SUSPENSÃO PROVISÓRIA DO PROCESSO
INCUMPRIMENTO DE INJUNÇÃO
NATUREZA JURÍDICA DAS INJUNÇÕES
DESCONTO
Sumário

I. A suspensão provisória do processo constitui um mecanismo de diversão processual, aplicável à criminalidade de baixa intensidade, que assenta num consenso entre o arguido e o Ministério Público (verificadas as condições previstas no §1.º do artigo 281.º CPP), pelo qual se afasta o arguido da fase judicial do processo penal, sendo nesse contexto as injunções fixadas meras medidas processuais, conforme deflui das normas contidas nos artigos 281.º e 282.º CPP.
II. O acordo firmado na suspensão provisória do processo não corresponde a uma condenação; nem as injunções fixadas a penas (apenas a medidas de diversão processual).
III. Havendo incumprimento de alguma das injunções consensualizadas, o Ministério Público, tem o dever de ouvir o arguido. Não apenas por se preconizar decisão que contende contra os interesses deste, mas também (ou mesmo sobretudo) para não restarem dúvidas quanto à culpa no malogro do consenso.
IV. Em caso de incumprimento e prosseguimento dos autos para julgamento, a parte da injunção cumprida, de não conduzir veículos automóveis durante um certo período, não se desconta na pena acessória de proibição de conduzir veículos aplicada na sentença.

Texto Integral

I – Relatório
a. No 1.º Juízo1 Local Criminal de … procedeu-se a julgamento em processo comum de AA, nascido a …1953, com os demais sinais dos autos, a quem foi imputada a autoria, na forma consumada, de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, previsto nos artigos 292.º, § 1.º do Código Penal (CP), com referência ao artigo 69.º, § 1.º al. a) do mesmo código.

Teve lugar a audiência e a final o Tribunal proferiu sentença, na qual condenou o arguido como autor de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, previsto nos artigos 292.º, § 1.º e 69.º, § 1.º al. a) CP, na pena de 60 dias de multa à razão diária de 5€ e na pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados por 3 meses e 20 dias.

b. Inconformado recorre o arguido, pretendendo2:

1. Se declare a nulidade insanável decorrente do facto de o MP não o ter convocado antes de proceder à revogação da suspensão provisória do processo (artigos 55.º, 56.º, 57.º, 119.º, al. c) CP e 492.º a 495.º/2 CPP);

2. Deverá considerar-se provado que no âmbito da referida suspensão provisória do processo, na qual foi fixada a injunção de inibição de condução de veículos, a mesma foi integralmente cumprida (entregou carta no dia 3mar2023 e recuperou-a no dia 20set2023);

3. Devendo descontar-se à pena acessória aplicada (artigos 69.º, 80.º e 81. CP e 29/5 da Constituição;

4. A medida fixada à pena de multa é excessiva, devendo fixar-se em 10 dias, à razão diária de 5€ (artigo 47.º e 71.º CP).

c. Admitido o recurso o Ministério Público respondeu, considerando, no essencial:

- não verificar a alegada nulidade, porquanto o arguido não aproveitou a oportunidade que pare ele constituiu a suspensão provisória do processo;

- contrariamente ao alegado, foi-lhe dada oportunidade de se pronunciar sobre o incumprimento de uma das injunções fixada na suspensão provisória do processo;

- conforme decidiu o STJ no AUJ 4/2017, o tempo da injunção de inibição de conduzir aplicada no âmbito da suspensão provisória do processo não se desconta na pena, se aquele regime vier a ser revogado e vier a verificar-se a condenação na pena acessória de proibição de conduzir:

- a apena aplicada na sentença é justa, adequada e proporcional.

d. Nesta Relação o Ministério Público secundou integralmente o vertido na resposta dada ao recurso junto do Juízo de 1.ª instância; e como nada havia a responder foi isso que o arguido «respondeu», no escrito de contraditório que dirigiu a este Tribunal.

e. Os autos foram aos vistos e à conferência, nesta tendo ficado vencido o relator sorteado3, assumindo em tal circunstância o 1.º adjunto o relato da posição que fez vencimento.

Cumpre apreciar e decidir.

II – Fundamentação

A. As questões que o recurso do arguido coloca ao conhecimento deste Tribunal são as seguintes:

i) Nulidade insanável por preterição de audição ao arguido antes de se proceder à revogação da suspensão provisória do processo; ii. Desconto na pena aplicada da injunção de inibição de conduzir veículos automóveis constante da suspensão provisória do processo (ne bis in idem); iii) Proporcionalidade das penas aplicadas na sentença.

B. Da matéria de facto constante da sentença recorrida

O Tribunal recorrido considerou provados os seguintes factos:

«1. No dia 2-2-2023, pelas 15h49, o arguido conduzia o veículo ligeiro de passageiros, de matrícula …, no Caminho Municipal … em ….

2. O arguido conduzia a mencionada viatura apresentando uma Taxa de Álcool no Sangue (TAS) de pelo menos 1,665 gr/l.

3. O arguido sabia que tinha ingerido bebidas alcoólicas e tinha noção que a sua TAS era igual ou superior a 1,2 g/l, e quis conduzir o veículo nessas condições, bem sabendo que o seu estado não lhe permitia efetuar uma condução cuidada e prudente devido a ingestão de álcool.

4. Agiu livre, deliberada e conscientemente, bem sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei.

5. O arguido confessou de forma integral, livre e sem reservas todos os factos supra descritos, relativamente aos quais demonstrou arrependimento.

