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ACÇÃO ESPECIAL DE IMPUGNAÇÃO JUDICIAL DA REGULARIDADE E LICITUDE DO DESPEDIMENTO
ARTICULADO MOTIVADOR
DECISÃO DE CONDENAÇÃO
INDEMNIZAÇÃO DE ANTIGUIDADE
RETRIBUIÇÕES INTERCALARES
ISENÇÃO DE HORÁRIO DE TRABALHO
Sumário
1. Ainda que um subsídio de isenção de horário de trabalho integre a retribuição do trabalhador, nos termos do art. 258.º do Código do Trabalho, o mesmo não é atendível no cálculo do subsídio de Natal à luz do disposto nos arts. 262.º, n.º 1 e 263.º, n.º 1 do mesmo diploma, nem no cálculo da indemnização de antiguidade nos termos do previsto no art. 391.º, n.º 1 do Código do Trabalho e no art. 98.º-J, n.º 3, al. a) do CPT. 2. A indemnização de antiguidade e as retribuições intercalares em que o empregador é condenado na decisão proferida ao abrigo do disposto no art. 98.º-J, n.º 3, als. a) e b) do CPT são calculadas com referência à data do trânsito em julgado de tal decisão.
Texto Integral
Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa:
1. Relatório
AA intentou acção especial de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento contra XX, Lda., apresentando o formulário a que se referem os arts. 98.º-C e 98.º-D do CPT, em que se opõe ao despedimento por extinção do posto de trabalho promovido pela Ré com efeitos a 1/08/2023.
A Ré não apresentou articulado de motivação do despedimento, pelo que, em 29/04/2024, foi proferida decisão nos termos do art. 98.º-J, n.º 3 do CPT.
Tendo os autos prosseguido para conhecimento dos créditos laborais peticionados pela trabalhadora, relativamente aos quais a empregadora apresentou contestação, após audiência de julgamento foi proferida sentença, em 11/10/2014, que terminou com o seguinte dispositivo: «Face ao exposto julga-se a acção parcialmente procedente, condenando-se a Ré: a) No pagamento à Autora de uma indemnização, que na presente data se cifra no valor de €15.750,00 (14 x €1.125,00) pela cessação do contrato de trabalho face à ilicitude do despedimento, nos termos do art. 391.º do Código do Trabalho, valor esse ao qual devem ser deduzidos € 2.601,00 já pagos pela Ré à Autora e ainda o valor de € 3.529,48 compensados pela Ré à Autora aquando das suas contas finais. b) Condenar a Ré no pagamento à Autora do valor de € 16.149,19 euros, a título de retribuições intercalares, calculados de modo provisório, na presente data, sem prejuízo dos valores que se venham a apurar até ao trânsito em julgado da presente sentença, a apurar em incidente de liquidação, deduzidos os valores que a Autora tenha obtido a título de subsídio de desemprego, nos termos do art. 390.º n.º 1 e 2 al. c) do Código do Trabalho. c) Condenar a Ré no pagamento à Autora dos valores devidos pela integração do subsídio de isenção de horário de trabalho no subsídio de férias e de Natal entre Abril de 2009 e Setembro de 2021 na quantia de € 24.750,00. d) Absolver a Ré do pedido de condenação formulado pela Autora dos valores proporcionais de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal, nos montantes de (i) Férias não gozadas e subsídio de férias – €1.500,00, (ii) Subsídio de férias proporcionais – €1.500,00, (iii) Subsídio de Natal – €375,00. e) Condenar a Ré no pagamento à Autora no pagamento de € 843,75 a título de crédito de horas de formação devido e não pago. f) Absolver a Ré do pedido de condenação da Autora no pagamento da quantia por esta compensada em 3.529,48, valores esses que foram descontados nas contas finais elaboradas pela Ré. g) Absolver a Ré do pedido de condenação formulado pela Autora no valor de € 15.000,00 a título de danos de natureza não patrimonial. h) Absolver a Ré do pedido de condenação por litigância de má fé. i) Às quantias supra indicadas acrescem juros vencidos e vincendos desde a data do seu vencimento até efectivo e integral pagamento. Fixa-se o valor da causa em € 51.353,46. Custas pela Autora e pela Ré na proporção do decaimento (cfr. art. 527.º n.º 1 e 2 do CPC).»
