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PROCESSO DE EXECUÇÃO
DESPACHO DE MERO EXPEDIENTE
Sumário
O despacho que, para além de teor informativo, se limita a reiterar o prosseguimento da execução, previamente decidido com trânsito em julgado, sem alteração do quadro factual pertinente a tal respeito, não admite recurso, por assumir natureza de despacho de mero expediente e nos termos previstos no art. 630.º/1 do Código de Processo Civil.
Texto Integral
Proc. n.º 4316/14.0TDPRT-D.P1
ACORDAM OS JUÍZES QUE INTEGRAM O TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO:
Relator: Nuno Marcelo Nóbrega dos Santos de Freitas Araújo
1.º Adjunto: Carla Jesus Costa Fraga Torres
2.º Adjunto: José Eusébio Almeida
RELATÓRIO.
No âmbito do processo executivo que corre termos no Juízo Central Criminal do Porto - ..., intentado por Banco 1..., S.A., sendo executada AA, foi proferido despacho de 6/6/2024 que determinou, na sequência de requerimento do exequente e sem resposta conhecida da executada: Ordeno que o Agente de execução prossiga com a tramitação dos presentes autos de execução, conforme requerido pela exequente na antecedente pronúncia, a que aderimos, informando os autos de insolvência de que esta instância executiva não ficará suspensa e prosseguirá os seus termos.
No referido requerimento, o exequente afirmou, em síntese, que a dívida exequenda não é abrangida pela exoneração do passivo que eventualmente venha a ser concedida no âmbito do processo de insolvência da executada e que, por isso, embora não tenha ainda sido concedida a exoneração, tal não prejudica o prosseguimento destes autos, sendo ainda certo que o período de cessão de rendimentos cessou em Março de 2022.
Com data de 4/9/2024, foi proferido novo despacho, no qual agora foi exarado: Como resulta do despacho de 6.6.2024, os autos prosseguem os seus termos, devendo o AE proceder em conformidade com a derradeira solicitação do Processo de Insolvência. D.N, dando conhecimento ao processo de insolvência do teor deste despacho e do de 6.6.2024.
Seguiu-se requerimento da executada, submetido a juízo a 27/9/2024, nos termos do qual, tendo tomado conhecimento (porquanto do mesmo não foi notificada) do despacho que, apesar da indicação dada pelo Juízo de Comércio de Santo Tirso, decidiu não suspender a presente execução, vem, nos termos dos arts. 627º e ss. e 644º do Código de Processo Civil, interpor recurso, que é de apelação, com subida imediata e nos próprios autos.
E que rematou com o pedido de que, dando-se provimento ao recurso e revogando-se o despacho recorrido, se decida a suspensão da execução.
Todavia, o recurso não foi admitido porquanto, segundo se entendeu em primeira instância: Por requerimento dirigido ao processo e que deu entrada a 27.9.2024, veio a executada, AA, interpor recurso do despacho que decidiu não suspender a presente execução. Vejamos. Não tendo a requerente concretizado a data da prolação do despacho do qual pretende recorrer, constata-se que a decisão de mérito versando a matéria invocada pela executada consta de despacho de 6.6.2024, notificado à requerente em 7.6.2024. Com efeito, a pronúncia de 6.9.2024 é totalmente neutra do ponto de vista decisório, porquanto meramente remissiva para a decisão acima referida, destinando-se apenas a esclarecer os autos de insolvência na sequência de pedido de informação formulado nesse sentido. Ora, nos termos do disposto pelo artigo 638, n.º 1 do Código de Processo Civil, “o prazo para a interposição do recurso é de 30 dias e conta-se a partir da notificação da decisão, reduzindo-se para 15 dias nos processos urgentes e nos casos previstos no n.º2 do artigo 644.º e no artigo 677.º.” Desta forma, tendo em conta que a (única) decisão impugnável foi proferida por despacho de 6.6.2024, notificado à requerente em 7.6.2024, o requerimento de interposição de recurso é claramente extemporâneo e não pode ser admitido, Assim, nos termos e com os fundamentos acabados de expor, não admito o requerimento de interposição de recurso formulado pela executada AA a 27.9.2024.
