PRINCÍPIO DA IGUALDADE
TRABALHO IGUAL SALÁRIO IGUAL
DISCRIMINAÇÃO
PRÉMIO DE PRODUTIVIDADE
IRREDUTIBILIDADE DA RETRIBUIÇÃO
SUBSÍDIO DE FÉRIAS
SUBSÍDIO DE NATAL
Sumário

Impugnação da matéria de facto com relevo para a decisão – Proibição de discriminação – Tratamento remuneratório diferenciado justificado, proporcional e que prossegue um objectivo legítimo – Prémio de produtividade abrangido pelo conceito de retribuição e pago com cadência própria, 12 vezes por ano – Irrelevância do prémio de produtividade para o cálculo dos subsídios de férias e de Natal nos termos do contrato colectivo de trabalho – Irredutibilidade da retribuição – Artigo 59.º da Constituição da República Portuguesa – Artigos 25.º, 129.º, 258.º, 260.º e 270.º do Código do Trabalho – Cláusulas 51ª , 52ª e 61ª do Contrato coletivo de Trabalho celebrado entre a Associação Nacional de Transportadores Públicos Rodoviários de Mercadorias – ANTRAM e outra e a Federação dos Sindicatos de Transportes e Comunicações – FECTRANS e outros – revisão global, publicado no Boletim do Trabalho e Emprego n.º 45 de 8.12.2019

Texto Integral

Acordam em conferência, na 4.ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa

Sentença recorrida
1. Por sentença de 17.1.2024 (referência citius 431079863), o 1.º Juízo do Trabalho do Barreiro, Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa (doravante também Tribunal de primeira instância, Tribunal recorrido ou Tribunal a quo), proferiu a seguinte decisão:
“IV. Decisão:
Pelos fundamentos de facto e de direito supra expostos, o tribunal julga a ação parcialmente procedente porque parcialmente provada e decide:
1. Condenar a Ré no pagamento das seguintes quantias:
a. € 2642,22 a título de diferenças salariais entre 01.01.2020 e 01.01.2022, acrescida daquelas que se vierem a verificar relativamente à categoria do Autor por reporte a trabalhadores com a mesma categoria, no que tange à retribuição base, a liquidar em incidente próprio;
b. Diferenças salariais no que tange ao complemento salarial (2%) e retribuição prevista na Clausula 61 do Código do Trabalho (48%) sobre as quantias referidas em a., a liquidar em incidente próprio;
c. € 5280 a título de prémio de produtividade até 31.12.2023, acrescida das quantias que se vierem a vencer a esse título, desde a referida data, a liquidar em incidente próprio;
d. € 880 a título de subsídios de férias e de Natal por via da integração do prémio de produtividade referente aos anos de 2020 a 2023;
e. Juros de mora o vencimento de cada uma das rubricas desde a data do respetivo vencimento até efetivo e integral pagamento, a liquidar em incidente próprio.
2. Absolver a Ré do demais peticionado.
Custas a cargo de ambas as partes na proporção de 70,9% para o Autor e para a Ré 29,1%.”
Alegações da recorrente
2. Inconformada com a sentença mencionada no parágrafo anterior, a recorrente (ré, empregadora), dela veio interpor o presente recurso (cf. referência citius 38706719 de 6.3.2024), formulando o seguinte pedido:
“(...) requer-se que seja o presente recurso declarado procedente, e em consequência seja revogada a douta decisão de que se apela, declarando-se improcedente a acção e absolvendo-se a Recorrente do pedido (...)”
3. Nas suas alegações vertidas nas conclusões, a recorrente impugna a decisão recorrida com base nos argumentos que o Tribunal a seguir sintetiza:
Impugnação da matéria de facto
• Deve ser julgado provado o facto alegado no artigo 14.º da contestação, com a seguinte redacção:
Atendendo à especificidade da actividade em causa – o transporte de um bem de valor muito elevado, cujo histórico de furtos sempre foi muito elevado, o salário dos motoristas que transportavam tabaco era superior ao salário base estabelecido em IRCT (nomeadamente na Convenção Colectiva de Trabalho da ANTRAM).
Fundamentos da discordância:
Os depoimentos gravados das testemunhas BB, CC e DD, cujas passagens são indicadas nas alegações, conjugados com a retribuição base mínima de motoristas de pesados prevista na convenção colectiva de trabalho publicada no Boletim do Trabalho e Emprego n.º 30 de 15.8.1997;
O Tribunal a quo não se pronunciou sobre este facto, não o inserindo no acervo dos factos provados ou não provados, apesar de o mesmo ser relevante para a recorrente provar que não existiu o alegado tratamento desigual;
• Devem ser julgados provados os factos não provados f) e g), alegados nos artigos 26.º e 27.º da contestação, com a seguinte redacção:
Encontram-se ao serviço da Ré, afetos à operação de distribuição ... nas instalações sitas na Rua..., os seguintes motoristas de pesados: EE e FF.
A evolução salarial dos mesmos é a seguinte:
a) Trabalhador EE:
Mês/ano Salário base
abril/2011 €571,20
abril/2016 €581,20
abril/2017 €600,00
abril/2018 €615,00
abril/2019 €675,00
dezembro/2019 €675,00
janeiro/2020 €700,00
janeiro/2021 €733,07
janeiro/2022 €777,05
janeiro/2023 €837,67
b) Trabalhador FF:
Mês/ano Salário base
janeiro/2023 €837,67.
Fundamentos da discordância:
O depoimento gravado da testemunha DD, cuja passagem é indicada nas alegações, conjugado com os documentos 4 e 5 juntos à contestação que demonstram a evolução retributiva dos dois trabalhadores em causa;
Inexistência de tratamento remuneratório discriminatório
• A diferença salarial entre o recorrido e os trabalhadores GG e HH que prestam atualmente a mesma actividade de motorista de pesados que presta o recorrido e na mesma operação, é materialmente fundada e não é discriminatória, pelas seguintes razões: um desses motoristas tem antiguidade no exercício dessa actividade superior em 16 anos à do recorrido; esses dois trabalhadores foram contratados com salários acima das retribuições mínimas devidas aos motoristas de pesados, porque transportavam tabaco, produto considerado de risco devido ao histórico de assaltos; o salário mais elevado que a recorrente pagava aos dois trabalhadores aqui tomados como termo de comparação manteve-se quando a recorrente deixou de transportar tabaco e os colocou na mesma operação de transporte em que o recorrido presta a sua actividade; a retribuição do recorrido e respectiva progressão salarial, é igual à dos restantes motoristas (que não têm a especificidade de terem transportado tabaco), que trabalham na mesma operação onde trabalha o recorrido, a ZZ;
Irredutibilidade da retribuição
• A retribuição do recorrido foi restruturada e em consequência disso o recorrido passou a receber um valor superior por mês e por ano. A esse propósito, a recorrente defende que:
“4.1. O Recorrido deixou de receber todos os 12 meses do ano as quantias de €175,00 (retribuição por isenção de horário de trabalho) + €110,00 (prémio de produtividade), ou seja, o valor total de €285,00, e passou a receber: €364,00 + €14,00, pelo que passou a receber a mais €93, em cada um dos 12 meses mencionados.
4.2. Em 11 desses 12 meses, além dos valores mencionados, o Recorrido passou a receber também a quantia de €57,50 (subsídio de cargas e descargas), pelo que em todos esses 11 meses recebeu €150,50 a mais do que o que recebia em 2019 (tendo-se mantido a retribuição base).
4.3. Os subsídios de férias e de Natal ficaram do Recorrido passaram a ser mais elevados, uma vez que:
a) O subsídio de férias: deixou de incluir os €175,00, mas passou a integrar os €364,30 e os €14,00.
b) O subsídio de Natal (que não incluía nem o valor da retribuição por isenção de horário de trabalho, nem o valor do prémio de produtividade) passou a integrar o valor do complemento salarial, de €14,00.”
• O prémio de produtividade, apesar de ter sido pago ao recorrido com regularidade não faz parte da retribuição, nem do subsídio de Natal, uma vez que tinha por objectivo promover a dedicação e zelo e não remunerar a actividade ou disponibilidade do trabalhador. Na óptica da recorrente:
(...) a douta sentença a quo, ao ter decidido condenar a Recorrente no pagamento do valor pago a título de prémio de produtividade, até 31.12.2023, no montante de €5.280,00, e no pagamento das diferenças a este título a partir de 01.01.2024, assim como no pagamento de €880,00 a título de subsídios de férias e de Natal por via da integração do prémio de produtividade referente aos anos de 2020 a 2023, violou o disposto no artigo 260.º, número 1, alínea c) e número 3, alínea a), do Código do Trabalho, razão pela qual deverá ser revogada.
Contra-alegações do recorrido
4. O recorrido não contra-alegou.
Parecer do Ministério Público
5. O digno magistrado do Ministério Público junto ao Tribunal da Relação, emitiu parecer (cf. referência citius 21724156 de 27.6.2024), ao abrigo do disposto no artigo 87.º n.º 3 do Código de Processo do Trabalho (CPT), defendendo a procedência parcial do recurso, em síntese, com base nos seguintes fundamentos:
• Deve proceder o recurso da matéria de facto, porque estando em causa o princípio da igualdade, o tema probatório impugnado tem relevo para a apreciação do mérito, em particular, o facto alegado no artigo 14º da contestação;
• Dos elementos de prova indicados no recurso resulta ter ficado provado o tema probatório em crise;
• No que respeita à diferenciação salarial, em particular entre o recorrido e o trabalhador GG, os factos demonstram que existe uma diferenciação em antiguidade e histórico remuneratório que decorreu das diferentes funções desempenhadas por esse trabalhador, que se repercutiu no seu tratamento remuneratório;
• Também ficou demonstrada igual progressão salarial do recorrido e de outros trabalhadores na mesma situação do recorrido;
• Quanto à violação da irredutibilidade da remuneração por causa da eliminação do prémio de produtividade, tal como refere a sentença recorrida, o caracter periódico e regular do seu pagamento confere-lhe o caracter de retribuição, pelo que, nessa parte, o recurso deve improceder.
