I - Dentro do campo dos negócios jurídicos patrimoniais, a representação voluntária é permitida de um modo geral, incluindo quanto a actos quase negociais, e por força do artigo 295.º do CC.
II - Veda-o a Lei quanto aos actos materiais ou reais, como por exemplo, na posse, como o veda quanto aos actos ilícitos extracontratuais – art.294 do CC.
III - O reconhecimento da propriedade por via da usucapião não repristina a invalidade de uma procuração por ausência de legitimidade substantiva do outorgante para o efeito e apesar do disposto no art.1288.º e 1317.º, al.c), do CC.
IV - Os factos alegados como impugnativos de matéria que, de acordo com o perfil da causa de pedir, ao autor cabe alegar e provar, não devem ser levados aos provados nem aos não provados.
V - Devem ser objecto de prova, trabalhados na motivação da decisão, e na medida que comprometam a prova da versão suporte da pretensão do autor.
VI - A coberto da Teoria da Norma de Rosemberg, critério identificativo do que sejam factos constitutivos, extintivos e impeditivos (art.º342.º do CC), a repartição do ónus da prova processa-se de harmonia com a previsão (geral e abstracta) traçada na norma jurídica que serve de fundamento à pretensão de cada uma das partes.
Recorrente: AA
Recorrida: BB
I.
BB, maior, titular do NIF ......, residente na Rua ..., ..., 6ºD, ... Vila Nova de Gaia, intentou acção declarativa com processo comum contra AA, titular do NIF ......, residente na Rua ..., ..., ... ..., Santo Tirso.
Pede:
-a condenação da R. a pagar- lhe, a título indemnizatório, a quantia de € 263.235,00, sendo €106.685,00 a título de danos emergentes e €156.250,00 de lucros cessantes.
Em alternativa
- a condenação da R. a pagar-lhe a quantia de €275.000,00, correspondente a metade do valor (a sua quota parte) da diferença entre o valor expectável do imóvel em Novembro de 2018 se este apresentasse um estado de conservação normal (€1.250.000,00) e o valor efetivo do imóvel em Novembro de 2018, no mau estado em que se encontra (€700.000,00).
Alegou para tal que a R. desde que ocupou a quinta que é sua compropriedade em 2010, geriu-a e administrou-a de acordo como entendeu e contra a sua vontade, tendo desde então até que 2018, data que lhe foi reconhecido judicialmente por via da aquisição por usucapião o seu direito de metade da propriedade do imóvel.
Mais alega um conjunto de factos que materializam, na sua óptica, a obrigação da R. o indemnizar e ante a degradação e destruição da quinta e sua desvalorização por isso mesmo, igualmente por ter ficado impedido de explorar a atividade que havia no espaço exercido durante 8 anos: eventos.
Citada a R., contestou, tendo invocado à cabeça a excepção de ilegitimidade do A. por, desacompanhado da comproprietária do imóvel, a ter acionado, igualmente a sua própria ilegitimidade por entender que quem deveria ter sido demandada era aquela comproprietária, inabilitada, por ter esta, antes da sua inabilitação, outorgado procuração a seu favor com amplos poderes de administração e disposição do imóvel em seu nome.
No mais, aceitando alguma da matéria articulada na p.i., impugnou a restante, quer por desconhecimento, quer directa e motivadamente.
Conclui pela improcedência da acção, com a sua absolvição da instância e do pedido.
Às excepções respondeu o A. em requerimento autónomo.
III.a) Condena-se a Ré a pagar ao Autor a quantia de € 300,00;
III.b) Condena-se a Ré a pagar ao Autor a quantia relativa à reparação e reposição das portadas da casa da eira, a fixar em sede de liquidação de sentença, em montante que não poderá exceder 50% de € 4.600,00; a quantia relativa à reposição dos radiadores, em montante que não poderá exceder 50% de € 1.000,00; a quantia relativa à reparação da piscina, em montante que não poderá exceder 50% de € 10.000,00; a quantia relativa à reposição de 5 pilares em granito e dos cabos de aço que faziam parte da estrutura do toldo da eira, em montante que não poderá exceder 50% de € 25.000,00; a quantia relativa à reposição da ramada e vides que existiam no logradouro da Quinta, junto à entrada da casa, em montante que não poderá exceder 50% de € 10.850,00; a quantia relativa à reposição do relvado da espécie Gramilha (Cynodon dactilon) que existia no logradouro interior junto à casa e à volta da piscina, em montante que não poderá exceder 50% de € 9.000,00; a quantia relativa à reposição do relvado da espécie Zoysia (Zoysia Japónica) existente na área envolvente do engenho, em montante que não poderá exceder 50% de € 9.320,00; a quantia relativa à reposição do relvado, sem sistema de rega, localizado na zona do terreno mais afastada da casa, em montante que não poderá exceder 50% de € 6.530,00;
III.c) Condena-se a Ré a pagar ao Autor a quantia relativa ao lucro que este deixou de auferir enquanto esteve impedido de explorar economicamente a Quinta ..., a fixar em sede de liquidação de sentença, em montante que não poderá exceder € 4.375,00;
Em alternativa
III.d) Condena-se a Ré a pagar ao Autor a quantia relativa à diferença entre o valor de mercado da Quinta ... no estado em que se encontrava em 2018 e o valor de mercado que teria caso não padecesse dos danos referidos em 33), 35), 36), 38), 41), 43) e 44)-45), em montante que não poderá exceder € 275.000,00.
III.e) Absolve-se a Ré de demais que foi peticionado.
1 – No âmbito dos autos acima referidos foi proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente e, em consequência, condenou-se a R.:
- a pagar ao Autor a quantia de € 300,00;
- a pagar ao Autor a quantia relativa à reparação e reposição das portadas da casa da eira, a fixar em sede de liquidação de sentença, em montante que não poderá exceder 50% de € 4.600,00; a quantia relativa à reposição dos radiadores, em montante que não poderá exceder 50% de € 1.000,00; a quantia relativa à reparação da piscina, em montante que não poderá exceder 50% de € 10.000,00; a quantia relativa à reposição de 5 pilares em granito e dos cabos de aço que faziam parte da estrutura do toldo da eira, em montante que não poderá exceder 50% de € 25.000,00; a quantia relativa à reposição da ramada e videsque existiam no logradouro da Quinta, junto à entrada da casa, em montante que não poderá exceder 50% de € 10.850,00; a quantia relativa à reposição do relvado da espécie Gramilha (Cynodon dactilon) que existia no logradouro interior junto à casa e à volta da piscina, em montante que não poderá exceder 50% de € 9.000,00; a quantia relativa à reposição do relvado da espécie Zoysia (Zoysia Japónica) existente na área envolvente do engenho, em montante que não poderá exceder 50% de € 9.320,00; a quantia relativa à reposição do relvado, sem sistema de rega, localizado na zona do terreno mais afastada da casa, em montante que não poderá exceder 50% de € 6.530,00;
- A pagar ao Autor a quantia relativa ao lucro que este deixou de auferir enquanto esteve impedido de explorar economicamente a Quinta ..., a fixar em sede de liquidação de sentença, em montante que não poderá exceder € 4.375,00;
Ou em alternativa:
- a pagar ao Autor a quantia relativa à diferença entre o valor de mercado da Quinta ... no estado em que se encontrava em 2018 e o valor de mercado que teria caso não padecesse dos danos referidos em 33), 35), 36), 38), 41), 43) e 44)-45), em montante que não poderá exceder € 275.000,00.
2 – Ora a recorrente não pode de todo concordar com essa decisão na medida em que a mesma padece de vários vícios, quer ao nível da matéria de facto seleccionada quer ao nível da matéria de direito aplicada, que a afectam e inquinam e que põem em causa, por isso mesmo, os direitos da recorrente.
3 – Com efeito, este aresto dá a conhecer uma errada interpretação efectuada pelo tribunal acerca da prova produzida sendo certo que, por isso, entendeu qualificar factos como provados que, na verdade, deveriam ter sido considerados como não provados e, em rigor, o tribunal até olvidou alguns factos que foram alegados pelas partes nos seus articulados, e que, como se verá, mostram-se essenciais para o apuramento da verdade.
4 – Na sequência deste erro, o tribunal fez também errada interpretação acerca da matéria de direito que ao caso cabia sendo certo que mesmo que se considere que a matéria de facto foi e está bem avaliada, as consequências jurídicas que dela decorrerem não podem ser nunca aquelas que foram decididas pelo tribunal a quo.
5 – Salvo melhor opinião, a seleção da matéria de facto dada como provada e não provada está manifestamente errada pois existem factos dados como provados que deveriam constar do rol dos factos dados como não provados e, por outro lado existem factos que foram alegados pelas partes que deveriam figurar no elenco dos factos dados como provados uma vez que estes contribuem sobremaneira para uma decisão acertada e fundamentada desta questão que não poderiam ser omitidos como o foram porque importantes para uma boa decisão desta causa!
7 – Ora esta matéria, para além de alegada, foi amplamente discutida e confirmada no decorrer da audiência de discussão e julgamento por VÁRIAS testemunhas que neste caso depuseram e pelos próprios documentos que foram juntos aos autos pelo que não percebemos, por isso, como é que o tribunal a quo nem uma linha lhes dignou reconhecer na sentença até porque esta factualidade se relaciona e muito com aquilo que efectivamente está a ser discutido nos autos.
8 – Tendo em conta o que se discute nos autos, o caminho para a decisão começaria no apuramento do estado da Quinta ... antes da entrada da R. para que nela passasse a viver uma vez que para que se possa aferir da existência de danos cuidamos, salvo melhor opinião, que o primeiro passo que se deve tomar para se chegar a essa conclusão é, precisamente, perceber em que estado estava a coisa antes dos alegados e eventuais danos.
9.O A. alega que quando deixou de poder entrar na Quinta ..., esta estava em “bom e cuidado estado de conservação, evidenciado pelo elevado número de eventos que lá se realizavam” – cfr. artigo 22. da petição inicial que deu origem aos presentes autos – porém, esta alegação não é verdade!