A ré veio interpor recurso da sentença, formulando as seguintes conclusões: «1. Vem o presente recurso de apelação interposto das alíneas a) a c) do dispositivo e respetiva fundamentação constantes da sentença proferida pelo Tribunal a quo. 2. Posto isto, o tribunal a quo no dispositivo contido na al. a) da sentença recorrida, condenou a Recorrente a pagar à A a quantia de € 15.750,00 (14 x 1.125,00E) pela cessação do contrato de trabalho, face á ilicitude do despedimento. 3. Em nosso modesto entender mal andou o tribunal a quo, porquanto: 4. O disposto no art. 98º-J, nº 3, al. a) do CPT, estipula que, em caso de despedimento ilícito, tendo o trabalhador optado por indemnização em substituição de reintegração, o tribunal condena a entidade patronal a pagar ao trabalhador uma indemnização correspondente a 30 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo ou fração de antiguidade. 5. In casu entendeu o Tribunal a quo que a retribuição base aplicável ao caso em apreço, se cifrava em 1.125,00 E, composto pela retribuição base no valor de 900 E, acrescido do subsídio de isenção de horário, no valor de 225E mensais. Porém, Venerandos Julgadores, 6. Conforme consta dos factos provados als. c), m) e n) proferidos e assentes na sentença recorrida temos que, nos termos do disposto no art. 258º nº 2 do CT, a retribuição compreende a retribuição base e outras prestações regulares e periódicas feitas, direta ou indiretamente, em dinheiro ou em espécie. 7. Ademais, conforme resulta dos factos provados, a atribuição do subsídio de isenção de horário estabelecido com a trabalhadora, por escrito (facto provado B, cfr. doc. nº 2 do requerimento da autora datado de 4.12.2023), ocorreu em momento posterior ao da celebração do contrato de trabalho estabelecido entre as partes contratantes (empregador e trabalhador), não tendo em momento algum o tribunal a quo declarado a nulidade do acordo escrito para isenção de horário estabelecido entre as partes em confronto, pois foi cumprido o estabelecido a propósito do disposto nos arts. 218º e 219º do CT. Ou seja, Venerandos Julgadores, 8. No caso concreto e provado temos que o subsídio de isenção de horário atribuído à trabalhadora (Autora) não pode constituir a retribuição base da mesma para efeito indemnizatório ou outro, porquanto: *O acordo de constituição de retribuição a título de isenção de horário foi legal e licitamente estabelecido entre as partes contratantes; *Tal prestação foi constituída como pressuposto contratado da trabalhadora (como até alega no seu pedido e causa de pedir) deter disponibilidade de prestar o seu labor fora do seu período normal de trabalho (Ac. do TRL, no proc. 29547/22.6T8LSB.L1-4, em que foi relator a Dra. PAULA POTT, datado de 20-12-2023, in www.dgsi.pt); *A todo o momento assistia o direito à empregadora ou à trabalhadora de, querendo, por denúncia poderem fazer cessar a prestação de trabalho e correspondente remuneração ao abrigo da isenção de trabalho (cfr. doc. nº 2 do requerimento da autora datado de 4.12.2023); logo; *Tal subsídio por isenção de horário por ter sido licitamente contratado entre as partes não está sujeito ao princípio da irredutibilidade da retribuição estabelecido no art. 129.º do CT (cfr. Ac. do TRP datado de 10.10.2016, no proc nº 25236/15.6T8PRT.P1, em que foi relator a Dra. PAULA LEAL DE CARVALHO, in www.dgsi.pt e Ac. do TRL datado de 17-10-2018, no proc. nº 11892/17.4T8LSB.L1, em que foi relatora a Dra. Maria Celina Nóbrega, in www.dgsi.pt ); 9. Logo, atento igualmente a jurisprudência pacifica estabelecida no Ac. do STJ datado de 27.1.2021, no proc. nº 11947/17.5T8LSB.L1.S1, temos em sentido antagónico com a sentença recorrida que, não é pelo mero facto da trabalhadora deter uma retribuição base de 900 Euros, e outra complementar de 225 Euros, a título de subsidio de isenção de horário de trabalho, que forma um todo para formar a retribuição base a atribuir em sede de indemnização por antiguidade e por ilicitude do despedimento. 10. Não integrando, pois, o acordado e lícito subsídio de isenção de horário de trabalho o conceito de retribuição base para efeito de indemnização a atribuir à Autora, violando tal entendimento proferido pelo Tribunal a quo o disposto no art. 98.º - J, nº 3, al. a) do CPT e ainda o disposto nos arts. 258º nº 1 e 2 do CT; 11. Consequentemente, a final, a indemnização por ilicitude do despedimento devida à Autora terá que se formar pelo montante de 900 E x 14 = 12.600 Euros, ao qual será compensado com o montante de 2601 E e ainda de 3529,48 E, devidos pela trabalhadora à Ré empregadora, conforme o dispositivo em análise. Ademais, 12. O Tribunal a quo condenou a Recorrente a pagar a quantia provisória de 16.149,19 Euros, a título de retribuições intercalares, e nos termos contidos na alínea b) da Sentença recorrida. 