Delimitação do âmbito do recurso
6. Têm relevância para a decisão do recurso as seguintes questões, vertidas nas conclusões:
A. Impugnação da matéria de facto
B. Inexistência de tratamento remuneratório discriminatório
C. Observância do princípio da irredutibilidade da retribuição
Factos
7. Os factos provados e não provados serão a seguir agrupados, respectivamente, em dois parágrafos, antecedidos da numeração/alíneas, pelas quais foram designados na sentença recorrida, para facilitar a leitura e remissões. As alterações resultantes do presente recurso serão assinaladas infra.
8. Factos provados
A. A Ré é uma sociedade que se dedica à atividade de transporte rodoviário de mercadorias.
B. O Autor é motorista de pesados de mercadorias.
C. A relação contratual ainda se encontra vigente.
D. Como contrapartida pelo exercício da sua atividade o Autor aufere uma remuneração mensal fixa de € 777,05, acrescida do complemento salarial de € 15,54, subsídio de trabalho móvel de € 401,75 e diuturnidades de € 44,4.
E. O Autor foi admitido para trabalhar sob a autoridade, direção e fiscalização da Ré e exercer a categoria profissional de motorista de veículos pesados de 1.º escalão com ADR, nos transportes rodoviários de mercadorias perigosas.
F. O Autor e GG têm a mesma categoria profissional, o mesmo horário de trabalhador móvel e desempenham as mesmas funções.
G. No ano 2017, e durante 11 meses, o Autor recebeu € 665,00 de vencimento base, acrescido de subsídio de isenção de horário no valor de 15% sobre aquele vencimento, ou seja € 99,75.
H. Nesse mesmo ano e durante o mesmo período, GG tinha como retribuição base € 772,00, acrescida de um subsídio de isenção de horário de €115,80, correspondente a 15% do salário base.
I. No ano 2018, o Autor tinha como vencimento base € 680,00, acrescida de € 102,00 de subsídio de isenção de horário (15%).
J. Nesse mesmo período de 2018, o colega GG tinha a retribuição base de € 785,00, acrescida de € 117,75 de subsídio de isenção de horário (15%).
K. No ano 2019, o Autor tinha como vencimento base € 695,00, acrescida de € 173,75 de subsídio de isenção de horário (15%).
L. Nesse mesmo período de 2019, GG tinha a retribuição base de € 795,00, acrescida de € 119,25 de subsídio de isenção de horário (15%).
M. No ano 2020, a partir do mês de maio, o Autor tinha como vencimento base € 700,00, acrescida do complemento salarial (2%) previsto no CCT em vigor € 14,00, e da cláusula 61.ª (48% da soma do vencimento base + diuturnidades + complemento salarial) no valor de € 364,03.
N. Nesse mesmo período de 2020, GG tinha a retribuição base de € 810,90, acrescida do complemento salarial (2%) previsto no CCT em vigor € 16,22, e da cláusula 61.ª (48% da soma do vencimento base + diuturnidades + complemento salarial) no valor de € 450,30.
O. No ano de 2021, o Autor tinha como vencimento base € 733,07, acrescida do complemento salarial (2%) previsto no CCT em vigor € 14,66, e da cláusula 61.ª (48% da soma do vencimento base + diuturnidades + complemento salarial) no valor de € 380,22.
P. Nesse mesmo período de 2021, GG tinha a retribuição base de € 810,90, acrescida do complemento salarial (2%) previsto no CCT em vigor € 16,22, e da cláusula 61.ª (48% da soma do vencimento base + diuturnidades + complemento salarial) no valor de € 450,30.
Q. No ano 2022, o Autor tem como vencimento base € 777,05, acrescida do complemento salarial (2%) previsto no CCT em vigor € 15,54, e da cláusula 61.ª (48% da soma do vencimento base + diuturnidades + complemento salarial) no valor de € 412,41.
R. Nesse mesmo período de 2022, GG tem a retribuição base de € 825,00, acrescida do complemento salarial (2%) previsto no CCT em vigor € 16,50, e da cláusula 61.ª (48% da soma do vencimento base + diuturnidades + complemento salarial) no valor de € 457,20.
S. A 1 de abril de 2015, o Autor e a Ré celebraram um acordo de isenção de horário de trabalho, nos termos da qual a segunda pagava à primeira a quantia de 15% da remuneração base ilíquida mensal.
T. A 1 de abril de 2019, a Ré passou a pagar ao Autor 25% da remuneração base ilíquida.
U.
Esta retribuição era paga 14 vezes ao ano.
V. Este regime foi aplicado pela circunstância do exercício regular da atividade dos Autores ocorrer fora do estabelecimento, sem controlo imediato da hierarquia.
W. A partir 1 de maio de 2020, a Ré deixou de proceder ao pagamento desta quantia mensal.
X. A Ré deixou de proceder a tal pagamento apesar de o Autor exercer a atividade exatamente da mesma forma à que exercia aquando da celebração do acordo, e de não ter dado consentimento nesse sentido.
Y. Desde que o Autor se encontra a trabalhar para a Ré que a mesma lhe paga um prémio de produtividade.
Z. Esse prémio era pago 12 vezes por ano, no valor de €110,00.
AA. A partir de maio de 2020, com efeitos reportados a 1 de janeiro de 2020, sem dar qualquer explicação e sem que o Autor desse consentimento nesse sentido, a Ré deixou de proceder ao pagamento dessa rúbrica.
BB. A título de subsídio de alimentação, a Ré pagou €1.215,00 em 2019 (correspondente a € 5 a título de subsídio de refeição), €2.091,60 em 2020, €1.629,60 em 2021 e €1.176,00 em 2022 (estes correspondentes a € 8,40 a título de subsídio de refeição).
CC. A Ré não proporcionou formação profissional ao Autor.
DD. A Ré é uma sociedade comercial que se dedica, entre outras coisas, a atividade de logística empresarial e transporte de mercadorias.
EE. No âmbito do desenvolvimento da sua atividade, a Ré assegura operações logísticas nas instalações de vários clientes, atuando a par com trabalhadores desses seus clientes e de outros prestadores de serviços que possam também ali executar funções.
FF. A Ré tem também armazéns, onde recebe carga que é trazida e posteriormente expedida, de acordo com as indicações e necessidades dos seus clientes.
GG. O trabalhador GG é trabalhador da Ré desde 03 de maio de 2004.
HH. Foi contratado em tal data para desempenhar ao serviço da Ré, sob suas ordens e direção, as funções de motorista de pesados.
II. À data, a Ré tinha uma operação de distribuição de tabaco, e o trabalhador GG foi contratado para conduzir veículos que transportavam tabaco, fazendo a distribuição do mesmo pela zona centro e sul do país.
JJ. Em 2010/2011, a Ré deixou de prestar a atividade de distribuição de tabaco.
KK. Nesse momento, o trabalhador GG (e também o outro motorista da Ré afeto a essa atividade, HH) viram os seus postos de trabalho de motoristas na operação de distribuição de tabaco serem eliminados.
LL. Os referidos trabalhadores ficaram afetos à operação de distribuição ... que a Ré tinha, por referência aos armazéns sitos no ....
MM. Quando a alteração de operação ocorreu, os salários dos mencionados trabalhadores não foram reduzidos.
NN. Quando iniciou o seu contrato de trabalho, GG tinha um salário base de 750,00 Eur, e a evolução da sua retribuição base foi a seguinte:
Mês/ano Salário base
Junho/2010 €772,00
Junho/2015 €772,00
Janeiro/2018 €785,00
Janeiro/2019 €795,00
Junho/2019 €810,90
Fevereiro/2022 €825,00
Janeiro/2023 €837,67
OO. O Autor celebrou contrato de trabalho em 2012, para desempenhar as funções de conferente de mercadorias.
PP. A 01 de março de 2014, o Autor altera a sua categoria profissional e funções, e passa a deter a categoria de motorista (de ligeiros) em operação de distribuição referida em LL..
QQ. A 01 de janeiro de 2020, o Autor passa a motorista de pesados, mantendo-se afeto à mesma operação de distribuição.
RR. Quando iniciou o seu contrato de trabalho, o Autor tinha um salário base de €520,00, e a evolução da sua retribuição base foi a seguinte:
Data Categoria Salário base
Março/2013 Conferente de mercadorias €520,00
Março/2014 Motorista ligeiros €650,00
Abril/2017 Motorista ligeiros €665,00
Abril/2018 Motorista ligeiros €680,00
Maio/2019 Motorista ligeiros €695,00
Janeiro/2020 Motorista pesados €700,00
Janeiro/2021 Motorista pesados €733,07
Janeiro/2022 Motorista pesados €777,05
SS. A partir de 01 de abril de 2015, o Autor ficou sujeito ao regime de isenção de horário de trabalho, na modalidade de possibilidade de determinado aumento do período normal de trabalho, por dia ou por semana.
TT. Tal sujeição ao regime de isenção de horário de trabalho foi objeto de acordo reduzido a escrito.
UU. Tal acordo foi celebrado em virtude de o Autor ser motorista e exercer regularmente a sua atividade fora do estabelecimento, sem controlo imediato por superior hierárquico.
VV. A 1 de abril de 2019, o Autor e a Ré celebraram um novo acordo de isenção de horário de trabalho, por meio do qual foi alterada a modalidade a observar: passou então, daí em diante, a vigorar entre a Ré e o Autor a modalidade de não sujeição aos limites máximos do período normal de trabalho.
WW. A Ré abonou o Autor com uma retribuição especifica correspondente a 15% da sua retribuição no período em que entre os mesmos vigorava a modalidade de possibilidade de determinado aumento do período normal de trabalho, por dia ou por semana, e de 25% quando a modalidade de isenção passou a ser a de não sujeição aos limites máximos do período normal de trabalho.
XX. A partir de maio de 2020, a Ré passou a abonar o Autor com a retribuição do regime específico de trabalho dos motoristas prevista na Cláusula 61.º da CCT celebrada entre a ANTRAM e a Federação dos Sindicatos de Transportes e Comunicações – FECTRANS, publicada no Boletim do Trabalho e Emprego, n.º 45, de 8/12/2019.
