UNIÃO DE FACTO
VIDA COMUM
MORTE
PRESTAÇÃO
Sumário

1 – Para efeitos de atribuição de prestação de morte ao elemento sobrevivo da união deve ter existido entre os membros da união um projecto de vida em comum análogo ao da vivência marital, concretizado pela comunhão de leito, mesa e habitação que deve perdurar em termos de estabilidade no tempo por um período superior a dois anos e em que os membros dessa união se comportem como se de marido e mulher se tratassem.
2 – Sendo a vítima de acidente de viação uma pessoa jovem de 31 anos de idade, saudável, alegre com uma expectativa de vida de largos anos é ajustado fixar o quantum indemnizatório para ressarcimento da perda do direito à vida no montante de € 85.000,00.
3 – Ao menor de nove anos de idade que perde o seu progenitor ainda em tenra idade é de estabelecer uma indemnização de € 40.000,00 para ressarcimento dos seus danos não patrimoniais decorrentes da perda do progenitor.
(Sumário do Relator)

Texto Integral

Processo n.º 4825/20.2T8STB.E1

Acordam na 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora

1. Relatório

(…), menor representado pela sua mãe (…) e (…) intentaram acção declarativa sob a forma de processo comum contra (…) Seguros – Companhia de Seguros de (…), SA peticionando a condenação da Ré no pagamento de indemnização pelos danos sofridos pelo falecimento de (…) no seguimento do acidente de viação de que este foi vítima provocado pelo condutor de viatura segurada pela Ré.
Após a realização da audiência de julgamento foi proferida a seguinte decisão:
Em face de todo o exposto, julga-se parcialmente procedente a presente acção e, em consequência decide-se:
1.) Condenar a Ré (…) Seguros – Companhia de Seguros de (…), SA a pagar ao A., a título de indemnização a titulo de danos não patrimoniais o valor de € 40.000,00 quantia acrescida dos juros legais que se forem sucedendo, desde a citação até integral pagamento.
2.) Condenar a Ré (…) Seguros – Companhia de Seguros de (…), SA a pagar ao Autor, a título de indemnização pelo dano morte o valor de € 95.000,00 quantia acrescida dos juros legais que se forem a sucedendo, desde a citação até integral pagamento.
3.) Absolver a Ré do restante peticionado pelo Autor.
4.) Absolver a Ré do peticionado pela Autora (…);
5.) Custas a cargo de AA. e R. na proporção do decaimento, sem prejuízo do beneficio de apoio judiciário concedido.
Inconformada com tal decisão veio a Ré seguradora interpor recurso de apelação com as conclusões que se transcrevem:
1. São exageradas as indemnizações arbitradas para ressarcimento dos danos não patrimoniais sofridos.
2. Nomeadamente, no que concerne à perda do direito à vida é muito elevada a indemnização de € 95.000,00, que foi fixada em primeira instância, devendo em sua substituição ser arbitrado um montante que não exceda € 70.000,00, por se afigurar mais justo e equilibrado.
3. É igualmente exagerada a indemnização de € 40.000,00 atribuída ao Autor como compensação moral pelo desgosto face à perda do pai, entendendo-se que seria mais justa uma indemnização não superior a € 30.000,00 a tal título;
4. A douta sentença recorrida violou, além do mais, por errada interpretação e aplicação, o disposto nos artigos 496.º, 562.º e 566.º do Código Civil;
5. O Tribunal a quo interpretou e aplicou tais normas no sentido exposto na douta sentença, condenando a recorrente numa indemnização manifestamente excessiva;
6. A interpretação correta de tais preceitos era a que resultaria na atribuição de montantes de indemnização que não se afastassem dos agora preconizados.
Termos em que, deve ser concedido provimento ao presente recurso, revogando-se a douta decisão recorrida e substituindo-se por uma outra que condene nos valores apontados.

