CONTRATO DE ADESÃO
RESOLUÇÃO
CLÁUSULA PENAL
NULIDADE
Sumário

I - O direito de resolução é um direito potestativo extintivo, que exige a verificação de um facto que crie esse direito, isto é, tem de ocorrer um facto ou situação, designadamente, incumprimento ou inadimplência, a que a lei atribua como consequência o desencadeamento desse direito potestativo.
II - A alínea c) do artigo 19.º do Decreto-Lei n.º 446/85, de 25.10 pressupõe que a cláusula penal inserta num contrato de adesão seja “desproporcionada aos danos a ressarcir”, exigindo-se uma desproporção sensível e flagrante entre o montante da pena convencionada e o montante dos danos a reparar.
III - É nula a cláusula penal inscrita em contrato de adesão de manutenção de elevadores em que se estipula que “Uma vez que a natureza, âmbito e duração dos serviços contratados, é elemento conformante da dimensão da estrutura empresarial da A..., em caso de extinção antecipada do presente Contrato pelo CLIENTE, a A... terá direito a uma indemnização no valor da totalidade das prestações do preço previstas até ao termo do prazo contratado para Contratos com duração até 5 anos, no valor de 50% das prestações do preço para Contratos com duração superior a 5 anos”.

Texto Integral

Processo n.º 788/20.2T8MAI.P1

Tribunal Judicial do Porto

Juízo Local Cível da Maia – Juiz 4

Acordam no Tribunal da Relação do Porto:

I. RELATÓRIO.

A..., LDA., com sede em ..., Freguesia ..., ..., Concelho de Sintra, pessoa coletiva n.º ..., com o capital social de € 2.109.915,11, matriculada na Conservatória do Registo Comercial de Cascais, sob o nº ... (Sintra), veio propôs acção declarativa com processo comum contra CONDOMÍNIO ..., sito na Rua ..., ... Maia, NIPC ..., pedindo que seja este condenado a pagar–lhe a importância de € 12.165,79, acrescida de juros vencidos, à taxa legal e até 27.02.2020, no valor de € 929,47, e bem assim, dos vincendos, desde 28.02.2020 e até integral pagamento (calculados sobre o capital em dívida, isto é, € 12.165,79).

Fundamenta a sua pretensão num contrato de Manutenção Completa de Elevadores que alegadamente celebrou com o réu.

Alega, para tanto e em síntese, que, no âmbito do referido contrato a autora comprometeu-se a prestar assistência e manutenção a dois elevadores instalados no prédio que o aqui réu representa e este, por sua vez, a proceder ao pagamento mensal de uma determinada importância previamente acordada.

Refere que o réu deixou de proceder ao pagamento de várias facturas, cujo pagamento aqui reclama.

Por fim, alega que, dado que a revogação do contrato efectuado pelo réu foi ilícita e extemporânea, tem direito a ser ressarcida e, “in caso” dado que autora e ré previram nas cláusulas do contrato que celebraram o valor indemnizatório, o correspondente valor e bem assim o valor correspondente às facturas emitidas e não pagas.

Devidamente citado, o réu contestou, por excepção e por impugnação, e deduziu pedido reconvencional.

Alega, para tanto e em síntese, que o Condomínio réu reuniu em Assembleia de Condóminos e, em face do teor do relatório de inspeção que havia solicitado a uma empresa independente, o qual apontou várias deficiências na manutenção/reparação dos dois elevadores, decidiu resolver o contrato, tendo para o efeito, enviado carta à autora com cópia do relatório em causa.

Acrescenta que, em face do incumprimento do contrato por parta da autora, nada lhe deve.

Acresce que, com fundamento nesse mesmo incumprimento, o réu deduziu pedido reconvencional, peticionando que a autora seja condenada a pagar-lhe as importâncias que teve de suportar designadamente, os custos referentes à elaboração do relatório do ISQ, o valor correspondente à inspeção periódica adicional e a substituição e reparação de peças/componentes que a autora deveria ter reparado/ substituído, ao abrigo do contrato de manutenção completa dos dois elevadores que haviam celebrado.

A autora devidamente notificada da contestação/reconvenção, apresentou articulado no qual pugna pela total improcedência do pedido reconvencional.

Alega, para tanto e em síntese, que não praticou qualquer acto, por acção/ou omissão, que pudesse ser gerador do incumprimento do contrato. Sustenta que, pelo contrário, o incumprimento ficou a dever-se à conduta do réu, pois escusou-se a proceder ao pagamento de uma reparação que se mostrava excluída do contrato celebrado, invocando o disposto na cláusula 5.1.3 al. A), a qual refere que a A... não garantirá o funcionamento dos elevadores, por causas estranhas e fora do seu controle, como sejam (…) entre outras, “a) infiltração de água e/ou inundação na caixa, casa das máquinas ou poço.”

Foi realizada a audiência prévia, sendo fixados o objecto do litígio e enunciados os temas de prova.

Realizado o julgamento, foi proferida sentença com o seguinte dispositivo:

“Nos termos e fundamentos supra expendidos, decide-se julgar a presente ação parcialmente procedente, por só parcialmente provada e, em consequência condenar o réu a pagar á autora o valor de cada uma das faturas descritas nos pontos 1/ a 30/ do art.44º dos factos dados como provados, acrescidas dos respetivos juros moratórios, calculados á taxa de 4%, desde o vencimento de cada uma das faturas até efetivo e integral pagamento.

Mais se decide condenar o réu a pagar a importância de 6.772,50€ (seis mil setecentos e setenta e dois euros e cinquenta cêntimos) a título de cláusula penal, acrescida dos juros moratórios calculados, á taxa de 4%, desde junho de 2019 até efetivo e integral pagamento, absolvendo-a da demais importância peticionada a esse título.

Absolvo a autora/reconvinda do pedido deduzido pelo réu reconvinte.

Custas na proporção dos respetivos decaimentos.

Registe e notifique”.

Inconformado com tal sentença, dela interpôs o Réu recurso de apelação para esta Relação, formulando com as suas alegações as seguintes conclusões:

“1 - Vem o presente recurso interposto da sentença proferida pelo tribunal “a quo”, que condenou o Recorrente a pagar à Recorrida as facturas descritas nos itens 1 a 30 do artigo 44º dos factos provados e a quantia de 6.775,58 € referente à cláusula penal e juros de mora, contabilizados desde Setembro de 2019.

2 - O recorrente celebrou com a A... um contrato de manutenção completa para os dois elevadores instalados no edifício, para o período de 01.09.2015 a 31.08.2023. O qual, de acordo com o disposto na sua cláusula 1.4, incluía: “as reparações originadas pelo uso normal do equipamento, incluindo a substituição dos componentes referidos no ponto 5 do Anexo Il do DL 320/2002, de 28 de dezembro”.

3 - No dia 06.07.2018, como resultado da inspeção periódica aos ascensores do Réu, a B..., entidade competente para o efeito, efectuou um relatório em que afirmou que o ascensor 1 estava avariado e que o ascensor 2 tinha duas não conformidades de tipo C3.

4 - Em 11.10.2018, na inspeção periódica ao ascensor 1 do Réu, a mesma entidade descreve no relatório cinco não conformidades, quatro delas do tipo C2.

5 - Em 22.03.2019, o Réu reuniu em assembleia, deliberando contratar serviço de inspecção a empresa independente para avaliar os estado dos ascensores e da sua manutenção.