YY. A partir do momento em que a Ré passou a abonar o Autor com esta retribuição prevista na Cláusula 61.º do CCT, operou a cessação do acordo de isenção de horário de trabalho, deixando de abonar o Autor com a respetiva retribuição específica.
ZZ. A retribuição do regime específico de trabalho dos motoristas prevista na Cláusula 61.º da CCT que passou a ser abonada ao Autor, com efeitos a janeiro de 2020, ascende ao montante de €364,03.
AAA. O Autor recebia €175,00 por sujeição a regime de isenção de horário de trabalho e passou a receber €364,03 por via da aplicação da cláusula 61.º.
BBB. O Autor recebeu prémio de produtividade, 12 vezes por ano.
CCC. O pagamento deste prémio sempre foi realizado com o objetivo de promover a dedicação dos trabalhadores da Ré, um acréscimo de dedicação e zelo.
DDD. A partir de maio de 2020, o Autor deixou de receber tal prémio de produtividade.
EEE. A partir de maio de 2020, com efeitos a janeiro de 2020, o Autor passou a receber:
a) Retribuição específica dos motoristas, prevista na cláusula 61.º do CCT pago 13 vezes por ano, e cujo valor foi de:
a. €364,03 no ano de 2020
b. €380,22 no ano de 2021.
c. €412,41, no ano de 2022.
b) Subsídio de cargas e descargas, pago 11 vezes por ano, no valor mensal de €57,50.
c) Complemento salarial, pago 14 vezes por ano, no valor mensal de:
a. €14,00 no ano de 2020.
b. €14,66 no ano de 2021.
c. €15,54, no ano de 2022.
Facto FFF aditado aos factos provados por via do presente recurso:
FFF. Tendo o GG sido afecto à operação de transporte de tabaco quando foi contratado pela recorrente em 2004, foi depois transferido para a operação de transporte de produtos farmacêuticos em 2011 porque a recorrente deixou de transportar tabaco, mas manteve a mesma retribuição base que recebia quando transportava tabaco, a qual, tendo em conta a especificidade do transporte de tabaco – que era gerido a partir das instalações do cliente da recorrente, exigia a observância de itinerários e número de paragens pré estabelecidos e tinha por objecto caixas cujo valor unitário era de cerca de 2000 euros – era superior à retribuição base dos motoristas de veículos pesados contratados para o transporte de produtos farmacêuticos, entre os quais passou a estar incluído o recorrido, quando, em Janeiro de 2020, começou a exercer funções correspondentes à categoria profissional de motorista de pesados.
Factos GGG e HHH aditados aos factos provados por via do presente recurso:
GGG. Encontram-se ao serviço da Ré, afectos à operação de distribuição ... nas instalações sitas na Rua..., os seguintes motoristas de pesados: EE, cujo contrato de trabalho iniciou em 7 de abril de 2011 e FF, cujo contrato de trabalho iniciou em 2 de janeiro de 2023.
HHH. A evolução salarial dos mesmos é a seguinte:
a) Trabalhador EE:
Mês/ano Salário base
abril/2011 €571,20
abril/2016 €581,20
abril/2017 €600,00
abril/2018 €615,00
abril/2019 €675,00
dezembro/2019 €675,00
janeiro/2020 €700,00
janeiro/2021 €733,07
janeiro/2022 €777,05
janeiro/2023 €837,67
b) Trabalhador FF:
Mês/ano Salário base
janeiro/2023 €837,67.
9. Factos não provados
a. Nas circunstâncias referidas em G. o Autor auferiu as referidas quantias 14 meses.
b. O Autor não tem hora definida de início de trabalho, na medida em que se trata de um regime de horário móvel, o que faz com que por motivos de serviço, se encontre impedido de tomar as refeições no horário tradicional.
c. Nas circunstâncias referidas em NN. a evolução foi a seguinte:
a. Junho/2005 €760,00
b. Junho/2006 €760,00
c. Agosto/2007 €760,00
d. Setembro/2008 €772,00
d. O contrato de trabalho vigente entre o Autor e a Ré foi celebrado a 15 de fevereiro de 2013.
e. Em janeiro de 2023 o Autor auferia €837,67;
As alíneas f) e g) foram eliminadas dos factos não provados e aditadas aos factos provados, como factos GGG e HHH, por via do presente recurso.
Quadro legal relevante
10. Para a apreciação do recurso têm relevo, essencialmente, o quadro legal e as fontes de regulação, seguintes:
Constituição da República Portuguesa ou CRP
Artigo 59.º
(Direitos dos trabalhadores)
1. Todos os trabalhadores, sem distinção de idade, sexo, raça, cidadania, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, têm direito:
a) À retribuição do trabalho, segundo a quantidade, natureza e qualidade, observando-se o princípio de que para trabalho igual salário igual, de forma a garantir uma existência condigna;
b) A organização do trabalho em condições socialmente dignificantes, de forma a facultar a realização pessoal e a permitir a conciliação da actividade profissional com a vida familiar;
c) A prestação do trabalho em condições de higiene, segurança e saúde;
d) Ao repouso e aos lazeres, a um limite máximo da jornada de trabalho, ao descanso semanal e a férias periódicas pagas;
e) À assistência material, quando involuntariamente se encontrem em situação de desemprego;
f) A assistência e justa reparação, quando vítimas de acidente de trabalho ou de doença profissional.
2. Incumbe ao Estado assegurar as condições de trabalho, retribuição e repouso a que os trabalhadores têm direito, nomeadamente:
a) O estabelecimento e a actualização do salário mínimo nacional, tendo em conta, entre outros factores, as necessidades dos trabalhadores, o aumento do custo de vida, o nível de desenvolvimento das forças produtivas, as exigências da estabilidade económica e financeira e a acumulação para o desenvolvimento;
b) A fixação, a nível nacional, dos limites da duração do trabalho;
c) A especial protecção do trabalho das mulheres durante a gravidez e após o parto, bem como do trabalho dos menores, dos diminuídos e dos que desempenhem actividades particularmente violentas ou em condições insalubres, tóxicas ou perigosas;
d) O desenvolvimento sistemático de uma rede de centros de repouso e de férias, em cooperação com organizações sociais;
e) A protecção das condições de trabalho e a garantia dos benefícios sociais dos trabalhadores emigrantes;
f) A protecção das condições de trabalho dos trabalhadores-estudantes.
3. Os salários gozam de garantias especiais, nos termos da lei.
Código do Trabalho ou CT
Artigo 3.º
Relações entre fontes de regulação
1 - As normas legais reguladoras de contrato de trabalho podem ser afastadas por instrumento de regulamentação colectiva de trabalho, salvo quando delas resultar o contrário.
2 - As normas legais reguladoras de contrato de trabalho não podem ser afastadas por portaria de condições de trabalho.
3 - As normas legais reguladoras de contrato de trabalho só podem ser afastadas por instrumento de regulamentação colectiva de trabalho que, sem oposição daquelas normas, disponha em sentido mais favorável aos trabalhadores quando respeitem às seguintes matérias:
a) Direitos de personalidade, igualdade e não discriminação;
b) Protecção na parentalidade;
c) Trabalho de menores;
d) Trabalhador com capacidade de trabalho reduzida, com deficiência ou doença crónica;
e) Trabalhador-estudante;
f) Dever de informação do empregador;
g) Limites à duração dos períodos normais de trabalho diário e semanal;
h) Duração mínima dos períodos de repouso, incluindo a duração mínima do período anual de férias;
i) Duração máxima do trabalho dos trabalhadores nocturnos;
j) Forma de cumprimento e garantias da retribuição, bem como pagamento de trabalho suplementar;
k) Teletrabalho;
l) Capítulo sobre prevenção e reparação de acidentes de trabalho e doenças profissionais e legislação que o regulamenta;
m) Transmissão de empresa ou estabelecimento;
n) Direitos dos representantes eleitos dos trabalhadores.
o) Uso de algoritmos, inteligência artificial e matérias conexas, nomeadamente no âmbito do trabalho nas plataformas digitais.
4 - As normas legais reguladoras de contrato de trabalho só podem ser afastadas por contrato individual que estabeleça condições mais favoráveis para o trabalhador, se delas não resultar o contrário.
5 - Sempre que uma norma legal reguladora de contrato de trabalho determine que a mesma pode ser afastada por instrumento de regulamentação colectiva de trabalho entende-se que o não pode ser por contrato de trabalho.
Artigo 25.º
Proibição de discriminação
1 - O empregador não pode praticar qualquer discriminação, directa ou indirecta, em razão nomeadamente dos factores referidos no n.º 1 do artigo anterior.
2 - Não constitui discriminação o comportamento baseado em factor de discriminação que constitua um requisito justificável e determinante para o exercício da actividade profissional, em virtude da natureza da actividade em causa ou do contexto da sua execução, devendo o objectivo ser legítimo e o requisito proporcional.
3 - São nomeadamente permitidas diferenças de tratamento baseadas na idade que sejam necessárias e apropriadas à realização de um objectivo legítimo, designadamente de política de emprego, mercado de trabalho ou formação profissional.
4 - As disposições legais ou de instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho que justifiquem os comportamentos referidos no número anterior devem ser avaliadas periodicamente e revistas se deixarem de se justificar.
5 - Cabe a quem alega discriminação indicar o trabalhador ou trabalhadores em relação a quem se considera discriminado, incumbindo ao empregador provar que a diferença de tratamento não assenta em qualquer factor de discriminação.
6 - O disposto no número anterior é aplicável em caso de invocação de qualquer prática discriminatória no acesso ao trabalho, à formação profissional ou nas condições de trabalho, nomeadamente por motivo de gozo de direitos na parentalidade, de outros direitos previstos no âmbito da conciliação da atividade profissional com a vida familiar e pessoal e dos direitos previstos para o trabalhador cuidador.
7 - São ainda consideradas práticas discriminatórias, nos termos do número anterior, nomeadamente, discriminações remuneratórias relacionadas com a atribuição de prémios de assiduidade e produtividade, bem como afetações desfavoráveis em termos de avaliação e progressão na carreira.
8 - É inválido o acto de retaliação que prejudique o trabalhador em consequência de rejeição ou submissão a acto discriminatório.
9 - Constitui contraordenação muito grave a violação do disposto nos n.os 1 ou 8.