6. O arguido nasceu no dia …1953, declarou estar divorciado e estar reformado, auferindo uma pensão de reforma no valor de €506,00 [quinhentos e seis euros].

7. O arguido tem uma filha maior de idade, com … anos de idade, a qual não se encontra a seu cargo.

8. O arguido frequentou a escola até ao 3.º ano.

9. Vive em casa de um amigo, não contribuindo com dinheiro para as despesas relativas à habitação, mas antes contribuindo com o seu trabalho, quando lhe é solicitado.

10. O arguido não regista condenações anteriores no âmbito de contraordenações estradais.

11. O arguido não sofreu condenações anteriores no âmbito de processos criminais.»

Mais evidenciam relevantemente os autos que em momento anterior à acusação, o Ministério Público com a concordância do arguido (e a não oposição do Juiz de Instrução Criminal), procedeu nos termos previstos no artigo 282.º CPP à suspensão provisória do processo, por um período de seis meses, com a condição de nesse mesmo prazo o arguido cumprir as seguintes injunções:

«a) Entregar a quantia de 650€ aos Bombeiros Voluntários de …, fazendo prova nos autos dessa entrega;

b) Frequentar e cumprir o programa TAXA.ZERO ministrado pela DGRSP, no período da suspensão;

c) Entrega da carta de condução nestes Serviços até 10 (dez) dias após a comunicação da suspensão provisória do processo, a qual ficará nos Serviços durante 4 (quatro meses), período durante o qual (de quatro meses) o arguido fica proibido de conduzir veículos a motor na via pública;»

E ainda que a 18/1/2024 o MP ordenou a notificação do arguido para «esclarecer porque é que não fez o pagamento aos Bombeiros Voluntários de ….»

Tendo a GNR no dia 31/1/2024 certificado ter realizado a notificação pessoal respetiva ao arguido.

Nessa sequência, em razão de não ter chegado resposta aos autos, o Ministério Público decidiu, a 4/3/2024, que:

em razão de o arguido não ter cumprido «na totalidade, as injunções que lhe foram impostas, o Ministério Público vai deduzir acusação em Processo Comum e com intervenção do Tribunal Singular».

Tendo elaborado o respetivo libelo nessa mesma data.

Só através de requerimento datado de 15/8/2024 o arguido veio aos autos informar que «não procedeu ao pagamento aos Bombeiros Voluntários de …» porque «tem uma reforma anual de 6 592,67€ conforme se verifica do doc. 1 e 2 Anexo.»

C. Apreciando

C.1 Da nulidade por preterição de audição do arguido

Cabe em primeiro lugar referir que as injunções fixadas na Suspensão Provisória do Processo foram concertadas ou pelo menos aceites pelo arguido, sem o que tal suspensão não seria possível. E depois lembrar, que não é correto afirmar que o Ministério Público não procurou ouvir o arguido relativamente ao incumprimento de uma das injunções! Precisemos. A suspensão provisória do processo constitui um mecanismo de diversão processual, aplicável à criminalidade de baixa intensidade, que assenta num consenso entre o arguido e o Ministério Público4 (verificadas as condições previstas no §1.º do artigo 281.º CPP), pelo qual se afasta o arguido da fase judicial do processo penal, sendo nesse contexto as injunções fixadas meras medidas processuais, conforme deflui das normas contidas nos artigos 281.º e 282.º CPP. Não são penas. Nem podem com estas confundir-se. Tanto assim que conforme bem lembra José Faria Costa, a diversão ou desjudicialização que este mecanismo integra, traduz-se na «tentativa de solução do conflito jurídico-penal fora do processo normal da justiça penal: isto é, de um modo desviado, divertido, face àquele procedimento» que ocorre «antes da determinação ou declaração da culpa, ou antes da determinação da pena»5.

E é justamente por ser esta a natureza do referido instituto jurídico-processual, que carece de sentido tratá-lo como se fora um procedimento judicial e aplicar-lhe (ainda que apenas subsidiariamente) – como reclama o recorrente - o regime das penas (artigos 55.º e 36.º CP e 495.º CPP)! O princípio do contraditório afirmado no artigo 32.º, § 5.º da Constituição tem em vista o processo penal em sentido estrito – o processo judicial. Não deixando, contudo, de haver dimensões desse princípio aplicáveis logo na fase preliminar do processo penal (no inquérito), pelo menos lá quando não vigore o regime do segredo. E é o que sucede no âmbito da suspensão provisória do processo. Daí que considerando-se haver incumprimento das injunções consensualizadas, o Ministério Público, tem o dever de ouvir o arguido. Não apenas por se preconizar decisão que contende contra os interesses deste, mas também (diríamos mesmo «sobretudo») para não restarem dúvidas quanto à culpa no malogro do consenso6. Só depois disso poderá o processo seguir para as suas fases judiciais (de instrução e/ou de julgamento). Mas como deixámos dito, o contraditório foi neste caso regularmente exercido. O arguido optou por não o fazer. Tendo resolvido pronunciar-se sobre o incumprimento das injunções quando já estava deduzida acusação e, portanto, encerrada a fase do consenso. Não se verifica, por isso, nenhuma nulidade (seja a prevista no artigo 119.º, al. c) ou a prevista no artigo 120.º, § 3.º, al. d) CPP).

