades parentais)
P. 233/13.... (processo de promoção e protecção)
P. 233/13.... (processo de promoção e protecção)
P. 233/13.... (incumprimento das responsabilidades parentais)
P. 233/13.... (incidente por apenso)
P. 233/13.... (incidente por apenso)
P. 233/13.... (acção de alimentos a filhos maiores ou emancipados)
P. 233/13.... (processo de promoção e protecção)
P. 233/13.... (alteração da regulação das responsabilidades parentais)
P. 233/13.... (inventário)
P. 233/13.... (incumprimento das responsabilidades parentais)
P. 233/13.... (entrega judicial de criança)
P. 233/13.... (alteração da regulação das responsabilidades parentais)
P. 233/13.... (recurso de apelação em separado)
P. 233/13.... (processo tutelar – falta de acordo)
P. 233/13.... (alteração da regulação das responsabilidades parentais)
P. 233/13.... (Reclamação – art. 643º CPC)
P. 233/13.... (Suspeição - escusa)
P. 233/13.... (acção de alimentos a menores)
P. 233/13.... (recurso de apelação em separado)
Quando o grau de litigiosidade entre os progenitores atinge os extremos que a listagem supra demonstra, o resultado nunca é positivo. Os presentes autos são disso um lamentável mas cristalino exemplo.
Não iremos perder tempo a explicar os princípios fundamentais de direito da família que estão aqui em jogo. Para isso, remetemos para a decisão recorrida.
Vamos apenas sublinhar os aspectos mais marcantes deste caso, que explicam o fracasso da intervenção judicial neste caso concreto.
Em caso de separação dos progenitores, o convívio do menor com os pais deve ser tão amplo quanto possível e, na medida do possível, alargar-se aos demais membros da família, de tal forma que a criança nunca venha a sentir que, em virtude da separação dos pais, perdeu uma estrutura familiar. É importante mostrar, agindo em conformidade, que os laços parentais se mantêm indissociáveis, pelo menos no que à criança diz respeito. No caso destes autos, o exacto oposto sucedeu.
A sentença cita, e nós reproduzimos aqui: “seja como for, meios coercitivos negam à criança o estatuto de pessoa e a liberdade mais profunda do ser humano: a liberdade de amar ou de não amar. Não cabe ao tribunal impor sentimentos e afectos, e perfeição moral aos cidadãos.” (Clara Sottomayor, Regulação do Exercício…cit., pág. 247).
O jovem AA nasceu a ../../2008, o que significa que tem actualmente 16 anos. Como qualquer outro jovem, tinha o direito de esperar que os seus pais lá resolvessem as divergências entre eles de uma forma que o resguardasse, e que apesar da separação, o fizesse sentir-se amado pelos dois. Em vez disso, os autos demonstram que depois de tudo o que ele teve de passar devido à litigiosidade imparável dos progenitores, com algum destaque para o ora recorrente, as inúmeras cenas domésticas a que certamente assistiu, a instrumentalização permanente pelos progenitores que os autos demonstram, a sujeição a pressão psicológica e a um quadro de alienação parental em escalada, a sujeição à inquirição e intervenção permanente de assistentes sociais, psicólogos, magistrados e advogados, entregas judiciais com a presença da força policial (PSP e GNR), não admira que tenha chegado a um ponto de exaustão em que se recusou a contactar e estar com o pai.
Não interessa agora de quem é a “culpa”, pois é evidente de tudo o que consta dos autos que ambos os progenitores terão uma quota não despicienda de responsabilidade na recusa do filho em estar com o pai, desde os 11 anos de idade.
E, não obstante, não deixa de ser curioso notar que dos relatórios periciais realizados aos progenitores nada há que levante dúvidas sobre as capacidades de cada um para exercer a parentalidade.
No relatório pericial realizado à progenitora datado de 27/08/2020 pode ler-se que a progenitora “se revelou globalmente ajustada, não manifestando sintomatologia psicopatológica ou perturbação da personalidade clinicamente significativa. Concluímos, deste modo, que a progenitora reúne condições psicoemocionais favoráveis à condução da educação do seu filho AA (…)”.
