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LIQUIDAÇÃO
EXECUÇÃO PARA PAGAMENTO DE QUANTIA CERTA
TÍTULO EXECUTIVO
JUROS DE MORA
Sumário
1- O simples desacordo da executada sobre a liquidação efetuada não justifica a suspensão da execução. 2- Na execução para pagamento de quantia certa, porque a ação só prossegue contra os executados (ou seus sucessores) e há que executar o título executivo apresentado, não há que apurar a responsabilidade de outras pessoas que eventualmente tenham também contribuído no processo para o atraso no pagamento da quantia exequenda ou dos juros.
Texto Integral
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães
.I- Relatório
Em 25 de Novembro de 2015, foi instaurada a presente ação executiva com forma ordinária para pagamento da quantia de 31.612,77 €. Apresentou-se como título executivo uma letra de câmbio no valor de 26.950,00 €, e peticionou-se, além desse quantitativo, os juros vencidos desde ../../2012 até à data da entrada do requerimento executivo, no valor de 4.611,77 €, bem como o montante de 51,00 € referentes à taxa de justiça paga pela exequente aquando da entrada deste requerimento executivo.
Em 19-11-2020, a executada veio apresentar reclamação da liquidação provisória do julgado, afirmando que não é responsável pelo pagamento dos honorários e despesas do AE, nem das taxas de justiça, nem das custas de parte da exequente, peticionando que se ordene á Exma AE que proceda à reformulação da respetiva liquidação do julgado, retirando-lhe tais quantias cujo pagamento será da responsabilidade do IGFEJ.
Em 12-7-2021, a executada veio pedir a imediata liquidação da totalidade da responsabilidade da executada, esclarecendo "apenas da quantia exequenda e dos respetivos juros", com vista ao pagamento da mesma. Em 13-7-2021, foi emitida guia de pagamento, onde consta como quantia exequenda a quantia de 31 612,77 €, juros de mora 6 135,62 € e custas de parte, indicando-se como saldo -41 598,33 €.
Em 23-09-2021 a executada veio reclamar que nada deve a título de custas.
Em 30-11-2021, a executada veio afirmar pretender proceder, de imediato, ao pagamento voluntário da quantia exequenda em singelo, acrescida dos respetivos juros (ou seja, sem quaisquer custos acrescidos, nomeadamente taxas de justiça e honorários e despesas da Ex.ma AE. Execução) e pede a liquidação da quantia exequenda e respetivos juros.
Em 18-1-2022, a executada veio afirmar juntar comprovativo do pagamento de 31.612,77 €, pedindo a sustação da execução e a liquidação da quantia exequenda e respetivos juros vencidos.
Em 24-1-12022, a exequente pronunciou-se no sentido deste requerimento ser indeferido, porquanto a executada não liquidou a dívida na íntegra.
Em 24-2-2024, a exequente veio opor-se, invocando que a executada apenas liquidou parcialmente a dívida, pelo que não deverá ser sustada (ou suspensa) a presente execução, nem ser suspensa as diligências de venda dos bens penhorados e que os juros de mora, os mesmos deverão ser liquidados até ao dia em que a executada efetuar o seu pagamento.
Em 11-3-2022, a Agente de execução elaborou a seguinte decisão: "Considerando que a executada procedeu ao pagamento por conta dos montantes em dívida, no valor de 31.611,96€ em 19/01/2022, valor este insuficiente para liquidar a quantia exequenda e demais custas processuais, conforme apuramento de responsabilidades que se anexa, decide-se que os presentes autos prosseguirão os seus termos. - Da presente decisão cabe reclamação ao Exmo. Dr. Juiz."
Em 25-5-2022 foi proferido o seguinte despacho: "Notifique-se a AE para juntar aos autos o cálculo da liquidação das responsabilidades da executada, conforme requerido por esta".
Em 26-5-2022, a Agente de execução juntou quadro com "apuramento de responsabilidades / nota discriminativa - Portaria 225/2013 de 10 julho", onde constava: quantia exequenda 31 612,77 €, juros de mora 15 789,01 €, constando como quantias depositadas na conta do AE 31 612,77.