Consideramos também não haver nulidade da sentença (artigo 379.º, § 1.º. al. c) CPP), pelo facto de o juiz na fase de julgamento, depois de dar conhecimento ao Ministério Público de expediente cuja junção aos autos se requereu a 15/8/2024 (contendo escrito que alegadamente teria sido dirigido ao Ministério Público na fase de inquérito), depois de este ter declarado nada opor à requerida junção, não se ter pronunciado expressamente sobre o teor de tal escrito - alegadamente dirigido ao Ministério Público na fase de inquérito! Atentemos. A ter havido resposta ao contraditório encetado sem que o Ministério Público dele fizesse caso – como parece ser tese do arguido -, ao ser notificado da acusação, este poderia/deveria ter suscitado a irregularidade da sua dedução (artigo 123.º CPP) perante o Ministério Público. Mas não o fez. Daí que a existir tal irregularidade esta se convalidou na ordem jurídica. Anota-se, por fim, que terá sido exatamente deste modo que o assunto foi entendido pelo arguido. Porquanto não há rasto de tal questão na ata da audiência; nem se suscitou tal questão no recurso da sentença.

C.2 Do desconto na pena aplicada da injunção de inibição de conduzir veículos automóveis constante da suspensão provisória do processo (ne bis in idem)

Pretende o recorrente que tendo depositado a carta de condução nos serviços do Ministério Público de Faro a 3/3/2023 (para cumprimento da injunção que tal determinava) e recuperado a mesma a 20/9/2023, o período intermediário em que esteve privado da carta de condução deverá ser descontado na pena fixada na sentença.

O Ministério Público pronuncia-se em sentido contrário, para tanto lançando mão da interpretação fixada pelo Supremo Tribunal de Justiça no acórdão de fixação de jurisprudência n.º 4/2017, publicado no DR, I-A, 16/6/2017.

O recorrente não tem razão porque a lei rege exatamente no sentido oposto ao que preconiza, o que faz sem violação de nenhum direito fundamental do arguido.

Diz a lei (já o dizia na data em que o arguido cometeu o ilícito em referência) no § 4.º do artigo 282.º do CPP, que: «o processo prossegue e as prestações feitas não podem ser repetidas (…) se o arguido não cumprir as injunções e regras de conduta.»

Na sequência de divergências jurisprudenciais na interpretação desta norma, o Supremo Tribunal de Justiça, fixou jurisprudência obrigatória através do acórdão n.º 4/2017, clarificando as dúvidas que se suscitavam, nela fixando que: «Tendo sido acordada a suspensão provisória do processo, nos termos do artigo 281.º do Código de Processo Penal, com a injunção da proibição da condução de veículo automóvel, prevista no n.º 3 do preceito, caso aquela suspensão termine, prosseguindo o processo, ao abrigo do n.º 4, do art.º 282.º, do mesmo Código, o tempo em que o arguido esteve privado da carta de condução não deve ser descontado, no tempo da pena acessória de inibição da faculdade de conduzir, aplicada na sentença condenatória que venha a ter lugar.»

É, pois, inequívoca a sem razão do recorrente.

Acrescendo que, contrariamente ao também sustentado pelo recorrente, o normativo em referência não vulnera o princípio ne bis in idem, vertido no artigo 29.º, § 5.º da Constituição, não sendo, portanto, inconstitucional. Como é bom de ver, o acordo firmado na suspensão provisória do processo não corresponde a uma condenação, nem as injunções ali fixadas a penas (apenas a medidas de diversão processual). Não havendo, pois, uma condenação a sobrepor-se a outra; nem uma pena acessória a sobrepor-se a outra, porque antes da aplicada pela sentença ora sobre recurso não houve qualquer outra pena aplicada sobre os mesmos factos7.

Não havendo, pois, lugar a qualquer desconto a efetuar à pena acessória de proibição de conduzir fixada na sentença recorrida.

C.3 Da proporcionalidade das penas (principal e acessória)

O recorrente considera que a medida da pena de multa aplicada, bem assim como a duração fixada à pena acessória são excessivas, desajustadas dos princípios e regras que norteiam a determinação da medida das penas, vulnerando o preceituado nos artigos 47.º e 71.º CP. O Ministério Público, pelo contrário, considera as penas ajustadas às circunstâncias do caso.

Pois bem.

Importará começar por lembrar que as incriminações (os comportamentos proibidos e puníveis com penas criminais) visam tutelar os bens jurídicos mais relevantes da vida comunitária.

Na circunstância do ilícito previsto no artigo 292.º CP, tutela-se a segurança rodoviária (bem jurídico coletivo que reflexamente protege a vida, a integridade física e o património alheio).

Por sua vez, os parâmetros norteadores da escolha e medida das penas são essencialmente os seguintes:

a) A finalidade das penas é a de proteger bens jurídicos e reintegrar o agente na sociedade, não podendo a pena exceder a medida da culpa do infrator (artigo 40.º CP); b) Sendo o crime cometido punível alternativamente com pena de prisão ou com pena de multa, o tribunal deverá dar preferência a esta, desde que a mesma realize de forma adequada e suficiente as finalidades da punição (artigos 70.º e 40.º CP); c) No concernente à determinação da medida da pena, dentro dos limites definidos na lei, esta faz-se em função da culpa do agente e das exigências de prevenção (artigo 71.º do CP). Breve: dentre os limites fixados pela medida da culpa (que traça o máximo de pena) e pelas exigências (comunitárias) de prevenção geral (que fixam o mínimo da pena), são as necessidades de prevenção especial que determinam o quantum concreto da pena.