Igualmente inconformada com a decisão veio a Autora (…) interpor recurso de apelação para o que apresentou alegações e as seguintes conclusões:
A ré seguradora ofereceu resposta às A. Alteração da matéria de facto – Quanto ao facto provado n.º 68
a.1. Prova documental
1.ª Com o devido respeito pela opinião em contrário, face aos factos provados n.ºs 66 a 68, deveria ter sido dado como provado que a Recorrente viveu em união de facto com o (…) durante vários anos em período superior a 2 anos (a entender-se que não ficou provado o período) e até à data do óbito do mesmo e não apenas conforme consta do facto provado n.º 68 que “mantiveram um relacionamento amoroso”.
2.ª A união de facto é a situação jurídica de duas pessoas que, independentemente do sexo, vivam em condições análogas às dos cônjuges há mais de dois anos, e beneficia de proteção social nos termos previstos na Lei n.º 7/2001, de 11 de maio e nos termos do artigo 2.º-A, n.º 4, da citada lei: “No caso de morte de um dos membros da união de facto, a declaração emitida pela junta de freguesia atesta que o interessado residia há mais de dois anos com o falecido, à data do falecimento, e deve ser acompanhada de declaração do interessado, sob compromisso de honra, de que vivia em união de facto com o falecido há mais de dois anos, à mesma data, de certidão de cópia integral do registo de nascimento do interessado e de certidão do óbito do falecido.”
3.ª Com efeito, a Recorrente cumpriu com o disposto no citado artigo 2.º-A e juntou aos autos a declaração da Junta de Freguesia datada de 03/06/2020 onde consta que viviam em união de facto desde 2011, a qual é um documento e faz prova quanto à existência da união de facto, sendo que a sua autenticidade apenas poderia ter sido atacada pela via da falsidade o que não foi e tal impedia a produção de prova testemunhal sobre a respetiva matéria/factualidade, pelo que se deveria ter dado como provado que a Recorrente e o (…) viveram em união de facto durante mais de 2 anos e até à morte deste.
4.ª Contudo, na Douta Sentença Recorrida não se valorou esse documento e apenas consta que “os depoimentos prestados são muito desconexos e sem precisão de tempo e lugar, não sendo corroborados por prova documental” e de que não foi feita prova que tivessem uma conta bancária conjunta, a mesma morada fiscal ou apresentassem IRS em conjunto, contudo e com o devido respeito pela opinião em contrário, tais “pormenores” não podem ser fundamento para se dar como não provada a união de facto e para se descredibilizar o documento da junta de freguesia, porquanto:
a) A Recorrente e o (…) eram pessoas reservadas e não davam a conhecer a sua vida pessoal e familiar;
b) São pessoas com pouca escolaridade e humildes pelo que não sabiam que deviam alterar a morada fiscal, nem estavam à espera que acontecesse o acidente mortal e que a Recorrente fosse forçada a fazer prova duma união de facto que durava há vários anos à vista de todos;
c) A ex-companheira, mãe e representante do Autor (…), face ao relacionamento da Recorrente com o (…) tudo faria para que esta não recebesse a indemnização, para evitar ter que dividir a indemnização da Recorrente com o seu filho.
d) Mesmo que se tratasse duma relação conjugal e não de união de facto como é o caso os casais estes não estão obrigados a ter uma conta conjunta e sendo a Recorrente e o falecido (…) pessoas pobres e humildes não viram necessidade em abrir a mesma uma vez que já tinham contas próprias e o dinheiro era escasso e para evitar custos de manutenção desnecessários;
e) O (…) manteve sempre a morada fiscal em casa dos seus pais e não viu necessidade de a alterar porque estes lhe entregavam a correspondência e porque o seu objectivo como consta do depoimento dactilografado de várias testemunhas (Doc. 1) era morar sozinho com a Recorrente, pelo que a residência em casa dos pais desta sempre se mostrou temporária e de acordo com a Jurisprudência Dominante o domicilio fiscal é o local da sua residência habitual e a falta de alteração de morada não afeta os direitos, como se exemplifica em 20 e se dá como reproduzido.
f) A entrega do IRS em conjunto é opcional mesmo para quem vive uma relação conjugal, conforme previsto no artigo 13.º do CIRS e conforme foi referido por várias testemunhas a Recorrente apenas tinha trabalhos pontuais e não declarados, aliás, consta dos factos provados que não trabalhava, pelo que não estava obrigada nem podia entregar o IRS por falta de rendimentos e o (…) apenas entregava pontualmente o seu IRS e não todos os anos.
5.ª Com o devido respeito pela opinião em contrário, foi junto aos autos o documento exigido nos termos do artigo 2.º-A, n.º 4, da Lei n.º 7/2001 para prova da união de facto, pelo que deve alterar-se o n.º 68 dos factos provados e dar-se como provado que: “A Autora e o (…) viveram em união de facto durante mais de 2 anos e até à data da morte do mesmo”, por os documentos referidos na fundamentação na Douta Sentença não serem exigidos por lei. Se assim se não entender,
a.2. Prova testemunhal – reapreciação da prova gravada
6.ª Na Douta Sentença Recorrida houve erro na apreciação da prova pois apesar de se ter dado como provado que o (…) e a Recorrente mantiveram um caso amoroso (n.º 68 dos factos provados), não se deu como provado que viveram em união de facto desde 2011, ou, durante mais de 2 anos e até à data do óbito do (…) ocorrido em 21/06/2018, por tal constar do documento da junta de freguesia junto aos autos e de ter sido referido por várias testemunhas, conforme depoimento datilografado que se junta (doc. 1) do qual se destaca:
Testemunha do Autor (…), (…), irmã do (…), ouvida em 02/02/2024, cuja duração da inquirição foi de 10h50 a 11h34m referiu várias vezes que foi a casa do irmão e da (…) conforme consta em 07.08 a 07.36; 13.15 a 13.25; De 13.37 a 13.43 do seu depoimento datilografado (Doc. 1) e ainda que a Recorrente e o (…) viveram em união de facto durante mais de 6 anos:
De 02.06m a 02.13
Mma Juiz: Conhece (…)?
Testemunha: Sim, teve com o meu irmão.
De 24.52 a 25.27
(...)
Mandatária da Recorrente: (…) lembra-se quantos anos ou quanto tempo ele terá tido esse relacionamento com a (…)?
Testemunha: Com a (…)? Deve ter tido 6/7 anos para aí juntos.
Mandatária da Recorrente: Porque é que você diz 6/7 anos de relação com a (…)? Porque é que a D. (…) acha isto?
Testemunha: Porque desde que ele começou a namorar com ela, eles começaram logo a fazer vida.
De 25.40 a 25.41
Mandatária da Recorrente: Foi muito tempo para si
Testemunha: Foi muito tempo!
De 30.07 a 30.18
Advogada da Recorrente: E a vossa família conhecia a (…)? A (…) conhecia e o seu irmão (…) também conhecia?
Testemunha: Também e o meu marido também, e a minha mãe claro também conhecia e o meu pai.
Advogado da Recorrente: Todos conheciam a (…)?
Testemunha: Sim (…)
Testemunha da Recorrida (…), (…), mãe do (…), ouvida em 02/02/2024, cuja duração da inquirição foi de 12h16m a 12h43m referiu em 12.28: (…) teve 2 anos com a (…) parece, 2 anos ou 3 anos com a (…) depois esteve com esta rapariga!
Testemunha (…), mãe da Recorrente e esta e o (…) habitaram até à morte deste, ouvida em 05/12/2023, cuja duração da inquirição foi de 15h47m a 16h41m a 12.43 referiu que viveram em união de facto durante vários anos, conforme consta de 05:55 a 06.23; 06.34 a 06.40; 07.43 a 07.44; 34.41 a 35.10 do seu depoimento datilografado (Doc. 1) e ainda que viveram em união de facto durante mais de 6 anos como tinha sido referido também pela testemunha do Autor (…) de 24.52 a 25.27, conforme consta no seu depoimento:
De 04.40 a 05.25:
Testemunha: O (…) viveu na minha casa.
Advogada da Recorrente: Viver é o quê?
Testemunha: Ele …
Advogada da Recorrente: Era o seu filho, amigo …
Testemunha: Não! Era o meu genro, estava com a minha filha, viveram juntos!
Advogada da Recorrente: Viveram juntos quanto tempo?
Testemunha: 6/7 anos
(...)
Testemunha: Juntaram-se é a mesma coisa que a irmã, não são casados.
De 08.25 a 08.35
Testemunha: A minha filha tinha um quarto, a casa é de 3 quartos e ela tinha o quarto dela e foi para aí que foram morar, dormir, nesse quarto!
De 08.45 a 08.51:
Advogada da Recorrente: (…) a senhora acha que a sua filha tinha 19 anos quando se juntou?
