I- Os documentos que se encontram juntos aos autos não são de leitura ou visionamento obrigatórios em audiência, considerando-se examinados e produzidos em audiência, independentemente de nesta ter sido feita a sua leitura ou visionamento, não constituindo prova proibida.
II- Não há insuficiência da matéria de facto para a decisão se a factualidade apurada é idónea ao preenchimento dos elementos objectivos e subjectivos do tipo legal do crime pelo qual o arguido foi condenado, bem como à determinação da pena e dos montantes indemnizatórios.
III- Não há erro notório quando os factos estão descritos de forma clara e perceptível, não existe qualquer contradição entre a matéria de facto provada e não provada, todos os factos se mostram fundamentados, de forma lógica e coerente, e a decisão do Tribunal funda-se na prova produzida, estando em conformidade com a mesma.
IV- O recorrente que invoca a existência de um erro de julgamento tem que apontar na decisão recorrida os segmentos que impugna e colocá-los em relação com as provas, concretizando as partes da prova gravada que pretende que sejam ouvidas e que sustentam uma decisão diversa, quais os documentos que pretende que sejam reexaminados, bem como quais os outros elementos probatórios que pretende ver reproduzidos, demonstrando a verificação do erro judiciário a que alude.
V- Quando nada na acusação se reporta ao ofendido para se poder concluir da prática pelo mesmo de algum ilícito criminal, a sentença também não o pode condenar pela prática de qualquer crime, sob pena de ser uma decisão ferida de nulidade.
VI- O Tribunal da Relação não pode julgar em primeira instância o ofendido relativamente aos crimes que o arguido lhe imputa em sede de recurso e que não foram objecto de investigação criminal nos autos, nem de condenação pelo Tribunal a quo.
No processo comum singular nº 535/22.4PBSTR, Tribunal Judicial da Comarca de …, Juízo Local Criminal de …- Juiz …, foi proferida sentença, datada de 11/06/2024, de cuja parte decisória consta o seguinte:
“Tudo visto e ponderado, este tribunal decide julgar a pronuncia procedente, por provada e, consequentemente:
» Parte Criminal:
- Condenar o arguido AA, pela prática de um crime de ofensa à integridade física simples, previsto no art.º 143.º, n.º 1 do CP, na pena de 170 dias de multa, à taxa diária de €7,00, num total de €1.190,00. (…)
» Parte Cível:
- Condenar o arguido/demandado AA, a pagar ao Centro Hospitalar …, o valor de €250,46, acrescido de juros à taxa de natureza civil, desde a notificação do pedido e até efetivo e integral pagamento.
- Condenar o arguido/demandado a pagar ao Hospital Distrital de …, demandante, a quantia de €300,10, acrescida de juros, à taxa de natureza civil, desde a notificação do pedido cível, e até efetivo e integral pagamento. (…)”
*
Inconformado com aquela decisão, veio o arguido interpor recurso, formulando as seguintes conclusões:
“ 1) Do decurso processual relevante: o processo iniciou com o Auto de Denúncia, por iniciativa do alegado Ofendido, 2 dias depois de alegadamente ter ocorrido o crime em causa (crime de ofensa à integridade física simples, p. e p. artigo 143.º, n.º 1, do CP), no qual se fez constar o supratranscrito;
2) No dia 28.07.2022, pelas 14h, data em que se encontrava agendada a perícia médico-legal através de Ofício do INML… ao Tribunal, o Ofendido não compareceu;
3) Ainda em sede de inquérito, foram inquiridas 4 testemunhas, sendo que nenhuma delas declarou ter presenciado as alegadas agressões, tendo ainda sido inquirido o Arguido no dia 19.12.2022, altura em que declarou supratranscrito;
4) Resulta do Aditamento n.º 9, no dia 04.01.2023 que compareceu na Esquadra BB, o qual entregou uma Pen Drive de cor vermelha escura, contendo imagens de videovigilância do possível ilícito ocorrido no seu Estabelecimento …, em …, tendo sido emitida pelo MP, em 10.01.2023, uma Promoção, no sentido de delegar ao OPC investigante para visualizar e, se pertinente, extrair fotogramas e elaborar o respetivo Relatório, o que aconteceu no dia 27.02.2023, do qual resulta supratranscrito, sendo certo que as imagens estão impercetíveis e do Autor e respetivas legendas das imagens não se faz qualquer referência a nenhuma agressão;
5) No dia 29.05.2023, o Arguido requereu, nos termos dos artigos 89.º e 90.º do CPP ex vi 32.º da CRP, o processo devidamente digitalizado, o qual foi remetido, via correio eletrónico, ao ora subscritor da presente peça, no dia 05.06.2023, sucedendo que não foi procedida a remessa do suporte digital (pen-drive) de fls. 125;
6) No dia 05.06.2023 o MP emitiu Acusação, com conteúdo diferente da Denúncia do Ofendido, na medida em que acusa o Arguido de agarrar e arrastar o Ofendido para a porta do Estabelecimento …, acusa o Arguido de desferir murros contra o Ofendido na rua do referido estabelecimento (e não no interior, como se queixou o Ofendido), e acusa o Arguido de ter provocado no Ofendido danos que determinaram um período de 7 dias para a cura, dos quais 4 com incapacidade para o trabalho geral, quando o Ofendido tinha já declarado expressamente, em 19.12.2022, não tinha estado nenhum dia de baixa nem tinha estado impedido de exercer a sua profissão ou atividade profissional;
7) O Arguido requereu a abertura de instrução, alegando e requerendo o supratranscrito, tendo sido emitido Despacho de Pronúncia, em 07.11.2022, tendo o Arguido contestado, alegando o supratranscrito;
8) Nas suas Alegações orais finais, o MP salientou que:
a. Não se confirma o relato do alegado Ofendido quando afirma que os factos ocorreram no chão do estabelecimento de diversão noturna em causa, não existindo um qualquer suporte testemunhal nesse sentido, tanto mais que é possível verificar, pela prova efetivamente produzida, que quer a queda, quer o levantamento do alegado Ofendido e Arguido se procederam de forma muito rápida, não havendo tempo suficiente para os alegados socos contra o alegado Ofendido terem aí ocorrido;
b. Não obstante a informação clínica junta aos autos, a verdade é que, face à prova produzida, permanece muito em dúvida a sua causa, existindo algumas reservas quanto à imputação da mesma ao Arguido;
c. Embora seja possível observar que há um braço esquerdo do Arguido, a verdade é que existiram vários testemunhos que referiram, de forma isenta, clara e coerente, que a queda foi quer do Arguido, quer do alegado Ofendido, a qual terá sido motivada por um fator externo, designadamente o facto de o concreto piso do estabelecimento em causa se encontrar naturalmente escorregadio;
d. Relativamente às imagens do sistema de videovigilância do estabelecimento em causa, e que estão analisadas junto aos autos através do Agente Principal da Polícia de Segurança Publica ( CC), delas não se retira a qualidade das imagens suficiente para imputar o Arguido de qualquer crime, tanto mais que, como disse o Sr. Agente principal, na qualidade de testemunha, que não era possível a identificação do segurança, atendendo até ao baixo nível de definição das imagens em causa e ao facto de as circunstâncias terem ocorrido num ambiente escuro, como é o da discoteca;
9) Foi proferida Sentença de que ora se recorre, na qual se condenou o Arguido;
10) II – Da Impugnação da decisão relativa à matéria de facto: dos elementos dos autos e de toda a prova produzida em sede de Audiência e Julgamento, entende-se que deverá ser alterada a decisão proferida quanto à matéria de facto, nos termos dispostos no artigo 410.º, n.º 2 CPP;
11) DOS CONCRETOS PONTOS DE FACTO QUE CONSIDERA INCORRETAMENTE JULGADOS COMO PROVADOS: foram incorretamente julgados como “provados” os pontos de facto com os n.os 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9 e 10, e foram incorretamente julgados como “não provados” os factos incluídos na alínea C), todos constantes na Sentença recorrida;
12) DAS CONCRETAS PROVAS QUE IMPÕEM DECISÃO DIVERSA DA RECORRIDA: Não é verdade que “foram apresentadas duas versões dos acontecimentos. Uma pelo Arguido e outra pelo ofendido” (p. 10 da Sentença), pois, na verdade, o que sucedeu foi a apresentação do alegado Ofendido de várias versões, sendo que pelo Arguido (e testemunhas) se manteve sempre pela mesma e única só versão, com a perceção dos vários ângulos possíveis, versão, essa, que corresponde com a realidade dos factos;
13) Sob os factos probandos em causa, foi ouvido o Arguido/Recorrente (cujo depoimento foi gravado no sistema digital integrado no sistema informático, cujo nome é “Diligencia_535-22.4PBSTR_2024-05-27_10-01-17”, iniciando o mesmo pelas 10.05 horas e terminando pelas 10.30 horas) e analisadas essas declarações, dúvidas não existem de que:
a. Cerca das 4 horas da manhã (“a meio da noite”), na pista de dança, da zona VIP (zona VIP, essa, que tinha umas escadas “de um lado e do outro”), da discoteca “…” (a qual se encontrava lotada, encontrando-se as pessoas “encostadas umas às outras” e que encerrava às 7h), o Sr. DD, que estava com duas raparigas no referido estabelecimento de diversão noturna, tinha sofrido prévia provocação/agressão por parte do Ofendido, que aí também se encontrava;
b. Tal provocação perpetrava-se pelo alegado Ofendido, de forma cada vez mais agressiva contra o Sr. DD, iniciando o primeiro por dizer ao segundo que este tinha a mania que tinha as mulheres todas, sugerindo que as raparigas que se encontravam a acompanhar o Sr. DD se tratava de mulheres de casa de alterne;
c. Em virtude de tais provocações que nunca mais terminavam, o Sr. DD clamou por ajuda ao Arguido, que se encontrava a trabalhar como segurança, no sentido de fazer cessar a conduta provocadora e agressiva do alegado Ofendido, pois “O nosso trabalho é zelar pelas pessoas das confusões e das complicações. E dos materiais”;
d. Dirigindo-se o Arguido ao alegado Ofendido, foi possível ao primeiro observar que o segundo, que não conhecia, já se encontrava alcoolizado e sob efeito de estupefacientes e que efetivamente provocara de forma agressiva o Sr. DD, uma vez que estas provocações ainda ocorreram na presença do Arguido quando este chegou ao local, repetindo-se, muitas vezes, o alegado Ofendido;
e. A reação do alegado Ofendido perante a tentativa de apaziguamento por parte do Arguido foi a de provocar ainda mais, escalando em agressividade, dirigindo a agressividade que até então dirigia para o Sr. DD agora para o Arguido, provocando o Arguido, dizendo-lhe que este tinha a mania de que tinha peito e de que era segurança;
f. A resposta do Arguido às provocações dirigidas pelo alegado Ofendido foi a de, numa abordagem verbal, atentar ao facto de que se este continuasse a agir dessa forma, que teria de o acompanhar até à porta do estabelecimento;
g. Esta resposta do Arguido foi mal acolhida e recusada pelo alegado Ofendido, que, após ter afirmado que ninguém o metia na rua, procurou agredir o Arguido através de iniciar um movimento que derivaria num murro contra o Arguido;
h. Tentativa de agressão que não chegou a concretizar-se, em virtude da rápida reação do Arguido, que conseguiu simultaneamente evitar a mesma, esquivando-se em sua própria defesa, para minimizar a amplitude da conduta do alegado Ofendido;
i. Estas referidas movimentações bruscas e instantâneas ocorreram de uma forma muito rápida, desencadeando o desequilíbrio e provocando o escorregamento de ambos no chão da zona VIP do estabelecimento que se encontrava escorregadio, em virtude de bebidas que aí tinham sido derrubadas;
j. O incidente terminou com a retirada do alegado Ofendido por parte dos colegas do Arguido, também eles seguranças em trabalho no local, os quais encaminharam o alegado Ofendido à porta do estabelecimento;
k. O Arguido não acompanhou mais o desenvolvimento da situação após o Ofendido ter sido levado para a porta do estabelecimento, porém, escutou nesse dia, pelos seus colegas que tiveram conhecimento direto dos factos, que o alegado Ofendido terá arrancado um sinal da via de trânsito, com o intuito de agredir o Arguido, ameaçando, ainda, que iria buscar uma arma a casa para matar o Arguido;
l. Há dois anos que o Arguido é segurança e nunca ocorreu a necessidade de recorrer à força, sendo o seu papel, assim como o dos seus colegas, minimizar os conflitos até a PSP chegar ao local, sendo certo que as regras do estabelecimento em causa são “manter a casa sem problemas e, ocorrendo quaisquer atos desses, é acompanhar à porta”;
m. Face à falsa denúncia apresentada pelo alegado Ofendido, o Arguido vê o seu futuro comprometido, pois sempre foi militar, no Exército Português, onde recebeu a medalha de exemplar, encontrando-se atualmente a concorrer à …, concurso que poderá ficar inviabilizado tendo em conta o presente processo;
14) Foi ouvida a testemunha CC (cujo depoimento foi gravado no sistema digital integrado no sistema informático, cujo nome é “Diligencia_535-22.4PBSTR_2024-05-27_11-53-56”, iniciando o mesmo pelas 11.53 horas e terminando pelas 11.59 horas), o OPC investigante, a exercer funções na Esquadra de Investigação Criminal da PSP de …, que elaborou o Inquérito nessa qualidade, e que elaborou o Auto de Visionamento das imagens de videovigilância junto aos autos, tratando-se de testemunha indubitavelmente objetiva e analisadas essas declarações, dúvidas não existem de que:
a. Do que se recorda das imagens de videovigilância que visualizou, um elemento da segurança do estabelecimento “…” dirigia-se ao denunciante, abordando-se primeiramente de forma verbal, posteriormente ocorrendo um “envolvimento de um braço”;
b. Questionada a testemunha de se das imagens foi possível apurar se algum dos intervenientes esteve no chão, a mesma respondeu “Eu não consigo apurar. Há distância que as imagens estão da câmara e a quantidade de gente que se encontra. Eu não me apercebi da queda e se houve queda”, ficando clara a impercetibilidade das imagens, não só face à distância que as câmaras se encontravam do local em causa, bem como também em virtude da quantidade de pessoas que se encontravam no local, o que corrobora com as declarações do Arguido;
c. Questionada a testemunha de se das imagens foi possível apurar se algum dos intervenientes derrubou o outro no chão, a testemunha respondeu, mais uma vez, que “Pelas imagens não é percetível”, acrescentando, ainda, o facto relevante de que “a gravação não tem todas as câmaras de videovigilância”, ou seja, não tem imagens do hall entre as pistas e o hall de entrada, mas apenas da pista de dança;
d. A testemunha ainda reafirmou a falta de qualidade das imagens, face ao facto de as câmaras se encontrarem demasiado à distância do local em causa e tendo em conta “o ambiente escuro”, sem qualidade para proceder a qualquer identificação, sendo que nem lhe foi possível concluir pela identificação concreta dos intervenientes em causa.