Feitas estas considerações acerca dos referentes normativos, aplicáveis à pena principal e à pena acessória, atentemos agora nas circunstâncias particulares do caso, gizando aferir se o resultado a que chegou o Juízo a quo no processo de escolha e determinação das penas concretas se ajusta aos princípios e regras ínsitos no referido enquadramento normativo.

Não sem antes recordar que os recursos não são segundos julgamentos da mesma causa, antes meios de correção de eventuais erros de procedimento ou de julgamento, que têm de ser demonstrados. A jurisprudência dos tribunais superiores vem sistematicamente lembrando isso mesmo: que «o tribunal ad quem não julga de novo, não determina a pena como se inexistisse uma decisão de primeira instância, e a sindicância dessa decisão (de primeira instância) pelo tribunal superior não abrange a fiscalização do quantum exato de pena que, decorrendo duma correta aplicação das regras legais e dos princípios legais e constitucionais, ainda se revele proporcionada. E não inclui a compressão da margem de apreciação livre reconhecida ao tribunal de primeira instância enquanto componente individual do ato de julgar. E a margem de liberdade do juiz de julgamento nos limites expostos, abrange todo o processo prático de decisão sobre a pena.»8 Volvamos aos princípios relativos à escolha e determinação das penas concretas. Primo – Sendo a pena principal de prisão ou de multa, o tribunal recorrido optou por esta, não divergindo da orientação preferencial dada no artigo 70.º CP, o que circunstancialmente se mostra ajustado, em razão da primariedade criminal do arguida da circunstância de se mostrar social, familiar e profissionalmente integrada. Secundo – A moldura da pena de multa prevista a título principal é de 10 a 120 dias (artigos 292.º, § 1.º e 47.º, § 1.º CP), tendo o Juízo a quo graduado em 60 dias à razão diária de 5€, isto é, fixando-a a meio da moldura abstrata da pena; mas em quantitativo diário encostado ao mínimo legal (artigo 47.º, § 2.º CP) – justamente pelas razões de natureza económica e social decorrente dos factos provados. Como se deixou referido a culpa limita o máximo da pena concreta, sendo depois as exigências de prevenção geral e as necessidades de prevenção especial que intervêm para determinar o quantum da pena (artigo 40.º, § 1.º e 2.º CP). Nas circunstâncias do caso presente a culpa é mediana, em razão da TAS registada, situada 1,665 g/l. Neste contexto importará referir a existência de vários estudos que vêm demostrando que o risco de acidente rodoviário aumenta exponencialmente com o aumento de álcool consumido. Por exemplo, Blomberg et al. (2005) concluem que: «comparativamente com condutores com TAS = 0,0 g/L, condutores com TAS de 0,50 g/L têm 1,4 vezes mais risco de ter um acidente, com TAS de 0,80 g/L o risco acrescido é de 2,7 vezes, com TAS de 1,20 g/L o risco acrescido é de 8,9 vezes e com TAS de 1,80 g/L o risco aumenta para 51 vezes.» 9 Sendo que «o risco de morrer na sequência de um acidente rodoviário é também mais elevado em condutores sob o efeito de álcool (ECORYS, 2014): condutores com TAS de 0,10-0,50 g/L têm uma probabilidade de 1 a 3 vezes superior de ter um acidente mortal, comparativamente com condutores sóbrios; a probabilidade acrescida é de 20 vezes para condutores com TAS de 0,50-0,80 g/L e de 30 vezes para condutores com TAS de 0,80-1,20 g/L.»10 As necessidades de prevenção geral, na dimensão da tutela da confiança e das expectativas da comunidade na manutenção da vigência da norma que foi violada (sendo por isso uma razoável forma de expressão afirmar como finalidade primária da pena o restabelecimento da paz jurídica comunitária abalada pelo crime), impõem o limite mínimo da pena, o qual deverá corresponder à neutralização do efeito negativo do crime na comunidade e fortalecer o seu sentimento de justiça e de confiança na validade das normas que foram violadas. Por seu turno a prevenção especial reporta-se à vertente positiva ou de socialização do agente do crime, a qual fixará em última instância a medida concreta da pena (na medida necessária à prevenção da reincidência11 - ajustando-se às necessidades de reintegração social do agente). Para concretizar a medida da pena de multa o tribunal recorrido valorou, na sentença recorrida, a taxa de álcool no sangue registada (que sendo mediana implica que a medida da pena tenha de se afastar do patamar mínimo previsto na lei e aproximar-se da sua mediana). Sendo a ausência de antecedentes naturalmente relevante – no sentido de não exigir uma medida mais que mediana (artigo 71.º, § 2.º, al. e) CP).

O arguido confessou os factos, mas essa confissão é circunstancialmente pouco relevante, na medida em que foi apanhado em flagrante delito.

A medida fixada à pena de multa mostra-se, pois, bem fundada nos seus pressupostos, e funcionará também como lembrete de que numa eventual reincidência; sendo que a opção pela pena de multa poderá também nesse caso já ser questionada; e a medida da pena naturalmente mais elevada. O mesmo sucedendo com a razão diária da multa, tendo o tribunal recorrido atendido às condições económicas e sociais do arguido, fixou-a no mínimo legal. Em suma: a medida concreta da pena de multa situou-se no ponto médio da respetiva moldura abstrata, o que se mostra plenamente justificado pela taxa de alcoolémia registada (e o risco daí decorrente para todos os demais utentes da via pública). E a razão diária foi fixada no mínimo. Tertio - O tribunal graduou a pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados, a que se reporta o artigo 69.º, § 1.º, al. a) CP, em 3 meses e 20 dias, dentro de uma moldura legal de 3 meses a 3 anos. Conforme já referido a pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados, sendo uma pena (ainda que acessória) visa também a proteção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade. Neste contexto da circulação rodoviária, a pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor, constituindo uma sanção (uma pena) adicional à pena principal, prossegue também especiais finalidades de prevenção geral essencialmente negativa - de intimidação (visando aportar um contributo significativo «para a emenda cívica do condutor imprudente ou leviano»).12

A sua graduação obedece às regras gerais, atribuindo a lei larga margem ao julgador para eleger os fatores relevantes a atender para a determinação da medida concreta da pena (cf. corpo do artigo 71.º, § 2.º CP).