10 – Acaso o tribunal a quo tivesse atendido ao que foi alegado em sede de contestação relacionado com a prova produzida em todo este processo, teria percebido e dado como provado que a Quinta ..., em Dezembro de 2010, não estava em bom estado de conservação nem estava apta a habitar nem a receber eventos – a R. disse-o na sua contestação e isso ficou manifestamente provada em sede de audiência de discussão e julgamento pelo que aquilo que foi alegado pela R. é que tinha mais correspondência com a realidade.
11 – A testemunha CC cujo depoimento consta do ficheiro informático Diligencia_9-20.8T8PVZ_2023-10-18_15-36-35, veio ao tribunal dizer, desde logo, que a R. pediu-lhe para fazer várias intervenções na Quinta ..., num período compreendido entre finais do ano de 2010 e/ou inícios de 2011 – cfr. minuto 02:20 até ao minuto 03:12 – serviços esses que consistiam em várias intervenções ao nível de várias especialidades e, no que à sua arte de carpinteiro dizia respeito, foram, a pedido da R., intervencionados a cozinha e o salão da Quinta ... que serviriam para as festas/eventos que ali se realizassem – vide minuto 04:03 até ao minuto 04:46.
12 – Esta testemunha fez, inclusivamente, um tecto novo na cozinha que servia esse salão e, de resto, esta testemunha também confirmou que, a mando da R., também realizou diversas obras em diversos aposentos na parte habitacional da Quinta ... que estavam em estado inabitável – v.g. de «grosso» - nomeadamente ao nível de quartos, metendo flutuante, guarnições nas portas e janelas, persianas, arranjou casas de banho e até chegou a realizar serviços de trolha, enfim, um manancial de obras que dão a entender p estado real da Quinta ...
13 – Ao mesmo tempo, assumindo a veste de empreiteiro, esta testemunha estabeleceu contactos com outros artistas de outras especialidades no sentido de o ajudar a concretizar todas estas obras sendo certo que, neste particular, a testemunha relatou que conseguiu arranjar electricistas e picheleiros que instalaram e repararam diversos produtos e sistemas eléctricos, várias ligações e uma rede de internet para servir diversos cómodos do imóvel e, ao nível de pichelaria, foram feitas várias reparações inclusive uma reparação de um motor para um poço de recolha e abastecimento de águas – cfr. depoimento constante do ficheiro acima referido do minuto 04:50 até ao minuto 09:58 – tudo a mando da R..
14 – Nada nos autos existe que desminta ou infirme este depoimento e, em consequência deveria o tribunal ter entendido que, ao contrário do que foi alegado pelo A. na sua petição inicial e ao contrário do que aquilo que a sentença ora em crise dá a entender, a Quinta ... não tinha, afinal, boas condições de conservação atenta a dimensão e densidade de obras que foram realizadas ao nível interior.
15 – Até por força da aplicação das regras da experiência comum e do normal acontecer, se pode concluir que se foi necessário intervencionar o salão e a cozinha da Quinta ... que acolhiam os eventos, onde se realizavam e se confecionavam as refeições para estes, logo em finais de 2010 e/ou inícios de 2011, parece resultar claro que, afinal, aqueles espaços não estavam propriamente nas melhores condições para receber eventos.
16 – E o mesmo se diga em relação à situação exterior da Quinta ... pois foi dito e alegado que logo que a R. tomou posse do imóvel, esta encontrou-o bastante destratado, com silvas e mato em lugar de relva e espaços verdes arranjados, e que a piscina apresentava-se completamente desfigurada e negligenciada na sua essência o que impossibilitava o seu uso – e mais do que ter alegado, a R. conseguiu provar esta factualidade.
17 – No depoimento da testemunha CC – constante do ficheiro informático Diligencia 9-20.8T8PVZ 2023-10-18 15-36-35 do minuto 11.55 até ao minuto 13:30–retira-sequeaquandodoseuprimeirocontactocomaQuintadeLeigal, em finais do ano de 2010 e inícios do ano de 2011, apercebeu-se que na mesma existia uma piscina/tanque cuja água “estava verdinha” o que não é compatível com aquilo que foi alegado na petição inicial e bem assim com as fotografias que o A. utilizou naquela peça processual para tentar demonstrar o estado da Quinta ... antes de a R. passar lá a residir.
18 – Não é verosímil que uma piscina fique no estado descrito pela testemunha num tão curto espaço de um ou dois meses; mas já se relacionarmos esta percepção da testemunha com o problema de reparação de motor de abastecimento de água que ele diz que viu fazer, tudo já faz mais sentido uma vez que este motor estava avariado mesmo antes de a R. entrar na Quinta ... e, em consequência, a água da piscina não fazia a circulação e tratamento devido o que a tornou inutilizável para o fim a que se destinava ficando abandonada à sua sorte e natureza redundando numa espécie de tanque/lago que foi percepcionado pela testemunha.
19 – Este é um depoimento directo sobre a factualidade em causa, temporalmente referenciado em finais do ano de 2010 e inícios do ano de 2011 e que deveria ter sido atendido pelo tribunal forçando-o a retirar outro tipo de conclusões que não aquelas que retirou.
20 – Ainda com vista a aquilatar o estado de conservação da Quinta ... ao tempo da entrada da R. para lá passar a residir, o tribunal deveria ter centrado as suas atenções naquilo que foi referido pela testemunha DD, vizinha próxima da Quinta ..., quando esta refere que, tendo frequentado a mesma ao logo de vários anos, quer antes quer depois de a R. ir para lá viver, veio ao tribunal prestar o seu depoimento donde se pode retirar que no decorrer do ano de 2009, a Quinta ... não recebeu qualquer evento – cfr. ficheiro informático Diligencia_9-20.8T8PVZ_2023-10-18_14-18-07 do minuto 04:21 até ao minuto 06:13.
21 – Mais adiante, quando questionada nesse sentido, refere que a Quinta ..., antes de a R. passar a residir na mesma, estava com muito mato, muito lixo, tudo arrombado – vide depoimento no ficheiro referido do minuto 08:18 até ao minuto 10:40 – e tanto teve esta percepção ao entrar na Quinta nesta altura, ou seja, no decorrer do ano de 2010, como constatou esta situação quando olhava para o interior da Quinta pelo lado de fora da mesma.
22 – Note-se que esta testemunha assenta a razão de ciência do seu conhecimento dos factos numa relação de vizinhança próxima da Quinta ... o que legitima e deveria relevar e obrigar o tribunal a quo a dar um tratamento preferencial desta testemunha em detrimento de umas fotografias sem data concretamente aferida.
23 – Ainda acerca desta matéria existe uma testemunha que de um modo, claro, conciso e sucinto esclarece sobremaneira qualquer pessoa acerca do real estado de conservação e manutenção dos espaços exteriores que circunda a Quinta ... em toda a sua extenção ao tempo em que a R. entra para lá passar a residir: a testemunha EE – cfr. depoimento constante do ficheiro informático Diligencia_9-20.8T8PVZ_2023-05-17_14-55-45.
24 – Esta testemunha veio a juízo dizer que, doze anos antes do seu depoimento, a R. lhe encomendou um serviço que consistia na limpeza da Quinta ... ao nível de espaços exteriores o que, atenta a data do seu depoimento prestado no decorrer do ano de 2023 – cfr. do minuto 03:10 até ao minuto 03:55 – e se bem sabemos fazer contas, quer dizer que esse serviço terá ocorrido no ano de 2011, isto é, muito pouco tempo depois de a R. se instalar na Quinta ...!
25 – Quando questionado acerca do tipo de trabalhos que lá foi realizar, esta testemunha esclarece que “Aquilo estava cheio de silvas! Tinha 3 e 4 metros de altura de silvas! Eu limpei aquilo tudo! As silvas chegavam ao telhado! Aquilo nem se via piscina nem nada!” – vide depoimento do minuto 03:58 até ao minuto 04:27 – pelo que conjugando este depoimento com aquilo que o próprio tribunal diz na página 41 da sentença ora em crise quando refere que as silvas “(…) como é do conhecimento geral, na zona norte do nosso país, ‘apoderam-se’ das áreas de terreno que não são cuidadas, anos a fio” é fácil de concluir que em 2011 a Quinta ... estava coberta de silvas com cerca de 3 e 4 metros de altura e que para atingir este nível de altura, as silvas e o terreno já não deveria ser efectivamente limpo, mesmo junto à piscina há mais de 3 (três), 4 (quatro) ou 5 (cinco) anos!
26 – E isto bate certo com o que esta mesma testemunha diz do minuto 12:45 até ao minuto 13:25 quando refere que antes de ele fazer o serviço já não havia lá nada, estava tudo parado, já não havia casamentos – este é um conhecimento directo dos factos aqui em causa e por isso, ao que tudo indica, por via desta e das outras testemunhas, parece ser claro que a Quinta ..., em finais de 2010 e inícios de 2011, não estava, afinal, em boas condições de receber pessoas para ali viverem nem receber eventos.
27 – Aliadas estas conclusões ao facto de durante o ano de 2019 não se terem realizados quaisquer eventos na Quinta ... – na decorrência do que ficou dito e na consequência do facto dado como provado sob o número 21 – quer isto significar, portanto, que no decorrer desse ano a Quinta ... sofreu umduro revés no seu estado de conservação pois de outra forma a testemunha DD não conseguiria ver mato e lixo acumulado no interior da Quinta.
28 – Todos os depoimentos acima referidos ganham ainda mais consistência se os conjugarmos com as declarações de parte prestadas pela R. na audiência de discussão e julgamento que a este caso coube e que constam do ficheiro informático Diligencia_9-20.8T8PVZ_2022-10-24_14-16-17 na medida em que todas as testemunhas acima referidas confirmaram ao tribunal aquilo que a R. acerca desta matéria conforme se alcança pela audição do ficheiro acima referido, em concreto, do minuto 16.35 até ao minuto 19:50 e do minuto 20:05 até ao minuto 21:20.
29 – De tudo quanto aqui ficou exposto, parece resultar de forma clara que mal a R. entrou na Quinta ..., deparou-se com um adiantado estado de degradação do imóvel sendo certo que também, e por isso, a R. viu-se na obrigação de mandar limpar e arranjar todas as partes exteriores necessárias – limpeza de mato, vegetação, poda de árvores, corte de relva, limpeza de piscina e espaços circundantes – já que a Quinta, tal qual a encontrou, estava sem esses cuidados.