13. Novamente mal andou o tribunal a quo, porquanto: 14. Na decisão em apreço o tribunal a quo imputou à recorrente empregadora o pagamento de 16.149,19 Euros, que corresponde às retribuições mensais intercalares devidas desde 1.8.2023 até à prolação da sentença recorrida, que ocorreu ora no decurso de Outubro/2024. 15. Porém, facto é que, a declaração de ilicitude do despedimento em apreço nos presentes autos, ocorreu com o D. Despacho proferido pelo tribunal a quo, datado de 27/11/2023, com a refª 147659343, donde resultou a seguinte notificação: “Uma vez que a Ré, devidamente notificada para apresentar o articulado motivador do despedimento não o fez, nos termos do art. 98.º-J n.º 1 do Código de Processo do Trabalho, há que dar cumprimento ao exposto no n.º 3 da referida disposição legal. Face ao exposto, determina-se a notificação da Autora a fim de vir aos autos informar sobre se pretende a reintegração na Ré ou, se pelo contrário, pretende receber indemnização em substituição da reintegração.” 16. E, consequentemente, a Autora apresentou, pois, em 4.12.2023 o articulado no qual peticionou os créditos emergentes do contrato de trabalho, da sua violação ou da sua cessação, incluindo a indemnização prevista na alínea a) do n.º 1 do artigo 389.º do Código do Trabalho. 17. Posto isto, tal e qual decorre do disposto no art. 98.º-J, nº 3 do CPT, em 27.11.2023, o tribunal a quo declara, pois, a ilicitude do despedimento, sendo que, é este o momento a partir do qual se cessam as prestações intercalares devidas à A, tal e qual professa o Ac. do TRL, no proc. nº 1695/23.2T8BRR.L1-4, em que foi relator o Dr. SÉRGIO ALMEIDA, datado de 24.4.2024. 18. Logo a ilicitude do despedimento ocorreu com o D. Despacho datado de 27.11.2023. 19. Pelo que, assistia ao tribunal a quo, respeitar o disposto no art. 98.º-J, nº 3, al. b) do CPT, que dispõe que: “(…) Condena ainda o empregador no pagamento das retribuições que o trabalhador deixou de auferir desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado da decisão judicial que declare a ilicitude do despedimento. (…)”. 20. Tendo o sobredito despacho que declarou a ilicitude do despedimento da autora transitou em julgado em 15.12.2023 (processo urgente), momento até ao qual é devido à Autora as prestações intercalares pelo despedimento ilícito, que se fixam em (4,5 x 1.125 E) = 5.062,50 Euros. 21. E, por conseguinte, mal andou o tribunal a quo ao condenar a R no pagamento á A da quantia de 16.149,19 E, a título de retribuições intercalares, quando as mesmas são devidas até à decisão que declarou a ilicitude do despedimento, a saber, a proferida em 27.11.2023, até, porque, não houve outra nesse sentido senão aquela ora indicada. Ademais, 22. In casu, estamos, pois, perante o mais crasso erro produzido pelo Tribunal a quo, donde não resultam factos ou direito para aplicar a decisão proferida na al. c) do dispositivo contido na sentença recorrida. Vejamos, Venerandos Desembargadores, 23. O Tribunal a quo, na al. c) da sentença recorrida, condenou a R a pagar à A a quantia de 24.750 Euros, devidos pela integração do subsídio de isenção de horário de trabalho no subsídio de férias e de natal entre Abril de 2009 e Setembro de 2021. 24. E, logo, aqui começa o erro do Tribunal a quo: - O subsídio de isenção de horário de trabalho, como consta nos factos provados, é de 225E mensais, conforme resultou dos factos provados na sentença recorrida. 25. Ou seja, caso tivéssemos o acréscimo de Subsídio de Férias, tal resultaria na seguinte conta: Anos de 04/2009 a 09/2021 = 225 E x 11 = € 2.475,00; e, ainda, acréscimo de Subsídio de Natal nos anos de 04/2009 a 09/2021 = 225 E x 11 = € 2.475,00; resultando num Total = € 4.950,00. Venerandos Julgadores, 26. O Exmo. Sr. Juiz a quo somente olhou para a PI da A, que peticionava a quantia de 24.750E e julgou (mesmo contra os fundamentos constantes na sentença) fazendo copy paste do pedido da Autora… 27. Tanto que, não há qualquer facto provado na sentença recorrida donde possa emergir que entre 2009 e 2023 (extinção da relação laboral) não fossem pagos à A as quantias devidas anualmente a título de subsídio de férias e natal. 28. Tanto que, o Juiz a quo, na condenação visada na presente secção, até indica, precisamente, «valores devidos pela integração do subsídio de isenção de horário de trabalho no subsídio de férias e de natal entre abril de 2009 e setembro de 2021…»!!! 