ERRO MÁXIMO ADMISSÍVEL
PORTARIA N.º 1542/2007 DE 06/12 (EM VIGOR À DATA)
EXCESSO DE VELOCIDADE NÃO SUPERIOR A 20 KM/H
CONTRA ORDENAÇÃO LEVE PREVISTA E PUNÍVEL PELAS DISPOSIÇÕES CONJUGADAS DOS ARTIGOS 27º N.ºS 1 E 2 AL A) 1.º E 28º N.º 5 DO CÓDIGO DA ESTRADA
Sumário

1 - À data dos factos em apreço [15.09.2021] estava em vigor a Portaria n.º 1542/2007, de 06/12, que aprovou o Regulamento do controlo metrológico dos cinemómetros, aplicável aos instrumentos de medição da velocidade instantânea e dos dispositivos complementares associados para registar os resultados das medições [cfr. artigo 1.º]. Concretamente, os valores dos erros máximos admissíveis (EMA), variáveis em função da velocidade e do tipo de cinemómetro [cfr. artigo 8º], eram definidos nos termos do quadro que figura como Anexo à referida Portaria.
2 - Assim, de acordo com o referido quadro, no caso concreto dos autos, tratando-se de radar móvel e tendo o equipamento MULTANOVA MUVR-6FD, nº 262 (Aprovação modelo nº 111.20.18.34.3, de 28-03-2019) sido alvo de verificação periódica IPQ em 06/05/2021, considerando a velocidade registada de 77Km/hora <100km/h], o erro máximo admissível (EMA) corresponde a 7 Km/hora, e não a 5 km/h – prevista para o caso de se tratar de equipamento com a primeira verificação – como consta do auto de contraordenação, pelo que a velocidade apurada, a que o arguido conduzia o mencionado veículo, era de 70km/hora, e não 72km/hora como consta do mesmo auto.
3 - Mercê do apontado erro máximo admissível aplicável no caso concreto, a velocidade a considerar passa a ser de 70 km/h, o que significa que o excesso de velocidade relativamente ao limite máximo de 50 km/h que vigora para a circulação de automóvel ligeiro como o conduzido pelo recorrente dentro de localidade não é superior a 20 km/h.
4 - Assim sendo, a conduta do recorrente não integra a contra ordenação grave prevista no artigo 145º, n.º 1, al. c), do Código da Estrada, mas antes a contra ordenação leve prevista e punível pelas disposições conjugadas dos artigos 27º, n.ºs 1 e 2, al. a), 1.º, e 28º, n.º 5, do mesmo diploma.
5 - Tal contra ordenação leve é sancionada apenas com coima de 60 € a 300 €, não havendo lugar a sanção acessória de inibição.
6 - Por força do estatuído no n.º 3 do artigo 28º do RGC, «nas contra-ordenações rodoviárias, a prescrição do procedimento terá sempre lugar decorridos que sejam [2 anos (prazo normal) + 1 ano (metade do prazo normal) + 6 meses (prazo de suspensão)] 3 anos e 6 meses sobre a data da prática da contra-ordenação».

Texto Integral

* Acordam, em conferência, os Juízes da Secção Penal do Tribunal da Relação de Coimbra: I. - RELATÓRIO 1. – Nos presentes autos, que sob o n.º 2458/24.3T9LRA correm termos pelo Juízo Local Criminal de Leiria – Juiz ..., do Tribunal Judicial da Comarca de Leiria, por despacho judicial proferido em 11.10.2024, foi decidido não conceder provimento ao recurso de contraordenação, mediante o qual foi impugnada judicialmente a decisão administrativa que condenou AA pela prática da contraordenação prevista nos termos do disposto nos artigos, 27.º, n.º1, 136.º, 138.º e 145.º, al. b), 147.º, todos do Código da Estrada, na coima de €180,00 (cento e oitenta euros) e na sanção acessória de proibição de conduzir por 75 (setenta e cinco) dias, mantendo, assim, a decisão administrativa recorrida e sanções aplicadas. 2. - Não se conformando com tal despacho, dele veio o arguido interpor o presente recurso, tendo, no termo da motivação, formulado as conclusões e o pedido que ora se transcrevem: «1.ª A infração dos presentes autos terá sido alegadamente praticada no dia 15 de setembro de 2021. 2.ª Decorreram mais de 3 anos desde a prática da alegada infração. 3.ª De acordo com o n.º 3 do artigo 28º do RGCO, “a prescrição do procedimento tem sempre lugar quando, desde o seu início e ressalvado o tempo de suspensão, tiver decorrido o prazo da prescrição acrescido de metade.”. 4.ª Tendo decorrido mais de três anos desde a data da alegada prática da infração até presente data, dúvidas inexistem quanto à prescrição do presente procedimento contraordenacional. 5.ª Impõe-se assim o arquivamento do presente procedimento contraordenacional. 6.ª Salvo devido respeito e sempre melhor entendimento, o auto de contraordenação na origem deste processo é nulo por omissão factual, nulidade essa que acaba naturalmente por inquinar a decisão da ANSR e posteriormente a decisão de que aqui se recorre. 7.ª Entende o Recorrente que do auto de contraordenação, não se descreveram com exatidão e rigor não só “os factos que constituem a infração” mas também “as circunstâncias em que foi cometida” a alegada infração. 8.ª Conforme alegado e retratado (a nosso ver de forma insuficiente) em sede de despacho de decisão, no que concerne à velocidade a que alegadamente seguia o veículo do recorrente são referidas duas velocidades, 9.ª A de “pelo menos” que corresponde à velocidade de 72 Km/h e a “velocidade registada” de 77 Km/h.”. 10ª O Tribunal recorrido vem justificar em sede de decisão por despacho que se “aplicou a margem de erro legalmente prevista” e que as margens de erro resultam da própria lei. 11.ª Onde está o critério e cálculo aritmético / razão de ciência / determinação legal que explique qual/quais a margens de erro legais a aplicar? 12.ª Salvo devido respeito e douto melhor entendimento, não vimos isso refletido no auto de contraordenação nem fundamentado em sede da decisão que aqui se recorre. 13.ª A al. b) do n.º 1 do artigo 170º do CE determina que, “O valor registado e o valor apurado após dedução do erro máximo admissível previsto no regulamento de controlo metrológico dos métodos e instrumentos de medição, quando exista, prevalecendo o valor apurado, quando a infração for aferida por aparelhos ou instrumentos devidamente aprovados nos termos legais e regulamentares.” 14.ª Questiona-se o Recorrente se no caso dos presentes autos existia regulamento de controlo metrológico dos métodos e instrumentos de medição. 15.ª Qual a regra para que o erro máximo admissível imputado no presente caso tenha sido de 5 Km/h e não de 8km/h? 16.ª É importantíssimo para o Recorrente perceber a lógica e determinação do valor do erro máximo admissível, pois se no presente caso fosse aplicada margem de erro de 8 km/h, a contraordenação seria leve e não seria imputada qualquer sanção acessória. 17.ª A única forma de tal resultar “respeitado” e em conformidade com o normativo legal que resulta do 170.º do CE, é, a ser possível e exato, constar do auto de contraordenação. 18.ª Sendo que, este aspeto, configura nos termos do artigo 170.º, n.º 1, do CE, uma nulidade insanável, porquanto não se mencionam com a exatidão e o rigor exigidos pela norma “(...) os factos que constituem a infração (...)”. 19.ª A ausência de uma referência exata sobre a real e efetiva velocidade a que o veículo do aqui Recorrente circulava e sobre qual das velocidades está efetivamente a ser punido, constitui uma evidente omissão acusatória, insanável 20.ª Os requisitos dos artigos 170.º e 175.º do CE, são essenciais e fundamentais para sustentar a elaboração de um auto de contraordenação, sendo a decisão proferida pela ANSR sustentada com base nos factos nele contidos e posteriormente confirmada pelo Tribunal Recorrido, e não estando expressos nesse mesmo auto, violam essas mesmas normas jurídicas inquinando todo o processo contraordenacional de nulidade. Nestes termos, e nos mais de Direito, deverá o presente recurso ser considerado procedente, e, consequentemente ser revogada a decisão recorrida e ordenado o arquivamento dos presentes autos Pois assim o impõem o Direito e a JUSTIÇA!» 