30 – Era imperioso o tribunal a quo pronunciar-se sobre esta factualidade – dando-a como provada ou não provada – para que depois se pudesse aferir se, afinal, a R. provocou danos na medida em que o dano só existe sobre algo que não esteja danificado!
31 – E segundo o que acima se apurou em decorrência da prova produzida, quer-nos parecer, salvo melhor opinião, que aquando da entrada da R. na Quinta ... – Dezembro de 2010 – quer a(s) construção(ões) ali existente(s), quer os relvados quer a piscina que a mesma detinha já não estavam em bom estado de conservação sendo certo que esta conclusão é suportada em prova directa e credível que se produziu em relação a esta matéria e que contraria a presunção assumida pelo tribunal de que a Quinta ... estava em bom estado de conservação.
32 – Era este o raciocínio lógico que o tribunal deveria ter feito e, não o tendo feito, errou o tribunal – e porque assim é não deveria o tribunal ter olvidado os factos alegados em 57º) e 58º) da contestação apresentada pela R. e deveria ter considerado estes factos dados como provados!
33 – Mediante a prova testemunhal que acima se escalpelizou – cfr. depoimento da testemunha CC constante do ficheiro informático Diligencia_9- 20.8T8PVZ_2023-10-18_15-36-35 do minuto 04:03 até ao minuto 09:58 e do minuto 11.05 até ao minuto 11:55 – corroborado com aquilo que a R. disse – vide ficheiro informático Diligencia_9-20.8T8PVZ_2022-10-24_14-16-17 do minuto 20:05 até ao minuto 21:20 – parece resultar de forma inequívoca que o tribunal deveria ter tomado posição sobre outra matéria factual que foi trazida aos autos pela R., que foi realmente demonstrada, e deveria ter também dado como provado o que foi alegado de 59º) a 63º) e de 72º) a 74º) da contestação apresentada a saber: 59º) Já na parte residencial, a R. encontrou pelo menos 3 (três) casas de banho da área residencial em estado de grosso e se qualquer hipótese de uso; 60º) Foi a R. que mandou meter tectos falsos, iluminação, louças e chão em parquet naquelas casas de banho tornando-as assim utilizáveis; 61º) Foi a R. que mandou forrar as janelas que existem no espaço dedicado à habitação da Quinta ao nível da bordadura/guarnição que estavam ainda em grosso – v.g. em cimento; 62º) Foi a R. que mandou rebocar e pintar as paredes e tectos do hall de entrada da zona residencial que estavam inacabados; 63º) Foi aR. que mandou instalar grades de segurança em todas as janelas que servem a habitação excepto as da fachada principal – vide fotos juntas pelo A.; 72º) Foi a R. que durante o período em que lá esteve a coabitar a Quinta juntamente com a sua irmã FF mandou instalar um sistema de vídeo vigilância composto por 4 câmaras; 73º) Porque o tecto da cozinha industrial não cumpria as normas regulamentares exigidas pela Autoridade Segurança Alimentar e Económica, a R. viu-se na obrigação de mandar colocar um novo tecto da cozinha industrial para além do investimento que já lá tinha feito; 74º) Foi a R. que mandou criar ligações de internet nos cómodos todos da casa quer da zona residencial quer da zona destinada a eventos.
34 – Esta factualidade nunca foi negada ou contraditada pelo A. pelo que não se percebe como é que o tribunal não a considerou na sua fundamentação sendo certo que, não o tendo feito, também aqui errou o tribunal na apreciação da prova que foi produzida.
35 – Também quanto aos factos alegados na contestação apresentada pela recorrente quando refere que 84º) Outra das possibilidades exploradas foi a locação temporária da casa da eira por via da plataforma ... que ainda teve alguma procura durante os anos de 2015 e 2016 e que 86º) Que assim se foi mantendo num estado de conservação aceitável conforme se poderá constatar pelas fotografias tiradas à época e que serviram de base para o site publicitar o espaço – cfr. docs. 16 a 29 deveria o tribunal ter tomado posição quanto àqueles.
36 – Se ouvirmos com atenção aquilo que referiu a testemunha DD no seu depoimento constante do ficheiro informático Diligencia_9-20.8T8PVZ_2023-10-18_14-18-07 do minuto 12:00 até ao minuto 12:39 e do minuto 20:15 até ao minuto 22:53 e quando confrontada com as fls. 190 verso e 192, 193, 194 verso 195 e 196 a 197 verso – esta confirma que sabe que a R. locou a casa da eira da Quinta ... em regime de alojamento local porque tinha pessoas a frequentar o seu estabelecimento que eram reencaminhadas pela R. para ali fazerem as suas refeições mais referindo que tanto esta parte como a globalidade da Quinta ... sempre esteve em condições correspondentes às que viu nas fotografias exibidas
37 – Já quando questionada se, por exemplo, no ano de 2017 se recordava de ver a Quinta ... naquelas condições verificadas nas fotografias exibidas, esta testemunha declarou peremptoriamente que desde que sabe que a R. lá habitou sempre conheceu a casa naquelas condições – a este respeito, atente-se também àquilo que a R. referiu nas suas declarações de parte do minuto 21:17 até ao minuto 22:16 de onde se retira a mesma conclusão, isto é, que a R. utilizou parte da Quinta ... para alojamento local.
38 – Existe, portanto, prova mais que suficiente para sustentar a prova dos factos alegados em 84º) e 86º) da contestação apresentada pela R. Pelo que o tribunal deveria fazer constar estes factos no rol dos factos dados como provados – e assim tinha decidido bem!
Acresce ainda que,
40 – Segundo a prova que foi produzida deve-se concluir que já antes de Dezembro de 2010 as portadas da casa da eira já apresentavam sinais de deterioração quer por força da acção natural do tempo, quer por força de acção humana activa ou omissiva.
41 – Nas suas declarações de parte, a R. refere que quanto se instalou na Quinta ..., constatou que algumas portadas da casa da eira já tinham vidros partidos – cfr. Diligencia_9-20.8T8PVZ_2022-10-24_14-16-17 do minuto 20:13 até ao minuto 20:28 – ou seja: pode e deve-se concluir que já existiam algumas deteriorações nas portadas em causa antes de Dezembro do ano de 2010 e que não foram reparadas por quem de direito, isto é, pelo A. e pela sua irmã, possuidores da Quinta ... antes da entrada da R.
42 – Já depois da entrada da R. na Quinta ..., o que aconteceu foi aquilo que a R. disse de forma esclarecida e que o Juiz a quo assentou: que “relativamente às portadas da casa da eira, em vidro e madeira, algumas foram partidas por ação da sua irmã FF e algumas por ação do vento e das condições climatéricas” foram degradando-se – ver assentada ordenada pelo Juiz no decorrer da sessão de audiência de julgamento realizada em 24/10/202.
43 – Quando muitoadmitia-se que o tribunal a quo desse como provadoque entre dezembro de 2010 e 2018, as portadas da casa da eira, em vidro e madeira, degradaram-se, tendo algumas delas sido retiradas, mas nunca que estas circunstâncias se deveram à falta de manutenção propiciada por qualquer atitude activa ou omissiva da R..
44 – Ademais, a sentença não específica que em que período do ano de 2018 foi constatada essa degradação e, se o tribunal dá como provado que “no decurso do ano de 2018, em data anterior ao mês de novembro de 2018, mas não antes de 06-04-2018, a Ré saiu da Quinta ...”, não pode o tribunal dar como garantido que os danos, a existirem e a serem verificados de acordo com as fotografias que integram os documentos 7 e 10 apresentados com a petição inicial, surgiram antes da saída da R. e não depois uma vez que depois da saída da R. da Quinta ... ficou lá gente a residir, nomeadamente, a sua irmã FF e o seu irmão GG o que foi habilmente omitido em todo este processo pelo A. – vide declarações de parte constantes do ficheiro Diligencia_9-20.8T8PVZ_2022-10-24_14-16-17 do minuto 32:00 até ao minuto 33:00.
45 – Por isso o sentido de prova do tribunal relativamente a este facto deveria ter sido outro até porque, conforme já referido, as fotografias que integram os autos de fls. 190 verso e 192, 193, 194 verso 195 e 196 a 197 verso retratam, de uma forma geral, o estado da Quinta ... durante o tempo em que a R. lá se instalou – cfr. acima o depoimento da testemunha DD.
46 – Todos estes últimos raciocínios acerca do período temporal que medeia entre a saída da R. e finais do ano de 2018 – cerca de 7/8 meses – são válidos, mutatis mutandis, quanto à matéria fáctica dada como provada sob os números 35), 40) a 45) uma vez que, em qualquer um destes pontos, o tribunal a quo limita-se a dizer que entre Dezembro de 2010 e 2018 aconteceu algo – seja a deterioração das portadas, da piscina, da relva, ou outros sem relevar que em mais de metade do ano de 2018, a R. não esteve na posse do imóvel que constitui a Quinta ...!
47 – E como se disse, esta factualidade dada como provada, assim considerada temporalmente, não é compatível com a prova que foi produzida e que diz respeito ao período em que a R. lá viveu – até o início de Abril de 2018 – neste sentido, vide as declarações de parte da R. acima revisitadas e o depoimento da testemunha DD na parte correspondente.
48 – Concorre também para esta conclusão o depoimento prestado pela testemunha HH que afirma que tem ideia de ter frequentado a Quinta ... até ao ano de 2018 – cfr. ficheiro informático Diligencia_9-20.8T8PVZ_2023-10-18_14-57-36 do minuto 04:45 até ao minuto 05:41 – e que tanto quanto se recorda a Quinta ... estava em melhor estado quando a R. deixou de lá residir em comparação com o estado do mesmo imóvel aquando das primeiras vezes que o frequentou quando começou a ir lá depois do momento em que a R. foi para lá residir – vide o minuto 12:15 até ao minuto 12:25.
49 – Atendendo à quantidade e qualidade probatória é impossível negar isto: que aquando da saída da R. da Quinta ..., esta deixou o imóvel nas condições que se podem verificar nas fotografias insertas nas fls. 190 verso e 192, 193, 194 verso 195 e 196 a 197 verso! O que aconteceu depois de Abril de 2018 não sabemos nem o tribunal sabe!
