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PROCESSO DE INVENTÁRIO
AVALIAÇÃO
CONFERÊNCIA DE INTERESSADOS
Sumário
(da responsabilidade do relator): I. O disposto no art.º 1114.º do CPC, que permite que qualquer interessado em processo de inventário requeira avaliação de bens relacionados em conferência de interessados, deve ser interpretado no sentido que não confere o direito a solicitar uma repetição de uma avaliação pericial realizada anteriormente e não posta em causa no processo; II. Tal pedido de reavaliação de uma verba nesse momento processual seria de admitir apenas ante a invocação de fundamentos que permitissem estabelecer uma desatualização da avaliação antes realizada (entre a data em que a mesma se realizou e a da conferência de interessados).
Texto Integral
Acorda-se nesta 2.ª Secção o seguinte quanto à matéria desta apelação: -- I. Caracterização do recurso: I.I. Elementos objetivos:
- Apelação – 1 (uma), nos autos;
- Tribunal recorrido – Juízo de Família e Menores de Vila Franca de Xira – Juiz 1;
- Processo em que foi proferida a decisão recorrida – Inventário;
- Decisão recorrida – Despacho que indeferiu realização de avaliação.
-- I.II. Elementos subjetivos:
- Recorrente (interessada):
- AA. –
- Recorrido (cabeça-de-casal):
- BB. –
-- -- I.III. Síntese dos autos:
- Apresentou BB em 13/8/2021 requerimento inicial pedindo inventário para separação de meações subsequente ao divórcio que dissolveu o casamento que manteve com a requerida;
- Com o requerimento inicial apresentou relação de bens;
- A requerida foi citada por meio de funcionário judicial em 23/11/2021;
- Por requerimento de 5/1/2022 a interessada deduziu reclamação à relação de bens.
Em síntese, disse o seguinte:
- Estão omissos da relação de bens dois veículos automóveis (que descreveu);
- Está omitido o valor correspondente ao preço pela alienação de quota comum em sociedade comercial (GP - Comércio e Reparação Automóvel, Acessórios e Peças, Lda.), no valor que indica;
- Não existem os créditos relacionados sob as verbas n.ºs 7 e 8, que devem ser eliminados;
- A verba n.º 7 do passivo não existe, nunca tendo o interessado comparticipado com o pagamento de prestações relativas ao empréstimo bancário aí indicado;
- Todas as prestações mensais relativas às verbas n.ºs 4 e 5 foram pagas pela interessada;
- Por isso devem ser aditadas duas verbas ao passivo, correspondentes aos pagamentos efetuados pela requerida relativas a empréstimos e seguros da casa de família, descritos nas aludidas verbas n.ºs 4 e 5;
- Respondeu o cabeça-de-casal pugnando pela total falta de fundamento da reclamação deduzida;
- Foi proferido despacho designando data para audição das partes;
- Realizou-se diligência judicial, no âmbito da qual foi deferido prazo de suspensão da instância, requerido pelas partes, com vista a que chegassem a acordo;
- Não tendo as partes chegado a conclusão, foi designada data para continuação da diligência judicial em curso;
- Prosseguindo a audiência, no dia 16/1/23, foi no seu decurso proferido despacho relativo à reclamação e relacionamento de bens, nos seguintes termos (trechos essenciais):
- “Nos presentes autos de inventário para partilha de acervo ainda em comum, em consequência de divórcio, em que é requerente e BB e requerida AA, veio a requerida, sem sede de reclamação à relação de bens (cf. 06.01.2022), alegar que deve ser aditado à relação de bens o montante de €124.699,47 relativo à alienação de uma quota da sociedade comercial; dois veículos automóveis de matrícula -- e --; despesas inerentes à reclamação de créditos – Banco Santander e Totta – no montante de € 414,00; dois créditos da requerida relativamente à verba 4 e 5 do passivo nos montantes de € 51.883,42 e € 12.743,80; e não deverão ser admitidos os créditos do requerente sob as verbas 7 e 8, pois, relativamente à verba 7, foi ela que efectuou tais pagamentos e em relação à verba 8 tal passivo deveria ter sido pago com a venda da quota da sociedade comercial.
Notificado desta reclamação, veio o BB defender que a mesma não pode proceder, alegando para o efeito:
(...)
Cumpre, pois, apreciar.
Tendo em atenção a complexidade de prova dos alegados créditos existentes por parte do BB e da requerida, bem como a utilização ou não em proveito do casal do valor de € 124.699,47, remeto, quanto aos mesmos, as partes para os meios comuns, nos termos do disposto no art.º 1093º nº 1 do CPC.
Na realidade, (...).
Assim, face ao supra exposto e ao abrigo do disposto nos artigos 1092º e 1093º CPC decido remeter as partes para os meios comuns, a fim de ser apreciada a questão dos créditos do BB e requerida (verbas 7º e 8º da Relação de bens; créditos da requerida no montante de € 51.883,42 e € 12,743,80; e o valor de € 124.699,47 relativo à quota da sociedade comercial (cf. saber se foi utilizado ou não em proveito do casal).
Notifique.
--
Terão de ser relacionados os dois veículos automóveis, tendo em atenção o teor de fls. 63 e 64 e o disposto no art.º 1725º do Código Civil.