5. - A Ex.ma Magistrada do Ministério Público junto da 1.ª instância respondeu ao recurso, em termos que aqui se dão por integralmente reproduzidos e, afinal, concluiu: «1ª- Por douta sentença, proferida nos autos, foi decidido não conceder provimento ao recurso de contraordenação, que veio impugnar a decisão administrativa, da Autoridade de Segurança Nacional Rodoviária, que condenou o arguido, AA, pela prática de uma contraordenação prevista e sancionável, nos termos do disposto nos artigos, 27.º, n.º1, 136.º, 138.º e 145.º, al. b), 147.º, todos do Código da Estrada, e sancionando o mesmo numa coima de €180,00 (cento e oitenta euros) e numa sanção acessória de proibição de conduzir por 75 (setenta e cinco) dias, assim, mantendo a decisão administrativa recorrida e sanções aplicadas; 2ª.- No âmbito do respetivo processo de contraordenação n.º ...45, foi proferida a 15-07-2022, a competente decisão administrativa, pela Autoridade de Segurança Nacional Rodoviária, considerando verificada, a prática da aludida contraordenação, sancionada com coima de €180,00 (cento e oitenta euros) e em sanção acessória de proibição de conduzir por 75 (setenta e cinco) dias; 3ª.- Como consta do respetivo auto por contraordenação, a prática dos factos reporta-se a 15-09-2021, endo o prazo de prescrição do procedimento contraordenacional, no caso “sub judice”, de 2 (dois) anos, atento o disposto no artigo 188º., nº. 2, do Código da Estrada, pelo que o termo do prazo ocorreria em 15-09-2023; 4ª.- Todavia, e de acordo com o disposto nos artigos 27.º-A e 28º., ambos do Regime Geral das Contraordenações (RGCO) ex vi do artigo, 188.º, nº. 2, do Código da Estrada, verificam-se causas de interrupção e de suspensão do procedimento contraordenacional; 5ª.- Tendo em conta que o recorrente foi notificado para o exercício do direito de audição, no dia da prática dos factos, a 15-09-2021, a prescrição do procedimento contraordenacional interrompeu-se a 15-07-2022, com a prolação da decisão administrativa, e voltou a interromper-se a 04-11-2022, com a notificação dessa decisão ao arguido (cfr. fls. 14), tendo começado a correr novo prazo de prescrição de 2 (dois) anos, que terminaria a 05-11-2024; 6ª.- Verifica-se, porém, a 14-06-2024, uma nova causa de interrupção e de suspensão do procedimento contraordenacional, prevista pelo artigo, 27º.-A, nº. 1, alínea c), do RGCO, pelo prazo máximo de seis meses, com a notificação do arguido, do despacho (de 11-06-2024), que admitiu o recurso de impugnação judicial, por carta registada com prova de receção (cfr. fls. 39), prazo que ainda decorre; 7ª.- De acordo com o disposto no artigo 28.º, nº. 3, do RGCO, sendo que “a prescrição do procedimento tem sempre lugar quando, desde o seu início e ressalvado o tempo de suspensão, tiver decorrido o prazo da prescrição acrescido de metade”, verifica-se, assim, que no caso em apreço, ainda não ocorreu a prescrição do procedimento contraordenacional; 8ª.- No caso em apreço, o auto de contraordenação encontra-se elaborado nos termos legais devidos, de forma completa, com descrição de todos os factos imputados ao arguido, assim, contendo a exigida concretização factual, as circunstâncias em que os mesmos factos ocorreram, bem como as normas legais aplicáveis ao caso concreto, as normas que tipificam a conduta do arguido como contraordenação e as sancionatórias; 9ª.-Do mesmo auto, lavrado a 15-09-2021, consta expressamente, em “Descrição sumária” que: “O referido veículo circulava, dentro da localidade, pelo menos, à velocidade de 72 Km/hora, correspondendo velocidade registada de 77 Km/hora, deduzida a margem de erro legalmente prevista, sendo o limite máximo de velocidade permitida no local, de 50 Km/hora. A velocidade foi verificada através do equipamento MULTANOVA MUVR-6FD, nº 2627, aprovado pelo IPQ (Aprovação modelo nº 111.20.18.34.3, de 28-03-2019), e aprovada para uso pelo Despacho nº. 5121/2019, da ASNR, de 26ABR, com verificação periódica IPQ em 06/05/2021.” 10ª.- Já no que se refere ao controlo metrológico da velocidade dos veículos, na altura dos factos, 15-09-2021, os ditos critérios respetivos aplicáveis pelas normas aplicáveis em vigor, encontravam-se estabelecidos pela Portaria nº. 1542/2007, de 6/12 e respetivo Anexo; 11ª.- Assim, a determinação do valor de erro máximo admissível (EMA) encontra-se sujeita aos critérios legais, e não aos “critérios puramente arbitrário por parte da entidade autuante”, como questiona o recorrente, sendo o erro máximo admissível, no presente caso, de 5 Km/hora, atenta a concreta velocidade registada, de 77Km/hora, e não outro qualquer valor de desconto porque, pura e simplesmente, a lei aplicável à data assim o impunha, 12ª.- Assim, havendo uma só velocidade imputada, atenta a condução do arguido, do referido veículo, a velocidade de 72Km/hora; 13ª.- Pelo que o auto de contraordenação, e rigorosamente, encontra-se em conformidade com o disposto no artigo 170º., do Código da Estrada, não se verificando qualquer a alegada “omissão factual”, da alegada nulidade e nem de qualquer outro vício; 14ª.- Mais tendo sido cumprido, escrupulosamente, o disposto no artigo 175º., do Código da  Estrada, atenta a notificação do arguido, na data dos factos, e com o auto de notícia, tal como se verifica do teor da notificação do mesmo (cfr. fls. 1 e 2); 15ª.-Etanto é assim que o recorrenteveio aimpugnar adecisão administrativada Autoridade de Segurança Nacional Rodoviária, por meio da impugnação que deduziu nos autos, demonstrando conhecer, perfeitamente, todos factos que lhe eram imputados e as razões de facto e de direito por que tais factos lhe foram imputados, bem como a coima e sanção aplicadas; 16ª.-Verifica-se dosautos que se mostram plenamente cumpridos, o disposto nospreceitos legais aplicáveis no caso “sub judice”, incluindo, o disposto nos artigos 170º. e 175º., ambos do Código da Estrada; 17ª.- A decisão administrativa não padece de nulidade, encontrando-se fundada no teor do auto de contraordenação e nos factos e circunstâncias, aí descritos, de forma completa, assim, não se encontrando “inquinada” por uma alegada e inexistente nulidade desse auto; 18ª.- Em consequência, logicamente, a sentença recorrida também não padece de qualquer nulidade, igualmente, não se encontrando “inquinada” por alegadas nulidades, que não existem; 19ª.- A sentença recorrida encontra-se devidamente fundamentada, de facto e de direito, visto terem sido dado como provados factos concretos que sustentam a verificação dos elementos objetivos e subjetivos, conducentes à responsabilidade contraordenacional do arguido, pelo que consideramos que não assiste qualquer razão ao mesmo, recorrente, atentas asnulidades invocadas, que só podem ser declaradas improcedentes, tal como bem foi decidido pela sentença proferida. 20ª.- Assim sendo, só podia ter sido decidido pela sentença recorrida, como o foi, a manutenção da decisão administrativa de condenação do arguido, pela prática da aludida contraordenação, prevista e sancionável pelos artigos, 27.º, nº. 1, 136.º, 138.º e 145.º, al. b), 147.º todos do Código da Estrada, numa coima de €180,00 (cento e oitenta euros) e numa sanção acessória de proibição de conduzir por 75 (setenta e cinco) dias, e 21ª.- Daí que a sentença proferida não se encontre em violação com quaisquer princípios ou preceitos legais, inclusive, os invocados pelo arguido, ora recorrente. Pelo exposto, e pugnando-se pela total improcedência do recurso interposto pelo arguido, entendemos que deverá ser mantida a sentença proferida, nos seus precisos termos. VOSSAS EXCELÊNCIAS, PORÉM, FARÃO A ACOSTUMADA JUSTIÇA!» 