6 - Em 15.04.2019 o Instituto de Soldadura e Qualidade (ISQ) verificou as condições regulamentares de segurança, estado de manutenção dos ascensores e análise de orçamentos identificando no seu relatório várias inconformidades tipo C2, isto é, correspondente a situações de médio risco para a segurança de pessoas e bens, as quais deveriam ser corrigidas no mais curto espaço de tempo:

a) Ascensor 1

- Com o contrapeso assente nos amortecedores é possível deslocar a cabina no sentido ascendente;

- Com a cabina assente nos amortecedores é possível deslocar o contrapeso no sentido ascendente;

- A máquina de tração evidencia elevado desgaste, face à sua utilização;

- A cabina evidencia desgaste face ao seu uso;

- Cabos apresentam corrosão;

- Poço em mau estado face à entrada de água;

- Portas de patamar evidenciam elevado desgaste, porta piso O embate no pavimento.

b) Ascensor 2

- Com o contrapeso assente nos amortecedores é possível deslocar a cabina no sentido ascendente;

- Com a cabina assente nos amortecedores é possível deslocar o contrapeso no sentido ascendente;

- Os cabos de suspensão apresentam partes cabelagem em mau estado, com corrosão;

- O cabo de acionamento do limitador de velocidade está em mau estado de conservação;

- A máquina de tração evidencia elevado desgaste, face à sua utilização;

- Comando não se adequa à instalação face à sua taxa de utilização; A cabina evidencia desgaste face ao seu uso;

- Cabos apresentam corrosão;

- Poço em mau estado face à entrada de água;

- Portas de patamar evidenciam elevado desgaste, porta piso O embate no pavimento.

7 - Na conclusão do relatório, ficou ainda dito que “os cabos de tração, limitador de velocidade de cabo encontram-se com elevado desgaste.” – tudo da responsabilidade da A....

8 - Nessa senda o recorrente ainda contactou a A... dando-lhe conhecimento do relatório do ISQ e solicitando a necessária manutenção dos elevadores, nos termos do contrato em vigor.

9 - Sem qualquer resposta, em 31.05.2019, o condomínio reuniu em assembleia e deliberou a resolução do contrato de manutenção celebrado com a Autora, devido ao incumprimento contratual daquela. Pelo que, no dia 04.06.2019, enviou à Autora comunicação da resolução do contrato celebrado.

10 - O incumprimento contratual alegado pelo Réu fundou-se nas não conformidades de verificadas pelo ISQ (com excepção do mau estado do poço do elevador que era responsabilidade do recorrente) e na falta de vontade de as corrigir por parte da recorrida.

11 - Sempre se diga que, a recorrida quando interpelada para realizar as correções às anomalias detectadas emitiu orçamento para o efeito, alegando que os problemas tinham origem a entrada da água no poço do elevador.

12 - Nada disso restou provado e basta ler as inconformidades registadas pelo ISQ para, face às regras da experiência comum, verificar que nada têm a ver com a entrada de água no poço do elevador.

13 - No dia 23.04.2020, a B... em nova inspeção periódica dá nota no seu relatório de seis não conformidades, quatro delas de tipo C2, o que confirmou a má execução do contrato pela recorrida.

14 - Embora fosse da responsabilidade do Réu assegurar o isolamento do poço dos elevadores, e se achasse contratualmente excluída a responsabilidade da Autora pela correcção de avarias resultantes de infiltrações de água e/ou inundação na caixa, casa das máquinas ou poço, não resultou provado que as desconformidades registadas hajam sido causadas pela entrada de água no respectivo poço.

15 - O incumprimento contratual da Autora para além dos riscos não negligenciáveis para os utilizadores dos ascensores, acarretou custos para o Réu, tais como o pagamento de nova inspeção periódica ao ascensor; a necessidade de solicitar o relatório do ISQ, no valor de 369,00 €; E, o pagamento da reparação e substituição dos componentes e peças dos ascensores que deveriam ter sido reparados e substituídos pela Autora, ao abrigo do contrato de manutenção completa celebrado entre as partes.

16 - Não resultando demonstrado que as anomalias registadas nos elevadores, hajam resultado de circunstância que afastava a responsabilidade da Autora pela sua correcção – facto que lhe competia provar, o que não fez -, não tendo feito a mesma a manutenção dos elevadores, por virtude da avaria, se mantinham imobilizado, não lhe era devida qualquer contrapartida a título de manutenção.

17 – A resolução do contrato baseou-se na falta da adequada manutenção e conservação dos elevadores a que a recorrida estava contratualmente obrigada, os mesmos tinham anomalias que perigavam a segurança dos condóminos e sem que a recorrida se digna-se repará-las.

18 - Como tal, havendo justa causa para a resolução unilateral do contrato e consequente antecipação da sua cessação, não se mostra exigível o pagamento da quantia reclamada a título de facturas de serviços e de cláusula penal.

19 - Nestes termos, deve a reconvenção ser julgada procedente, com os devidos efeitos, improcedendo o pedido alinhado pela A..

20 – Sem prescindir, cabia à Autora, que invocou a cláusula do contrato agora em análise, e que dela se quis prevalecer, alegar e demonstrar que a mesma resultou de negociação entre as partes para a afastar do regime do Decreto – Lei n.º 446/85. Ónus, de alegação e de prova, que a mesma não satisfez.

21 - O que pretende a apelada com a cláusula em análise é a penalização do cliente, mais do que salvaguardar uma reparação proporcionada ao dano, que evidentemente teve com a denúncia do contrato por parte do Réu.

22 – Ora, tal conduz necessariamente a uma desproporção perceptível e evidente entre o montante da pena e o montante dos danos a reparar, atendendo ao quadro negocial padronizado em que o contrato se integra, contrariando o princípio da boa-fé a que alude o art.º 15.º do DL n.º 446/85, de 25.10, e sendo proibida nos termos previstos na al. c), do art.º 19.º do mesmo diploma, e consequentemente nula.

23 - A cláusula encerra uma evidente disformidade entre a pena nela convencionada e o montante dos danos a reparar, contrariando o princípio da boa-fé acolhido pelo artigo 15.º do Decreto-Lei n.º 446/85, de 25.10, sendo proibida nos termos da alínea c) do artigo 19.º deste diploma, e, por via disso, nula.

24 - In casu é flagrantemente abusiva a posição contratual da Autora, proponente da cláusula que a introduziu no contrato a que o Réu aderiu, resultando da sua aplicação manifesto desequilíbrio para situações idênticas de incumprimento, havendo, por isso, fundamento, com recurso a critérios de razoabilidade, para se concluir pela nulidade da mencionada cláusula contratual, que deve ter-se por proibida nos termos do artigo 19.º, c) do Decreto-Lei n.º 446/85, de 25.10.

Nestes termos, e nos melhores de Direito, deverá o presente recurso proceder, sendo revogada a sentença em crise que deverá ser substituída por Acórdão que dê razão ao recorrente quanto resolução do contrato com todos os efeitos legais e, não procedendo, na nulidade da cláusula penal em que se estribou a sentença em recurso, assim se fazendo JUSTIÇA!”.

A recorrida apresentou contra-alegações, pugnando pelo não provimento do recurso.

Colhidos os vistos, cumpre apreciar.

II.OBJECTO DO RECURSO

A. Sendo o objecto do recurso definido pelas conclusões das alegações, impõe-se conhecer das questões colocadas pelo recorrente e as que forem de conhecimento oficioso, sem prejuízo daquelas cuja decisão fique prejudicada pela solução dada a outras, importando destacar, todavia, que o tribunal não está obrigado a apreciar todos os argumentos apresentados pelas partes para sustentar os seus pontos de vista, sendo o julgador livre na interpretação e aplicação do direito.

B. Considerando, deste modo, a delimitação que decorre das conclusões formuladas pelo recorrente, no caso dos autos cumprirá apreciar:

- Se a revogação do contrato pelo Réu foi efectuada com justa causa;

- Validade da cláusula 5.7.4. aposta no contrato celebrado entre as partes.

III- FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO.

III.1. Pelo tribunal recorrido foram considerados provados os seguintes factos:

1º - A A. é uma Sociedade Comercial, que tem como actividades principais, o fornecimento, a montagem e a conservação de elevadores.

2º - Com data de 24.11.2015, o réu celebrou com a autora, um Contrato de Conservação de Elevadores, denominado “Contrato A... Manutenção OM MANUTENÇÃO COMPLETA”, com início a 01.09.2015 e termo a 31.08.2023, mediante o pagamento de uma contraprestação mensal.