50 – Com efeito, ao decidir como decidiu, o tribunal desacredita a R., a testemunha DD e outras sem qualquer fundamento ou argumento válido para o efeito quando, na realidade, os seus depoimentos prestados em tribunal que se mostraram seguros, concisos, coerentes e directos implicam, desde logo, outra decisão.
51 – Mas, em boa verdade, o tribunal a quo, com a fundamentação que apresenta, descredibiliza-se a ele próprio pois confunde termos, confunde períodos temporais, confunde nomes de testemunhas, enfim, confunde tudo!
52 – Se analisarmos a fundamentação que apresenta para justificar a sua análise quanto à prova relativa ao facto dado como provado no número 35 o tribunal a quo diz-nos que “(…) Da conjugação dos meios de prova acabados de referir, entendemos que, entre dezembro de 2010 e 2018, houve uma fase em que a piscina foi utilizada, o que faz pressupor a sua manutenção e conservação, mas que depois a Ré deixou de cuidar da manutenção e conservação da piscina, o que é evidenciado, nomeadamente, pela fotografia 12. (…) assumindo, portanto, que a R. praticou actos de manutenção e conservação.
53 – E é isto que nos choca nesta sentença pois se lermos com atenção toda a motivação da matéria de facto, ficamos com a nítida sensação que a R., afinal, cuidou da Quinta ... da maneira que pode e da melhor forma que pode e soube fazer tendo-o feito até ao momento em que saiu da Quinta ... deixando-a, nesse momento, em condições muito diferentes do que aquelas retratadas nas fotografias que o tribunal valorou, neste caso em específico, na fotografia 12.
54 – Ficou provado que a piscina manteve-se a uso no período compreendido entre Dezembro de 2010 e Abril de 2018 graças à intervenção da R. que a manteve desde o momento em que passou a residir na Quinta ... até à sua saída como resulta da prova que, por sinal, é abundante neste sentido.
55 – Desde logo, relembremos que foi a R. que mandou reparar a bomba que fornecia água à piscina – cfr. depoimento da testemunha CC acima referido sendo certo que esta mesma testemunha, em finais de 2010 e/ou inícios de 2011 viu qualquer coisa “verdinha” parecida com uma piscina na Quinta ... o que faz pressupor que a R. encontrou a piscina em mau estado de conservação – que foi a R. que tentou impermeabilizar a piscina pois a mesma apresentava microfissuras antes da intervenção da R. e não depois de retirada a pastilha – cfr. declarações de parte da R. constantes do ficheiro Diligencia_9-20.8T8PVZ_2022-10-24_14-16-17 do minuto 22:17 até ao minuto 22:46.
56 – Estes actos fizeram com que a piscina pudesse ser utilizada mantida e utilizada tal como confirmaram as testemunhas II, DD (cujo marido até forneceu a tinta para ser utilizada na piscina como se refere na motivação) e HH.
57 – Tudo isto é prova concreta e credível que deveria ter sido valorada pelo tribunal e que indica apenas e só um sentido: que a R., enquanto esteve a residir na Quinta ..., cuidou da manutenção e conservação da piscina que equipa esse imóvel; já o que aconteceu depois de Abril de 2018 não sabemos o que aconteceu nem o tribunal sabe e por isso, o número 35) dos factos dados como provados deve ser dado como não provado pois tudo aponta nesse sentido conforme acima vimos.
58 – Também os factos dados como provados sob os números 40) a 45) da matéria de facto dada como provada devem ser eliminados do rol tal qual se apresentam na sentença em crise.
59 – Sem prescindir da tese que apresentamos que vai no sentido de que os relvados aqui em questão já não estavam em boas condições aquando da entrada da R. na Quinta ... – cfr. acima – mesmo que não se enverede por essa opinião, julgamos, salvo melhor opinião, que que o tribunal a quo decidiu mal esta matéria uma vez que o tribunal confundiu a questão de saber se uma obrigação foi ou não cumprida com a questão de quantificar o quantum desse cumprimento e se esta quantificação satisfaz ou não a subjectividade de um qualquer credor ou de um qualquer interprete da questão!
60 – Se o tribunal entendeu, e bem, que a R., enquanto residiu na Quinta ..., cuidou, manteve e conservou os espaços relvados da Quinta ..., nomeadamente, aqueles que faziam parte do logradouro interior junto à casa e à volta da piscina e na área envolvente do engenho isto é suficiente para fazer quedar a tese do A. quando imputa a degradação dos relvados aqui considerados apenas e só a uma conduta da R. e aqui se esgota a questão de saber se a R., num acto voluntário e consciente, cumpriu ou não cumpriu com a obrigação a que eventualmente pudesse estar obrigada (o que não era o caso como adiante veremos).
61 – É do senso comum que quando se refere que existiu uma manutenção mínima é porque esta cumpriu, no limite do incumprimento, com a manutenção que se exigia um homem médio, colocado no lugar da R., tendo de decidir e agir com os meios que a R. tinha disponíveis naquele momento – já o mesmo não poderíamos dizer se a manutenção que foi feita ultrapassasse esse limite mínimo, ou seja, se a manutenção ficasse bastante aquém do que um homem médio, colocado no lugar da R., teria feito, pois aí, até poderíamos concordar que manutenção aplicada não estava a cumprir com o desiderato proposto – logo, existiria incumprimento da obrigação!
62 – Ora, o tribunal depois de ter constatado que a R. cumpriu, no limite do incumprimento, com aquilo que estava eventualmente obrigada, enredou-se em considerações subjectivas da questão acabando por contradizer-se quando, afinal, veio dizer que a R. cuidou pouco da manutenção dos espaços em questão.
63 – Cuidar pouco é diferente de cuidar minimamente e enquanto num caso, quando se diz que cuidou pouco, ultrapassou-se, no sentido negativo, o limite do incumprimento, no outro caso, estamos dentro, no sentido positivo, do limite do incumprimento – logo estamos em terreno correspondente ao cumprimento!
64 – Por outro lado, o tribunal concluiu que a R. cuidou pouco destes relvados sem que tenha apresentado qualquer raciocínio fundamentado para extrair essa conclusão, ou seja, sem considerar ou explicar quais seriam as diligências que a R. deveria ter tomado para conservar e manter os relvados aqui visados isentos dos alegados danos!
65 – Quando o tribunal a quo admite, na sua fundamentação, que ”também é da experiência comum que, devido a fatores diversos (por exemplo, climatéricos ou pragas), as plantas são destruídas, pelo que, considerando o longo tempo em causa, cerca de 8 anos, e a circunstância de não se ter apurado em concreto o que foi sucedendo aos relvados ao longo desse tempo, apenas se considerou provado que a pouca manutenção e conservação proporcionada pela Ré aos relvados contribuiu para a destruição dos relvados, ou seja, não foi a única razão para a destruição dos relvados (alíneas 41, 43 e 45)” – parece-nos, salvo melhor opinião, que o tribunal está a dar-nos razão na medida em que mesmo com o cuidado e manutenção exigível, sempre existiria o risco de degradação dos relvados por factos que não podiam ser imputados à R..
66 – Com efeito, e mediante a argumentação acima esgrimida, entendemos que os factos vertidos nos números 40) a 45) da matéria dada como provada devem ser dados como não provados.
67 - No limite, e caso assim não se entenda, deverá ser alterada a matéria fáctica dada como provada ficando a constar dos factos números 40), 42) e 44 que a R. cuidou da conservação e manutenção dos relvados ali mencionados devendo, em consequência, serem dados como não provados os factos dos números 41), 43) e 45).
Com efeito,
68 – Em face de tudo o quanto ficou exposto, cremos que deverá ser alterada a matéria fáctica dada como provada constante da sentença ora em crise devendo ser acrescentada à mesma os seguintes factos:
– Assim que entrou na Quinta ... para ali passar a residir, a R. deparou-se com um estado adiantado de degradação do imóvel fruto da incúria do A. sendo falso, por isso, o alegado em 22 da petição inicial apresentada;
– Na altura em que entrou na Quinta ... para ali passar a residir a R. mandou limpar e arranjar todas as partes exteriores do imóvel fazendo a limpeza de mato e vegetação, corte de relva, limpeza da piscina e espaços circundantes já que a Quinta estava sem esses cuidados pelo menos desde o ano de 2009;
– Na parte residencial, a R. encontrou pelo menos 3 (três) casas de banho da área residencial em estado de grosso e se qualquer hipótese de uso;
– Foi a R. que mandou meter tectos falsos, iluminação, louças e chão em parquet naquelas casas de banho tornando-as assim utilizáveis;
– Foi a R. que mandou forrar as janelas que existem no espaço dedicado à habitação da Quinta ao nível da bordadura/guarnição que estavam ainda em grosso – v.g. em cimento;
– Foi a R. que mandou rebocar e pintar as paredes e tectos do hall de entrada da zona residencial que estavam inacabados;
– Foi a R. que mandou instalar grades de segurança em todas as janelas que servem a habitação excepto as da fachada principal;
– Foi a R. que durante o período em que lá esteve a coabitar a Quinta juntamente com a sua irmã FF mandou instalar um sistema de vídeo vigilância composto por 4 câmaras;
– Foi a R. que mandou colocar um novo tecto da cozinha industrial para além do investimento que já lá tinha feito;
– Foi a R. que mandou criar ligações de internet nos cómodos todos da casa quer da zona residencial quer da zona destinada a eventos;
– A R. explorou economicamente a casa da eira em regime de locação temporária por via da plataforma ... que ainda teve alguma procura durante os anos de 2015 e 2016;
– Assim se foi mantendo a Quinta ... num estado de conservação aceitável conforme se poderá constatar pelas fotografias tiradas à época e que constam dos autos.
69 – No que à matéria fáctica dada como provada diz respeito, deverá esta ser alterada conforme acima se preconizou devendo os factos dados como provados sob os número 33), 35), 40)a 45) passarem a constar dos factos dados como não provados de acordo com os raciocínios acima expostos; consequentemente, aquilo que está vertido em 48) dos factos dados como não provados terá que ser retirado deste elenco.
70 – Esta é, salvo melhor opinião, a interpretação fáctica que se deve fazer nesta causa mediante toda a prova que foi carreada para os autos.
