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EXPROPRIAÇÃO POR UTILIDADE PÚBLICA
COMPARÊNCIA DOS PERITOS EM AUDIÊNCIA
Sumário
I - O disposto no artigo 486 do atual Código de Processo Civil é aplicável ao processo de expropriação. II - Aliás, essa aplicação, que sempre seria de considerar, decorre do disposto no artigo 61, n.º 3 do Código das Expropriações, que expressamente prevê a aplicação do disposto no (anterior) artigo 588 do Código de Processo Civil, o qual corresponde, exatamente, ao atual artigo 486. III - Por ser assim, as partes podem sempre pedir a comparência dos peritos em audiência, com vista a prestarem esclarecimentos. IV - Tendo-se decidido, em violação daquele normativo, o indeferimento da comparência dos peritos, requerida pelos expropriados, a revogação desse despacho implica a anulação de todos os atos posteriores, incluindo a sentença final.
Texto Integral
Processo n.º 2272/22.0T8STS.P1
Relator – José Eusébio Almeida
Adjuntos: Carlos Gil e Fernanda Almeida
Os juízes subscritores acordam na 3.ª Secção Cível (5.ª Secção) do Tribunal da Relação do Porto: I - Relatório
Nos presentes autos em que a I.P. – INFRAESTRUTURAS DE PORTUGAL, SA é beneficiária da expropriação e AA e BB são expropriados, os anteditos recorreram da decisão arbitral que fixou os montantes indemnizatórios em 19.059,25€ e em 40.702,70€, com referência, respetivamente, às parcelas n.º ... e ....
Alegaram, sumariamente, que: (i) Justifica-se a aplicação de uma majoração do rendimento fundiário nunca inferior a 15%; (ii) Tem de ser valorado o aproveitamento do mato que é retirado após o corte do eucalipto; (iii) O PDM confere aos solos com classificação de Espaço Florestal potencialidades construtivas; (iv) Na parcela n.º ... existiam, sensivelmente, 601 eucaliptos que tinham de ser contabilizados e na n.º ... 1.434 eucaliptos que também tinham de ser contabilizados; (v) Com referência à parcela n.º ..., considera-se reunidos os pressupostos a expropriação da parcela sobrante, a sul, o que se requer, ou não sendo possível, a fixação de uma desvalorização que não pode ser fixada em menos de 80% do valor do solo. Concluíram, propugnando a fixação de indemnizações em valores superiores aos constantes da decisão arbitral.
Foi proferido despacho de admissão do recurso e a beneficiária da expropriação respondeu, declarando concordar com a expropriação da parcela sobrante e propugnando pela improcedência do demais peticionado; por outro lado, interpôs recurso subordinado, sustentando a fixação da indemnização para as parcelas n.º ... e ... de 14.605,00€ e de 28.660,00€, respetivamente.
Os expropriados responderam ao recurso, sustentando a sua improcedência.
Efetivou-se a avaliação pericial das parcelas expropriadas. Junto o laudo pericial, foram pedidos esclarecimentos e, após estes, os expropriados requereram a realização da audiência de julgamento, visando a tomada de declarações aos peritos [(...) notificados do relatório complementar, vêm, por entender que subsistem questões carecidas de devido esclarecimento (designadamente dentre as já suscitadas na reclamação precedente, que não foram efetivamente respondidas), solicitar a realização de audiência de julgamento, tendo em vista permitir a obtenção de esclarecimentos orais por parte de todos os Senhores Peritos, o que se pugna deferido por apelo ao estatuído no artigo 486.º do C.P.C.], tendo o tribunal recorrido, por despacho de 20.02.24, indeferido o requerido [Os Expropriados arrolaram testemunhas em sede do recurso e peticionaram a prestação de esclarecimentos periciais na audiência. * Em convergência com o vertido no art. 64.º/1, do Código das Expropriações, concluídas as diligências de prova, as partes são notificadas para alegarem no prazo de 20 dias. Efetivando-se a densificação do citado preceito, à luz de uma hermenêutica teleológica e sistemática, enuncia-se que, em sede do processo especial de expropriação, curando-se o recurso judicial como um meio processual de natureza híbrida, concatenando elementos típicos de uma ação com notas distintivas de um estrito recurso, divisa-se apodicticamente da ação de processo comum consignada no Código de Processo Civil. Destarte, na fase judicial do processo de expropriação, ocorre uma cisão entre a fase de instrução probatória e a fase de alegações, linearmente consubstanciada na inexistência de audiência de julgamento e na estatuição de que as alegações são efetivadas por escrito (vd. Acórdão do STJ de 10.7.2012, proc. n.º Processo n.º 157/1999, in datajuris). Acresce que, à luz do consignado no art. 61.º/1 e 2, do Código das Expropriações, a avaliação pericial prefigura-se como a única diligência instrutória imperativa, sendo que os demais atos probatórios devem exarar-se sob o crivo da utilidade para a decisão da causa. (...) Em decorrência do referenciado, in casu, no que se refere às testemunhas arroladas, atentando-se que o objeto da prova no vertente processo de expropriação se atem a uma avaliação técnica da parcela expropriada, fundando-se, essencialmente, em meios de prova documentais e periciais, conclui-se que a audição das preditas testemunhas se afigura linearmente anódina para a descoberta da verdade material e para a boa decisão da causa, sendo que os peritos já prestaram esclarecimentos por escritos, não se vislumbrando fundamento objetivo para a produção de novos esclarecimentos, que os Expropriados tampouco delimitam. Pelo supra exposto, indefere-se o requerido] e determinado a notificação das partes “para alegarem nos termos e para os efeitos do art. 64.º/1, do Código das Expropriações”.