Testemunha: Sim, acho que era isso 19, para aí!
Testemunha (…), amiga da Recorrente e o do (…), ouvida em 05/12/2023, cuja duração da inquirição foi de 14h54m a 15h47m referiu que a união de facto durava há vários anos e que nunca se separaram conforme consta de 34.10 a 36.34; 36.56 a 37.14; 39.15 a 39.24 do seu depoimento datilografado (Doc. 1) e em: 8.38 a 9.22
Testemunha: Eu lembro-me do principio do namoro da (…) e do (…), eles desde o primeiro encontro que tiveram já não se largaram mais como namorados e passado pouco mais de dois meses por ai ele começou logo a viver na casa dos pais da (…)
De 23.46 a 23.51
Testemunha: Eles namoraram cerca de 2 meses juntaram-se logo foi até o (…) falecer.
De 24.10 a 24.44
Testemunha: Eu julgo que é 2011 que eles começaram a namorar e namoraram cerca de 2 meses e juntaram-se logo.
Advogada da Recorrente: E a (…) e o (…) nunca chegaram a ter filhos, nunca falaram nisso? Viver juntos noutro sitio? Sozinhos?
Testemunha: Sim, sim houve esse tipo de conversas em morarem juntos, em terem filhos. Só que nunca se proporcionou porque queriam ter mais estabilidade.
Advogada da Recorrente: E o que quer dizer morarem juntos?
Testemunha: Terem uma casa só para os dois.
Testemunha (…), que tinha um café junto à casa onde a Recorrente e o (…) vivia e que era frequentado por ambos ouvida em 05/12/2023, cuja duração da inquirição foi de 14.21 a 14.54 referiu que viveram em união de facto durante vários anos:
De 04.20 a 06.02
Advogada da Recorrente: Senhora sabe quando se refere ao (…), o que é que o (…) era à (…)?
Testemunha: Viviam maritalmente, não sei se eram casados mesmo mas viviam juntos.
Advogada da Recorrente: E porque é que a senhora e porque é que acha que viviam juntos?
Testemunha: Dormiam juntos, faziam tudo juntos é o mesmo que eu com o meu marido só que eles não tinham uma casa deles viviam com a D. (…) na casa dona … sempre viveram com ela.
(…)
Advogada da Recorrente: Portanto, isso foi durante quanto tempo? A senhora teve o café durante quanto tempo?
Testemunha: Sei lá! Eu não posso precisar agora os anos! Isso foi à uns tempos mas aí 7/8 anos, sei lá!
Advogada da Recorrente: Mas durante esse tempo sempre conviveu com eles?
Testemunha: Sempre! Sempre!
Advogada da Recorrente: Na altura em que teve o café conviveu com eles durante esse período todo?
Testemunha: Todo! Praticamente desde que abri o café até que fechei!
Advogada da Recorrente: E só com esta família, da (…) e do (…), mais os irmãos, ou, também com o (…)?
Testemunha: Também com o (…), claro! Todos, todos, iam todos frequentavam o café, iam todos juntos!
Advogada da Recorrente: Então a senhora tem a noção de que eram marido e mulher nesse sentido?
Testemunha: Sim!
De 14.15 a 14.16:
Testemunha: (…) eles namoraram pouco tempo e foram viver juntos.
De 15.30 a 15.49:
Advogada do António: Já agora recorda-se quando é que começou a ver o (…) a frequentar o café?
Testemunha: Lá está até à morte, foi agora mais uns 7 ou 8 anos para trás, 6, 7, 8 anos (…)
De 21.27 a 21.37:
Advogado da (…) Seguros: A senhora está a dizer no fundo, desde que ele viveu com a (…) 7/8 anos até ao acidente?
Testemunha: Exatamente!
De 23.35 a 24.05:
Advogado da (…) Seguros (…) inclusivamente a (…) não foi pedir, pedir ao direito do trabalho, podia …
Testemunha: Não foi quê?
Advogado da (…) Seguros: Não reclamou nada no direito do trabalho? No acidente de trabalho?
Testemunha: Olhe doutor não foi falta de eu não lhe dizer até pedir na segurança social uma pensão para ela?
Advogado da (…) Seguros: Pois …
Testemunha: Não foi à falta de eu não lhe dizer! “Ai D. (…) eu não quero nada, não quero nada do (…), depois a família, ai não quero nada” “Oh filha mas tu tens direito!”
Advogado da (…) Seguros: E tem direito porquê?
Testemunha: Porque viveu com ele! Viveu com ele doutor!
7.ª Do depoimento das testemunhas apresentadas pela Recorrente verifica-se que as mesmas são pessoas humildes e com pouca escolaridade, pelo que não “preparam” as palavras mas são frontais e sinceras naquilo que dizem, aliás, mesmo quando pressionadas e por vezes “gozadas” pelos mandatários das outras partes para as baralhar foram firmes e constantes no seu depoimento, pelo que, com o devido respeito pela opinião em contrário, face ao depoimento das mesmas é evidente que o (…) e a Recorrente viveram de forma regular em união de facto durante mais de 2 anos e até à morte do mesmo.
8.ª Aliás, na fundamentação da Douta Sentença consta que: “Não se pode negar que resultou provado a existência de um relacionamento afectivo entre a Autora e o falecido (…), no âmbito do qual ambos partilhavam o leito ….”, mas, entendeu-se que “não decorre dos autos a partilha de todos os momentos de vida, seja a nível familiar, seja a nível económico”, para se dar como não provada a união de facto, mas face aos depoimentos das testemunhas constantes do documento datilografado em anexo (Doc. 1) é evidente que os mesmos tinham essa partilha, quer em termos partilha de momentos da vida, convívio com familiares e amigos quer em termos económicos porquanto:
a) Várias testemunhas visitaram a Recorrente e o (…) onde habitavam e com eles tinham momentos de convívio, conforme consta do depoimentos das mesmas que se junta (Doc. 1) dos quais se destaca:
Testemunha do Autor (…), (…), irmã do (…), ouvida em 02/02/2024, cuja duração da inquirição foi de 10h50m a 11h34m referiu:
De 07.08 a 07.36
Testemunha: A segunda casa já conhecia com ela, porque o meu irmão levou-me a casa onde eles moravam.
De 30.07 a 30.18
Advogado da Recorrente: E a vossa família conhecia a (…)? A (…) conhecia e o seu irmão (…) também conhecia?
Testemunha: Também e o meu marido também, e a minha mãe claro também conhecia e o meu pai.
Advogado da Recorrente: Todos conheciam a (…)?
Testemunha: Sim (…)
Testemunha (…), amiga da Recorrente e o do (…), ouvida em 05/12/2023, cuja duração da inquirição foi de 14h54m a 15h47m referiu:
De 02.12 a 2.18
Mma Juiz: Conhece o (…)?
Testemunha: Sim, é filho do (…).
De 2.25 a 2.34
Testemunha: Porque conhecia o (…) e tive com o (…) uma vez no café que veio passar um fim de semana com o (…) e com a (…).
De 6.19 a 6.31
Testemunha: Nós estávamos algumas vezes juntos, eles frequentavam a minha casa, eu frequentava a casa da D. (…), íamos ao café e tínhamos saídas juntos.
De 6.42 a 6.53
Testemunha: Jantávamos, bebíamos às vezes lá café, outras vezes costumávamos ir ao (…) que é o café que nós costumávamos frequentar.
De 17.42 a 17.56
Testemunha: Eram um casal, viviam juntos na mesma casa.
Advogada da Recorrente: Viviam na mesma casa podiam ser …
Testemunha: Viviam na mesma casa no quarto dela.
Advogada da Recorrente: Como é que a senhora sabe disso?
Testemunha: Porque eu frequentava a casa da D. (…).
Testemunha (…), que tinha um café junto à casa onde a Recorrente e o (…) vivia e que era frequentado por ambos ouvida em 05/12/2023, cuja duração da inquirição foi de 14h21m a 14h54m referiu:
De 04.20 a 06.02
Advogada da Recorrente: Senhora sabe quando se refere ao (…), o que é que o (…) era à (…)?
Testemunha: Viviam maritalmente, não sei se eram casados mesmo mas viviam juntos.
Advogada da Recorrente: É porque é que a senhora e porque é que acha que viviam juntos?
Testemunha: Dormiam juntos, faziam tudo juntos é o mesmo que eu com o meu marido só que eles não tinham uma casa deles viviam com a D. (…) na casa dona … sempre viveram com ela.
Advogada da Recorrente: E porque é que acha que vivem juntos? Não podiam ser só namorados (…) qual é a diferença?
Testemunha: Para mim se se, peço desculpa de estar a dizer … mas se vive, se dormem juntos, comem juntos, o dinheiro do (…) era o dinheiro da (…), pelo aquilo que me apercebi e me contava o (…), acho que são marido e mulher né, pelo menos é assim que …
Advogada da Recorrente: A senhora diz que viviam juntos? A senhora não estava lá para ver?
Testemunha: Não, não estava lá para ver mas a própria mãe da (…) dizia: “Olhe D. (…) já tenho mais um filho!”
Advogada da Recorrente: Portanto, isso foi durante quanto tempo? A senhora teve o café durante quanto tempo?
Testemunha: Sei lá! Eu não posso precisar agora os anos! Isso foi à uns tempos mas aí 7/8 anos, sei lá!
Advogada da Recorrente: Mas durante esse tempo sempre conviveu com eles?