72 – Resulta claro da sentença – cfr. facto dado como provado no número 16 – que a R. assistia a sua irmã nos actos de disposição de todos os seus bens sendo certo que essa gestão, administração e disposição de bens sempre foi corroborada e ratificada, ainda que de forma tácita, pela sua irmã FF – isto nunca foi posto em causa nos presentes autos.
73 – Não havendo nos autos nada que nos indique que toda a actuação da R. estava fora do âmbito dos poderes que lhe foram conferidos pela sua irmã, comproprietária do imóvel e sendo certo que não constam da sentença quaisquer circunstâncias de facto ou de direito que impediriam ou exonerariam a outra comproprietária do imóvel da eventual gestão, manutenção e conservação do imóvel e respectiva responsabilização das eventuais consequências desses actos fossem eles praticados por si ou por intermédio da procuração que outorgara cremos salvo melhor opinião, que todos os actos da R., lícitos ou ilícitos, culposos ou não culposos, foram praticados à luz e de acordo com o instituto da representação – vide artigo 258.º do Código Civil ex vi artigo 1178.º ambos do Código Civil pelo que todos os actos praticados e levados a cabo pela sua representante devem também responsabilizar a mandante pelos alegados danos no imóvel pois estes devem repercutir-se não na esfera jurídica do representante mas sim do representado.
74 – Porque assim é entendemos que esta acção deveria ter sido instaurada ao abrigo de um litisconsórcio necessário nos termos e para os efeitos do artigo 33.º do CPC.
75 – O tribunal a quo violou a aplicação obrigatória desta norma no despacho saneador quando conheceu desta excepção dilatória pelo que importa agora rever tal situação decidindo-se pelo conhecimento da excepção alegada declarando-se a absolvição da R. da instância por ser parte ilegítima.
77 – No entanto, depois desta acertada tipificação jurídica que fez, o tribunal a quo errou em toda a linha na sentença que proferiu e com isso violou normas jurídicas!
78 – Mas desde já se diga o seguinte: tudo o quanto iremos argumentar só fará sentido acaso não se altere a matéria de facto nos termos acima defendidos pois, caso assim aconteça como se espera, faltará desde logo um dos elementos mais importantes para subsunção desta questão ao instituto da responsabilidade civil por factos ilícitos: o dano!
79 – Na verdade, tal como acima vimos não está minimamente provado que a Quinta ..., antes da entrada da R., estava em melhores condições do que aquelas em que a R. a deixou em Abril de 2018 – bem pelo contrário e daí que não se pode danificar aquilo que já está danificado como será bom de compreender!
Isto posto,
80 – Mesmo que se não altere a matéria de facto, sempre teríamos de convir que não estão preenchidos todos os pressupostos para a aplicação do instituto da responsabilidade civil por factos ilícitos tal qual como o fez o tribunal a quo pois, no caso dos autos, ainda que configurada a questão nos termos fácticos decididos pelo tribunal, cremos que da e por via da configuração assumida não se consegue aferir e concretizar a ilicitude!
81 – De acordo com aquilo que ficou provado no número 17) dos factos dados como provados, a legítima propriedade total ou parcial da Quinta ... era uma questão controversa e controvertida e, por isso, e por via disso, a mesma teve que ser dirimida e esclarecida pelo tribunal. Ademais, até 7 de Novembro de 2018 – data do registo definitivo da inscrição da propriedade a favor do A. ainda que na proporção de metade – não existia qualquer tipo de presunção da propriedade que fizesse criar em qualquer sujeito a ideia de estar a violar qualquer direito que pertencesse a outrem.
82 – Fundamentou a acção referida em 17) uma declaração assinada pelo A. onde este parecia atribuir a propriedade exclusiva da Quinta ... à sua irmã FF, precisamente aquela que outorgou uma procuração à aqui R. para gerir e administrar os seus bens conforme melhor lhe aprouvesse – cfr. Acórdão da Relação do Porto de 11/09/2018 que sustenta o facto dado como provado no número 19.
83 – Salvo melhor opinião, que em todo o período que vai de Dezembro de 2010 até ao trânsito em julgado da decisão que determinou a direito a ser proprietário de metade da Quinta ..., não existiu qualquer violação do direito do A. porque este ainda não existia!
84 – E o erro em que a R. estava parece ser desculpável na medida em que estava suportado não em opiniões mas em documentos assinados pelo próprio A. e, tendo aplicado o cuidado normal e adequado à situação em causa, procurou descobrir o direito aplicável instaurando uma acção judicial – por isso falamos em erro desculpável!
85 – Concluindo, falta um dos requisitos que tem de estar verificados para que se possa aplicar aqui o instituto da responsabilidade civil da forma como o tribunal o fez – falta a ilicitude dos factos; por conseguinte, verifica-se que o tribunal a quo aplicou mal o direito não o subsumindo-o correctamente, violando, entre outros, o artigo 483.º, n.º 1 do Código Civil pois, perante a factualidade dada como provada considerada na sentença, deveria ter reconhecido que falta uma dos pressupostos de aplicação deste instituto.
86 – Era, pois, este raciocínio que o tribunal a quo deveria ter seguido ao invés de considerar que está verificada a responsabilidade civil da R. por factos ilícitos sendo certo que toda esta lógica ainda se revela mais se alterarmos a matéria de facto nos termos acima preconizados.
1.
O tribunal a quo decidiu as excepções invocadas pela apelante, sua ilegitimidade e a do apelado, este por estar desacompanhado na acção da sua consorte na propriedade da Quinta objecto destes autos, nos seguintes termos:
Despacho saneador:
(….)
«Sobre a invocada ilegitimidade do Autor e da Ré. – O conceito de legitimidade das partes, enquanto pressuposto processual, encontra-se vertido no art. 30.º do Código de Processo Civil, segundo o qual:
«1 - O autor é parte legítima quando tem interesse direto em demandar; o réu é parte legítima quando tem interesse direto em contradizer.
2 - O interesse em demandar exprime-se pela utilidade derivada da procedência da ação e o interesse em contradizer pelo prejuízo que dessa procedência advenha.
3 - Na falta de indicação da lei em contrário, são considerados titulares do interesse relevante para o efeito da legitimidade os sujeitos da relação controvertida, tal como é configurada pelo autor».
Através da presente ação, o Autor, comproprietário de determinado imóvel, formula um pedido indemnizatório contra a Ré, invocando – em síntese – que a Ré praticou factos ilícitos e culposos dos quais resultaram danos para o Autor.
Na contestação, a Ré invocou a exceção de «ilegitimidade da R.» (arts. 1.º a 20.º) e a exceção de «ilegitimidade do A.» (arts. 21.º a 29.º).
(…)
Quanto à invocada «ilegitimidade da R.» (arts. 1.º a 20.º da contestação), a Ré afirma, em síntese, que «a procedência desta acção, tal como configurada pelo A. […], a ser julgada como procedente, criará apenas e só uma desvantagem à FF que é a representada da R.», «pois é isto que decorre do regime previsto na lei para o instituto da representação – vide artigo 258.º do Código Civil». «O A. não alegou quaisquer factos que demonstrariam que toda a suposta actuação da R. estava fora do âmbito dos poderes que lhe foram conferidos pela sua irmã, comproprietária do imóvel»; «o A. não logrou transportar para a p.i. quaisquer circunstâncias de facto ou de direito que impediriam ou exonerariam sua a irmã FF de ser responsável e causadora pelos alegados danos no imóvel»; «pelo que, assim sendo, quem deveria ocupar o lugar da R. seria a comproprietária do imóvel em conjunto com o A. ou, no limite, estaríamos aqui perante um caso de litisconsórcio necessário nos termos do artigo 33.º, n. 1 e 2 Código de Processo Civil».
O Autor veio defender a improcedência desta exceção (fls. 226 e segs.).
Cumpre decidir.
Salvo o devido respeito por diferente opinião, entendemos que, também nesta parte, não assiste razão à Ré.
Como já foi referido, o Autor, comproprietário de determinado imóvel, formula um pedido indemnizatório contra a Ré, invocando que a Ré praticou factos ilícitos e culposos dos quais resultaram danos para o Autor, sendo que esse pedido indemnizatório diz respeito apenas à quota parte do Autor no imóvel de que é comproprietário.
Dito de outro modo, o Autor demanda a Ré invocando que esta é a autora material de factos ilícitos e culposos que causaram danos no imóvel de que o Autor é comproprietário; é nessa conduta da Ré que radica a presente ação e, por isso, o Autor pede a condenação da Ré a pagar-lhe determinada quantia para ressarcimento dos danos que alega ter sofrido.
Pode, pois, afirmar-se que a Ré «tem interesse direto em contradizer», sendo sujeito da relação controvertida, tal como é configurada pelo autor. A circunstância de existir uma procuração subscrita pela outra comproprietária do imóvel a favor da ora Ré não constitui obstáculo à legitimidade da ora Ré, porquanto o Autor não baseia a sua pretensão nessa procuração (procuração que o Autor até entende que não é válida – cfr. art. 6.º da resposta; fls. 227), o Autor demanda a ora Ré com base apenas – hoc sensu – na conduta desta.
Assim, face ao alegado na petição inicial pelo Autor (ou seja: tendo em consideração a forma como é configurada pelo Autor a relação jurídica controvertida), não subsiste dúvida quanto à legitimidade processual da Ré.
Pelo exposto, julga-se improcedente a invocada exceção dilatória de ilegitimidade da Ré.»
Os factos dados como provados e não provados na sentença recorrida são os seguintes:
1) A Quinta ... é uma construção iniciada em 1740 e concluída no início do século XX, caracterizada pela sua qualidade arquitetónica e de construção dos edifícios e da área exterior envolvente, estando o imóvel identificado no PDM de Santo Tirso como um imóvel de interesse municipal não classificado, dada a sua relevância, arquitetónica e histórica, para o Concelho.
2) A Quinta tem uma área global de 13.398 m2 e é constituída por uma casa principal, com uma área de implantação de 198 m2, em perpianho de granito à vista, desenvolvendo-se em forma de “L”, com 2 pisos (rés-do-chão e 1º andar), com uma área de construção de 396 m2 e por vários anexos contíguos, logradouro com piscina e eira, e terreno agrícola junto; tudo vedado por um muro alto em granito.