--
Não se admite o crédito de € 414,00 por falta de fundamento legal, pois não existe qualquer processo de penhora do imóvel no âmbito deste inventário";
- Os interessados não recorreram deste despacho;
- Por requerimento desse mesmo dia 12/1/23, requereu o cabeça-de-casal avaliação de todos os imoveis constantes na Relação de Bens apresentada;
- Por despacho de 19/6/23 foi ordenada avaliação dos imóveis relacionados;
- Por comunicação de 10/11/23 o perito enviou a Juízo o respetivo relatório de avaliação, que foi notificado às partes nesse mesmo dia;
- Subsequentemente, apresentou a interessada um pedido de esclarecimentos ao perito nomeado, relacionado com os critérios usados para valorar a verba n.º 1 (tendo por referência o valor dos prédios da zona, critério indicado pelo perito);
- Pronunciou-se o interessado no sentido de dever ser fixado à verba n.º 1 o valor indicado pelo perito;
- Foi proferido despacho ordenando notificação do perito para prestar esclarecimentos;
- Respondeu o perito em 8/4/2024;
- Foi proferido despacho convidando as partes a pronunciarem-se nos termos do art.º 1110.º do CPC;
- Pronunciou-se o cabeça-de-casal no sentido de as verbas a partilhar deverem ser atribuídas a ambos os ex-cônjuges, na proporção de metade a cada um;
- Pronunciou-se a interessada no sentido de os bens a partilhar serem comuns, mas dever ser levada em conta a sua comparticipação no pagamento;
- Foi designada data para conferência de interessados para o dia 20/11/24;
- Apresentou a interessada, nesse dia 20/11/2024, requerimento autónomo nos autos, com o seguinte teor:
AA, interessada nos autos de processo acima identificado, vem alegar e requerer o seguinte:
A- Verba nº 1 (e lote de terreno não integrado na mesma)
1º A interessada após uma análise mais exaustiva à relação de bens apresentada pelo Cabeça de Casal e consequente reclamação de bens e resposta à mesma, foi confrontada com a seguinte factualidade:
2.º A primeira questão que importa aduzir é a relativa ao lote de terreno onde está inserida a moradia, ou seja, a verba n.º 1 da Relação de Bens.
3.º Efetivamente, e de acordo com os docs. n.ºs 1 e 2 que se juntam e cujos teores aqui se dão por integralmente reproduzidos para todos os efeitos legais, o terreno é um bem próprio da interessada.
4.º E, não obstante não ter sido relacionado, a verdade é que tendo a moradia (verba n.º 1) sido inserida nesse lote de terreno com uma área total de 1.650,00m2, não se faz qualquer referência ao valor desse lote de terreno no Relatório de Avaliação junto aos presentes autos, cfr. informação do Perito junto aos mesmos.
5.º Ora, o valor desse lote de terreno deveria constar do Relatório de Avaliação, não só porque influi inolvidavelmente no valor da própria moradia (verba n.º 1), mas também, e principalmente para aferir do valor do crédito, na sua totalidade, da interessada sobre o Cabeça de Casal.
6.º Ora, considerando que quanto à perícia/avaliação aos imóveis relacionados, a abertura das licitações constitui o termo final para a dedução do requerimento de avaliação dos bens, e uma vez que não foi iniciado o período de licitação, requer-se nos termos do art.º 1114.º do CPC que seja efetuada uma nova avaliação da moradia (verba n.º 1) atendendo ao valor do terreno em que esta foi inserida.
7.º A acrescer, e sem conceder, ainda que assim não se entenda, resulta do disposto no previsto no n.º 1 do art.º 1093.º do CPC que quando a complexidade da causa assim o exigir, devem as partes ser remetidas para os meios comuns para apreciação e averiguação da natureza do bem e do crédito.
8.º Ora, a verba n.º 1, moradia, foi relacionada como sendo um bem comum.
9.º Não obstante, para além da não diferenciação do lote de terreno, já foi profusamente alegado pela interessada que o Cabeça de Casal nunca contribuiu com qualquer quantia para o pagamento das prestações mensais para amortização dos créditos decorrentes dos contratos de mútuo outorgados com o Banco Santander Totta, S.A, credor reclamante nos presentes autos, assim como das prestações do seguro de vida conexo aos respetivos empréstimos, tendo inclusivamente, já junto comprovativos dos pagamentos no período compreendido entre 30-09-2017 e 31-12-2021.
10.º Mais, não só o respetivo pagamento foi sempre efetuado pela interessada quanto a todas as prestações mensais nesse período acima alegado, como também desde 2001, data da outorga do primeiro contrato de mútuo com hipoteca com o Banco reclamante nos presentes autos, e também desde 2004, data da outorga do segundo contrato de mútuo com hipoteca com o Banco reclamante, cfr. doc. n.º 3 que se junta e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzidos para todos os efeitos legais, tendo os referidos pagamentos sido efetuados maioritariamente com os seus bens próprios.
11.º Acresce ainda que após 2021, pós data da entrada da presente ação, permanece apenas a interessada a ser a única a proceder ao pagamento das prestações dos contratos de mútuo que se venceram e se vencem até à presente data, doc. n.º 4 que se junta e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzidos para todos os efeitos legais.