6. - Na vista a que se refere o artigo 416º, n.º 1, do Código de Processo Penal, a Ex.ma Procuradora-Geral Adjunta apôs o seu visto. 7. - Colhidos os vistos e realizada a conferência, cumpre apreciar e decidir. *             II. – FUNDAMENTAÇÃO 1. - Delimitação do objeto do recurso Conforme entendimento pacífico, no âmbito de recurso, o poder de cognição do tribunal é delimitado pelas conclusões – deduzidas por artigos –, já que é nelas que o recorrente sintetiza as razões – expostas na motivação – da sua discordância com a decisão recorrida.             No caso de recurso em matéria de contraordenação, regem os artigos 73º a 75º do Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de outubro – Regime Geral das Contraordenações (RGC) –, aplicando-se as regras do processo penal, tendo em conta as especialidades daquele diploma, conforme resulta dos seus artigos 41º, n.º 1, e 74º, n.º 4.             Ademais, importa ter em atenção o decidido no acórdão de fixação de jurisprudência n.º 3/2019[1]  – “Em processo contraordenacional, no recurso da decisão proferida em 1.ª instância o recorrente pode suscitar questões que não tenha alegado na impugnação judicial da decisão da autoridade administrativa”.             Da conjugação do sobredito regime legal com a antedita jurisprudência fixada extraem-se as seguintes conclusões relativamente aos processos de contraordenação:             - A impugnação da decisão da autoridade administrativa não assume a natureza de um verdadeiro recurso, sendo antes a causa retirada do âmbito administrativo e entregue a um órgão independente e imparcial – o tribunal;             - O Tribunal da Relação funciona como tribunal de revista ampliada – podendo alterar a decisão do Tribunal recorrido sem qualquer vinculação aos termos e ao sentido em que foi proferida ou anulá-la e devolver o processo ao mesmo tribunal, sempre sem prejuízo do conhecimento oficioso de qualquer dos vícios referidos no artigo 410.º, n.º 2, Código de Processo Penal e como última instância, conhecendo apenas da matéria de direito;             - Está, assim, excluída a impugnação ampla da matéria de facto com base no erro de julgamento, nos moldes previstos no artigo 412º, n.ºs 3 e 4, do Código de Processo Penal[2].             Posto isto, in casu, as questões a apreciar são as seguintes:                 -  Prescrição do procedimento contraordenacional;             - Nulidade do auto de contraordenação, da decisão administrativa e da decisão judicial, por omissão de cabal descrição factual.                         2. – Decisão recorrida             O despacho judicial alvo de recurso, proferido ao abrigo do preceituado no artigo 64º do RGC, tem o seguinte teor [transcrição]:   I.  Relatório 1. AA, titular do bilhete de identidade n.º ...19, NIF n.º ...09, com morada em Rua ... ..., ... ..., veio nos presentes autos de recurso de contraordenação, impugnar judicialmente a decisão administrativa proferida em 15.07.2022 âmbito do processo de contraordenação n.º ...45 pela Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária. Em tal decisão, considerou-se verificada a prática de uma contraordenação prevista e sancionável nos termos do disposto nos arts. 27.º, n.º1, 136.º, 138.º e 145.º, al. b), 147.º todos do Código da Estrada e sancionou a arguida numa coima de €180,00 (cento e oitenta euros) e e numa sanção acessória de proibição de conduzir por 75 dias (tudo conforme fls. 12 e ss. cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido). 2.                 A arguida apresentou nos autos impugnação judicial da aludida decisão administrativa, e sendo as conclusões dessa mesma peça processual que delimitam o que há a apreciar em sede recursiva é o seguinte: · a) Da nulidade insanável do procedimento contraordenacional dos autos na medida em que, em seu entender, ao contrário do que se impunha nos termos do art. 170.º, n.º1 do Código da Estrada o auto em que assenta a decisão não concretiza “os factos que constituem a infração” nem as “circunstâncias em que foi cometida” sobretudo porque não se concretiza nem é possível ao arguido ficar a saber a que velocidade estava a circular, se a 72 km/h ou 77 km/h, o que, em seu entendimento, bem como se desconhece por não resultar da decisão como chegou o agente autuante à conclusão que o veículo circulava a “pelo menos 72 km/h” (o que seria importante até pela diferença entre uma contraordenação grave/muito grave e consequências ao nível da sanção acessória em causa); Assim, entende que deve ser revogada decisão de aplicação quer da coima quer da sanção acessória e ordenado o arquivamento dos autos; Termina peticionando que seja declarada a nulidade do procedimento, que seja revogada a aplicação da coima no valor de €180,00 e da sanção acessória de inibição de conduzir pelo período de 75 dias e que seja ordenado o arquivamento dos autos; · Invoca a nulidade da própria decisão administrativa: O  arguido refere ainda que o ponto 1 da decisão é igualmente omisso nessas mesmas circunstâncias fácticas quanto à indicação precisa da velocidade, o que gera a nulidade da decisão. 3.                 Enviados os autos ao Ministério Público pela autoridade administrativa, a D.M. determinou que os autos fossem registados e autuados como recurso de contraordenação, com posterior conclusão à magistrada judicial, valendo como acusação, nos termos do disposto no art. 62.º, n.º1 do D.L. n.º 433/82 de 27.10. 4. Foi o recurso admitido nos termos melhor constantes do despacho de 28.05.2022 e foi determinada a notificação do arguido e do Ministério Público para se pronunciarem sobre a eventual decisão por despacho, com expressa advertência de que se nada dissessem se entenderia não se oporem (art. 64.º, n.º2 do R.G.C.O.), o arguido opôs-se a tanto, razão pela qual foi designada data para audiência de julgamento. Contudo, veio ulteriormente a consignar não se opor à decisão por despacho. II.  Saneamento O Tribunal é competente e o processo é próprio. * * Questões prévias e eventuais nulidades: Para conhecimento das nulidades arguidas importa ter em consideração a seguinte factualidade comum (provados de acordo com as fls. do processo que se referem em cada facto): · Foi levantado auto de notícia por contraordenação à arguida, referente a factos de 15.09.2021, nos termos melhor constantes de fls. 1 ss. que aqui damos por integralmente reproduzidos– fls. 1 ss; · Do auto de notícia em que consta como arguido o ora recorrente, consta, além do mais, o seguinte “Data:2021-09-15; Hora:10:32; presenciada pelo autuante: sim; Local: E.N. ...13, ..., sentido N/S, 8,0, ...; Descrição sumária dos factos: O referido veículo circulava, dentro da localidade, pelo menos, à velocidade de 72 km/h correspondente à vlociade registada de 77 km/h, deduzida a margem de erro legalmente prevista, sendo o limite máximo de velocidade permitido no local de 50 km/h. A velocidade foi verificada através do equipamento MULTANOVA MUVR-6FD, aprovado pelo IPQ (aprovação Modelo n.º 111.20.18.34.3 de 28MAR2019) e aprovado para uso pelo despacho 5121/2019 da ANSR de 26ABR, com verificação periódica IPQ em 06/05/21– fls. 1 que aqui se dá por integralmente reproduzido.; · A notificação de tal auto ao arguido foi feita por carta registada com aviso de receção, em que foi aposto n.