Em 9-6-2022, a Executada veio reclamar da "(NOVA) liquidação da responsabilidade da executada ora requerente efetuada pela Ex.ma AE em 26/05/2022, afirmando que "a liquidação da responsabilidade do executada não foi corretamente efectuada. E, desde logo, quanto ao montante dos juros, porquanto, por um lado, não se consegue descortinar como é que a quantia exequenda poderá ter vencido € 7.356,14 de juros desde o dia 16/06/2021 até á presente data. Sendo certo que, a quantia exequenda (já com juros) era naquela data (16/06/2021) de apenas € 31.612-77 (vd docjunto com o nosso requerimento de 30/03/2022). Por outro lado, a executada só é responsável pelo pagamento dos juros vencidos até ao dia 19/11/2020, ou seja, até á data em que a executada ora requerente apresentou a sua reclamação com a refº de entrada citius: 10787584 ou, na pior das hipóteses, até á data (12/07/2021) da presentação do seu requerimento (comunicação á AE) com a referência de entrada citius nº 11727018, onde a mesma requereu que a Exma AE procedesse á liquidação da sua responsabilidade em singelo ( ou seja, sem os seus honorários e despesas e sem taxas de justiça) em virtude de gozar do beneficio do apoio judiciário."
Em 10-8-2022, a Agente de execução esclareceu que "sobre o valor liquido 26.950,00€ venceram-se juros á taxa indicada no requerimento executivo de 9% desde ../../2012 até á data de entrada do requerimento executivo, no montante de 4611,77€; Sobre o capital liquido 26.950,00€ vencem-se juros desde a data do requerimento executivo (../../2015) até data de liquidação, junto aos autos em 26/05/2022, contabilizando o montante 15.343,54€ referente a juros vincendos".
Em 12-8-2022 o exequente veio aos autos pronunciar-se, além do mais, com o seguinte: "1 . A pretensão da executada é infundada e deve ser indeferida. 2. A executada apenas liquidou parcialmente a dívida. 3. Quanto aos juros de mora vencidos e vincendos, os mesmos deverão ser liquidados até ao dia em que a executada efectuar o seu pagamento, pelo que a pretensão da executada é infundada. 4. A embargante poderia suspender o efeito dos embargos / execução, prestando a devida caução nos presentes autos. 5. Pelo que a reclamação deverá ser julgada improcedente."
Em 8-9-2022 é proferido o seguinte despacho: "Notifique-se o AE para informar os autos se o valor ainda em dívida corresponde exclusivamente aos seus honorários e despesas, como reclama a executada."
Em 9-9-2022 foi prestada a seguinte informação: "Conforme resposta datada de 18/08/2022 "sobre o capital liquido 26.950,00€ vencem-se juros desde a data do requerimento executivo (../../2015) até data de liquidação, junto aos autos em 26/05/2022, contabilizando o montante 15.343,54€ referente a juros de mora;- para além desses juros, encontram-se em falta também despesas e honorários da Agente de Execução.”
Em 17-10-2022 a executada veio dizer que "o referido expediente do Exmo AE não esclarece com suficiente clareza a questão que lhe foi colocada pelo tribunal."
Em 2-11-2022 a Agente de execução vem informar, além do mais, que "Conforme resulta da liquidação da obrigação, sobre o valor liquido 26.950,00€ venceram-se juros á taxa indicada no requerimento executivo de 9% desde ../../2012 até á data de entrada do requerimento executivo, no montante de 4611,77€;Sobre o capital liquido 26.950,OO€ vencem-se juros desde a data do requerimento executivo (../../2015)até data de liquidação, junto aos autos em 26/05/2022, contabilizando o montante 15.343,54€ referente a juros vincendos"
Em 5-7-2023 foi proferido despacho no qual se decidiu que 'julgo procedente e reclamação apresentada pelo executado quanto à nota de honorários do agente de execução com o fundamento de que o mesmo não está obrigado a pagar essa mesma nota de honorários. "
Em 12-1-2024 foi elaborado auto de penhora de depósito bancário.
Em 28-1-2024 a executada veio pedir "notificação da Ex.ma AE para proceder a uma nova liquidação da responsabilidade da executada ora requerente em conformidade, aliás, com o que foi doutamente decidido pelo douto despacho do (já longínquo) dia 05/07/2023, sendo certo que a contagem dos respetivos juros terá, obviamente, de cessar na data exata a partir da qual a Exma. AE poderia (e deveria) ter entregue ao exequente a totalidade da quantia penhorada á ordem dos presentes autos".