15) Foi ouvida a testemunha DD (cujo depoimento foi gravado no sistema digital integrado no sistema informático, cujo nome é “Diligencia_535-22.4PBSTR_2024-05-27_14-27-25”, iniciando o mesmo pelas 14.27 horas e terminando pelas 14.47 horas), habitual frequentador do estabelecimento “…”, com conhecimento direto dos factos em causa, que, previamente à ocorrência dos mesmos, foi alvo de provocações por parte do alegado Ofendido, o que despoletou um pedido de ajuda ao Arguido, no sentido de, na qualidade de segurança, fazer cessar o mau ambiente que se instalara no local por parte do alegado Ofendido, e analisadas essas declarações, dúvidas não existem de que:
a. Foi o Sr. DD, frequentador do estabelecimento “…”, que foi prévia vítima, juntamente com duas suas amigas que o acompanhavam na noite de sábado em causa, de provocações por parte do alegado Ofendido, sendo que essas provocações se consubstanciaram, inicialmente, por meras provocações verbais, implicando o alegado Ofendido contra a testemunha, pelo facto de esta se encontrar “acompanhado por duas meninas”;
b. Estas provocações perpetradas pelo alegado Ofendido diretamente contra a testemunha, que não o conhecia, iniciaram-se logo quando a testemunha chegara ao local, ou seja, ao local que denomina como “os privados”, referindo-se à parte VIP do estabelecimento em causa;
c. As provocações materializavam-se, inicialmente, pela verbalização das seguintes expressões: “Deves te achar o maior aqui”, “Deves te achar que és o maior”, “que és o rei delas”, as quais foram dirigidas com agressividade;
d. Face a tais provocações repetidas, a testemunha dirigiu-se ao dono do estabelecimento, o qual lhe disse para se dirigir ao Arguido, que era o segurança que se encontrava mais perto e poderia ajudar, apelando a uma ajuda no sentido de fazer cessar as referidas provocações, de forma a proporcionar à testemunha e suas amigas a continuação no local, podendo divertir-se com tranquilidade;
e. Interpelado pela testemunha, o Arguido, que se encontrava nas escadas de saída da zona VIP, junto a um balcão, dirigiu-se ao alegado Ofendido, na tentativa de fazer cessar as referidas provocações;
f. A zona VIP em causa não é um espaço muito grande e, quando ocorreram os factos em causa, a zona teria cerca de entre 30 a 40pessoas, o que significa que que estavam todas muito próximas;
g. Do local onde a testemunha ficou, embora não lhe tenha sido possível escutar as palavras trocadas entre o alegado Ofendido e o Arguido, foi-lhe possível observar que o Arguido terá convidado o alegado Ofendido a sair do local, o que este último terá recusado, observando claramente que o alegado Ofendido se tornou ainda mais agressivo contra o Arguido, dada a postura corporal que fazia em provocação do Arguido: “A fazer peito” e “a querer agir”;
h. Mais verificou a testemunha que o Arguido procurara fazer acompanhar o alegado Ofendido para fora do local, quando, “como o individuo [o alegado Ofendido] estava tão agressivo”, “estava agressivo, estava agitado”, “houve um percalço, que escorregaram, possivelmente por o chão estar escorregadio, bebidas durante a noite, e não sei quê, e caíram os dois”, conformando que “não houve violência”;
i. Após a queda pelos dois intervenientes referidos, “os colegas [do Arguido] foram logo ajudar”, permanecendo o Arguido dentro do estabelecimento;
j. A testemunha também confirma a existência das escadas perto do local;
k. A testemunha, que frequenta o estabelecimento, conhece o Arguido com pessoa, em virtude de este trabalhar na qualidade de segurança no local em causa, o que o possibilita caracterizar o Arguido como sendo “Profissionalmente uma pessoa que sabe falar, que sabe agir na forma pausada, uma pessoa atenta, e não tenho nada a falar do trabalho dele”;
16) Foi ouvida a testemunha EE (cujo depoimento foi gravado no sistema digital integrado no sistema informático, cujo nome é “Diligencia_535-22.4PBSTR_2024-05-27_14-50-27”, iniciando o mesmo pelas 14.50 horas e terminando pelas 14.57 horas), trabalhadora no estabelecimento noturno em causa desde 2019, conhecedora, portanto, do espaço físico em causa e conhecedora da personalidade do Arguido, e analisadas essas declarações, dúvidas não existem de que:
a. A testemunha, à altura dos factos, que situou numa noite de julho de 2022, trabalhava no bar do estabelecimento desde 2019, que se encontrava em frente à zona VIP, o qual não tem visibilidade para a parte de trás, apenas para a parte da frente, razão pela qual não pôde visualizar qualquer agressão naquele local;
b. Não obstante, pôde observar já que o alegado Ofendido foi acompanhado pelo corpo de segurança do estabelecimento, designadamente pelo Sr. FF, um segurança alto, para fora da pista, e isto “sem qualquer tipo de interação física, simplesmente o estavam a acompanhar”;
c. Confirma a existência de escadas perto do local específico em causa;
d. Recorda-se a testemunha que conseguiu, nessa altura, visualizar a cara do alegado Ofendido, a qual não apresentava, naquele momento em que foi acompanhado a sair do estabelecimento, nenhuma lesão;
e. À data dos factos, a testemunha já conhecia o Arguido há cerca de um ano e, relativamente a ele, nunca detetou nenhum motivo de preocupação comportamental, quer em termos pessoais “o AA é uma pessoa familiar, adora a família, adora a filha, é uma pessoa que me ajuda, é um companheiro exemplar. Não tenho qualquer tipo de queixa a fazer em relação a ele”, quer em termos profissionais “pessoa honesta e trabalhadora”, designadamente no tratamento dos clientes: “que interagia com as pessoas, com os clientes era uma pessoa sempre bastante apaziguadora, falava normalmente (…) uma pessoa tranquila”, “nunca teve um ato de agressão”;
f. O sonho do Arguido é ingressar na …, finalidade para a qual, nestes últimos dois anos da sua vida, se tem esforçado muito, sonho e esforço que poderão não materializar-se em sucesso, tendo em conta esta falsa denúncia apresentada pelo alegado Ofendido;
17) Foi ouvida a testemunha BB (cujo depoimento foi gravado no sistema digital integrado no sistema informático, cujo nome é “Diligencia_535-22.4PBSTR_2024-05-27_10-55-14”, iniciando o mesmo pelas 10.55 horas e terminando pelas 11.18 horas), que explora o estabelecimento em causa, bem conhecedor, portanto, do espaço físico em causa, dos factos relevantes sub judice, de todos os intervenientes em causa, bem como da personalidade do Arguido, e analisadas essas declarações, dúvidas não existem de que:
a. A testemunha é a pessoa que explora o estabelecimento de diversão noturna em causa, denominado por “…”, conhecendo o Arguido em virtude de este trabalhar no local referido como segurança;
b. A testemunha encontrava-se no local no momento dos factos em causa, perto da zona VIP do estabelecimento, zona, essa, que se caracteriza como tal por ser “para quem compra garrafas ou então sofás. Tem uma parte de sofás e outra parte de garrafas para o balcão. Essa é a parte da zona VIP. Quem passar por lá tem de ter uma pulseira”;
c. O Sr. DD se encontrava acompanhado por “umas amigas dele”, “umas senhoras do sexo feminino”;
d. A testemunha tomou conhecimento da postura desafiadora do alegado Ofendido, pelo facto de um seu conhecido, de nome DD, se ter dirigido à testemunha, queixando-se de que o alegado Ofendido estava a provocá-lo “ó BB está ali um rapaz a meter-se comigo”, ao que a testemunha respondeu para se dirigir ao AA, segurança perto do local, para que este fosse abordar o alegado Ofendido “não sou eu que vou lá abordar o rapaz, eles é que são seguranças”, o que corrobora com as declarações prestadas pela testemunha Sr. DD;
e. A testemunha confirma que efetivamente o Sr. DD se dirigiu depois ao Arguido, pedindo-lhe o auxílio, porque o alegado Ofendido se encontrava “a meter com ele”;
f. Pedido que a testemunha atestou que obteve resposta imediata por parte do Arguido, que se dirigiu ao alegado Ofendido, o qual a testemunha que reparara que antes de o Sr. DD o abordar a queixar-se, se encontrava “a dançar sozinho e estava à beira do tal DD que veio fazer essa reclamação”, ou seja, não se encontrava acompanhado;
g. Iniciou-se depois um contacto por via verbal “começaram a falar ali qualquer coisa”, sucedendo, porém que, com a natural confusão do local “porque a discoteca tem música e não consegui perceber daqui para aí”, “não conseguia perceber bem, mas quando eu olho já estão os dois no chão” e “o AA a falar ao ouvido, mas nada de violência”, “não houve violência”;
h. A queda poderá ter ocorrido, dado que “a discoteca estava quase no final da noite e aquilo estava molhado”, pois “Normalmente a malta que bebe copos está a dançar, o copo está sempre a virar gelo e as pessoas viram sempre. Viram a bebida sempre no chão. E aquilo é cerâmico. Escorrega”;
i. A testemunha confirma a existência de escadas perto do local em causa;
j. Foi um colega do Arguido que ajudou a levantar o alegado Ofendido e o Arguido, acompanhando o primeiro, depois, o segundo, que se dirigiu à caixa para pagar, mas neste momento, o Arguido “começou lá a “espernear” um bocadito mas pagou”;
k. A testemunha veio à porta do estabelecimento para “perceber o que se estava a passar”, acompanhando também o outro segurança que acompanhava o alegado Ofendido, “para ver se ele queria falar comigo alguma situação. Para me tentar explicar o porquê daquilo. Também fiquei sem perceber nada”;
l. Foi nessa altura, que a testemunha observou que o carro do alegado Ofendido “estava em frente à Câmara. Um …. E ele deu a volta com o carro. Parou na frente do …. E saiu fora do carro. Deixou a porta aberta com o carro a trabalhar. Foi do outro lado, arrancou o sinal da Câmara”, pois o alegado Ofendido “andou lá a abanar. Trouxe o sinal na mão. A dizer que ia matar o AA”;
m. A testemunha confirma, então, a tentativa de agressão que o alegado Ofendido procurou realizar contra o Arguido, já no exterior do estabelecimento em causa, “pegou no carro que estava estacionado no parque, deu a volta ao jardim todo”;
n. A testemunha confirma, ainda, o crime de dano qualificado (sinal camarário de trânsito) e até o crime de ameaça, perpetrados pelo alegado Ofendido, referindo que este, após retirar o carro que se encontrava previamente estacionado no parque exterior à discoteca, conduziu tal veículo, “parou em frente à discoteca, foi do outro lado da estrada arrancar o sinal da Câmara e depois cá fora disse que ia matar o AA, que ia fazer e acontecer” e ainda “ele vai buscar o carro. O outro rapaz dá a volta, para lá na frente e começa a tratar mal, a querer matar o AA”;
o. A testemunha atesta que o estabelecimento tem regras internas “somos contra a violência”, e que a função dos seguranças sempre foi de “manter a paz e a tranquilidade lá no espaço”, porém tem observado “que hoje a malta está terrível, nós abordamos a malta
quer bater nos seguranças não é o contrário. Não é os seguranças a bater neles, é eles a bater nos seguranças”,
p. A testemunha, após ter trabalhado mais de 2 anos com o Arguido, pôde atestar que este é “calmo, tranquilo, evita problemas como todos nós” e que nunca teve nenhum problema com ele;
q. Foi ouvida a testemunha FF (cujo depoimento foi gravado no sistema digital integrado no sistema informático, cujo nome é “Diligencia_535-22.4PBSTR_2024-05-27_15-31-03”, iniciando o mesmo pelas 15.31 horas e terminando pelas 15.35 horas), com conhecimento direto dos factos maioritariamente respeitantes ao momento em que o alegado Ofendido sai do estabelecimento e demonstra a vontade de querer agredir o Arguido/Recorrente, praticando, com vista a esse fim, um crime de dano qualificado, ao arrancar um sinal camarário de trânsito, e analisadas essas declarações, dúvidas não existem de que:
r. A testemunha conhece o Arguido/Recorrente há cerca de 5/6 anos, em virtude do trabalho que os identifica aos dois;
s. A testemunha presenciou alguns dos relevantes factos em causa nos autos, os quais situa terem ocorrido entre as 4h ou 5h da manhã;
t. O alegado Ofendido, após ter sido acompanhado para o exterior do estabelecimento, “arrancou um sinal e queria dar com o sinal no AA”, “Metemos na rua, fechou-se a porta e ele foi buscar um sinal para dar no AA e eu disse, mete lá o sinal no chão, que o sinal estava ao lado do meu carro, bates aí no carro”, preocupando-se também a testemunha com o seu próprio carro que estava estacionado ao pé do local onde se encontrava o alegado Ofendido com o sinal na mão: “E eu tinha o carro e disse-lhe a ele que “está aqui o meu carro”, vê se não batia com o sinal no carro. E ele deixou o sinal e pronto”;
18) Foi ouvida a testemunha GG (cujo depoimento foi gravado no sistema digital integrado no sistema informático, cujo nome é “Diligencia_535-22.4PBSTR_2024-05-27_15-15-16”, iniciando o mesmo pelas 15.15 horas e terminando pelas 15.29 horas), frequentador habitual do estabelecimento em causa, que acompanhava, como amigo, DD, ou seja, a pessoa que fora primeiramente alvo de provocações por parte do alegado Ofendido, pelo que pôde atestar o mau ambiente que este último já instalara no local em causa, antes da tentativa de apaziguamento do Arguido/Recorrente, e analisadas essas declarações, dúvidas não existem de que:
a. A testemunha conhece o Arguido por frequentar o estabelecimento em causa;
b. Os factos de que presenciou terão ocorrido entre as 3h / 4h da manhã, tendo conhecimento direto dos mesmos, em virtude de se encontrar na zona VIP do estabelecimento em causa, acompanhado com “mais uns rapazes do … (...) estamos sempre ali colocados na zona que se chama a zona VIP”, entre os quais o Sr. DD;
c. Para aceder à zona VIP em causa, é necessário subir umas escadas “sobe-se uns degrauzinhos”, confirmando a existência de escadas no local, o que corrobora com o depoimento de anteriores testemunhas cujo depoimento já foi supratranscrito;
d. O alegado Ofendido, nessa noite, já tinha criado problemas/incómodos no estabelecimento: “O rapaz já houve duas ou três nesse mesmo dia que ele importou algumas pessoas, foi chamado à atenção pelos seguranças, e houve uma vez que os seguranças naquilo que eu me apercebi já não havia situação para remediar. «Passam 5 horas, desloca-se lá fora, põe lá o cartão, e sai»”;
e. O que se justifica pelo facto de o alegado Ofendido se encontrar “muito eufórico derivado se calhar ao consumo de álcool. Não estava ao seu estado normal”, tanto que “o rapaz já estava um bocado exaltado e já tinha incomodado várias pessoas e por isso é que foi chamado a deslocar-se à rua”;
f. O Arguido é “um rapaz normal, pacato”;
19) Foi ouvida a testemunha HH (cujo depoimento foi gravado no sistema digital integrado no sistema informático, cujo nome é “Diligencia_535-22.4PBSTR_2024-05-27_15-37-00”, iniciando o mesmo pelas 15.37 horas e terminando pelas 15.48 horas), que trabalhava com o Arguido no estabelecimento e na noite em causa nos autos, e analisadas essas declarações, dúvidas não existem de que:
a. Trabalhou com o Arguido no estabelecimento …, sendo este seu colega;
b. Estava na zona VIP do estabelecimento na altura dos factos, a qual se encontrava com “muita gente”;
c. Viu o alegado Ofendido naquela noite e reparou na sua agitação;
d. Viu o alegado Ofendido a gesticular e a falar de forma agressiva para o senhor DD e nesse seguimento ouviu na radio que tinham chamado o segurança (AA) para acautelar a situação, “ele esteve a falar com ele e, entretanto, eu apercebo-me que ele devia ter dito ao rapaz «se ele não se comportasse como deve ser poderia ir para a rua»”;
e. Em resposta, o alegado Ofendido “fez gesto agressivo para cima do meu colega, e o meu colega, entretanto junto com ele para tentar falar com eles escorregam e caem para o chão”;
f. Foram outros seus colegas que ajudaram o Arguido e alegado Ofendido a levantarem-se, porém, presenciou ao levantamento, que ocorreu sem conflito;
20) Foi ouvida a testemunha II (cujo depoimento foi gravado no sistema digital integrado no sistema informático, cujo nome é “Diligencia_535-22.4PBSTR_2024-05-27_15-49-31”, iniciando o mesmo pelas 15.49 horas e terminando pelas 15.55 horas), que trabalhava com o Arguido no estabelecimento em causa, porém, na noite sub judice, não se encontrava em trabalho, mas na qualidade de cliente na zona VIP, e analisadas essas declarações, dúvidas não existem de que:
a. Trabalhou no … com o Arguido, sendo este, na altura, seu colega;
b. Nessa noite, a testemunha estava como cliente na zona VIP;
c. A testemunha não viu o Arguido a agredir o alegado Ofendido;
d. O que a testemunha viu foi o Arguido a falar com o alegado Ofendido e nisto “algo se passou” e escorregam os dois. Posteriormente um outro segurança agarra no alegado Ofendido e leva-o para a rua;
e. Durante a conversa com o alegado Ofendido, este permanecia exaltado;
f. Durante a conversa com o alegado Ofendido, não houve qualquer género de toque ou agressão por parte do Arguido;
g. Após o incidente, o Arguido manteve-se na zona VIP do estabelecimento;
21) Foi ouvida a testemunha JJ (cujo depoimento foi gravado no sistema digital integrado no sistema informático, cujo nome é “Diligencia_535-22.4PBSTR_2024-05-27_15-56-48”, iniciando o mesmo pelas 15.56 horas e terminando pelas 16.02 horas), trabalhador no estabelecimento em causa, com conhecimento direto dos factos maioritariamente respeitantes ao momento em que o alegado Ofendido sai do estabelecimento e demonstra a vontade de querer agredir o Arguido/Recorrente, praticando, com vista a esse fim, um crime de dano qualificado, ao arrancar um sinal camarário de trânsito, e analisadas essas declarações, dúvidas não existem de que:
a. A testemunha é amiga do Arguido e no dia em causa estava a desempenhar o papel de segurança, à porta do estabelecimento …;
b. A testemunha viu o alegado Ofendido a arrancar um sinal do parque de estacionamento, no exterior do estabelecimento;
c. O alegado Ofendido, depois de arrancar o sinal de trânsito, dizia expressamente que queria atingir o Arguido com o mesmo;
d. Após arrancar o sinal de trânsito largou-o, o alegado Ofendido fez dois “piões” com o seu carro e foi-se embora, abandonando o parque de estacionamento;
22) Ficou provado que, no estabelecimento em causa, o Sr. DD foi alvo de prévias provocações por parte do alegado Ofendido:
a. Vide depoimento de BB em sede de Inquérito:
“estava presente e assistiu aos factos, podendo afirmar com toda a certeza que o denunciante meteu-se com pessoal que se encontrava no estabelecimento e que foram alertar o segurança de serviço naquele local, na pessoa de AA, o qual dirigiu-se ao denunciante e pediu para não se meter com os clientes, ao que o denunciante disse que não era nada consigo e que ele fazia o que queria”;
b. Vide depoimento de BB em sede de Julgamento: “o amigo DD veio dizer-lhe que estava um rapaz a meter-se com ele, e disse-lhe que fosse ter com os seguranças” (p. 8 da Sentença);
c. Vide depoimento de DD em sede de Julgamento: “disse estar na discoteca com umas raparigas, e logo que chegou, começou a ser importunado. O indivíduo dizia que devia achar que é o maior. És o rei delas. Nunca o tinha visto. Foi ter com o dono do estabelecimento, que disse que fosse ter com o segurança. Foi ter com o AA e explicou a situação” (p. 8 da Sentença);
d. Vide depoimento de KK em sede de Julgamento: “segurança na discoteca, referiu que já tinha visto o cliente, um bocado agitado, ouviu no rádio que tinham chamado o AA” (p. 9 da Sentença).
e. Vide depoimento de GG em sede de Julgamento: “frequentador da discoteca, contou que estava lá com uns rapazes, na zona vip, incluindo o DD. O rapaz [LL] importunou o colega e foi avisado pelos seguranças” (p. 10 da Sentença);
f. Vide depoimento do Arguido em sede de Julgamento: apareceram outros seguranças que o levantaram e levaram para a rua;
g. Vide depoimento de MM em sede de Julgamento:
“A seguir foi posto na rua” (Sentença); “o amigo quando foi para a rua, ia a esbracejar” (p. 8 da Sentença);
h. Vide depoimento de NN: “Viu o amigo a ser levado pelos seguranças, mas nem se apercebeu que era ele. Há dois seguranças que o agarraram e levaram, tem a ideia que ia deitado” (p. 8 da Sentença);
i. Vide depoimento de DD em sede de Julgamento: “levantaram-se e os colegas levaram-nos para fora. O AA ficou no interior” (p. 9 da Sentença);
j. Vide depoimento de HH em sede de Julgamento: “segurança na discoteca, referiu que (…) O que viu foi o cliente a opor-se, a não querer ir para a rua” (p. 9 da Sentença).
23) Também ficou provado que o alegado Ofendido se encontrava embriagado:
a. Vide depoimento do Arguido em sede de Julgamento: “o ofendido estava embriagado, porque estava sempre a repetir a mesma coisa” (p. 7 da Sentença);
b. Vide depoimento de NN: “Esclareceu ainda que estavam embriagados” (p. 8 da Sentença);
c. Vide depoimento de HH em sede de Julgamento: “segurança na discoteca, referiu que já tinha visto o cliente, um bocado agitado, ouviu no rádio que tinham chamado o AA. Viu o homem a gesticular e a falar de forma agressiva para o DD. Viu o AA a falar e que o cliente se tornou ainda mais agressivo, a tentar saltar para cima do AA” (p. 9 da Sentença).
24) Também ficou provada a tentativa de agressão, por parte do alegado Ofendido, contra o Arguido/Recorrente:
a. Vide depoimento de DD em sede de Julgamento: “veja-se a testemunha DD fiz que percebeu que o indivíduo se estava a tornar agressivo, porque estava a fazer peito” (p. 11 da Sentença); “Acha que o AA o convidou a sair. Ele não queria (…) como ele [LL] estava tão agressivo, caíram os dois” (p. 9 da Sentença);
b. Vide depoimento de HH em sede de Julgamento: “diz ter visto um gesto agressivo por parte do individuo, porém, não foi também qualquer tentativa de murro, e não foi também fazer peito… mas antes a tentar saltar para cima do AA” (p. 11 da Sentença), sendo certo que “saltar para cima” pode muito bem ser sinónimo de “fazer peito” ou “tentar agredir” - “segurança na discoteca, referiu que já tinha visto o cliente, um bocado agitado, ouviu no rádio que tinham chamado o AA. Viu o homem a gesticular e a falar de forma agressiva para o DD.