Testemunha: Sempre! Sempre!
Advogada da Recorrente: Na altura em que teve o café conviveu com eles durante esse período todo?
Testemunha: Todo! Praticamente desde que abri o café até que fechei!
Advogada da Recorrente: E só com esta família, da (…) e do (…), mais os irmãos, ou, também com o (…)?
Testemunha: Também com o (…), claro! Todos, todos, iam todos frequentavam o café, iam todos juntos!
Advogada da Recorrente: Então a senhora tem a noção de que eram marido e mulher nesse sentido?
Testemunha: Sim!
Testemunha (…), irmão do (…), ouvida em 05/12/2023, cuja duração da inquirição foi de 10h04m a 10h31m referiu:
De 6.38 a 7.22
Mma Juiz: Alguma vez foi a casa do seu irmão?
Testemunha: Cheguei a ir, ele vivia aqui, aqui em (…) perto da Av. da (…) vivia com a (…), vivia aí com ela.
Mma Juiz: Alguma vez foi lá a casa? Viu?
Testemunha: Vi! Eles estavam a viver na altura.
Mma Juiz: Foi lá a casa porquê?
Testemunha: Devo ter ido lá almoçar ou qualquer coisa, sei que tive com eles lá mais que uma vez até fui tomar café com eles e assim, essas coisas assim, sei que eles tinham uma relação!
b) É evidente a partilha económica face aos factos dados como provados, pois, o (…) trabalhava (factos provados n.º 34, 35 e 60), a Recorrente não (facto provado n.º 61) e o mesmo fez-lhe várias transferências (facto provado n.º 62) e também suportava as despesas do casal, aliás, conforme consta do depoimento dactilografado das testemunhas que se junta (Doc. 1) dos quais se destaca:
Testemunha (…), mãe da Recorrente e na casa de quem morava a Recorrente e o (…), ouvida em 05/12/2023, cuja duração da inquirição foi de 15h47m a 16h41m referiu:
De 22.36 a 22.50:
Testemunha: Ele dava o dinheiro eu só dava a casa, o quarto onde dormiam porque ela é que fazia o comer dele e lavava a roupa dele.
De 23.05 a 23.15:
Testemunha: A gente combinava, “Olha (…), vê lá se tens roupa tua e do (…) lava que eu depois tenho a minha e a do teu pai.” Era assim!
De 40.38 A 41.16:
Mma Juiz: E como é que faziam a divisão das contas fixas? Água, luz e gás?
Testemunha: Ou pagávamos a metade da fatura os dois ou ele pagava uma metade e eu pagava a outra metade, ou, uma vez pagava ele e outra pagava eu, fazíamos assim!
A testemunha (…), amiga da Recorrente e do (…), ouvida em 05/12/2023, cuja duração da inquirição foi de 14h54m a 15h47m referiu:
De 15.39 a 15.56
Testemunha: Eles faziam vida de casal na casa dos pais dela, sei que ele ajudava financeiramente os pais dela, contribuía para as despesas e sei que ajudava também ela com tudo.
De 17.22 a 17.27
Testemunha: A carteira é só uma num casal, a carteira é só uma.
De 41.19 a 41.42
Testemunha: Usei a expressão da carteira é só uma. Na minha casa a carteira é só uma paga-se as contas e o que sobrar e dos dois e ali era igual.
Advogado: Como é que sabe isto tudo?
Testemunha: Porque falava com a (…), porque o (…)também dizia. A (…) bastava dizer gosto daquele sapatos, o (…) fazia questão da (…) ter aqueles sapatos, nós íamos jantar …
Advogado: Era o (…) que pagava?
Testemunha: O (…) pagava.
Testemunha (…), que tinha um café junto à casa onde a Recorrente e o (…) residiam ouvida em 05/12/2023, cuja duração da inquirição foi de 14h21m a 14h54m referiu:
De 06.31 a 06.46:
Testemunha: Era o (…) que pagava as contas todas da (…), lá no meu café não é! Agora lá de fora não sei! E ele comentava comigo: “Olha este mês a conta é mais pequena já posso dar mais à (…)!”. Se dava se não dava também não sei, não é?
De 19.12 a 19.33:
Mmo Juiz: Quando diz que foi para a Suíça … fazer o quê? Trabalhar?
Testemunha: Trabalhar! Ele até comentou: “Pode ser que agora quando a gente … a ver se a gente se orienta mais, a gente arranja a nossa casa e quero ter um filho com a (…)!” É o que eu sei, não sei mais nada!
De 20.40 a 21.03:
Testemunha: Então eu vou-lhe explicar! O (…) comentava, ele dava-se muito bem com o meu marido, ainda mais do que eu porque eram homens! O (…) chegava a dizer que ganhava 800/900 euros e dava € 400 à (…) para as despesas da casa e pagava a conta do café não ficava com muito dinheiro para ajudar mais ninguém.
De 30.20 a 30.34:
Testemunha: “Olhe agora já vou ganhar mais pode ser que agora consiga endireitar e que a (…) arranje ai uma coisinha qualquer e a gente já dê para pagar uma casinha e gostava de ter um filho com a (…).” Isso disse-me muita vez!
Testemunha (…), testemunha da Recorrida (…) Seguros e mãe do (…) ouvida em 02/02/2024, cuja duração da inquirição foi de 12h16m a 12h43m referiu:
De 24.38 a 24.43
Advogada da Recorrente: Ele dava-lhe o dinheiro todo que ganhava?
Testemunha: Pois ele dava-lhe o dinheiro todo que ganhava.
9.ª Com o devido respeito pela opinião em contrário, face aos factos dados como provados, mesmo que não se tivesse provado as partilhas a nível familiar e económico, o que apenas por hipótese se admite, tal não deve ser fundamento para não se provar a união de facto, porquanto:
a) Há pessoas mais reservadas e que não gostam de conviver nem não dão a conhecer a sua vida familiar e económica e o facto da Recorrente e o (…) não terem conseguido ter casa própria necessariamente fazia com que tivessem mais dificuldade em receber amigos e familiares;
b) A Recorrente não trabalhava o que fazia com que não pudessem sair e conviver com tanta regularidade;
10.ª A Recorrente e o (…) faziam as refeições juntos, dormiam juntos, esta cuidava da roupa de ambos, repartiam as despesas da casa onde moravam, viviam em plena comunhão de vida, amparavam-se e protegiam-se mutuamente na sua vida quotidiana, comportando-se e agindo reciprocamente como se fossem marido e mulher e assim eram vistos por toda a gente, nomeadamente pelos conhecidos, familiares e amigos, conforme consta dos depoimentos datilografados das testemunhas que se juntam (Doc. 1), dos quais se destacam:
Testemunha (…), ouvida em 05/12/2023, cuja duração da inquirição foi de 15h47m a 16h41m referiu:
De 04.40 a 05.25:
Testemunha: O (…) viveu na minha casa.
(…)
Testemunha: Não! Era o meu genro, estava com a minha filha, viveram juntos!
Advogada da Recorrente: Viveram juntos quanto tempo?
Testemunha: 6/7 anos
(…)
Testemunha: Juntaram-se é a mesma coisa que a irmã, não são casados.
De 05.55 a 06.23:
Testemunha: As filhas são juntas.
Advogada da Recorrente: São juntas, é a expressão que nós utilizamos! Pois, é isso … Para si estar junto é a mesma coisa que estar casado?
Testemunha: Sim!
Advogada da Recorrente: Então e a sua filha … viviam só os dois?
Testemunha: Não! Eles namoraram e depois pediram-me para ver se os deixava ir para lá.
De 08.25 a 08.35
Testemunha: A minha filha tinha um quarto, a casa é de 3 quartos e ela tinha o quarto dela e foi para aí que foram morar, dormir, nesse quarto!
De 16 a 16.08
Testemunha: A mãe do (…) ligou para a (…) para saber se tinha a carteira com os documentos do (…) isso eu lembro-me bem.
De 22.36 a 22.50:
Testemunha: Ele dava o dinheiro eu só dava a casa, o quarto onde dormiam porque ela é que fazia o comer dele e lavava a roupa dele.
De 23.05 a 23.15:
Testemunha: A gente combinava, “Olha (…), vê lá se tens roupa tua e do (…) lava que eu depois tenho a minha e a do teu pai.” Era assim!
De 40.38 A 41.16:
Mma Juiz: E como é que faziam a divisão das contas fixas? Água, luz e gás?
Testemunha: Ou pagávamos a metade da fatura os dois ou ele pagava uma metade e eu pagava a outra metade, ou, uma vez pagava ele e outra pagava eu, fazíamos assim!
Testemunha (…), amiga da Recorrente e do (…), ouvida em 05/12/2023, cuja duração da inquirição foi de 14h54m a 15h47m referiu:
De 2.25 a 2.34
Testemunha: Porque conhecia o (…) e tive com o (…) uma vez no café que veio passar um fim de semana com o (…) e com a (…).
De 6.19 a 6.31
Testemunha: Nós estávamos algumas vezes juntos, eles frequentavam a minha casa, eu frequentava a casa da D. (…), íamos ao café e tínhamos saídas juntos.
De 6.42 a 6.53
Testemunha: Jantávamos, bebíamos às vezes lá café, outras vezes costumávamos ir ao (…) que é o café que nós costumávamos frequentar.
De 15.39 a 15.56
Testemunha: Eles faziam vida de casal na casa dos pais dela, sei que ele ajudava financeiramente os pais dela, contribuía para as despesas e sei que ajudava também ela com tudo.
De 17.42 a 17.56
Testemunha: Eram um casal, viviam juntos na mesma casa.