Em 14-2-2024 o Agente de Execução veio apresentar quadro em que declara efetuar o “apuramento de responsabilidades / nota discriminativa - Portaria 225/2013 de 10 julho”, com, além do mais, o seguinte teor:
Em 4-3-2024 a executada apresentou a seguinte reclamação de ato do agente de execução: “Salvo melhor opinião, a liquidação da responsabilidade do executada não foi (DE NOVO) correctamente efectuada. De resto, a liquidação ora em apreço é quase idêntica á (ultima) que foi efetuada em 26/05/2012, tendo a Exma AE (incrivelmente) aumentado ainda mais a quantia supostamente em divida (apesar das «custas de parte» não serem da responsabilidade da executada e da nova quantia penhorada). Na verdade, Exma AE voltou a tentar (teimosamente) baralhar este tribunal, imputando, de novo, á executada ora reclamante o pagamento das respetivas «custas de parte» (ou seja, o valor dos seus honorários e despesas), quando este tribunal já decidiu (por despacho já transitado em julgado) que o pagamento de tais despesas não são da responsabilidade da ora requerente. Razão pela qual, deverá, desde logo, ser retirada da responsabilidade da executada ora reclamante a respetiva quantia de € 3.112,3. Como deverá, de igual modo, a Exma AE proceder á correta liquidação do respetivo montante dos juros devidos, tendo em devida consideração que a executada ora requerente procedeu ao pagamento da quantia de exequenda (em singelo) - ou seja, € 31.812,77 – no já longínquo dia 18/01/2022. Com é certo, de igual modo, que a quantia exequenda só deverá vencer juros até á data (19/11/2020) em que a executada ora requerente apresentou a sua reclamação com a refª de entrada citius: 10787584 ou, na pior das hipóteses, até á data (12/07/2021) da presentação do seu requerimento (comunicação á AE) com a referência de entrada citius nº 11727018, onde a mesma requereu que a Exma AE procedesse á liquidação da responsabilidade da executada em singelo ( ou seja, sem os seus honorários e despesas e sem taxas de justiça) em virtude de gozar do beneficio do apoio judiciário. Vd. o teor do nosso requerimento de 18/01/2022 (com a referência de entrada citius nº 12486831; Termos em que no integral provimento da presente reclamação deverá a Exma AE ser notificada par proceder a uma nova liquidação ou, pelo menos, á devida rectificação da liquidação (já efetuada) da responsabilidade da executada ora requerente”.
Em 12-3-2024 a Agente de execução veio informar: “a quantia em dívida é de 20.025,78 Euros - a última penhora efetuada trata-se de uma penhora de saldos no valor de 3.036,28 Euros, que foi objeto de oposição, e que já se encontra contemplado na nota discriminativa junta a ../../2024. - no entanto, devemos ter em atenção que o valor em dívida supra mencionado apenas possui juros de mora contabilizados até à data da junção da nota, ../../2024, pelo que, como sabemos, são contabilizados juros diariamente.”
Em 18-4-2024 a executada apresentou requerimento, em que invocou, além do mais o seguinte: “O ora signatário ignora quais as concretas razões e motivações que terão levado a Exma AE a apresentar o seu expediente ora em apreço. Tanto mais que, o ora signatário ignora qual o exato teor do tal oficio com a refª ...12 a que a Exma. AE alude no seu referido expediente. O certo é que a Exma não faz nele qualquer referência ao teor da nossa reclamação de 04/03/2024, nem a qualquer dos nossos argumentos que nesta foram aduzidos. Limitando-se a afirmar, sem qualquer justificação ou mera explicação (verdadeiro ato de fé!), que «a quantia em divida é de 20.025,78 Euros» e que a nota reclamada só contabilizou os juros até á data (../../2024) da sua junção aos autos; Cremos, pois, que o referido expediente da Exma AE nem sequer se reportará á nossa aludida reclamação de 04/03/2024. Em qualquer caso, sempre se dirá que, face aos pagamentos efetuados e á quantia por si indevidamente retida, a Exma AE ter-se-á esquecido de explicar como é procedeu ao cálculo dos respetivos juros. Ou será que a Exma AE pretende, habilidosamente, imputar á executada ora requerente (também) o pagamento dos juros que se venceram sobre a quantia (€ 3.112,30) que ela própria reteve ilicitamente? Pelo que, se reitera na integra o teor do nosso requerimento/reclamação de 04/03/2024, devendo, pois, ser proferida decisão expressa sobre cada uma das concretas questões que nele foram suscitadas. Mais, requer a VªExª que a decisão em causa seja proferida com a brevidade que a situação recomenda, porquanto, como bem lembrou a Exma AE, a quantia (eventualmente) ainda divida (mesmo a que vier eventualmente a resultar da nova liquidação) estará a vencer juros diários (para a exequente) e alguém os terá de pagar.”