29. In casu, o juiz a quo fez foi multiplicou na integra os subsídios de férias e natal anuais (1.125E x 2) = 2.250,00 E, pelos anos entre 04/2009 e 09/2021, num total de 11 anos, que correspondiam a 24.750 Euros. 30. Porém, como consta dos factos provados, da decisão recorrida, e da demais argumentação jurídica controvertida, em causa estavam: Que os subsídios de férias e natal entre 04/2009 e 09/2021 foram pagos pela retribuição base de 900 E, e não pelo montante de 1125 E, como pretendia a A. 31. No entanto, tendo por base tudo o que supra se alegou a propósito da isenção de horário temos então que: 32. Ainda que se aplique ao caso concreto quanto aos subsídios de férias a contabilização do montante de 225 E, referente a isenção de horário, no período que engloba 04/2009 até 09/2021, tal montante perfaz a quantia de 2475 Euros (225 E x 11 = 2475E), ao abrigo do disposto no art. 264º nº 2 do CT; 33. E por conseguinte, a R deve ser condenada a pagar à A somente a quantia de 2475E, correspondente ao montante de 225E x 11 anos a título de diferença pela integração do subsidio de isenção de horário no subsidio de férias no período correspondente a 04/2009 até 09/2021. 34. No que concerne ao subsídio de natal, somente é devido à autora a quantia de 900 E anuais, correspondentes à retribuição base da mesma, em conformidade com o disposto no art. 263º do CT e em conformidade com o Ac. do TRP, datado de 14/3/2022, no proc. nº 3807/20.9T8MTS.P1, em que foi relator o Dr. Rui Penha, in www.dgsi.pt; 35. Motivos pelos quais, entende a recorrente, a condenação da R a pagar à A os valores devidos pela integração do subsídio de isenção de horário no subsídio de natal, viola desde logo o disposto no art. 263º, nº 1 do CT, devendo, em conformidade improceder tal condenação da R. Ademais, Venerandos Julgadores, 36. Entendeu o Tribunal a quo, na fundamentação constante nas páginas 11 e 12 da sentença recorrida, o seguinte: “(…) Por fim, é de notar que a prova da falta de consideração do valor auferido pela Autora a título de subsidio de isenção de horário de trabalho no subsidio de Natal e de Férias entre Abril de 2009 e Setembro de 2021 deveu-se à falta de impugnação desse facto em concreto pela Ré a qual se limitou a argumentar, no sentido jurídico, que de acordo com as previsões legais tal subsidio não deveria integrar o conceito de retribuição tal como pretendido pela Autora.”. 37. Porém, tal causa de pedir alegada pela Autora constava nos arts. 11º a 13º do seu requerimento apresentado em 4.12.2023. 38. Sendo que a Recorrente na sua contestação, a propósito de tais factos, vem contrapor (contestando), invocando em sua defesa os seguintes factos: arts. 23º a 31º da contestação. 39. Pelo que, é entendimento da recorrente, que, in casu, a mesma além da argumentação jurídica exposta na contestação, igualmente, impugnou os pontos 11º a 13º alegados pela Autora no seu pedido. 40. Mal andando, uma vez mais, o Tribunal a quo!!! 41. E, por conseguinte, entende a recorrente, que a decisão ora impugnada violou o conceito de retribuição previsto no art. 258º, nº 1 e 2 do CT, quando o tribunal recorrido considera que a retribuição base da Autora era integrada pelo subsídio de isenção de horário, o que, conforme supra se demonstrou, é claramente uma ignominia jurídica; 42. E, ainda, violando o tribunal a quo o disposto no art. 263º/1 do CT, no qual considera, igualmente, que o subsídio de natal somente é composto por uma retribuição base que englobou outras retribuições complementares, como in casu, o subsídio de isenção de horário acordado com a Autora. Nestes termos e nos melhores de direito, com o douto suprimento de V. Exas., deve o presente recurso proceder, por provado, e, em consequência: A) Ser a alínea a) da sentença recorrida parcialmente revogada, e substituída por decisão que considere devido à Autora a quantia de 12.600 Euros, a título de indemnização pelo despedimento ilícito, montante ao qual será compensado com o montante de 2601 E já pago pela R à A, e ainda, de 3529,48 E, compensados pela R à A aquando das suas contas finais; B) Ser a alínea b) da sentença recorrida parcialmente revogada, e substituída por decisão que considere devido pela R à A a quantia de € 5.062,50 a título de retribuições intercalares até à declaração de ilicitude do despedimento; C) Ser a alínea c) da sentença recorrida parcialmente revogada, e substituída por decisão considere devido pela R à A a quantia de € 2.475,00, a título de integração do subsídio de isenção de horário de trabalho no subsídio de férias entre 04/2009 e 09/2021;»
A Autora apresentou resposta ao recurso, pugnando pela sua improcedência.