E desse despacho, inconformada, a executada deduziu a presente reclamação, aduzindo os seguintes fundamentos:
1. Foi, no âmbito do presente recurso, proferida decisão de indeferimento do recurso apresentado por, em suma, se entender que a decisão proferida não é impugnável por remeter para decisão anterior, essa sim, passível de impugnação.
Acontece que,
2. Apresentou a Recorrente recurso da decisão proferida no âmbito dos presentes autos, que veio decidir não suspender a presente instância executiva, não obstante a indicação dada pelo Juízo de Comércio de Santo Tirso nesse sentido em virtude de se encontrar ainda a decorrer o processo de insolvência da Executada e o período de exoneração do passivo restante.
3. Na verdade, ao contrário do mencionado no despacho do qual ora se reclama, a decisão da qual foi interposto recurso não se trata de um mero esclarecimento na sequência de um pedido de informação formulado pelo Juízo de Comércio de Santo Tirso.
4. Tal despacho surge na sequência da insistência por parte do Juízo de Comércio de Santo Tirso na suspensão da execução aqui em causa,
5. Tendo sido remetidas as posições expressas pelo Ex.mo Senhor Procurador junto do Juízo de Comércio de Santo Tirso e a decisão proferida por aquele tribunal de que, não tendo ainda terminado o período de exoneração do passivo restante, deveria esta execução ser suspensa.
6. Na sequência de tal notificação veio este tribunal a manter o processo executivo aqui em causa ativo,
7. Remetendo a sua justificação para tal para despacho anteriormente proferido no mesmo sentido, mas antes desta notificação por parte do Juízo de Comércio,
8. Pelo que, não obstante remeter a justificação para a mesma para despacho anterior, é esta a decisão que, definitivamente, tem efeitos na esfera jurídica da aqui
Reclamante,
9. Tratando-se, por força desse facto, de decisão recorrível.
10. Ao decidir de forma diversa violou o despacho, do qual ora se reclama os arts. 627º e ss e 644º e ss do CPC.
11. Termos em que o presente recurso deve ser aceite e julgado procedente e, em consequência, ser ordenada a reforma da decisão recorrida.
Não foi apresentada resposta à reclamação, da qual nada impede o conhecimento, encontrando-se verificados os requisitos de regularidade da instância necessários para o efeito.
Entretanto, já neste Tribunal da Relação do Porto, foi proferido despacho na 4.ª Secção Criminal, que decidiu que a competência para a presente reclamação cabe, nos termos do artigo 643º do CPC às secções cíveis deste Tribunal, por a secção criminal ser incompetente em razão da matéria para julgar o recurso e, consequentemente, o presidente do tribunal ou a vice-presidente com competência delegada - para julgar a reclamação.
Na sequência, foi proferida decisão datada de 17/1/2025, nos termos do art. 643.º/4 do CPC, que manteve o despacho de não admissão do recurso.
E dessa decisão, mantendo-se inconformada, veio a executada reclamar para conferência, ao abrigo das disposições conjugadas dos arts. 643.º/4 e 652.º/3 do CPC.
Alinhou as seguintes motivações:
1. Foi, no âmbito do presente recurso, proferida decisão singular de indeferimento do recurso apresentado por, em suma, se entender ser inadmissível, por versar sobre um despacho de mero expediente.
Acontece que,
2. Apresentou a Recorrente recurso da decisão proferida no âmbito dos presentes autos, que veio decidir não suspender a presente instância executiva, não obstante a indicação dada pelo Juízo de Comércio de Santo Tirso nesse sentido em virtude de se encontrar ainda a decorrer o processo de insolvência da Executada e o período de exoneração do passivo restante.