Em 6-5-2024 foi proferido o seguinte despacho: “Notifique-se a exequente e o AE para se pronunciarem sobre o requerimento apresentado pela executada no passado dia 18 de abril.”
Em 20-5-2024 a exequente respondeu: “1. A executada ainda não procedeu ao pagamento dos juros. 2. Lamentável, constitui a atitude da executada, que desde 2015 que anda a protelar o pagamento dos juros. 3. A executada não procedeu ao pagamento do valor em dívida conforme resulta da Douta Sentença. 4. A Sr. AE já informou o método do cálculo dos juros.”
E 24-5-2024 foi proferido o seguinte despacho: “Visto. Nada a ordenar em face da decisão proferida no apenso de oposição à penhora.”
É desta decisão que a Recorrente apela, apresentando as seguintes conclusões:
“Mesmo fazendo uso de todo o nosso esforço interpretativo, parece-nos manifesto que o douto despacho recorrido não contem qualquer segmento decisório, a não ser um lacónico «nada a ordenar»; 4.2- Donde se concluiu sem necessidade de grande esforço intelectual que o despacho ora recorrido não conheceu ou, pelo menos, nada decidiu sobre os pedidos que foram expressa e inequivocamente formulados nos nossos requerimentos de 04/03/2024 e 18/04/2024. 4.3- O que, quanto a nós, consubstancia a nulidade processual a que se alude 615º, nº1, al d) do CPC ( ex vi rtº 613º, nº3); 4.4- Mas mesmo que assim não se venha a entender, sempre se dirá que o despacho ora recorrido está despedido de qualquer fundamentação de facto e direito; 4.5- O que, quanto a nós, consubstancia a nulidade processual a que se alude 615º, nº1, al b) do CPC ( ex vi rtº 613º, nº3). 4.6- Nulidades essas que, nos termos do artº 615º, nº 4 do CPC, também poderão servir, como de facto servem, de fundamento para o presente recurso; 4.7- Em qualquer caso sempre se dirá que a decisão que foi proferida no apenso de oposição á penhora é totalmente irrelevante para economia da decisão a ser proferida sobre a pretensão deduzida no nosso requerimento de 18/04/2024. 4.8- porquanto a referida decisão não contém qualquer explicação, fundamentação ou mero calculo quanto ao concreto montante da quantia exequenda em função da data exacta em que o Exmo Agente de Execução deveria ter entregue a quantia penhorada aos exequentes ora recorridos; 4.9- E, assim sendo, como de facto é, deveria o meritíssimo Juiz quo ter ordenado ao Exmo Execução que procedesse a uma nova liquidação da responsabilidade da executada ora recorrente em função do montante da quantia penhorada e da data exata em que a mesma deveria ter sido entregue aos exequentes ora recorridos; 3.5- Pelo que, ao decidir como decidiu, o douto despacho recorrido padece das nulidade supra invocadas e violou as normas contidas nos artigos 608º, nº2 e 615º, nº1, als b) e d) do CPC ( ex vi rtº 613º, nº3 do mesmo diploma). Termos em que, no integral provimento do presente recurso, deverá ao douto despacho recorrido ser revogado e substituído por outro que proceda ao deferimento do pedido formulado pela executada ora recorrente nos seus requerimentos 5 de 04/03/2024 e 18/04/2024, com todas as legais consequências.”
No despacho de admissão de recurso o tribunal a quo pronunciou-se sobre a nulidade, afirmando, em síntese, que não sendo da sua competência, mas do AE, a liquidação da quantia exequenda, temos confessadas dificuldades, em face de todas as nossas limitações, algumas das quais também do ponto de vista funcional, identificar a reclamada omissão”.