12.º Ora, conforme resulta do doc. n.º 5 que se junta e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais, houve pagamentos das prestações mensais efetuados com bens próprios da interessada, isto é, com o produto de doações efetuadas por familiares, depositados na conta associada ao pagamento das prestações mensais decorrentes dos empréstimos, utilizados exclusivamente para a liquidação dos respetivos empréstimos.
13.º Com efeito, o valor constante dos docs. juntos totaliza € 171.000,00, sendo certo que houve outros montantes depositados na conta da interessada, fruto de doações, e que só com prova testemunhal se poderá corroborar que eram valores doados, valores estes que serviram para a interessada proceder ao pagamento das prestações mensais referentes aos empréstimos.
14.º Ora, conforme resulta do disposto no n.º 1 do art.º 1726.º do CC «Os bens adquiridos em parte com dinheiro ou bens próprios de um dos cônjuges e noutra parte com dinheiro ou bens comuns revestem a natureza da mais valiosa das duas prestações.»
15.º Assim, se o ex-casal celebrou um primeiro contrato de mútuo com hipoteca em 30-08-2001 com o valor de € 324.218,63 e posteriormente, em 29.01.2004 um contrato de mútuo com hipoteca com o valor de € 20.000,00, totalizando um valor global de € 344 218,6, E,
16.º Se, conforme o teor do requerimento junto aos autos pelo Banco reclamante já foi paga a quantia de € 320 257,7, encontrando-se atualmente em dívida a quantia de € 23.960,94, facilmente se conclui que desde 2001 ate à presente data, a moradia (verba n.º 1) foi adquirida/paga na sua maior parte com dinheiro ou bens próprios da interessada,
17.º Deste modo, requer-se a exclusão da Relação de Bens da verba n.º 1 e que as partes sejam remetidas para os meios comuns quanto à natureza do bem, uma vez que só com a definição dessa natureza se poderá dizer cessada a situação pendente de partilha.
18.º Atento ao exposto, e considerando a complexidade da matéria de facto subjacente à questão da natureza da verba n.º 1, e por ser imperativo apreciar e comprovar mediante prova documental e testemunhal a mesma, justifica-se que as partes sejam remetidas para os meios comuns para apreciação e comprovação da natureza da verba.
B – Verbas nºs. 2 e 3 19.º Ora, as verbas n.ºs 2 e 3 da Relação de Bens apresentada pelo Cabeça de Casal foram relacionadas por serem, no seu entendimento, bens comuns.
20.º Acontece que, tais verbas são bens próprios, não devendo por isso, sido relacionadas com essa natureza, porquanto:
21.º As verbas 2 e 3 têm origem na distribuição de ativos de uma sociedade detida originalmente pelos pais da interessada, comprovado designadamente pela escritura de cessão de quotas da mãe para a interessada no valor de $14.000.000, conforme doc. n.º 6 que se junta e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.
22.º Pela dação em pagamento de $10.000.000 – montante contraído em data anterior à celebração do matrimónio, conforme prova testemunhal a apresentar em sede de processo comum, conforme doc. n.º 6 que se junta e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.
23.º E pela escritura de dissolução e partilha da sociedade, na qual os ativos são divididos e à interessada é atribuído 1/3 das verbas 2 e 3, conforme doc. n.º 6 que se junta e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.
24.º Deste modo, entende a interessada que as verbas n.ºs 2 e 3 devem ser igualmente excluídas da Relação de Bens e remetidas para os meios comuns, uma vez que a discussão, apreciação e decisão da natureza destas, exige uma análise superior aos termos processualmente confinados, simplificados e relativamente condicionados, o que apenas se logrará no quadro do processo comum.
25.º De facto, a remessa para os meios comuns supõe naturalmente uma necessária amplitude de garantias processuais, traduzidas na livre possibilidade de apresentação dos meios probatórios e da sua efetiva contradição, bem como na realização judiciosa e pormenorizada da audiência de discussão e julgamento.
Termos em que se requer a exclusão da Relação de Bens das verbas n.ºs 1, 2 e 3 e, consequentemente, a remessa para os meios comuns para discussão da natureza dos bens que compõem tais verbas, com as demais consequências legais daí decorrentes.
--
- Em 21/11/2024 realizou-se conferência de interessados nos autos;
- Nessa ata consta:
Iniciada a conferência foi dada a palavra à Ilustre Mandatária do Cabeça de Casal, que requereu:
“Pela sua intempestividade, incoerência e falta de verdade, o Cabeça-de-Casal pretende impugnar desde já o requerimento apresentado ontem com reclamação de bens. Não só porque esta reclamação é manifestamente extemporânea porque já houve uma reclamação, já foi decidida, já decorreu mais de 30 dias, e, portanto, já cessou o direito de poder ser apresentada qualquer reclamação de bens.
Ainda assim o Cabeça de Casal indica que de facto a avaliação levou em consideração toda a área do terreno onde está implantado o imóvel, pelo que não se pode afirmar que não foi feita a avaliação porque foi e está incluída no valor do imóvel.
É falso que o terreno e demais bens constantes das verbas que a Interessada quer fazer querer, tenham alguma vez sido pagas com os bens próprios da Requerida e, portanto, devem todas elas manter-se em Partilha.