A beneficiária da expropriação alegou [(...) II. A IP aceita o valor unitário do solo fixado na Perícia maioritária de 2,89 €/m2, assim como do valor atribuído à benfeitoria existente na parcela .... III. Aceita também o valor fixado para a parcela sobrante da parcela .... IV. Porém, já não pode aceitar o valor fixado para ambas as parcelas ... e ..., incluindo a sobrante, quanto a perda de produção. V. O critério preconizado pelos peritos de considerar o valor relativo a perda de produção, pelo facto de ter sido interrompido o período de corte, contende com o critério do valor de mercado do bem, que é o que assume a primazia no direito das expropriações quanto ao cálculo do valor do bem. VI. Numa situação normal de mercado, não tem influência no valor do bem o facto de a produção estar em fase inicial, intermédia ou final. VII. Além de que os lucros cessantes não são contabilizados na indemnização devida pela expropriação, não tendo sido previstos pelo legislador, já que se considera que o valor de mercado é o que deve prevalecer. VIII. De facto, este “eventual” prejuízo encontra-se inclusivamente já contabilizado no cálculo do valor do solo, em face dos parâmetros adotados para a sua determinação, como sejam, rendimento, encargos, preços de venda do material lenhoso, taxa de capitalização etc. IX. Assim sendo, entendemos que V. Exa. deverá aderir ao laudo pericial maioritário, o qual beneficia de uma presunção de imparcialidade e competência. X. Deduzindo, porém, o valor atribuído quanto a perda de produção, o qual não viola as normas do Código das Expropriações. XI. Nestes termos, deverá a sentença fixar o valor global de 55.967,27€ para as parcelas ... e ..., onde se inclui a parcela sobrante (...)] tal como também o fizeram os expropriados [1. Primeiramente importa deixar expressa a nossa discordância quanto ao facto de V.ª Ex.ª, por despacho de 20 de fevereiro de 2024 ter indeferido a prova testemunhal arrolada pelo expropriados, bem como a prestação dos esclarecimentos orais solicitados aos senhores Peritos. 2. No que respeita à prova testemunhal tal deve tratar-se de um lapso, uma vez que os Expropriados não arrolaram qualquer testemunha. 3. Mas já no que respeita à presença dos senhores peritos em audiência de julgamento para prestarem oralmente esclarecimentos, tal foi requerido pelos Expropriados, a 10 de janeiro de 2024, em virtude de no entender dos expropriados subsistirem dúvidas quanto aos mecanismos e métodos de avaliação das parcelas que interessava ver esclarecidos pelos senhores Peritos. 4. Ora, é face a esta necessidade de ver esclarecidas questões que importam na avaliação das parcelas expropriadas que os expropriados requereram novos esclarecimentos, com o intuito de verem supridas as deficiências existentes no laudo pericial. 5. Daí que entendamos que as diligências de prova não deviam ter sido dadas como findas (...) 27. Enquanto os peritos subscritores da posição maioritária, consideraram ser de prever uma produção média de 17 ton/ha/ano, e um preço médio de venda do material lenhoso de € 40,00 por tonelada, ao que aplicaram ainda um custo de construção de 15 % do valor da produção e uma taxa de capitalização de 2%. 28. O Perito indicado pelos expropriados previu antes uma produção de 21 m2/ha/ano, que estimou ser de 30 anos, com uma previsão de 3 cortes e um custo de instalação de 1500,00/há. 29. Acabando por chegar a um valor unitário de € 3,50 por m2 para cada uma das parcelas. 30. O senhor perito acabou ainda por divergir dos demais peritos por ter considerado a perda de produção que os expropriados tiveram ao terem perdido a produção do segundo corte como explica no seu relatório. 31. (...) o senhor perito fez o reporte dessa perda de produção à data da DUP, chegando ao valor de € 4 189,50. 32. A perda desse rendimento é evidente e uma consequência direta da expropriação pelo que é da maior justiça que seja consagrada na indemnização. 33. Ademais, considerou ainda um outro prejuízo, que decorre da perda de uma quota parte do investimento inicial. Isto porque, o proprietário fez um investimento inicial para transformar aquela plantação de eucaliptos numa plantação organizável e rentável, e vê a sua produção interrompida pela expropriação (...) 38. A discordância na avaliação dos senhores peritos reside nos métodos utilizados e que conduzem a valores distintos entre os senhores peritos e árbitros. (...) 41. E no caso das parcelas que se tratavam de exploração florestal preparada de raiz para o efeito, onde foi aplicado investimento para ser uma exploração organizada e destinada a ser rentável, mais sentido faz que sejam atendidas todas as potencialidades e valências do solo. 42. E, na falta de tal previsão na avaliação subscrita pelos peritos maioritários, os Expropriados tentaram ver esta questão tratada em sede de esclarecimentos, mas ao invés de ponderarem sobre o assunto e responderem, os senhores Peritos limitaram-se a afastar a questão. 43. Apenas o perito minoritário acabou por reconhecer que considerou na avaliação que levou a cabo tal factualidade. 