Com exceção da afirmação genérica de desproporcionalidade, o recorrente nada (verdadeiramente) alega para sustentar a sua pretensão de ver diminuída a medida fixada à pena acessória aplicada! Nem poderia, porque ela foi encostada a mínimo permitido pela lei. Desse modo conferindo ao arguido um (enorme) sinal de confiança no porvir.

Pelas referidas razões o recurso não se mostra merecedor de provimento.

III – Dispositivo

Destarte e por todo o exposto, acordam os Juízes que constituem a Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora, em conferência:

a) Negar provimento ao recurso e, em consequência, manter integralmente a douta sentença recorrida.

b) Custas pelo arguido/recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 3 UC (artigo 513.º, § 1.º e 3.º do CPP, artigo 8.º Reg. Custas Processuais e sua Tabela III).

c) Notifique-se.

Évora, 11 de fevereiro de 2025

Francisco Moreira das Neves (relator)

Manuel Soares

Edgar Valente (vencido)

Declaração de voto

Salvo o devido respeito pelos argumentos que sustentam a tese que fez vencimento (quanto à questão prévia), não os subscrevo, pelas seguintes ordens de razões:

Na minha opinião, importa, antes de mais, recortar com rigor as vicissitudes processuais que nos permitem conhecer, em toda a extensão, os pressupostos fácticos necessários ao conhecimento da suscitada questão prévia.

Assim:

Resulta dos autos, com interesse para a decisão, o seguinte:

A - Em sede de inquérito, o Ministério Público, por despacho de 06.02.2023, e relativamente aos mesmos factos por que foi o arguido acusado e condenado, proferiu o seguinte despacho:

“Em face de todo o exposto, nos termos do artigo 281 n.º 1 e 2, do Código de Processo Penal, o Ministério Público propõe a SUSPENSÃO PROVISÓRIA DO PROCESSO, por um período de seis meses, com a condição de … no mesmo prazo, cumprir as injunções referidas abaixo e fazer prova de tal facto nestes autos, arquivando-se os mesmos após o cumprimento de tais injunções e caso não cometa novamente crime da mesma natureza, cfr. artigo 282º nº 4 alínea b) do Código de Processo Penal.

Injunções e regras de conduta, a cumprir no prazo de suspensão:

a) Entregar a quantia de € 650,00 (seiscentos e cinquenta euros) aos Bombeiros Voluntários de …, fazendo prova nos autos dessa entrega;

b) Frequentar e cumprir o programa TAXA.ZERO ministrado pela DGRSP, no período da suspensão;

c) Entrega da carta de condução nestes Serviços até 10 (dez) dias após a comunicação da suspensão provisória do processo, a qual ficará nos Serviços durante 4 (quatro meses), período durante o qual (de quatro meses) o arguido fica proibido de conduzir veículos a motor na via pública;

*

Conclua os autos ao Meritíssimo Juiz de Instrução, nos termos e para os efeitos do artigo 384.º n.º 1 e 2, por referência ao artigo 281.º n.º 1, todos do Código de Processo Penal.

B - O Meritíssimo JIC, por despacho de 08.02.2023, decidiu o seguinte:

“Mostrando-se reunidos todos os pressupostos elencados no art. 281.º, n.º 1, do CPP, dá-se a concordância à suspensão provisória do processo pelo tempo e mediante o cumprimento das injunções constantes da promoção apresentada pelo Ministério Público.”

C - Com a referência … e data de 15-02-2023, o arguido foi notificado como segue:

“Certifico que, por se encontrar presente neste Tribunal, notifiquei pessoalmente AA, natural de … […]; nascido em …1953 estado civil: Casado no regime de Desconhecido profissão: …, BI … domicílio: …, na qualidade de Arguido, nos termos e para os efeitos a seguir mencionados:

- Entregar a quantia de €650,00 euros aos BOMBEIROS VOLUNTÁRIOS DE …, (junta-se contato da instituição) devendo juntar aos autos, no mesmo prazo (6 meses, documento comprovativo do pagamento;

- Proibição de conduzir veículos a motor na via pública, durante o período de 4 meses, e deverá entregar nestes serviços a sua carta de condução, no prazo de 10 dias após receber a presente notificação.

- Frequentar o programa da DGRSP “TAXA.ZERO”, pelo que terá de comparecer no próximo dia 01-03-2023 pelas 14h40m no Tribunal de …, sito no Palácio da Justiça, …, para a realização de entrevista prevista para o cumprimento do programa “TAXA.ZERO”, junto dos serviços de reinserção social – a quem deverá prestar total colaboração.

Deverá fazer-se acompanhar do seu BI ou Cartão de Cidadão e da presente notificação.