3º - Nos termos desse Contrato, a autora obrigava-se a conservar, durante 08 (oito) anos, renováveis por iguais períodos, os dois elevadores instalados no Edifício do réu.

4º - Os serviços contratados, tinham o valor inicial de € 200,00 (+IVA), o qual sofreu, entretanto, as actualizações anuais de preços respectivas como contratadas, (cfr. doc. nº 1 – Cl. “5.3.3.”).

5º - De acordo com o disposto na cláusula 1.4 do contrato de manutenção, inclui: “as reparações originadas pelo uso normal do equipamento, incluindo a substituição dos componentes referidos no ponto 5 do Anexo II do DL 320/2002, de 28 de dezembro”.

6º - A cláusula 5.1.3 al. A), refere que a “A... não garantirá o funcionamento dos elevadores, por causas estranhas e fora do seu controle, como sejam (…) entre outras, “a) infiltração de água e/ou inundação na caixa, casa das máquinas ou poço.

7º - Na cláusula 5.6 do contrato de manutenção vem escrito: “Na situação de eventual incumprimento imputável à A..., é expressamente aceite que a A... apenas responderá até à concorrência do valor de 3 meses de faturação A... do Contrato, como máximo de indemnização a pagar ao CLIENTE”.

8º - Na cláusula 5.7.4 do contrato de manutenção vem escrito: “Uma vez que a natureza, âmbito e duração dos serviços contratados, é elemento conformante da dimensão da estrutura empresarial da A..., em caso de extinção antecipada do presente Contrato pelo CLIENTE, a A... terá direito a uma indemnização no valor da totalidade das prestações do preço previstas até ao termo do prazo contratado para Contratos com duração até 5 anos, no valor de 50% das prestações do preço para Contratos com duração superior a 5 anos”.

9º - Em 10.03.2016, na sequência da realização de uma inspecção periódica, a entidade inspectora identificou a presença de humidade na casa das máquinas.

10º - No dia 06.07.2018, como resultado da inspeção periódica aos ascensores do Réu, a B..., entidade competente para o efeito, escreveu no relatório que o ascensor 1 estava avariado e que o ascensor 2 tinha duas não conformidades de tipo C3 – cfr. documento 1 que se junta ao diante e se dá aqui por integralmente reproduzido.

11º - Em 06.07.2018, na sequência da realização de uma nova inspecção, o elevador NV788 foi aprovado, conforme doc. nº 4 junto com a P.I..

12º - Na mesma data, o elevador nº ... não foi objecto da inspecção, uma vez que o mesmo se encontrava imobilizado na sequência de uma avaria inesperada.

13º - Tendo a A. procedido à reparação dessa mesma avaria e se realizado a reinspecção em 11.10.2018, conforme doc. nº 2 junto com a Contestação.

14º - As reparações foram realizadas, tendo a A. solicitado o pagamento da taxa para realização da inspecção periódica em 30.11.2018 e 29.01.2019, conforme doc. Nº2 e nº3 que ora se juntam e se dão por integralmente reproduzidos para todos os devidos e legais efeitos.

15º - No dia 11.10.2018, na inspeção periódica ao ascensor 1 do Réu, escreve no relatório cinco não conformidades, quatro delas do tipo C2 – cfr. documento 2 que se junta ao diante e se dá aqui por integralmente reproduzido.

16º - No dia 22.03.2019, o Condomínio Réu reuniu em assembleia, deliberando contratar serviço de inspeção a empresa independente para avaliar os ascensores alegadamente “devido à má qualidade de serviços prestados pela Autora” que estão relatados na acta n.º ... – cfr. documento 3 que se junta e se dá aqui por integralmente reproduzido.

17º - No dia 15.04.2019 o Instituto de Soldadura e Qualidade (de ora em diante ISQ) verificou as condições regulamentares de segurança, estado de manutenção dos ascensores e análise de orçamentos, no edifício da Rua ..., ... – documento 2 junto à PI.

18 - Identificando no relatório da inspeção que realizou, várias não conformidades tipo C2, correspondentes a situações de médio risco para a segurança de pessoas e bens, as quais deveriam ser corrigidas no mais curto espaço de tempo:

a) Ascensor 1

- Com o contrapeso assente nos amortecedores é possível deslocar a cabina no sentido ascendente;

- Com a cabina assente nos amortecedores é possível deslocar o contrapeso no sentido ascendente;

- A máquina de tração evidencia elevado desgaste, face à sua utilização;

- A cabina evidencia desgaste face ao seu uso;

- Cabos apresentam corrosão;

- Poço em mau estado face à entrada de água;

- Portas de patamar evidenciam elevado desgaste, porta piso 0 embate no pavimento.

b) Ascensor 2

- Com o contrapeso assente nos amortecedores é possível deslocar a cabina no sentido ascendente;

- Com a cabina assente nos amortecedores é possível deslocar o contrapeso no sentido ascendente;

- Os cabos de suspensão apresentam partes cabelagem em mau estado, com corrosão;

- O cabo de acionamento do limitador de velocidade está em mau estado de conservação;

- A máquina de tração evidencia elevado desgaste, face à sua utilização;

- Comando não se adequa à instalação face à sua taxa de utilização;

- A cabina evidencia desgaste face ao seu uso;

- Cabos apresentam corrosão;

- Poço em mau estado face à entrada de água;

- Portas de patamar evidenciam elevado desgaste, porta piso 0 embate no pavimento.

19 - Na conclusão, vem ainda escrito que: “os cabos de tração, limitador de velocidade de cabo encontram-se com elevado desgaste. O I.S.Q. em consequência dos resultados observados considera que os ascensores devem ser sujeitos a ações de regularização de forma a eliminar as anomalias detetadas”.

20º - Tomado conhecimento do relatório inspetivo, o Sr. Administrador do Condomínio Réu, Dr. AA, entrou em contacto com a Autora e solicitou a competente manutenção dos ascensores.

21º - Inclusive, enviou para a Autora o relatório da ISQ.

22º - No dia 31.05.2019, o Condomínio Réu reuniu em assembleia e deliberou a resolução do contrato de manutenção celebrado com a Autora, devido a incumprimento contratual daquela – cfr. documento 4 que se junta ao diante e se dá aqui por integralmente reproduzido.

23º - No dia 04.06.2019, o Réu enviou à Autora carta, via CTT, com resolução do contrato de manutenção celebrado, invocando a justa causa de resolução por incumprimento contratual imputável à Autora – cfr. documento 5 que se junta ao diante e se dá aqui por integralmente reproduzido.

24º - No dia 14.06.2019, o Réu enviou à Autora carta via CTT, registo simples, devolvendo as facturas n.ºs ..., ..., ... e ..., correspondentes aos meses de Março a Junho de 2019. – cfr. documento 6 que se junta ao diante e se dá aqui por integralmente reproduzido.

25º- Através de missiva datada de 19.06.2019, responde a autora, na qual esclarece que o elevador número 2 se encontrava aprovado e certificado até Julho de 2020, conforme doc. nº 3 que ora se junta e se dá por integralmente reproduzido para todos os devidos e legais efeitos.

26º - Relativamente ao elevador nº 1, o mesmo foi reprovado em Abril, porque “o condomínio decidiu retirar as chaves de acesso à casa da máquina, e não providenciou os acessos no dia da inspecção, contrariamente ao estabelecido contratualmente” – doc. nº 3. Aliás,

27º - No dia 21.06.2019, o Réu recepciona carta da Autora, datada de dia 19.06.2019, interpelando ao pagamento da quantia global de 15.436,09 EUR, em anexo o extrato da conta corrente e, ainda, fatura n.º ..., com data de emissão de 07.06.2019, ao Réu, no valor de 6.907,83 EUR, com o descritivo: “fatura de rescisão de contrato referente aos meses de 06/2019 a 08/2023 nos termos da cláusula

28º - No próprio dia 21 de Junho, o Réu envia carta, registo simples, para a Autora devolvendo a factura n.º ..., fundamentando não reconhecer o valor da mesma por a resolução do contrato ter ocorrido devido a incumprimento contratual da Autora e, solicitando, uma vez mais, que a Autora procedesse à manutenção a que estava obrigada nos ascensores – cfr. documento 8 que se junta ao diante e se dá aqui por integralmente reproduzido.