44. Ora, não pode este Tribunal dar guarida a este tipo de postura por parte dos senhores Peritos, e no caso, deverá afastar-se da avaliação feita pelos senhores Peritos, ainda que sendo posição maioritária (...) 45. Um outro aspeto que merece ser objeto de uma atenção especial é respeitante à produção estimada (...) tanto os árbitros como os peritos do laudo maioritário estimam uma produção de 17 toneladas por hectare e por ano. Mas fazem-no sem justificar tal produção, sem deixar demonstrado qualquer fundamento para que nos leve a perceber o porque deste valor. 46. A propósito, o perito subscritor da posição minoritária, aptou por uma produção de 21 toneladas. Mas ao invés justifica esta produção, apresentando os cálculos que acabam por ser coincidentes – o que demonstra a exatidão desta produção e parca a apresentada pelos demais peritos – com o número de árvores que na vistoria são descritas como existentes em cada uma das parcelas. 47. De onde se depreende que também nesta matéria se verificam falhas na avaliação do laudo maioritário, devendo V.ª Ex.ª afastar também aqui este critério de avaliação, aplicando antes o valor de produção adotado pelo perito minoritário. 48. Igualmente não poderá deixar-se descurada a consagração das perdas de produção e dos demais prejuízos sofridos em consequência da expropriação e que foram, e bem, previstas pelo perito indicado pelos expropriados. 49. O que nos leva a concluir que a avaliação nos moldes por si subscritos é aquela que melhor permite a fixação de uma indemnização justa].
De seguida, veio a ser proferida sentença com o seguinte dispositivo: “Pelo supra exposto, julga-se o recurso da decisão arbitral interposto pelos Expropriados parcialmente procedente e o recurso subordinado da Expropriante totalmente improcedente e, consequentemente, decide-se: A) Condenar a Expropriante I.P. – INFRAESTRUTURAS DE PORTUGAL, S.A. a pagar aos Expropriados AA e marido BB o montante indemnizatório de €23.860,06 (vinte e três mil oitocentos e sessenta euros e seis cêntimos) pela expropriação da parcela n.º ..., quantia atualizada de acordo com a evolução do índice de preços do consumidor, desde a data da declaração da utilidade pública até à data do trânsito em julgado da presente sentença; B) Condenar a Expropriante I.P. – INFRAESTRUTURAS DE PORTUGAL, S.A. a pagar aos Expropriados AA e marido BB o montante indemnizatório de €44.740,67 (quarenta e quatro mil setecentos e quarenta euros e sessenta e sete cêntimos) pela expropriação da parcela n.º ..., quantia atualizada de acordo com a evolução do índice de preços do consumidor, desde a data da declaração da utilidade pública até à data do trânsito em julgado da presente sentença; C) Condenar a Expropriante e os Expropriados no pagamento das custas processuais em função do respetivo decaimento nas quotas respetivas de 1/3 e 2/3”, posteriormente, e na sequência da invocação de erro material, retificada quanto à alínea “A) Condenar a Expropriante I.P. – INFRAESTRUTURAS DE PORTUGAL, S.A. a pagar aos Expropriados AA e marido BB o montante indemnizatório de €22.060,06 (vinte e dois mil e sessenta euros e seis cêntimos) pela expropriação da parcela n.º ..., quantia atualizada de acordo com a evolução do índice de preços do consumidor, desde a data da declaração da utilidade pública até à data do trânsito em julgado da presente sentença”.
II – Dos Recursos II.I – Recurso dos expropriados
Inconformados, os expropriados interpuseram recurso. Pretendem que venha a “ser considerada nula a sentença recorrida por não ter conhecido de questões que devia ter conhecido. Sem prescindir, e caso não seja o entendimento de V. Exas., deve ser alterada a matéria de facto nos termos requeridos no presente recurso e, concomitantemente, ser ordenada a avaliação das parcelas expropriadas de acordo com as verdadeiras características das parcelas, tendo por atenção os valores que vão ser pagos aos expropriados no negócio recentemente realizado. Por fim, e subsidiariamente, deverá a sentença recorrida ser revogada e avaliadas as parcelas expropriadas de acordo com os parâmetros definidos no laudo minoritário por se tratar de elemento técnico mais fundamentado e detalhado e que mais se adequa às parcelas expropriadas”. Para tanto, apresentaram as seguintes Conclusões:
I - Os recorrentes discordam da sentença proferida, entendendo que a mesma, em determinados segmentos, merece a sua crítica.
II - Na verdade, os presentes autos de expropriação têm, como objeto central, a discussão sobre qual deva ser a justa indemnização devida pela ablação de duas parcelas dos recorrentes, discussão essa que nos solicita, em termos simplistas, a resolução de duas questões nucleares, reportadas ora à classificação, ora à avaliação, do bem expropriado.
III - Mas também porque entendemos que a sentença recorrida é nula por o tribunal ter deixado de conhecer de questões suscitadas pelos expropriados e que o tribunal não conheceu, nem analisou na sentença aqui posta em crise.
IV - Falamos de não ter admitido a audição dos senhores peritos em audiência de julgamento para prestarem esclarecimentos suscitados pelos expropriados e que importava ver prestados por terem interferência direta na avaliação das parcelas expropriadas.