º de “BI ou outro documento oficial: ...73, bem como o nome de “BB”, e a data de 19.10.2021, com a informação “contingência” (conforme registo de receção junto aos autos após auto de fls. 1); A ora recorrente não apresentou defesa em tal fase processual; Em 15.07.2022, foi proferida decisão condenatória sendo que em tal decisão, considerou-se verificada a prática de uma contraordenação prevista e sancionável nos termos do disposto nos arts. 27.º, n.º1, 136.º, 138.º e 145.º, al. b), 147.º todos do Código da Estrada e sancionou a arguida numa coima de €180,00 (cento e oitenta euros) e e numa sanção acessória de proibição de conduzir por 75 dias (tudo conforme fls. 12 e ss. cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido); Do ponto 1 de tal decisão constam os seguintes dizeres (fls. 12): a) Da nulidade do auto de notícia que está na base da decisão administrativa e da sua notificação Vejamos as nulidades invocadas. Estando-se perante contraordenação rodoviária importa desde logo referir que apenas se aplica o RGCO no que não esteja previsto no Código da Estrada. Vem desde logo invocada a nulidade quanto ao teor do próprio auto de notícia. Em matéria de auto de notícia estabelece, o art. 170.º do Código da Estrada (e art. 175º) os requisitos que o auto de notícia deve respeitar. Vejamos. Assim, prevê-se do predito artigo 170.º do Código da Estrada que: “ 1- Quando qualquer autoridade ou agente de autoridade, no exercício das suas funções de fiscalização, presenciar contraordenação rodoviária, levanta ou manda levantar auto de notícia, o qual deve mencionar: a) Os factos que constituem a infração, o dia, a hora, o local e as circunstâncias em que foi cometida, o nome e a qualidade da autoridade ou agente de autoridade que a presenciou, a identificação dos agentes da infração e, quando possível, de, pelo menos, uma testemunha que possa depor sobre os factos; b) O valor registado e o valor apurado após dedução do erro máximo admissível previsto no regulamento de controlo metrológico dos métodos e instrumentos de medição, quando exista, prevalecendo o valor apurado, quando a infração for aferida por aparelhos ou instrumentos devidamente aprovados nos termos legais e regulamentares. 2 - O auto de notícia é assinado pela autoridade ou agente de autoridade que o levantou ou mandou levantar e, quando for possível, pelas testemunhas. 3 - O auto de notícia levantado e assinado nos termos dos números anteriores faz fé sobre os factos presenciados pelo autuante, até prova em contrário. 4 - O disposto no número anterior aplica-se aos elementos de prova obtidos através de aparelhos ou instrumentos aprovados nos termos legais e regulamentares. 5 - A autoridade ou agente de autoridade que tiver notícia, por denúncia ou conhecimento próprio, de contraordenação que deva conhecer levanta auto, a que é correspondentemente aplicável o disposto nos n.os 1 e 2, com as necessárias adaptações.” Por seu turno, a notificação do auto terá de conter os elementos previstos no art. 175.º, n.º1 do Código da Estrada, que prevê que 1 - Após o levantamento do auto, o arguido deve ser notificado: a) Dos factos constitutivos da infração; b) Da legislação infringida e da que sanciona os factos; c) Das sanções aplicáveis; d) Do prazo concedido e do local para a apresentação da defesa, bem como do prazo e local para apresentação do requerimento para atenuação especial ou suspensão da sanção acessória; e) Da possibilidade de pagamento voluntário da coima pelo mínimo nos termos e com os efeitos estabelecidos no artigo 172.º, da possibilidade de prestação de depósito nos termos e efeitos referidos do artigo 173.º, do prazo e do modo de o efetuar, bem como das consequências do não pagamento; f) Da possibilidade de requerer o pagamento da coima em prestações, no local e prazo indicados para a apresentação da defesa; g) Do prazo para identificação do autor da infração, nos termos e com os efeitos previstos nos n.os 3 e 5 do artigo 171.º”. Ora, ao contrário do que conclui o arguido, o auto de notícia de fls. 1 refere todos os elementos exigíveis pelo referido art. 170.º do Código da Estrada, designadamente quanto aos factos, infração e suas circunstâncias. Com efeito, nos termos dados como provados, vem referido o tempo (15.09.2021 pelas 10:32h) o lugar (E.N. ...13 – ... – sentido N/S, 8, ...) e a infração e suas circunstâncias (o veículo ligeiro de passageiros de matrícula ..-0G-.. circulava dentro da localidade, pelo menos pelo menos, à velocidade de 72 km/h correspondente à velocidade registada de 77 km/h, deduzida a margem de erro legalmente prevista, sendo o limite máximo de velocidade permitido no local de 50 km/h. A velocidade foi verificada através do equipamento MULTANOVA MUVR-6FD, aprovado pelo IPQ (aprovação Modelo n.º 111.20.18.34.3 de 28MAR2019) e aprovado para uso pelo despacho 5121/2019 da ANSR de 26ABR, com verificação periódica IPQ em 06/05/21). Não seria curial nem exigir às entidades e autoridades que levantam os autos que logo naquele primeiro momento concluísse pelo tipo de culpa a imputar e o fizesse constar do auto de notícia, não só por se tratarem de profissionais a quem tal não seria exigível mas também porque, em muitos dos casos nem sequer seria possível extrair da materialidade dos factos um fenómeno subjetivo como é a culpa (o que a recorrente não coloca em causa), nem para afirmar coisa diferente do que vem descrito no aparelho que mediu a velocidade. Refere-se que circulava “pelo menos a 72 km” precisamente porque, tendo a velocidade sido medida por um radar, se aplicou a margem de erro legalmente prevista. Assim, referindo o recorrente que desconhece por não resultar da decisão como chegou o agente autuante à conclusão que o veículo circulava a “pelo menos 72 km/h”,  é de sublinhar que tal resulta da própria lei na parte em que determina que se apliquem margens de erro à velocidade registada e que assim concluem, que o agente conduziu a pelo menos essa velocidade (pode ter até conduzido a mais, dentro da margem de erro, mas é seguro afirmar que pelo menos a essa conduziu). É a essa velocidade, já com dedução da margem de erro benéfica ao arguido, que o auto e a decisão aludem e que, em sede decisória foi corretamente tida em conta como referência para a classificação da contraordenação como leve, grave ou muito grave nos termos do art. 136. do Código da Estrada (com todas as consequências que daí advêm quanto às molduras das sanções – coima e sanção acessória -). Mas vem ainda arguida a nulidade da própria notificação do auto de noticia. Importa por isso, nesta sede, ter em conta o previsto nos art.s 175.º e 176.º do Código da Estrada. O arguido coloca em causa o facto de na notificação do art. 175.º do Código da estrada não constar a que velocidade concreta o veículo circulava já que se referem duas velocidades distintas uma tida como “registada” e outra a que se refere “pelo menos”), não sabendo pela qual vem sancionado. Ora, no que concerne à nulidade invocada por violação do art. 175.º, n.º1 do Código da estrada, reiteramos aqui o que já dissemos supra quanto à arguição da nulidade do auto. Como resulta provado supra, o recorrente, que em nenhum momento impugna o facto de ser o condutor, “circulava dentro da localidade, pelo menos, à velocidade de 72 km/h correspondente à vlociade registada de 77 km/h, deduzida a margem de erro legalmente prevista, sendo o limite máximo de velocidade permitido no local de 50 km/h. A velocidade foi verificada através do equipamento MULTANOVA MUVR-6FD, aprovado pelo IPQ (aprovação Modelo n.