3) O rés-do-chão da casa principal, os anexos contíguos e logradouros destinam-se a uma utilização comercial; o 1º andar destina-se a habitação Tipologia 4 +2.
4) Os dois anexos principais da Quinta são constituídos, um por uma cozinha industrial e duas instalações sanitárias (H/S) para pessoal de serviço e o outro por uma arrecadação de mobiliário de festas.
5) Encontra-se descrito na Conservatória do Registo Predial de Santo Tirso sob o n.º ..., o imóvel denominado Quinta ..., sito em Leigal, ..., Santo Tirso, com a área total de 13.398 m2, sendo 198 m2 de área coberta e 13.200 m2 de área descoberta, composto por casa de rés do chão, andar, quintal e terreno.
6) Os ora Autor e Ré são irmãos e juntamente com mais 5 irmãos – JJ, KK, GG, LL e FF – são os únicos herdeiros dos seus pais, MM e LL, falecidos em 13-05-1989 e 22-11-1994, respetivamente.
7) Em 20-12-1996, o Autor e os seus 6 irmãos assinaram um documento intitulado «Contrato-Promessa de Partilha» – com o teor que consta do documento 1 apresentado com a petição inicial, o qual se dá aqui por integralmente reproduzido –, nos termos do qual todos acordaram, designadamente, que seriam adjudicados ao Autor e à sua irmã FF, em comum e partes iguais, os imóveis identificados nos lotes nºs ... e ... da «Relação dos Bens Anexa ao Contrato Promessa de Partilha Outorgado em 20.12.96» (relação esta que integra o mencionado «Contrato-Promessa de Partilha»).
8) Do lote n.º ... da «Relação dos Bens Anexa ao Contrato Promessa de Partilha Outorgado em 20.12.96» faz parte a verba n.º 5.1, com a seguinte descrição: «um prédio misto, denominado “Quinta ...”, constituído por casa de rés-do-chão e andar, com 198,0 m2, quintal, com 400 m2 e terreno junto com 12.800 m2, sito no lugar ..., freguesia ..., concelho de Santo Tirso, inscrito na matriz sob os arts. ... urbano, ... e ... rústicos descrito na Conservatória do registo Predial de Santo Tirso sob o nº ..., descrito na Conservatória deste concelho sob o n.º ...».
9) A partir daquela data – 20-12-1996 – o Autor e a sua irmã FF, com o acordo dos demais outorgantes – os seus irmãos - passaram a usar o referido imóvel (doravante designado por Quinta ... ou Quinta), dele dispondo como se fossem os seus únicos proprietários, nomeadamente, efetuando avultadas e cuidadas obras dirigidas à reabilitação e adaptação do espaço à atividade turística, locando espaços desse prédio para a realização de eventos (casamentos, batizados, entre outros), recebendo os proveitos assim obtidos e suportando as respetivas despesas.
10) Em resultado de tais obras o imóvel deixou de ter uma afetação exclusivamente residencial e agrícola, passando a estar destinado a atividades turísticas, especialmente festas de casamento.
11) FF sofre de debilidade mental ligeira a moderada, de natureza congénita, padecendo, desde o início da vida adulta, de psicose esquizofrénica;…
12) …Tendo sido instaurada pelo Ministério Público, em 2013, uma ação especial de interdição.
13) A referida ação judicial culminou com a prolação da sentença, datada de 05-09-2015, na qual FF foi declarada inabilitada por anomalia psíquica, para dispor a qualquer título dos seus bens imóveis, alienando-os ou onerando-os, tendo o início da incapacidade sido fixado desde os 18 anos e tendo sido nomeada como curadora a sua irmã AA, ora Ré.
14) Por força da sua doença, FF sempre foi auxiliada pelos seus irmãos, tendo vivido até janeiro de 2007 com o seu irmão BB, ora Autor, e a partir dessa data, com a sua irmã AA, ora Ré.
15) A partir de dezembro de 2010, FF, ora Ré, e a filha desta, cuja guarda foi atribuída à tia AA, ora Ré, mudaram-se para a Quinta ..., passando a residir ali permanentemente e a agir como se a FF fosse a única proprietária do imóvel.
16) Em 27-07-2010, FF passou uma procuração – com o teor que consta do documento 4 apresentado com a petição inicial, o qual se dá aqui por integralmente reproduzido –, à ora Ré, com quem vivia desde janeiro de 2007, concedendo-lhe amplos poderes de administração e disposição dos seus bens, nomeadamente para “(…) tratar de todos os direitos e interesses dela outorgante, presentes e futuros, podendo para tal, gerir e administrar os seus bens, móveis e imóveis, celebrar e assinar contratos de locação (…), comprar, vender ou proceder a permuta de bens imóveis, no todo ou em parte, pelo preço e condições que entender, outorgar e assinar as respectivas escrituras e suas rectificações, bem como os contratos-promessa correspondentes (…)”.
17) Em 23-05-2012, foi intentada uma ação de condenação – que correu termos sob o n.º 2240/12.0TBSTS, Tribunal Judicial da Comarca do Porto, Juízo Central Cível da Póvoa de Varzim, Juiz 6 –, na qual FF figura como Autora, contra todos os seus irmãos e contra a herança indivisa aberta por morte de seu pai, LL, pedindo, a título principal, o seu reconhecimento como única proprietária da Quinta ... por efeito da sua aquisição por usucapião ocorrida em 20-11-2011, e a título subsidiário, entre outros, que fosse “declarado que o R. BB, por força do acordo celebrado com a A., em 24/04/2009, se obrigou a transmitir para esta a quota que detêm na Quinta ... e, ainda, os direitos relativos à propriedade de tal imóvel, que lhe seriam transmitidos pelos demais RR. (em nome próprio e enquanto herdeiros de LL)”.
18) No âmbito do processo n.º 2240/12.0TBSTS, em 08-02-2018, foi proferida sentença que julgou a ação totalmente improcedente e absolveu os Réus de todos os pedidos contra si formulados.
19) …Tendo sido interposto recurso pela aí Autora FF, por acórdão proferido pelo Tribunal da Relação do Porto de 11-09-2018, já transitado em julgado, a referida decisão foi parcialmente revogada, e, consequentemente, julgada a ação parcialmente procedente, declarando-se a aquisição por usucapião, pela apelante e apelado BB, em comum e em partes iguais da propriedade da Quinta ..., determinando a inscrição da propriedade em conformidade, tendo, quanto ao mais, sido confirmada a decisão recorrida.
20) Pela apresentação n.º 3625, de 2018/11/07, foi definitivamente inscrita no registo predial a decisão judicial que declarou a aquisição do imóvel denominado Quinta ..., por usucapião, por BB e por FF, em comum e em partes iguais.
21) Entre 1999 e 2009, o Autor explorou economicamente a Quinta ..., aí tendo realizado um evento por ano;…
22) …Resultando de cada um desses eventos um rendimento líquido entre € 500,00 a € 1.250,00.
23) Após o referido em 15), o Autor dirigiu-se, por diversas vezes, à Quinta ... tendo sido impedido de lá entrar pela Ré.
24) A partir de dezembro de 2010, foi a Ré quem procedeu à gestão e administração da Quinta ..., com a oposição do Autor.
25) No decurso do ano de 2018, em data anterior ao mês de novembro de 2018, mas não antes de 06-04-2018, a Ré saiu da Quinta ....
26) O Autor voltou a entrar na Quinta ... em novembro de 2018.
27) Entre dezembro de 2010 e 2018, a Ré mandou cortar e arrancar a trepadeira hera unha de gato (Ficus pumila) que revestia toda a fachada principal da casa.
28) A reposição da situação anterior implicará a replantação de vários pés da trepadeira, mas o seu crescimento por forma a cobrir toda a fachada demorará cerca de 5 a 6 anos;...
29) …Sendo o custo da reposição de € 500,00 (€ 5,00/unidade).
30) Entre dezembro de 2010 e 2018, a Ré mandou cortar e arrancar a trepadeira hera “vinha virgem de Veitch” (Parthenocissus quinquefólia) que revestia a fachada posterior lateral da casa.
31) A reposição da situação anterior implicará a replantação de vários pés da trepadeira, mas o seu crescimento por forma a cobrir toda a fachada demorará alguns anos;...
32) …Sendo o custo da reposição de € 100,00 (€ 5,00/unidade).
33) Entre dezembro de 2010 e 2018, devido a falta de manutenção, as portadas da casa da eira, em vidro e madeira, degradaram-se, tendo algumas delas sido retiradas.
34) Entre dezembro de 2010 e 2018, a Ré mandou retirar 20 radiadores em ferro fundido do sistema central de aquecimento, situados nas áreas destinadas ao uso comercial, os quais foram colocados na pré-instalação existente do sistema central de aquecimento da habitação.
35) Entre dezembro de 2010 e 2018, a Ré não cuidou da manutenção e conservação da piscina, tendo da mesma sido arrancada parte do revestimento (pastilha) e não retendo a água devido a microfissuras na sua estrutura.
36) Entre dezembro de 2010 e 2018, a Ré mandou remover 5 pilares em granito e os cabos de aço que faziam parte da estrutura do toldo da eira.
37) Entre dezembro de 2010 e 2018, a Ré mandou retirar todos os móveis e máquinas da cozinha industrial existente, em dezembro de 2010, na Quinta ...; móveis e máquinas que haviam sido adquiridos pela Ré.
38) Entre dezembro de 2010 e 2018, a Ré mandou arrancar a ramada e vides que existiam no logradouro da Quinta, junto à entrada da casa.
39) A reposição dessa ramada e vides implica a construção de uma nova ramada – esteios de pedra de granito, barras em ferro e fio de arame zincado – e a plantação de novas videiras.
40) Entre dezembro de 2010 e 2018, a Ré cuidou pouco da manutenção e conservação do relvado da espécie Gramilha (Cynodon dactilon) existente no logradouro interior junto à casa e à volta da piscina – área de 466,00 m2.
41) A pouca manutenção e conservação proporcionada pela Ré, entre dezembro de 2010 e 2018, ao relvado da espécie Gramilha (Cynodon dactilon) que existia no logradouro interior junto à casa e à volta da piscina contribuiu para a destruição desse relvado.