29º - No dia 26.06.2019, o Réu recepcionou carta da Autora, datada de 19.06.2019, em que esta última se limita a dizer que “tomamos a devida nota das observações do relatório de auditoria do ISQ” e que “não verificamos qualquer incumprimento da A...” – cfr. documento 9 que se junta ao diante e se dá aqui por integralmente reproduzido.

30º - No dia 02.07.2019, o Réu recepcionou carta da Autora informando-o que não reconhecia o seu incumprimento contratual – cfr. documento 10 que se junta ao diante e se dá aqui por integralmente reproduzido.

31º - No dia 03.07.2019, o Réu enviou carta à Autora reiterando o pedido de anulação das faturas correspondentes aos meses de Março a Junho de 2019 e ainda da fatura ... – cfr. documento 11 que se junta ao diante e se dá aqui por integralmente reproduzido.

32º - No dia 05.07.2019, a Autora envia ao Réu carta dando conta da não anulação das faturas em causa – cfr. documento 12 que se junta ao diante e se dá aqui por integralmente reproduzido e dá por terminadas as negociações.

33º - No dia 24.07.2019, mandatária constituída do Réu envia e-mail à Autora solicitando, novamente, a anulação das facturas em crise e o contacto dos serviços jurídicos da Autora – cfr. documento 13 que se junta ao diante e se dá por integralmente reproduzido.

34º - Missiva que nunca recebeu resposta.

35º - No dia 23.04.2020, a B... em nova inspeção periódica dá nota no seu relatório de seis não conformidades, quatro delas de tipo C2 – cfr. documento 14 que se junta ao diante e se dá aqui por integralmente reproduzido.

36º - A Autora não reparou os ditos componentes/peças.

37º - Relativamente ao elevador nº 1, tal como referido na carta da A. datada de 19.06.2019, não foi possível o acesso à casa da máquina, em 09.04.2019, impossibilidade essa que, conforme consta no próprio relatório, obrigaria a requerer nova inspecção, a qual configurou uma cláusula C2, conforme doc. nº 5 que ora se junta e se dá por integralmente reproduzidas para todos os devidos e legais efeitos.

38º - A Autora, encerrou os ascensores desde 28.02.2019, devido a inundação do poço, aguardando os mesmos reparação.

39º - A Autora disse ao Réu que este teria de diligenciar pela limpeza do poço.

40º - O réu diligenciou pela limpeza do poço.

41º - Contudo, a Autora não voltou a ligar os ascensores, devido à existência/verificação de estragos em alguns materiais dos elevadores, apresentando orçamento no valor de 1.033,20 EUR, para reparação.

42º - Valor que o réu se recusou a pagar.

43º - A autora realizou os trabalhos de manutenção, designadamente em 29.03.2019, 29.04.2019 e 31.05.2019, conforme doc. nº 4 que ora se junta e se dá por integralmente reproduzido para todos os devidos e legais efeitos.,

44º - A autora emitiu as seguintes facturas: respectivamente, Doc. Nº Tipo de Factura;

Nº da Factura; Data de Vencimento; Valor (em €); Conservação

9F... 01.10.2017 153,50

10 ... 01.11.2017 268,21

11 ... 01.12.2017 268,21

12 ... 01.01.2018 268,21

13 ... 01.02.2018 268,21

14 ... 01.03.2018 268,21

15 ... 01.04.2018 268,21

16 ... 01.05.2018 268,21

17 ... 01.06.2018 268,21

18 ... 01.07.2018 214,39

19 ... 01.08.2018 134,10

20 ... 01.09.2018 270,89

21 ... 01.10.2018 270,90

22 ... 01.11.2018 270,90

23 ... 01.12.2018 270,90

24 ... 01.01.2019 270,90

25 ... 01.02.2019 270,90

26 ... 01.03.2019 270,90

27 ... 01.04.2019 270,90

28 ... 01.05.2019 270,90

29 Acomp. Inspecção

FRZ19010514 06.05.2019 86,10

30 ... 06.05.2019 86,10

31 Sanção Contratual ... 07.06.2019 6.907,83

45º - O réu não procedeu ao pagamento de qualquer uma das facturas a que se alude no nº anterior.

46º- As referidas facturas e nota de juros constam na contabilidade da autora.

47º - A Autora suportou os seguintes custos:

Pagamento de nova inspeção periódica ao ascensor 1;

Pagamento de relatório do ISQ, no valor de 369,00 EUR;

Pagamento da reparação e substituição dos componentes e peças dos ascensores.

III. 2. E julgou não provados os seguintes factos:

Que os materiais alegadamente danificados, não obstante, outra empresa especializada no ramo da Autora ter dito que apenas o ascensor 1 havia ficado danificado e que somente esse deveria permanecer encerrado.

Que volvidos poucos dias, a Autora para o mesmo orçamento aumentou o valor para 1.986,45 EUR.

Que no período de Março a Junho, a Autora não efectuou qualquer trabalho de manutenção dos ditos ascensores.

Que pretendendo a Autora facturar ao Réu serviços/visitas que não estão incluídos no contrato de manutenção celebrado entre as partes.

IV. FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO.

Entre a Autora, que tem como actividade principal fornecimento, montagem e conservação de elevadores, e o Réu foi celebrado, datado de 24.11.2015, com início a 1.09.2015 e termo a 31.08.2023, um contrato denominado Contrato A... Manutenção OM Manutenção Completa, nos termos do qual a Autora se obrigou perante o Réu, mediante contraprestação mensal, a conservar, durante um período de 8 (oito) anos, renovável por iguais períodos, os dois elevadores instalados no edifício do segundo.

Trata-se de um típico contrato de prestação de serviços, no âmbito do qual a Autora se obrigou perante o Réu a assegurar a manutenção dos dois elevadores existentes no prédio deste, mediante contrapartida económica ajustada entre ambos.

A Autora, por via da acção instaurada contra o Réu, reclama deste o pagamento da quantia global de € 12.165,79, acrescida de juros, vencidos e vincendos, que engloba o valor alegadamente devido pela manutenção dos dois elevadores entre o período de 1.10.2017 e 1.05.2019, acompanhamento de inspecção e “sanção” contratual, esta no valor de € 6.907,83, por resolução antecipada do contrato.

Com relevância, resulta nos autos demonstrado que:

- Em 10.03.2016, na sequência da realização de uma inspecção periódica, a entidade inspectora identificou a presença de humidade na casa das máquinas.

- No dia 06.07.2018, como resultado da inspeção periódica aos ascensores do Réu, a B..., entidade competente para o efeito, escreveu no relatório que o ascensor 1 estava avariado e que o ascensor 2 tinha duas não conformidades de tipo C3.

- Em 06.07.2018, na sequência da realização de uma nova inspecção, o elevador NV788 foi aprovado.

- Na mesma data, o elevador nº ... não foi objecto da inspecção, uma vez que o mesmo se encontrava imobilizado na sequência de uma avaria inesperada.

- Tendo a A. procedido à reparação dessa mesma avaria e se realizado a reinspecção em 11.10.2018.

- As reparações foram realizadas, tendo a A. solicitado o pagamento da taxa para realização da inspecção periódica em 30.11.2018 e 29.01.2019.

- No dia 11.10.2018, na inspeção periódica ao ascensor 1 do Réu, escreve no relatório cinco não conformidades, quatro delas do tipo C2.