***

Mais fica ainda V. Exª advertido para os termos do disposto do artº 282 nº4 do CPP que:

- O processo prossegue para julgamento e as prestações feitas não podem ser repetidas se não cumprir as injunções ou regras de condutas aceites e, durante o prazo de suspensão do processo, cometer crime da mesma natureza pelo qual venha a ser condenado Disse de tudo ficar ciente, recebe nota legal e comigo vai assinar a presente certidão.”

D - Em 18.01.2024 foi proferido nos autos pelo Digno Procurador da República o seguinte despacho:

“Notifique o arguido para esclarecer porque é que não fez o pagamento aos Bombeiros Voluntários de ….”

E - Consta dos autos ofício da GNR, datado de 31.01.2024, com o seguinte teor; “De acordo com o solicitado (…) junto envio a notificação respeitante a (arguido), a qual assinou, recebeu cópia e ficou ciente de todo o seu conteúdo.”

F - Em 04.03.2024, o Ministério Público consignou que:

“Uma vez que o arguido não cumpriu, na totalidade, as injunções que lhe foram impostas, o Ministério Público vai deduzir acusação em Processo Comum e com intervenção do Tribunal Singular, contra: AA (…)”,

tendo deduzido acusação contra o mesmo.

G - Em 02.05.2024 foi proferido despacho ordenando o registo e autuação como processo comum com intervenção de Tribunal singular.

H – O arguido, através de requerimento datado de 15.08.2024, subscrito por advogado, veio requerer o seguinte:

“AA, arguido nos autos, por seu advogado, vem, perante V. Exª, requerer a junção aos autos dos documentos e procuração enviado aos autos em 2.2.2024, na fase de inquérito.”

Junta, com tal requerimento, documento com o seguinte teor:

“Exmo. Senhor,

Procurador do Ministério Público de ….

Diap.

…ª. Secção.

Procº.32/23.0GDFAR

AA, arguido nos autos, vem, perante V.Exª, expor o seguinte:

1º.

O arguido foi notificado para informar o motivo pelo qual não procedeu ao pagamento aos Bombeiros Voluntários de ….

2º.

O arguido, tem uma reforma anual de, 6592,67€ conforme se verifica do doc. 1 e 2 Anexo.

3º.

Não tem possibilidades de liquidar tal valor dado que não possui outros rendimentos, sendo esse o motivo pelo qual não liquidou tal valor, por estar impossibilitado de o poder fazer.

Junta: dois documentos e procuração.

E.D.

BB

Advogado

Céd. Prof. N.º …..

Junta ainda, complementarmente, documento que aparenta ser uma mensagem de correio eletrónico de “…advogados.oa.pt”, “Enviado: 2 de fevereiro de 2024 09:44”, “Para: '….ministériopublico@tribunais.org'. “Assunto: Procº. 32/23.0GDFAR”, com 3 anexos e “Assinada por: …@advogados.oa.pt”, com o seguinte teor:

“Lisboa, 2 de fevereiro de 2024

Ao,

Ministério Público

Diap de …, …ª. Secção – Procº. 32/23.0GDFAR

AA, arguido nos autos, por seu advogado, vem, perante V. Exªs, requerer a junção aos autos:

1. De requerimento.

2. De dois documentos.

3. De procuração forense.

E.D.”

I - Em 04.09.2024 foi proferido nos autos despacho judicial com o seguinte teor, no que ora interessa:

“Req. Fls. 95 e 96:

Antes lavre termo de vista ao Ministério Público, a fim de, querendo, pronunciar-se.”

J - Em 09.09.2024, a Digna Procuradora da República apôs, na “vista” que lhe foi aberta, o seguinte:

“Nada a opor à junção dos referidos documentos.”

L - Nem na ata, nem na sentença (recorrida) é proferida qualquer decisão ou feita qualquer referência aos documentos e requerimento juntos.

*

De recordar que, segundo o recorrente, a omissão da sua audição previamente ao despacho de acusação (com a inerente cessação prévia da antes decretada suspensão do processo) configura nulidade insanável (art.º 119.º, alínea c) do CPP).

Vejamos.

É hoje absolutamente pacífico que o incumprimento que conduz à cessação da suspensão do processo deve ser culposo (doloso, grosseiramente negligente ou repetidamente assumido), pelo que o mesmo “não pode conduzir automaticamente à “revogação” da suspensão, devendo o Ministério Público (…) indagar das razões do incumprimento, em ordem a decidir-se pelo prosseguimento do processo para julgamento ou pelo decurso do prazo de suspensão, consoante apure haver, ou não, comportamento culposo, ou repetido, por parte do arguido.”13

Está provado que, após indagação sobre o cumprimento de uma das injunções determinadas na decisão de suspensão provisória do processo (pagamento de € 650,00 aos BV…) e confirmação de que tal injunção não havia sido cumprida, o MP deduziu acusação nos autos, que prosseguiram os seus termos, com o julgamento e a prolação da sentença recorrida. Contudo, deve também sublinhar-se que ficou provado que, previamente àquela decisão, o arguido foi notificado para esclarecer porque é que não fez o pagamento aos BV…, tendo ficado “ciente de todo o seu conteúdo.”

O que nos reconduz à questão de saber se é ou não necessária a “audição” presencial do arguido previamente à decisão de revogação da suspensão provisória do processo.