Observado o disposto no art. 87.º, n.º 3 do CPT, o Ministério Público emitiu parecer no sentido da procedência parcial do recurso.
Cumprido o previsto no art. 657.º do CPC, cabe decidir em conferência.
2. Questões a resolver
Tal como resulta das conclusões do recurso, que delimitam o seu objecto, as questões que se colocam a este Tribunal são as seguintes:
- consideração do subsídio de isenção de horário de trabalho no cômputo da indemnização de antiguidade;
- condenação em retribuições intercalares vencidas até momento posterior ao trânsito em julgado da decisão respectiva;
- erro no cálculo das diferenças devidas a título de subsídios de férias e de Natal e na consideração do subsídio de isenção de horário de trabalho no cômputo do subsídio de Natal.
3. Fundamentação
3.1. Os factos considerados provados são os seguintes:
A. A Autora foi contratada pela Ré para exercer, sob suas ordens e direcção, as funções de supervisora de operações, por contrato outorgado em 6 de Abril de 2009, tendo iniciado as suas funções naquela mesma data.
B. Complementarmente, em 8 de Abril de 2009, foi atribuída à Autora pela Ré, a titulo de isenção de horário de trabalho, a quantia mensal de € 212,50.
C. Na data em que a Ré fez cessar a relação laboral com a Autora, esta auferia mensalmente as quantias de:
- € 900,00 a título de ordenado;
- € 225,00 a título de isenção de horário de trabalho.
D. A Autora sempre auferiu, de forma reiterada, um montante de subsídio de isenção de horário de trabalho, em montante correspondente a 25% do seu salário base, quer a mesma tivesse afecta a prestação de trabalho extraordinário, quer não, tendo, a partir de Outubro de 2021, passado a ser processado o subsídio de Natal e de férias também em relação ao montante que era pago a titulo de isenção de horário de trabalho.
E. A Autora não recebeu, em consequência da extinção do seu posto de trabalho, os valores proporcionais de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal, nos montantes de:
- Férias não gozadas e férias – € 1.500,00
- Subsídio de férias – € 1.500,00
- Subsídio de Natal – € 375,00.
F. A Autora não auferiu 120 horas correspondentes a formação que não lhe foi dada.
G. Regressada de férias, veio a Autora a ser notificada do despedimento da mesma por extinção do posto de trabalho, tendo sido notificada da decisão final em 18 de Maio de 2023.
H. Sete dias após a data da extinção do posto de trabalho, sem qualquer indicação, a Ré procedeu a uma transferência para a Autora de € 2.601,00.
I. A Ré obstou a que a Autora acedesse ao seu local de trabalho.
J. Retirou-lhe a viatura automóvel que sempre esteve ao seu dispor.
K. Fez saber à Autora, numa altura em que a mesma estava grávida, que não mais iria contar com a mesma enquanto trabalhadora.
L. Colocando a mesma em situação de ansiedade.
M. A retribuição base da Autora era de € 900,00.
N. Sendo o montante mensal actual de € 225,00, realizado por escrito estabelecido entre as partes, comunicado ao ACT, atribuído pela entidade patronal à trabalhadora por isenção de horário.
O. A Autora às vezes cumpria o seu horário, outras vezes excedia-o, em conformidade com o acordo de isenção de horário previamente estabelecido com a empregadora.