V - E porque diziam respeito a matéria controvertida, matéria técnica que importava ver detalhada e bem fundamentada e só seria possível depois de ouvidos os senhores peritos.
VI - O Tribunal limitou assim a possibilidade de defesa dos expropriados, ignorando o seu pedido.
VII - Mais, da análise da matéria de facto dada como provada resulta também que o tribunal selecionou matéria que não são factos, mas parâmetros de avaliação aos quais aderiu, e como tal não podem constar como matéria assente. São o caso dos pontos 16 a 22 que têm de ser eliminados.
VIII - Por sua vez, têm de ser aditados muitos outros factos, estes sim factos que foram aceites pelas partes, fazendo parte também do auto de vistoria ad perpetuam rei memoriam, como deixamos expresso no ponto 31.º destas alegações, nomeadamente devem ser aditados os factos expressos nas alíneas a) a g) do mencionado artigo.
IX - Igualmente deve ser aditado um outro facto que foi aceite quer pelos senhores árbitros, como por todos os senhores Peritos que é o facto “das parcelas se encontrarem classificadas em “Espaço Canal – Variante EN ...”.
X - Isto dito, cremos estar inquinado o raciocínio do tribunal quando tem por adquirida a premissa quanto à não verificação de alguma das alíneas identificadas no n.º 2 do artigo 25.º do C.E., algo que se compreende por não ter dado como provados todos os factos que constam dos autos.
XI - Isto porque se atentassem a todos os factos cujo aditamento requeremos que seja determinado, conseguia ter tido a noção plena que o solo das parcelas expropriadas não é um simples solo florestal como estamos habituados a ver em zonas interiores e longínquas, sem acessos, e que se localizam em penhascos, cujo valor irrisório se justifica.
XII - No caso destas parcelas expropriadas trata-se de solos junto a grandes centros urbanos como as cidades da Maia, Matosinhos ou Porto, com acessos a arruamentos públicos diretos, que beneficiam da proximidade de infraestruturas, o que por si só os torna terrenos com potencialidades próprias, e com um valor bem diferente dos terrenos descritos.
XIII - Tratam-se de características que implicam a majoração dos solos.
XIV - Daí que tais características não podiam ter sido deixadas de conhecer por parte dos senhores Peritos, nem muito menos por parte do douto julgador.
XV - E esta injustiça ainda se torna maior quando os expropriados celebraram recentemente um contrato-promessa de compra e venda de dois terrenos vizinhos dos aqui expropriados, exatamente com as mesmas características, e onde lhes vai ser pago o valor por m2 acima dos 15,00€.
XVI - O tribunal recorrido não podia ter deixado de avaliar as parcelas expropriadas contemplando todas as suas características sob pena de se afastar de uma indemnização que tem de ser justa para os expropriados.
XVII - Ainda assim, e relativamente à avaliação seguida nos autos, importa referir que a do laudo maioritário peca por defeito. Desde logo porque considera uma produção média muito aquém da produção possível e adequada ao tipo de solos. No caso, é muito mais consentânea e resulta devidamente fundamentada, a produção prevista pelo senhor perito minoritário.
XVIII - O mesmo se diga quanto à previsão de uma indemnização pela perda de produção que os expropriados sofreram com a expropriação ao terem perdido a produção de segundo corte em virtude da expropriação.
XIX - Esta perda é uma realidade e uma decorrência direta da expropriação pelo que tinha de ser atendida, devendo também aqui ser revogada a sentença recorrida.
XX - O mesmo se diga quanto à perda de rendimento e a perda decorrente do investimento que os expropriados tiveram para organizar os seus terrenos, para os reflorestar, para os colocar produtivos e rentáveis.
XXI - Daí que se entenda mais adequada a avaliação do laudo minoritário que não atendendo a todas as circunstâncias das parcelas expropriadas, nem a todas as suas reais potencialidades, ainda assim contempla decorrências próprias da expropriação que não foram consideradas pela sentença recorrida.
XXII - O mesmo se diga quanto à parcela sobrante, cuja valorização tem de atender ao mesmo modo de avaliação, revogando-se igualmente a sentença recorrida.
Nestes termos e nos melhores de Direito deve o presente recurso ser julgado provado e procedente e, consequentemente ser considerada nula a sentença recorrida por não ter conhecido de questões que devia ter conhecido. Sem prescindir, e caso não seja o entendimento de V. Exas. deve ser alterada a matéria de facto nos termos requeridos no presente recurso e, concomitantemente, ser ordenada a avaliação das parcelas expropriadas de acordo com as verdadeiras características das parcelas, tendo por atenção os valores que vão ser pagos aos expropriados no negócio recentemente realizado. Por fim, e subsidiariamente, deverá a sentença recorrida ser revogada e avaliadas as parcelas expropriadas de acordo com os parâmetros definidos no laudo minoritário por se tratar de elemento técnico mais fundamentado e detalhado e que mais se adequa às parcelas expropriadas.
A beneficiária da expropriação respondeu ao recurso dos expropriados, e, defendendo a sua improcedência, concluiu:
I - Os expropriados insurgem-se quanto à sentença, alegando que a mesma é nula porque o tribunal não admitiu a prestação de esclarecimentos orais pelos Srs. Peritos nem tão pouco se pronunciou sobre esse motivo.