Há quem entenda que o necessário contraditório fica respeitado com uma audição não presencial, “dando-se, assim, cumprimento ao princípio do contraditório, constitucionalmente previsto, no artigo 32º, nº 5, da CRP, e concretizado no artigo 61º, nº 1, als. a) e b), do CPP.”14

Alinha no mesmo diapasão quem entende que a “oportunidade de o arguido se pronunciar basta-se com a notificação ao arguido e ao advogado que o defende para o efeito. Não tem que se tratar de uma audição presencial” e que não “há paralelo entre a revogação da suspensão provisória do processo e a revogação da suspensão da execução da pena prevista no art. 56º do Cód. Penal no contexto do incumprimento dos deveres condição daquela suspensão.”15

Daquilo que nos foi possível indagar, porém, a maioria da jurisprudência entende que aquela “audição” deve ser presencial16, sendo que, quanto às consequências da omissão desta audição, há quem defenda que a mesma configura a nulidade insanável prevista no art.º 119.º, alínea c) (os acórdãos mencionados na nota anterior) e quem defensa que se trata da nulidade dependente de arguição prevista no art.º 120.º, n.º 2, alínea d)17.

Se seguirmos esta segunda tese (necessidade de audição presencial), teremos de concluir que o MP, em face ao não cumprimento daquela injunção, procedeu automaticamente à revogação da suspensão, não indagando, como se lhe impunha, das razões de tal incumprimento, decidindo de imediato o prosseguimento do processo, com dedução da acusação, ou seja, sobrevém uma clara incompletude da obrigação de apuramento da culpa no incumprimento da injunção por parte do MP.

Se seguirmos a primeira das teses acima referidas, poderia considerar-se que foi, in casu, assegurado o contraditório, pois o arguido teve oportunidade de se pronunciar18 sobre as razões pelas quais não cumpriu a injunção determinada.

No entanto, mesmo para tal conceção do contraditório nesta sede específica, há algo que os autos evidenciam e que não foi considerado.

O arguido fez juntar aos autos, em 15.08.2024, ou seja, antes do julgamento, requerimento em que alega implicitamente, juntando documentação atinente, que, em 02.02.2024, ou seja, antes da dedução da acusação, enviou mensagem eletrónica dirigida ao MP onde informava que não liquidou aos BV… o montante a que dizia respeito a injunção, por não ter possibilidades e por não possuir outros rendimentos para além da sua reforma, que especifica19. (facto complementar acima mencionado sob a alínea “J”).

Em face desta alegação, o MP apenas não se opôs à junção de tais documentos (facto complementar acima mencionado sob a alínea “M”), nada tendo o tribunal decidido sobre a relevância ou irrelevância dos mesmos para a decisão da causa (facto complementar acima mencionado sob a alínea “N”).

Vejamos.

Estão em causa factos processuais (averiguar se o requerimento em causa, acompanhado de dois documentos e de procuração forense foi efetivamente enviado como alegado e se foi ou não recebido) e materiais (o montante de rendimentos auferidos pelo arguido no período em que devia liquidar a fixada importância aos BV…).

Em face da prova (ou não prova) dos aludidos factos, importa que tribunal se pronuncie sobre a relevância dos mesmos para a decisão a proferir nos autos, no que se considera uma questão prévia (e prejudicial) ao conhecimento dos factos da acusação e valoração jurídico-penal dos mesmos. Mais exatamente: em face do requerimento apresentado antes do julgamento, deveria ter sido apreciada a questão pelo mesmo implicitamente suscitada (em decisão autónoma, em decisão proferida na audiência ou, pelo menos, na sentença) e não o foi. A questão do conhecimento da eventual extemporaneidade da arguição (de nulidade sanável / insanável ou mera irregularidade, se for esse o caso) é posterior à necessidade de conhecimento da mesma. Ou seja, o tribunal tinha a obrigação legal de se pronunciar expressamente sobre a questão, nem que fosse para a considerar como invocação de nulidade / irregularidade extemporânea (ou improcedente / inexistente). A qualificação da questão e a extração das consequências jurídicas decorrentes de tal qualificação não prejudicam a necessidade de o tribunal sobre a mesma se pronunciar.

Do exposto flui que entendemos existir, uma vez que tal pronúncia não ocorreu, a nulidade da sentença prevista no art.º 379.º, n.º 1, alínea c). Segundo o art.º 410.º, n.º 3, o recurso pode ter como fundamento, mesmo que a lei restrinja a cognição do tribunal de recurso a matéria de direito, a inobservância de requisito cominado sob pena de nulidade que não deva considerar-se sanada.

As nulidades da sentença, se constatadas, devem ser conhecidas oficiosamente pelo tribunal de recurso.20

Pelo exposto, entendo que estamos perante uma omissão de pronúncia do tribunal de 1.ª instância perante uma questão que foi suscitada pelo arguido, estando aquele legalmente obrigado a pronunciar-se sobre a mesma. Tal omissão gera a nulidade da sentença recorrida, nos termos do art.º 379.º, n.º 1, alínea c) in proemio e deveria ser, na minha opinião, substituída por outra por forma a nela se incluir o conhecimento da referida questão suscitada pelo arguido. Em consequência, entendo que deveria anular-se, por omissão de pronúncia (art.º 379.º, n.º 1, alínea c) in proemio do Código de Processo Penal) a sentença recorrida, que deveria ser substituída por outra, por forma a nela incluir o conhecimento da questão suscitada pelo arguido.

Edgar Valente

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1 A utilização da expressão ordinal (1.º Juízo, 2.º Juízo, etc.) por referência ao nomen juris do Juízo tem o condão de não desrespeitar a lei nem gerar qualquer confusão, mantendo uma terminologia «amigável», conhecida (estabelecida) e sobretudo ajustada à saudável distinção entre o órgão e o seu titular, sendo por isso preferível (artigos 81.º LOSJ e 12.º RLOSJ).