Em conclusão, tudo é extemporâneo e a própria reclamação não indica quaisquer meios que possam provar os factos que alegam, que comprove efetivamente que os bens são bens próprios.
Com efeito, o casal casou em 1986 e os bens foram adquiridos em 2001, já em constância de matrimónio, pelo que jamais poderá ser admitido o requerimento da Interessada, não só pela manifesta extemporaneidade, pela falta de cumprimento das regras básicas de admite à prova diz respeito.
A requerida teve todo o tempo para fazer a reclamação e jamais o fez, não sendo agora lícito e o Cabeça de Casal pugna pelo indeferimento da reclamação por absoluta falta de fundamentação.”
- Mais consta desta ata que:
...de seguida, pelo Mmº Juiz de Direito foi proferido o seguinte:
DESPACHO
“Tendo em atenção que já estamos na fase da conferência de interessados, o requerimento apresentado em 20-11-2024 é manifestamente extemporâneo e como tal inexiste fundamento legal para a sua admissão.
Aliás, a Interessada já teve oportunidade de reclamar no momento processualmente adequado e nessa altura poderia ter apresentado as reclamações ora deduzidas, o que não fez.
Não pode, pois, nesta fase processual apresentar nova reclamação por manifesta extemporaneidade.
Pelo exposto, o Tribunal não admite esta reclamação por extemporânea e, consequentemente, ordena o seu desentranhamento e devolução.
Custas pelo incidente em 4 UC a cargo da Interessada.
Notifique.
- Consta ainda da ata que:
Após conversações entre as partes, foi possível chegar a acordo quanto às seguintes verbas:
- Quanto às verbas n.º 2 e 3, ficam adjudicadas à Interessada AA.
- Quanto ao passivo das verbas n.º 4, 5 e 6, o valor será partilhado pelas partes.
Quanto aos dois veículos automóveis, o Peugeot de matrícula -- de 2005, modelo Expert, carrinha de 2 lugares, e o Audi de matrícula --, a Interessada requer que se proceda à sua avaliação.
De seguida, pelo Mmº Juiz de Direito foi proferido o seguinte:
DESPACHO
“Tendo em atenção ao disposto no art.º 1114º n.º 1 e n.º 2 do CPC, o Tribunal ordena que a secção indique perito avaliador capaz de fazer a avaliação solicitada, e, consequentemente, suspende-se a presente conferência de interessados, sendo designada data para continuação após a receção e notificação das partes do relatório de avaliação.”
- Deste despacho interpôs a interessada a presente apelação. –
-- II. Objeto do recurso (delimitado pelas conclusões apresentadas pelo recorrente): II.I. Conclusões apresentadas pelos recorrentes nas suas alegações (com eliminação de repetições e assinalando a negrito as questões suscitadas):
- A. O recorrido, em 13 de agosto de 2021, instaurou Processo de Inventário para partilha dos bens comuns do ex-casal, após a dissolução do casamento por divórcio, no Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Norte, no Juízo de Família e Menores de Vila Franca de Xira.
B. Em tal Processo de Inventário, que corre seus termos sob o n.º 2428/21.3T8VFX, o recorrido, na qualidade de cabeça de casal, apresentou Relação de Bens.
C. Tendo relacionado, entre outros, como Verba n.º 1, o Prédio urbano --, com o valor patrimonial de € 326.078,90.
D. O lote de terreno onde está inserida a moradia, ou seja, a verba n.º 1 da Relação de Bens junta ao Processo de Inventário, é um bem próprio da recorrente
E. E, não obstante a moradia (verba n.º 1) ter sido inserida nesse lote de terreno com uma área total de 1.650,00m2, e ter sido requerida pelo cabeça de casal, ora recorrido, no processo de inventário, uma avaliação à verba n.º 1, para aferir do valor comercial atual,
F. A verdade é que não se faz qualquer referência ao valor desse lote de terreno no Relatório de Avaliação junto aos autos de processo de inventário, mas apenas ao valor da verba n.º 1, a moradia, de € 830.590,86.
G. Ora, o valor desse lote de terreno deveria constar do Relatório de Avaliação, não só porque influi no valor da própria moradia (verba n.º 1), mas também, e principalmente para aferir do valor do crédito, na sua totalidade, da recorrente sobre o recorrido.
H. Em consequência, a recorrente, através de requerimento junto aos autos a 20 de novembro de 2024, veio alegar e requerer, na parte que ora interessa, o seguinte:
(...) – supra transcrito
I. Na diligência de Conferência de Interessados realizada no dia 21 de novembro de 2024, foi proferido o seguinte despacho, de que ora se recorre:
(...) supra transcrito
J. Ao contrário do que resulta do teor do despacho proferido, e com todo o respeito que se credita, o Mm.º Juiz a quo não terá equacionado devidamente a situação em apreço e não terá feito correta leitura e interpretação do teor do requerimento, uma vez que a recorrente não veio apresentar nova reclamação,
L. Antes veio suscitar a questão da inolvidável importância do valor do terreno em que a moradia – verba n.º 1, está inserida.