II - Ora, não se afigura justificável a pretensão dos expropriados, já que os Peritos se pronunciaram sobre os esclarecimentos que por aqueles foram solicitados, não se vislumbrando motivos para que fossem ouvidos presencialmente.
III - Foi assim indeferido o pedido de esclarecimentos presenciais, pois nada mais havia a acrescentar, mostrando-se totalmente inútil a audiência de peritos.
IV - A sentença classificou corretamente a parcela como solo para outros fins, como não poderia deixar de ser, pois outra classificação não era possível à data da DUP .
V - Contrariamente ao que é alegado pelos expropriados, também o Perito por estes designados classificou a parcela como solo para outros fins, verificando-se, assim, existir uma unanimidade global entre peritos e árbitros quanto à classificação do solo.
VI - Argumentam ainda os expropriados que as parcelas se destinam à produção florestal porque os seus proprietários assim o decidiram e que a todo o momento a proximidade de acessos públicos e infraestruturas permitirá alterar este uso e destino.
VII - Ora, tal é descabido, já que ao longo dos últimos 20 anos, nada se alterou no local das parcelas, o qual é caraterizado por uma ocupação florestal densa e fortemente solidificada ao longo dos tempos, não se perspetivando que viesse a ser alterada.
VIII - Alegam que este tipo de terrenos florestais, idênticos aos das parcelas têm de ser avaliados a um valor unitário próximo de 3,00€/m2, esquecendo-se que assim foi, pois, os peritos maioritários fixaram o valor de 2,89€/m2, ao qual aderiu a sentença e a expropriante.
IX - Numa tentativa vã de exponenciar o valor fixado para as parcelas, juntam dois contratos promessa de compra e venda, recentemente celebrados, posteriores à DUP, alegando que estes dois terrenos são semelhantes e próximos dos das parcelas.
X - Numa primeira análise dir-se-á que tais documentos em nada relevam, pois a avaliação das parcelas deve reportar-se à data da publicação da DUP, o que não é o caso!
XI - Por outro lado, trata-se de um contrato-promessa de compra e venda, desconhecendo-se os eventuais interesses das partes que motivaram a realização da negócio e a fixação de tal valor.
XII - Além de que são terrenos que têm distintas características.
XIII - Por último, mesmo que se dê por credíveis tais valores, tal pode comprovar algo que era expectável, que é uma valorização dos terrenos nas proximidades da obra rodoviária, por força da existência desta!
XIV - E conforme dispõe o artigo 23.º/2/a) do C.E: “Na determinação do valor dos bens expropriados não pode tomar-se em consideração a mais-valia que resultar: a) Da própria declaração de utilidade pública da expropriação”.
XV - Pretendem os expropriados, sem qualquer fundamentação, que seja atendida a posição minoritária do Perito por eles indicado, a qual notoriamente se afasta dos restantes peritos, com vista a exponenciar, com parcialidade, a indemnização a atribuir.
XVI - Quanto à metodologia e parâmetros a aplicar para determinação do valor unitário do solo, remete-se para a argumentação constante das alegações de recurso da IP.
II.II – Recurso da beneficiária da expropriação
Pretendendo a revogação da sentença e invocando um erro material (oportunamente apreciado em primeira instância) a beneficiária da expropriação veio, igualmente, apelar, tendo apresentado as seguintes Conclusões:
I - O cálculo da indemnização da parcela ..., constante da sentença, padece de erro material, já que se encontra somado, duas vezes, o valor das benfeitorias.
II - O valor de 22.060.06€ já continha a indemnização das benfeitorias, sendo a este adicionado novamente o valor das benfeitorias (1.800,00€).
III - Deste modo, deverá ser corrigida a indemnização calculada para a parcela ..., a qual, de acordo com os fundamentos da sentença, corresponde a 22.069,06€.
IV - No caso, a perícia suscita questões de direito com relevância para o cálculo do valor do bem expropriado o que implica que o julgador não esteja vinculado a uma mera subscrição do laudo.
V - A matéria controvertida não exige conhecimentos especiais fora do alcance de quem não disponha de formação técnica.
VI - Referem os peritos que deverá ser atribuído valor relativo a perda de produção, pelo facto de ter sido interrompido o período de corte.
VII - Ora, tal critério contende com o critério do valor de mercado do bem, que é o que assume a primazia no direito das expropriações quanto ao cálculo do valor do bem.
VIII - Numa situação normal de mercado, não tem influência no valor do bem o facto de a produção estar em fase inicial, intermédia ou final.
IX - Além de que os lucros cessantes não são contabilizados, não tendo sido previstos no Código das Expropriações, já que considera que o valor de mercado deve prevalecer.
X - E que se for pago tal valor, o expropriado poderá adquirir outro bem semelhante.
XI - De facto, este “eventual” prejuízo encontra-se inclusivamente já contabilizado no cálculo do valor do solo, em face dos parâmetros adotados para a sua determinação, como sejam, rendimento, encargos, preços de venda do material lenhoso, taxa de capitalização, etc.
XII - Além de que, nos termos do artigo 23.º do C.E, a indemnização corresponde ao valor real e corrente do bem, de acordo com as circunstâncias de facto à data da DUP.