- No dia 15.04.2019 o Instituto de Soldadura e Qualidade (ISQ) verificou as condições regulamentares de segurança, estado de manutenção dos ascensores e análise de orçamentos, identificando no relatório da inspeção que realizou, várias não conformidades tipo C2, correspondentes a situações de médio risco para a segurança de pessoas e bens, as quais deveriam ser corrigidas no mais curto espaço de tempo, identificadas no ponto 18) dos factos dados como provados.

- Concluindo ainda o respectivo relatório que: “os cabos de tração, limitador de velocidade de cabo encontram-se com elevado desgaste. O I.S.Q. em consequência dos resultados observados considera que os ascensores devem ser sujeitos a ações de regularização de forma a eliminar as anomalias detetadas”.

- O Sr. Administrador do Condomínio Réu entrou em contacto com a Autora e solicitou a manutenção dos ascensores, enviando-lhe o relatório da ISQ.

- No dia 31.05.2019, o Condomínio Réu reuniu em assembleia e deliberou a resolução do contrato de manutenção celebrado com a Autora.

- No dia 04.06.2019, o Réu enviou à Autora carta, via CTT, com resolução do contrato de manutenção celebrado, invocando a justa causa de resolução por incumprimento contratual imputável à Autora.

- No dia 14.06.2019, o Réu enviou à Autora carta via CTT, registo simples, devolvendo as facturas n.ºs ..., ..., ... e ..., correspondentes aos meses de Março a Junho de 2019.

- Através de missiva datada de 19.06.2019, responde a autora, na qual esclarece que o elevador número 2 se encontrava aprovado e certificado até Julho de 2020, e que, relativamente ao elevador nº 1, o mesmo foi reprovado em Abril, porque “o condomínio decidiu retirar as chaves de acesso à casa da máquina, e não providenciou os acessos no dia da inspecção, contrariamente ao estabelecido contratualmente “.

- No dia 21.06.2019, o Réu recepciona carta da Autora, datada de dia 19.06.2019, interpelando ao pagamento da quantia global de 15.436,09 EUR, em anexo o extrato da conta corrente e, ainda, fatura n.º ..., com data de emissão de 07.06.2019, ao Réu, no valor de 6.907,83 EUR, com o descritivo: “fatura de rescisão de contrato referente aos meses de 06/2019 a 08/2023 nos termos da cláusula

- No próprio dia 21 de Junho, o Réu envia carta, registo simples, para a Autora devolvendo a factura n.º ..., fundamentando não reconhecer o valor da mesma por a resolução do contrato ter ocorrido devido a incumprimento contratual da Autora e, solicitando, uma vez mais, que a Autora procedesse à manutenção a que estava obrigada nos ascensores.

- No dia 03.07.2019, o Réu enviou carta à Autora reiterando o pedido de anulação das faturas correspondentes aos meses de Março a Junho de 2019 e ainda da fatura ....

- No dia 05.07.2019, a Autora envia ao Réu carta dando conta da não anulação das faturas em causa e dá por terminadas as negociações.

Pese embora o Réu na contestação deduzida à pretensão formulada na acção contra si proposta pela Autora pugne pela absolvição total do pedido, da leitura daquele articulado constata-se que o mesmo apenas se insurge contra o pagamento das facturas que identifica com os n.ºs ..., ..., ... e ..., referentes aos meses de Março a Junho de 2019[1], por considerar que, em relação às mesmas, ocorreu por parte da Autora incumprimento contratual, e factura n.º ..., referente à cláusula n.º 5.7.4., por entender ter a resolução do contrato sido efectuada com justa causa, além de que é nula a referida cláusula.

O quadro factual anteriormente descrito permite apurar, que, na sequência da deliberação de condóminos referida no ponto 16) dos factos provados, no dia 15.04.2019 o Instituto de Soldadura e Qualidade (ISQ) – entidade contratada pelo Réu para avaliar as condições de funcionamento do seus elevadores, e cuja manutenção cabia à Autora efectuar na sequência do contrato celebrado com o Réu -, verificou as condições regulamentares de segurança, estado de manutenção dos ascensores, identificando no relatório da inspeção que realizou várias não conformidades tipo C2, identificadas no ponto 18) dos factos dados como provados, correspondentes a situações de médio risco para a segurança de pessoas e bens, as quais deveriam ser corrigidas no mais curto espaço de tempo. O mesmo relatório concluiu ainda que “os cabos de tração, limitador de velocidade de cabo encontram-se com elevado desgaste. O I.S.Q. em consequência dos resultados observados considera que os ascensores devem ser sujeitos a ações de regularização de forma a eliminar as anomalias detetadas”.

Também resulta assente que tendo o Réu dado conhecimento dessas anomalias à Autora, enviando-lhe o relatório inspectivo e solicitando-lhe a manutenção dos elevadores, esta declinou tal pedido com o argumento de que o elevador n.º 2 se encontrava aprovado e certificado até Julho de 2020 e que, relativamente ao ascensor n.º 1, o mesmo tinha sido reprovado em Abril porquanto “o condomínio decidiu retirar as chaves de acesso à casa da máquina, e não providenciou os acessos no dia da inspecção, contrariamente ao estabelecido contratualmente”.

Relativamente a este elevador, resultou efectivamente demonstrado que não foi possível o acesso à casa da máquina, em 09.04.2019, impossibilidade essa que, conforme consta no próprio relatório, obrigaria a requerer nova inspecção, a qual configurou uma cláusula C2. O que, naturalmente, não invalida que o mesmo, inspeccionado mais tarde, a 15.04.2019, pelo Instituto de Soldadura e Qualidade, apresentasse as anomalias descritas no respectivo relatório e identificadas no ponto 18) dos factos provados.

Acresce que a Autora havia encerrado os ascensores a 28.02.2019, devido a inundação do poço, carecendo os mesmos de reparação, tendo informado o Réu que teria o mesmo de diligenciar pela limpeza do poço, o que este satisfez.

Não obstante, a Autora não voltou a ligar os ascensores devido à verificação de alguns estragos nos referidos equipamentos, tendo apresentado, para a sua reparação, um orçamento no valor de € 1.033,20, que o Réu se recusou a pagar.

De acordo com o disposto na cláusula 1.4 do contrato celebrado entre Autora e Réu, a manutenção a que aquela se obrigou para com este inclui “as reparações originadas pelo uso normal do equipamento, incluindo a substituição dos componentes referidos no ponto 5 do Anexo II do DL 320/2002, de 28 de dezembro”.

Sobre o Réu recaía a responsabilidade de assegurar o isolamento do poço dos elevadores, achando-se contratualmente excluída a responsabilidade da Autora pela correcção de avarias resultantes de infiltrações de água e/ou inundação na caixa, casa das máquinas ou poço, nos termos da cláusula 5.1.3., alínea a) do referido contrato, como o próprio Réu reconhece.

Todavia, não resulta minimamente demonstrado que as anomalias ou desconformidades detectadas na inspecção efectuada 15.04.2029 pelo Instituto de Soldadura e Qualidade, tenham sido causadas pela inundação do poço dos elevadores, a cuja limpeza o Réu promoveu.

De resto, analisando as desconformidades e anomalias descritas no ponto 18) dos factos provados é facilmente constatável, até para quem seja desprovido de específicos conhecimentos técnicos, que na sua grossa maioria[2] nada as permite relacionar com a inundação ocorrida no poço dos elevadores, devendo-se antes a elevado desgaste de alguns componentes dos equipamentos em causa em virtude da sua utilização.

Decorre, pois, da factualidade apurada nos autos que a Autora não corrigiu as anomalias detectadas nos elevadores objecto do contrato que firmara com o Réu, que o informou acerca das patologias que afectavam os referidos equipamentos, com envio do relatório elaborado pelo ISQ, limitando-se a declinar a sua responsabilidade por essa correcção, argumentando que o elevador n.º 2 se encontrava aprovado e certificado até Julho de 2020 – o que não é necessariamente sinónimo de ausência de desconformidades, as quais, de resto, viriam também a ser detectadas na inspecção periódica de 23.04.2020, realizada pela B... – e que o elevador n.º 1 tinha sido reprovado em Abril de 2019 por o Réu ter retirado as chaves de acesso à casa da máquina, vedando o acesso ao equipamento em causa, circunstância que por si só também não exclui a existência das desconformidades assinaladas pela ISQ.