º 111.20.18.34.3 de 28MAR2019) e aprovado para uso pelo despacho 5121/2019 da ANSR de 26ABR, com verificação periódica IPQ em 06/05/21”. Está corretamente descrito que o que a infração que estava imputada neste procedimento contraordenacional era a de conduzir a pelo menos 72 km/h em local onde a velocidade permitida era de 50 km/h. Há a concretização necessária dos factos da infração já que o que está em causa é uma velocidade registada em radar de 77 km/h e que após dedução da margem de erro legalmente imposta (desde a Portaria n.º 1542/2007 de 6 de Dezembro) resulta numa velocidade mínima a que conduziu de 72 Km. Assim, é totalmente certo notificar que o arguido conduzia pelo menos a 72 km/h sendo a mais favorável das velocidades em causa entre os 72Km/h e os 77 km/h. Refere ainda o arguido que desconhece por completo o auto que está na base do procedimento contraordenacional e que nunca recebeu na sua morada qualquer notificação eferente ao auto de notícia que alegadamente lhe foi levantado. Não nos resta a dúvida que, face ao teor do art. 176.º do Código da estrada (legislação especial face ao RGCO), quando possível, é no ato de autuação que se procede à notificação por contacto pessoal. Não sendo possível ou estando em causa outro qualquer ato, a notificação pode ser efetuada através de carta registada com aviso de receção, expedida para o domicílio ou sede do notificando . – cfr. n.º 4 do art.º 176.º do Código da Estrada. O que sucedeu nos presentes autos, ou seja, o aqui opoente não foi notificado por contacto pessoal no ato de autuação, até porque a infração foi detetada através de radar e sem paragem do veículo, e daí que lhe foi dirigida notificação, através de carta registada com aviso de receção. Contudo, se, por qualquer motivo, a carta registada com aviso de receção for devolvida à entidade remetente, a notificação é reenviada ao notificando, para o seu domicílio ou sede, através de carta simples. – cfr. n.º 5 do art.º 176.º do Código da Estrada. Ora, revertendo ao caso dos autos, importa referir que o auto de notícia foi notificado por carta registada com aviso de receção. Por ocasião da pandemia provocada pelo vírus Covid-19, legislou-se um Regime excecional e temporário quanto às formalidades da citação e da notificação postal no âmbito da pandemia da doença COVID-19. Com efeito a Lei n.º 10/2020 de 18 de abril (lei temporária e portanto prevalecente para o período de vigência, sendo que a mesma esteve em vigor desde 19.04.2020 e até que foi revogada pela Lei n.º 31/2023 de 04.07, em vigor desde 05.07.2023)  veio estabelecer um regime excecional e temporário quanto às formalidades da citação e da notificação postal previstas nas leis processuais e procedimentais e quanto aos serviços de envio de encomendas postais, atendendo à situação epidemiológica provocada pelo coronavírus SARS-CoV-2 e à doença COVID-19. Assim, e nos termos do seu artigo 2.º previu-se o seguinte regime excecional “1 - Fica suspensa a recolha da assinatura na entrega de correio registado e encomendas até à cessação da situação excecional de prevenção, contenção, mitigação e tratamento da infeção epidemiológica por SARS-CoV-2 e da doença COVID-19. 2 - A recolha da assinatura é substituída pela identificação verbal e recolha do número do cartão de cidadão, ou de qualquer outro meio idóneo de identificação, mediante a respetiva apresentação e aposição da data em que a recolha foi efetuada.3 - Em caso de recusa de apresentação e fornecimento dos dados referidos no número anterior, o distribuidor do serviço postal lavra nota do incidente na carta ou aviso de receção e devolve-o à entidade remetente. 4 - Nos casos previstos no número anterior, e qualquer que seja o processo ou procedimento, o ato de certificação da ocorrência vale como notificação, consoante os casos. 5 - Sem prejuízo do disposto no número anterior, as citações e notificações realizadas através de remessa de carta registada com aviso de receção consideram-se efetuadas na data em que for recolhido o número de cartão de cidadão, ou de qualquer outro meio legal de identificação. 6 - O disposto neste artigo aplica-se, com as necessárias adaptações, às citações e notificações que sejam realizadas por contacto pessoal. No caso dos autos, resultou provado que o aviso de receção dos autos tem aposto que se tratou de uma altura de contingência (19.10.2021), tendo o nome de BB e estando aí aposto o n.º de BI ou documento oficial. Assim, foi recolhido o n.º de documento legal de identificação de pessoa a quem o aviso de receção foi entregue bem como ficou aposto o seu nome, pelo que, nos termos do aludido regime excecional se tem a notificação por feita. Há assim que ter o arguido por notificado a terceira pessoa, sendo a notificação regular, apenas tendo o referido como consequência o facto de o arguido apenas se ter por notificado no terceiro dia útil subsequente face ao previsto no art. 179.º, n.º9 al. a) in fine do Código da Estrada. Se bem virmos, das conclusões da impugnação judicial (que balizam as questões a conhecer) não vem impugnada a matéria factual (antes se arguindo a nulidade quanto à falta de indicação da velocidade concreta e a nulidade da notificação do auto de notícia). Ainda assim, dir-se-á que o arguido arguiu a nulidade do auto de notícia na base da decisão e bem assim da notificação desse mesmo auto porque se aludem a duas velocidades: uma velocidade “registada” e outra em que se afirma que circulava “pelo menos” a outra velocidade, afirmando que desta forma não sabe a velocidade concreta imputada. Ora, o arguido vem requerer que se produza como prova documental aa junção pela ANRS do comprovativo de que o radar identificado no auto foi sujeito às obrigações destinadas a aferir da manutenção da fiabilidade, incluindo verificações periódicas. Ora, como referido, nenhum momento das conclusões (que balizam o objeto do recurso a apreciar) coloca em causa as verificações do radar ou a correção da velocidade registada (o que coloca em causa é a notificação de um auto que alude a duas velocidades: uma velocidade “registada” e outra em que se afirma que circulava “pelo menos” a outra velocidade, afirmando que assim não sabe a velocidade concreta imputada), sendo que mesmo que assim não fosse se mostra junto aos autos o certificado de verificação de fls. 4. No que concerne a registo fotográfico ou de vídeo comprovativo da deteção da infração apontada nos autos, em que seja visível o veículo e a velocidade a que seguia, mostra-se já junto a fls. 3 e 5 verso dos presentes autos (registo fotográfico). O arguido requer ainda, quanto à arguição da notificação do auto de notícia “cópia do registo de expedição para efeitos de notificação do auto de contraordenação ao arguido assim como AR devidamente assinado pelo arguido”. Ora, a fls. 6 dos autos consta cópia do Aviso de receção respeitante à notificação do auto de contraordenação (sendo esse e não o registo de expedição a prova documental relevante para aferir da regularidade da notificação). Assim, no que não se mostra já junto aos autos a prova documental requerida é impertinente e/ou irrelevante, não a cumprindo produzir (sendo que, como vimos o que verdadeiramente vinha arguido em conclusões era a nulidade conhecida supra). b) Da eventual nulidade da própria decisão administrativa O arguido refere ainda que o ponto 1 da decisão é igualmente omisso nessas mesmas circunstâncias fácticas quanto à indicação precisa da velocidade, o que gera a nulidade da decisão. Referia-se nesse ponto 1 (factualidade objetiva) o seguinte: É inequívoco que existe um dever de fundamentação da decisão administrativa que sancione alguém pela prática de um ilícito contraordenacional.     De um ponto de vista constitucional, a fundamentação das decisões é, desde logo, um imperativo que decorre do art. 205.