XIII - Ou seja, o valor da parcela é calculado à data da publicação da DUP, no estado em que a mesma se encontrava.
XIV - Acresce que o expropriado teve a possibilidade de promover o corte do material lenhoso, antes da posse administrativa, beneficiando do seu valor à data da DUP.
XV - Pelo que não deve ser contabilizado o valor atribuído quanto a perda de produção.
XVI - Nestes termos, deverá a sentença fixar o valor global de 55.967,27€ para as parcelas ... e ..., onde se inclui a parcela sobrante a sul da parcela ..., o qual corresponde ao valor real e corrente da indemnização a atribuir à data da DUP.
Os expropriados responderam ao recurso, sustentando a sua total improcedência, “e nessa decorrência mantida a sentença naquilo que é o segmento por aquela via impugnado”.
Os recursos foram recebidos nos termos legais, ocasião em que se procedeu à retificação – já supra considerada - do dispositivo da sentença [(...)a sentença proferida nos autos, afere-se que a mesma indexou o quantum indemnizatório de €23.860,06 à parcela n.º ..., porém, conclui-se que a soma dos parâmetros avaliativos descritos em 17) incorreu numa inexatidão, i.e., enunciou-se €22.060,06, sendo que o valor correto se reconduz a €20.260,06, o qual aditado ao montante fixado para a benfeitoria de €1.800,00, perfaz o total de €22.060,06. Cura-se de um cristalino lapso material de escrita, revelado no contexto da sentença, postulando-se a exigível retificação].
Os autos correram Vistos e nada se observa que obste ao conhecimento dos recursos, cujo objeto, atentas as conclusões dos apelantes, se traduz em saber, no recurso dos expropriados, se a) A sentença é nula “por o tribunal ter deixado de conhecer de questões suscitadas pelos expropriados e que o tribunal não conheceu, nem analisou na sentença”, concretamente ao “não ter admitido a audição dos senhores peritos em audiência de julgamento para prestarem esclarecimentos”; se b) deve ser alterada a decisão relativa à matéria de facto, por não serem factos o assinalado nos pontos 16 a 22, devendo outros (que os recorrentes indicam nas alegações serem acrescentados e se c) deve ser alterado (e aumentado) o valor indemnizatório, atendendo-se, porque melhor fundamentado, ao laudo pericial minoritário.
Quanto ao recurso interposto pela beneficiária da expropriação, está em causa saber se, por não ser de considerar a perda de produção, se deverá fixar o valor global de 55.967,27€ para as parcelas, aí se incluindo a parcela sobrante, a sul da parcela n.º ....
III – Fundamentação Se a sentença é nula “por o tribunal ter deixado de conhecer de questões suscitadas pelos expropriados e que o tribunal não conheceu, nem analisou na sentença”, concretamente ao “não ter admitido a audição dos senhores peritos em audiência de julgamento para prestarem esclarecimentos” – Recurso dos expropriados.
Como resulta do relatório deste acórdão, o tribunal recorrido pronunciou-se sobre a pretensão dos expropriados, formulada em requerimento no qual estes pretenderam que o tribunal, em audiência, ouvisse os peritos em esclarecimentos. Fê-lo por despacho, indeferindo essa pretensão e, em simultâneo, determinando a notificação das partes para alegações, nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 64 do Código das Expropriações (CE), notificação essa que pressupõe – como o próprio preceito esclarece, estarem “Concluídas as diligências de prova”.
Os recorrentes, no entanto, sustentam a nulidade da sentença, por falta de conhecimento (análise) daquela pretensão. Omissão esta, necessariamente se pressupõe, ocorrida na própria sentença, porquanto – como também se transcreveu – nas alegações (ao abrigo do citado artigo 64 do CE) os expropriados já haviam manifestado a sua discordância do despacho, antes referido, que indeferiu a pretensão.
O particularismo processual do processo (judicial) expropriativo parece ter – se a expressão nos é permitida – confundido os recorrentes: não obstante as várias alegações possíveis nesse tipo de processo, não nos parece que – contrariamente ao que sucede relativamente ao recurso da decisão judicial – as alegações de que estamos a tratar definam o objeto da sentença.
De todo o modo, parece-nos claro (e interpretativamente evidente) qual seja o objeto da discordância dos apelantes, ainda que, formalmente, vinquem a eventual nulidade da sentença, a qual, sempre estaria sujeita à estrita taxatividade do disposto no artigo 615 do Código de Processo Civil (CPC).
O que está em causa é a decisão do tribunal recorrido, que indeferiu o pedido dos expropriados. E é assim, por razões várias. Primeiro, a eventual nulidade da sentença, não dispensaria este tribunal de recurso de se substituir ao tribunal recorrido, atento o disposto no artigo 665, n.º 1 do CPC; depois, o recurso da decisão/despacho que indeferiu a pretensão dos expropriados – ou que a abranja – pode ser o recurso da decisão final (644, n.º 3 do CPC), uma vez que não se mostra aplicável o disposto no n.º 2, alínea d) do mesmo normativo: não estamos perante a admissão ou rejeição de um meio de prova, tanto mais que, no caso, estamos perante um meio de prova de admissão obrigatória e que foi, naturalmente, admitido. Por último, é inequívoco que a impugnação e discordância dos expropriados tem por objeto, primeiramente, a decisão de indeferimento que já se identificou, e a resposta ao recurso [II - Ora, não se afigura justificável a pretensão dos expropriados, já que os Peritos se pronunciaram sobre os esclarecimentos que por aqueles foram solicitados, não se vislumbrando motivos para que fossem ouvidos presencialmente. III - Foi assim indeferido o pedido de esclarecimentos presenciais, pois nada mais havia a acrescentar, mostrando-se totalmente inútil a audiência de peritos] identifica precisamente esse objeto.