Foi proferida decisão singular, que julgou parcialmente procedente o recurso, anulou a decisão recorrida e julgou as reclamações do Recorrente efetuadas a 18-4-2024 e 4-3-2024 parcialmente procedentes e em consequência determinou que se lesse na liquidação de 12-4-2024 que o montante devido pela Executada, a título de juros de mora perfazia, nessa data, 19.955,55€ e não 20.025,78 €.
A Recorrente reclamou desta decisão, invocando: “1- A presente reclamação é deduzida por mera cautela, ou seja, apenas para a hipótese improvável de se vir a entender que a decisão ora em apreço não é recorrível; 2- Ora, cumpre-nos, desde logo, evidenciar que a questão a dirimir no presente recurso não cabe na previsão da norma contida no artº 656º do CPC; 3- Porquanto, salvo melhor opinião, tal questão não é simples, nomeadamente que tivesse possibilitado á decisão ora reclamada uma mera remissão para outras decisões jurisprudencialmente consolidadas; 4- E, por outro lado, o recurso não é, como não foi, manifestamente improcedente; 5- E a questão a decidir não é simples pela simples razão de que, ao invés do que se refere na decisão ora reclamada, não se resume ao mero cálculo aritmético dos juros; 6- Mas, ao invés e antes disso, consiste em determinar as datas exacta em que o agente de execução deveria ter entregue as quantias penhoradas aos exequentes; 7- Sendo certo que, conforme resulta com manifesta evidência dos autos, o Exmo AE reteve ilicitamente ( durante um largo período de tempo) a quantia correspondente ás suas despesas e honorários estimados; 8- E, salvo melhor opinião, tal questão, por ora, nada tem a ver com a sustação ou não da execução; 9- Nem com o efeito que deverá ser atribuído ás reclamação da ora reclamante contra as liquidações efectuadas pelas Exma AE; 10- Como não é verdade que a ora reclamante não tenha posto em causa o valor a atender para o cálculo dos juros; 11- De resto, esse argumento só valeria para a quantia inicial; 12- Porquanto, a Exma AE teria de deduzir a essa quantia inicial as quantias que, entretanto, foram penhoradas á ora reclamante; 13- E feita essa dedução no timing processual adequado aquele montante inicial já seria inferior; 14- E, por isso, não se venha dizer que a liquidação efectuada retrata já a decisão que entendeu que não eram devidas pela executada as custas do processo e os honorários e despesas do Exmo AE; 15- Sendo certo que, o que está em causa é determinar quem terá de suportar os juros devidos pelo retenção ilícita por parte da AE da quantia correspondente aos seus honorários e despesas e pela sua inusitada demora na elaboração das suas liquidações na sequencia das reclamações da executada ora reclamante; 16- Ou dito de outra forma: deverá ser imputada á ora reclamante a responsabilidade pelo facto da Exma AE ter retido ilicitamente as ditas quantias? 17- E, se assim for, poderá e deverá a ora reclamante imputar essa responsabilidade á Exma AE numa acção judicial autónoma? 18- Ou até participar criminalmente contra a mesma pela prática do crime de abuso de confiança? 19- É que, se assim for, teremos, então, o total arbítrio no reino dos senhores agentes de execução! 20- Que só entregarão as quantias penhoradas aos exequentes quando bem entenderem; 21- Finalmente, salvo melhor opinião, a questão da sustação da execução só releva para o direito dos exequentes ao vencimento dos respetivos juros; 22- Mas já não para a questão de quem terá de os pagar! 23- Tanto mais que, é o próprio AE que decide unilateralmente, e pelos vistos de forma arbitrária, proceder á sustação da execução; 24- Ou seja, a questão a decidir no recurso não é saber se e quando o exequente deixou de ter direito ao vencimento dos juros e em que medida, 25- Mas, ao invés, se é a executada ora reclamante que os terá de pagar; 26- No caso, como os dos autos, em o Exmo AE reteve ilicitamente quantias que penhorou á executada ora reclamante e se atrasou sistematicamente a proceder á correcta liquidação da responsabilidade da executada; 27- E, assim sendo, como de facto é, requer-se a Vª Exª que, depois de ouvida a parte contrária, a matéria versada no douto despacho ora reclamado seja submetida á conferência e que sobre a mesma recaia um acórdão.