3. Na verdade, ao contrário do mencionado no despacho do qual ora se reclama, a decisão da qual foi interposto recurso não se trata de um mero esclarecimento na sequência de um pedido de informação formulado pelo Juízo de Comércio de Santo Tirso.
4. Tal despacho surge na sequência da insistência por parte do Juízo de Comércio de Santo Tirso na suspensão da execução aqui em causa,
5. Tendo sido remetidas as posições expressas pelo Ex.mo Senhor Procurador junto do Juízo de Comércio de Santo Tirso e a decisão proferida por aquele tribunal de que, não tendo ainda terminado o período de exoneração do passivo restante, deveria esta execução ser suspensa.
6. Na sequência de tal notificação veio este tribunal a manter o processo executivo aqui em causa ativo,
7. Remetendo a sua justificação para tal para despacho anteriormente proferido no mesmo sentido, mas antes desta notificação por parte do Juízo de Comércio,
8. Pelo que, não obstante remeter a justificação para a mesma para despacho anterior, é esta a decisão que, definitivamente, tem efeitos na esfera jurídica da aqui Reclamante,
9. Tratando-se, por força desse facto, de decisão recorrível.
10. Neste contexto, o despacho proferido viola o disposto nos arts. 627º e ss e 644º e ss do CPC,
11. Pelo que não deverão restar dúvidas de que a decisão em causa é recorrível, o recurso apresentado é o próprio e é admissível por tempestivo, pelo que deverá ser objecto de acórdão a proferir por este tribunal superior.
Finalizou com o pedido de recebimento do recurso.
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FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
Os factos relevantes a considerar são os indicados no relatório, para o qual, por economia, se remete.
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O DIREITO
Apreciados os elementos descritos, constata-se que, na reclamação para a conferência, a executada se limitou a reproduzir a argumentação apresentada inicialmente, sem aduzir motivos especificamente dirigidos ao despacho do relator que decidiu o indeferimento do seu pedido e aos fundamentos expostos para o efeito.
Assim, o principal fundamento para a reclamação relativa à inadmissibilidade do recurso continua a assentar na asserção de que no despacho recorrido não esteve em causa um mero esclarecimento na sequência de um pedido de informação formulado pelo Juízo de Comércio de Santo Tirso.
Na perspectiva da executada, tratou-se, diversamente, de uma insistência por parte daquele Juízo, no sentido de ser decretada a suspensão da execução, instruído com as posições expressas pelo Ex.mo Senhor Procurador que ali exerce funções e com a decisão proferida segundo a qual, não tendo ainda terminado o período de exoneração do passivo restante, deveria esta execução ser suspensa.
Salvo o devido respeito, porém, impõe-se considerar que essa diferente visão sobre o teor do ofício provindo do Juízo de Comércio de Santo Tirso é irrelevante para todos os efeitos, incluindo quanto à sorte da reclamação.
Com efeito, no confronto entre o requerimento do exequente tendo em vista o prosseguimento dos autos de execução e a comunicação remetida pelo Juízo de Comércio de Santo Tirso, de acordo com a indicação da reclamante, verifica-se que os factos pertinentes para a decisão que cumpria tomar no processo executivo são exactamente os mesmos: corre termos processo de insolvência relativo à executada sem que nele tenha ainda sido proferida decisão sobre a concessão da exoneração do passivo restante.
Já relativamente à posição assumida no Juízo de Comércio pelo Ministério Público e à decisão judicial que, na sequência, ali foi proferida, não se verifica, salvo o devido respeito, qualquer pertinência para a questão atinente ao prosseguimento da execução.
Na verdade, sem embargo da repercussão que, mercê do disposto nos arts. 88.º e 242.º do CIRE, a pendência do processo de insolvência e do pedido de exoneração do passivo restante podem assumir na marcha dos autos de execução, é sempre ao juiz deste processo que compete decidir relativamente ao prosseguimento ou não da instância executiva.