Em suma, o que está em causa é o eventual desrespeito pelo disposto no artigo 486, n.º 1 do CPC: “Quando alguma das partes o requeira ou o juiz o ordene, os peritos comparecem na audiência final, a fim de prestarem, sob juramento, os esclarecimentos que lhes sejam pedidos”.
Comentando o preceito, António Santos Abrantes Geraldes/Paulo Pimenta/Luís Filipe Pires de Sousa [Código de Processo Civil Anotado, Vol. I, 3.ª Edição, Almedina, 2022, pág. 589] não revelam qualquer restrição à possibilidade de comparência dos peritos na audiência final: citam um acórdão deste Tribunal da Relação do Porto que admitiu a reinquição de um perito, por confronto com novos meios de prova e, depois de esclarecem os prazos a cumprir, defendem o mesmo critério “a propósito dos peritos que intervenham em segunda perícia, quando haja lugar à mesma”.
Também Fernando Pereira Rodrigues [Os Meios de Prova em Processo Civil, 4.ª Edição, Almedina, 2024, pág. 150], sem avançar qualquer restrição à pretensão prevista no normativo em análise, refere que “quando alguma das partes o requeira ou o juiz o ordene, os peritos comparecerão na audiência final, a fim de prestarem, sob juramento, os esclarecimentos que lhes sejam pedidos. E, como se disse, mais se justificará a comparência dos peritos em audiência quanto mais discordantes tenham sido entre si quanto ao resultado da perícia, que devendo contribuir para a descoberta da verdade dos factos não tenham atingido tal desiderato”[1].
Quer Miguel Teixeira de Sousa [João Castro Mendes/Miguel Teixeira de Sousa, Manual de Processo Civil, Volume I, AAFDL Editora, 2022, pág. 554] quer José Lebre de Freitas [A Ação Declarativa Comum, 5.ª Edição, 2023, pág. 350] citam o preceito, sem darem nota de qualquer restrição à faculdade aí deferida às partes.
Em comentário ao Código de Processo Civil, José Lebre de Freitas/Isabel Alexandre [Código de Processo Civil Anotado, Volume 2.º, 4.ª Edição/Reimpressão, Almedina, 2021, pág. 340] são mais esclarecedores, dando conta da história do preceito e do seu sentido: “Dispunha o art. 602 do CPC de 1961, antes da revisão de 1995-1996 (equivalente ao art. 606 do CPC de 1939), que os peritos seriam notificados para comparecerem na audiência final (...) O art. 476 do anteprojeto da comissão Varela propôs, em substituição da notificação obrigatória para comparência, uma notificação deixada ao arbítrio do juiz: os peritos poderiam ser notificados. Esta solução foi criticada por RIBEIRO MENDES – LEBRE DE FREITAS, em nome da Ordem dos Advogados, Parecer cit., p. 653, que, defendendo o contacto direto entre os peritos, o juiz e as partes na audiência final, entendiam que os peritos deviam continuar a ser para ela sempre notificados. O art. 460 do projeto da comissão Varela limitou-se a acrescentar ao texto anterior que a comparência podia ser ordenada oficiosamente ou a requerimento de qualquer das partes. O Projeto de Revisão manteve esta proposta, que LEBRE DE FREITAS, Revisão cit., n.º III.2.5, criticou, propondo que se determinasse que a comparência teria de ser ordenada pelo juiz sempre que as partes a requeressem em tempo útil para fazer a notificação dos peritos. Esta sugestão foi aceite pelo DL 329-A/95, pelo que, desde então têm, segundo o n.º 1 do atual art. 486, o dever de comparecer na audiência, mediante notificação para o efeito (art. 251-1), quando alguma das partes o requeira ou o juiz o ordene”.
Em suma, da leitura do disposto no artigo 486 do CPC, conjugada com os comentários doutrinais que antecedem, não se vê como possa indeferir-se a pretensão de alguma das partes na comparência dos peritos para a prestação de esclarecimentos.
Em recente acórdão deste Tribunal da Relação do Porto [Acórdão de 23.05.2024, Processo n.º 822/21.9T8PVZ-A.P1, Relator, Desembargador Paulo Dias da Silva, dgsi] sumaria-se: “I - No âmbito de processo de expropriação, e em face do disposto no artigo 61º, nº1, do Código das Expropriações, pode o tribunal indeferir as diligências que não considere úteis à decisão da causa. II - Não comportando o processo de expropriação, obrigatoriamente, a realização de uma audiência de julgamento, e tendo as “partes” lançado mão da faculdade a que alude o artigo 485º, do Código de Processo Civil, não se justifica a designação de audiência de julgamento formal apenas para efeitos de prestação de esclarecimentos pelos peritos, nos termos do artigo 486º, do Código de Processo Civil”. No entanto, importa acentuar que a situação fáctica ali apreciada não é transponível para estes autos: como nele se escreveu, “Ademais, resulta, ainda, dos autos que notificado o Expropriado/Apelante dos relatórios complementares de esclarecimentos, deles não reclamou, não suscitou esclarecimentos, nem pediu a comparência dos Senhores Peritos em audiência de produção de prova” (sublinhado nosso), ou seja, só em sede de recurso foi sustentado que o tribunal recorrido devia ter designado audiência com vista ao esclarecimento dos peritos.