º, n.º 1 da Constituição da República Portuguesa.     O RGCO estatui, no seu art. 58.º, sob a epígrafe “decisão condenatória” que: “1 - A decisão que aplica a coima ou as sanções acessórias deve conter: a) A identificação dos arguidos; b) A descrição dos factos imputados, com indicação das provas obtidas; c) A indicação das normas segundo as quais se pune e a fundamentação da decisão; d) A coima e as sanções acessórias. 2 - Da decisão deve ainda constar a informação de que: a) A condenação se torna definitiva e exequível se não for judicialmente impugnada nos termos do artigo 59.º; b) Em caso de impugnação judicial, o tribunal pode decidir mediante audiência ou, caso o arguido e o Ministério Público não se oponham, mediante simples despacho. 3 – A decisão conterá ainda: a) A ordem de pagamento da coima no prazo máximo de 10 dias após o carácter definitivo ou o trânsito em julgado da decisão; b) A indicação de que em caso de impossibilidade de pagamento tempestivo deve comunicar o facto por escrito à autoridade que aplicou a coima”. Por outro lado, até no próprio regime sectorial do Código da Estrada temos norma especial a que atender. Com efeito, dispõe o art. 181.º do Cód. da Estrada que: “1 - A decisão que aplica a coima ou a sanção acessória deve conter: a) A identificação do infrator; b) A descrição sumária dos factos, das provas e das circunstâncias relevantes para a decisão; c) A indicação das normas violadas; d) A coima e a sanção acessória; e) A condenação em custas. 2 - Da decisão deve ainda constar que: a) A condenação se torna definitiva e exequível se não for judicialmente impugnada por escrito, constando de alegações e conclusões, no prazo de 15 dias úteis após o seu conhecimento e junto da autoridade administrativa que aplicou a coima; b) Em caso de impugnação judicial, o tribunal pode decidir mediante audiência ou, caso o arguido e o Ministério Público não se oponham, mediante simples despacho. 3 - A decisão deve conter ainda: a) A ordem de pagamento da coima e das custas no prazo máximo de 15 dias úteis após a decisão se tornar definitiva; b) A indicação de que, no prazo referido na alínea anterior, pode requerer o pagamento da coima em prestações, nos termos do disposto no artigo 183.º 4 - Não tendo o arguido exercido o direito de defesa, a fundamentação a que se refere a alínea b) do n.º 1 pode ser feita por simples remissão para o auto de notícia. Alinhadas as ideias básicas do tipo de fundamentação a nosso ver exigida pela decisão administrativa concreta, desçamos ao caso concreto e analisemos a mesma. Mais uma vez há aqui que reiterar o supra referido quanto à suficiente concretização quanto à velocidade a que o arguido conduzia: está corretamente descrito factualmente que o que a infração que estava imputada neste procedimento contraordenacional era a de conduzir a pelo menos 72 km/h em local onde a velocidade permitida era de 50 km/h. Há a concretização necessária dos factos da infração já que o que está em causa é uma velocidade registada em radar de 77 km/h e que após dedução da margem de erro legalmente imposta resulta numa velocidade mínima a que conduziu de 72 Km. Não há pois que afirmar a nulidade invocada, sendo improcedente a sua arguição. IV. Decisão: Nos termos e fundamento expostos decide-se não conceder provimento ao recurso de contraordenação, impugnar judicialmente a decisão administrativa que condenou AA, pela prática de uma contraordenação prevista e sancionável nos termos do disposto nos arts. 27.º, n.º1, 136.º, 138.º e 145.º, al. b), 147.º todos do Código da Estrada e sancionou a arguida numa coima de €180,00 (cento e oitenta euros) e e numa sanção acessória de proibição de conduzir por 75 (setenta e cinco) dias, mantendo-se assim a decisão administrativa recorrida e sanções aplicadas. * Custas pelo recorrente, com taxa de justiça que se fixa em 2 U.C. (arts. 93.º e 94.º do RGCO e art. 8.º, n.º9 do RGCO). * Com cópia da presente decisão, comunique-a à autoridade administrativa (cfr. artigo 70.º, n.º 4, do R.G.C.O..) * Deposite e Notifique».             3. – Apreciação do recurso                         3.1 - Prescrição do procedimento contraordenacional.             Alega o recorrente, em suma, que tendo decorrido mais de 3 (três) anos sobre a data – 15.09.2021 – da prática da alegada infração, atento o disposto no artigo 28º, n.º 3, do RGC, o presente procedimento contraordenacional está prescrito.             Vejamos.             Dispõe o artigo 188º do Código da Estrada, sob a epígrafe prescrição do procedimento:             “1 - O procedimento por contraordenação rodoviária extingue-se por efeito da prescrição logo que, sobre a prática da contraordenação, tenham decorrido dois anos.             2 - Sem prejuízo da aplicação do regime de suspensão e de interrupção previsto no regime geral do ilícito de mera ordenação social, a prescrição do procedimento por contraordenação rodoviária interrompe-se também com a notificação ao arguido da decisão condenatória.”             Como sobressai de forma cristalina, o n.º 2 do artigo 188º do Código da Estrada remete, expressamente, quanto a causas de interrupção e de suspensão do procedimento contraordenacional, para o disposto no RGC, especificamente previstas nos artigos 27º-A e 28º, respetivamente.             A interrupção da prescrição tem como efeito a inutilização do prazo que se iniciou com a prática da infração, começando a correr um novo prazo de prescrição no dia em que se produz o ato interruptivo; já a suspensão da prescrição não inutiliza o prazo que estava em curso até à ocorrência de uma causa de suspensão; neste caso, o prazo deixa de correr durante o período fixado ou até ao desaparecimento do obstáculo legalmente previsto, voltando a partir daí a correr[3]. Conforme consta do acórdão de Fixação de Jurisprudência do STJ n.º 4/2011[4], a suspensão da prescrição impede o decurso do prazo da prescrição; significa que, consoante as causas, se paralisam o começo e o decurso do prazo de prescrição. No que respeita à suspensão do prazo de prescrição do procedimento, estatui o artigo 27º-A do RGC: “1 - A prescrição do procedimento por contra-ordenação suspende-se, para além dos casos especialmente previstos na lei, durante o tempo em que o procedimento: a) Não puder legalmente iniciar-se ou continuar por falta de autorização legal; b) Estiver pendente a partir do envio do processo ao Ministério Público até à sua devolução à autoridade administrativa, nos termos do artigo 40.º; c) Estiver pendente a partir da notificação do despacho que procede ao exame preliminar do recurso da decisão da autoridade administrativa que aplica a coima, até à decisão final do recurso. 2 - Nos casos previstos nas alíneas b) e c) do número anterior, a suspensão não pode ultrapassar seis meses.” Relativamente à interrupção da prescrição, estabelece o artigo 28º do RGC: “1 - A prescrição do procedimento por contraordenação interrompe-se: a) Com a comunicação ao arguido dos despachos, decisões ou medidas contra ele tomados ou com qualquer notificação; b) Com a realização de quaisquer diligências de prova, designadamente exames e buscas, ou com o pedido de auxílio às autoridades policiais ou a qualquer autoridade administrativa; c) Com a notificação ao arguido para exercício do direito de audição ou com as declarações por ele prestadas no exercício desse direito; d) Com a decisão da autoridade administrativa que procede à aplicação da coima. 2 - Nos casos de concurso de infrações, a interrupção da prescrição do procedimento criminal determina a interrupção da prescrição do procedimento por contraordenação. 