Desta forma, não resultando demonstrado que as anomalias registadas nos mencionado elevadores a 15.04.2019 hajam resultado de circunstâncias que afastavam a responsabilidade da Autora pela sua correcção – facto que lhe competia provar, o que não fez -, não tendo feito a mesma a manutenção de tais elevadores, os quais encerrou a 28.02.2019 e não voltou a ligar devido à existência de estragos em alguns dos seus materiais, pode o Réu recusar o pagamento relativo às facturas relativas aos meses de Março a Maio (inclusive) de 2019, por incumprimento da Autora dos deveres contratuais de manutenção e conservação dos elevadores.

Como tal, não tem a mesma direito ao pagamento das quantias tituladas pelas facturas n.ºs ..., de 01.03.2019, ..., de 01.04.2019, e ..., de 01.05.2019, cada uma delas no valor de € 270,90, e referentes à conservação dos elevadores nos meses de Março, Abril e Maio de 2019.

Na sequência dos factos anteriormente narrados, e no seguimento da deliberação da sua assembleia de condóminos realizada a 31.05.2019, o Réu, no dia 04.06.2019, enviou à Autora carta, via CTT, com comunicação da resolução do contrato de manutenção celebrado, invocando a justa causa de resolução por incumprimento contratual imputável à Autora.

O artigo 432.°, n.° 1 do Código Civil admite a resolução do contrato fundada na lei ou em convenção, operando mediante declaração duma parte à outra, nos termos do artigo 436.° do Código Civil.

A revogação pode ser unilateral, quando é reconhecida a uma das partes a faculdade de dar sem efeito o contrato, ou bilateral, quando a extinção do contrato se dá por mútuo consentimento dos contraentes.

A resolução consiste na destruição da relação contratual, validamente constituída, operada por um acto posterior de vontade de um dos contraentes, que pretende fazer regressar as partes à situação em que elas se encontrariam se o contrato não tivesse sido celebrado[3].

O direito de resolução é um direito potestativo extintivo, que depende de um fundamento: exige a verificação de um facto que crie esse direito, isto é, tem de ocorrer um facto ou situação – no caso, o incumprimento ou inadimplência - a que a lei atribua como consequência o desencadeamento desse direito potestativo[4].

Assim, o direito de resolução está sempre condicionado a uma situação de inadimplência e, como ocorre no universo contratual, a resolução legal do contrato pressupõe uma situação de incumprimento “stricto sensu”.

Tendo as partes celebrado entre si um contrato, 24.11.2015, assumindo a Autora, mediante contrapartida económica, a obrigação de proceder à conservação, pelo período de oito anos, renováveis por iguais períodos, dos dois elevadores instalados no edifício do Réu, veio este a desvincular-se do referido contrato por carta enviada à Autora a 04.06.2019, isto é, antes do termo do contrato, por resolução unilateral.

Fê-lo quando os dois elevadores, cuja manutenção e conservação estava contratualmente a cargo da Autora, se achavam imobilizados desde 28.02.2019, por inundação do poço, cuja limpeza o Réu entretanto assegurou, e que aquela não voltou a ligar em virtude da verificação de estragos em alguns materiais dos mencionados equipamentos, e depois de o Instituto de Soldadura e Qualidade (ISQ), a pedido do Réu, ter, a 15.04.2019, efectuado uma avaliação das condições de funcionamento do seus elevadores, detectando neles diversas anomalias/desconformidades, grande parte das quais por elevado desgaste de alguns componentes, correspondentes a situações de médio risco para a segurança de pessoas e bens, que deviam ser corrigidas no mais curto espaço de tempo, recusando-se a Autora, quando para tal interpelada, a proceder a essa correcção, declinando a sua responsabilidade pelas mesmas.

Cumprindo à Autora, pelas razões já adiantadas, remover as anomalias que afectavam os elevadores, de forma a permitir a operacionalidade dos mesmos, e negando-se a fazê-lo, permanecendo aqueles equipamentos inactivos desde o final do mês de Fevereiro de 2019, mostra-se plenamente justificada, por parte do Réu, a sua desvinculação antecipada do contrato.

Como tal, havendo justa causa para a resolução unilateral do contrato e consequente antecipação da sua cessação, não se mostra exigível o pagamento da quantia reclamada a título de cláusula penal.

Mas ainda que não se configurassem os pressupostos da justa causa da antecipação do termo do contrato, também não seria devido o seu pagamento pelos fundamentos que a seguir se indicam.

Consta das condições gerais do contrato - cláusula 5.7.4: “Uma vez que a natureza, âmbito e duração dos serviços contratados, é elemento conformante da dimensão da estrutura empresarial da A..., em caso de extinção antecipada do presente Contrato pelo CLIENTE, a A... terá direito a uma indemnização no valor da totalidade das prestações do preço previstas até ao termo do prazo contratado para Contratos com duração até 5 anos, no valor de 50% das prestações do preço para Contratos com duração superior a 5 anos”.

A cláusula em apreço, integrada no contrato que o representante do Réu subscreveu, apondo nele a sua assinatura, prevê uma penalização pela quebra antecipada do vínculo contratual, conferindo à Autora uma indemnização cujo valor é pré-determinado em função do tempo antecipado para o termo do contrato.

Podemos, assim, falar da estipulação de uma cláusula penal na medida em que através dela as partes pretenderam fixar uma indemnização para a possibilidade de o Réu livremente se desvincular do contrato e, simultaneamente, liquidar previamente o dano que tal actuação poderá causar à prestadora dos serviços.

A cláusula penal consiste, como resulta da definição legal do artigo 810.º, nº 1 do Código Civil, na faculdade reconhecida às partes de “fixar, por acordo, o montante da indemnização exigível”, tratando-se da convenção através da qual as partes fixam o montante da indemnização a satisfazer, em caso de eventual inexecução do contrato[5].

Tem como escopo último a fixação antecipada de uma indemnização, compensatória ou moratória, pelo incumprimento ou retardamento no cumprimento da obrigação, com intuito de se evitarem futuras dúvidas e litígios entre as partes, quanto à determinação do montante da indemnização[6].

Pinto Monteiro[7] distingue três tipos de cláusulas penais, consoante o objectivo por elas visado e o seu modo de actuação: as que fixam antecipadamente o montante da indemnização, que, por razões de segurança jurídica, procedem à liquidação prévia dos danos, substituindo a indemnização fixada nos termos gerais; as puramente compulsórias, que, tendo por objectivo o constrangimento ao cumprimento da obrigação, são autónomas em relação à indemnização, acrescendo a esta; e as cláusulas penais em sentido estrito, que, não tendo uma função meramente indemnizatória, constituem uma alternativa à indemnização.

Serve isto para dizer que, no caso concreto, a cláusula em apreço não apenas faz depender o exercício do direito do Réu revogar unilateral e livremente o contrato ao pagamento de uma indemnização à Autora, como limita tal indemnização a um valor pré-determinado.

Essa pré-fixação do valor da indemnização, em função do tempo que faltava para o contrato atingir o seu termo, afasta a possibilidade de a Autora ser indemnizada nos termos gerais, mesmo na hipótese de o seu prejuízo ser superior ao valor fixado, e simultaneamente impede o Réu de demonstrar que o dano sofrido por aquela foi inferior ao valor estipulado para se eximir ao pagamento da indemnização fixada.

Dispõe o artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 446/85, de 25 de Outubro:

1. As cláusulas contratuais gerais elaboradas de antemão, que proponentes ou destinatários indeterminados se limitem, respectivamente, a subscrever ou aceitar, regem-se pelo presente diploma.