P. A Autora, em Agosto de 2023, detinha um débito para com a empregadora, no montante de € 3.829,48.
Q. O crédito supramencionado, a favor da empregadora, era do conhecimento da Autora, sendo aprovado pela mesma, que se encontrava a pagar em prestações mensais ao longo do período em que para a mesma trabalhou.
R. Assim sendo, a Autora, em 29 de Setembro de 2014, solicitou à Ré a quantia de € 1.200,00, que vinha pagando e lhe iam sendo deduzidos, por acordo, na retribuição (menção Vale).
S. Em 19 de Novembro de 2019 solicitou a Autora crédito de € 2.800,00 à Ré, que os pagou.
T. Em 11 de Outubro de 2021, referente a depósitos em falta no montante de € 3.879,48, a Autora pagou somente parte, ficando por liquidar, aquando do despedimento, a quantia de € 3.529,48, cujos saldos foram compensados no momento do pagamento dos valores pecuniários devidos à Autora, com o último recibo de remuneração da mesma.
U. A Autora detinha conhecimento dos vários débitos para com a Ré e, bem assim, assumiu o seu pagamento àquela.
V. Motivo pelo qual, aquando da cessação do contrato de trabalho, promovido pela Ré, os valores pecuniários devidos foram compensados em € 3,529,40, devidos pela trabalhadora à empregadora.
W. A Autora entrou de férias em 01 de Abril de 2023 e já não regressou ao trabalho quando ocorreu o seu despedimento.
X. O subsídio de férias no ano da cessação era de cerca de € 615,00, que lhe iam mensalmente sendo pagos em duodécimos.
Y. O mesmo se diz no que concerne a subsídio de Natal, pois o mesmo foi-lhe pago em duodécimos.
3.2. Os factos considerados não provados são os seguintes:
1. Ainda em recuperação da sua situação de gravidez, veio a Autora a ser notificada do despedimento da mesma por extinção do posto de trabalho, tendo sido notificada da decisão final sem o aviso prévio em 18 de Maio de 2023.
2. Geradora de uma situação de perigo de perda do seu filho nascituro.
3. Esteve a Autora quase dois anos sem que a entidade patronal alguma vez lhe haja feito qualquer comunicação.
4. Atingindo a Autora na sua consideração profissional e pessoal.
3.3. A Apelante insurge-se contra a consideração do subsídio de isenção de horário de trabalho no cômputo da indemnização de antiguidade.
Nos termos do art. 258.º do Código do Trabalho, considera-se retribuição a prestação a que, nos termos do contrato, das normas que o regem ou dos usos, o trabalhador tem direito em contrapartida do seu trabalho, compreendendo:
- a retribuição base, ou seja, a prestação correspondente à actividade do trabalhador no período normal de trabalho (art. 262.º, n.º 2, al. a) do mesmo diploma);
- outras prestações regulares e periódicas feitas, directa ou indirectamente, em dinheiro ou em espécie.
O tribunal recorrido entendeu – e bem, tendo em conta o que decorre da factualidade provada e do referido art. 258.º do Código do Trabalho – que o subsídio de isenção de horário de trabalho é um complemento que integra a retribuição da Autora, porém considerou erradamente – por violação do disposto no art. 391.º, n.º 1 do mesmo diploma e no art. 98.º-J, n.º 3, al. a) do CPT – que tal subsídio deve ser atendido no cálculo da indemnização de antiguidade.
Com efeito, resulta expressamente do citado art. 391.º, n.º 1 do Código do Trabalho que o tribunal deve determinar o montante da indemnização de antiguidade entre 15 e 45 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo ou fracção de antiguidade. E, nessa conformidade, o citado art. 98.º-J, n.º 3, al. a) do CPT estabelece que, se o empregador não apresentar o articulado referido no número anterior, ou não juntar o procedimento disciplinar ou os documentos comprovativos do cumprimento das formalidades exigidas, o juiz declara a ilicitude do despedimento do trabalhador e condena o empregador (…), caso o trabalhador tenha optado por uma indemnização em substituição da reintegração, a pagar-lhe, no mínimo, uma indemnização correspondente a 30 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo ou fracção de antiguidade.
Relevam, pois, para o efeito apenas a retribuição base e as diuturnidades, não sendo atendíveis outras prestações pecuniárias auferidas pelo trabalhador, ainda que integrem a sua retribuição nos termos do art. 258.º do Código do Trabalho.
Constata-se, aliás, que o tribunal recorrido assim já tinha decidido, na decisão proferida, em 29/04/2024, nos termos do art. 98.º-J, n.º 3 do CPT, transitada em julgado, pelo que a sentença recorrida incorre ainda em ofensa de caso julgado.