Artigo 129.º
Garantias do trabalhador
1 - É proibido ao empregador:
a) Opor-se, por qualquer forma, a que o trabalhador exerça os seus direitos, bem como despedi-lo, aplicar-lhe outra sanção, ou tratá-lo desfavoravelmente por causa desse exercício;
b) Obstar injustificadamente à prestação efectiva de trabalho;
c) Exercer pressão sobre o trabalhador para que actue no sentido de influir desfavoravelmente nas condições de trabalho dele ou dos companheiros;
d) Diminuir a retribuição, salvo nos casos previstos neste Código ou em instrumento de regulamentação colectiva de trabalho;
e) Mudar o trabalhador para categoria inferior, salvo nos casos previstos neste Código;
f) Transferir o trabalhador para outro local de trabalho, salvo nos casos previstos neste Código ou em instrumento de regulamentação colectiva de trabalho, ou ainda quando haja acordo;
g) Ceder trabalhador para utilização de terceiro, salvo nos casos previstos neste Código ou em instrumento de regulamentação colectiva de trabalho;
h) Obrigar o trabalhador a adquirir bens ou serviços a ele próprio ou a pessoa por ele indicada;
i) Explorar, com fim lucrativo, cantina, refeitório, economato ou outro estabelecimento directamente relacionado com o trabalho, para fornecimento de bens ou prestação de serviços aos seus trabalhadores;
j) Fazer cessar o contrato e readmitir o trabalhador, mesmo com o seu acordo, com o propósito de o prejudicar em direito ou garantia decorrente da antiguidade.
k) Obstar a que o trabalhador exerça outra atividade profissional, salvo com base em fundamentos objetivos, designadamente segurança e saúde ou sigilo profissional, ou tratá-lo desfavoravelmente por causa desse exercício.
2 - O disposto na alínea k) do número anterior não isenta o trabalhador do dever de lealdade previsto na alínea f) do n.º 1 do artigo anterior nem do disposto em legislação especial quanto a impedimentos e incompatibilidades.
3 - Constitui contra-ordenação muito grave a violação do disposto neste artigo.
Artigo 258.º
Princípios gerais sobre a retribuição
1 - Considera-se retribuição a prestação a que, nos termos do contrato, das normas que o regem ou dos usos, o trabalhador tem direito em contrapartida do seu trabalho.
2 - A retribuição compreende a retribuição base e outras prestações regulares e periódicas feitas, directa ou indirectamente, em dinheiro ou em espécie.
3 - Presume-se constituir retribuição qualquer prestação do empregador ao trabalhador.
4 - À prestação qualificada como retribuição é aplicável o correspondente regime de garantias previsto neste Código.
Artigo 260.º
Prestações incluídas ou excluídas da retribuição
1 - Não se consideram retribuição:
a) As importâncias recebidas a título de ajudas de custo, abonos de viagem, despesas de transporte, abonos de instalação e outras equivalentes, devidas ao trabalhador por deslocações, novas instalações ou despesas feitas em serviço do empregador, salvo quando, sendo tais deslocações ou despesas frequentes, essas importâncias, na parte que exceda os respectivos montantes normais, tenham sido previstas no contrato ou se devam considerar pelos usos como elemento integrante da retribuição do trabalhador;
b) As gratificações ou prestações extraordinárias concedidas pelo empregador como recompensa ou prémio dos bons resultados obtidos pela empresa;
c) As prestações decorrentes de factos relacionados com o desempenho ou mérito profissionais, bem como a assiduidade do trabalhador, cujo pagamento, nos períodos de referência respectivos, não esteja antecipadamente garantido;
d) A participação nos lucros da empresa, desde que ao trabalhador esteja assegurada pelo contrato uma retribuição certa, variável ou mista, adequada ao seu trabalho.
2 - O disposto na alínea a) do número anterior aplica-se, com as necessárias adaptações, ao abono para falhas e ao subsídio de refeição.
3 - O disposto nas alíneas b) e c) do n.º 1 não se aplica:
a) Às gratificações que sejam devidas por força do contrato ou das normas que o regem, ainda que a sua atribuição esteja condicionada aos bons serviços do trabalhador, nem àquelas que, pela sua importância e carácter regular e permanente, devam, segundo os usos, considerar-se como elemento integrante da retribuição daquele;
b) Às prestações relacionadas com os resultados obtidos pela empresa quando, quer no respectivo título atributivo quer pela sua atribuição regular e permanente, revistam carácter estável, independentemente da variabilidade do seu montante.
Artigo 262.º
Cálculo de prestação complementar ou acessória
1 - Quando disposição legal, convencional ou contratual não disponha em contrário, a base de cálculo de prestação complementar ou acessória é constituída pela retribuição base e diuturnidades.
2 - Para efeito do disposto no número anterior, entende-se por:
a) Retribuição base, a prestação correspondente à actividade do trabalhador no período normal de trabalho;
b) Diuturnidade, a prestação de natureza retributiva a que o trabalhador tenha direito com fundamento na antiguidade.
Artigo 263.º
Subsídio de Natal
1 - O trabalhador tem direito a subsídio de Natal de valor igual a um mês de retribuição, que deve ser pago até 15 de Dezembro de cada ano.
2 - O valor do subsídio de Natal é proporcional ao tempo de serviço prestado no ano civil, nas seguintes situações:
a) No ano de admissão do trabalhador;
b) No ano de cessação do contrato de trabalho;
c) Em caso de suspensão de contrato de trabalho por facto respeitante ao trabalhador.
3 - Constitui contra-ordenação muito grave a violação do disposto neste artigo.
Artigo 264.º
Retribuição do período de férias e subsídio
1 - A retribuição do período de férias corresponde à que o trabalhador receberia se estivesse em serviço efectivo.
2 - Além da retribuição mencionada no número anterior, o trabalhador tem direito a subsídio de férias, compreendendo a retribuição base e outras prestações retributivas que sejam contrapartida do modo específico da execução do trabalho, correspondentes à duração mínima das férias.
3 - Salvo acordo escrito em contrário, o subsídio de férias deve ser pago antes do início do período de férias e proporcionalmente em caso de gozo interpolado de férias.
4 - Constitui contra-ordenação muito grave a violação do disposto neste artigo.
Artigo 270.º
Critérios de determinação da retribuição
Na determinação do valor da retribuição deve ter-se em conta a quantidade, natureza e qualidade do trabalho, observando-se o princípio de que, para trabalho igual ou de valor igual, salário igual.
Contrato coletivo de trabalho entre a Associação Nacional de Transportadores Públicos Rodoviários de Mercadorias - ANTRAM e outra e a Federação dos Sindicatos de Transportes e Comunicações – FECTRANS e outros - Revisão global, publicado no Boletim do Trabalho e Emprego n.º 45 de 8.12.2019, doravante também CCT ANTRAM – FECTRANS de 2019.
Cláusula 51.ª
(Subsídio de férias)
1- Durante o período em que ocorra o gozo de férias, os trabalhadores tem direito a receber, para além da retribui ção do período de férias, um subsídio de férias de montante igual à retribuição/salário base (cláusula 44.ª), diuturnidades (cláusula 46.ª), complemento salarial (cláusula 59.ª) e outras prestações retributivas que sejam contrapartida do modo específico d execução do trabalho, correspondentes ao período de férias que têm direito.
2- Consideram-se prestações retributivas devidas como contrapartida do modo específico da execução do trabalho, a retribuição do regime específico de trabalho dos motoristas (cláusula 61.ª), o subsídio de trabalho noturno (cláusula 62.ª número 1 e 63.ª número 1), a ajuda de custo TIR (cláusula 64.ª) e o subsídio de operações (cláusula 67.ª).
3- Da retribuição e do subsídio de férias, com exceção do previsto no número 2 desta cláusula, exclui-se qualquer outra cláusula de expressão pecuniária, designadamente a média do trabalho suplementar e o subsídio de operações/cargas e descargas (clausula 60.ª).
4- O subsídio de férias será pago no mês anterior ao gozo das férias ou, caso o gozo ocorra de forma interpolada, no mês anterior àquele em que se verificar o gozo do período mínimo de dez dias úteis consecutivos.
5- Por acordo entre a entidade empregadora e o trabalhador, o subsídio de férias pode ser pago em duodécimos.
6- Para efeitos do previsto no número anterior, todos os anos o trabalhador pode revogar o acordo que prevê o pagamento do subsídio de férias em duodécimos, optando pelo seu pagamento por inteiro, devendo entregar uma declaração escrita com esta vontade à entidade empregadora, durante o mês de dezembro do ano anterior ao que o pagamento do subsídio diz respeito.
Cláusula 52.ª
(Subsídio de natal)
1- Todos os trabalhadores abrangidos por este CCTV têm o direito a um subsídio correspondente a um mês de retribuição, o qual será pago ou posto à sua disposição até 15 de dezembro de cada ano, salvo o previsto nos números 2 e 3.
2- Para efeitos do número anterior, considera-se que integram o conceito de retribuição, a retribuição base (cláusula 44.ª), as diuturnidades (cláusula 46.ª) e o complemento salarial (cláusula 59.ª).
3- Os trabalhadores que no ano de admissão não tenham concluído um ano de serviço, terão direito a tantos duodécimos daquele subsídio quantos os meses de serviço que completarem até 31 de dezembro.
4- Cessando o contrato de trabalho, o trabalhador tem direito ao subsídio fixado no número um, em proporção ao tempo de serviço prestado no próprio ano de cessação.
5- Tem direito ao subsídio de natal, na parte proporcional ao tempo de trabalho efetivo, o trabalhador que esteja ou tenha estado na situação de impedimento prolongado por motivo de doença devidamente comprovada por declaração de estabelecimento hospitalar, centro de saúde ou atestado médico.
6- Para efeitos do disposto nos números 3 e 4, entende-se como um mês completo qualquer fração do mesmo.
7- Por acordo entre a entidade empregadora e o trabalhador, o subsídio de natal pode ser pago em duodécimos.
8- Para efeitos do previsto no número anterior, todos os anos o trabalhador pode revogar o acordo que prevê o pagamento do subsídio de natal em duodécimos, optando pelo seu pagamento por inteiro, devendo entregar uma declaração
escrita com esta vontade à entidade empregadora, durante o mês de dezembro do ano anterior ao que o pagamento do
subsídio diz respeito.