Viu o AA a falar e que o cliente se tornou ainda mais agressivo, a tentar saltar para cima do AA” (p. 9 da Sentença);
c. Vide, ainda, o depoimento do Arguido em sede de Julgamento: “disse o arguido que, andou para trás, porque o ofendido se tornou agressivo consigo, tentando-lhe dar um murro”, porém, entendeu o Tribunal que “Curiosamente, algumas das testemunhas, procuraram também transmitir esta agressividade, porém, sem corroborarem, o que foi dito pelo arguido” (p. 11 da Sentença), o que não se compreende, pois o Tribunal parece exigir a produção de uma prova quase impossível, na medida em que num ambiente ruidoso, como o de uma discoteca, é praticamente impossível escutar uma conversa se não se estiver com muita proximidade das pessoas que falam, sendo sabido que a agressividade não é possível ser demonstrada apenas pelo verbalizar das palavras, mas primeiro que tudo, pela posição corporal da pessoa que procura agredir;
25) O Tribunal a quo entendeu haver uma discrepância e incoerência dos depoimentos testemunhais e das declarações do Arguido, o que não se compreende, uma vez que todos foram unânimes em revelar uma postura agressiva por parte do alegado Ofendido, falando todos eles a verdade ao Tribunal, porém, cada um do ângulo onde se encontrava no espaço física em causa, e no momento que os factos lhe chamaram à atenção, mas em nada foram discrepantes ou incongruentes;
26) Entendeu incorreta e injustamente o Tribunal a quo que o Arguido e as testemunhas poderão ter faltado à verdade, apoiando-se num elemento que entendeu ser claro e percetível, ou seja, o Auto de Visionamento de suporte informático, elaborado por uma das testemunhas cujo depoimento foi supratranscrito (CC, Agente da PSP), quando, na verdade, o próprio OPC investigante, quando confrontado, em sede de julgamento, com as imagens de videovigilância em causa, afirmou expressamente que encontram-se impercetíveis;
27) Resulta do Auto de Visionamento, de 27.02.2023, que o OPC investigante concluiu que o vídeo e respetivos fotogramas encontram-se de tal forma imperfectíveis, não sendo possível, a partir dos mesmos, entender que pelo Arguido foi praticada uma qualquer agressão punida por lei: “a qualidade de captação não tem a definição ideal e o ambiente de uma discoteca não ajuda a que essa definição seja a melhor”, sendo certo que do Auto e das respetivas legendas das imagens, não se faz qualquer referência a nenhuma agressão e assim concluiu o próprio MP relativamente à impercetibilidade das imagens em causa;
28) O Tribunal a quo apoiou o seu julgamento condenatório em prova proibida, uma vez que sustentou o seu entendimento com base num vídeo que não foi produzido e examinado em sede de julgamento (nos termos que abaixo melhor se invocarão), sendo certo que, mesmo que o fosse, o seu teor sempre seria impercetível, pelo que, por ambas as razões, da visualização do mesmo nunca poderia ser emitida a Sentença recorrida;
29) Ficou provado que o Arguido procurou simplesmente levar o alegado Ofendido à porta do estabelecimento, face à sua conduta inapropriada:
a. Vide o depoimento supratranscrito do Arguido em sede de Julgamento, quando confrontado com as imagens de videovigilância;
b. Vide o depoimento de DD em sede de Julgamento: “Acha que o AA o convidou a sair. Ele não queria, o AA agarrou-o para o levar para fora. Mas como ele [LL] estava tão agressivo, caíram os dois” (p. 9 da Sentença);
30) Ficou provado que o Arguido não agrediu o alegado Ofendido, pois não obstante este último ter afirmado falsamente que Arguido o agarrara com o braço, o mandara ao chão, com um pontapé e que no chão lhe deu murros na cara, sobretudo no olho direito, sempre com o braço no pescoço, entendeu bem o Tribunal a quo que o Arguido não deu nenhum pontapé ao alegado Ofendido, tanto mais que, como concluído pelo próprio MP (segundo afirmou nas suas Alegações Orais finais), é possível verificar, pela prova efetivamente produzida, quer a queda, quer o levantamento do alegado Ofendido e Arguido se procederam de forma muito rápida, não havendo tempo suficiente para os alegados socos contra o alegado Ofendido terem aí ocorrido;
31) O facto de o alegado Ofendido ter mentido, também nesta parte, parece não ter abalado a credibilidade que o Tribunal a quo lhe conferiu no que diz respeito ao alegado derrubamento do Ofendido no chão, ao desferimento de murros que atingiram o Ofendido, designadamente na face e no olho direito, o que não se compreende, já para não falar que, não obstante e sem prescindir, no vídeo os intervenientes encontram-se de costas, pelo que não é percetível o que está a acontecer, tanto mais que na própria Sentença tal se fez constar: “porque estão de costas para o vídeo, e pela forma como se mexe, não se consegue perceber o que está a fazer” (p. 14 a Sentença);
32) Que passo dedutivo temerário dado pelo Tribunal a quo quando, a partir de um vídeo que, para além de consubstanciar prova proibida, e que é constituído por imagens de difícil perceção, conclui que, pelo facto de o Arguido ter a mão direita dele livre, haveria a possibilidade de a usar para esmurrar na face o alegado Ofendido, concluindo pela mera possibilidade, que o Arguido esmurrou o alegado Ofendido, o que se concede;
33) É abundante a prova testemunhal que testifica que o Arguido nunca foi agressivo para com o alegado Ofendido, designadamente a supratranscrita:
a. Vide o depoimento de MM: “estava na discoteca e que só viu o amigo LL no chão” (Sentença); “não viu se bateu, já o viu no chão. Só soube no dia a seguir, quando o viu com o olho negro” (p. 8 da Sentença);
b. Vide o depoimento de NN: “disse que não viu nada. Estava com o MM e o LL e foi à casa de banho” (p. 8 da Sentença);
c. Vide o depoimento de BB em sede de Julgamento: “o amigo DD veio dizer-lhe que estava um rapaz a meter-se com ele, e disse-lhe que fosse ter com os seguranças. Foi ter com o AA, e ainda viu o AA a falar com o indivíduo. Mas depois, olhou para outro lado, e quando voltou a olhar já estão os dois no chão. (…) Quando se aproximou estavam lado a lado. Não se apercebeu de alguma lesão. Mais afirmou que ninguém andou à porrada lá dentro” (p. 8 da Sentença);
d. Vide o depoimento de DD em sede de Julgamento: “Acha que o AA o convidou a sair. Ele não queria, o AA agarrou-o para o levar para fora. Mas como ele [LL] estava tão agressivo, caíram os dois (…) o individuo ficou com a mão por trás do pescoço do AA. O AA ficou de lado, e o outro de barriga para baixo. (…) Não houve violência” (p. 9 da Sentença);
e. Vide o depoimento de OO em sede de Julgamento: “trabalhava na discoteca (…) olhou para lá e viu um individuo no chão, mais o AA e depois viu o segurança a levá-lo para fora. Acha que estavam os dois de barriga para baixo” (p. 9 da Sentença);
f. Vide o depoimento de HH em sede de Julgamento: “segurança na discoteca, referiu que já tinha visto o cliente, um bocado agitado (…) Viu o homem a gesticular e a falar de forma agressiva para o DD. Viu o AA a falar e que o cliente se tornou ainda mais agressivo, a tentar saltar para cima do AA. O AA tentou travar e eles escorregaram e caíram. Aproximou-se e eles estavam no chão (…) O AA não teve qualquer contacto físico com o cliente. O que viu foi o cliente a opor-se, a não querer ir para a rua” (p. 9 da Sentença);
g. Vide o depoimento de II em sede de Julgamento: “o AA falou com o rapaz. Algo se passou que escorregaram e caíram” (p. 9 da Sentença);
h. Vide o depoimento de EE em sede de Julgamento: “não se apercebeu de nada. Não viu qualquer lesão” (p. 10 da Sentença);
i. Vide o depoimento de GG em sede de Julgamento: “frequentador da discoteca, contou que estava lá com uns rapazes, na zona vip, incluindo o DD. O rapaz [LL] importunou o colega e foi avisado pelos seguranças, até que o AA o chamou à atenção. Convidou-o a sair de forma educada. Deu-lhe uma palmadinha no ombro. Foi uma conversa normal. Ninguém empurrou ninguém. (…) Questionado sobre como viu a conversa, diz que estava perto” (p. 10 da Sentença);
34) É abundante a prova testemunhal supratranscrita, que testifica que a zona VIP do estabelecimento em causa se encontrava lotada, com pessoas encostadas umas às outras, e que o respetivo chão se encontraria escorregadio:
a. Vide o depoimento de BB: “A discoteca estava molhada e escorregaram” (p. 8 da Sentença);
b. Vide o depoimento de DD: “Mas como ele [LL] estava tão agressivo, caíram os dois. O chão estava escorregadio, e o individuo ficou com a mão por trás do pescoço do AA” (p. 9 da Sentença);
c. Vide o depoimento de II: “o AA falou com o rapaz. Algo se passou que escorregaram e caíram” (p. 9 da Sentença);
d. Vide o depoimento de GG em sede de Julgamento: “Foi uma conversa normal. Ninguém empurrou ninguém. Depois escorregaram e caíram” (p. 10 da Sentença);
35) É abundante a prova testemunhal supratranscrita, que testifica que o alegado Ofendido, após ter sido acompanhado para a porta do estabelecimento pelos seguranças, demonstrou intenção de agredir o Arguido no exterior a zona VIP do estabelecimento, tendo praticado um crime de dano qualificado (arrancou um sinal camarário de trânsito para bater com ele no Arguido):
a. Vide o depoimento do alegado Ofendido em sede de Julgamento: “Admitindo que, pegou num ferro e que quis ir bater no arguido, porque estava revoltado por não ter feito nada. O que foi dito também dito pelo arguido e que as testemunhas FF e JJ, também seguranças procuraram confirmar” (p. 17 da Sentença);
b. Vide o depoimento de BB em sede de Inquérito: “declara que estava presente e assistiu aos factos, podendo afirmar com toda a certeza que (…) o depoente viu ainda que o denunciante após ter sido acompanhado ao exterior, arrancou um sinal de trânsito que se encontrava no parque de estacionamento do lado contrário ao local onde se encontra o estabelecimento por si gerido, e com esse sinal quis enfrentar o pessoal de serviço ao segurança, ao mesmo tempo que dizia que ia buscar uma pistola e matava toda a gente”;;
c. Vide o depoimento de FF em sede de Julgamento: “Na altura estava na porta, e até viu o rapaz a agarrar num sinal para bater no AA” (p. 9 da Sentença);
d. Vide o depoimento de JJ em sede de Julgamento: “Saiu um rapaz a correr, e foi arrancar um sinal e queria entrar na discoteca para bater no AA, depois largou o sinal e foi embora” (p. 10 da Sentença).
36) Como poderá o Tribunal a quo ter desconsiderado a prática, por parte do alegado Ofendido, de um crime de dano qualificado, punível com pena de prisão até oito anos, pelo facto de ter ficado mais do que provado que o mesmo arrancou um sinal de trânsito naquela bem concreta zona da cidade? O crime em questão trata-se de um crime público, que se aplica a quem destruir, no todo ou em parte, danificar, desfigurar ou tornar não utilizável coisa alheia destinada ao uso e utilidade públicos;
37) Como poderá o Tribunal a quo ter desconsiderado estes tão relevantes factos, que mais não provam a conduta agressiva e ameaçadora do alegado Ofendido, passível de integrar, pelo menos, um crime de ofensa à integridade física, na forma tentada, previsto e punido pelos artigos 22.º, 23.º e 143.º n.º 1 do Código Penal?;
38) A dinâmica dos factos que entendemos que devem ser julgados como provados demonstra que, aquando do afastamento do alegado Ofendido, do estabelecimento de diversão noturna em causa, por parte do corpo de segurança, o alegado Ofendido praticou já atos de execução, nos termos do artigo 22.º, n.º 2, do CP, tendentes a provocar ofensas corporais no Arguido segurança, pois o sinal vertical camarário que arrancou no parque de estacionamento confinante com o estabelecimento era meio idóneo para as concretizar;
a. São visíveis as discrepâncias entre as declarações do alegado Ofendido e das testemunhas, no que diz respeito ao estado embriagado, mas capaz de conduzir, do alegado Ofendido e ao sucedido com o alegado Ofendido após este ter abandonado o estacionamento e o respetivo estacionamento:
b. Por um lado, o alegado Ofendido afirmou, em sede de Inquérito e de Julgamento, que se dirigiu para o Hospital de … com a esposa/amiga, que seria a testemunha PP;
c. Porém, a testemunha PP, em sede de inquérito, afirmou que o alegado Ofendido lhe ligou às 7h da manhã, informando-a que já se encontrava no Hospital de…, tendo esta se dirigido ao serviço de urgências do Hospital de …, onde apanhou o denunciante e transportou-o ao Hospital de .., em …;
d. A mesma testemunha PP, em sede de julgamento, afirmou que “O LL ligou-lhe a dizer que tinha que ir a …. Foi ter com ele a … e foram ao Hospital de …”;
e. Vide o depoimento de BB em sede de Inquérito: “o denunciante conduzia um veículo de marca …, de cor … modelo …”;
f. Vide o depoimento de BB em sede de Julgamento: “O carro dele estava em frente à Câmara. Um …. E ele deu a volta com o carro. Parou na frente do …. E saiu fora do carro. Deixou a porta aberta com o carro a trabalhar”;
g. Vide o depoimento de JJ em sede de Julgamento: “Fez lá um peão e arrancou em excesso de velocidade”;
39) Aqui, sim, se poderia compreender a conclusão do Tribunal a quo de que só haveria uma explicação para esta discrepância de declarações, ou seja, que o alegado Ofendido mentiu, pelo que deveria ter determinado a extração de certidão da ata de audiências de julgamento para eventual procedimento criminal, tanto mais que detetou, a Meritíssima Juiz, que “a testemunha LL referiu que, foi para o Hospital com uma amiga. Porém, por esta, a testemunha PP, foi dito que, não estava no local, apenas foi com ele no dia a seguir ao Hospital a …”, sucedendo, porém, que, mais uma vez, desconsiderou tais discrepâncias: “Trata-se de uma mera imprecisão que (…) não o descredibiliza” (p. 15 da Sentença), o que não se pode conceder;
40) Contra o Arguido existe apenas as incongruentes (e não suportadas por um qualquer meio de prova) declarações do alegado Ofendido, sendo certo que das imagens juntas aos autos não é percetível, de todo, que seja possível imputar ao Arguido um qualquer crime;
41) Resulta dos autos que o Arguido não teria personalidade, nem seria verosímil que o Arguido tivesse agido conforme afirmou o alegado Ofendido, não só face ao facto de o mesmo se encontrar a concorrer para a … (“Desde muito jovem que tem como objetivo dedicar-se a uma carreira militar, encontrando-se em concurso para eventual admissão à …” (p. 5 da Sentença), nunca comprometeria a concretização de tal sonho), tendo em conta que “Do contacto com fonte do meio local, foi apurado que o arguido é conhecido no seu local de residência e considerado uma pessoa bem integrada socialmente com uma representação social positiva” (p. 5 da Sentença), e face ao seu historial limpo e até exemplar: “Encontrava-se a exercer funções de … em …, afeto ao …, com quem estabeleceu contrato por sete anos, finalizando o mesmo com louvor por comportamento exemplar. Em part time desempenhava funções de segurança em espaço de diversão noturna aos fins de semana, atividade que abandonou por sua iniciativa, na sequência dos factos” (p. 5 da Sentença), não olvidando o facto de não constar nenhum antecedente criminal no seu Certificado;
42) DOS CONCRETOS PONTOS DE FACTO QUE DEVERIAM TER SIDO INSERIDOS NA MATÉRIA FACTUAL JULGADA COMO PROVADA E QUE SE CONSIDERAM INCORRETAMENTE OMITIDOS: omitiu, o Tribunal a quo, a necessária inserção de matéria factual “provada” relevante que a produção de prova ocorrida nos presentes autos demandava;
43) Requer o Arguido/Recorrente, a inserção dos seguintes pontos de facto na Lista de Factos a serem considerados como “provados”:
a. 1 – No dia 24.07.2022, na zona VIP do estabelecimento noturno “…”, o Sr. DD foi alvo de provocações por parte do Ofendido, ocorridas antes do contacto estabelecido com o Arguido;
b. 2 – O Ofendido encontrava-se embriagado e instalara um mau ambiente na referida zona VIP;
c. 3 – Quando o Arguido procurou chamar à razão o Ofendido, apelando a que o mesmo cessasse as provocações para com o Sr. DD, o Ofendido ficou mais agressivo e iniciou uma postura corporal que indicava que iria agredir o Arguido;
d. 4 – A zona VIP do estabelecimento em causa se encontrava lotada, com pessoas encostadas umas às outras, e o respetivo chão se encontraria escorregadio;
e. 5 – O ofendido, após ter sido acompanhado para a porta do estabelecimento pelos seguranças, demonstrou intenção de agredir o Arguido no exterior do estabelecimento, praticando um crime de dano qualificado (arrancou um sinal camarário de trânsito para com ele bater com ele no Arguido);
44) Relativamente ao ponto de facto n.º 1 acima identificado, eis os concretos meios probatórios constantes do processo que demandam a sua inclusão:
a. Vide depoimento de BB em sede de Inquérito:
“estava presente e assistiu aos factos, podendo afirmar com toda a certeza que o denunciante meteu-se com pessoal que se encontrava no estabelecimento e que foram alertar o segurança de serviço naquele local, na pessoa de AA, o qual dirigiu-se ao denunciante e pediu para não se meter com os clientes, ao que o denunciante disse que não era nada consigo e que ele fazia o que queria”;
b. Vide depoimento de BB em sede de Julgamento: “o amigo DD veio dizer-lhe que estava um rapaz a meter-se com ele, e disse-lhe que fosse ter com os seguranças” (p. 8 da Sentença);
c. Vide depoimento de DD em sede de Julgamento: “disse estar na discoteca com umas raparigas, e logo que chegou, começou a ser importunado. O indivíduo dizia que devia achar que é o maior. És o rei delas. Nunca o tinha visto. Foi ter com o dono do estabelecimento, que disse que fosse ter com o segurança. Foi ter com o AA e explicou a situação” (p. 8 da Sentença);
d. Vide depoimento de HH em sede de Julgamento: “segurança na discoteca, referiu que já tinha visto o cliente, um bocado agitado, ouviu no rádio que tinham chamado o AA” (p. 9 da Sentença).
e. Vide depoimento de GG em sede de Julgamento: “frequentador da discoteca, contou que estava lá com uns rapazes, na zona vip, incluindo o DD. O rapaz [LL] importunou o colega e foi avisado pelos seguranças” (p. 10 da Sentença);
f. Vide depoimento do Arguido em sede de Julgamento: apareceram outros seguranças que o levantaram e levaram para a rua;
g. Vide depoimento de MM em sede de Julgamento: “A seguir foi posto na rua” (Sentença); “o amigo quando foi para a rua, ia a esbracejar” (p. 8 da Sentença);
h. Vide depoimento de NN: “Viu o amigo a ser levado pelos seguranças, mas nem se apercebeu que era ele. Há dois seguranças que o agarraram e levaram, tem a ideia que ia deitado” (p. 8 da Sentença);
i. Vide depoimento de DD em sede de Julgamento: “levantaram-se e os colegas levaram-nos para fora. O AA ficou no interior” (p. 9 da Sentença);
j. Vide depoimento de HH em sede de Julgamento: “segurança na discoteca, referiu que (…) O que viu foi o cliente a opor-se, a não querer ir para a rua” (p. 9 da Sentença).
45) Relativamente ao ponto de facto n.º 2 acima identificado, eis os concretos meios probatórios constantes do processo que demandam a sua inclusão:
a. Vide depoimento do Arguido em sede de Julgamento: “o ofendido estava embriagado, porque estava sempre a repetir a mesma coisa” (p. 7 da Sentença);
b. Vide depoimento de NN: “Esclareceu ainda que estavam embriagados” (p. 8 da Sentença);
c. Vide depoimento de HH em sede de Julgamento: “segurança na discoteca, referiu que já tinha visto o cliente, um bocado agitado, ouviu no rádio que tinham chamado o AA. Viu o homem a gesticular e a falar de forma agressiva para o DD. Viu o AA a falar e que o cliente se tornou ainda mais agressivo, a tentar saltar para cima do AA” (p. 9 da Sentença);
46) Relativamente ao ponto de facto n.º 3 acima identificado, eis os concretos meios probatórios constantes do processo que demandam a sua inclusão:
a. Vide depoimento de DD em sede de Julgamento: “veja-se a testemunha DD fiz que percebeu que o indivíduo se estava a tornar agressivo, porque estava a fazer peito” (p. 11 da Sentença); “Acha que o AA o convidou a sair. Ele não queria (…) como ele [LL] estava tão agressivo, caíram os dois” (p. 9 da Sentença);
b. Vide depoimento de HH em sede de Julgamento: “diz ter visto um gesto agressivo por parte do individuo, porém, não foi também qualquer tentativa de murro, e não foi também fazer peito… mas antes a tentar saltar para cima do AA” (p. 11 da Sentença), sendo certo que “saltar para cima” pode muito bem ser sinónimo de “fazer peito” ou “tentar agredir” - “segurança na discoteca, referiu que já tinha visto o cliente, um bocado agitado, ouviu no rádio que tinham chamado o AA.
Viu o homem a gesticular e a falar de forma agressiva para o DD. Viu o AA a falar e que o cliente se tornou ainda mais agressivo, a tentar saltar para cima do AA” (p. 9 da Sentença).