E desta elementar regra de competência, apenas se ressalva o caso de o Juízo de Comércio determinar, ao abrigo do regime previsto no art. 85.º/2 do CIRE, a apensação da execução ao processo de insolvência, situação na qual passa a ter o domínio sobre a referida decisão de prosseguimento.
Em atenção a estas observações, é de concluir, pois, que nenhuma circunstância relevante foi alegada na reclamação capaz de alterar o quadro factual sobre o qual incidiram os despachos proferidos no processo executivo a 6/6/2024 e, depois, a 4/9/2024.
Assim sendo, cumpre reconhecer que, como foi decidido no despacho reclamado, a única decisão impugnável foi proferida por despacho de 6.6.2024, notificado à requerente em 7.6.2024.
Todavia, já peca a decisão reclamada, salvo melhor opinião, quando faz assentar a recusa do recurso na sua extemporaneidade, considerando a data de notificação daquele despacho de 6/6/2024.
Com efeito, é nítido que o recurso foi interposto da decisão mais recente (de 4/9/2024).
O que não significa, porém, que a decisão que indeferiu ao requerimento de interposição de recurso esteja errada, visto que o erro apenas ocorre quanto ao argumento da extemporaneidade.
Na verdade, tendo em conta que a decisão impugnável foi proferida por despacho de 6.6.2024, dela não tendo sido interposto recurso, daí resultou o seu trânsito em julgado, embora apenas formal, com o efeito previsto no art. 620.º/1 do Código de Processo Civil.
Ora, nos termos dessa disposição legal, as sentenças e os despachos que recaiam unicamente sobre a relação processual têm força obrigatória dentro do processo.
De modo que, na ausência de alteração no quadro factual pertinente após o despacho de 6/6/2024, era o próprio tribunal reclamado, para além das partes do processo executivo, que àquela decisão estava vinculado.
Em consequência, o despacho de 4/9/2024, para além de informativo ao agente de execução e ao processo de insolvência, nada decidiu e nada poderia alterar com efectiva implicação no prosseguimento do processo executivo e nos interesses e direitos das partes a esse nível.
Tratou-se, pois, de um despacho de mero expediente, destinado a prover ao regular andamento do processo e sem a virtualidade de interferir no conflito de interesses entre as partes, de acordo com o art. 152.º/4 do CPC.
E como, segundo prescreve o art. 630.º/1 do CPC, os despachos de mero expediente não admitem recurso, é este, segundo entendemos, o fundamento acertado para a decisão que não admitiu o recurso interposto do despacho de 4/9/2024 e cujo sentido, por isso, não nos merece qualquer censura.
Identicamente, entre outros, decidiu o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 16/1/2019 que pronunciando-se o tribunal no sentido de que, estando pendente recurso da decisão que determinou uma apreensão, se deve aguardar tal decisão, tendo essa decisão transitado em julgado e mantendo-se os seus pressupostos e eficácia, não tem o tribunal de se pronunciar posteriormente sobre outro pedido sobre a mesma questão”.
De modo que, se posterior requerimento obteve o despacho “aderindo ao teor da douta promoção que antecede, no entendimento de que a decisão a proferir quanto à apreensão de bens é questão prejudicial face ao requerido (…) nada a determinar, tal decisão, não é passível de recurso, pois repetindo o já determinado, é despacho de mero expediente” (cfr. processo 12512/13.1 TDPRT-M, sendo o aresto relatado por José Carreto e estando disponível na base de dados da Dgsi em linha).
Impõe-se, pois, salvo o devido respeito pela posição da reclamante, confirmar novamente a decisão de inadmissibilidade do recurso.
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DECISÃO:
Pelo exposto, decide-se manter o despacho que não admitiu o recurso. Custas da reclamação pela executada, que nela decaiu (art. 527.º do Código de Processo Civil).