Termos em que, no integral provimento da presente reclamação, deverá a decisão singular ora reclamada ser revogada e substituída por outra que mande prosseguir os trâmites normais do presente recurso ou em que, pelo menos, revogue a decisão da primeira instância, devendo esta tomar conhecimento das sucessivas reclamações deduzidas pela executada ora reclamante , com toda as legais consequências “ .II- Questões a apreciar
Importa verificar:
- se a decisão recorrida é nula;
- se os juros devidos pela reclamante foram devidamente contabilizados na liquidação a que se reporta a reclamação que não foi apreciada, para o que importa apurar até quando devem ser contados e se se deve imputar a outrem o pagamento desses juros.
.III- Fundamentação de Facto
Os factos, de natureza processual, já foram enunciados supra.
IV- Fundamentação de Direito
Há neste caso que fazer uma interpretação restritiva do a alínea c) do n.º 1 do art.º 723.º do Código de Processo Civil, “na medida em que uma ideia de irrecorribilidade absoluta colidiria com o direito a uma tutela jurisdicional efetiva (art.º 20.º n.ºs 1 e 4, da CRP)”, conforme jurisprudência do acórdão proferido no processo nº 13644/12...., de 07/11/2019., pelo que passamos de imediato à apreciação do mérito do recurso.
1- Da nulidade do despacho recorrido
Para fundar esta nulidade a Recorrente funda-se no disposto nas alíneas d) e b) do artigo 615º do Código de Processo Civil apontando que o juiz deixou de conhecer de questões que devia ter conhecido e não integrou fundamentação no despacho.
As causas de nulidade da sentença estão taxativamente previstas no artigo 615º nº 1 do Código de Processo Civil e são de caráter formal, dizendo respeito a desvios no procedimento ocorridos na sentença que impedem que se percecione uma decisão de mérito do concreto litígio: não se confundem com todas as situações que podem inquinar uma sentença ou despacho e conduzir à sua revogação.
Não abarcam todas e quaisquer falhas de que uma sentença ou um despacho podem padecer: têm que traduzir-se na falta de assinatura do juiz, na omissão total dos fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão; ininteligibilidade da decisão por oposição entre esta e os fundamentos, ambiguidade ou obscuridade; omissão de pronúncia sobre pedidos, causas de pedir ou exceções que devessem ser apreciadas ou conhecimento de questões de que não se podia tomar conhecimento; condenação em quantidade superior ou em objeto diverso do pedido. Atingem as decisões por razões de natureza mais formal, sem averiguar da sua razão, legalidade ou bondade.
Assim, não constituem nulidade da sentença os erros de julgamento, a deficiente seleção dos factos em que se baseia ou imperfeita valoração dos meios de prova, erros de raciocínio, omissão de pronúncia sobre todos os argumentos levados aos autos e violação de caso julgado.
É efetivamente causa de nulidade da sentença a omissão de pronúncia sobre questões que a exigiam, como dispõe a alínea d) do artigo 615º do Código de Processo Civil.
Essas questões, cuja omissão de pronúncia determina a nulidade da sentença, são aquelas a que se refere o artigo 608º nº 2 do Código de Processo Civil e não são os simples argumentos, razões ou elementos parciais trazidos à liça: identificam-se com os pedidos formulados, com a causa de pedir e com as exceções invocadas, desde que não prejudicadas pela solução de mérito encontrada para o litígio.
É, pois, pacífico que não há que confundir as “questões a conhecer”, com considerações ou factos: aquelas são as mencionadas no artigo 608º nº 2 do Código de Processo Civil, relacionadas com as pretensões das partes, não o conjunto de alicerces (e cada um deles) em que as partes fundam tais “questões”, traduzidas nos factos (preteridos ou mal atendidos) ou na aplicação do direito (normas ou princípios que não terão sido atendidas ou terão sido erroneamente empregados).