E, no caso do progenitor: “A avaliação psicológica realizada, não identificou sinais de perturbação emocional clinicamente significativa, no momento actual. Do mesmo modo, não surgiram indicadores de perturbação da personalidade. CC apresenta características de funcionamento psicológico seguro e estável, orientado para a tarefa e focado em objectivos concretos, consciencioso e persistente. Os momentos de nervosismo poderão ocorrer apenas em situações mais exigentes, como o actual processo judicial. Tenderá a ser sociável, activo e falador. Quanto à paternidade, foi possível constatar que CC está motivado, interessado face ao acompanhamento do filho. Manifesta preocupação pelo seu bem-estar e segurança. Mostrou conhecer as práticas educativas mais ajustadas à educação, valorizando o cumprimento de regras e limites como orientadores do crescimento saudável do menor. Foi identificado um sentimento crescente de afastamento afectivo relativamente ao filho, que CC sente como muito negativo e difícil de ultrapassar e que relaciona com a influência que a figura materna terá sobre o filho. Concluímos que o progenitor reúne condições favoráveis à educação do filho e está motivado para exercer o seu papel parental”.
Porém, já no relatório relativo à progenitora, se escrevia: “não obstante, a esta avaliação foi igualmente perceptível que a relação entre o ex-casal continua a pautar-se por uma escalada em termos de hostilidade, conflito e judicialização, culminando num comprometimento das relações paterno-filiais, perceptível pela alegada postura de recusa e rejeição de AA à figura paterna (…) A persistência no tempo destas dinâmicas poderá vir a comprometer o equilíbrio emocional do AA e impedir a resolução em absoluto do aludido litígio parental (…)”.
E, paralelamente, no relatório sobre o progenitor: “esta perspectiva é fortemente influenciada pelo litígio face à figura materna, sobre a qual transmite uma percepção de incapacidade parental, permissividade e negligência. Apesar de manifestar o desejo de retomar o contacto com o menor, reconhece o afastamento actual na relação entre ambos como difícil e problemático. A conflitualidade relatada com a progenitora, é considerada como factor de interferência clara na relação paterno-filial. Contudo, é necessário cessar o litígio relativamente à figura materna, por se considerar que tem vindo a influenciar claramente a relação do menor com o pai. A longa judicialização do problema, a dificuldade de ambos os pais negociarem e encontrarem estratégias de articulação relativamente à educação do menor e a exposição do menor aos conflitos parece ser o principal factor que estará a impedir a resolução do afastamento do menor face ao pai. É essencial que ambos os progenitores sejam capazes de reconhecer no outro competências e capacidades e sejam capazes de transmitir ao filho uma imagem positiva de cada um dos pais, para que este se consiga posicionar face a ambos de forma livre e descomprometida”.
Recordemos que do último relatório social de acompanhamento de execução da medida datado de 28/06/2024, constam as seguintes conclusões: “Do passível de avaliação, conclui esta equipa técnica, reiterado pela equipa técnica do CAFAP que os convívios supervisionados, apesar de alguns percalços e interrupções pontuais, têm evoluído de forma positiva. Atendendo à necessidade de se manter a intervenção junto de todos os intervenientes, com o objectivo de se reforçar uma colaboração cooperante, neste processo que se pretende gradual e evolutivo, sugerimos a manutenção da medida actualmente em vigor, pelo período de 6 meses, com as seguintes injunções: -o jovem compromete-se a comparecer nas consultas de psicologia, com assiduidade e pontualidade, na ...; -o jovem compromete-se a comparecer nas sessões de convívios supervisionados, com assiduidade e pontualidade, no CAFAP - ...; -o progenitor compromete-se a manter a colaboração e a comparência assídua e pontual nas sessões de convívios supervisionados, no CAFAP - ...; -o progenitor compromete-se a abster-se, no decurso dos convívios (supervisionados e externos), de toda e qualquer referência à progenitora ou aos processos judiciais; -o progenitor compromete-se ainda a comparecer, sempre que notificado, em sessões individuais no CAFAP, na ... ou na Segurança Social; -a progenitora compromete-se a comparecer, sempre que notificada, em sessões no CAFAP, na ... ou na Segurança Social; -a progenitora compromete-se a abster-se de questionar o jovem sobre a forma como decorreram os convívios com o progenitor, tecer qualquer comentário acerca do progenitor ou interferir nos convívios agendados pelo jovem”.