47) Relativamente ao ponto de facto n.º 4 acima identificado, eis os concretos meios probatórios constantes do processo que demandam a sua inclusão:
a. Vide o depoimento de BB: “A discoteca estava molhada e escorregaram” (p. 8 da Sentença);
b. Vide o depoimento de DD: “Mas como ele [LL] estava tão agressivo, caíram os dois. O chão estava escorregadio, e o individuo ficou com a mão por trás do pescoço do AA” (p. 9 da Sentença);
c.Vide o depoimento de II: “o AA falou com o rapaz. Algo se passou que escorregaram e caíram” (p. 9 da Sentença);
d. Vide o depoimento de GG em sede de Julgamento: “Foi uma conversa normal. Ninguém empurrou ninguém. Depois escorregaram e caíram” (p. 10 da Sentença).
e. Relativamente ao ponto de facto n.º 5 acima identificado, eis os concretos meios probatórios constantes do processo que demandam a sua inclusão:
f. Vide o depoimento do alegado Ofendido em sede de Julgamento: “Admitindo que, pegou num ferro e que quis ir bater no arguido, porque estava revoltado por não ter feito nada. O que foi dito também dito pelo arguido e que as testemunhas FF e JJ, também seguranças procuraram confirmar” (p. 17 da Sentença);
g. Vide o depoimento de BB em sede de Inquérito: “declara que estava presente e assistiu aos factos, podendo afirmar com toda a certeza que (…) o depoente viu ainda que o denunciante após ter sido acompanhado ao exterior, arrancou um sinal de trânsito que se encontrava no parque de estacionamento do lado contrário ao local onde se encontra o estabelecimento por si gerido, e com esse sinal quis enfrentar o pessoal de serviço ao segurança, ao mesmo tempo que dizia que ia buscar uma pistola e matava toda a gente”;;
h. Vide o depoimento de FF em sede de Julgamento: “Na altura estava na porta, e até viu o rapaz a agarrar num sinal para bater no AA” (p. 9 da Sentença);
i. Vide o depoimento de JJ em sede de Julgamento: “Saiu um rapaz a correr, e foi arrancar um sinal e queria entrar na discoteca para bater no AA, depois largou o sinal e foi embora” (p. 10 da Sentença);
48) Os 5 (cinco) pontos de facto, cuja inclusão se requer ao quadro factual apurado como provado, têm suma relevância não só para a análise atenta e crítica da prova produzida nos autos na sua globalidade, como também para a prolação de uma decisão justa e correspondente à realidade dos factos, tendo sido, tais factos sido totalmente desconsiderados pelo Tribunal a quo, sem qualquer justificação;
49) Atendendo à prova documental e testemunhal indicada, deverá a Sentença recorrida ser ainda alterada, e substituída por outra, que inclua, no quadro factual apurado como provado, os cinco pontos de facto supratranscritos, o que se requer;
50) DA CONCLUSÃO DA IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO: da prova produzida em sede de Audiência de Julgamento, bem como pelos documentos juntos aos autos, não resultaram provados os factos falsamente alegados contra o Arguido, pelo que também se requer a V. Exas. a reapreciação destes factos;
51) Na Sentença recorrida não se procedeu a uma correta interpretação dos elementos constantes dos autos, da prova produzida em sede de audiência de julgamento, bem como se efetuou uma incorreta interpretação e aplicação das normas jurídicas aplicáveis ao caso em concreto, sofrendo a Sentença recorrida de nulidade que se invoca, para todos os efeitos legais;
52) Do exame da Sentença recorrida, deteta-se a existência erro no julgamento quanto à matéria de facto em causa, tendo ocorrido, salvo devido respeito, uma visível falha na avaliação da prova feita pelo Tribunal a quo, sendo o texto da decisão em crise revelador de incoerência e desrespeito pelas regras da experiência comum e da prova produzida, pelo que deverá ser revogada a Sentença recorrida;
53) A Sentença recorrida padece do vício de erro notório na apreciação da prova, a que se reporta a alínea c), do n.º 2, do artigo 410.º do CPP, não existindo nos auto prova testemunhal ou documental que sustente a condenação do Arguido e, consequentemente, deve a Sentença recorrida ser revogada e o Arguido absolvido do crime que lhe é imputado e dos pedidos de indemnização civil contra si formulados, o que se requer, com todas as consequências legais daí resultantes;
54) DA DECISÃO QUE DEVE SER PROFERIDA SOBRE AS QUESTÕES DE FACTO IMPUGNADAS: após a motivação exposta supra, que este Venerando Tribunal, irá revogar e alterar a Sentença recorrida, alterando a matéria de facto dada como provada e como não provada e incluindo a matéria de facto identificada, atendendo ao disposto no artigo 431.º do CPP;
55) Dos pontos de facto que foram julgados incorretamente como “provados” (consignados na Sentença recorrida, sob os seguintes números 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9 e 10) deverão ser considerados como NÃO PROVADOS, dos pontos de facto que foram julgados incorretamente como “não provados” (consignados na Sentença recorrida, sob a alínea C), deverão ser dados como totalmente PROVADOS e os pontos de facto incorretamente omitidos e cuja inclusão supra se requereu com os números 1, 2, 3, 4 e 5, deverão ser incluídos no quadro factual apurado como PROVADOS, o que se requer;
56) III – Do Recurso sobre a matéria de direito: IIIA - Da valoração de prova proibida: o Tribunal a quo deu como provada factualidade constante do vídeo que não foi exibido em audiência, formando a sua convicção com base no vídeo;
57) O Tribunal a quo, em várias partes da Sentença recorrida, referencia um vídeo que não foi produzido, nem examinado em sede de julgamento, o que fica bem visível através da Ata da audiência de discussão e julgamento, na qual consta que algumas testemunhas e o Arguido apenas foram confrontadas com as fotografias constantes dos autos de fls. 118 e 124 (Arguido, BB) e de fls. 116 e 117 (CC), em violação do artigo 355.º do CPP, referente à proibição de valoração de provas, sendo a falta de exibição do vídeo em audiência de julgamento violadora do princípio da imediação e da oralidade de que o n.º 1, do artigo 355.º do CPP é emanação;
58) O vídeo em causa nem se trata de um vídeo suficientemente percetível, nos termos já supra sobejamente explanado, não sendo o mesmo adequado à emanação dos juízos conclusivos perpetrados na Sentença recorrida de que o Arguido terá agredido o alegado Ofendido, designadamente esmurrando o mesmo;
59) Nem a testemunha CC (Agente da PSP), ao proceder ao visionamento do vídeo em causa, conseguiu afirmar ter visto uma agressão nos termos temerariamente concluídos na Sentença recorrida, dada a impercetibilidade do referido vídeo, resultando do Auto de Visionamento de suporte informático, de 27.02.2023: “a qualidade de captação não tem a definição ideal e o ambiente de uma discoteca não ajuda a que essa definição seja a melhor”, e desse Auto e das respetivas legendas dos fotogramas selecionados não se faz qualquer referência a nenhuma agressão, designadamente que o Arguido tenha dado murros na face e olho direito do alegado Ofendido;
60) Pelo Arguido fora solicitado todo o processo, pedido esse que foi respondido apenas parcialmente, uma vez que ao mesmo apenas foi concedido acesso ao processo que se encontra materializado em papel, não lhe tendo sido concedido o acesso ao vídeo ora em causa, o que não se pode conceder;
61) O artigo 355.º do CPP determina que todas as provas que, concretamente, contribuam para a decisão do Tribunal de julgar provados ou não provados factos com interesse para a decisão de alguma das questões que integram o objeto da causa sejam produzidos ou examinadas em audiência pública, tendo em vista a contraditoriedade imposta pelo artigo 327.º, n.º 2, do CPP que dispõe que os meios de prova apresentados no decurso da audiência são submetidos ao princípio do contraditório, mesmo que tenham sido oficiosamente produzidos pelo tribunal;
62) Trata-se de assegurar o princípio do contraditório, segundo o qual assiste ao Arguido o direito de contestar e impugnar não só os factos iniciais já conhecidos ou quaisquer outros que surjam e que o Tribunal pretenda levar em consideração, assim como as provas que sobre eles incidam, de modo que não seja proferida qualquer decisão surpresa contra o mesmo, por factos ou provas dos quais não teve oportunidade de se defender;
63) Tal princípio tem acolhimento constitucional como decorre da segunda parte do n.º 5, do artigo 32.º da CRP, que assegura o contraditório a todos os sujeitos processuais que possam vir a ser afetados pela decisão, de forma a garantir-lhes uma influência efetiva no desenvolvimento do processo e, particularmente no que respeita ao Arguido, estão em causa as «garantias de defesa» a que alude o n.º 1, do mesmo artigo 32.º da CRP;
64) Lida a motivação da matéria de facto, fica a perceber-se, claramente, o modo como se formou, no essencial, a convicção formulada naquela decisão, quanto ao núcleo fundamental da controvérsia verificada nos autos, ou seja, aos factos que fundamentaram a condenação, alegadamente cometidos pelo Recorrente em ofensa à integridade física do alegado Ofendido;
65) Verifica-se na Sentença recorrida que a convicção do Tribunal a quo se alicerçou com base na visualização de um vídeo cujas imagens são impercetíveis para os efeitos de prolação de uma condenação do Arguido, e um vídeo que não foi produzido e examinado em audiência de julgamento, ou seja, constata-se que essa convicção se formou, essencialmente, com base nas declarações incongruentes e contraditórias do alegado Ofendido, coadjuvadas pelo resultado de um vídeo cujo teor não foi objeto de visionamento no decurso do julgamento, pelo que a convicção da Meritíssima Juiz a quo claramente se fundou em meios os quais, nos termos do citado artigo 355.º do CPP, não poderiam valer em julgamento, nomeadamente para o efeito de formação da convicção do tribunal, sem que tivessem sido examinados em audiência;
66) É insustentável a ponderação de tal vídeo, cujo teor não foi examinado em audiência, e ainda assim se terá de entender porque na respetiva ata nada se diz;
67) Ocorreu na Sentença recorrida uma flagrante violação do artigo 355.º, n.º 1, do CPP respeitante à proibição de valoração de provas, sendo que a sua consequência consiste fundamentalmente na inutilização da prova afetada pelo seu desrespeito que, por isso, não pode ser invocada nem pode valer para o efeito da formação da convicção;
68) A Sentença recorrida violou os princípios da imediação, da oralidade e do contraditório e, ao decidir como decidiu – formando a sua convicção com base no vídeo em causa – fundamentou a douta decisão ora recorrida, em prova proibida, o que acarreta a nulidade da Sentença, a qual se invoca;
69) IIIB - Do crime de dano qualificado por parte do alegado Ofendido e da tentativa de ofensa à integridade física perpetrada pelo alegado ofendido contra o Arguido: Resulta da prova produzida que o alegado Ofendido, após ter sido acompanhado para a porta do estabelecimento pelos seguranças, demonstrou intenção de agredir o Arguido no exterior do estabelecimento, tendo praticado um crime de dano qualificado (arrancou um sinal camarário de trânsito para bater com ele no Arguido):
a. Vide o depoimento do alegado Ofendido em sede de Julgamento: “Admitindo que, pegou num ferro e que quis ir bater no arguido, porque estava revoltado por não ter feito nada. O que foi dito também dito pelo arguido e que as testemunhas FF e JJ, também seguranças procuraram confirmar” (p. 17 da Sentença);
b. Vide o depoimento de BB em sede de Inquérito: “declara que estava presente e assistiu aos factos, podendo afirmar com toda a certeza que (…) o depoente viu ainda que o denunciante após ter sido acompanhado ao exterior, arrancou um sinal de trânsito que se encontrava no parque de estacionamento do lado contrário ao local onde se encontra o estabelecimento por si gerido, e com esse sinal quis enfrentar o pessoal de serviço ao segurança, ao mesmo tempo que dizia que ia buscar uma pistola e matava toda a gente”;;
c. Vide o depoimento de FF em sede de Julgamento: “Na altura estava na porta, e até viu o rapaz a agarrar num sinal para bater no AA” (p. 9 da Sentença);
d. Vide o depoimento de JJ em sede de Julgamento: “Saiu um rapaz a correr, e foi arrancar um sinal e queria entrar na discoteca para bater no AA, depois largou o sinal e foi embora” (p. 10 da Sentença);
70) Sobre esta matéria, o Tribunal a quo apenas soube dizer o seguinte: “foi perentório o ofendido ao referir que, fora da discoteca não aconteceu nada. Admitindo que, pegou num ferro e que quis ir bater no arguido, porque estava revoltado por não ter feito nada. O que foi dito também dito pelo arguido e que as testemunhas FF e JJ, também seguranças procuraram confirmar” (p. 17 da Sentença) – o que não se pode conceder;
71) O crime em questão trata-se de um crime público, que se aplica a quem destruir, no todo ou em parte, danificar, desfigurar ou tornar não utilizável coisa alheia destinada ao uso e utilidade públicos;
72) Como poderá o Tribunal a quo ter desconsiderado a prática, por parte do alegado Ofendido, de um crime de dano qualificado, punível com pena de prisão até oito anos, pelo facto de ter ficado mais do que demonstrado, pela prova produzida, que o mesmo arrancou um sinal de trânsito naquela bem concreta zona da cidade?;
73) O sinal de trânsito, que foi objeto de danos por parte do alegado Ofendido, enquanto coisa destinada ao uso e utilidade de organismo ou serviços públicos, integra a previsão da alínea c), do n.º 1, do artigo 213.º, do CP, revestindo, este ilícito penal, natureza pública;
74) Os factos demonstrados através das declarações do alegado Ofendido e dos depoimentos das testemunhas supra identificadas, produzidas em sede de audiência de julgamento enquadram-se na previsão típica do crime de dano qualificado, pelo que ao alegado Ofendido deveria ter sido imputada, pois, a prática em autoria material de um crime de dano qualificado, p. e p. nos artigos 212.º e 213.º, n.º 1, alínea c), do CP, pelo que dúvidas não existem de que a douta Sentença recorrida violou tais normativos;
75) Quando muito, o Tribunal a quo, com base nas próprias declarações do alegado Ofendido e também dos depoimentos das testemunhas supra identificadas, deveria ter determinado a extração de certidão da ata de audiência de julgamento e da gravação da audiência de julgamento e a remessa ao DIAP, para procedimento criminal, o que não sucedeu, razão pela qual deverá o presente Recurso ser julgado totalmente procedente e revogada a Sentença recorrida, o que se requer, com todas as consequências legais daí resultantes;
76) V – Ainda do recurso: na Sentença recorrida, embora se faça essa referência às declarações de cada uma das testemunhas – quer sejam de defesa, quer seja da acusação –, não se poderia efetivamente condenar o Arguido, por todos os motivos expostos;
77) A Sentença recorrida viola os artigos 359.º, n.º 1 e 2 CPP e artigos 40.º, 70.º e 71.º do CP, não existindo dúvidas que na Sentença recorrida se violou também o disposto no artigo 410.º do CPP, e que esse Venerando Tribunal pode apreciar as questões postas em crise, nos termos do n.º 2 desta disposição processual/legal;
78) Na Sentença recorrida existe insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, omissão de pronúncia sobre questões que deveria ter sido objeto de apreciação e erro notório na apreciação da prova nos termos supra demonstrados;
79) O Tribunal a quo deixou de se pronunciar sobre as questões que deveria ter devidamente apreciado, nomeadamente as já alegadas nesta peça processual, ou apreciando-as superficialmente, e com bastantes lacunas, como acima já se demonstrou;
80) Lendo, atentamente, a Sentença recorrida, verifica-se que nela não se indica factos concretos verdadeiramente suscetíveis de revelar, informar, e fundamentar, a real e efetiva situação, do verdadeiro motivo da condenação do Arguido/Recorrente, antes pelo contrário;
81) A Sentença recorrida viola o disposto no artigo 208.º da CRP, uma vez que segundo esta disposição Constitucional, “As decisões dos tribunais são fundamentadas nos casos e nos termos previstos na Lei”, sendo que a Sentença recorrida viola o disposto no artigo 207.º da CRP, uma vez que esta norma é tão abrangente, que nem é necessário que os Tribunais apliquem normas que infrinjam a Constituição, basta apenas e tão só, que violem “os princípios nela consignados”;
82) Viola também a Sentença recorrida o disposto no artigo 205.º da CRP, nomeadamente o n.º 2, uma vez que: “Na administração da justiça incumbe aos tribunais assegurar a defesa dos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos... e dirimir os conflitos de interesses públicos e provados” e, neste caso, essa circunstância não se verifica;
83) A condenação do Arguido/Recorrente é ilegal e inconstitucional, violando-se também o disposto no artigo 13.º da CRP, dado que esta norma constitucional dispõe: “Todos os cidadãos têm a mesma dignidade social e são iguais perante a lei”;
84) Tem forçosamente de ser alterada a matéria de facto dada como provada atendendo aos vários depoimentos acima transcritos, e à falta de outros meios de prova que sustentem a prática dos factos, nos termos do artigo 412.º do CPP;
85) O Arguido/Recorrente não foi tratado de forma igual a outros cidadãos perante a lei, acrescendo o facto de que a Sentença recorrida viola o disposto nos artigos 374.º, 375.º e 377.º do CPP;
86) V. Exas. certamente REVOGARÃO a Sentença recorrida, absolvendo o Arguido do crime de que foi injustamente condenado, revogando também as regras de cumprimento que lhe foram impostas, por ser de LEI, DIREITO E JUSTIÇA;
87) A Sentença sob recurso violou:
a) O disposto nos artigos 22.º, 23.º, 40.º, 70.º, 71.º, 143.º, n.º 1, 212.º, 213.º, n.º 1, todos do Código Penal;
b) O disposto nos artigos 89.º, 90.º, 327.º, n.º 2, 355.º, 359.º, n. os 1 e 2, 374.º, 375.º, 377.º e 410.º, todos do Código Processo Penal;
c) O disposto nos artigos 13.º, 32.º, 205.º, 207.º, 208.º da Constituição da República Portuguesa.”
*
O recurso foi admitido com subida imediata, nos próprios autos e com efeito suspensivo.
*
O Ministério Público apresentou resposta ao recurso, pugnando pela sua improcedência e formulando as seguintes conclusões:
“1. A decisão da matéria de facto está bem fundamentada e a prova produzida em julgamento não é geradora de dúvida.
2. Efetivamente, se o Tribunal considerou que da prova produzida resultou que o arguido praticou os factos que lhe foram imputados em sede de acusação, tal sucedeu precisamente porque a interpretação dos depoimentos prestados em audiência interpretados à luz das regras da experiência comum e da lógica e, bem assim, quando conjugados com todos os demais elementos de prova já constantes dos autos - em particular as imagens de videovigilância – permitiram formar ao Tribunal a convicção de que os factos ocorreram conforme vinha descrito na acusação.
3. Donde, no que concerne a crítica do arguido à impugnada sentença quanto à decisão de dar como assente a factualidade descrita na acusação e de não dar como provado o facto constante da alínea c), o mesmo mais não pretende do que, ao arrepio do princípio da livre apreciação da prova, fazer prevalecer aquilo que entende que deveria ter sido dado como não provado, a partir de uma sua pessoal interpretação dos factos trazidos à apreciação do tribunal.
4. É certo que o princípio da livre apreciação da prova não se confunde, de modo algum, como já referido, com livre arbítrio ou plena discricionariedade na apreciação da prova.
5. Mas também é um facto que uma modalidade de ponderação discricionária da prova é a utilizada pelo recorrente -, ao branquear tudo o que resulta à saciedade das imagens de videovigilância, conjugadas com as declarações do ofendido e elementos clínicos juntos aos autos, em particular o facto das testemunhas de defesa terem procurado atribuir a queda ao chão, não como resultado da violência perpetrada pelo arguido sobre LL, mas como resultado de um chão escorregadio, estribados numa necessidade de afastar qualquer responsabilidade do arguido - em lugar de proceder a uma análise objectiva e a uma crítica imparcial e contextualizada desses elementos de prova, análise que, pelas razões aduzidas na fundamentação, à luz das regras da experiência comum, foi decisiva para formar a convicção do tribunal. Por outro lado,
6. Existe erro notório quando se dão como provados factos que, face às regras da experiência comum e à lógica do homem médio, não se poderiam ter verificado ou são contraditados por documentos que fazem prova plena não arguidos de falsos.
7. Perscrutada a decisão recorrida, não se encontra, nem o recorrente esclarece em que termos, nenhuma falha dessa natureza.
8. Alega o Recorrente que, o Tribunal “a quo” deu como provada factualidade constante do vídeo que não foi exibido em audiência, com base no qual formou a sua convicção, em violação do princípio da imediação e da oralidade, expresso no n.º 1 do artigo 355º, n.º1, do CPP.