2 As «conclusões» previstas na lei não são o que o recorrente entende que possam ser! São apenas o que a lei diz que são: um resumo das questões discutidas na motivação; ou uma síntese essencial dos fundamentos do recurso (artigo 412.º/1 CPP). Daí que, tal como sagazmente refere o Supremo Tribunal de Justiça, no seu acórdão de 17fev2005, proc. 05P1441, relator o Cons. Pereira Madeira ( www.dgsi.pt ) o recurso não deve ser serventuário do que sob tal «título» os recorrentes entendam nele colocar. Razão pela qual se procedeu ao devido «aparo» para que as conclusões (e só estas) cumpram a função gizada na lei.

3 A respetiva declaração de voto consta no final desta peça, a seguir à identificação dos membros do Tribunal.

4 Precise-se que o juiz não participa no acordo celebrado os referidos sujeitos processuais, cingindo-se aquele a verificar o cumprimento dos pressupostos e da legalidade do conteúdo desse acordo.

5 José de Faria Costa, Diversão (desjudiciarização) e mediação: que rumos?, Boletim da Faculdade de Direito, vol. 61 (1985), p. 93. No mesmo sentido, mas mais desenvolvido cf. (por todos) João Conde Correia, Comentário Judiciário do Código de Processo Penal, t. III, 2022, p. 1135 ss.

6 Seria impensável – por vulnerador da dignidade do arguido enquanto pessoa - considerar não cumprida injunção, se a razão desse incumprimento advier de uma alteração substancial das circunstâncias em que o consenso se formou.

7 O Tribunal Constitucional já se pronunciou no sentido de não vulnerar este princípio a sobreposição de julgamento criminal versus julgamento disciplinar (Ac. 263/94).

8 Por todos, cf. DSum. TRÉvora 20/2/2019, relatora Ana Brito, proc. 1862/17.8PAPTM.E1 e também acórdão do TRÉvora, de 16jun2015, proc. 25/14.9GAAVS.E1, relator Clemente Lima; e acórdão do TRCoimbra, de 5abr2017, proc. 47/15.2IDLRA.C1, relatora Olga Maurício.

9 https://prp.pt//wp-content/uploads/2021/07/Conducao_sob_Efeito_do_Alcool_em_Portugal.pdf

10 Idem.

11 «Por reforço dos standards de comportamento e de interação na vida comunitária (condução da vida “de forma socialmente responsável”)» - Jorge de Figueiredo Dias, Direito Penal Português – As Consequências Jurídicas do Crime, pp. 74, 110 e 238 ss., Aequitas – Editorial Notícias, 1993. Também Maria João Antunes, Penas e Medidas de Segurança, Almedina, 2020, pp. 42 e ss.

12 Jorge de Figueiredo Dias, Direito Penal Português – As Consequências Jurídicas do Crime, Aequitas – Editorial Notícias, 1993, pp. 165.

13 Maia Costa in Código de Processo Penal Comentado, 3.ª edição revista, 2021, Almedina, página 952.

14 Acórdão do TRC de 10.07.2024 proferido no processo n.º 170/23.0GAOFR.C1 (relator Paulo Guerra), disponível, como todos os ulteriormente citados sem indicação diversa, em www.dgsi.pt .

15 Acórdão do TRL de 23.04.2024 proferido no processo n.º 81/20.0PAOER.L1-5 (relatora Alda Tomé Casimiro).

16 Neste sentido, entre outros, vide os Acórdãos deste TRE de 10.09.2024 proferido no processo n.º 173/21.9PFSTB.E1 (relatora Laura Goulart Maurício), de 10.11.2020 proferido no processo n.º 49/15.9EAEVR.E1 (idem), de 11.05.2021 proferido no processo n.º 579/19.3T9EVR.E1 (idem) e também do TRC de 08.05.2024 proferido no processo n.º 890/22.6PBCTB.C1 (relatora Ana Carolina Cardoso).

17 Neste sentido, vide, entre outros, o Acórdão do TRC de 12.05.2021 no processo n.º 48/19.1GBGRD.C1 (relatora Helena Bolieiro), do TRP de 23.10.2024 proferido no processo n.º 32/23.0GACPV.P1, do mesmo TRP de 09.12.2015, proferido no processo n.º 280/12.9TAVNG-A.P1 (relator Nuno Ribeiro Coelho) e de 23.10.2024 proferido no processo n.º 32/23.0GACPV.P1 (relator Pedro Vaz Pato), bem como deste TRE de 04.02.2020, proferido no processo n.º 133/15.9T9RMR.E1 (relator Carlos Berguete Coelho) e também deste TRE de 21.06.2022 proferido no processo n.º 276/19.0GCSSB.E1 (relator Carlos Lobo)

18 Desconsiderar-se-á a circunstância, que alguns consideram determinante, da inexistência de defesa assegurada por defensor (oficioso ou constituído), atento o infra exposto.

19 Cremos que terá havido algum lapso na quantificação desta reforma (“6592,67€”), pois está em flagrante e ostensiva contradição com o alegado e até com o dado como provado (pensão de reforma no valor de €506,00 [quinhentos e seis euros]).

20 José Mouraz Lopres in Comentário Judiciário do Código de Processo Penal, tomo IV, 2022, Almedina, página 802. No mesmo sentido, vide Oliveira Mendes in Código de Processo Penal Comentado, 3.ª edição revista, 2021, Almedina, página 1158.