42) Entre dezembro de 2010 e 2018, a Ré cuidou pouco da manutenção e conservação do relvado da espécie Zoysia (Zoysia Japónica) existente na área envolvente do engenho – área de 1.230,00 m2.
43) A pouca manutenção e conservação proporcionada pela Ré, entre dezembro de 2010 e 2018, ao relvado da espécie Zoysia (Zoysia Japónica) que existia na área envolvente do engenho contribuiu para a destruição desse relvado.
44) Entre dezembro de 2010 e 2018, a Ré cuidou pouco da manutenção e conservação do relvado, sem sistema de rega, localizado na zona do terreno mais afastada da casa – área de 6.530,00 m2;…
45) …O que contribuiu para a destruição desse relvado.
46) O portão principal da Quinta ... é em ferro maciço.
47) O valor de mercado da Quinta ... em 2018 era de € 700.000,00.
48) O supra referido em 33), 35), 36), 38), 41), 43) e 44)-45) implicou uma diminuição do valor de mercado da Quinta ....
I) Sem prejuízo para o supra referido em 21) e 22), entre 1999 e 2009, o Autor explorou economicamente a Quinta, tendo realizado na mesma anualmente cerca de 25 eventos;
II) …Permitindo cada um desses eventos um rendimento líquido de € 1.250,00.
III) Sem prejuízo para o supra referido em 25), em fins de outubro de 2018, a Ré e a FF saíram da Quinta ..., tendo esta regressado pouco tempo depois, lá passando a residir com o seu curador, o seu irmão, GG.
IV) A trepadeira hera que revestia toda a fachada principal da casa sempre funcionou como elemento estético diferenciador e caracterizador da Quinta ....
V) A ausência da trepadeira hera na fachada principal da casa provoca a sua desvalorização comercial.
VI) A trepadeira hera existente na fachada principal pôs em causa a estabilidade das paredes mestras do imóvel.
VII) A trepadeira hera que revestia toda a fachada posterior lateral da casa sempre funcionou como elemento estético diferenciador e caracterizador da Quinta ....
VIII) A ausência da trepadeira na fachada posterior lateral da casa provoca a sua desvalorização comercial.
IX) A trepadeira hera existente na fachada posterior lateral da casa pôs em causa a estabilidade das paredes mestras do imóvel.
X) A reparação e reposição das portadas da casa da eira tem um custo nunca inferior a € 4.600,00.
XI) O custo da reposição dos radiadores em ferro fundido será de cerca de € 1.000,00.
XII) A reparação e reposição da piscina tem um custo de € 10.000,00.
XIII) Sem prejuízo para o supra referido em 36), entre dezembro de 2010 e 2018, a Ré mandou remover o toldo estrutural da eira e todos os elementos que o compunham, designadamente, uma estrutura formada por 6 pilares em granito e respetivas fundações em betão e por um sistema de cabos de aço e 5 fachas móveis em lona (5x12,60mx3,20m) com acessórios de movimento e amarração.
XIV) A reposição de 5 pilares em granito e de cabos de aço para refazer a estrutura do toldo da eira tem um custo de € 25.000,00.
XV) Foi o Autor quem adquiriu os móveis e máquinas que compunham a cozinha industrial existente, em dezembro de 2010, na Quinta ....
XVI) Sem prejuízo para o supra referido em 38), entre dezembro de 2010 e 2018, a Ré mandou arrancar as ramadas e videiras existentes na Quinta ....
XVII) A reposição supra referida em 39) tem um custo de € 10.850,00.
XVIII) Entre dezembro de 2010 e 2018, a Ré não cuidou da manutenção e conservação do relvado, da espécie Zoysia (Zoysia Japónica), existente no logradouro e na zona de entrada na Quinta – área de 439,00 m2 – bem como os sistemas de rega, que se encontram integralmente destruídos, incapazes de serem recuperados;…
XIX) …Sendo que a reposição do relvado e dos sistemas de rega implica uma nova sementeira, incluindo tratamento da terra e adubagem, e um novo sistema de rega automático, o que tem um custo de € 6.585,00 (€ 15,00/m2 x 439 m2).
XX) Em dezembro de 2010, o relvado da espécie Gramilha (Cynodon dactilon) existente no logradouro interior junto à casa e à volta da piscina tinha incluído um sistema de rega automática.
XXI) A reposição do relvado existente no logradouro interior junto à casa e à volta da piscina e do sistema de rega implica uma nova plantação incluindo tratamento da terra e adubagem, bem como um novo sistema de rega automático, o que tem um custo de € 9.000,00 (€ 20,00/m2 x 466 m2).
XXII) Em dezembro de 2010, o relvado da espécie Zoysia (Zoysia Japónica) existente na área envolvente do engenho tinha incluído um sistema de rega automática.
XXIII) A reposição do relvado existente na área envolvente do engenho e do sistema de rega implica uma nova sementeira, incluindo tratamento da terra e adubagem, bem como um novo sistema de rega automático, o que tem um custo de € 9.320,00 (€ 15,00/m2 x 1.230 m2).
XXIV) A reposição do relvado existente na zona mais afastada da casa implica uma nova sementeira, incluindo tratamento da terra e adubagem, o que tem um custo de € 6.530,00 (€1,00/m2 x 6.530 m2).
XXV) A Ré não cuidou da manutenção e conservação do sistema eletromecânico de grande potência de abertura e fecho do portão principal da Quinta ..., razão pela qual o mesmo se encontra muito deteriorado, tanto mecânica como eletronicamente.
XXVI) Como se trata de um sistema eletrónico a sua recuperação é mais dispendiosa do que um sistema novo.
XXVII) O sistema de abertura e fecho do portão principal da Quinta ..., devido ao peso do portão, tem de ser um sistema de grande potência.
XXVIII) A instalação de um novo sistema eletromecânico tem um custo estimado de € 2.500,00.
XXIX) A Ré mandou retirar os dois pilares decorativos que existiam na eira/piscina;...
XXX) …Os quais têm um custo de € 400,00.
XXXI) A Ré mandou retirar uma mesa retangular e respetivo banco e duas mesas redondas implantadas no solo, todas de pedra de granito;...
XXXII) …Os quais têm um custo de € 1.000,00.
XXXIII) A Ré mandou retirar a nora e respetiva bomba mecânica;…
XXXIV) …As quais têm um custo de € 500,00.
XXXV) A Ré mandou cortar transversalmente o portão em madeira de cedro, que separa as áreas de serviço e de clientes.
XXXVI) A sua reposição tem um custo de € 500,00.
XXXVII) A Ré permitiu que desaparecessem da Quinta ... um alambique em cobre, com um valor aproximado de € 6.000,00; uma bomba manual antiga de transferir vinho, com um valor aproximado de € 200,00; e uma balança antiga em madeira, com um valor aproximado de € 1.000,00.
XXXVIII) O valor de mercado da Quinta ... em 2018, caso estivesse no estado em que se encontrava em dezembro de 2010, seria de € 1.250.000,00.
É consabido que resulta dos artº635º, n.ºs3 a 5 e 639º, n.ºs1 e 2, ambos do CPC, que o objeto do recurso está delimitado pelas conclusões das respetivas alegações[1], sem prejuízo das questões cujo conhecimento é oficioso.
Assim, em síntese, do que resulta das conclusões, caberá apreciar as seguintes questões:
1.- Da excepção da ilegitimidade da R. (conclusões 72 a 75.)
2.- Da impugnação da decisão da matéria de facto constante da sentença recorrida:
a. – omissão de factos que deveriam ter sido dados como provados.
- factos contantes da contestação nos artigos 57 e 58 (conclusões 6-32), 59 a 63, 72 a 74 (conclusões 33 – 34), 84 e 86 (conclusões 35-38)[2]
b. - indevida consideração como provados de factos que se pretendem como não provados.
- factos constantes dos pontos 33 (conclusões 39 – 45), 35, 40 a 45 (conclusões 46 a 58, 47 a 67), da matéria de facto dada como provada,
- em consequência rectificação do facto conste do ponto 48 (conclusão 69).
3. Da responsabilidade civil: dano e ilicitude, sua verificação ou não (conclusões 76 e ss)
Conclusões 72-75
Dizer antes de mais, e porque o recorrido invoca que sobre esta questão a decisão proferida no saneador transitou[3], que o lugar próprio para a impugnar é nesta sede.
Em relação a ela, porque fez improceder as excepções, não absolvendo a recorrente da instância, não cabe apelação autónoma nos termos do art.644.º, n.º1, al.b) do CPC.
Da decisão quanto a elas cabe recurso nos termos o nº3 do citado preceito (e art.644.º, n.º1, al.b), a contrário), ou seja, com a decisão que decida do mérito da causa, pondo-lhe termo.
«Consequentemente, a não ser que a decisão integrada no despacho saneador se inscreva em alguma das alíneas do n.º2 (v.g. quando é apreciada a exceção de incompetência absoluta), o despacho saneador que traduza a declaração de improcedência de alguma excepção dilatória (v.g. ilegitimidade, cumulação ilegal de pedidos, coligação ilegal, inadmissibilidade da reconvenção) não admite recurso de apelação.
A impugnação de tais segmentos decisórios far-se-á com o recurso do despacho saneador, quando este o admita em alguns dos demais segmentos decisórios, ou com o recurso que eventualmente venha a ser interposto da decisão final, nos termos do n.º 3.»[4]
Vejamos.
A recorrente na sua contestação (art.1 a 20) discorre a propósito desta excepção e para a fundar, afirmando que toda a sua actuação surge enquadrada no âmbito de uma representação concedida por procuração outorgada em 27.07.2010 pela comproprietária do recorrido na propriedade da Quinta objecto dos autos, sua irmã FF.
No quadro dessa representação a recorrente tinha amplos poderes de administração e disposição dos seus bens, nomeadamente para “(…) tratar de todos os direitos e interesses dela outorgante, presentes e futuros, podendo para tal, gerir e administrar os seus bens, móveis e imóveis (…).”