9. Ora, no caso, a circunstância de o vídeo em questão não ter sido visionado durante a audiência de julgamento não invalida que tenha constituído, como constituiu, o centro da discussão da prova, como meio de prova nuclear do processo - aliás, a acusação relaciona-o como meio de prova, por se encontrar junto aos autos.
10. E, quer o arguido foi confrontado com os fotogramas extraídos do mesmo (a fls. 118 e 124 dos autos), quer o a testemunha CC foi ouvida sobre o mesmo, na presença do recorrente e seu mandatário que exerceu o contraditório, a par e passo, da forma o mais ampla possível; Sendo a cópia do vídeo junta aos autos conhecido de todos, a reprodução nem foi pedida nem se revelou, por qualquer forma, necessária. Como meio pré-constituído, arrolado na acusação, objeto de discussão em audiência, com exercício do contraditório, não carecia ser reproduzido, porque ninguém teve como necessária a reprodução de um conteúdo de todos conhecido e indiscutível.
11. Improcede, pois, a invocada nulidade.
12. É a acusação que delimita o objecto do processo, são os factos daquela constantes, imputados a um concreto arguido e constituindo crime, que fixam o campo delimitador dentro do qual tem de se mover a investigação do tribunal, a sua actividade cognitiva e decisória.
13. Nessa medida, não constando da acusação, como objecto, a prática de factos por LL, designadamente a prática de um crime de dano qualificado, não poderia nunca o Tribunal sobre os mesmos, exercer actividade cognitiva e decisória.
14. Nem bem assim, proceder à extração de certidão para procedimento criminal, atentas as discrepâncias dos depoimentos no que toca ao tipo de objecto agarrado por LL.
15. Por fim, avultam da sentença recorrida, com clareza evidente, os critérios que determinaram a escolha da medida concreta da pena, o grau de ilicitude elevado, o modo de execução, a existência de dolo directo a não demonstração de arrependimento. Donde,
16. Considerando as circunstâncias do caso concreto, à luz dos critérios dos artigos 40.º e 71.º do Código Penal, a pena de 170 dias de multa, à taxa diária de €7,00, num total de €1.190,00, mostra-se justa e equilibrada.
17. Não incorreu, como tal, o Tribunal na violação dos princípios invocados pelo Recorrente.
18. Não enferma, assim, a sentença de qualquer dos vícios invocados;
Deste modo, deverá tal sentença ser mantida nos seus precisos termos.”
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Nesta Relação, o Ministério Público emitiu parecer no sentido de dever ser negado provimento ao recurso e mantida a sentença recorrida.
*
Foi dado cumprimento ao disposto no art.º 417º, nº 2 do Cód. Proc. Penal, nada tendo o recorrente vindo acrescentar ao já por si alegado.
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Proferido despacho liminar, teve lugar a conferência.
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2 – Objecto do Recurso
Conforme o previsto no art.º 412º do Cód. Proc. Penal, o âmbito do recurso é definido pelas conclusões extraídas pelo recorrente da motivação do recurso, as quais delimitam as questões a apreciar pelo tribunal ad quem, sem prejuízo das que forem de conhecimento oficioso (cf. neste sentido, Germano Marques da Silva, in “Curso de Processo Penal”, vol. III, 1994, pág. 320, Simas Santos e Leal-Henriques, in “Recursos Penais”, 9ª ed., 2020, pág. 89 e 113-114, e, entre muitos outros, o acórdão do STJ de 5.12.2007, no Processo nº 3178/07, 3ª Secção, disponível in Sumários do STJ, www.stj.pt).
Assim sendo, são as seguintes as questões a apreciar no presente recurso:
- verificação dos vícios previstos no art.º 410º, nº 2, alíneas a) e c) do Cód. Proc. Penal;
- impugnação da matéria de facto;
- valoração de prova proibida;
- imputação ao ofendido da prática de um crime de dano qualificado e de um crime de ofensa à integridade física contra o arguido, na forma tentada.
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3- Fundamentação:
3.1. – Fundamentação de Facto
A decisão recorrida considerou provados e não provados os seguintes factos e com a seguinte motivação:
“Factos Provados:
No que respeita à pronúncia com interesse para a boa decisão da causa resultaram provados os seguintes factos:
1. No dia 24.07.2022, cerca das 06H00m, LL encontrava-se no interior do estabelecimento noturno “…”, sita na …, em …, designadamente numa área da pista de dança do mesmo.
2. Altura em que o arguido AA se dirigiu ao mesmo, encetando uma conversa com o mesmo e colocando, concomitantemente, a sua mão esquerda em cima do ombro de LL.
3. Nisto, sem que nada o fizesse prever, passou o braço esquerdo pelo pescoço do mesmo, fazendo pressão e derrubou-o, levando-o a cair ao chão.
4. Apesar de se encontrar no chão, o arguido continuou a agarrar o ofendido, desferindo-lhe murros em número indeterminado, que o atingiram na face e no olho direito.
5. Ao mesmo tempo que o arrastou, caindo depois também o arguido ao chão, momento em que surge outro segurança que pega no ofendido, e o leva para o exterior do estabelecimento.
6. Em consequência da conduta do arguido, LL sofreu dores e apresentou traumatismo da face, da boca e do tórax, olho direito vermelho por hemorragia conjuntival interna, visão enevoada, escoriação malar direita, hematoma prioritário direito, ferida puntiforme supraciliar direita, deformação e dor da pirâmide nasal com epistáxis, dor à palpação da mandíbula, à esquerda,
7. Que determinaram um período de 7 (sete) dias para a cura, dos quais 4 (quatro) com incapacidade para o trabalho geral.
8. O arguido atuou com o propósito de atingir a saúde e integridade física de LL, o que conseguiu.
9. Agiu de forma livre, porque capaz de se determinar segundo a sua vontade, e voluntária e consciente, querendo atuar da forma supra descrita
10. Sabia ser o seu comportamento proibido por lei penal.
Do pedido de indemnização civil do Centro Hospital …:
11. Na sequência das referidas lesões, a LL, foi prestada assistência hospitalar, no dia 24.07.2022, no valor de €250,46.
Do pedido de indemnização civil deduzido pelo Hospital Distrital de …:
12. Na sequência das referidas lesões, a LL, foi prestada assistência no Hospital Distrital de … no dia 24.07.2022 e no valor de €310,10.
Das condições económicas e pessoais:
13.
- O arguido reside com a companheira, EE, de … anos, desde meados de 2023.
- Reside num apartamento, na cidade de …, com boas condições de habitabilidade.
- O arguido exerce atividade laboral como … num espaço comercial na cidade de … desde a ocorrência dos factos, pertencendo aos quadros da empresa … desde 01-10-2023.
- Encontrava-se a exercer funções de … em …, afeto ao …, com quem estabeleceu contrato por sete anos, finalizando o mesmo com louvor por comportamento exemplar. Em part time desempenhava funções de segurança em espaço de diversão noturna aos fins de semana, atividade que abandonou por sua iniciativa, na sequencia dos factos.
- O arguido aufere €845 e a companheira €890,00. Pagam de habitação €500,00, de credito automóvel €345,00, de gás e luz €100,00, água €30,00 e telecomunicações €115,00.
- Desde muito jovem que tem como objetivo dedicar-se a uma carreira militar, encontrando-se em concurso para eventual admissão à …
- Do contacto com fonte do meio local, foi apurado que o arguido é conhecido no seu local de residência e considerado uma pessoa bem integrada socialmente com uma representação social positiva.
Antecedentes criminais:
14. O arguido não tem antecedentes criminais.
Factos não Provados:
Da pronúncia:
A. Após, agarrou-o e arrastou-o para a porta do estabelecimento, colocando-o na rua.
B. No exterior, o arguido desferiu-lhe murros em numero indeterminado, que ao atingiram na face e no olho direito.
C. O arguido abordou o ofendido, motivado por situação não concretamente apurada que ocorrera no interior do referido estabelecimento envolvendo o ofendido e outros clientes que aí se encontravam, que deste se queixaram.
Motivação da decisão de facto:
Acusação
O Tribunal fundou a sua convicção no apuramento da matéria de facto no conjunto da prova produzida em audiência de julgamento.
Em concreto:
Quanto ao local dos factos, tanto o arguido como o ofendido LL, se referiram à discoteca …, em …. Apesar de não conseguirem concretizar o dia em que ocorreram os factos, referiu o ofendido LL que, após sair da discoteca, se dirigiu ao hospital de …. Do episódio de urgência junto a fls. 15, retira-se que tal sucedeu no dia 24 de Julho de 2022. Ainda, e como testemunha prestou depoimento, BB, que explorava o espaço, trabalhando na altura o arguido para o mesmo, que referiu que, entregou as imagens de videovigilância à PSP, do dia do conflito. Ora, esta imagens constam efetivamente dos autos. Do auto de visionamento e dos fotogramas extraídos e bem assim do próprio suporte informático - fls. 116 a 124 e 125 -resulta que o referido conflito ocorreu no dia 24.07.2022, cerca das 6h00.
Assim, desta apreciação resultam provados os factos do ponto 1.
No que respeita ao sucedido, contou o arguido que estava na discoteca, e o ofendido foi agressivo com outro rapaz, DD, que estava com umas raparigas. O rapaz foi chamá-lo e dirigiu-se ao ofendido, que disse que tinha a mania que era segurança, e que tinha peito. Disse-lhe que tinha que o acompanhar à rua, mas ele reagiu mal, e tentou agredi-lo. Questionado sobre o que quer dizer sobre o ter tentado agredi-lo, referiu que se aproximou para lhe dar um murro. E continuou referindo que, nisto andou para trás, escorregou e caíram os dois, ficando o ofendido a seu lado. Os colegas apareceram, pegaram nele e levaram-no para a rua. Desconhece o que sucedeu na rua, porque não foi até lá. Concretizou que, os factos ocorreram na zona VIP que na altura estava lotada., pessoas encostadas umas às outras. Questionado, porque razão caíram, disse que foi por causa dos copos, acabam por molhar o chão. Explicou também que, o ofendido estava embriagado, porque estava sempre a repetir a mesma coisa.
Confrontado com os fotogramas disse que simplesmente pegou no ofendido, para o levar à porta, reconhecendo-se como a pessoa de preto que se aproxima de um individuo de branco que diz ser o ofendido.
A testemunha LL, ofendido relata uma versão totalmente distinta dos acontecimentos. Diz que, saiu à noite. A certa altura houve um atrito entre uma pessoa que conhecia e outra que não conhecia, disse-lhes que estivessem quietos e para se divertirem. O arguido veio falar consigo de forma menos simpática, e depois, agarrou-lhe no pescoço e mandou-o ao chão. Concretiza que, lhe agarrou no pescoço com o braço, e deu-lhe um pontapé, e meteu-o no chão. No chão deu-lhe murros na cara, principalmente no direito, sempre com o braço no pescoço. Depois, apareceram outros seguranças que o levantaram e levaram para a rua. Questionado referiu que, na rua não aconteceu nada. Recorda-se que, pegou num ferro e tentou chamar a pessoa, por se sentir em minoria perante o sucedido. Depois, foi com uma amiga ao hospital. Quando chegou à rua deu conta que tinha a visão turva. Esteve em …, e depois foi para …. Ainda, e questionado sobre se o arguido o levou para a rua, disse que acha que não, julga que se afastou. Mais disse que, nunca lhe tentou dar um murro. Sentiu-se transtornado no fim, porque não fez nada para que lhe fizessem aquilo. E não estava embriagado. Já tinha bebido, mas estava lúcido.
Mais disse que, tinha ido à discoteca com dois amigos: o MM e o NN.
Vejamos o que por estas testemunhas foi dito.
A testemunha MM referiu que, estava na discoteca, e que só viu o amigo LL no chão, referindo que, devem tê-lo posto no chão. Quando olhou o arguido estava a agarra-lo, por trás. A seguir foi posto na rua, Mas não viu mais nada. Concretizou que, o amigo quando foi para a rua, ia a esbracejar. Não viu se bateu, já o viu no chão. Só soube no dia a seguir, quando o viu com o olho negro. A testemunha NN, disse que, não viu nada. Estava com o LL e o MM e foi à casa de banho. Viu o amigo a ser levado pelos seguranças, mas nem percebeu que era ela. Há dois seguranças que o agarraram e levaram, tem a ideia que ia deitado. Esclareceu ainda que estavam embriagados.
Ainda, pela testemunha PP, a amiga que, pelo ofendido foi dito que foi consigo ao Hospital, foi explicado que não estava na discoteca. O LL ligou-lhe do hospital a dizer que tinha que ir a …. Foi ter com ele a … e foram ao Hospital a ….
Em síntese, vejamos o que foi referido, pelas demais testemunhas:
» BB, que explorava a discoteca, foi dito que, o amigo DD veio dizer-lhe que estava um rapaz a meter-se com ele, e disse-lhe que fosse ter com os seguranças. Foi ter com o AA, e ainda viu o AA a falar com o individuo. Mas depois, olhou para outro lado, e quando voltou a olhar já estão os dois no chão. Havia outro segurança, o FF que foi ter com eles, e acompanhou o outro individuo à porta. A discoteca estava molhada e escorregaram. Quando se aproximou estavam lado a lado. Não se apercebeu de alguma lesão. Mais afirmou que, ninguém andou à porrada lá dentro.
» DD, que disse estar na discoteca com umas raparigas, e logo que chegou, começou a ser importunado. O individuo dizia que devia achar que é o maior. És o rei delas. Nunca o tinha visto, Foi ter com o dono do estabelecimento, que disse que fosse ter com o segurança. Foi ter com o AA e explicou a situação. O AA foi ter com o individuo, e percebeu que estava a tornar-se muito agressivo, a fazer peito. Acha que o AA o convidou a sair. Ele não queria, o AA agarrou-o para o levar para fora. Mas como ele estava tão agressivo, caíram os dois. O chão estava escorregadio, e o individuo ficou com a mão por trás do pescoço do AA. O AA ficou de lado, e o outro de barriga para baixo. O AA foi logo separado do individuo, levantaram-se e os colegas levaram-no para fora, O AA ficou no interior. Não houve violência.
» OO, que trabalhava na discoteca, referiu que, reparou que as pessoas estavam a olhar para trás, e olhou para lá e viu um individuo no chão, mais o AA e depois viu o segurança a leva-lo para fora. Acha que estavam os dois de barriga para baixo.
» FF, que trabalhava como segurança na discoteca, referiu que, o AA agarrou o rapaz e colocou-o na rua. Assistiu a levarem-no para a rua. Na altura estava na porta, e até viu o rapaz a agarrar num sinal para bater no AA.
» HH, também segurança na discoteca, referiu que, já tinha visto o cliente, um bocado agitado, ouviu no rádio que tinham chamado o AA. Viu o homem a gesticular e a falar de forma agressiva para o DD. Viu o AA a falar e que o cliente se tornou ainda mais agressivo, a tentar saltar para cima do AA. O AA tentou travar e eles escorregaram e caíram. Aproximou-se e eles estavam no chão. Não ajudou a levantar. O AA não teve qualquer contacto físico com o cliente. O que viu foi o cliente a opor-se, a não querer ir para a rua.
» II, que trabalhava também na discoteca, referiu que, o AA falou com o rapaz. Algo se passou que escorregaram e caíram. Na altura estava como cliente. Depois, um colega do AA, levou-o para a rua. Não houve qualquer contacto, era uma conversa.
» JJ, amigo do arguido, e segurança do estabelecimento referiu que, estava à porta da discoteca. Saiu um rapaz a correr, e foi arrancar um sinal e queria entrar na discoteca para bater no AA, depois largou o sinal e foi embora.
Ainda, prestou depoimento a testemunha EE, companheira do arguido, que trabalhava no bar da discoteca, que referiu ter visto o individuo a sair com um colega do AA, e não se apercebeu de nada. Não viu qualquer lesão.
A testemunha GG, que disse ser frequentador da discoteca, contou que, estava lá com uns rapazes, na zona vip, incluindo o DD. O rapaz importunou o colega, e foi avisado pelos seguranças, até que o AA o chamou à atenção. Convidou-o a sair de foram educada. Deu-lhe uma palmadinha no ombro. Foi uma conversa normal. Ninguém empurrou ninguém. Depois, escorregaram e caíram pelas escadas. Vieram os dois certinhos até às escadas. Escorregaram e caíram. Questionado, sobre como ouviu a conversa, diz que estava perto.
Apreciando, cumpre-nos dizer o seguinte:
Foram apresentadas duas versões dos acontecimentos. Uma pelo arguido e outra pelo ofendido. Procurou o arguido fazer crer que, apenas convidou o ofendido a sair, e que foi o ofendido que reagiu, dizendo que, tentou agredi-lo com um murro. Nisto, andou para trás, escorregou e caíram. Os colegas, levaram o ofendido à rua.
Andou para trás, escorregaram e caíram, diz o arguido. O que, desde logo, não faz qualquer sentido. E não faz sentido, porque não é um chão molhado, de bebidas, que faz as pessoas caírem ao chão. Até porque, se assim fosse, naturalmente que, não seria apenas o arguido a cair, mas também as pessoas que na mesma se encontravam, inclusivamente a dançar, sendo que, como o próprio disse, a zona onde se encontravam estava cheia. O que mais incoerente torna a afirmação de que escorregou.
Mas, não foi só o arguido que, procurou convencer o Tribunal de que, havia escorregado. Tal foi também referido pela testemunha BB, DD, HH, II e GG. Aliás, esta testemunha deixou bem patente, o seu depoimento forçado, e consequentemente a necessidade de ter que dizer que, o arguido e o outro individuo escorregaram. Esqueceu-se foi que, não bastava dizer que escorregaram, e quando questionado sobre onde escorregaram, foi o único a dizer que tal aconteceu nas escadas do estabelecimento. O que, como se verá não corresponde à realidade.
Mais disse o arguido que, andou para trás, porque o ofendido se tornou agressivo consigo, tentando-lhe dar um murro. Curiosamente, algumas das testemunhas, procuraram também transmitir esta agressividade, porém, sem corroborarem, o que foi dito pelo arguido. Veja-se a testemunha DD diz que percebeu que o individuo se estava a tornar agressivo, porque estava a fazer peito. A testemunha HH, também segurança, diz ter visto um gesto agressivo por parte do individuo, porém, não foi também qualquer tentativa de murro, e não foi também fazer peito…mas antes a tentar saltar para cima do AA.
Por outro lado, existiram também testemunhas, que não viram nada: a testemunha GG, que inclusivamente, apesar do barulho da música, disse ter ouvido a conversa prévia - a terem escorregado - não viu qualquer resistência, só o AA a dar uma palmadinha nas costas do arguido, até porque estavam a ter uma conversa muito educada. A testemunha II, que disse estar perto do local, não viu nada. Só viu o AA a falar com o rapaz… escorregaram e caíram.
Todos no mesmo local, com atenção no arguido e no ofendido, mas nem todos assistiram ao mesmo!
A discrepância e incoerência destes depoimentos e das declarações do arguido, tem uma explicação: a descrição que fazem dos acontecimentos não corresponde ao que sucedeu. Nem as referidas testemunhas, nem o arguido falaram a verdade ao Tribunal.
Esta conclusão retira-se de um elemento objetivo dos autos. Em concreto, encontra-se junto aos autos o auto de visionamento de suporte informático, com extração dos respetivos fotogramas de fls. 116 a 124, e a gravação do sistema de videovigilância da discoteca - a fls. 125.
A testemunha CC, Agente da PSP, confrontada com o referido auto confirmou a sua elaboração e extração dos respetivos fotogramas.
Previamente, importa referir que, em audiência de julgamento, confrontado com os fotogramas, o arguido reconheceu-se como sendo a pessoa de escuro, identificada nos mesmos.
Verificada esta prova, e sobretudo, a própria gravação do sistema de videovigilância, de fls. 125, ficheiro 2 “ …”, é possível perceber que, pelas 6h04 e 13s, o arguido está junto ao balcão, e o ofendido, está na pista, de camisa branca. Pelas 6h05m51s, o arguido sai do local onde se encontra, e quando vai a passar perto do ofendido, é este que o chama, assim se aproximando o arguido do mesmo.