Assim, não constituem nulidade da sentença os erros de julgamento, a deficiente seleção dos factos em que se baseia ou imperfeita valoração dos meios de prova, erros de raciocínio, omissão de pronúncia sobre todos os argumentos levados aos autos e até violação de caso julgado (neste último sentido, cf. Acórdão proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça, de 15.2.2007, no processo 07P336, sendo este, e todos os demais acórdãos citados sem indicação de fonte, consultados no portal dgsi.pt).
No caso foi apresentada reclamação a uma liquidação efetuada pelo Agente de execução e o juiz limitou-se a afirmar que nada tinha a ordenar, face a uma decisão que nada tinha a ver com a matéria da liquidação.
Ora, é patente que o despacho recorrido não se pronunciou sobre qualquer reclamação à liquidação, nomeadamente sobre se eram devidos juros e até quando, remetendo apenas para uma decisão proferida sobre a oposição à penhora que não se debruçou sobre estas questões.
E que nada decidiu, apenas afirmando que nada tinha a ordenar.
Embora não compita ao juiz elaborar a liquidação (como afirmou o tribunal a quo a negar esta nulidade), compete-lhe conhecer da reclamação dos atos do agente de execução, pelo que quando é deduzida uma reclamação a esse ato, o juiz tem o dever de sobre ela se pronunciar, afirmando se lhe cabe ou não razão, o que, manifestamente, não foi feito.
Assim, o despacho posto em crise padece de manifesta nulidade.
Porquanto se estipula no artigo 665º nº 1 do Código de Processo Civil que ainda que declare nula a decisão que põe termo ao processo, o tribunal de recurso deve conhecer do objeto da apelação, a sua consequência resume-se, em regra, à substituição da decisão proferida pela solução que venha a ser obtida no tribunal de apelação.
Assim, há que conhecer da reclamação.
2- Da contagem dos juros.
Antes de mais, atento o teor da reclamação, importa explicitar que numa execução apenas pode ser exigido o pagamento da quantia exequenda e dos inerentes juros aos executados (artigos 53º nº 1 e 54º nºs 1 a 4, ambos do Código de Processo Civil: “A execução tem de ser promovida pela pessoa que no título executivo figure como credor e deve ser instaurada contra a pessoa que no título tenha a posição de devedor, exceto se tiver existido sucessão na obrigação, existir garantia real de terceiros ou os bens onerados estejam na posse de terceiro”).
Por outro lado, convém também relembrar que o artigo 10º, nº 5 do Código de Processo Civil, o qual determina que toda a execução tem de ter por base um título, pelo qual se determinam o fim e os limites da ação executiva.
Assim, resultando do título executivo que a executada é responsável pelos juros de mora, não é nesta sede que cumpre apurar se a execução se atrasou por facto imputável a outrem e que tal contribuiu para o atraso no pagamento da quantia exequenda e dos juros: entendendo que tal ocorreu e que tem interesse em fazer valer esse direito que se arroga sobre outrem, a executada terá que o demandar para obter título executivo; caso o obtenha pode, então, executar o direito titulado.
Estes princípios resolvem o problema de saber a quem imputar os juros pelo atraso no pagamento, sejam ou não devidos a incidentes desnecessários, excessivos ou atrasos e demora do sistema e dos seus agentes: os juros são imputados à executada, legitimamente demandada, que não pagou voluntariamente a obrigação e demorou no seu cumprimento.
Não é possível nesta sede apurar outras responsabilidades para o atraso no pagamento da quantia exequenda e dos juros, apenas executar o título executivo apresentado para fundar a execução.
Já foi decidido, com trânsito em julgado que o executado não está obrigado a pagar os honorários do agente de execução e despesas, pelo que as mesmas não são da responsabilidade da executada.
Assim, apenas está em causa até que momento se devem contar os juros.
O Código de Processo Civil, de mais relevante, determina sobre esta matéria, no artigo 703º, nº 2, que quando a execução compreenda juros que continuem a vencer-se, a sua liquidação é feita a final, pelo agente de execução, em face do título executivo e dos documentos que o exequente ofereça em conformidade com ele ou, sendo caso disso, em função das taxas legais de juros de mora aplicáveis.