Advogada da Recorrente: E a (…) e o (…) nunca chegaram a ter filhos, nunca falaram nisso? Viver juntos noutro sitio? Sozinhos?
Advogada da Recorrente: Viviam na mesma casa podiam ser …
Testemunha: Viviam na mesma casa no quarto dela.
Advogada da Recorrente: Como é que a senhora sabe disso?
Testemunha: Porque eu frequentava a casa da D. (…).
De 24.10 a 24.44
Testemunha: Eu julgo que é 2011 que eles começaram a namorar e namoraram cerca de 2 meses e juntaram-se logo.
Testemunha: Sim, sim houve esse tipo de conversas em morarem juntos, em terem filhos. Só que nunca se proporcionou porque queriam ter mais estabilidade.
Advogada da Recorrente: E o que quer dizer morarem juntos?
Testemunha: Terem uma casa só para os dois.
A testemunha (…), ouvida em 05/12/2023, cuja duração da inquirição foi de 14h21m a 14h54m referiu:
De 04.20 a 06.02
Advogada da Recorrente: Senhora sabe quando se refere ao (…), o que é que o (…) era à (…)?
Testemunha: Viviam maritalmente, não sei se eram casados mesmo mas viviam juntas.
Advogada da Recorrente: E porque é que a senhora e porque é que acha que viviam juntos?
Testemunha: Dormiam juntos, faziam tudo juntos é o mesmo que eu com o meu marido só que eles não tinham uma casa deles viviam com a D. (…) na casa dona … sempre viveram com ela.
Advogada da Recorrente: E porque é que acha que vivem juntos? Não podiam ser só namorados (…) qual é a diferença?
Testemunha: Para mim se se, peço desculpa de estar a dizer … mas se vive, se dormem juntos, comem juntos, o dinheiro do (…) era o dinheiro da (…), pelo aquilo que me apercebi e me contava o (…), acho que são marido e mulher né, pelo menos é assim que …
(…)
De 06.31 a 06.46:
Testemunha: Era o (…) que pagava as contas todas da (…), lá no meu café não é! Agora lá de fora não sei! E ele comentava comigo: “Olha este mês a conta é mais pequena já posso dar mais à (…)!”. Se dava se não dava também não sei, não é?
De 17 a 17.12:
Testemunha: Aliás, o irmão quando … chegou a ir umas quantas vezes, umas quantas vezes ao fim de semana ao café. Ia com ele e com a (…), o irmão se calhar também sabe (…)
De 19.12 a 19.33:
Mmo Juiz: Quando diz que foi para a Suíça … fazer o quê? Trabalhar?
Testemunha: Trabalhar! Ele até comentou: “Pode ser que agora quando a gente … a ver se a gente se orienta mais, a gente arranja a nossa casa e quero ter um filho com a (…)!” É o que eu sei, não sei mais nada!
De 20.40 a 21.03:
Testemunha: Então eu vou-lhe explicar! O (…) comentava, ele dava-se muito bem com o meu marido, ainda mais do que eu porque eram homens! O (…) chegava a dizer que ganhava 800/900 euros e dava € 400 à (…) para as despesas da casa e pagava a conta do café não ficava com muito dinheiro para ajudar mais ninguém.
De 30.20 a 30.34:
Testemunha: “Olhe agora já vou ganhar mais pode ser que agora consiga endireitar e que a (…) arranje ai uma coisinha qualquer e a gente já dê para pagar uma casinha e gostava de ter um filho com a (…).” Isso disse-me muita vez!
11.ª Na fundamentação da Douta Sentença Recorrida consta que a Recorrente não pagou o funeral, porém, com o devido respeito pela opinião em contrário tal não prova que não vivesse em união de facto com o (…), mas apenas que não estava em condições de tratar do mesmo, o que é perfeitamente normal face às circunstâncias da morte e face aos factos provados consta que ficou em choque e desequilibrou-se psicologicamente, além de que conforme consta do facto provado n.º 39 os pais do (…) receberam da seguradora o valor que gastaram no funeral.
12.ª Na Douta Sentença Recorrida descredibilizou-se o depoimento das testemunhas da Recorrente por:
a) Não referirem as desavenças existentes entre a Recorrente e o (…), contudo, mesmo que as mesmas tivessem existido, o que apenas por hipótese se admite, tal é uma situação normal num casal que viveu em comum durante vários anos e não temporariamente e que não viveu apenas um relacionamento amoroso conforme consta da fundamentação da Douta Sentença Recorrida e seria grave se tal chegasse ao domínio público;
b) A testemunha … (amiga de infância da A.) ter deixado de residir no bairro em 2008 e ter perdido o contacto com a Recorrente quando a mesma ouvida em 05/12/2023, cuja duração da inquirição foi de 14h54m a 15h47m refere em 4.50 a 4.53, 6.08 a 6.12. 6.19 a 6.31, 6.43 a 6.53, que apesar de não residir no bairro manteve sempre o contacto com a Recorrente e com o (…) e com os mesmos continuou a conviver;
c) O depoimento da testemunha (…) que tinha um café junto à residência da Recorrente e do (…), que os mesmos frequentavam regularmente por não ter consistência, quando, conforme consta do seu depoimento dactilografado que se junta (Doc. 1) o mesmo foi isento e credível.
13.ª Assim, face à declaração da junta de freguesia junta aos autos e ao depoimento das testemunhas, constante do documento 1, deve alterar-se o n.º 68 dos factos provados e dar-se como provado que: “A Autora viveu em união de facto com o (…) durante mais de 2 anos e até à data do óbito do mesmo ocorrido em 21/06/2018.”
14.ª A Recorrente louva-se na fundamentação da Douta Sentença Recorrida quanto ao dano morte e quanto ao valor fixado de € 95.000,00, pelo que face à união de facto existente entre a Recorrente e o (…), pelo que deve alterar-se a Douta Sentença Recorrida e condenar-se a Recorrida (…) a pagar à Recorrente e ao Autor (…) o valor da indemnização inerente ao dano morte em partes iguais.
15.ª Dos factos provados da Douta Sentença Recorrida destacam-se os seguintes:
a) A morte repentina de (…), causou grande choque à Autora e esta desequilibrou-se psicologicamente (n.º 66 dos factos provados).
b) Ainda hoje a Autora não conseguiu refazer a sua vida e chora quando se lembra do … (n.º 67 dos factos provados).
16.ª Com efeito, face aos factos dados como provados é evidente que a morte trágica, inesperada e repentina do (…) com apenas 31 anos de idade (facto provado n.º 43), fez com o que o sonho de continuarem a vida em comum “ruísse”, o que causou enorme sofrimento à Recorrente, pois num momento despede-se do (…), este sai de casa e vai trabalhar e nas horas seguintes tem o trágico acidente e morre.
17.ª A Recorrente nasceu em 19/7/1988, pelo que tinha apenas 29 anos de idade quando ficou “viúva”, desequilibrou-se psicologicamente (facto provado n.º 66) e nunca mais conseguiu refazer a sua vida (facto provado n.º 67), pelo que os danos morais sofridos pela mesma são muito graves e devem ser valorados em € 30.000,00.
18.ª Conforme consta dos factos provados n.º 35 e 60 o (…) à data do sinistro trabalhava como montador de andaimes para (…) e ganhava um ordenado base de € 580,00 e um subsídio de alimentação de € 93,94, ou seja, € 9.153,34 anuais.
19.ª A Recorrente e o (…) viviam em união de facto e a mesma não trabalhava (facto provado n.º 61), pelo que o único rendimento do casal era o vencimento do (…), o qual entregava à mesma, conforme facto provado n.º 62 entre € 400,00 a € 500,00 mensais para esta fazer face às despesas do lar.
20.ª De acordo com o facto provado 43, o (…) tinha 31 anos de idade à data da morte, pelo que tinha 47 anos de vida ativa, tendo em conta que a esperança média de vida para os homens é de 78 anos e considerando que apenas entregava à Recorrente € 400,00 mensais, durante os 47 anos de vida ativa, se fosse vivo, teria entregue € 225.600,00 (400€ x 12 meses x 47 anos), pelo que abatendo-se 12,5%, conforme referido em 67, deve ser fixada a quantia de € 197.400,00 (225.600€-12,50%) por danos patrimoniais a atribuir à Recorrente.
21.ª Na Douta Sentença Recorrida foi feita uma interpretação errada do disposto nos artigos 2.º-A, n.º 4, da Lei 7/2001, 82.º, 303.º, n.º 2, 369.º, n.º 1, 370.º, n.ºs 1 e 2, 371.º, 394.º, n.º 1, 483.º, 496.º e 1680.º do Código Civil e 13.º do CIRS.
Nestes termos e nos demais de direito deve alterar-se a Douta Sentença Recorrida e em consequência:
a) Alterar-se n.º 68 dos factos provados e dar-se como provado que: “A Autora viveu em união de facto com o (…) durante mais de 2 anos e até à data do óbito do mesmo ocorrido em 21/06/2018.”;
b) Condenar-se a Recorrida (…) Seguros a pagar à Recorrente a quantia de € 282.400,00, acrescida de juros legais desde a citação e até integral pagamento.