Ficam a falar, próximos um do outro. O que é naturalmente compreensível, considerando que se encontravam num local com barulho. Cerca das 06h06m12s, o arguido coloca a mão esquerda no ombro direito do ofendido, e continuam a conversar. Porém, às 06h07m04s, de forma repentina, o arguido passa o seu braço pelo pescoço do ofendido, e com manifesta força, baixa-o e deitando-o ao chão, continuando sempre a agarra-lo, no pescoço, ao mesmo tempo que o tenta tirar do local, arrastando-o, acabando-o por cair também o arguido ao chão. É também visível que, quando o arguido agarra o ofendido, há uma pessoa que ainda vem por trás do arguido, no intuito de o afastar. Mas, nisto aproxima-se, por trás de ambos, outro segurança, sendo percetível que levanta o ofendido. No vídeo identificado como “ …”, também pelas 6h07m é visível a referida confusão, e o afastar das pessoas que se encontravam perto, e depois, a saída do ofendido com um segurança da referida zona, sendo que foi a andar, ficando o arguido no local, aproximando-se do mesmo algumas pessoas.
Significa que, contrariamente ao referido pelo arguido, não é verdade que tenha existido qualquer ato agressivo por parte do ofendido. Como não é verdade, contrariamente ao referido pela testemunha DD que, o ofendido tenha feito peito, ou como disse a testemunha HH, que saltou para cima do arguido. Como não é verdade, o que disse esta testemunha que, o AA não teve qualquer contacto físico com o cliente. Como não é verdade o que disse a testemunha BB, que “ ninguém andou à porrada lã dentro”, o que disse a testemunha GG, que apenas viu uma palmadinha nas costas, ou o que disse a testemunha II, que só viu conversar.
Efetivamente estavam a conversar. O arguido até colocou a mão no ombro do ofendido. Porém, é o arguido que o agarra e com violência, o manda ao chão, pretendendo imobiliza-lo e procurando arrastá-lo pela discoteca. Momento em que caem os dois. Aqui diga-se, que, o que é percetível é que caem, pela força que estava a ser feita. Ninguém escorrega. Aliás, antes disto, as pessoas estavam todas a dançar, mesmo perto do bar, o que é elucidativo que o chão não estava escorregadio. Como também, contrariamente ao que foi dito pela testemunha GG, nem o arguido, nem o ofendido estão nas escadas. Encontram-se junto ao bar da zona vip, e nem mesmo quando o ofendido é levado por outro segurança se verifica a existência de qualquer escada, ou passagem pela mesma.
Face à evidência destes vídeos, e perante as referidas passagens, naturalmente que, fica explicada a incoerência das testemunhas, que não falaram a verdade, o que lhes retira toda a credibilidade. O mesmo sucedendo com a versão do arguido.
Pelo contrário, este o vídeo corrobora o depoimento do ofendido, a testemunha LL, que disse que, o arguido veio falar consigo, colocou-lhe a mão no ombro, depois, agarrou-lhe no pescoço, com o braço e mandou-o ao chão.
É de facto, o que resulta das imagens.
Diga-se que, perante estas imagens, não conseguimos concluir o referido desentendimento anterior, sendo que, o arguido referiu que o ofendido se estava a meter com outro cliente, o que fez com que fosse falar com o mesmo. O ofendido LL, já disse que, foi o próprio que tentou apaziguar um conflito, quando o arguido veio ter consigo. Porém, nada disto se retira das imagens. O que é possível verificar é que, o arguido vai a passar, e é chamado pelo ofendido, iniciando-se a dita conversa e o demais.
Mas a testemunha LL disse mais.
Contou que, o arguido o agarrou com o braço, e o mandou ao chão, com um pontapé, e que no chão lhe deu murros na cara, sobretudo no olho direito, sempre com o braço no pescoço.
Os amigos MM e NN, nada viram. O primeiro relatou que, apenas o viu no chão e sair da discoteca e o segundo apenas o viu ser levado para fora.
Porém, tal não lhe retira credibilidade. As imagens de videovigilância são perfeitamente esclarecedoras no que respeita ao referido, porém, relativamente ao pontapé, para o colocar no chão, não é possível ter-se a perceção do mesmo, não sendo possível concluir que, de facto tenha existido, sendo antes visível e percetível que com o braço, usando da força, o arguido o colocou no chão, ao mesmo tempo que continua a agarrá-lo.
Quanto aos murros, no vídeo é visível que o arguido usa o seu lado esquerdo para agarrar o ofendido, que fica com o lado direito junto do arguido. E, como o ofendido referiu, no chão, o arguido continuou a segurá-lo no pescoço. Consegue-se ver que, o arguido mexe o braço direito e arrasta o ofendido, mas porque estão de costas para o vídeo, e pela forma como se mexe, não se consegue perceber o que está a fazer. Porém, a própria forma como agarra no ofendido, pelo pescoço, junto ao seu corpo, e o arrasta demonstra a sua agressividade. Não se tratou de um mero ato de apaziguar e o colocar no exterior. Foi um ato de força e violento. Depois, os murros na cara que o ofendido refere, sobretudo no olho direito, coadunam-se com a própria forma como o arguido pega no ofendido, que fica com o lado direito junto ao seu corpo, ficando o arguido com a tal mão direita livre, que possibilita os murros na face e o atingir no olho direito. Aliás, a reação das pessoas à volta em afastarem-se e de outra pessoa que ainda tentou puxar o arguido, é o reflexo de que o arguido estava de facto, como o diz o ofendido, a dar-lhe murros na cara.
Por outro lado, corrobora também o que descreve, o estado em que chega ao Hospital, apenas vinte minutos depois de ser colocado fora da discoteca.
De acordo com a informação clinica de fls. 15, LL deu entrada nas urgências do Hospital Distrital de … no referido dia 24.07.2022, sendo admitido às 6h27, com trauma na face, boca e peito e com olho direito vermelho por hemorragia conjuntiva interna - cf. fls. 15. Ou seja, deu entrada nas urgências deste Hospital, cerca de 20 minutos após os factos, sendo as lesões que apresenta, perfeitamente compatíveis com a agressão que refere. Aliás, corrobora também o que refere, a sua fotografia constante de fls. 50 dos autos.
A testemunha LL referiu que, foi para o Hospital com uma amiga. Porém, por esta, a testemunha PP, foi dito que, não estava no local, apenas foi com ele no dia a seguir ao Hospital a …. Trata-se de uma mera imprecisão, que perante a evidencia do referido, não o descredibiliza. Até porque, da referida informação clinica resulta que, no próprio dia, cerca das 7h55 é dada indicação para ir a …, referindo-se que diz querer ir pelos meios próprios, acompanhado pela esposa, tendo alta, o que corrobora o referido pela testemunha PP, que diz que o arguido lhe ligou e que foram ao Hospital a …. Mais, da assistência prestada no Hospital de …, resulta, entre o mais, a existência de hematoma e edema periorbitário direito - cf. fls. 47.
Importa ainda referir que, a necessidade das testemunhas apresentadas pelo arguido, em afastar a responsabilidade do mesmo, esteve também patente no depoimento da sua companheira, EE, que na altura trabalhava no bar da discoteca, e que referiu que, só viu o outro senhor a ser levado, não se apercebeu de nada, parecia-lhe perfeitamente normal, e não viu qualquer lesão.
Ora, desde logo, perante o ambiente de discoteca, estranho é que conseguisse ver a cara do ofendido, e concluir o estado em que se encontrava. Depois, tendo os factos acabado de acontecer, estranho seria que o ofendido tivesse já alguma lesão evidente. Mais estranho é que, afirme que, o ofendido, apesar de ser levado pelos seguranças, estava perfeitamente normal.
Mais uma vez a incoerência, e a necessidade de afastar qualquer responsabilidade do arguido, esteve também patente.
Concluímos assim que, continuaram a faltar à verdade: a testemunha BB, quando diz que, ninguém andou à porrada lá dentro; a testemunha DD quando disse que, não houve violência, e até quando referiu que, o AA sabe falar e agir de forma exata ( demonstrando o seu comportamento exatamente o contrário); a testemunha GG, que viu tudo mas não viu murros, e até os viu a escorregar nas escadas; a testemunha HH que viu tudo, mas não viu murros e pontapés, acrescentando que, o AA não teve qualquer contacto físico com o cliente; a testemunha II que disse não ter havido contacto. Como faltou também à verdade o arguido.
Esclarecemos que, não mencionamos as testemunhas OO, FF e JJ, porque o primeiro disse que, apenas os viu no chão, portanto, diretamente não demonstrou saber o que sucedeu antes, sendo certo que, não perdeu também a oportunidade em referir que escorregaram, e as outras duas testemunhas, diretamente disseram nada saber, porque estavam na porta do estabelecimento.
Por outro lado, da conjugação das referidas imagens de videovigilância, com as declarações do ofendido, totalmente credíveis e com o episodio de urgência e nota de alta de fls. 15 e 47, resulta claro que, o arguido se dirige ao ofendido, conversam, colocando aquele, concomitantemente, a sua mão esquerda em cima do ombro de LL. Depois, passou o braço esquerdo pelo pescoço do mesmo, fazendo pressão e derrubou-o, levando-o a cair ao chão. Apesar de se encontrar no chão, o arguido continuou a agarrar o ofendido, desferindo-lhe murros em número indeterminado, que o atingiram na face e no olho direito. Isto ao mesmo tempo em que o arrastava, momento em que, como resulta evidente do referido vídeo de videovigilância, caem ao chão, aparecendo depois, como resulta do vídeo “ ….”, um outro segurança que leva o ofendido para o exterior. Como o disse o ofendido, e aqui também o arguido, este ficou na discoteca. Não saiu.
Acresce ainda que, foi perentório o ofendido ao referir que, fora da discoteca não aconteceu nada. Admitindo que, pegou num ferro e que quis ir bater no arguido, porque estava revoltado por não ter feito nada. O que foi dito também dito pelo arguido e que as testemunhas FF e JJ, também seguranças procuraram confirmar.
Porém, independentemente do que fez no exterior. Ou até do seu estado embriagado como o disse o arguido, o sucedido ocorreu no interior, como resulta claramente das referidas imagens, sendo de salientar que, em nenhum momento dos autos, e isto, apesar de constar da acusação, o ofendido referiu que os factos ocorreram no exterior.
Pelo que, desta apreciação, resultam provados os factos dos pontos 2 a 7 e não provados os factos dos pontos A e B.
Não provados resultam também os factos do ponto C, porque como já referimos, no vídeo é o ofendido que chama o arguido, dirigindo-se este ao ofendido, sendo que, desconhecemos o que o motivou.
No que respeita aos factos dos pontos 8 a 10, estes resultam do próprio comportamento do arguido, que ao agarrar o ofendido, ao deita-lo ao chão e ao desferir murros, o fez voluntariamente, pretendendo atingi-lo na sua integridade física, o que conseguiu. Como cidadão inserido que é, sabe que este seu comportamento é proibido por lei, no entanto, agiu ainda assim, em conformidade com a sua pretensão.
Do pedido de indemnização civil do Centro Hospitalar ….
Como resultou da referida prova, o arguido foi assistido, por indicação do Hospital de …, no Hospital de …, no dia 24.07.2022 - cf. informação clinica de fls. 15 e nota de alta de fls. 47. A descrição dos atos realizados neste Hospital, descritos na fatura de fls. 153, que importam o valor de €250,46, encontram-se em conformidade com o relatado a fls. 47. Importa ainda referir que, o número do episódio descrito na fatura, corresponde ao que se encontra na nota de alta deste Hospital a fls. 47, reportando-se a fatura a assistência prestada no dia 24.07.2022.
Assim, desta apreciação resultam provados os factos dos pontos 11.
Do pedido de indemnização civil deduzido
Como resultou da referida prova, o arguido foi assistido, no Hospital de …, no dia 24.07.2022 - cf. informação clinica de fls. 15. A descrição dos atos realizados neste Hospital, descritos na fatura de fls. 160, que importam o valor de €300,10, encontram-se em conformidade com os atos realizados relatados no episódio de urgência a fls. 15. Importa ainda referir que, o número do episódio descrito na fatura, corresponde ao que se encontra a fls. 15, reportando-se a fatura a assistência prestada no dia 24.07.2022.
Resultando assim provados os factos do ponto 12.
Das condições económicas e sociais:
A prova destes factos resultam das declarações prestadas pelo arguido e do relatório social junto aos autos – cf. referência 10593594.
Dos antecedentes criminais:
No que respeita aos antecedentes criminais, releva o certificado que se encontra nos autos emitido em 13.05.2024. (…)”
*
3.2.- Mérito do recurso
A) Valoração de prova proibida:
Alega o recorrente que a decisão recorrida é nula porque o Tribunal a quo deu como provada factualidade constante de um vídeo que não foi exibido em audiência, formando a sua convicção com base no teor desse vídeo.
Entende o recorrente que a falta de exibição do vídeo em audiência de julgamento é violadora do princípio da imediação e da oralidade de que o nº 1, do art.º 355º do Cód. Proc. Penal é emanação.
Mais alega que se trata de assegurar o princípio do contraditório, segundo o qual assiste ao arguido o direito de contestar e impugnar não só os factos iniciais já conhecidos ou quaisquer outros que surjam e que o Tribunal pretenda levar em consideração, assim como as provas que sobre eles incidam, de modo que não seja proferida qualquer decisão surpresa contra o mesmo, por factos ou provas dos quais não teve oportunidade de se defender, tudo em conformidade com o disposto no art.º 32º, nºs 1 e 5 da CRP.
Por outro lado, entende o recorrente que o vídeo em causa não é suficientemente percetível, não sendo adequado à prova de que o arguido terá agredido o ofendido, designadamente esmurrando o mesmo, como consta da sentença recorrida.
Por último, entende que solicitou todo o processo, mas que apenas lhe foi concedido acesso ao processo que se encontra materializado em papel, não lhe tendo sido concedido o acesso ao vídeo em causa.
Apreciemos a sua pretensão.
A este respeito prevê-se no art.º 355º, nº 1 do Cód. Proc. Penal que:
“1 - Não valem em julgamento, nomeadamente para o efeito de formação da convicção do tribunal, quaisquer provas que não tiverem sido produzidas ou examinadas em audiência.”
Sucede, porém, que daqui não decorre que todos os documentos juntos aos autos tenham que ser lidos ou visionados em audiência.
Aliás, a jurisprudência maioritária tem sido sempre no sentido de que os documentos que se encontram juntos aos autos não são de leitura ou visionamento obrigatórios em audiência, considerando-se examinados e produzidos em audiência, independentemente de nesta ter sido feita a sua leitura ou visionamento e a sua menção na acta (cf. neste sentido, na doutrina, Maia Gonçalves, in “ Código de Processo Penal Anotado”, 7ª Ed., pág. 521).
Neste sentido, veja-se, entre outros, o Acórdão do TRP de 19/04/2006, proferido no processo nº 0416166, em que foi relator Paulo Valério, in www.dgsi.pt: “Os documentos juntos aos autos não são de leitura obrigatória na audiência de julgamento, considerando-se nesta produzidos e examinados, desde que se trate de caso em que a leitura não seja proibida. Na verdade, tais provas podem ser submetidas ao contraditório, sem necessidade de serem lidas na audiência, já que as partes têm conhecimento do seu conteúdo.(…)
E não era obrigatória a leitura dos ditos relatórios e documentos em audiência de julgamento, pois nenhuma disposição legal impõe a leitura em audiência de julgamento dos documentos existentes no processo, desde que não seja requerida por qualquer sujeito processual. Entendimento que desde há muito vem sendo sufragado pela jurisprudência, tanto nos Tribunais de Relação como no STJ. (cfr Acs desta Relação de 20/10/2004 e de 21/04/2004 (em www.dgsi.pt/jtrp.nsf/ sob os nºs 0442822 e 0314013), e do STJ, de 1/06/93, 4/10/95 e 30/05/96, em www.dgsi.pt/jstj.nsf/ sob os nºs 046004, 048257 e 96P498).
E, de facto, a interpretação conjugada dos arts 355.º e 356.º do CodProcPenal não impõe a leitura desses documentos, é apenas uma faculdade que assiste ao tribunal; o que acontece é que eles têm de ser examinados, como impõe o art. 355.°, n.° 1, o que pode acontecer até ao momento da leitura da sentença ou do acórdão, sendo que tais provas podem ser submetidas ao contraditório, sem necessidade de serem lidas na mesma audiência, já que as partes têm conhecimento do seu conteúdo. (Ac. STJ de 27-1-1999, proc. 350/98-3.; SASTJ, n.° 27, 83).”
Também o TC no seu Acórdão n° 87/99, de 10/2, proferido no processo n° 444/98, in DR, II série, de 1/07/99, se pronunciou no sentido de não ser inconstitucional a norma do art.º 355° do Cód. Proc. Penal quando interpretada no sentido de que os documentos juntos aos autos não são de leitura obrigatória na audiência de julgamento, considerando-se nesta produzidos e examinados, desde que se trate de caso em que a leitura não seja proibida, jurisprudência esta que também vale para os documentos em suporte vídeo.
A este respeito, pode ler-se neste Acórdão o seguinte:
“ (…) tratando-se de documentos que foram juntos com a acusação e depois se mantiveram durante a instrução e acompanharam a pronúncia do arguido, teve este todas as possibilidades de os questionar, podendo ainda, na própria audiência, provocar a sua reapreciação individualizada para esclarecer qualquer ponto da sua defesa relativamente à qual entendesse que isso seria necessário e, assim, pedir a leitura de qualquer desses documentos.
Não é, porém, indispensável à satisfação da exigência do princípio do contraditório, quer na modalidade do princípio da oralidade quer da imediação, a leitura necessária de toda a prova documental pré-constituída e junta ao processo. Quanto a este tipo de prova, como bem refere o Ministério Público nas suas alegações, “o princípio do contraditório há-de traduzir-se - como resulta da parte final do nº2 do artigo 517º do Código de Processo Penal - em ter necessariamente de facultar-se às outras partes ou sujeitos do processo a impugnação quer da respectiva admissão quer da sua força probatória”.
Acresce que é a audiência de julgamento no seu conjunto e os actos instrutórios que a lei determinar que a Constituição submete ao princípio do contraditório e não a prova testemunhal ou por declarações. O conteúdo essencial deste princípio está em que nenhuma prova deve ser aceite em audiência nem nenhuma decisão deve aí ser tomada pelo juiz sem que previamente tenha sido dada uma ampla e efectiva possibilidade ao sujeito processual contra o qual ela é dirigida de a discutir, de a contestar e de a valorar.(…)”
Não sendo o vídeo em apreço prova proibida, como se vê, o seu conteúdo está submetido ao princípio da livre apreciação da prova, previsto no art.º 127º do Cód. Proc. Penal, segundo o qual, salvo quando a lei dispuser diferentemente, a prova é apreciada segundo as regras da experiência e a livre convicção da entidade competente.
No caso dos autos, o vídeo em questão foi junto antes da acusação, foi mencionado nesta como prova dos factos aí descritos e, não obstante não ter sido visionado durante a audiência de julgamento, o Tribunal a quo valorou-o como meio de prova, tendo o arguido e a testemunha CC sido confrontados com fotogramas extraídos do mesmo durante o julgamento.
O arguido reconheceu-se nos fotogramas retirados do referido vídeo e observados em julgamento, não mostrou estranheza quanto à existência do vídeo e não requereu a sua visualização em julgamento, podendo tê-lo feito.
A cópia do vídeo está junta aos autos e a sua reprodução não foi pedida, nem se revelou necessária durante o julgamento, pelo que se impõe concluir que não se verificou nos autos qualquer nulidade de prova, improcedendo este fundamento do recurso.
*
B) Impugnação da matéria de facto
Nos presentes autos vem o recorrente impugnar a matéria de facto, dizendo que o faz ao abrigo do disposto no art.º 410º, nº 2 do Cód. Proc. Penal, mas indicando que considera terem sido incorrectamente julgados os pontos 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9 e 10 dos factos dados como provados na sentença recorrida, bem como os factos não provados incluídos na alínea C).