M. Efetivamente, sendo o lote de terreno um bem próprio da recorrente, e, não obstante a moradia (verba n.º 1) ter sido inserida nesse lote de terreno com uma área total de 1.650,00m2,
N. A verdade é que não se faz qualquer referência, isoladamente, ao valor desse lote de terreno no Relatório de Avaliação junto aos autos de processo de inventário, mas apenas ao valor da verba n.º 1, a moradia, € 830.590,86.
O. Ora, o valor desse lote de terreno deveria constar do Relatório de Avaliação, porque influi no valor da própria moradia (verba n.º 1).
P. Pelo que, sendo imperativo saber o valor desse lote terreno pelos motivos acima alegados, e sendo tal valor omisso no Relatório Pericial efetuado, a recorrente requereu uma nova avaliação à verba n.º 1, que fixasse o valor definitivo da mesma, contemplando o valor do terreno onde está inserida, devidamente individualizado
Q. Questão que assume inquestionável relevância na discussão dos bens que integram a exata definição do acervo a partilhar, para uma igualação da partilha que se quer justa e equitativa.
R. Desse modo, a recorrente, sustentada no disposto no n.º 1 do art.º 1114.º do Código de Processo Civil que prevê que «1 - Até à abertura das licitações, qualquer interessado pode requerer a avaliação de bens, devendo indicar aqueles sobre os quais pretende que recaia a avaliação e as razões da não aceitação do valor que lhes é atribuído.»,
S. Requereu nova avaliação à moradia, com o valor do lote de terreno já incluído, mas devidamente individualizado, avaliação que reputa pertinente e imprescindível.
T. Efetivamente, a eventual licitação da verba n.º 1 no seu todo, sem qualquer referência específica ao valor do lote de terreno, obrigará a recorrente a licitar um bem, a verba n.º 1, que em parte é um bem próprio, o lote de terreno, o que irá influir e em muito a igualação da partilha, ´
U. Na medida em que o recorrido irá beneficiar, na partilha, de metade do valor do lote de terreno, que é um bem próprio da recorrente, cfr. os docs. n.ºs 1 e 2 juntos ao seu requerimento de 20 de novembro de 2024,
V. Documentos cujo desentranhamento foi ordenado, conforme resulta do teor do despacho proferido no dia 21 de novembro de 2024, mas que, dada a ostensiva importância e relevância que assumem na boa decisão da causa e na apreciação e comprovação da natureza do lote de terreno como bem próprio da recorrente,
X. Se requer desde já seja admitida a sua junção aos presentes autos, até para instruir devidamente o presente recurso.
Z. Na verdade, o indeferimento da pretensão da recorrente em se proceder a uma nova avaliação à moradia que contemple, devidamente identificado e individualizado, também o valor do lote de terreno, consubstanciará um enriquecimento sem causa por parte do recorrido,
AA. Condicionando ostensivamente a posição da recorrente e, na verdade, do recorrido também, na conferência de interessados, quer quanto à composição de quinhões, quer quanto a eventuais licitações da verba n.º 1 constante da relação de bens.
BB. Pelo que dever-se-á proceder a uma nova avaliação à moradia – verba n.º 1, designadamente com uma avaliação isolada do terreno onde se insere, com os fundamentos acima aduzidos, estando tal pretensão devidamente sustentada no n.º 1 do art.º 1114.º do Código de Processo Civil que dispõe que «- Até à abertura das licitações, qualquer interessado pode requerer a avaliação de bens, devendo indicar aqueles sobre os quais pretende que recaia a avaliação e as razões da não aceitação do valor que lhes é atribuído.».
--
- Os autores contra-alegaram concluindo do seguinte modo:
A - Vem o recurso interposto do despacho de 21/11/2024 do Tribunal de 1ª instância da não admissão do requerimento formulado pela Recorrente a 20 de novembro de 2024, por extemporâneo e falta de fundamento legal para a sua admissão bem como da não admissão do requerimento da avaliação da verba 1., da Relação de Bens, já atempadamente avaliada.
B - Pretende a recorrente, a avaliação da moradia – verba N.º 1 da Relação de Bens que contempla o lote de terreno, devidamente identificado, em que a mesma esta inserida, alegando ser um bem próprio da Recorrente.
C - O referido terreno é um bem comum, adquirido pelo casal no ano de 2001, ou seja, 15 anos após o casamento e ainda na constância do matrimonio.
D - Os documentos juntos com o requerimento de 20/11/2024 com o número 1 e 2, nada provam para além de que, era o cônjuge mulher quem assumia a gestão dos bens comuns do casal.
E - O prazo para reclamar da Relação de Bens é de 30 dias (n.º 1 c do artigo 1104.º C.P.C.)
F- A Recorrente/interessada foi citada a 23/11/2021,
G- Em consequência no dia 5/01/2022, vem apresentar reclamação à relação de bens.
H- Apesar de ter apresentado reclamação a Relação de Bens, aceitou que a verba n.º 1 é um bem comum do casal e dela não reclamou;
I- O direito para reclamar da Relação de Bens já terá precludido em 5/01/2022, sendo extemporânea a reclamação apresentada a 21/11/2024.
J- Além disso, o imóvel da Verba N.º 1 composto por uma moradia inserida num terreno com uma área total de 1.650,00 m², já foi, em devido tempo, avaliado.