O mesmo acórdão cita um outro, do Tribunal da Relação de Guimarães [Acórdão de 11.07.2017, Processo n.º 384/12.8TBVPA.G1, Relatora, Desembargadora Helena Melo, dgsi] onde a situação já podia assemelhar-se ao caso que apreciamos. Nele se sustenta, no texto e no sumário (que transcrevemos) que “Em sede de processo de expropriação, o tribunal pode indeferir as diligências que não considere úteis à decisão da causa, dispensando a produção de prova testemunhal ou a presença dos peritos em audiência para esclarecimentos, nos termos do artº 486º do CC[2], designadamente quando a considere desnecessária porque já foram prestados esclarecimentos por escrito. A prova testemunhal só poderá assumir relevância, em sede de processo de expropriação, quando se destine a provar os factos não compreendidos nas funções dos peritos” (sublinhado nosso), embora se acrescente, no mesmo ponto sumariado, que “O Código das Expropriações não prevê a aplicação subsidiária do CPC, mas tratando-se, como se trata, de uma forma de processo especial, aplica-se-lhe o disposto no artº 549º, nº 1 do CPC que dispõe que os processos especiais regulam-se pelas disposições que lhe são próprias e pelas disposições gerais e comuns; em tudo o que não estiver prevenido numas e noutras, observa-se o que se acha estabelecido para o processo comum”.
Discorda-se do entendimento acabado de citar. Com efeito, a inadmissão de diligências probatórias, sustentada no disposto no n.º 1 do artigo 61 do CE, não pode abranger a avaliação, ou seja, a prova pericial, porquanto esta é obrigatória (artigo 61, n.º 2 do CE) e só uma segunda perícia (avaliação) está legalmente afastada (artigo 61, n.º 6 do CE).
Mas mais: a decisão da primeira instância (e o acórdão antes citado) parece terem olvidado o disposto no artigo 61, n.º 3 do CE: “É aplicável o disposto nos artigos 578.º e 588.º do Código de Processo Civil”. Ora, o artigo 588 do CPC para que se remete, tem exatamente o mesmo sentido do artigo 486 do atual CPC; só não tem uma redação exatamente igual porque o preceito anterior refere que “os peritos comparecerão” e o atual diz-nos que os “peritos comparecem”. Diríamos que, hoje, com o atual CPC, a remissão deve entender-se feita, exatamente, para o artigo 486.
E, assim, tal como o artigo 588 do anterior CPC era expressamente aplicável, o atual 486 não pode deixar de o ser. Dito ainda de outro modo, no processo de expropriação, a perícia (vistoria) é obrigatória, e as partes podem sempre pedir a comparência dos peritos em audiência para prestarem esclarecimentos. Essa faculdade não pode ser afastada em razão do n.º 1 do artigo 61 do CE, atento o disposto no n.º 3 do mesmo normativo e a obrigatoriedade da perícia (61, n.º 2 do CPC).
Ao indeferir a pretensão dos expropriados, o tribunal recorrido violou o disposto nos artigos 486 do CPC e 61, n.º 3 do CE. Notificou as partes para alegarem, sem estarem concluídas as “diligências de prova” (artigo 64, n.º 1 do CE).
A decisão que indeferiu a comparência dos peritos para prestarem esclarecimentos deve, por isso, ser revogada. Da sua revogação resulta, necessariamente, a anulação dos atos processuais posteriores, concretamente, as alegações das partes e a sentença recorrida.
Por ser assim, o conhecimento das demais questões suscitadas pelos expropriados no seu recurso e pela beneficiária da expropriação, no dela, está necessariamente prejudicado.
As custas em ambos os recursos são devidas pela beneficiária da expropriação, em razão de ter deduzido oposição à pretensão que ora se acolhe e, assim, ter ficado vencida (artigo 527, n.ºs 1 e 2 do CPC).
IV – Dispositivo
Pelo exposto, acorda-se na 3.ª Secção Cível (5.ª Secção) do Tribunal da Relação do Porto em, na procedência do recurso interposto pelos expropriados, revogar a decisão que indeferiu o pedido de comparência dos peritos em audiência, para prestarem esclarecimentos, e, consequentemente, determina-se que o tribunal recorrido designe audiência e determine essa comparência dos peritos, anulando-se, em consequência, todos os atos processuais posteriormente praticados, incluindo a sentença proferida e, igualmente, ficando prejudicado o conhecimento do recurso interposto pela beneficiária da expropriação.
Custas dos recursos pela beneficiária da expropriação.
Porto, 10.02.2025
José Eusébio Almeida
Carlos Gil
Fernanda Almeida
_______________ [1] Exatamente com o mesmo sentido, já o citado autor o afirmava nas Noções Fundamentais de Processo Civil, Almedina, 2015, pág. 279. [2] Pretendeu dizer-se “CPC”, como é manifesto.