Clausula 61.ª
(Retribuição do regime específico de trabalho dos motoristas)
1- Os trabalhadores que, por acordo com a empresa, desempenhem a função de motorista afeto ao transporte internacional, ibérico ou nacional, excecionando-se destes últimos os motoristas que conduzem veículos com menos de 7,5 toneladas, por prestarem uma actividade que implica regularmente um elevado grau de autonomia e a possível realização de trabalho extraordinário de difícil controlo
e verificação pela empresa, decorrente da imprevisibilidade da duração concreta dos serviços a serem realizados e encontrando-se deslocados das instalações dos empregadores e sem controlo hierárquico directo, terão obrigatoriamente
o direito a receber, em contrapartida de tal regime, uma retribuição especifica no montante correspondente a 48 % do valor total resultante da soma da retribuição base (cláusula 44.ª), diuturnidades (cláusula 46.ª) e complemento salarial (cláusula 59.ª), não lhes sendo devido qualquer outro valor a título de trabalho suplementar em dia normal de trabalho.
2- O pagamento desta prestação pecuniária não prejudica o direito a dia de descanso semanal, obrigatório ou complementar, feriado ou a descanso diário bem como o respetivo pagamento nos termos previsto na cláusula 50.ª
3- O pagamento desta retribuição específica não afasta o cumprimento dos limites da duração do trabalho previstos na
cláusula 21.ª do presente CCTV, não podendo ser solicitado nem prestado trabalho para além dos mesmos.
4- Esta retribuição específica é devida por 13 meses.
Nota explicativa:
Para efeitos do acordo mencionado no número 1 desta cláusula, estão incluídos todos os contratos de trabalho para a função de motorista, celebrados antes deste contrato colectivo de trabalho. Mais se esclarece que esta retribuição específica substituí a anterior cláusula 61.ª do CCTV celebrado entre a ANTRAM e a FECTRANS e publicado no Boletim do Trabalho e Emprego, n.º 34, de 15 de setembro de 2018 e primitiva cláusula 74.ª número 7 prevista no CCTV celebrado entre a ANTRAM e a FECTRANS
(anterior FESTRU) e publicado no Boletim do Trabalho e Emprego, n.º 9, de 8 de março de 1980 e demais alterações.
A cláusula 21.ª reflecte a proibição, que vincula empregadores e trabalhadores, prevista no Decreto-Lei n.º 237/07, de 19 de junho, de ser prestado trabalho semanal para além dos limites nesta fixados.
Apesar de não ser obrigatório, face ao concreto modo como o trabalho é prestado, esta figura poderá ser aplicada na relação mantida entre empresas e motoristas que, por acordo, estão afectos ao transporte nacional, conduzindo viaturas inferiores a 7.5 ton., sejam elas superiores ou não a 3,5 ton.
Doutrina que o Tribunal leva em conta
11. O Tribunal leva em conta os seguintes elementos, mencionados na fundamentação:
Abílio Neto, Novo Código do Trabalho e Legislação Complementar Anotados, 3.ª Edição, Ediforum
António Monteiro Fernandes, Direito do Trabalho, 21.ª Edição, Almedina
Maria do Rosário Palma Ramalho, Tratado de Direito do Trabalho, parte II, Almedina
Apreciação do recurso
A. Impugnação da matéria de facto
12. A recorrente pretende a inclusão no acervo dos factos provados do facto alegado no artigo 14.º da petição inicial.
13. Tal como defendem o recorrente e o digno magistrado do Ministério Público, o facto alegado no artigo 14.º da contestação tem relevo para apreciar o mérito da alegada violação da igualdade de tratamento remuneratório.
14. Acresce que o Tribunal a quo, no despacho saneador, seleccionou os seguintes temas de prova (cf. referência citius 428862102 de 4.10.2023):
- Da realização das mesmas funções por parte do Autor e do seu colega GG;
- Da realização, por parte do Autor, de trabalho noturno.”
15. Em consequência, o facto alegado no artigo 14.º da petição inicial faz parte do primeiro tema de prova indicado no parágrafo anterior. Não obstante, o Tribunal a quo não incluiu tal facto entre os factos provados ou não provados.
16. Adicionalmente, a recorrente defende que os factos não provados f) e g) devem ser incluídos nos factos provados.
17. Reapreciados os depoimentos gravados das testemunhas BB, CC e DD, indicados nas alegações de recurso, deles resulta que os motoristas de pesados GG e HH trabalhavam no transporte de tabaco, que é um transporte com características específicas, devido ao tipo de produto transportado, ao valor de cada caixa, cerca de 2000 euros, à circunstância de a operação ter lugar a partir das instalações da YY (cliente da recorrente) onde a recorrente mantém uma equipa permanente na qual trabalha a testemunha BB como gestor de operações e ao facto de a programação dos itinerários e das paragens dos motoristas ser pré estabelecida pela recorrente e controlada de modo mais rigoroso. Por isso, a retribuição dos motoristas que transportavam tabaco era mais elevada do que a que estava prevista no contrato colectivo de trabalho e que era paga aos motoristas de pesados que trabalhavam na operação ZZ, como é o caso do recorrido. A testemunha BB, que gere as operações da recorrente na YY, referiu que o trabalhador GG quando foi contratado pela recorrente foi trabalhar no transporte de tabaco e só quando a recorrente deixou de fazer o transporte de tabaco para a YY é que foi transferido para a operação ZZ; atualmente a recorrente continua a prestar serviços de logística à YY mas já não faz o transporte de tabaco. Resulta dos depoimentos destas três testemunhas que com excepção dos dois trabalhadores que faziam o transporte de tabaco na zona sul e de dois outros que trabalhavam no transporte de tabaco na zona norte do país, os motoristas que trabalham na operação ZZ recebem idêntica retribuição. Ao longo do tempo a recorrente foi aproximando as retribuições dos motoristas, aumentando menos os que ganhavam mais e mais os que ganhavam menos, de modo que na presente data, as retribuições dos motoristas que prestam trabalho na operação ZZ são idênticas, como referiram as testemunhas DD e CC. Quando a recorrida deixou de fazer o transporte de tabaco para a YY, os dois motoristas que ganhavam mais por transportarem tabaco, entre os quais o GG, foram integrados na operação ZZ, onde trabalha o recorrido, passaram a transportar produtos farmacêuticos, mas mantiveram os salários mais elevados que já tinham. Os outros trabalhadores que, como o recorrido, eram motoristas de pesados na operação ZZ, recebiam remuneração de base idêntica à do recorrido.
18. Em particular, a testemunha DD, que trabalha na área de recursos humanos e tem acesso à informação salarial da generalidade dos trabalhadores, explicou os valores constantes dos recibos de vencimento dos vários trabalhadores, que se encontram juntos como documentos 4 e 5 à contestação e disse ao Tribunal ter confirmado no sistema que os dois trabalhadores em questão, que trabalhavam anteriormente no transporte de tabaco, foram admitidos pela recorrente em 2004.
19. Estas três testemunhas referiram ainda que o GG já trabalha na recorrente há mais anos e foi contratado como motorista de pesados.
20. As testemunhas BB, CC e DD, apesar de trabalharem para a recorrente, depuseram de forma isenta, desinteressada, coerente e indicaram a respectiva razão de ciência, de modo a merecerem credibilidade. Os seus depoimentos estão sujeitos à livre apreciação do Tribunal – cf. artigo 396.º do Código Civil (CC).
21. A recorrente alega que a remuneração mínima estabelecida para a categoria de motorista de pesados no Contrato Colectivo de Trabalho (CCT) aplicável entre 1997 e 2018 era de 98 200 escudos – cf. anexo II (Tabela de remunerações), ponto VI, do CCT entre a ANTRAM – Assoc. Nacional de Transportadores Públicos Rodoviários de Mercadorias e a FESTRU – Feder. dos Sind. de Transportes Rodoviários e Urbanos e outrosAlteração salarial e outras, publicado no Boletim do Trabalho e Emprego (BTE) n.º 30 de 15.8.1997. Esse valor, convertido em euros, equivale a 489,82 euros – cf. artigo 1.º do Regulamento 2866/98 (taxas de conversão entre o euro e as moedas dos Estados Membros que adoptaram o euro).
22. Resulta do documento 1 junto à contestação – contrato de trabalho entre a recorrente e o trabalhador GG – que a retribuição prevista nessa data, 23.3.2004, foi de 750 euros, portanto um valor superior ao que resultava do CCT mencionado no parágrafo anterior. O documento 1 junto à contestação é um documento particular, assinado, não impugnado, cuja força probatória é a prevista no artigo 376.º n.ºs 1 e 2 do CC.
23. Adicionalmente, tal como referiram as testemunhas CC e DD, o recorrente foi inicialmente contratado pela recorrente noutra categoria profissional (conferente de mercadorias), depois passou para a categoria de motorista de veículos ligeiros e mais tarde de motorista de veículos pesados. É o que resulta também do documento 3 junto à contestação que contém os recibos de vencimento do recorrido, que são documentos particulares não assinados, sujeitos à livre apreciação do Tribunal – cf. artigo 366.º do CC. De tais documentos extrai-se que em Março de 2013 o recorrido era conferente de armazém, em Março de 2014 era motorista de ligeiros, categoria que mantinha em 2019 e em Fevereiro de 2020 tinha a categoria de motorista de pesados.
24. As testemunhas CC e DD, mereceram credibilidade quando referiram que os trabalhadores EE e FF são motoristas de pesados que exercem as mesmas funções do recorrido nas instalações do ..., no transporte de produtos farmacêuticos e recebem os dois remuneração idêntica entre si e idêntica à do recorrido. O que é confirmado pelos dos documentos 4 e 5 juntos à contestação – recibos de vencimento dos motoristas de pesados EE e FF – que são documentos particulares não assinados, sujeitos à livre apreciação do Tribunal – cf. artigo 366.º do CC. A evolução salarial que resulta desses documentos foi explicada de modo credível pela testemunha DD.