3 - A prescrição do procedimento tem sempre lugar quando, desde o seu início e ressalvado o tempo de suspensão, tiver decorrido o prazo da prescrição acrescido de metade.”             Assim, por força do estatuído no n.º 3 do artigo 28º do RGC, «nas contra-ordenações rodoviárias, a prescrição do procedimento terá sempre lugar decorridos que sejam [2 anos (prazo normal) + 1 ano (metade do prazo normal) + 6 meses (prazo de suspensão)] 3 anos e 6 meses sobre a data da prática da contra-ordenação»[5].                         Ora, compulsados os autos, constata-se que os factos em causa remontam a 15.09.2021 (cfr. auto de contraordenação, a fls. 1), pelo que, de acordo com o disposto no artigo 27º do RGC, o prazo de prescrição começou a correr a partir de tal data.             Sucede, porém, que o ora recorrente foi notificado para o exercício do direito de audição em 22.10.2021 (cfr. aviso de receção de fls. 6 e razões aduzidas a este respeito na sentença, que aqui damos por reproduzidas), a decisão administrativa foi proferida em 15.07.2022, tendo-lhe sido notificada em 04.11.2022 (cfr. aviso de receção de fls. 14), tendo, ainda, sido notificado do despacho que admitiu o recurso de impugnação judicial em 14.06.2024 (cfr. aviso de receção a fls. 39) – causas de interrupção do procedimento contraordenacional previstas no artigo 188º, n.º 2, do Código da Estrada e artigo 28º, n.º 1, als. b) e c), do RGC – tendo começado a correr novo prazo de prescrição de 2 (dois) anos a partir de cada uma daquelas datas, terminando, pois, o último em 14.06.2026.             Todavia, a partir da sobredita notificação, em 14.06.2024, do despacho que admitiu o recurso de impugnação judicial até à decisão final [que ainda não ocorreu porquanto foi interposto o presente recurso da decisão judicial que sobre aquela recaiu] ocorre, igualmente, causa de suspensão, com o limite máximo de 6 meses [cfr. artigo 27º, n.º 1, al. c), e n.º 2, do RGC], pelo que para efeito do n.º 3 do artigo 28º o prazo máximo de prescrição atingir-se-á em 15.03.2025.             Ante o exposto, conclui-se pela improcedência da questão relativa ao procedimento contraordenacional.             3.2 – Nulidade do auto de contraordenação, da decisão administrativa e da decisão judicial, por omissão de cabal descrição factual.             Em apertada síntese, o recorrente alega que o auto de contraordenação padece de “nulidade insanável”, porque nele não se mencionam, com a exatidão e o rigor exigidos pelo artigo 170º do Código da Estrada, os factos que constituem a infração, mas também as circunstâncias em que foi cometida – concretamente, a real e efetiva velocidade a que circulava o veículo que conduzia e por qual das velocidades está a ser punido –, estando a decisão administrativa  sustentada com base nos factos naquele contidos e a decisão do tribunal a quo que confirmou aquela contaminadas por aquela nulidade, “inquinando todo o processo contraordenacional de nulidade” e, consequentemente, conclui, deve ser revogada a decisão administrativa e ordenado o arquivamento dos presentes autos.             No essencial, o recorrente invoca a nulidade do auto de contraordenação e, por arrastamento, a decisão administrativa, a decisão recorrida e, até, todo o processo contraordenacional.             Vejamos.             O artigo 170º do Código da Estrada define o conteúdo obrigatório do auto de notícia e de denúncia nos seguintes moldes:             “1 - Quando qualquer autoridade ou agente de autoridade, no exercício das suas funções de fiscalização, presenciar contraordenação rodoviária, levanta ou manda levantar auto de notícia, o qual deve mencionar:             a) Os factos que constituem a infração, o dia, a hora, o local e as circunstâncias em que foi cometida, o nome e a qualidade da autoridade ou agente de autoridade que a presenciou, a identificação dos agentes da infração e, quando possível, de, pelo menos, uma testemunha que possa depor sobre os factos;             b) O valor registado e o valor apurado após dedução do erro máximo admissível previsto no regulamento de controlo metrológico dos métodos e instrumentos de medição, quando exista, prevalecendo o valor apurado, quando a infração for aferida por aparelhos ou instrumentos devidamente aprovados nos termos legais e regulamentares.             2 - O auto de notícia é assinado pela autoridade ou agente de autoridade que o levantou ou mandou levantar e, quando for possível, pelas testemunhas.             3 - O auto de notícia levantado e assinado nos termos dos números anteriores faz fé sobre os factos presenciados pelo autuante, até prova em contrário.             4 - O disposto no número anterior aplica-se aos elementos de prova obtidos através de aparelhos ou instrumentos aprovados nos termos legais e regulamentares.             5 - A autoridade ou agente de autoridade que tiver notícia, por denúncia ou conhecimento próprio, de contraordenação que deva conhecer levanta auto, a que é correspondentemente aplicável o disposto nos n.ºs 1 e 2, com as necessárias adaptações.” E, nos termos do artigo 175º, n.º 1, do mesmo diploma: “1 - Após o levantamento do auto, o arguido deve ser notificado: a) Dos factos constitutivos da infração; b) Da legislação infringida e da que sanciona os factos; c) Das sanções aplicáveis; d) Do prazo concedido e do local para a apresentação da defesa, bem como do prazo e local para apresentação do requerimento para atenuação especial ou suspensão da sanção acessória; e) Da possibilidade de pagamento voluntário da coima pelo mínimo nos termos e com os efeitos estabelecidos no artigo 172.º, da possibilidade de prestação de depósito nos termos e efeitos referidos do artigo 173.º, do prazo e do modo de o efetuar, bem como das consequências do não pagamento; f) Da possibilidade de requerer o pagamento da coima em prestações, no local e prazo indicados para a apresentação da defesa; g) Do prazo para identificação do autor da infração, nos termos e com os efeitos previstos nos n.ºs 3 e 5 do artigo 171.º”. Os sobreditos requisitos visam, fundamentalmente, a salvaguarda da possibilidade de o arguido exercer efetivamente os seus direitos de defesa, o que só poderá suceder com o conhecimento perfeito dos factos que lhe são imputados, das normas legais em que se enquadram e condições em que pode impugnar judicialmente aquela decisão[6]. Ora, no caso vertente, do auto de contraordenação elaborado em 15.09.2021, de que o recorrente foi regularmente notificado, após a indicação das circunstâncias de tempo e lugar, da identificação do arguido e do veículo, consta na parte da “Descrição sumária”: “O referido veículo circulava, dentro da localidade, pelo menos, à velocidade de 72 Km/hora, correspondendo velocidade registada de 77 Km/hora, deduzida a margem de erro legalmente prevista, sendo o limite máximo de velocidade permitida no local, de 50 Km/hora. A velocidade foi verificada através do equipamento MULTANOVA MUVR-6FD, nº 2627, aprovado pelo IPQ (Aprovação modelo nº 111.20.18.34.3, de 28-03-2019), e aprovada para uso pelo Despacho nº. 5121/2019, da ASNR, de 26ABR, com verificação periódica IPQ em 06/05/2021”, concluindo-se com a indicação das normas jurídicas infringidas e das sanções correspondentes. Como sobressai de forma cristalina da análise do auto de contraordenação, em cumprimento do exigido pela al. b), do n.