Alegações da Autora (…) e conclui pela forma seguinte:
1.ª – A decisão judicial sob recurso procedeu a uma correcta e ponderada aplicação do direito aos factos provados e é, s.m.o., imerecedora de qualquer censura. Donde, afigura-se que a pretensão recursiva da recorrente deverá improceder.
2.ª - Na verdade, entendemos que a convicção formada pelo Exmo. Juiz a quo, no que a este particular diz respeito, foi prudente e ponderada, pelo que o recurso oferecido pelos Recorrentes tem de ser julgado improcedente.
Termos em que, nos melhores de Direito e com o sempre mui douto suprimento de Vossas Exas., deve o presente recurso ser considerado improcedente, mantendo-se a douta decisão recorrida.

*

2. Objecto do recurso

Sendo o objecto do recurso definido pelas conclusões das alegações, impõe-se conhecer das questões colocadas pelos recorrentes e as que forem de conhecimento oficioso, sem prejuízo daquelas cuja decisão fique prejudicada pela solução dada a outras, artigos 608.º, n.º 2, 609.º, 635.º, n.º 4, 639.º e 663.º, n.º 2, todos do CPC. As questões que importa apreciar e decidir são
- da união de facto entre a Autora (…) e (…);
- do montante da indemnização peticionada pelos Autores no âmbito de contrato de seguro de responsabilidade civil do ramo automóvel.
*