Alega para tanto que a globalidade da prova produzida em audiência de julgamento impunha decisão diversa, não correspondendo à verdade que foram apresentadas duas versões dos acontecimentos, uma pelo Arguido e outra pelo ofendido, pois, na verdade, o que sucedeu foi a apresentação pelo ofendido de várias versões dos factos, sendo que pelo arguido e as suas testemunhas se mantiveram sempre pela mesma versão que corresponde à realidade do sucedido.
Alegou ainda que deveriam ter sido dados como provados factos que fundamentam a incriminação do ofendido pela prática de um crime de dano qualificado e de um crime de ofensa à integridade física contra o arguido, na forma tentada.
C) Verificação dos vícios previstos no art.º 410º, nº 2, alíneas a) e c) do Cód. Proc. Penal
Como fundamento do seu recurso, imputa o recorrente à decisão recorrida os vícios formais de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada e do erro notório na apreciação da prova, dizendo que o Tribunal a quo não fez uma apreciação cuidada da prova produzida, errando de forma ostensiva quanto ao apuramento da matéria de facto provada e não provada, devendo a sentença recorrida ser revogada e o recorrente absolvido do crime que lhe é imputado e dos pedidos de indemnização civil contra si formulados.
Relativamente a esta questão, estabelece o art.º 410º, nº 2 do Cód. Proc. Penal que, mesmo nos casos em que a lei restringe a cognição do Tribunal a matéria de direito, o recurso pode ter como fundamentos, desde que o vício resulte do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum:
a) A insuficiência para a decisão da matéria de facto provada;
b) A contradição insanável da fundamentação ou entre a fundamentação e a decisão;
c) O erro notório na apreciação da prova.
Tratam-se de vícios da decisão sobre a matéria de facto que são vícios da própria decisão, como peça autónoma, e não vícios de julgamento, que não se confundem nem com o erro na aplicação do direito aos factos, nem com a errada apreciação e valoração das provas ou a insuficiência destas para a decisão de facto proferida.
Estes vícios são também de conhecimento oficioso, pois têm a ver com a perfeição formal da decisão da matéria de facto e decorrem do próprio texto da decisão recorrida, por si só considerado ou em conjugação com as regras da experiência comum, sem possibilidade de recurso a outros elementos que lhe sejam estranhos, mesmo constantes do processo (cfr., neste sentido, Maia Gonçalves, in “Código de Processo Penal Anotado”, 16ª ed., pág. 873; Germano Marques da Silva, in “Curso de Processo Penal”, Vol. III, 2ª ed., pág. 339; Simas Santos e Leal-Henriques, in “Recursos em Processo Penal”, 6ª ed., 2007, pág. 77 e seg.; Maria João Antunes, RPCC, Janeiro-Março de 1994, pág. 121).
Há insuficiência da matéria de facto para a decisão quando os factos dados como assentes na decisão são insuficientes para se poder formular um juízo seguro de condenação ou absolvição, ou seja, são insuficientes para a aplicação do direito ao caso concreto.
No entanto, tal insuficiência só ocorre quando existe uma lacuna no apuramento da matéria de facto necessária para a decisão de direito, porque não se apurou o que é evidente e que se podia ter apurado ou porque o Tribunal não investigou a totalidade da matéria de facto com relevo para a decisão da causa, podendo fazê-lo.
Esta insuficiência da matéria de facto tem de existir internamente, no âmbito da decisão e resultar do texto da mesma.
Neste sentido decidiu o STJ no Ac. de 5/12/2007, proferido no processo nº 07P3406, em que foi relator Raúl Borges, in www.dgsi.pt, onde se pode ler que: “Ocorre o vício da insuficiência para a decisão da matéria de facto provada quando esta se mostra exígua para fundamentar a solução de direito encontrada, quando da factualidade vertida na decisão se colhe faltarem elementos que, podendo e devendo ser indagados, são necessários para que se possa formular um juízo seguro de condenação ou de absolvição. Ou, como se diz no acórdão deste STJ de 25-03-1998, BMJ 475.º/502, quando, após o julgamento, os factos colhidos não consentem, quer na sua objectividade, quer na sua subjectividade, dar o ilícito como provado; ou ainda, na formulação do acórdão do mesmo Tribunal de 20-12-2006, no Proc. 3379/06 - 3.ª, o vício consiste numa carência de factos que permitam suportar uma decisão dentro do quadro das soluções de direito plausíveis e que impede que sobre a matéria de facto seja proferida uma decisão de direito segura.”
No mesmo sentido se decidiu no Ac. do TRC de 12/09/18, proferido no processo nº 28/16.9PTCTB.C1, em que foi relator Orlando Gonçalves, in www.dgsi.pt, onde se escreveu que: “ (…) Como resulta expressamente mencionado nesta norma, os vícios nela referidos têm que resultar da própria decisão recorrida, na sua globalidade, mas sem recurso a quaisquer elementos que lhe sejam externos, designadamente a segmentos de declarações ou depoimentos prestados oralmente em audiência de julgamento e que se não mostram consignados no texto da decisão recorrida. O vício da insuficiência para a decisão da matéria de facto provada existe quando da factualidade vertida na decisão se colhe faltarem dados e elementos para a decisão de direito, considerando as várias soluções plausíveis, como sejam a condenação (e a medida desta) ou a absolvição (existência de causas de exclusão da ilicitude ou da culpa), admitindo-se, num juízo de prognose, que os factos que ficaram por apurar, se viessem a ser averiguados pelo tribunal a quo através dos meios de prova disponíveis, poderiam ser dados como provados, determinando uma alteração de direito. Existirá insuficiência para a decisão da matéria de facto se houver omissão de pronúncia pelo tribunal sobre factos relevantes e os factos provados não permitem a aplicação do direito ao caso submetido a julgamento, com a segurança necessária a proferir-se uma decisão justa.”
No que concerne ao erro notório na apreciação da prova, o mesmo releva como fundamento de recurso desde que resulte do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugado com as regras da experiência comum.
Pese embora a lei não o defina, o «Erro notório» tem sido entendido como aquele que é evidente, que não escapa ao homem comum, de que um observador médio se apercebe com facilidade e que ressalta do teor da decisão recorrida, por si só ou conjugada com o senso comum, só podendo relevar se for ostensivo, inquestionável e percetível pelo comum dos observadores ou pelas faculdades de apreciação do «homem médio».
Há «erro notório» quando se retira de um facto dado como provado uma conclusão logicamente inaceitável, quando se dá como provado algo que notoriamente está errado, que não podia ter acontecido, ou quando, usando um processo racional e lógico, se retira de um facto dado como provado uma conclusão ilógica, arbitrária e contraditória ou notoriamente violadora das regras da experiência comum e ainda quando determinado facto provado é incompatível, inconciliável ou contraditório com outro facto, positivo ou negativo, contido no texto da decisão recorrida (cf. neste sentido, LEAL-HENRIQUES e SIMAS SANTOS, in “Código de Processo Penal anotado”, II volume, 2ª edição, 2000, Rei dos Livros, pág. 740).
Este é um vício do raciocínio na apreciação das provas, de que nos apercebemos apenas pela leitura do texto da decisão, o qual, por ser tão evidente, salta aos olhos do leitor médio, sem necessidade de particular exercício mental, em que as provas revelam claramente um sentido e a decisão recorrida extraiu uma ilação contrária, logicamente impossível, incluindo na matéria fáctica provada ou excluindo dela algum facto essencial (cf. entre muitos outros, Acs. TRC de 09.03.2018, proferido no processo nº 628/16.7T8LMG.C1, em que foi relatora Paula Roberto, e de 14.01.2015, proferido no processo nº 72/11.2GDSRT.C1, em que foi relator Fernando Chaves, ambos disponíveis em www.dgsi.pt).
Quanto ao que se deva entender por erro notório na apreciação da prova, nos termos e para os efeitos do disposto no art.º 410º, nº 2, alínea c) do Cód. Proc. Civil, discorreu largamente o STJ, no seu Ac. de 7/07/21, proferido no processo nº 128/19.3JAFAR.E1.S1, em que foi relator Nuno Gonçalves, in www.dgsi.pt, onde cita vária jurisprudência e onde se pode ler: “ (…) A decisão de julgar provado um acontecimento da vida na convicção de que foi demonstrado por uma versão que é manifestamente ilógica, contrariada pelas regras da física e ao mesmo tempo pelas máximas da experiência, padece do vício que o legislador consagrou no art.º 410º n.º 2 al.ª c) do CPP. Este é, como os demais aí previstos, um defeito da decisão em matéria de facto. Não devendo confundir-se nem com a errada aplicação do direito aos factos, nem com a escassez da prova para suportar o julgado. A sua deteção ou verificação não permite o recurso a elementos externos ao texto da decisão recorrida. Não assim, evidentemente, ao que constar da motivação do julgamento da matéria de facto. Se é certo que um determinado facto ou acontecimento da vida, simplesmente pelo modo como vem narrado, pode apresentar-se visivelmente irracional, notoriamente impossível, manifestamente desconforme às regras da experiência comum, todavia, mais comumente o erro notório na apreciação da prova deteta-se pela motivação do julgamento da facticidade, designadamente pelo exame critico dos elementos de prova.
Como sustenta Pereira Madeira, no erro notório “estão incluídas, evidentemente, as hipóteses de erro evidente, escancarado, de que qualquer homem médio se dá conta. Porém, a ser assim, com um alcance tão restrito, o preceito acabaria por perder grande parte do seu interesse prático, acabando afinal por deixar encobertas situações de erro clamoroso, ainda que porventura não acessíveis ao cidadão comum. Impor-se-à, assim, uma leitura algo mais abrangente que não acoberte situações de julgamento erróneo (…) que numa visão jurídica consequente e rigorosa da decisão no seu todo, seja possível, ainda que só ao jurista e, naturalmente, ao tribunal de recurso, assegurar sem margem para dúvidas que a prova foi erroneamente apreciada. Certo que o erro tem de ser «notório». Mas basta para assegurar essa notoriedade que ela ressalte do texto da decisão recorrida, ainda que, para tanto tenha de ser devidamente escrutinada (…) e sopesada à luz das regras da experiência, Ponto é que, no fim, não reste qualquer dúvida sobre a existência do vício e que a sua existência fique devidamente demonstrada pelo tribunal ad quem.” ( in Código de Processo Penal comentado, 3ª ed. Revista, Almedina, 2021, pag. 1293/1294.) (…).”
Nos presentes autos, vem o recorrente invocar estes vícios, mas sem concretizar em que parte ou partes da decisão recorrida é que os mesmos se verificam.
Porém, o que decorre da argumentação do recorrente é que o mesmo invoca estes vícios porque não se conforma que se tenha dado como provada a versão dos factos apresentada pelo ofendido, pretendendo ser absolvido do crime de ofensas pelo qual foi condenado e do pedido cível.
Ora, analisada a decisão recorrida, não decorre da mesma a verificação de nenhum dos vícios previstos no art.º 410º, nº 2 do Cód. Proc. Penal.
Mais à frente apreciaremos se existem ou não fundamentos para alterar a matéria de facto que conduziu à condenação do arguido.
A factualidade apurada é idónea ao preenchimento dos elementos objectivos e subjectivos do tipo legal do crime pelo qual o arguido foi condenado, bem como à determinação da pena e dos montantes indemnizatórios.
No que concerne ao erro notório também não se descortina a sua verificação na decisão recorrida, porquanto os factos estão descritos de forma clara e perceptível, não existe qualquer contradição entre a matéria de facto provada e não provada, todos os factos se mostram fundamentados, de forma lógica e coerente, e a decisão do Tribunal funda-se na prova produzida, estando em conformidade com a mesma.
Não se tendo apurado a existência de um qualquer vício de raciocínio evidente para um observador médio ou uma qualquer desconformidade intrínseca e evidente no raciocínio exposto na decisão do Tribunal recorrido, o que também não foi alegado pelo recorrente, impõe-se julgar o recurso improcedente quanto a este fundamento, sem necessidade de mais considerandos.
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D) Erro de julgamento
Alega o recorrente que houve na decisão em apreço um erro de julgamento, quanto à matéria vertida nos pontos 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9 e 10 dos factos dados como provados na sentença recorrida, bem como quanto aos factos não provados incluídos na alínea C), cuja consequência é sua absolvição do crime pelo qual foi condenado nos autos, bem como dos pedidos cíveis contra si formulados.
Vejamos se lhe assiste razão.
A reapreciação da matéria de facto poderá ser feita no âmbito, mais restrito, dos vícios previstos no art.º 410º, nº 2 do Cód. Proc. Penal, onde a verificação desses vícios tem que resultar do próprio texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum, mas sem recurso a quaisquer elementos exteriores, ou através da impugnação ampla da matéria de facto, feita nos termos do art.º 412º, nos 3, 4 e 6 do mesmo diploma, caso em que a apreciação se estende à prova produzida em audiência, dentro dos limites fornecidos pelo recorrente.
Quanto à impugnação ampla da matéria de facto, feita nos termos do art.º 412º, nos 3, 4 e 6 do mesmo diploma, verifica-se que só se pode alterar o decidido se as provas indicadas obrigarem a uma decisão diversa da proferida, mas já não quando tais provas apenas permitirem uma outra decisão, a par da decisão recorrida.
Neste último caso, havendo duas, ou mais, possíveis soluções de facto, face à prova produzida, se a decisão da primeira instância se mostrar devidamente fundamentada e couber dentro de uma das possíveis soluções, face às regras da experiência comum, é esta que deve prevalecer, mantendo-se intocável e inatacável, porquanto foi proferida em obediência ao previsto nos art.ºs 127º e 374º, nº 2 do Cód. Proc. Penal ( cf., Ac. TRL de 02.11.2021, no processo nº 477/20.8PDAMD.L1-5, em que foi relator Jorge Gonçalves, in www.dgsi.pt.). Nos casos de impugnação ampla da matéria de facto, o recurso da matéria de facto não visa a realização de um segundo julgamento sobre aquela matéria, com base na audição de gravações, mas constitui apenas um mero remédio para obviar a eventuais erros ou incorreções da decisão recorrida na forma como apreciou a prova, sempre em relação aos concretos pontos de facto identificados pelo recorrente. Para esse efeito, deve o Tribunal de recurso verificar se os concretos pontos de facto questionados têm suporte na fundamentação da decisão recorrida, avaliando e comparando especificadamente os meios de prova indicados nessa decisão e os meios de prova indicados pelo recorrente e que este considera imporem decisão diversa ( neste sentido, cf. Ac. STJ de 14.03.2007 (no processo nº 07P21, Relator: Conselheiro Santos Cabral), de 23.05.2007 (no processo 07P1498, Relator: Conselheiro Henriques Gaspar), de 03.07.2008 (no processo nº 08P1312, Relator: Conselheiro Simas Santos), de 29.10.2008 (no processo nº 07P1016, Relator: Conselheiro Souto de Moura) e de 20.11.2008 (no processo nº 08P3269, Relator: Conselheiro Santos Carvalho), todos disponíveis em www.dgsi.pt). O recurso em que se impugne (amplamente) a decisão sobre a matéria de facto destina-se a despistar e corrigir determinados erros in judicando ou in procedendo, razão pela qual o art.º 412º, nº 3 do Cód. Proc. Penal impõe ao recorrente a obrigação de indicar: “ a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados; b) As concretas provas que impõem decisão diversa da recorrida; c) As provas que devem ser renovadas.” A especificação dos «concretos pontos de facto» traduz-se na indicação dos factos individualizados que constam da sentença recorrida e que se consideram incorretamente julgados. A especificação das «concretas provas» implica a indicação do conteúdo do meio de prova ou de obtenção de prova e a explicitação da razão pela qual essas «provas» impõem decisão diversa da recorrida. Por seu turno, a especificação das provas que devem ser renovadas impõe a indicação dos meios de prova produzidos na audiência de julgamento em 1ª instância cuja renovação se pretenda e das razões para crer que aquela renovação permitirá evitar o reenvio do processo previsto no art.º 430º do mesmo diploma. Relativamente às duas últimas especificações recai ainda sobre o recorrente uma outra exigência. Havendo gravação das provas, essas especificações devem ser feitas com referência ao que tiver sido consignado na ata, devendo o recorrente indicar concretamente as passagens das gravações em que fundamenta a impugnação, não bastando a simples remissão para a totalidade de um ou de vários depoimentos, pois são essas passagens concretas que devem ser ouvidas ou visualizadas pelo Tribunal de recurso, como é exigido pelo art.º 412º, nºs 4 e 6 do Cód. Proc. Penal. A este respeito, importa ter em atenção que o STJ, no seu Ac. nº 3/2012, publicado no Diário da República, 1.ª série, Nº 77, de 18 de abril de 2012, já fixou jurisprudência no seguinte sentido: «Visando o recurso a impugnação da decisão sobre a matéria de facto, com reapreciação da prova gravada, basta, para efeitos do disposto no artigo 412.º, n.º 3, alínea b), do CPP, a referência às concretas passagens/excertos das declarações que, no entendimento do recorrente, imponham decisão diversa da assumida, desde que transcritas, na ausência de consignação na acta do início e termo das declarações».
Na verdade, o poder de apreciação da prova da 2ª instância não é o mesmo que o atribuído ao juiz do julgamento, não podendo a sua convicção ser arbitrariamente alterada apenas porque um dos intervenientes processuais expressa o seu desacordo quanto à mesma, pois o poder de apreciação da prova do tribunal de recurso não é absoluto, nem se reconduz à realização integral de um novo julgamento da matéria de facto, em substituição do já realizado em 1ª instância.
Segundo o previsto no art.º 127º do Cód. Proc. Penal, o Tribunal deve fixar a matéria de facto de acordo com as regras da experiência e a livre convicção do julgador, desde que não se esteja perante prova vinculada.
Pese embora o ato de julgar tenha sempre, necessariamente, um lado subjetivo, as regras da experiência, complementadas pelo disposto no art.º 374º, nº 2 do Cód. Proc. Penal, determinam que aquele acto não possa ser um acto arbitrário ou discricionário.
Verifica-se, pois, que a livre convicção não se confunde com a íntima convicção do julgador, dado que a lei lhe impõe que extraia das provas um convencimento lógico e motivado, devendo a avaliação da prova ser efectuada com sentido de responsabilidade e bom senso.
Em consequência, sempre que a convicção seja uma convicção possível e explicável pelas regras da experiência comum, deve-se acolher a opção do julgador da 1ª instância, sobretudo porque o mesmo beneficiou da oralidade e da imediação na recolha da prova ( cf., neste sentido, Ac. STJ de 13/02/08, proferido no processo nº 07P4729, em que foi relator Pires da Graça, in www.dgsi.pt ).
A lei não considera relevante a convicção pessoal de cada um dos intervenientes processuais, no sentido de a mesma se sobrepor à convicção do Tribunal, até porque, se assim fosse, não seria possível existir qualquer decisão final.
O que a lei permite é que, quem entenda que ocorreu um erro de apreciação da prova, o invoque, fundamentadamente, em sede de recurso, para que tal questão possa ser reapreciada por uma nova instância jurisdicional.
Para além de a lei determinar a forma como tal reapreciação deve ser pedida, estabelece também os limites da mesma, ou seja, os poderes de cognição do tribunal de recurso.
Mesmo nos casos em que exista documentação dos atos da audiência, o recurso para o Tribunal da Relação não constitui, como já se referiu, um novo julgamento, no sentido de haver lugar a reapreciação integral da prova.
Na verdade, como se refere no Ac. do TRL, datado de 26/10/21 ( proferido no processo nº 510/19.6S5LSB.L1-5, em que foi relator Manuel Advínculo Sequeira, in www.dgsi.pt): «(…) apenas séria discrepância entre o que motivou o tribunal de 1ª instância e aquilo que resulta da prova por declarações prestada, no seu todo e à luz de regras de experiência comum, pode ser de molde a inverter aquela factualidade, impondo, nas palavras da lei, outra decisão (…). As declarações são ainda indissociáveis da atitude e postura de quem as presta, olhares, trejeitos, hesitações, pausas e demais reacções comportamentais às diversas perguntas e questões abordadas, isoladas ou entre si combinadas, bem como a regras de experiência e senso comuns à luz da normalidade dos comportamentos humanos. (…)»
Assim sendo, o que o Tribunal da Relação pode e deve fazer nesta matéria, em sede de recurso, é verificar, ponto por ponto, se os concretos erros de julgamento indicados pelo recorrente, de facto existem e, na afirmativa, proceder à sua correção.