º 1, do artigo 170º do Código da Estrada, consta expressamente daquele o valor registado – 77 Km/h – da velocidade de circulação do mencionado veículo, bem como o valor apurado – 72 Km/h – após dedução do erro máximo admissível previsto no regulamento de controlo metrológico dos métodos e instrumentos de medição, prevalecendo o valor apurado, quando a infração for aferida por aparelhos ou instrumentos devidamente aprovados nos termos legais e regulamentares, como é o caso e dali também consta. Questiona o recorrente «onde está o critério e cálculo aritmético / razão de ciência / determinação legal que explique qual/quais as margens de erro legais a aplicar» e «se no caso dos presentes autos existia regulamento de controlo metrológico dos métodos e instrumentos de medição». Ora, a resposta a esta questão resulta diretamente da lei – à data dos factos em apreço [15.09.2021] estava em vigor a Portaria n.º 1542/2007, de 06/12[7], que aprovou o Regulamento do controlo metrológico dos cinemómetros, aplicável aos instrumentos de medição da velocidade instantânea e dos dispositivos complementares associados para registar os resultados das medições [cfr. artigo 1.º]. Concretamente, os valores dos erros máximos admissíveis (EMA), variáveis em função da velocidade e do tipo de cinemómetro [cfr. artigo 8º], eram definidos nos termos do quadro que figura como Anexo à referida Portaria. Assim, de acordo com o referido quadro, no caso concreto dos autos, tratando-se de radar móvel – pois, conquanto não tal não seja referido expressamente no auto, nem no expediente anexo a este, os factos foram presenciados pelo agente de autoridade autuante –, e tendo o equipamento MULTANOVA MUVR-6FD, nº 262 (Aprovação modelo nº 111.20.18.34.3, de 28-03-2019) sido alvo de verificação periódica IPQ em 06/05/2021, considerando a velocidade registada de 77Km/hora [<100km/h], o erro máximo admissível (EMA) corresponde a 7 Km/hora, e não a 5 km/h – prevista para o caso de se tratar de equipamento com a primeira verificação – como consta do auto de contraordenação, pelo que a velocidade apurada, a que o arguido conduzia o mencionado veículo, era de 70km/hora, e não 72km/hora como consta do mesmo auto. Conclui-se, assim, que o auto de contraordenação preenche os requisitos de descrição factual exigidos pela lei, mas que aquele padece de lapso na determinação da margem de erro legalmente prevista aplicável in casu que ali se fez constar, com significativa repercussão na caraterização da contraordenação, como infra melhor veremos. Não obstante, nem no Código da Estrada, nem no Regime Geral das Contraordenações, se comina a ausência ou, sequer, a deficiência da menção dos preditos elementos no auto de contraordenação de nulidade. Como decorrência, improcede a invocada nulidade do auto de contra ordenação, bem como da decisão administrativa e da decisão judicial que o recorrente também convocava como consequência daquela. Todavia, aqui chegados cumpre relembrar que, como se assinalou supra, no âmbito do recurso que tenha por objeto decisão da 1.ª instância sobre impugnação judicial de decisão administrativa em matéria contraordenacional, o Tribunal da Relação funciona como tribunal de revista ampliada, podendo alterar a decisão do tribunal recorrido sem qualquer vinculação aos termos e ao sentido em que foi proferida. Ora, mercê do apontado erro máximo admissível aplicável no caso concreto, a velocidade a considerar passa a ser de 70 km/h, o que significa que o excesso de velocidade relativamente ao limite máximo de 50 km/h que vigora para a circulação de automóvel ligeiro como o conduzido pelo recorrente dentro de localidade não é superior a 20 km/h.  Assim sendo, a conduta do recorrente não integra a contra ordenação grave prevista no artigo 145º, n.º 1, al. c), do Código da Estrada, mas antes a contra ordenação leve prevista e punível pelas disposições conjugadas dos artigos 27º, n.ºs 1 e 2, al. a), 1.º, e 28º, n.º 5, do mesmo diploma. Tal contra ordenação leve é sancionada apenas com coima de 60 € a 300 €, não havendo lugar a sanção acessória de inibição de conduzir [cfr. artigos 136º, n.ºs 1 e 2, e 147º, ambos do Código da Estrada]. Sendo punível em termos substancialmente menos gravosos, a alteração da qualificação jurídica ora operada em nada prejudica o recorrente, quer quanto ao exercício dos seus direitos de defesa, quer em termos de resultado final, maxime, no que tange ao valor da coima a aplicar-lhe, sendo certo que, no recurso, o mesmo tentou evidenciar que se o erro máximo admissível fosse superior teria como consequência a qualificação da contraordenação como leve e a ausência de aplicação de sanção acessória [cfr. ponto 26º da motivação de recurso]. Assim sendo, ainda que implicitamente, o recorrente pugnou pela qualificação jurídica da conduta em apreciação como contraordenação leve e, como tal, não se justifica efetuar a comunicação da sobredita alteração – que, de resto, lhe é francamente mais favorável –, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 424º, n.º 3, do Código de Processo Penal. Posto isto, importa proceder à fixação do montante da coima a aplicar. Nos termos do artigo 139º, n.º 2, do Código da Estrada, nesse âmbito, “deve atender-se à gravidade da contraordenação e da culpa, tendo em conta os antecedentes do infrator relativamente ao diploma legal infringido ou aos seus regulamentos, e a situação económica do infrator, quando for conhecida”. Considerando que o excesso de velocidade é elevadíssimo [de 20 km/h], estando no limiar entre a contraordenação leve e a contra ordenação grave, que o recorrente atuou de forma negligente e que tem averbado no seu registo de condutor duas contra ordenações graves – autos n.ºs ...14 e ...72 – e desconhecendo-se qual a sua concreta situação económica, afigura-se-nos ajustada a coima de 100 € [cem euros]. *             III. – DISPOSITIVO Nos termos e pelos fundamentos supra expostos, acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Coimbra em revogar a decisão judicial recorrida na parte em que confirmou a decisão administrativa mediante a qual foi o recorrente condenado pela prática da contraordenação grave ali descrita, condenando-o, antes, pela prática da contra ordenação leve prevista e punível pelas disposições conjugadas dos artigos 27º, n.ºs 1 e 2, al. a), 1.º, e 28º, n.º 5, do Código da Estrada, na coima de 100,00 € (cem euros).             Não é devida tributação. *             Notifique [artigo 425º, n.º 6, do Código de Processo Penal]. * * (Elaborado e revisto pela relatora, sendo assinado eletronicamente pelos signatários – artigo 94º, n.ºs 2 e 3, do Código de Processo Penal) * Coimbra, 05 de fevereiro de 2025  Isabel Gaio Ferreira de Castro [Relatora] Teresa Coimbra  [1.ª Adjunta] João Abrunhosa  [2.º Adjunto] [1] Publicado no Diário da República, I.ª Série, de 02.07.2019 [2] Neste sentido, vejam-se, entre outros, os acórdãos do Tribunal da Relação de Évora, de 05.04.2022, e deste Tribunal da Relação de Coimbra de 14.05.2013, disponíveis para consulta no sítio da internet http://www.dgsi.pt [3] Cfr. acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 21.02.2018, disponível para consulta no sítio da internet http://www.dgsi.pt [4] Publicado no D.R. I Série, nº 30, de 11 de fevereiro de 2011. [5] Cfr. o acórdão deste Tribunal da Relação de Coimbra de 21.02.2018, acessível em http://www.dgsi.pt [6] Vide Manuel Simas Santos e Jorge Lopes de Sousa, “Contra-Ordenações – Anotações ao Regime Geral das Contra Ordenações e Coimas”, 2.ª edição de Janeiro de 2003, Vislis Editores, p. 334, e o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 20.01.2007, processo n.º 06P3202, Henriques Gaspar [7] Entretanto revogada pela Portaria n.º 358/2023, de 14 de novembro, atualmente em vigor