25. Pelo que, com base nos meios de prova acima analisados, o Tribunal da Relação, no seu juízo autónomo, ficou convicto de que, atendendo à especificidade do transporte de tabaco, que tinha lugar a partir das instalações do cliente da recorrente e exigia a observância, pelos motoristas, de itinerários e número de paragens pré estabelecidos os motoristas que transportavam esse produto, entre os quais o GG, recebiam uma retribuição superior aos motoristas que faziam transporte de produtos farmacêuticos, entre os quais se incluía o recorrido e quando o GG foi transferido para o transporte de produtos farmacêuticos porque a recorrente deixou de transportar tabaco, manteve a mesma remuneração que recebia quando transportava tabaco. Na restante parte, o teor do artigo 14.º alude a furtos frequentes sobre os quais não existe prova suficiente. Em consequência, o Tribunal julga provada a matéria do artigo 14.º da contestação apenas na parte e com os esclarecimentos a seguir mencionados no parágrafo 27.
26. Com base na análise que antecede, o Tribunal da Relação ficou igualmente convicto da veracidade dos factos não provados f) e g) que, por isso, serão retirados do acervo dos factos não provados e incluídos no acervo dos factos provados.
27. Assim, o Tribunal modifica a decisão de facto como se segue:
Adita aos factos provados o seguinte facto, sob a alínea FFF:
FFF. Tendo o GG sido afecto à operação de transporte de tabaco quando foi contratado pela recorrente em 2004, foi depois transferido para a operação de transporte de produtos farmacêuticos em 2011 porque a recorrente deixou de transportar tabaco, mas manteve a mesma retribuição base que recebia quando transportava tabaco, a qual, tendo em conta a especificidade do transporte de tabaco – que era gerido a partir das instalações do cliente da recorrente, exigia a observância de itinerários e número de paragens pré estabelecidos e tinha por objecto caixas cujo valor unitário era de cerca de 2000 euros – era superior à retribuição base dos motoristas de veículos pesados contratados para o transporte de produtos farmacêuticos, entre os quais passou a estar incluído o recorrido, quando, em Janeiro de 2020, começou a exercer funções correspondentes à categoria profissional de motorista de pesados.
Retira dos factos não provados as alíneas f) e g) que inclui nos factos provados sob as alíneas GGG e HHH:
GGG. Encontram-se ao serviço da Ré, afectos à operação de distribuição ... nas instalações sitas na Rua..., os seguintes motoristas de pesados: EE, cujo contrato de trabalho iniciou em 7 de abril de 2011 e FF, cujo contrato de trabalho iniciou em 2 de janeiro de 2023.
HHH. A evolução salarial dos mesmos é a seguinte:
a) Trabalhador EE:
Mês/ano Salário base
abril/2011 €571,20
abril/2016 €581,20
abril/2017 €600,00
abril/2018 €615,00
abril/2019 €675,00
dezembro/2019 €675,00
janeiro/2020 €700,00
janeiro/2021 €733,07
janeiro/2022 €777,05
janeiro/2023 €837,67
b) Trabalhador FF:
Mês/ano Salário base
janeiro/2023 €837,67.
28. Motivos pelos quais procede parcialmente este segmento da argumentação da recorrida.
B. Inexistência de tratamento remuneratório discriminatório
29. A recorrente discorda da sentença recorrida na parte em que julgou existir tratamento salarial discriminatório entre o recorrido e o trabalhador da recorrente GG.
30. A esse propósito, foi a seguinte a fundamentação da sentença recorrida aqui posta em crise:
“Com relevo para a decisão a proferir sobre este tema importa salientar a seguinte factualidade:
- A relação laboral entre Autor e Ré teve início em março de 2013, tendo o Autor a categoria profissional de conferente de mercadorias, auferindo este a título de retribuição a quantia de € 520.
- A relação laboral entre GG e a Ré teve início a 03 de maio de 2004, para desempenhar as funções de motorista de pesados, auferindo este a título de retribuição € 750.
- GG exercia as suas funções numa operação de distribuição de tabaco que cessou em 2010/2011, tendo, a partir dessa data, passado a exercer funções no âmbito da operação de distribuição ... que a Ré tinha, por referência aos armazéns sitos no ..., não tendo visto reduzida a sua situação salarial;
- O Autor passou a exercer as suas funções de motorista de pesados por conta da Ré, no âmbito do contrato de trabalho celebrado, a partir de janeiro de 2020.
- A partir de janeiro de 2020, tendo ambos a mesma categoria profissional, a evolução da retribuição base de ambos os trabalhadores, sobre a qual passou a incidir a percentagem constante da cláusula 61 do CCT, foi a seguinte:

AutorAntónio Carromeu
01/2020€ 700€810,90
01/2021€ 733,07€810,90
01/2022€ 777,05825

Não resulta dos autos qualquer factualidade que justifique a diferença de funções de ambos os trabalhadores da Ré a partir do momento em que ambos passaram a exercer funções no âmbito da mesma categoria profissional, uma vez que a diferença constatada não se deveu a qualquer diuturnidade paga pela antiguidade do trabalhador GG.
Assim, considerando os comandos supra descritos, tem o Autor direito às diferenças salariais existentes entre ambos os trabalhadores, procedendo, neste tocante o pedido formulado.”
31. Para resolver este problema o Tribunal da Relação leva em conta, não só os contornos fácticos descritos no parágrafo anterior, mas também os factos provados FFF, GGG e HHH acima incluídos na matéria de facto provada modificada no presente recurso. Com efeito, resulta de tais factos que: o motorista de pesados GG foi afecto à operação de transporte de tabaco desde que foi contratado em 2004; o recorrido só passou a exercer funções correspondentes à categoria profissional de motorista de pesados a partir de Janeiro de 2020 e na operação de transporte de produtos farmacêuticos; atendendo à especificidade do transporte de tabaco, os motoristas de veículos pesados que transportavam esse produto, como o GG, recebiam uma retribuição superior aos motoristas de veículos pesados que faziam o transporte de produtos farmacêuticos mesmo antes de o recorrido aí iniciar a sua actividade, como resulta dos factos provados NN e HHH; assim, por um lado, quando o GG foi transferido para o transporte de produtos farmacêuticos, porque a recorrente deixou de fazer a operação de transporte de tabaco à qual ele estava afecto desde o início do seu contrato de trabalho, esse trabalhador manteve a mesma remuneração que recebia quando transportava tabaco; por outro lado, os trabalhadores afectos ao transporte de produtos farmacêuticos, desde o início da respectiva actividade como motoristas de pesados ao serviço da recorrente, como é o caso do trabalhador EE, recebiam uma remuneração base inferior à que era paga aos motoristas de pesados que tinham estado afectos à operação de transporte de tabaco; essa situação já se verificava antes de o recorrido ter iniciado as funções de motorista de pesados no transporte de produtos farmacêuticos; com efeito, é idêntica a retribuição base dos motoristas de pesados EE, cujo contrato de trabalho iniciou em 7 de abril de 2011 e FF, cujo contrato de trabalho iniciou em 2 de janeiro de 2023, ambos afectos ao transporte de produtos farmacêuticos como o recorrido; assim como, em Janeiro de 2022, era idêntica a retribuição base do recorrido e do EE, já que recebiam, cada um, a retribuição base de 777,05 euros.
32. Sendo esses os contornos fácticos relevantes, o Tribunal leva em conta o seguinte quadro legal: o artigo 59.º da Constituição da República Portuguesa (CRP) consagra o princípio salário igual trabalho igual, sendo relevantes para aplicar esse princípio, os critérios da qualidade, natureza e quantidade do trabalho prestado; esse princípio constitucional está vertido no artigo 270.º do CT; a Directiva 2000/78 (igualdade de tratamento no emprego e na actividade profissional), que se encontra transposta, nomeadamente, no artigo 24.º do CT, tem por âmbito de aplicação material a discriminação em razão da religião ou das convicções, de uma deficiência, da idade ou da orientação sexual, consagrando para esse efeito o conceito amplo de remuneração, transposto para o artigo 24.º n.º 2 – c) do CT – cf. artigos 1.º, 2.º e 3.º da Directiva 2000/78.
33. Do quadro legal mencionado no parágrafo anterior resulta que as diferenças retributivas entre trabalhadores, não justificadas objectivamente, devem ser qualificadas como tratamento discriminatório e são, portanto, proibidas.
34. Dito isto, o recorrido alegou a discriminação remuneratória com base na violação do disposto no artigo 31.º n.º 2 do CT, tendo indicado e junto os recibos de vencimento do trabalhador em relação a quem se considera discriminado (cf. artigos 7.º a 13.º da petição inicial com a referência citius 34365792 de 6.7.2023). Pelo que, presume-se a existência de discriminação (cf. artigo 25.º n.º 5 do CT). Para ilidir essa presunção legal, a recorrente tem de fazer prova em contrário (cf. artigo 350.º do CC).
35. Ou seja, para que a diferença na retribuição base aqui em causa não seja discriminatória, é necessário que se verifiquem cumulativamente três requisitos previstos no artigo 25.º n.º 2 do CT, a saber, que essa diferença:
• Seja justificada;
• Seja proporcional;
• E prossiga um objectivo legitimo;
tendo em conta a natureza da actividade ou o contexto da sua execução.
36. Segue-se a análise dos requisitos enunciados no parágrafo anterior.
37. No que toca ao carácter justificado da diferença remuneratória, a recorrente logrou ilidir a presunção constante do artigo 25.º n.º 5 do CT através de prova em contrário, na medida em que provou que a diferença de tratamento entre o recorrido e o trabalhador em causa, GG, não assenta em qualquer factor de discriminação injustificado, antes, tem por base um requisito justificável pois foi determinada pelo exercício da actividade de transporte de tabaco à qual estava afecto o trabalhador GG, nomeadamente, devido à natureza desse transporte e ao contexto em que era realizado, que tinham especificidades que não foram apuradas no caso do transporte de produtos farmacêuticos, ao qual se encontra afecto o recorrido desde que exerce a actividade de motorista de pesados para a recorrente.
38. A finalidade do tratamento remuneratório mais favorável dos motoristas que transportavam tabaco é legitima, tendo em conta as especificidades do produto e os requisitos a cumprir pelos motoristas quanto ao itinerário e paragens, apurados no facto provado FFF.