A razão de ser desta forma de funcionamento do instituto do recurso, quanto à reapreciação de matéria de facto, decorre do princípio da oralidade, o qual implica uma imediação, um contacto direto, pessoal e presencial entre o julgador e os elementos de prova (sejam eles pessoas, coisas, lugares, sons, cheiros, timbre e entoação), que facilita a formação da livre convicção do julgador e que só existe na primeira instância.
A imediação permite que o julgador tenha uma perceção dos elementos de prova muito mais próxima da realidade do que qualquer apreciação posterior, a realizar pelo tribunal de recurso, mesmo que este se socorra da documentação dos atos da audiência.
A imediação revela-se também de importância fulcral para aferir da credibilidade de um depoimento, pois o seu desenrolar, a posição corporal, os gestos, as hesitações, o tom de voz, o olhar, o embaraço ou o desembaraço e todas as componentes pessoais ligadas ao ato de depor são insuscetíveis de serem registadas, mas ficam na memória de quem realizou o julgamento, são importantes na formação da convicção do julgador e são objetiváveis na fundamentação da decisão, mas não são suscetíveis de documentação para reapreciação em sede de recurso.
Impõe-se, assim, concluir que, nesta matéria, cabe apenas ao Tribunal de recurso verificar se o Tribunal a quo, ao formar a sua convicção, fez um bom uso do princípio de livre apreciação da prova, aferindo da legalidade do caminho prosseguido até se chegar à matéria fáctica dada como provada e não provada, devendo tal apreciação ser feita com base na motivação elaborada pelo Tribunal de primeira instância e na fundamentação da sua escolha, em cumprimento do disposto no art.º 374º, nº 2 do Cód. de Proc. Penal.
Para este efeito, como se escreveu no Ac. do TRL datado de 11/03/2021 ( proferido no processo nº 179/19.8JDLSB.L1-9, em que foi relator Abrunhosa de Carvalho, in www.dgsi.pt. ): «O que é necessário e imprescindível é que, no seu livre exercício de convicção, o tribunal indique «os fundamentos suficientes para que, através das regras da ciência, da lógica e da experiência, se possa controlar a razoabilidade daquela convicção sobre o julgamento do facto como provado ou não provado».
E convém referir que quando o tribunal recorrido forma a sua convicção com provas não proibidas por lei, prevalece a convicção do tribunal sobre aquelas que formulem os recorrentes.
Normalmente, os erros de julgamento capazes de conduzir à modificação da matéria de facto pelo tribunal de recurso consistem no seguinte: dar-se como provado um facto com base no depoimento de uma testemunha que nada disse sobre o assunto; dar-se como provado um facto sem que tenha sido produzida qualquer prova sobre o mesmo; dar-se como provado um facto com base no depoimento de testemunha, sem razão de ciência da mesma que permita a referida prova; dar-se como provado um facto com base em prova que se valorou com violação das regras sobre a sua força legal; dar-se como provado um facto com base em depoimento ou declaração, em que a testemunha, o arguido ou o declarante não afirmaram aquilo que na fundamentação se diz que afirmaram; dar-se como provado um facto com base num documento do qual não consta o que se deu como provado; dar-se como provado um facto com recurso à presunção judicial fora das condições em que esta podia operar.»).
Sucede que: «O recorrente não impugna de modo processualmente válido a decisão proferida sobre matéria de facto se se limita a procurar abalar a convicção assumida pelo tribunal recorrido, questionando a relevância dada aos depoimentos prestados em audiência.» ( cf. Ac. do TRP datado de 6/10/2010, proferido no processo nº 463/09.9JELSB.P1, em que foi relatora Eduarda Lobo, in www.dgsi.pt).
No mesmo sentido, se decidiu no Ac. do TRG datado de 28/06/2004 ( proferido no processo nº 575/04-1, em que foi relator Heitor Gonçalves, in www.dgsi.pt ), onde se refere que: “… Cremos que o recorrente pretende substituir essa convicção do julgador pela sua própria convicção, “escolhendo” os depoimentos que vão de encontro aos seus interesses processuais, quando é sabido que são os julgadores em primeira instância que detêm o poder/dever de apreciar livremente a prova, apreciação que, de todo o modo, no dizer do Prof. Figueiredo Dias, há-de ser, como foi no caso concreto, “recondutível a critérios objectivos e, portanto, em geral susceptível de motivação e controlo”. Uma decisão errada, ilegal ou arbitrária não pode ser sustentada numa simples alegação da discordância entre a convicção do recorrente e a convicção que o julgador livremente formou com base na prova produzida em audiência de julgamento, antes passa necessariamente pela demonstração inequívoca de que o tribunal que a proferiu contrariou as regras da experiência e desrespeitou princípios basilares do direito probatório (v.g. prova legalmente vinculada, provas proibidas etc.). Quando o recorrente pretende apenas pôr em causa a livre apreciação da prova, o recurso estará irremediavelmente destinado à improcedência. É que, como se referiu, o tribunal é livre de dar credibilidade a determinados depoimentos, em detrimento de outros, desde que essa opção seja explicitada e convincente, como é o caso. Cumprida essa exigência, a livre convicção do juiz torna-se insindicável, até porque a documentação dos actos da audiência não se destina a substituir, nem substitui, a oralidade e a imediação da prova. Defender-se uma outra solução, o tribunal de recurso acabaria “por proceder a um juízo, mas com inversão das regras da audiência de julgamento ou então, numa espécie de juízos por parâmetros” (Damião da Cunha, O caso julgado Parcial, 2002, pág. 37). …”.
Em suma, o recorrente que invoca a existência de um erro de julgamento tem que apontar na decisão recorrida os segmentos que impugna e colocá-los em relação com as provas, concretizando as partes da prova gravada que pretende que sejam ouvidas e que sustentam uma decisão diversa, se for o caso, quais os documentos que pretende que sejam reexaminados, bem como quais os outros elementos probatórios que pretende ver reproduzidos, demonstrando a verificação do erro judiciário a que alude.
Voltando ao caso dos autos, verificamos que o recorrente indicou concretamente os pontos da matéria de facto que considera terem sido mal julgados, pese embora tenha remetido para a quase totalidade da factualidade apurada, e indicou as provas que, no seu entendimento, impunham decisão diversa.
Alegou, para tanto, que da análise crítica e concatenada dos depoimentos do arguido e das testemunhas CC, DD, EE, BB, FF, GG, HH, II e JJ não podiam ter resultado provados os factos que o Tribunal a quo considerou provados, nos moldes que expôs na sua motivação de recurso, devendo o arguido, ora recorrente, ter sido absolvido.
Sucede, porém, que o recorrente se limitou a transcrever a totalidade dos depoimentos do arguido e das referidas testemunhas, mas, apesar de ter destacado a negrito partes desses depoimentos, não individualizou as partes da gravação desses depoimentos é que este Tribunal de recurso deveria ouvir, em claro desrespeito do ónus previsto no art.º 412º, nºs 4 e 6 do Cód. Proc. Penal.
Por outro lado, não obstante tenha apontado os factos provados e não provados que considera terem sido mal julgados, também não indicou qual a versão desses factos é que se deveria ter apurado.
Mais alegou que a sentença recorrida considerou provada a versão dos factos apresentada pelo ofendido, com fundamento nos depoimentos do próprio ofendido e da testemunha PP, os quais apresentaram versões dispares e não claramente coincidentes entre si, tendo ainda apresentado em julgamento uma versão dos factos não inteiramente coincidente com aquela que haviam prestado na fase de inquérito.
Sucede que, compulsados os autos, não decorre da acta de julgamento, datada de 27/05/24, que o Tribunal a quo tenha procedido à leitura em audiência das declarações prestadas pelo ofendido e pela testemunha PP na fase de inquérito e em conformidade com as exigências constantes dos arts.º 356º e 357º do Cód. Proc. Penal.
Assim sendo, não tendo servido as declarações do ofendido e da tetemunha PP prestadas na fase do inquérito para formar a convicção do Tribunal a quo e para fundamentar a decisão recorrida, não podem as mesmas ser consideradas e apreciadas em sede de recurso, em obediência aos princípios do contraditório e da proibição de valoração das provas, plasmados nos arts.º 327º, nº 2 e 355º do Cód. Proc. Penal.
Quanto à disparidade das declarações das testemunhas entre si, tal circunstância é normal, tendo em conta que os factos se passaram num curto espaço de tempo, nenhuma das testemunhas presenciais estava à espera que os mesmos ocorressem e nenhuma testemunhou a integralidade dos acontecimentos.
Estranho seria se todos os depoimentos fossem totalmente coincidentes e alinhados entre si, o que só lhes retiraria credibilidade.
Ora, lida a decisão recorrida verificamos que o Tribunal a quo concedeu maior credibilidade à versão dos factos apresentada pelo ofendido, concatenada com as declarações do arguido e das restantes testemunhas inquiridas, tendo justificado a decisão a que chegou de forma clara, bastante completa e perceptível.
Da análise da prova produzida resulta que a versão dos factos apurada pelo Tribunal a quo se alicerçou sobretudo nas declarações do ofendido, mas também em três dados objectivos, a saber:
- o próprio arguido reconheceu que ele e o ofendido se envolveram fisicamente no chão da discoteca;
- a versão dos factos apurada é consentânea com o que resulta do visionamento das filmagens registadas pelas câmaras de videovigilância existentes no recinto no dia dos factos, sendo que o próprio arguido se reconheceu nos fotogramas dali retirados e visionados em julgamento;
- o ofendido recebeu assistência médica no Hospital Distrital de … no dia 24/07/22, pelas 6.27 horas, constando da documentação médica junta aos autos que o mesmo apresentou traumatismo da face, da boca e do tórax, olho direito vermelho por hemorragia conjuntival interna, visão enevoada, escoriação malar direita, hematoma prioritário direito, ferida puntiforme supraciliar direita, deformação e dor da pirâmide nasal com epistáxis, dor à palpação da mandíbula, à esquerda, lesões estas que lhe determinaram um período de 7 dias para a cura, dos quais 4 com incapacidade para o trabalho geral.
Analisada esta factualidade à luz das regras da lógica e da experiência comum, constatamos que as lesões sofridas pelo ofendido não podem ter apenas resultado da queda do mesmo no solo da discoteca, por se ter desequilibrado por estar embriagado e o chão estar molhado, conforme pretendido pelo arguido.
Uma simples queda não seria apta a provocar as lesões da gravidade das apresentadas pelo ofendido.
O Tribunal a quo teve perante si o arguido, o ofendido e as restantes testemunhas, as quais não apresentaram depoimentos inteiramente coincidentes entre si, nem tal seria de esperar.
Da análise conjugada de todos os depoimentos e da restante prova documental junta aos autos, o Tribunal a quo chegou à factualidade apurada, a qual nos parece ter sido apreciada segundo as regras da lógica e da experiência comum, conforme amplamente explanado na decisão em apreço supra transcrita, de forma completa e transparente, onde é referido porque é que se conferiu maior credibilidade a uns depoimentos do que a outros, em resultado da audição dos testemunhos e da observação dos comportamentos dos depoentes.
Em face do exposto, a argumentação do recorrente mais não é do que o resultado da sua apreciação da prova, daquilo que o mesmo gostaria que se tivesse dado como provado, realçando aspectos dos depoimentos das testemunhas que, no seu entender, reforçam a sua tese, sem qualquer distanciamento imparcial e apenas com vista a conseguir a sua absolvição.
Pelo contrario, constata-se que a decisão da matéria de facto está bem e exaustivamente fundamentada, não sendo a prova produzida em julgamento geradora de dúvida, pelo que não existe qualquer violação dos arts.º 374º, 375º e 377º do Cód. Proc. Penal e dos arts.º 13º, 32º, 205º, 207º e 208º da Constituição da República Portuguesa, conforme alegado pelo recorrente.
Conclui-se, assim, que não só o recorrente não fez uma correcta impugnação dos factos, nos termos exigidos pela lei, como a apreciação da prova efectuada pelo Tribunal recorrido não merece qualquer reparo, sendo o recurso improcedente quanto a esta matéria.
Com vista à imputação ao ofendido da prática de um crime de dano qualificado e de um crime de ofensa à integridade física contra o arguido, na forma tentada, pretende ainda o recorrente a inserção dos seguintes pontos de facto na lista de factos provados:
“ 1 – No dia 24.07.2022, na zona VIP do estabelecimento noturno “…”, o Sr. DD foi alvo de provocações por parte do Ofendido, ocorridas antes do contacto estabelecido com o Arguido;
2 – O Ofendido encontrava-se embriagado e instalara um mau ambiente na referida zona VIP;
3 – Quando o Arguido procurou chamar à razão o Ofendido, apelando a que o mesmo cessasse as provocações para com o Sr. DD o Ofendido ficou mais agressivo e iniciou uma postura corporal que indicava que iria agredir o Arguido;
4 – A zona VIP do estabelecimento em causa se encontrava lotada, com pessoas encostadas umas às outras, e o respetivo chão se encontraria escorregadio;
5 – O ofendido, após ter sido acompanhado para a porta do estabelecimento pelos seguranças, demonstrou intenção de agredir o Arguido no exterior do estabelecimento, praticando um crime de dano qualificado (arrancou um sinal camarário de trânsito para com ele bater com ele no Arguido)”.
Alega, para tanto, que o ofendido, após ter sido acompanhado para a porta do estabelecimento pelos seguranças, demonstrou intenção de agredir o arguido no exterior do estabelecimento, tendo praticado um crime de dano qualificado, ao arrancar um sinal camarário de trânsito para bater com ele no arguido, resultando tais factos das declarações do ofendido e das testemunhas BB, FF e JJ.
Com isto pretende o arguido que ao ofendido seja imputada a prática em autoria material de um crime de dano qualificado, p. e p. nos arts.º 212º e 213º, nº 1, alínea c) do Cód. Penal, bem como de um crime de ofensa à integridade física na pessoa do arguido, na forma tentada.
Com a inclusão desta factualidade na sentença recorrida não pretende o recorrente retirar ou aligeirar a sua responsabilidade criminal, nos moldes apurados naquela decisão, mas tão só imputar ao ofendido a prática de dois crimes diferentes.
Sucede, porém, que a investigação criminal levada a cabo nestes autos não teve em vista a incriminação do ofendido, nem a acusação neles proferida imputa ao ofendido a prática de qualquer crime.
É a acusação que delimita o thema probandum da fase processual seguinte, determinando o âmbito e o limite da intervenção do juiz em sede de instrução ou de julgamento.
A vinculação do Tribunal aos factos alegados na acusação decorre não só da estrutura acusatória do processo penal e das garantias de defesa do arguido, consagradas no art.º 32º, nºs 1 e 5 da CRP, mas funciona também como mecanismo de salvaguarda do arguido contra o alargamento arbitrário do objecto do processo, permitindo-lhe a preparação da defesa e o respeito do princípio do contraditório.
Relacionado com estas exigências está também o regime de nulidades previsto nos arts.º 309º, nº 1 e 379º, nº 1, alínea b) do Cód. Proc. Penal, os quais cominam com a nulidade a decisão instrutória “na parte em que pronunciar o arguido por factos que constituam uma alteração substancial dos descritos na acusação do Ministério Público ou do assistente ou no requerimento para abertura da instrução” e a sentença que “condenar por factos diversos dos descritos na acusação ou na pronúncia, se a houver, fora dos casos e das condições previstos nos artigos 358.º e 359.º”.
De tudo o exposto decorre que o legislador quis que a acusação contivesse todos os pressupostos de que depende a aplicação ao arguido de uma pena ou de uma medida de segurança, impondo que a mesma tenha o seu objecto definido de uma forma clara e suficientemente rigorosa, a fim de permitir ao acusado a organização da sua defesa.
No caso dos presentes autos nada na acusação se reporta ao ofendido para se poder concluir da prática pelo mesmo de algum ilícito criminal, pelo que a sentença em apreço também não poderia condená-lo pela prática de qualquer crime, sob pena de ser uma decisão ferida de nulidade.
Em face disto não se pode dizer que a decisão recorrida padece da omissão de pronúncia que o recorrente lhe imputa.
Por outro lado, nos termos do art.º 73º da Lei nº 62/2013, de 26/08, ( Lei da Organização do Sistema Judiciário ), compete aos Tribunais da Relação:
a) Julgar recursos;
b) Julgar as ações propostas contra juízes de direito e juízes militares de primeira instância, procuradores da República e procuradores-adjuntos, por causa das suas funções;
c) Julgar processos por crimes cometidos pelos magistrados e juízes militares referidos na alínea anterior e recursos em matéria contraordenacional a eles respeitantes;
d) Julgar os processos judiciais de cooperação judiciária internacional em matéria penal;
e) Julgar os processos de revisão e confirmação de sentença estrangeira, sem prejuízo da competência legalmente atribuída a outros tribunais;
f) Julgar, por intermédio do relator, os termos dos recursos que lhe estejam cometidos pela lei de processo;
g) Praticar, nos termos da lei de processo, os atos jurisdicionais relativos ao inquérito, dirigir a instrução criminal, presidir ao debate instrutório e proferir despacho de pronúncia ou não pronúncia nos processos referidos na alínea c);
h) Exercer as demais competências conferidas por lei.
Daqui decorre que não pode este Tribunal da Relação de Évora julgar em primeira instância o ofendido relativamente aos crimes que o arguido lhe imputa em sede de recurso e que não foram objecto de investigação criminal nos presentes autos, nem de condenação pelo Tribunal a quo.
Assim sendo, a inclusão dos factos incriminatórios do ofendido na decisão recorrida redundaria na prática de um acto absolutamente inútil, sem qualquer consequência jurídica e, como tal, a evitar.
É que, por força dos princípios da utilidade, da economia e da celeridade processuais, consagrados nos arts.º 2º, nº 1, 6º, nº 1 e 130º do Cód. Proc. Civil, aplicáveis por remissão do art.º 4º do Cód. Proc. Penal, o Tribunal de recurso não deve reapreciar a matéria de facto quando os factos concretos objeto da impugnação forem insuscetíveis de, face às circunstâncias próprias do caso em apreciação e às diversas soluções plausíveis de direito, assumirem relevância jurídica.
Caso o faça, leva a cabo uma atividade processual que se sabe não ter quaisquer consequências a nível da decisão de direito, que não leva a qualquer alteração na decisão jurídica anteriormente alcançada, não tendo a apreciação dessa matéria qualquer efeito jurídico relevante, sendo, por isso, inútil ( cf. neste sentido os Acórdãos do TRC datado de 24/4/12, proferido no processo nº 219/10.6T2VGS.C1, em que foi relator Beça Pereira, e de 14/01/14, proferido no processo nº 6628/10.3TBLRA.C1, em que foi relator Henrique Antunes, ambos in www.dgsi.pt.).
Impor-se, assim, julgar também improcedente o recurso neste tocante.
Quanto à pena concreta de multa que lhe foi aplicada, o arguido invoca a violação por parte da sentença recorrida do disposto nos arts.º 40º, 70º, 71º e 143º, nº 1 todos do Cód. Penal, mas não desenvolve quanto aos mesmos qualquer argumentação, quer no corpo da motivação, quer nas conclusões de recurso, nem formula qualquer pedido de redução da pena, pelo que não há quanto a esta matéria nada a referir.
Considera-se, assim, ser o presente recurso totalmente improcedente, não se considerando violados os preceitos legais, nem os preceitos e princípios constitucionais invocados pelo recorrente.
*
4. DECISÃO:
Pelo exposto, acordam os Juízes que integram esta Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora em julgar totalmente improcedente o recurso interposto por AA e, em consequência, confirmam a decisão recorrida.
Custas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 3 Uc´s.
Évora, 25 de Fevereiro de 2025
(texto elaborado em suporte informático e integralmente revisto pela relatora)
Carla Francisco
(Relatora)
Edgar Valente
Laura Goulart Maurício
(Adjuntos)