2. O presente diploma aplica-se igualmente às cláusulas em contratos individualizados, mas cujo conteúdo previamente elaborado o destinatário não pôde influenciar.

3. O ónus da prova de que uma cláusula contratual resultou de negociação prévia entre as partes recai sobre quem pretenda prevalecer-se do seu conteúdo.”.

Sobre este último dispositivo, que corresponde ao artigo 3.º, n.º 2, parágrafo 3.º, da Directiva Comunitária 93/13/CEE, de 5 de Abril, que a transpõe para a ordem jurídica interna, esclarece José Manuel de Araújo de Barros[8]: “...se é certo que é aquele a quem não convém a cláusula que tem interesse em pedir a declaração da sua nulidade ou a sua exclusão do contrato, não podemos esquecer que quem invoca a cláusula é que tem de provar a sua existência e o conjunto de factos que a tornam eficaz. Recaindo sobre ele não só o ónus de prova como também o de alegação dos factos constitutivos do direito invocado (artigos 342º, n.º 1 do Código Civil e 664º do Código de Processo Civil). Pelo que, em um caso concreto, dever-se-á entender que determinada cláusula previamente elaborada cai na previsão do artigo 1.º do DL n.º 446/85 se a parte que dela queira prevalecer-se não tiver alegado e provado que a mesma resultou de negociação. Sem o que se concluirá que a mesma não resultou dessa negociação, mesmo que a contraparte a tal se não tenha reportado”.

Cabia, pois, à Autora, que invocou a cláusula 5.7.4 do contrato aqui em discussão, e que dela se quis prevalecer, alegar e demonstrar que a mesma resultou de negociação entre as partes para a afastar do regime do Decreto-Lei n.º 446/85. Ónus, de alegação e de prova, que a mesma não satisfez.

Como se afirma no Acórdão da Relação de Lisboa de 05.02.2009[9], “não se provando que determinadas cláusulas contratuais, apesar de inseridas numa rubrica intitulada “condições específicas”, tenham sido objecto de negociação prévia – e o respectivo ónus incumbe à parte que pretende prevalecer-se do seu conteúdo – ficarão as mesmas abrangidas pelo regime aplicável às cláusulas contratuais gerais, nos termos do artigo 1º, nº 3 do DL nº 446/85”[10].

Segundo o acórdão da Relação do Porto de 19.02.2004[11], “nos contratos de adesão as cláusulas penais manifestamente desproporcionais aos danos, não são redutíveis, mas nulas.

Como tal, o tribunal pode declarar a respectiva nulidade, oficiosamente.”

Recorde-se que, tendo o contrato sido celebrado a 24.11.2015, por um período de oito anos, renovável por iguais períodos, procedeu o Réu à sua resolução a 04.06.2019, logo antes do seu termo, que ocorreria a 24.11.2023.

Em virtude disso, e acionando a referida cláusula contratual, a Autora emitiu e enviou ao Réu a factura relativa à sanção nela prevista, no valor de € 6.907,83, cujo pagamento, não tendo sido satisfeito pelo Réu, a mesma agora reclama pela via judicial.

Para determinar se a referida importância, reclamada a título de cláusula penal, é ou não devida, importa tomar posição quanto à validade da cláusula 5.7.4.

Ao fixar os limites de conteúdo das cláusulas contratuais gerais, o Decreto-Lei n.º 446/85, de 25.10, consagrou a boa-fé como princípio geral de controlo - cfr. art.ºs 15.º e 16.º -, elencando nos artigos 18º a 22º as cláusulas que qualifica de absoluta ou relativamente proibidas.

Nos termos da alínea c) do artigo 19.º do Decreto-Lei n.º 446/85, de 25 de Outubro, “são proibidas, consoante o quadro negocial padronizado, designadamente, as cláusulas contratuais gerais que consagrem cláusulas penais desproporcionadas aos danos a ressarcir”.

Segundo o acórdão do STJ de 12.06.2007[12], “para aferir da adequação do conteúdo da concreta cláusula penal com a citada norma da al. c), há que estabelecer uma relação entre o montante dos danos a reparar e a pena fixada contratualmente, de modo a que se possa dizer que há uma equivalência entre os dois valores.

Porém, [...] essa aferição não se pode fazer quanto aos danos concretos do contrato em apreço, mas aos que normal e tipicamente resultam, dentro do quadro negocial padronizado, em que o contrato se integra”.

De acordo com o acórdão da Relação de Coimbra de 28.10.2014[13], “para se aferir da adequação e proporcionalidade da cláusula estabelecida, à luz do disposto no art. 19 al. c) (do DL 446/85), há que ter em conta o valor dos danos a ressarcir e a pena contratualmente fixada, que vale como indemnização pré-determinada, de modo a estabelecer-se uma certa equivalência entre ambos os valores”.

Como se escreveu no acórdão da Relação do Porto de 08.04.2014[14], reflectindo sobre a validade de uma cláusula inserida pela aqui Autora num outro contrato, com contornos semelhantes ao que aqui se discute, “há assim que estabelecer uma relação entre o montante dos danos a ressarci e a pena fixada contratualmente, de modo a que se possa dizer que há uma equivalência entre os dois valores, para tanto atendendo-se não ao caso concreto, mas aos danos que “normal e tipicamente resultam, dentro do quadro negocial padronizado, em que o contrato se integra” segundo “critérios objectivos, numa avaliação prospectiva guiada por cálculos de proporcionalidade e valores médios e usuais, tendo em conta factores que, em casos daquele género, habitualmente relevam na produção e na medida dos prejuízos”.

Quanto ao que se deve entender por “desproporcionada”, na expressão da al. b), do art.º 19.º do DL 446/85, de 25.10, e sem entrarmos na discussão doutrinal e jurisprudencial pendente sobre tal questão, entendemos que, na esteira do supra referido Ac. do STJ de 12.06.2007 e dos Profs. Menezes Cordeiro e Almeida e Costa, in “Cláusulas Contratuais Gerais. Anotação ao Decreto-Lei n.º 446/85, de 25 de Outubro”, pág. 47 “(…)o qualificativo “desproporcionado” não aponta para uma pura e simples superioridade das penas preestabelecidas em relação ao montante dos danos. Pelo contrário, deve entender-se, de harmonia com as exigências do tráfico e segundo um juízo de razoabilidade, que a hipótese em análise só ficará preenchida quando se detectar uma desproporção sensível (…)”, (na acepção de notória, mas que não tem de ser excessiva, manifesta, grave).

No caso concreto, sem dúvidas que tem de se concluir que uma cláusula que, em contrato de adesão, estipula que “em caso de denúncia antecipada pelo cliente, (…) terá direito a uma indemnização por danos (…) no valor da totalidade das prestações do preço previstas até ao termo do prazo contratado” impõe consequências patrimoniais gravosas ao aderente/cliente, devendo, como tal ser considerada uma cláusula penal desproporcionada aos danos a ressarcir. Na realidade tal cláusula ofende o princípio da boa fé contratual uma vez que patenteia um manifesto desequilíbrio contratual de interesses uma vez que a autora ora apelante se limita a acautelar os seus interesses negociais ao inserir cláusulas padronizadas insusceptíveis de negociação, conduzindo a uma fidelização forçada dos clientes ao longo dos anos sob pena de se verem obrigados ao pagamento de uma pesada penalização em caso de resolução negocial. Veja-se a título de exemplo o manifesto desequilíbrio entre o preceituado na cláusula 5.6 (incumprimento imputável à B.......) e na cláusula em análise, sendo que para o caso de denúncia antecipada por parte da B......., nada está previsto, e para o caso de incumprimento que lhe seja imputável, ela apenas responderá “(...) até à concorrência do valor de 3 meses de facturação (...) como máximo de indemnização a pagar ao cliente.