Porém, exercido o contraditório sobre a proposta de manutenção da medida, o jovem e a progenitora vieram opor-se à manutenção da medida.
Tudo visto e ponderado, estamos perante uma situação claramente lamentável, em que apesar de o progenitor reunir condições favoráveis à educação do filho e estar motivado para exercer o seu papel parental, o conflito entre os progenitores e os extremos de litigiosidade a que chegaram, dizendo da maneira mais simples possível, estragou tudo.
E tudo aquilo que o menor teve de passar, o sofrimento que lhe foi imposto durante os anos em que durou este conflito, em que parece que os progenitores se esqueceram que o seu filho não era uma arma de arremesso, desembocou nesta atitude, actual, em que o jovem, com 16 anos de idade, não quer contactos com o progenitor. Podemos pois concluir que é totalmente correcta a afirmação constante da sentença recorrida de que “após ter esgotado todas as possibilidades no sentido da reaproximação gradual do pai e do filho, o tribunal está ciente que fez o que estava ao seu alcance, restando-lhe aderir à proposta de todos os intervenientes, incluindo da defensora do progenitor, no sentido de que outra solução não resta senão determinar o arquivamento dos autos, aguardando que o tempo, a maturidade e a inevitável transformação que as adversidades promove, façam o seu trabalho, sem prejuízo do problema continuar a ser abordado, aprofundado e trabalhado, naturalmente à margem dos autos, a nível de acompanhamento psicológico, ao menor e até mesmo ao progenitor, sendo desejável que todos percebam que existirão modos de ultrapassar os ressentimentos e as desilusões, mas que, talvez fosse salutar que cada qual apreendesse a enxergar as suas imperfeiçoes e sombras ao invés de as projectar no outro e que só o exercício do perdão - que obviamente não significa absolver quem supostamente nos faz mal, antes a libertação de sentimentos tóxicos como mágoa, raiva e ódio - é capaz de devolver aos envolvidos a paz familiar de que tanto carecem”.
E repare-se que neste recurso o recorrente não diz qual é a medida que pretende que seja adoptada, limitando-se a repetir que o menor pode estar a ser instrumentalizado pela progenitora quanto à sua recusa em manter uma relação filial com o progenitor, e que o menor se encontra em perigo, decorrente da ausência da figura paternal na sua vida. Termina as suas alegações dizendo que “pugna-se pelo não arquivamento dos autos e pela aplicação de uma medida de promoção e protecção, bem como, aplicação das respectivas injunções que se venham a demonstrar mais adequadas ao caso concreto”.
E onde demonstra que ainda não percebeu de todo porque as coisas correram tão mal na relação com o seu filho é quando fala nas “injunções que se venham a mostrar adequadas ao caso”. Depois de tudo o que se passou, o recorrente ainda pensa que pela força, neste caso a força pública, será possível obrigar o seu filho a aproximar-se de si.
Claro que esta Relação concorda em absoluto com todas as afirmações do recorrente que destacam a necessidade de um convívio com os dois progenitores, e chamam a atenção para os perigos do desligamento em relação a um deles.
Simplesmente, no estado actual das coisas o Tribunal mais nada pode fazer. Depois de tudo o que o jovem já passou, a ideia de continuar a ser bombardeado com perguntas e entrevistas de psicólogos e assistentes sociais, etc, só pode ser contraproducente. Ainda por cima, com a idade de 16 anos.
Eventualmente, com o passar do tempo, o recorrente irá perceber que para se relacionar com o seu filho não precisa do Tribunal para nada. Só precisa de lhe demonstrar o que sente por ele, sem injunções judiciais.
Eventualmente, com o passar do tempo, o jovem AA irá perceber que só tem a ganhar com a reaproximação ao seu pai.
Não há, pois, outra solução que não seja a confirmação integral da sentença recorrida.
V- DECISÃO
Por todo o exposto, este Tribunal da Relação de Guimarães decide julgar o recurso totalmente improcedente e confirma a decisão recorrida.
Custas do recurso pelo recorrente (art. 527º,1,2 CPC)
Data: 27.2.2025
Relator (Afonso Cabral de Andrade) 1º Adjunto (José Carlos Dias Cravo) 2º Adjunto (Alcides Rodrigues)