3. Factos provados

1- No dia 21/06/2018 pelas 6h54, ocorreu um embate, na EN 5, Km 34, (…), concelho de Palmela, entre duas viaturas ligeiras;
2- Foram intervenientes no embate o veículo automóvel ligeiro de mercadorias, com a matrícula espanhola (…), de marca Renault e o veículo automóvel ligeiro de passageiros com a matrícula (…), de marca Mercedes‐Benz;
3- O veículo com a matrícula espanhola (…) era um ligeiro de mercadorias de marca Renault, Modelo Master, conduzido por (…), natural de Espanha, com a apólice de seguros n.º (…), tendo transferido para (…), Seguros Gerais, S.A. a respetiva responsabilidade civil;
4- O outro veículo interveniente no embate era um ligeiro de passageiros, marca Mercedes-Benz, Modelo Vito, com a matrícula (…), com a apólice de seguros n.º (…), segurado pela Ré (…) Seguros – Companhia de Seguros de (…), SA, tendo transferido para a Ré a respetiva responsabilidade civil;
5- (…) era um dos ocupantes da viatura com a matrícula (…), de marca Mercedes-Benz;
6- O Autor (…) é filho de (…);
7- O veiculo Mercedes-Benz era conduzido por (…), também falecido no local do acidente;
8- Do embate, resultaram seis vitimas mortais, todos ocupantes do veículo de matrícula (…) e dois feridos graves: (…) e (…);
9- (…) era ocupante da viatura com matrícula (…);
10- No momento da ocorrência foi o NICAV de Grândola informado do embate tendo deslocado uma equipa de investigação que fotografou o local do acidente, vestígios existentes, veículos intervenientes e vítimas tendo sido atribuído o NUIPC 72/18.1gtstb ao inquérito iniciado na sequência do embate;
11- Foi proferido relatório final pelo NICAV datado de 24.04.2019 de onde consta “o condutor (…), circulava com o veículo de matrícula (…) na estrada nacional (N) n.º 5 no sentido norte/sul, aproximadamente ao km 34, ao descrever uma ligeira curva para a esquerda perdeu o controlo do veículo, entrando em despiste para a via do sentido oposto atravessando‐se na frente do veículo de matrícula (…), conduzido por (…), que não teve tempo de reação para efectuar qualquer manobra evasiva para evitar a colisão fronto‐lateral.”;
12- No local do acidente compareceram duas viaturas rápidas VMER, com as respectivas tripulações, que providenciaram pela evacuação dos feridos, tendo o médico com a cédula profissional (…) verificado os óbitos das vítimas;
13- O pai do autor, (…), faleceu no local, tendo sido transportado para o hospital já sem vida;
14- Do exame do hábito externo, resulta que o pai do autor sofreu as seguintes lesões: Cabeça: feridas contusas múltiplas na região frontal mediana. Ferida contusa avulsiva com 10 cm na região temporal direita. Ferida contusa com 3 cm na região occipital direita (…);
15- Membro superior direito: escoriações múltiplas no dorso da mão (…);
16- Membro superior esquerdo: escoriações múltiplas no dorso da mão (…);
17- Membro inferior direito: fractura fechada no terço medio da coxa (…);
18- Do exame do hábito interno, foram ainda verificadas as seguintes lesões: Cabeça Ossos da cabeça – base, com fractura do terço medio da base (…)
19- Encéfalo: hemorragia subaracnoideia difusa – hemorragias ventriculares. foco de contusão hemorrágico frontal, temporal e occipital à direita (…)
20- Aparelho auditivo: Otorragia bilateral.
21- Torax Esterno: fractura do terço superior (…)
22- Clavícula, cartilagens e costelas direitas: fractura da totalidade das costelas ao nível dos arcos costais posteriores (…)
23- Clavícula, cartilagens e costelas esquerdas: fractura da totalidade das costelas ao nível dos arcos costais posteriores (…)
24- Pleura parietal e cavidade pleural direita: hemotórax com 500ml (…)
25- Pleura parietal e cavidade pleural esquerda: hemotórax com 300ml (…)
26- Pulmão direito e pleura visceral: laceração do lobo medio e inferior (…)
27- Pulmão esquerdo e pleura visceral: laceração do lobo medio e inferior (…)
28- Abdómen - Peritoneu e cavidade peritoneal: hemoperitoneu com 500 ml (…)
29- Fígado: lacerações múltiplas (…)
30- Baço: lacerações múltiplas (…)
31- Rim esquerdo: laceração do hilo (…)
32- Membros - Membro inferior direito: fractura do terço medio do fémur. (…)
33- Resulta do Relatório de autópsia que “1 ‐ A morte foi devida a lesões traumáticas de órgãos crânio‐toraco‐abdominias. 2 – A morte é de natureza violenta e causa acidental. 3 – As lesões traumáticas são compatíveis com a ocorrência de um acidente de viação conforme descrito. 4 – No cadáver o exame toxicológico foi negativo para pesquisa de álcool, drogas de abuso de medicamentos”;
34- O pai do autor deslocava-se para o seu local de trabalho, para desempenhar as suas funções, sendo um dos ocupantes da viatura sinistrada;
35- No âmbito do processo de acidente de trabalho n.º 5225/18.0T8STB que correu termos no Juízo de Trabalho de Setúbal, foi obtida conciliação das partes e proferida decisão de homologação do acordo obtido com a Seguradora (…) Companhia de Seguros, SA, no âmbito do qual foi considerado que «À data do acidente o sinistrado auferia a remuneração base de € 580,00 x 14 meses + subsidio de alimentação de € 93,94 x 11 meses, o que perfaz a retribuição anual bruta de € 9.153,34 encontrando-se transferida para a “(…), Companhia de Seguros, SA” a responsabilidade emergente por acidentes de trabalho. O sinistrado deixou como beneficiário legal o seu filho menor (…), nascido a 21-10-2009, sendo que os ascendentes auferem rendimentos mensais superiores à pensão social (…)
36- (…) A Seguradora pagará com início em 22.06.2018 os seguintes montantes:
37- (…) Ao filho do sinistrado a pensão anual de € 1.830,67 (€ 9.153,34 x 0,20);
38- (…) A Seguradora pagará o montante global de € 5.661,48 (€ 471,79 x 12) a título de subsídio por morte ao filho do sinistrado;
39- (…) e ainda a quantia de € 1.409,02 de despesas de funeral aos pais do sinistrado; (…)»;
40- A Ré (…) Seguros – Companhia de Seguros de (…), SA acordou com a (…) Companhia de Seguros, SA o pagamento do valor de € 36.495,41 correspondente à soma do valor já pago pela (…) de € 17.705,53 e de € 18.789,88 a título de provisão matemática para pagamentos futuros, mais acordando que a (…) nada mais tinha a reclamar da Ré no que ao presente pedido diz respeito;
41- Tendo sido proferida sentença de homologação do referido acordo;
42- Foi proferida decisão instrutória de não pronúncia do arguido (…), datada de 01.10.2020, no âmbito do processo n.º 72/18.1GTSTB;
43- (…) nasceu em 05/06/1987, tinha à data do embate, 31 anos de idade;
44- O pai do autor era uma pessoa saudável, alegre, que adorava conviver com os seus amigos;
45- O (…) acompanhava o desenvolvimento do seu único filho estando com o mesmo em fins de semana combinados com a mãe do menor;
46- O Autor nasceu em 21.10.2009; (corrigido por ser manifesto lapso).
47- O Autor tem muita dificuldade em falar do pai, fechando‐se um pouco, sendo que por vezes isola‐se e fica bastante triste;
48- O Autor, à data do acidente, tinha 9 anos de idade, e não obstante à data do acidente não se encontrar a residir permanentemente com o pai, existia proximidade entre ambos;
49- Após a morte do pai, o Autor deixou de dormir tranquilo, acordando constantemente, (…)
50- Não se querendo afastar da mãe, tinha e continua a ter medo de perder também a sua mãe e ficar sozinho;
51- O A Autor teve que tomar alguns ansiolíticos e recorrer à ajuda de um psicólogo;
52- O Autor tem muitas saudades de pai;
53- A faixa de rodagem onde ocorreu o embate é composta por duas vias de trânsito;
54- O (…) e o (…) circulavam em sentidos opostos, o (…) no sentido de Setúbal para Alcácer do Sal e o (…) no sentido de Alcácer do Sal para Setúbal;
55- As duas vias de trânsito eram delimitadas por linhas guias (marca M19) bem visíveis no pavimento e separadas por duas linhas longitudinais contínuas adjacentes (marca M1), separadoras de sentidos de trânsito;
56- O condutor do (…) perdeu o controlo da viatura, entrou em despiste e invadiu a via de trânsito do (…);
57- O condutor do (…) não teve tempo de travar nem fazer nenhuma manobra para evitar o embate fronto-lateral entre o (…) e o (…), a frente do (…) com a lateral direita do (…);
58- No momento do embate chovia com bastante intensidade, estando o piso da via molhado;
59- O acidente ocorreu às 6h54m e o óbito de (…) foi declarado às 07h55m;
60- A vítima trabalhava como montador de andaimes para (…);
61- A Autora (…) não trabalhava;
62- (…) transferiu para a Autora (…) em 06.10.2015 a quantia de € 500,00; em 03.11.2015 a quantia de € 490,00, em 05.11.2015 a quantia de € 490,00, em 03.12.2015 a quantia de € 490,00 e em 04.12.2015 a quantia de € 490,00;
63- A Autora (…) teve residência fiscal declarada em 18.06.2013, na Rua das (…), n.º 15, Setúbal, e em 07.09.2018 foi alterada a residência fiscal para Rua das (…), n.º 55, r/c, Dto., Setúbal, e em 31.10.2022 foi comunicada como residência fiscal da Autora Praceta (…), 13, Setúbal;
64- (...) manteve como domicilio fiscal e junto da Segurança Social a residência em Rua (...), (...), 2950-127 Palmela;
65- (…) apresentou declaração de IRS como único titular;
66- A morte repentina de (…) causou grande choque à Autora e esta desequilibrou-se psicologicamente.
67- Ainda hoje a Autora não conseguiu refazer a sua vida e chora quando se lembra do (…).
68- (…) e a Autora (…) mantiveram um relacionamento amoroso.
*

4. Factos não provados

a) O pai do Autor apercebeu-se que o condutor do veículo onde seguia perdeu o controlo do mesmo, entrando em despiste e por breves momentos teve consciência do acidente;
b) (…) agonizou durante 1 hora e apercebeu-se que ia morrer e deixar a Autora;
c) (…) fazia uso do cinto de segurança;
d) O condutor do (…) seguia a mais de 90 km/h e sem atenção ao trânsito;
e) A Autora viveu em união de facto com o (…) de 2011 e até à data do óbito do mesmo ocorrido em 21/06/2018;
f) (…) praticava desporto;
g) (…) auferia mensalmente € 1.000,00, contudo, apenas era declarado € 580,00 de salário e um subsídio de alimentação de € 93,94, o que corresponde a um rendimento anual de € 9.153,34, sendo o restante ordenado pago em numerário;
h) (…) entregava à Autora entre € 400,00 a € 500,00 mensais para esta fazer face às despesas do lar;
i) Eram um casal muito amigo e ainda pretendiam ter filhos em comum;
j) A Autora perdeu a alegria de viver, porque já não poderia concretizar o sonho de ter um filho com o (…).
*

5. Direito

A recorrente (…) pretende ver alterada a matéria de facto quanto ao facto provado 68º, por entender que os depoimentos das testemunhas reflectem e provam essa união de facto entre a Autora e o (…) e que estes viveram de forma regular em união de facto durante mais de dois anos e até à morte do mesmo.