Por todo o exposto, como refere o Ministério Público no seu Parecer, resultando da factualidade provada que a retribuição base da Autora era de 900,00 €, a indemnização por despedimento ilícito deve ser calculada tendo em conta esse valor mensal e a antiguidade que a trabalhadora, admitida em 6 de Abril de 2009, tinha à data do trânsito em julgado da decisão proferida nos termos do art. 98.º-J, n.º 3 do CPT.
Deste modo, atendendo à fixação da indemnização de antiguidade em 30 dias, o seu montante importa em 14.400,00 € [900,00 € x 16 (15 anos completos e uma fracção)].
Procede, pois, parcialmente o recurso nesta parte.
3.4. A Recorrente insurge-se também contra a condenação em retribuições intercalares vencidas até ao trânsito em julgado da sentença proferida, em 11/10/2024, nos termos do art. 98.º-J, n.º 5, in fine, do CPT, isto é, até momento posterior ao trânsito em julgado da decisão proferida nos termos do art. 98.º-J, n.º 3 do CPT.
Estabelece o art. 98.º-J do CPT, na parte relevante:
(…)
3 - Se o empregador não apresentar o articulado referido no número anterior, ou não juntar o procedimento disciplinar ou os documentos comprovativos do cumprimento das formalidades exigidas, o juiz declara a ilicitude do despedimento do trabalhador, e:
a) Condena o empregador a reintegrar o trabalhador no mesmo estabelecimento da empresa, sem prejuízo da sua categoria e antiguidade, ou, caso o trabalhador tenha optado por uma indemnização em substituição da reintegração, a pagar-lhe, no mínimo, uma indemnização correspondente a 30 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo ou fracção de antiguidade, sem prejuízo do disposto nos n.ºs 2 e 3 do artigo 391.º do Código do Trabalho;
b) Condena ainda o empregador no pagamento das retribuições que o trabalhador deixou de auferir desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado da decisão judicial que declare a ilicitude do despedimento;
c) Ordena a notificação do trabalhador para, querendo, no prazo de 15 dias, apresentar articulado no qual peticione quaisquer outros créditos emergentes do contrato de trabalho, da sua violação ou da sua cessação, incluindo a indemnização prevista na alínea a) do n.º 1 do artigo 389.º do Código do Trabalho.
4 - Na mesma data, o empregador é notificado da sentença quanto ao referido nas alíneas a) e b) do número anterior.
5 - Se o trabalhador apresentar o articulado a que se refere a alínea c) do n.º 3, o empregador é notificado para, no prazo de 15 dias, apresentar contestação, observando-se seguidamente os restantes termos do processo comum regulados nos artigos 57.º e seguintes.
Decorre, pois, da norma em apreço que, no caso de o empregador não apresentar o articulado de motivação do despedimento ou não juntar o procedimento disciplinar ou os documentos comprovativos do cumprimento das formalidades exigidas, o juiz profere imediatamente decisão a declarar a ilicitude do despedimento do trabalhador e a condenar o empregador nas respectivas consequências, previstas nos arts. 389.º, n.º 1, al. b) ou 391.º, conforme o caso, e 390.º, todos do Código do Trabalho, com a particularidade de que a indemnização de antiguidade é fixada no mínimo em 30 dias, sem prejuízo de o trabalhador poder apresentar articulado no qual peticione indemnização superior de acordo com o previsto na alínea a) do n.º 1 do art. 389.º do mesmo diploma legal.
Assim, conforme se prescreve expressamente na al. b) do n.º 3 do art. 98.º-J do CPT, o empregador é condenado no pagamento das retribuições que o trabalhador deixou de auferir desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado de tal decisão judicial que declara a ilicitude do despedimento, tal como sucede relativamente ao cômputo da indemnização de antiguidade, por força da parte final da antecedente al. a).
Constata-se, aliás, que o tribunal recorrido assim já tinha decidido, na decisão proferida, em 29/04/2024, nos termos do art. 98.º-J, n.º 3 do CPT, transitada em julgado, pelo que a sentença recorrida incorre ainda em ofensa de caso julgado.