Destarte temos de concluir que o que pretende a autora/apelante com a cláusula em análise é a penalização do cliente, mais do que salvaguardar uma reparação proporcionada ao dano, que evidentemente teve com a denúncia do contrato por parte do réu. E assim sendo tal conduz necessariamente a uma desproporção sensível e flagrante entre o montante da pena e o montante dos danos a reparar, atendendo ao quadro negocial padronizado em que o contrato se integra, contrariando o princípio da boa-fé a que alude o art.º 15.º do DL n.º 446/85, de 25.10, e sendo proibida nos termos previstos na al. c), do art.º 19.º do mesmo diploma, e consequentemente nula, pois que a perda de um cliente, como é o caso dos autos, não importa para a apelante a necessidade de dispensa de pessoal ou a perda de utilidade de material, equipamentos ou qualquer logística. Sem dúvidas poderá exigir algum ajustamento à gestão, mas dentro da dinâmica do próprio comércio, à perda de um cliente seguir-se-á, normalmente, a angariação de um outro”.

Revendo-nos totalmente nos fundamentos do acórdão citado, não poderemos também deixar de concluir que a cláusula em análise encerra uma manifesta desproporção entre a pena nela convencionada e o montante dos danos a reparar, contrariando o princípio da boa fé a que o artigo 15.º do Decreto-Lei n.º 446/85, de 25.10 dá guarida, sendo proibida nos termos da alínea c) do artigo 19.º deste diploma, e, por via disso, nula.

Como destaca José Manuel Araújo de Barros[15], “é ainda por referência à razão de ser do regime das cláusulas contratuais gerais, na medida em que intenta a correcção de uma desigualdade e a prevenção de abuso contratual, que deve haver uma menor tolerância de cláusulas favoráveis ao predisponente, relativamente à admitida no regime geral, concernente a contratos negociados. O que impõe que o juízo de valor sobre o carácter abusivo de determinada cláusula favorável ao predisponente seja mais exigente que aquele que incidiria sobre a mesma, caso esta tivesse resultado de negociação”.

Não é invocável o argumento de que a natureza do contrato aqui em causa, de manutenção completa de elevadores, implica grandes investimentos, em pessoal e meios, delineados e concebidos para a longa execução do contrato, e cujos custos carecem de ser ressarcidos em caso de termo antecipado desse contrato por parte do beneficiário da prestação dos serviços de manutenção para justificar a validade de uma cláusula com os contornos de que se reveste a aludida cláusula 5.7.4., aqui em discussão, com a desproporcionalidade que a mesma expressa.

Como faz notar o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 19.09.2019[16], “...tendo em conta a amplitude e diversidade de escopo da ré, ora recorrida (...) – o que só por si aponta no sentido da existência de uma ampla e vasta clientela (e só assim se justifica a utilização do formulário de contrato em questão, denominado “Contrato A... Manutenção OM”) – não se pode considerar que uma ou outra esporádica situação de incumprimento ou denúncia dos contratos possa ter reflexos de relevo na perspectiva de desperdício dos meios humanos ou materiais contratados pela recorrida, implicando prejuízos que não possam ser evitados ou compensados”.

Ora, no caso em apreço é flagrantemente abusiva a posição contratual da Autora, proponente da cláusula 5.7.4., que a inseriu no contrato a que o Réu aderiu, resultando da sua aplicação manifesto desequilíbrio para situações idênticas de incumprimento[17], havendo, por isso, fundamento, com recurso a critérios de razoabilidade, para se concluir pela nulidade da mencionada cláusula contratual, que deve ter-se por proibida nos termos do artigo 19.º, c) do Decreto-Lei n.º 446/85, de 25.10.

Sendo essa cláusula proibida, nos termos enunciados, logo nula, e nela apenas se tendo fundamentado a Autora para reclamar a peticionada quantia de € 6.907,83, teria necessariamente de improceder, também nessa parte, a acção.

Em suma, a acção procede quanto ao valor reclamado pela Autora, com excepção das quantias tituladas pelas facturas n.ºs ..., de 01.03.2019, ..., de 01.04.2019, e ..., de 01.05.2019, cada uma delas no valor de € 270,90, referentes aos meses de Março, Abril e Maio de 2019, e factura n.º ..., de 07.06.2019, no valor de € 6 907,83, relativa à sanção penal prevista na dita cláusula 5.7.4.: € 12.165,70 - € 7.720,53 = € 4.445,26.

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Síntese conclusiva:

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Nestes termos, acordam os juízes desta Relação, na procedência parcial da apelação, em alterar a sentença recorrida, condenando o Réu a pagar à Autora a quantia de € 4.445,26, acrescida de juros moratórios, calculados à taxa de 4%, desde a data do vencimento de cada uma das facturas indicadas nos números 9 a 25, 29 e 30 do ponto 44) dos factos provados, absolvendo-o do demais peticionado.

No mais, mantém-se a sentença recorrida quanto à absolvição da Autora/Reconvinda, que não foi objecto de recurso.

Custas: a cargo do apelante e da apelada, na proporção do respectivo decaimento – artigo 527.º, n.º 1 do Código de Processo Civil.
Notifique.


Porto, 20.02.2025
Acórdão processado informaticamente e revisto pela 1.ª signatária.
Judite Pires
Isoleta de Almeida Costa
Paulo Dias da Silva
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[1] Importando notar, todavia, que, como resulta do teor da petição inicial e da cópia das facturas com ela juntas, a Autora não reclama qualquer pagamento referente à indicada factura n.º ....
[2] Designadamente, o facto de que com o contrapeso assente nos amortecedores ser possível deslocar a cabina no sentido ascendente; com a cabina assente nos amortecedores ser possível deslocar o contrapeso no sentido ascendente; o elevado desgaste na máquina de tração, pela sua utilização; o desgaste da cabine, pelo seu uso; Portas de patamar evidenciam elevado desgaste, porta piso 0 embate no pavimento; cabo de acionamento do limitador de velocidade em mau estado de conservação; comando que não se adequa à instalação face à sua taxa de utilização, concluindo o relatório respectivo que “os cabos de tração, limitador de velocidade de cabo encontram-se com elevado desgaste”.
[3] Antunes Varela, “Das Obrigações em Geral”, II, 2.ª edição, 1974, pág. 238.
[4] Cfr. João Baptista Machado, “Pressupostos da Resolução por Incumprimento”, in Obra Dispersa, Scientia Ivridica, Braga, 1991, págs. 130 e seguintes.
[5] Galvão Telles, “Direito das Obrigações”, pág. 437.
[6] Pires de Lima e Antunes Varela, “Código Civil Anotado”, vol. II, pág. 75.
[7] “Cláusula Penal e Indemnização”, págs. 577 e seguintes.
[8] “Cláusulas Contratuais Gerais, DL n.º 446/85 – Anotado”, Coimbra Editora, pág. 32.
[9] Processo nº 10941/08, www.dgsi.pt.
[10] Cf. ainda Acórdão da Relação do Porto, 22.06.2009, www.trp.pt/jurisprudenciacivel, e da mesma Relação, de 24.04.2008, www.dgsi.pt.
[11] Processo n.º 0351134, www.dgsi.pt.
[12] Processo n.º 07A1701, www.dgsi.pt.
[13] Processo n.º 3516/13.5TJCBR.C1, www.dgsi.pt.
[14] Processo n.º 1801/12.2TBPVZ.P1, www.dgsi.pt, seguido de perto pelo acórdão da mesma Relação de 24.11.2015, processo n.º 1069/13.3TBGDM.P1, www.dgsi.pt.
[15] Obra citada, pág. 236.
[16] Proferido na Revista n.º 652/16.0T8SNT.L1.S1, que revoga o acórdão da Relação de Lisboa, de 11 de Setembro de 2008, citado na sentença recorrida.
[17] Atente-se no teor da cláusula 5.6., prevista para situações de incumprimento da Autora, onde se consigna que “Na situação de eventual incumprimento imputável à A..., é expressamente aceite que a A... apenas responderá até à concorrência do valor de 3 meses de faturação A... do Contrato, como máximo de indemnização a pagar ao CLIENTE”.