K- A avaliação não contempla separadamente a avaliação do terreno nem poderia contemplar, pois só existe e só se encontra registada um imóvel que não poderá ser separado na sua avaliação, quando sobre o terreno, se encontra inserida a moradia, relacionada na Verban.º1.
L- O imóvel constante da Verba n.º 1 localiza-se na Rua --, -- (ex lote ---), Póvoa de Santa Iria. É composta por uma moradia inserida num terreno com uma área total de 1.650,00 m², com uma zona calcetada, arrecadações, piscina, casa de apoio à piscina com instalação sanitária e duche, zona destinada a horta” (pág. 6 do relatório de avaliação).
M- Ora, a Recorrente teve todas as oportunidades para reclamar, se assim o entendesse e só agora, ao final de 3 anos de pendência do processo de Inventario e, no dia anterior à Conferência de Interessados, se lembrou que, afinal, o terreno da Verba n. º1 é um bem próprio e vem requerer a hipotética avaliação de um terreno, isoladamente, sobre o qual incide um imóvel registado, havendo apenas um registo do imóvel constante na Verba n.º 1.
N- É desprovido de fundamento todo o argumentário expendido pela Recorrente, que com a interposição deste recurso mais não pretende do que protelar o desfecho da ação e partilha do imóvel constante na Verba n.º 1 da Relação de Bens, adiando uma decisão que bem sabe ser inevitável.
O- O Douto despacho recorrido não viola qualquer disposição legal, estando, por tal, perfeito, conforme o Direito, e não merecendo qualquer censura.
P- Em face de tudo quanto foi exposto, cabe concluir pela falta manifesta, completa e absoluta de fundamento do presente recurso que, assim, deve ser julgado improcedente. –
O recurso foi admitido como apelação autónoma, a subir de imediato e com efeito suspensivo.
II.II. Questões a Apreciar:
Nos termos delimitados pela recorrente, a única questão a apreciar em sede deste recurso será saber se existe fundamento para ordenar avaliação do imóvel relacionado como verba n.º 1.
Previamente a esta, e também tratada pela recorrente, está a questão de identificar o objeto do despacho recorrido e, designadamente, se constitui uma reclamação à relação de bens apresentada na véspera da conferência de interessados. –
--
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir. –
--- II.III. Apreciação do recurso:
--
a) Objeto do despacho recorrido:
Para melhor enquadrar esta questão, que é prévia, deve fazer-se uma síntese dos elementos relevantes para a apreciação da mesma:
Assim:
- Nos autos foi deduzida pela interessada reclamação à relação de bens apresentada pelo cabeça de casal e cointeressado ex-cônjuge;
- Tal reclamação foi objeto de decisão judicial em sede de audiência designada nos autos, com parcial procedência e parcial remessa dos interessados para os meios comuns;
- Desta decisão as partes não recorreram;
- Foi designada data para conferência de interessados e, na véspera da sua realização (de acordo com o que consta do despacho proferido em ata, sendo que, em termos de registo eletrónico, a data é até coincidente com o desta conferência) a interessada apresentou requerimento;
- Concluiu esse requerimento da seguinte forma:
Termos em que se requer a exclusão da Relação de Bens das verbas n.ºs 1, 2 e 3 e, consequentemente, a remessa para os meios comuns para discussão da natureza dos bens que compõem tais verbas, com as demais consequências legais daí decorrentes.
- O contraditório quanto ao mesmo foi exercido na própria sede de conferência de interessados;
- Ainda nessa sede foi objeto de decisão cujo teor é de não admissão de reclamação por extemporânea;
- Diz a recorrente nas suas alegações que o Mm.º Juiz a quo não terá equacionado devidamente a situação em apreço e não terá feito correta leitura e interpretação do teor do requerimento, uma vez que a recorrente não veio apresentar nova reclamação e veio suscitar a questão da inolvidável importância do valor do terreno em que a moradia.
Quer isto dizer, portanto, que a recorrente pretende que seja considerado que o requerimento apresentado se ateve a um simples pedido de avaliação (e não a uma reclamação à relação de bens, como qualificado pelo despacho recorrido).
É manifesta a falta de sustentação desta posição da recorrente que, na verdade, pode até ser qualificada de ostensiva argumentação desfasada da verdade.
É claro, da simples análise da conclusão do requerimento apresentado, que não se ateve sequer à verba n.º 1, compreendendo as verbas n.ºs 1 a 3, e que não constitui um qualquer pedido de avaliação, antes uma solicitação de remessa dos interessados para os meios comuns.
A questão da valorização do imóvel que faz verba n.º 1, e a argumentação relativa à consideração do prédio rústico onde está implantada a moradia que integra tal verba, é apresentada a mero título de fundamento, ou argumento, não constituindo qualquer pretensão expressamente delimitada nos autos.
Decorre das asserções anteriores uma primeira conclusão – o recurso apresentado constitui como que um desvio processual face à pretensão deduzida e indeferida pelo despacho recorrido.
Em termos simples, a interessada aqui recorrente deduziu um requerimento de reclamação à relação de bens, corretamente qualificado como tal pelo Mm. Juiz a quo, que não o admitiu por extemporaneidade, vindo em sede de recurso pretender pôr em crise uma decisão de putativo indeferimento de um pedido de avaliação.