Em qualquer estado do processo pode o executado ou qualquer outra pessoa fazer cessar a execução, pagando as custas e a dívida.- artigo 846º nº 1 do Código de Processo Civil – devendo o pagamento ser efetuado por entrega direta ou depósito em instituição de crédito à ordem do agente de execução. Efetuado o depósito referido no número anterior, susta-se a execução, a menos que ele seja manifestamente insuficiente, e tem lugar a liquidação de toda a responsabilidade do executado – artigo 846º nº 4 do Código de Processo Civil.
No presente caso, a execução foi instaurada em 3-12-2015 para pagamento da quantia de 31.612,77 € e juros vincendos (dependentes de simples cálculo aritmético).
Em 12-7-2021 a executada veio pedir a imediata liquidação do julgado com vista ao pagamento, a qual foi efetuada em 13-7-2021, indicando-se como quantia exequenda 31 612,77, juros de mora 6 135,62, custas de parte, indicando-se como saldo -41 598,33.
A executada reclamou desta liquidação e em 18-1-2022 depositou o valor equivalente ao capital e juros liquidados no requerimento executivo, sem os juros vencidos após a instauração da execução, pedindo a sustação da execução, o que foi indeferido.
A executada pretende que se atenda à data das suas reclamações das liquidações efetuadas como o terminus do cálculo de juros.
No entanto, carece de razão.
O depósito que a mesma efetuou mostra-se, desde sempre, manifestamente insuficiente para suprir a quantia exequenda: satisfazia apenas o valor que esta atingia no momento em que foi deduzida a execução, quando era manifesto que já haviam decorridos anos desde a data da sua instauração e que, assim, a mesma, porque comportava juros vencidos e vincendos, estava muito longe de estar satisfeita. Destarte, como, aliás, foi decidido, sem reclamação, a 11-3-2022, a execução não se susta e os juros continuam a vencer-se na sua pendência, até que a quantia exequenda se mostre satisfeita.
O simples desacordo da executada sobre a liquidação efetuada não justifica a suspensão da execução – o pagamento da quantia que é devida a título de capital e juros.
Transitou em julgado da decisão que entendeu que não eram devidas pela executada as custas do processo. Também é pacífico (e a liquidação retrata-o) que foi depositado o montante equivalente ao valor liquidado no requerimento executivo.
A agente de execução foi clara em 12-3-2024 em esclarecer o montante da quantia de juros em dívida da nota de 14/2/2024 era 20.025,78 euros e que nessa nota só foram contabilizados juros até essa data sobre a totalidade do capital em dívida. Por seu turno, em 10-8-2022 esclarecera que sobre o capital liquido 26.950,00€ vencem-se juros desde a data do requerimento executivo (../../2015) até data de liquidação.
A executada não coloca em causa o valor a atender para o cálculo de juros (pelo menos de forma percetível), nem teria razão para tal, porquanto não se sustou a execução e a quantia não foi entregue ao exequente, correndo os autos os seus termos; o exequente não pode ser prejudicado pelo facto de a executada não ter pago quantia que poderia eventualmente satisfazer a quantia devida, por ter depositado montante manifestamente muito inferior.
Embora ponha em causa as datas a atender quanto ao terminus da contagem de juros vimos já que carece de razão, por não haver fundamento para sustar a execução.
No entanto, tem razão quanto ás operações de cálculo matemático, embora também não esclareça o valor que entende ser devido. O cálculo dos juros à taxa de 9% ao ano entre ../../2015 e ../../2024 sobre o capital de 26.950,00 não perfaz o montante referido na nota de 14-2-2024, visto que o valor que assim se encontra é 19.955,55€ e não 20.025,78 €, numa diferença de 70,23 €.
Assim, tem razão a recorrente parcialmente, quanto ao valor do cálculo matemático, mas não mais do que isso.
Por o vencimento da Recorrente ser tão diminuto (0,32%), as custas serão na totalidade pela Recorrente, sem prejuízo do apoio judiciário de que goza.
.V -Decisão
Por todo o exposto, julga-se parcialmente procedente o recurso, anula-se a decisão recorrida e julga-se as reclamações do Recorrente efetuadas a 18-4-2024 e 4-3-2024 parcialmente procedentes e em consequência determina-se que se leia na liquidação de 12-4-2024 que o montante devido pela Executada, a título de juros de mora perfazia, nessa data, 19.955,55€ e não 20.025,78 €.
Custas pelo Recorrente (artigo 527º nº 1 e 2 do Código de Processo Civil).