39. Apurou-se que a diferença de tratamento retributivo aqui em crise se manteve mesmo depois de o trabalhador GG ter sido transferido para a operação de transporte de produtos farmacêuticos, ou seja, esse trabalhador manteve uma remuneração superior à que era praticada em relação aos trabalhadores que prestavam actividade na operação de transporte de produtos farmacêuticos. Não obstante essa diferença retributiva já não ter por finalidade proporcionar ao trabalhador a contrapartida pela especificidade do transporte do tabaco, o certo é que a finalidade do tratamento remuneratório diferenciado continuou a ser legitima mesmo após a transferência do trabalhador, porque visou observar a proibição de a empregadora reduzir a sua retribuição. Com efeito, tendo a recorrente cessado a actividade de transporte de tabaco à qual tinha afectado o trabalhador GG desde o início do seu contrato de trabalho, em 2004, para manter esse trabalhador ao seu serviço, a recorrente transferiu-o para o transporte de produtos farmacêuticos em 2011, sem reduzir a retribuição que lhe era paga no transporte de tabaco, que era mais elevada do que a paga aos restantes trabalhadores que transportavam produtos farmacêuticos porque, nos termos dos artigos 129.º n.º 1 – d) e 258.º n.º 4 do CT, a recorrente não podia diminuir a retribuição base do trabalhador GG.
40. Foi nesse contexto que, em 2020, o recorrido passou a exercer actividade de natureza idêntica, na operação de transporte de produtos farmacêuticos, mediante retribuição base de valor inferior à do trabalhador GG, mas idêntica à retribuição base paga aos outros motoristas de veículos pesados que prestavam actividade na mesma operação de distribuição ..., nomeadamente, o trabalhador EE, que exerce funções de motorista de veículos pesados na operação de transporte farmacêutico desde que foi contratado em 2011, como resulta dos factos GGG e HHH.
41. Por fim, a diferença de retribuição apurada não é desproporcional às especificidades do transporte do tabaco, apuradas no facto provado FFF (cf. artigo 18.º da CRP), nem às demais circunstâncias apuradas, das quais resulta que a diferença de retribuição base dos dois trabalhadores (o recorrido e o trabalhador GG), foi diminuindo gradualmente ao longo do tempo em que os trabalhadores vêm desempenhando funções na mesma operação de transporte de produtos farmacêuticos, em consequência da evolução salarial praticada pela recorrente, como resulta dos factos provados NN, RR e HHH.
42. Assim, pelos motivos indicados supra nos parágrafos 31 a 41, afigura-se que, contrariamente ao que alegou o recorrido, a diferença na retribuição base paga ao recorrido, por um lado, e ao trabalhador GG, por outro lado, é justificada, proporcional e prosseguiu objectivos legítimos. Pelo que, à luz do disposto no artigo 25.º n.º 2 do CT, não é discriminatória.
43. Em consequência, improcede a pretensão do recorrido (liquidada no artigo 13.º da petição inicial), de que lhe sejam pagas as diferenças entre a retribuição base que lhe foi paga e a que foi paga ao trabalhador GG e, consequentemente, improcede a sua pretensão de lhe serem pagas as diferenças do complemento salarial e da retribuição específica, calculadas com base no valor dessa diferença da retribuição base, alegadamente em falta.
44. Motivos pelos quais procede este segmento da argumentação da recorrente. Em conformidade, do dispositivo da sentença recorrida acima citado no parágrafo 1, o Tribunal revoga as alíneas a) e b) e a parte da alínea e) que condena a recorrente ao pagamento dos juros de mora sobre as quantias mencionadas nas alíneas a) e b) e substitui, nessa parte, a sentença recorrida por outra que absolve a recorrente de tais pedidos.
C. Observância do princípio da irredutibilidade da retribuição
45. Quanto a esta questão, o litígio entre as partes prende-se com saber se a recorrente infringiu o princípio da irredutibilidade da retribuição quando deixou de pagar ao recorrido o prémio de produtividade. A recorrente defende que não, porque a retribuição que passou a pagar ao recorrido foi superior. Em abono da sua argumentação, a recorrente invocou a aplicação da cláusula 61.º do Contrato Colectivo de Trabalho (CCT), publicado no Boletim do Trabalho e Emprego (BTE) n.º 45 de 8.12.2019, designado por Contrato coletivo entre a Associação Nacional de Transportadores Públicos Rodoviários de Mercadorias - ANTRAM e outra e a Federação dos Sindicatos de Transportes e Comunicações – FECTRANS e outros - Revisão global, doravante designado apenas por CCT ANTRAM-FECTRANS de 2019.
46. A cláusula 61.ª do CCT ANTRAM-FECTRAN de 2019 estabelece um regime específico de retribuição do trabalho de motorista. Provou-se que em consequência da aplicação pela recorrente, desse regime específico de retribuição, a recorrente passou a pagar ao recorrido um valor superior ao que resultava do prémio de produtividade e que, na mesma altura (com efeitos a partir de Janeiro de 2020) deixou de pagar-lhe o prémio de produtividade de 110 euros que lhe era pago 12 vezes por ano desde que o recorrido trabalha para a recorrente – cf. factos provados Y, Z, AA, XX, ZZ, BBB, CCC, DDD, EEE.
47. O problema que o Tribunal tem que resolver é decidir se o prémio de produtividade fazia parte da retribuição do recorrido e nesse caso, se a empregadora não podia deixar de o pagar e se esse valor integra os subsídios de férias e de Natal. O recorrido e o digno magistrado do Ministério Público defendem que sim. A recorrente defende que não, porque o valor da retribuição do recorrido passou a ser superior em resultado da aplicação da cláusula 61.º do CCT ANTRAM-FECTRANS de 2019.
48. Para resolver este problema o Tribunal começa por sublinhar que a cláusula 61.ª n.ºs 1 e 4 do CCT ANTRAM-FECTRANS de 2019 prevê o pagamento, como contrapartida do regime de do trabalho de motorista, de uma retribuição especifica no montante correspondente a 48 % do valor total resultante da soma da retribuição base (cláusula 44.ª), diuturnidades (cláusula 46.ª) e complemento salarial (cláusula 59.ª), não lhes sendo devido qualquer outro valor a título de trabalho suplementar em dia normal de trabalho”.
49. Nos termos da nota explicativa da cláusula 61.ª do CCT ANTRAM-FECTRANS, essa cláusula abrange todos os contratos de trabalho para a função de motorista celebrados anteriormente a esse contrato colectivo de trabalho e substitui a cláusula 61.ª do CCTV celebrado entre a ANTRAM e a FECTRANS publicado bo BTE n.º 34 de 15.9.2018 e a primitiva cláusula 74.º n.º 7 prevista no CCTV celebrado entre a ANTRAM e a FECTRANS (anterior FESTRU), publicado no BTE n.º 9 de 8.3.1980 e demais alterações.
50. Ou seja, com excepção dos valores a título de trabalho suplementar em dia normal de trabalho absorvidos pela retribuição específica prevista nessa cláusula, não resulta da cláusula 61.ª do CCT ANTRAM-FECTRANS de 2019 qualquer diminuição ou absorção de outros valores da retribuição. Pelo que, não merece acolhimento o argumento da recorrente de que o prémio de produtividade que até então pagava ao recorrido foi absorvido/substituído, pelos valores resultantes da retribuição específica do trabalho de motorista previstos na cláusula 61.ª do CCT ANTRAM-FECTRAN de 2019.
51. Dito isto, importa agora verificar se o prémio de produtividade integra ou não a retribuição. A esse propósito, o Tribunal leva em conta que se apurou que tal prémio, no valor de 110 euros, era pago ao recorrido 12 vezes por ano, desde que o recorrido começou a trabalhar para a recorrente e o seu pagamento sempre foi realizado com o objetivo de promover a dedicação dos trabalhadores, um acréscimo de dedicação e zelo (cf. factos provados Y, Z, AA, BB, CCC e DDD).
52. Os contornos fácticos descritos no parágrafo anterior convocam a aplicação do disposto nos artigos 258.º e 260.º do CT.
53. Trata-se aqui de saber se o prémio de produtividade em questão faz parte da remuneração em sentido amplo (cf. artigo 157.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia), que engloba o conjunto de vantagens patrimoniais de que o trabalhador beneficia em razão do seu contrato de trabalho e que podem não ser contrapartida do trabalho prestado, ou se faz parte da retribuição (remuneração em sentido estrito), que corresponde à prestação patrimonial em dinheiro ou em espécie, regular e periódica, devida ao trabalhador por força do contrato de trabalho, das normas que o regem ou dos usos, como contrapartida do seu trabalho (cf. Maria do Rosário Palma Ramalho, Tratado de Direito do Trabalho, parte II, Almedina, páginas 609 a 611).
54. Isto porque, o prémio de produtividade aqui em crise apenas estará coberto pelo princípio da irredutibilidade da retribuição previsto no artigo 129.º n.º 1 – d) do CT, se fizer parte da retribuição (remuneração em sentido estrito), ou seja, se corresponder ao padrão definido pelo artigo 258.º do CT.
55. Assim, à luz do disposto no artigo 260.º n.º 1 – c) do CT, o prémio de produtividade não se considera retribuição se não estiver antecipadamente garantido. Nesse contexto, cabe ao trabalhador/recorrido, provar que recebeu as prestações pecuniárias como prémios de produtividade; feita essa prova, cabe à empregadora/recorrente provar que o pagamento do prémio de produtividade não estava antecipadamente garantido. Ora, embora a recorrente tenha provado que o pagamento do valor em causa se destinava a promover a dedicação e zelo, o certo é que não logrou provar que o pagamento dessa quantia não estava antecipadamente garantido. Assim, independentemente da designação de prémio de produtividade que lhe foi atribuída pelas partes, presume-se que o prémio de produtividade constitui retribuição (cf. artigo 258.º n.º 3). Com efeito, tendo-se apurado que o prémio de produtividade foi pago de forma regular e periódica, 12 vezes por ano, desde que o recorrido trabalha para a recorrente, isso criou no recorrido a expectativa de poder contar com essa especifica parcela do rendimento do trabalho para o seu orçamento pessoal (cf. neste sentido, Abílio Neto, Novo Código do Trabalho e Legislação Complementar Anotados, 3.ª Edição, Ediforum, páginas 514 a 516, jurisprudência ai citada).