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Assim iluminado o recurso em apreço, emerge, liminarmente, uma questão derivada da primeira – saber se se pode sequer considerar que o recurso é apto a produzir a sua natural finalidade impugnatória de uma decisão.
Assim, se se considerar que a recorrente não pôs sequer em causa o objeto da decisão de que terá querido pôr em causa, antes deduzindo uma putativa pretensão recursória relativa a uma questão que não foi sequer decidida, a questão de aptidão do recurso poderia constituir-se como verdadeira matéria de admissibilidade.
Entende-se, todavia, que tendo a interessada recorrente argumentado no requerimento deduzido (objeto da decisão recorrida), acerca do valor da verba n.º 1, manifestando expressa discordância quanto ao mesmo, a pretensão de avaliação do mesmo pode aí ser comportada e, nessa medida, o despacho recorrido produziu também uma função de indeferimento de tal pretensão e, consequentemente, confere objeto útil ao presente recurso.
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As considerações anteriores, se permitem afirmar a existência de um objeto para o presente recurso, impõem, por outro lado, a inexorável conclusão de formação de caso julgado formal quanto à inclusão das verbas n.ºs 1 a 3 na relação de bens.
O tribunal a quo declarou a intempestividade do requerimento de reclamação e a recorrente não questionou, pelo presente recurso (e, pelo contrário, expressamente aceitou, ainda que usando o tal desvio qualificativo) tal conteúdo decisório.
Em todo o caso, para o que ora releva, está definitivamente assente nos autos que as verbas 1 a 3 da relação de bens se mantêm relacionadas, questão sobre que se formou caso julgado no processo (acerca de caso julgado formal, cfr. acórdãos (ac.) do Supremo Tribunal (STJ) de 8/3/2018, Fonseca Ramos; do STJ 19/9/24, Graça Trigo; da Relação de Évora de 23/11/23, Manuel Bargado e desta Relação de 22/6/2026, Conceição Gomes e 16/12/2020, Leopoldo Soares, todos em ecli.pt).
Refira-se que no primeiro destes arestos é dito, de forma muito apropriada à situação sub judice que o pressuposto essencial do caso julgado formal é que uma pretensão já decidida, em contexto meramente processual, e que não foi recorrida, seja objecto de repetida decisão.
Na medida em que nada foi posto em causa pela recorrente, esta questão está definitivamente encerrada, sem necessidade de maiores considerações (sempre o estaria, como decidido no despacho em causa, há muito tendo sido ultrapassados os prazos de reclamação).
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b) A invocada necessidade de avaliação da verba n.º 1:
Ultrapassada a questão do objeto recursivo e delimitando-o a uma impugnação da decisão de não admissão de avaliação de uma verba em sede de conferência de interessados, impõe-se agora, também quanto a esta questão, ressaltar os elementos pertinentes dos autos.
Assim:
- O imóvel que constitui a verba n.º 1 foi relacionado pelo cabeça-de-casal pelo seu valor patrimonial;
- Sobre o seu relacionamento e valor não foi deduzida reclamação pela interessada aqui recorrente (que deduziu reclamação, com diferente objeto);
- Foi requerida pelo cabeça-de-casal avaliação pericial a esta verba, que veio a ser determinada;
- Foi realizada essa avaliação pericial;
- A interessada requereu prestação de esclarecimentos ao perito, cujos foram determinados e apresentados;
- Os interessados nada disseram face a tais esclarecimentos;
- Não foi proferido despacho de fixação de valor da verba n.º 1;
- Foi designada data para conferência de interessados;
- Nesta, os interessados chegaram a acordo parcial e foi determinada diligência de avaliação de outros bens móveis;
- Quanto ao imóvel que faz verba n.º 1, o despacho recorrido não concluiu por um indeferimento de qualquer pedido de avaliação, qualificando o requerido como reclamação à relação de bens e declarando-a intempestiva;
- Da fundamentação do despacho consta, além do mais, o seguinte:
Ainda assim o Cabeça de Casal indica que de facto a avaliação levou em consideração toda a área do terreno onde está implantado o imóvel, pelo que não se pode afirmar que não foi feita a avaliação porque foi e está incluída no valor do imóvel.
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Se se considerar, como considerou, que o Mm. Juiz a quo bem andou ao qualificar e tratar o requerimento como reclamação à relação de bens, mas se considerar também que, a despeito do supra referido desvio do objeto do recurso face ao teor da decisão, terá que se concluir, de modo equivalente que o despacho recorrido.
Assim, na medida que o despacho refere expressamente uma avaliação da verba pré-realizada nos autos, a decisão também comporta esta dimensão de não admissão de nova avaliação pericial, que não é refletida no seu dispositivo por se mostrar prejudicada pela qualificação como reclamação (que é, repete-se, correta).
Em termos simples, o que o tribunal a quo decidiu foi não admitir a reclamação à relação de bens, por extemporânea, não deixando de fazer um juízo subsidiário no sentido de não ser admissível a avaliação da verba n.º 1, em qualquer caso, por já ter sido realizada nos autos e não colher a invocação de não ter sido considerado o valor do prédio rústico onde foi implantada (que era o fundamento material do pedido de avaliação).