Conforme se diz no artigo 1.º, n.º 2, da Lei n.º 7/2001, de 11 de Maio, na redacção dada pela Lei n.º 23/2010, de 30 de Agosto, “… A união de facto é a situação jurídica de duas pessoas que, independentemente do sexo, vivam em condições análogas às dos cônjuges há mais de dois anos …”.

Conforme ensinam Pereira Coelho e Guilherme de Oliveira in Curso de Direito de Família, 3ª Ed., Coimbra Editora, pág. 124, “… Fundamental é que os membros da união de facto vivam como sendo casados, em comunhão plena de vida, criando uma aparência de vida matrimonial …”.

Neste mesmo sentido veja-se o Acórdão Uniformizador de Jurisprudência 7/2017 “… a união de facto constitui-se quando duas pessoas se juntam e passam a viver em comunhão de leito, mesa e habitação …”.

E como se diz no Acórdão da Relação de Coimbra de 12.12.2017 proc. n.º 2292/16.4T8CTB.C1, “… Do exposto, pode dizer-se que a doutrina e jurisprudência (sendo esse o entendimento que perfilhámos) apontam como linha comum da união de facto a existência de um projeto de vida em comum, análogo à vivência marital, ou seja, aos cônjuges, sendo que esse projeto de vida em comum deve ser concretizado por uma comunhão plena de vida, nomeadamente por uma comunhão de mesa, leito e habitação, que deve perdurar, em termos de estabilidade, por um período temporal superior a dois anos, tudo se passando, no fundo, como se efetivamente de marido e mulher se tratassem …”.

Atento tudo o exposto e os factos dados por provados entendemos não se poder concluir que à data da morte do (…) este e a Autora (…) viviam numa situação de união de facto.

Entre eles não existia um projecto de vida em comum, uma comunhão plena de vida, a matéria de facto provada retracta uma relação amorosa, mas mantendo cada um a sua independência e sem partilharem um projecto de vida em comum.

Afirma-se que este entregaria determinadas quantias, por transferência bancária, à Autora (…), mas sempre de uma forma vaga, sem se conhecerem montantes, com que periodicidade e a que se destinavam tais quantias, nem tão pouco comprovativos dessas transferências.

O resultar provado que por vezes pernoitavam juntos, iam ao café com amigos ou tomavam refeições, só por si é escasso para se poder falar e dar como provado existir uma plena comunhão de vida em que tudo se passava como se efectivamente de marido e mulher se tratassem.

Deste modo, mantém-se inalterada a redacção do n.º 68 dos factos provados e consequentemente a sentença proferida pelo tribunal a quo quanto à Autora (…) por não se provar a existência de uma união de facto entre eles.

Ao manter-se inalterada a decisão sobre a matéria de facto, não existe qualquer outro argumento no recurso interposto pela Recorrente (…) susceptível de permitir a alteração do julgamento efectuado e deste modo adere-se à fundamentação da decisão recorrida, sem qualquer alteração, devendo o recurso ser rejeitado e mantida a decisão sob recurso.

Analisando de seguida o recurso interposto pela Ré seguradora, pretende esta que as indemnizações arbitradas quer pela perda do direito à vida quer a título de danos não patrimoniais são exageradas devendo em substituição ser arbitradas indemnizações cujos montantes não excedam os € 70.000,00 e € 30.000,00 respectivamente.

Conforme resultou provado o (…) tinha à data da sua morte 31 anos de idade, sendo uma pessoa saudável, exercia a profissão de montador de andaimes, com largos anos de expectativa de vida.

E mais resultou provado que “… 47 - O A tem muita dificuldade em falar do pai, fechandose um pouco, sendo que por vezes isola-se e fica bastante triste.
48- O A. à data do acidente, tinha 9 anos de idade, e não obstante à data do acidente não se encontrar a residir permanentemente com o pai, existia proximidade entre ambos;
49- Após a morte do pai, o autor deixou de dormir tranquilo, acordando constantemente, (…)
50- Não se querendo afastar da mãe, tinha e continua a ter medo de perder também a sua mãe e ficar sozinho;
51- O A autor teve que tomar alguns ansiolíticos e recorrer à ajuda de um psicólogo;
52- O autor tem muitas saudades de pai …”
Como se diz no Acórdão deste Tribunal da Relação de Évora de 11. 02. 2025 processo n.º 96/19.1GTEVR.E1 in www.dgsi.pt “… A indemnização por danos não patrimoniais tem em vista compensar de alguma forma o lesado pelos sofrimentos e inibições que sofreu em consequência do evento danoso, compensação que só será alcançada se a indemnização for adequada e significativa do ponto de vista financeiro e não meramente simbólica.

Tal compensação deve “ser proporcionada à gravidade do dano, tomando-se em conta, na sua fixação, todas as regras de boa prudência, de bom senso prático, de justa medida das coisas, de criteriosa ponderação das realidades da vida”.

Todavia, no critério a adoptar, não se devem perder de vista os padrões indemnizatórios decorrentes da prática jurisprudencial, procurando – até por uma questão de justiça relativa – uma aplicação tendencialmente uniformizadora ainda que evolutiva do direito, como aliás impõe o n.º 3 do artigo 8.º do CC.

Analisando a prática dos tribunais, constatamos que os quantitativos indemnizatórios, que antes eram quase simbólicos, têm vindo progressivamente a subir nos últimos anos.

Neste sentido veja-se o Acórdão do STJ de 27.09.2022 processo n.º 253/17.5T8PRT-A.P1.S1 em que se diz no Sumário “… II – Por sua vez, os danos de cariz patrimonial daí decorrentes sofridos por aqueles seus familiares-herdeiros são danos próprios dos mesmos, cujo direito de indemnização radica “ab initio” na sua esfera jurídica.

III – Todos esses danos, e particularmente aquele decorrente da perda do direito à vida, devem ser condignamente indemnizados/compensados, tendo sempre como critério nuclear de fundo a equidade, embora sem perder de vista o recurso a outros elementos circunstanciais, quer aqueles de carácter mais geral, e particularmente aqueles que a lei manda atender, quer aqueles que resultam da peculiaridade de que se reveste o caso concreto.

IV – À luz desses critérios mostra-se minimamente ajustado compensar o dano decorrente da perda do direito à vida da falecida com o montante indemnizatório de € 85.000,00, na sequência de um acidente de viação para o qual não contribuiu, tendo na altura 41 anos de idade e sendo então uma pessoa saudável, feliz/alegre, com família constituída, com um agregado familiar composto pelo seu marido e uma filha menor, e estabilizada profissionalmente …”.

Face ao exposto e aos factos que resultaram provados, entendemos ser de manter aqueles valores indemnizatórios de respectivamente € 85.000,00 pela perda do direito à vida e de € 40.000,00 pelos danos não patrimoniais.

Sumário (…)


*

6. Decisão

Pelo exposto decide-se:

a) Julgar improcedente o recurso interposto pela Recorrente (…) e manter a decisão recorrida.

b) Julgar parcialmente procedente o recurso interposto pela Recorrente (…) Seguros – Companhia de Seguros de (…), S.A. e manter as indemnizações arbitradas em 1ª Instância de:

- € 85.000,00 (oitenta e cinco mil euros) a título de perda do direito à vida, e;

- € 40.000,00 (quarenta mil euros) pelos danos não patrimoniais, sofridos pelo Autor (…).

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Custas por Autores e Ré na proporção do decaimento e sem prejuízo do benefício de apoio judiciário concedido.

Notifique.

Évora, 27. 02. 2025

José Saruga Martins (Relator)

José Manuel Tomé de Carvalho (1º Adjunto)

Isabel de Matos Peixoto Imaginário (2ª Adjunta)