56. Em consequência o prémio de produtividade faz parte da retribuição do recorrido, por corresponder à noção de retribuição prevista no artigo 258.º do CT e, por isso, está coberto pelo princípio da irredutibilidade da retribuição previsto no artigo 129.º n.º 1 – d) do CT, não merecendo censura a sentença recorrida na parte em que condenou a recorrente a pagar o respectivo valor, acrescido de juros de mora.
57. Sucede, porém, que, a qualificação do prémio de produtividade como retribuição à luz do disposto no artigo 258.º do CT, não afasta a possibilidade de o mesmo ser pago com uma cadência própria, neste caso de 12 vezes por ano, e de ser excluído do cálculo do subsídio de férias e do subsídio de Natal, como resulta das cláusulas 51.º n.º 3 e 52.º n.º 2 do CCT ANTRAN-FECTRAN de 2019.
58. A este propósito, o Tribunal acompanha a seguinte doutrina (cf. António Monteiro Fernandes, Direito do Trabalho, 21.ª Edição, Almedina, páginas 406 e 407):
“Significa isto, em suma, que a aplicação do critério geral do art. 258.º a um certo tipo de prestação não permite, sem mais, fornecer um tratamento pré-determinado às vicissitudes dessa prestação.
A hipótese do desenvolvimento linear de “um regime homogéneo” da retribuição para todos os efeitos seria, de resto, insuportavelmente absurda. Conduziria, desde logo, a um emeranhado de círculos viciosos no conjunto dos processos de cálculo das prestações derivadas da retribuição (que, por um lado, seriam determinadas com base nela, mas+, por outro lado, seriam nela integradas); traduzir-se-ia, depois, na neutralização das diferentes causas explicativas e legitimadoras dos elementos da retribuição, e, por esse caminho, no desvirtuamento dos produtos da autonomia privada, individual e colectiva, que têm, neste domínio um espaço de actuação incontestável.
Há, pois que assentar no seguinte: a qualificação de certa atribuição patrimonial como elemento do padrão retributivo definido pelo art. 258.º CT não afasta a possibilidade de se ligar a essa atribuição patrimonial uma cadência própria, nem a de se lhe reconhecer irrelevância para o cálculo deste ou daquele valor derivado “da retribuição””
59. Com efeito, sem prejuízo do o prémio de produtividade de 110 euros dever ser qualificado como retribuição à luz do disposto no artigo 258.º do CT e dever ser pago ao recorrido com a cadência apurada, ou seja, 12 vezes por ano, o certo é que a cláusula 51.º n.º 3 do CCT ANTRAM-FECTRANS de 2019, exclui expressamente do cálculo do subsídio de férias quaisquer outras cláusulas de expressão pecuniária além das nela previstas e nela não está previsto o prémio de produtividade; essa cláusula prevê o pagamento de um subsídio de férias de montante igual à retribuição/salário base (cláusula 44.ª), diuturnidades (cláusula 46.ª), complemento salarial (cláusula 59.ª) e outras prestações retributivas que sejam contrapartida do modo específico da execução do trabalho, correspondentes ao período de férias, estabelecendo para esse efeito que as prestações retributivas devidas como contrapartida do modo específico da execução do trabalho, são a retribuição do regime específico de trabalho dos motoristas (cláusula 61.ª), o subsídio de trabalho noturno (cláusula 62.ª número 1 e 63.ª número 1), a ajuda de custo TIR (cláusula 64.ª) e o subsídio de operações (cláusula 67.ª).
60. O mesmo sucede com o subsídio de Natal, uma vez que a cláusula 52.ª n.º 2 do CCT ANTRAM-FECTRANS de 2019 estabelece que para efeitos de cálculo do valor do subsídio de Natal são levados em conta a retribuição base (cláusula 44.ª), as diuturnidades (cláusula 46.ª) e o complemento salarial (cláusula 59.ª), não prevendo a inclusão nesse cálculo de qualquer outra quantia, nomeadamente, do prémio de produtividade.
61. As cláusulas acima mencionadas nos parágrafos 59 e 60 são mais favoráveis ao trabalhador do que os artigos 263.º n.º 1 e 264.º n.º 2 do CT, normas legais aplicáveis, respectivamente, ao subsídio de Natal e de férias. Isto porque, por um lado, o subsídio de Natal previsto no artigo 263.º do CT, sendo uma prestação complementar, deve ser calculado nos termos do artigo 262.º do CT, ou seja, inclui em regra a retribuição base e as diuturnidades (cf. nesse sentido, António Monteiro Fernandes, Direito do Trabalho, 21.ª Edição, Almedina, página 413). Ora a regulamentação colectiva do trabalho acima mencionada no parágrafo 60, acrescenta a tais componentes o complemento salarial. Por outro lado, o subsídio de férias previsto no artigo 264.º n.º 2 do CT compreende, em regra, a retribuição base e outras prestações contributivas que sejam contrapartida do modo específico da execução do trabalho. Ora a regulamentação colectiva do trabalho mencionada no parágrafo 59, prevê a inclusão de prestações adicionais às previstas no artigo 264.º n.º 2 do CT no cálculo do subsídio de férias na medida em que de tal regulamentação colectiva resulta que o subsídio de férias deve ser igual à retribuição/salário base, às diuturnidades, ao complemento salarial e às outras prestações retributivas que são contrapartida do modo específico da execução do trabalho aí previstas, a saber, a retribuição do regime específico de trabalho dos motoristas, o subsídio de trabalho noturno, a ajuda de custo TIR e o subsídio de operações.
62. Nesse contexto, à luz do disposto no artigo 3.º n.º 1 e n.º 3 – j) do CT não existe obstáculo legal à regulamentação do cálculo dos subsídios de férias e de Natal que resulta das cláusulas do contrato colectivo de trabalho acima mencionadas nos parágrafos 59 e 60.
63. Motivos pelos quais, procede parcialmente este segmento da argumentação da recorrente e, em consequência, no que respeita ao dispositivo da sentença recorrida acima transcrito no parágrafo 1, o Tribunal revoga a alínea d), revoga a parte da alínea e) que se refere aos juros de mora sobre as quantias previstas na alínea d) e mantém a alínea c) do dispositivo da sentença recorrida e a parte da alínea e) que prevê a condenação no pagamento dos juros de mora sobre as quantias mencionadas na alínea c).
Em síntese
64. Pelos motivos acima explicados na análise da questão A, o Tribunal da Relação modifica a decisão de facto, aditando aos factos provados um facto sob a alínea FFF e retirando dos factos não provados as alíneas f) e g), que inclui nos factos provados sob as alíneas GGG e HHH.
65. Pelos motivos explicados na análise da questão B, a diferença na retribuição base paga ao recorrido, por um lado, e ao trabalhador GG, por outro lado, é justificada, proporcional e prosseguiu objectivos legítimos. Pelo que, à luz do disposto no artigo 25.º n.º 2 do CT, não é discriminatória.
66. Tendo o recorrido/trabalhador provado que lhe era pago 12 vezes por ano um prémio de produtividade, no valor de 110 euros, desde que começou a trabalhar para a recorrente, cabia à empregadora/recorrente provar que o pagamento do prémio de produtividade não estava antecipadamente garantido, para que essa quantia fosse excluída da noção de retribuição nos termos do artigo 260.º n.º 1 – c) do CT.
67. Não tendo a recorrente feito essa prova, o prémio de produtividade faz parte da retribuição do recorrido, por corresponder à noção de retribuição prevista no artigo 258.º do CT e, por isso, está coberto pelo princípio da irredutibilidade da retribuição previsto no artigo 129.º n.º 1 – d) do CT, não merecendo censura a sentença recorrida na parte em que condenou a recorrente a pagar o respectivo valor acrescido de juros de mora.
68. A qualificação do prémio de produtividade como retribuição à luz do disposto no artigo 258.º do CT, não afasta a possibilidade de o mesmo ser pago com uma cadência própria, neste caso, 12 vezes por ano e de ser excluído do cálculo da retribuição e subsídio de férias e do subsídio Natal, como resulta das cláusulas 51.º n.º 3 e 52.º n.º 2 do CCT ANTRAN-FECTRAN de 2019.
69. Motivos pelos quais procede parcialmente o recurso, o Tribunal da Relação modifica a matéria de facto, revoga as alíneas a), b) e d) do dispositivo da sentença da primeira instância acima transcrito no parágrafo 1, revoga parcialmente a alínea e) do dispositivo e substitui, nessa parte, a sentença recorrida por outra que absolve a recorrente de tais pedidos assim como do pagamento dos respectivos juros de mora. No mais, mantém sentença recorrida.
70. Em suma, no que respeita ao dispositivo da sentença acima transcrito no parágrafo 1, mantém-se apenas a condenação da recorrente a pagar ao recorrido as quantias mencionadas na alínea c) acrescidas dos juros de mora sobre tais quantias referidos na alínea e).

Decisão
Acordam as Juízes desta secção em:
I. Julgar parcialmente procedente o recurso.
II. Modificar a matéria de facto nos termos acima mencionados no presente acórdão.
III. Revogar as alíneas a), b) e d) do dispositivo da sentença da primeira instância acima transcrito no parágrafo 1 e substituir, nessa parte, a sentença recorrida por outra que absolve a recorrente de tais pedidos
IV. Revogar parcialmente a alínea e) do dispositivo da sentença da primeira instância acima transcrito no parágrafo 1 e substituir, nessa parte, a sentença recorrida por outra que absolve a recorrente do pagamento dos juros de mora sobre as quantias acima mencionadas no ponto III.
V. Manter no mais a sentença recorrida.
VI. Condenar cada uma das partes nas custas do recurso na proporção do respectivo – artigo 527.º n.ºs 1 e 2 do CPC, aplicável ex vi artigo 87.º n.º 1 do CPT.

Lisboa, 12 de Fevereiro de 2025
Paula Pott
Paula Santos
Celina Nóbrega