Diga-se, a latere, que também a materialidade do pedido de avaliação traduz precisamente a prevalência da natureza de reclamação à relação de bens do requerimento apresentado pela interessada - sustenta, antes de mais, que o prédio rústico em que foi implantado o urbano é bem próprio (matéria de reclamação), dizendo depois, de forma meramente lateral e subsidiária, que o valor desse prédio rústico preexistente deveria ter sido computado autonomamente (matéria de avaliação).
Diga-se, ainda a latere, que o tribunal expressamente tratou desta questão considerando que a invocação não tem sustentação material e que a perícia realizada tratou a questão do valor do prédio preexistente.
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Estabelecidas as bases de decisão, cumpre considerar o teor da apelação – saber se deveria, ou não, o tribunal ter decidido a avaliação da verba n.º 1.
O atual art.º 1114.º n.º 1 do CPC, na medida em que traduz uma permissão legal ampla à realização de avaliação de verbas relacionadas, parece compreender uma pretensão deste tipo.
Assim, diz este preceito que até à abertura das licitações, qualquer interessado pode requerer a avaliação de bens, devendo indicar aqueles sobre os quais pretende que recaia a avaliação e as razões da não aceitação do valor que lhes é atribuído.
Esta permissão ampla vem sendo, diga-se, reconhecida pela jurisprudência, admitindo de forma irrestrita pedidos de avaliação formulados em sede de conferência de interessados (a propósito, ac. Relação de Guimarães de 30/6/2022, Moreira Dias, ecli.pt).
Importa, todavia, também a este propósito repescar o que acima se disse acerca da formação de caso julgado formal.
A avaliação da verba n.º 1 não foi suscitada no processo apenas na sede de conferência, fora-o muito antes, ainda antes da realização de audiência prévia nos autos.
O tribunal recorrido, illo tempore, deferiu a realização de avaliação, tendo sido realizada perícia, cujo resultado foi notificado às partes e do qual, inclusivamente, a interessada ora recorrente solicitou prestação de esclarecimentos (e não reclamou).
Os esclarecimentos solicitados foram prestados pelo perito e quanto ao seu teor a interessada nada disse (sendo que o cointeressado cabeça-de-casal se pronunciara expressamente pela concordância com o teor da avaliação realizada).
Estas considerações só podem impor uma conclusão – a de que a norma do art.º 1114.º tem que ser interpretada no sentido de a avaliação a realizar deve incidir sobre verbas não avaliadas previamente no processo.
Diga-se que o correto enquadramento da questão, neste caso, não será de uma situação de formação de caso julgado formal em sentido próprio, na medida em que não foi proferido qualquer despacho nos autos que tenha expressamente fixado um valor à verba em causa (a propósito de caso julgado formal em sede de processo de inventário, cfr. acórdão desta Relação de 27/10/2016, Ondina Carmo Alves, ecli.pt)
Por outro lado, realizada uma perícia nos autos, com a qual as partes se conformaram, não deve conceder-se qualquer campo de aplicação ao art.º 1114.º do CPC, no caso.
Poderia considerar-se o pedido formulado como uma pretensão de realização de segunda perícia, ex vi art.º 487.º n.º 1 do CPC.
Se assim fosse, além de desrespeitar o prazo estabelecido neste preceito (dez dias), sempre teria que se afirmar um claro desrespeito pela fundamentação imposta para uso desta faculdade, que impõe esta questão está encerrada esta questão está encerrada uma alegação fundada das razões de discordância em relação à primeira perícia.
A recorrente sequer refere a perícia realizada e nada alude quanto ao seu teor, sendo que, como consta da decisão recorrida, é claro que esta considerou todo o prédio avaliado.
Restaria a possibilidade, que não deve ser afastada e, pelo contrário, admitida pela ratio do preceito, de pedido de realização de nova avaliação do bem, desde que apresentadas razões fundadas que sustentassem uma desatualização da avaliação realizada ou, mais genericamente, circunstâncias supervenientes que impusessem nova avaliação.
Não é essa a pretensão da parte que, em termos simples, veio dizer que a avaliação efetuada não foi corretamente feita (sendo que não reclamou da mesma, solicitou esclarecimentos, estes foram prestados e sobre os mesmos nada disse).
Quer isto dizer, em conclusão, que a avaliação está feita nos autos e o pedido apresentado traduziria uma simples repetição de um ato processual.
Realizada nos autos a perícia, não haverá lugar à mesma, devendo o art.º 1114.º ser racional e teleologicamente interpretado de forma a conceder um amplo direito a solicitar realização de avaliação de bens, desde que não previamente realização a sua avaliação pericial nos autos, ou em que não sejam apresentadas razões sustentadas para estabelecer a conclusão de desatualização da avaliação realizada.
Não sendo essa a situação em apreço, deve manter-se a decisão recorrida.
É o que se decide. –
-- III. Decisão:
Face ao exposto, nega-se a apelação, mantendo-se a decisão recorrida.
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Custas pela apelante
Notifique-se e registe-se. –
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Lisboa, 13-02-2025
João Paulo Vasconcelos Raposo
Paulo Fernandes da Silva
Laurinda Gemas