Deste modo, seguindo de perto o Parecer do Ministério Público, considerando que a decisão a que se refere o art. 98.º-J, n.º 3 do CPT foi proferida em 29/04/2024 (e não 27/11/2023, como a Recorrente invoca), foi notificada às partes em 2/05/2024 e transitou em julgado em 21/05/2024, já que da mesma não foi interposto recurso, as retribuições deixadas de auferir pela Autora até esta data, desde o despedimento em 1/08/2023, importam em 12.724,83 € [(1.125,00 € x 9 meses = 10.125,00 €) + (1,125,00 € : 30 x 21 dias = 787,50 €) + (1.125,00 € : 365 x 294 dias x 2 subsídios = 1.812,33 €).
Termos em que o recurso procede parcialmente quanto à questão em apreço.
3.5. Finalmente, a Apelante invoca erro no cálculo das diferenças devidas a título de subsídios de férias e de Natal e erro de julgamento na consideração do subsídio de isenção de horário de trabalho no cômputo do subsídio de Natal.
Ora, quanto ao erro de cálculo, é manifesto que a Recorrente tem razão, pois, como resulta dos autos e dos termos da própria sentença recorrida, incluindo o dispositivo, o que se discutia era a falta de consideração, entre Abril de 2009 e Setembro de 2021, da quantia paga a título de subsídio de isenção de horário de trabalho no cômputo dos subsídios de férias e de Natal, e não a falta de pagamento destes por inteiro.
Assim, desde logo, resulta do próprio contexto da sentença, mormente do dispositivo, que, ao tomar-se por base de cálculo a retribuição mensal de 1.125,00 €, e não apenas a diferença de 225,00 € respeitante ao aludido subsídio de isenção de horário de trabalho, ocorreu um mero lapso de cálculo evidente e grosseiro que urge rectificar.
Por outro lado, sendo aplicável o Código do Trabalho de 2009, estabelece o seu art. 262.º, n.º 1, que, quando disposição legal, convencional ou contratual não disponha em contrário, a base de cálculo de prestação complementar ou acessória é constituída pela retribuição base e diuturnidades. E, por seu turno, o art. 263.º, n.º 1 dispõe que o trabalhador tem direito a subsídio de Natal de valor igual a um mês de retribuição, que deve ser pago até 15 de Dezembro de cada ano.
Conclui-se, pois, conforme confirmam pacificamente a doutrina e a jurisprudência, que a lei não impõe, actualmente, que o subsídio de Natal integre quaisquer outras prestações pecuniárias auferidas pelo trabalhador, para além da retribuição base e das diuturnidades, ainda que constituam retribuição do trabalhador à luz do disposto no art. 258.º do Código do Trabalho.
Pelo exposto, nada obrigava a que o subsídio de Natal devido pela Ré à Autora integrasse a quantia paga a título de subsídio de isenção de horário de trabalho, sem prejuízo de tal poder acontecer por força da vontade das partes, como efectivamente se veio a verificar a partir de Outubro de 2021.
Posto isto, sendo embora verdade que apenas se provou que o subsídio de isenção de horário de trabalho tinha o valor de 212,50 € em 8 de Abril de 2009 e de 225,00 € à data da cessação da relação laboral, como nota o Ministério Público no seu Parecer, o que é certo é que a Apelante aceita no seu recurso que seja este último o valor a atender para cálculo das diferenças em falta a título de subsídios de férias no período entre Abril de 2009 e Setembro de 2021.
Assim, a quantia global em dívida monta a 2.587,50 € (225,00 € x 11,5 anos), nesta medida procedendo o recurso quanto a esta questão.
4. Decisão
Nestes termos, acorda-se em julgar a apelação parcialmente procedente e, em consequência, alterar o dispositivo da sentença nos seguintes termos, quanto às seguintes alíneas:
«Face ao exposto, julga-se a acção parcialmente procedente, condenando-se a Ré:
a) No pagamento à Autora duma indemnização de antiguidade no valor de 14.400,00 €, deduzida da quantia de 2.601,00 € já paga pela Ré e da quantia de 3.529,48 € que a Autora lhe devia.
b) No pagamento à Autora da quantia de 12.724,83 €, a título de retribuições intercalares, deduzida de subsídios de desemprego que a Autora tenha recebido, devendo a Ré entregar a quantia correspondente à Segurança Social.
c) No pagamento à Autora da quantia de 2.587,50 €, a título de diferenças decorrentes da integração do subsídio de isenção de horário de trabalho nos subsídios de férias entre Abril de 2009 e Setembro de 2021.
(…)»
No mais, confirma-se a sentença recorrida.
Custas da acção e do recurso pelas partes, na proporção do decaimento.
Lisboa, 26 de Fevereiro de 2025
Alda Martins
Celina Nóbrega
Alexandra Lage