Configurando esta situação tenta «desvalorizar» a sua ocupação (e actuação) da Quinta, com a irmã, é certo, FF, sua alegada representada, também irmã do recorrido, entendendo que «tudo que passou» ocorreu, digamos, no âmbito dos poderes que lhe foram conferidos pela citada procuração outorgada pela sua citada irmã FF, comproprietária do imóvel, circunstância essa que a torna parte ilegítima na acção.
Conclui que, «assim sendo, quem deveria ocupar o lugar da R. seria a comproprietária do imóvel em conjunto com o A. ou, no limite, estaríamos aqui perante um caso de litisconsórcio necessário nos termos do artigo 33.º, n.1 e 2 CPC.»
A propósito desta excepção, o tribunal a quo, fez improceder a pretensão da recorrente, afirmando:
«Como já foi referido, o Autor, comproprietário de determinado imóvel, formula um pedido indemnizatório contra a Ré, invocando que a Ré praticou factos ilícitos e culposos dos quais resultaram danos para o Autor, sendo que esse pedido indemnizatório diz respeito apenas à quota parte do Autor no imóvel de que é comproprietário.
Dito de outro modo, o Autor demanda a Ré invocando que esta é a autora material de factos ilícitos e culposos que causaram danos no imóvel de que o Autor é comproprietário; é nessa conduta da Ré que radica a presente ação e, por isso, o Autor pede a condenação da Ré a pagar-lhe determinada quantia para ressarcimento dos danos que alega ter sofrido.
Pode, pois, afirmar-se que a Ré «tem interesse direto em contradizer», sendo sujeito da relação controvertida, tal como é configurada pelo autor. A circunstância de existir uma procuração subscrita pela outra comproprietária do imóvel a favor da ora Ré não constitui obstáculo à legitimidade da ora Ré, porquanto o Autor não baseia a sua pretensão nessa procuração (procuração que o Autor até entende que não é válida – cfr. art. 6.º da resposta; fls. 227), o Autor demanda a ora Ré com base apenas – hoc sensu – na conduta desta.
Assim, face ao alegado na petição inicial pelo Autor (ou seja: tendo em consideração a forma como é configurada pelo Autor a relação jurídica controvertida), não subsiste dúvida quanto à legitimidade processual da Ré.
Pelo exposto, julga-se improcedente a invocada exceção dilatória de ilegitimidade da Ré.»
Decidiu bem o tribunal a quo.
A recorrente olvida a verdadeira configuração da relação material controvertida gizada e formatada pelo recorrido.
De facto, é para essa conformação que o tribunal a quo deveria olhar e olhou por via do que impõe o art.º30 do CPC.
O conceito de legitimidade processual está consagrado neste preceito e segundo o qual “o réu é parte legítima quando tem interesse direto em contradizer”, sendo que “o interesse em contradizer» exprime-se «pelo prejuízo que dessa procedência advenha”, consagrando tal comando o princípio geral de que “são considerados titulares do interesse relevante para o efeito da legitimidade os sujeitos da relação controvertida, tal como é configurada pelo autor”.
À aferição «da legitimidade processual – pressuposto processual - releva, apenas, a consideração do concreto pedido e da respetiva causa de pedir, independentemente da prova dos factos que integram esta última e do mérito da causa.»[5]
A legitimidade processual afere-se pela titularidade da relação material controvertida tal como é configurada pelo Autor, na petição inicial, e é nestes termos que tem de ser apreciada.
No caso em apreço[6], na economia da decisão que se impõe, o que resulta da causa de pedir articulada pelo recorrido na sua p.i., como se refere na sentença posta em crise, é a invocação de que a recorrente é a autora material de factos ilícitos e culposos que causaram danos na Quinta de que o recorrido é comproprietário, desse factualidade radicando o pedido da sua condenação no pagamento de uma indemnização e por referência apenas à sua quota parte no imóvel.
Certo que se alega uma procuração outorgada pela inabilitada FF concedendo amplos poderes de administração e disposição dos seus bens à recorrente[7], dentre os quais a sua quota parte na propriedade da «quinta».
Surge, no entanto, na nossa óptica, esse facto a contextualizar a ocupação do imóvel pela recorrente e não a enquadrar todo o seu comportamento ulterior como acção concretizadora no cumprimento dos poderes que lhe foram concedidos pela citada procuração.
Toda a remanescente causa de pedir, em especial a partir do art. 32 da p.i., é conformada em termos que centra a responsabilidade do acontecido por acção «própria» da recorrente e não no quadro daquela sua alegada representação.
E bem se compreende isso, porque, o jaez dos actos que se imputa à recorrente, pretendendo-se com isso a respectiva responsabilização extracontratual por actos ilícitos, jamais poderiam corresponder ao cumprimento da representação (voluntária), sendo absoluta e legalmente inconcebível que se «passe procuração» para violar direitos absolutos de terceiros, no caso o também direito de propriedade do recorrido.
Estando a representação voluntária permitida de um modo geral, a lei veda-a quanto a actos ilícitos extracontratuais[8]/[9], sendo também insofismável, visto o teor do art.º 258 do C.C., que representação se destina à prática de negócios jurídicos[10] a benefício do dominus.
Dizer também que a procuração foi outorgada em 2010, e nessa data a FF não era proprietária, sequer comproprietária do imóvel em causa: era herdeira.
Nessa data a FF apensas era titular de um direito a exigir a partilha dos bens integrantes do património hereditário e, não obstante, desde 96 (20-12-1996), existir um Contrato-Promessa de Partilha, assinado pelo Autor e os seus 6 irmãos[11].
De facto, os direitos reais de propriedade e compropriedade não se confundem com o direito à herança.
«É sabido, que a morte de uma pessoa física produz diversas consequências jurídicas que carecem de resolução (…) – o que tem lugar através do fenómeno sucessório.
Com efeito, em consonância com o que se dispõe no art. 2024º do Código Civil, através da sucessão, as situações jurídicas patrimoniais (ativas e passivas) que compunham a esfera jurídica do falecido no momento do seu óbito serão transmitidas aos seus sucessores, caso estes aceitem a herança.
O fenómeno sucessório assume, pois, uma função simultaneamente individual e coletiva – ao proteger a propriedade privada, ampara também os direitos dos credores do falecido oferecendo-lhes, tanto quanto possível, a mesma garantia patrimonial que tinham anteriormente.
Este objetivo, tal como enfatiza OLIVEIRA ASCENSÃO, In Direito Civil. Sucessões, 5ª edição, págs. 402 e seguinte, é alcançado pelo “ingresso do herdeiro na posição jurídica do de cuius”, sendo a herança constituída pelas situações jurídicas de natureza patrimonial que se encontravam na titularidade do falecido no momento da morte e não devam extinguir-se por efeito desta (cfr. arts. 2024º e 2025º).
A herança identifica-se, por conseguinte, com a noção de património global (rectius, de património coletivo), já que entre nós se admite a sucessibilidade não apenas dos bens, mas das situações jurídicas patrimoniais ativas e passivas que compunham a esfera patrimonial do falecido aquando da sua morte.»[12]
Por seu turno, do art. 2032.º do CC retira-se que com a abertura da sucessão verifica-se uma perda relativa das relações jurídicas de que era sujeito o de cujus, sendo chamado a ela aqueles que gozam de prioridade na hierarquia dos sucessíveis.
A herança, aceite, apenas deixa de ter autonomia quando partilhada.
Nesse momento os herdeiros chamados, em função da partilha, passarão a deter direito concretos, nomeadamente de propriedade ou compropriedade, sobre cada elemento que componha a herança.
Só com a «(…) «aquisição» é que se encerra o fenómeno sucessório como tal (…), decorrendo «um período (…) até a definitiva confusão dos bens no património do herdeiro ou herdeiros. Nesta fase manifesta-se, no aspecto subjectivo, a qualidade de herdeiro adquirida por uma ou mais pessoas, e, no aspecto objectivo, uma vida própria da herança, mesmo dentro da esfera jurídica do sucessor – (vide Oliveira Ascensão, obra citada, pag.435)»[13]
Temos para nós, pois, indubitável, que a FF, à data em que outorgou a procuração à apelante não era, pois, proprietária ou comproprietária do imóvel, apenas sendo titular de um direito a exigir a partilha dos bens integrantes do património hereditário dos seus pais, naturalmente relevando-se o contrato de promessa de partilha assinalado.
De resto, a propriedade (compropriedade) sobre o imóvel só lhe foi reconhecido por decisão do TR do Porto em 11-09-2018, apenas ficando registada na CRP a sua quota parte na propriedade na Quinta por apresentação na CRP em 7.11.2018[14].
Notar que, com o reconhecimento dessa propriedade não se pode repristinar o que invalidamente foi praticado na ausência de legitimidade substantiva para o efeito e apesar do disposto no art.1288.º do CC.
Notar também que o reconhecimento foi feito com base na invocação da usucapião e não com base na sucessão por morte, dado que afasta a invocação do disposto no art.1317.º, al.b) do CC.
Mas mesmo que se relevasse este preceito, só com aceitação da herança pelos herdeiros se provocaria o efeito retroactivo ao momento da abertura da sucessão de acordo com o nº2 do art.2050.º do CC[15].
Nesse caso, a FF não teria, igualmente, legitimidade substantiva para, sozinha, outorgar a procuração citada (vide facto constante do ponto 6).
Face ao que se referiu, dados trazidos pelo apelado ao processo, visto o perfil da causa de pedir configurado ou formatado, a apelante surge como a única titular do interesse em contradizer, configurando-se a mesma como a única titular do interesse relevante no lado passivo da relação processual.
Temos, pois, por demais evidente a legitimidade processual passiva da recorrente para ser demandada na acção, e demandada singularmente e não com a sua irmã FF ao seu lado por, quanto a esta, não ter a causa de pedir conformado (art.30.º nº3 do CPC) quaisquer actos por si praticados, a título pessoal ou pela recorrente e com repercussão na respectiva esfera jurídica[16].
Certo que, como refere Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Sousa, em comentário ao art.33.º do CPC, «[e]m alguns casos, a aferição da legitimidade exclusivamente através do critério previsto no nº3 do art.30.º, assente na relação na relação material controvertida configurada (descrita) pelo autor, não pode deixar de ser questionada quando, porventura outros elementos dos autos infirmem de forma absoluta tal alegação (v.g. alegação do autor que é o único herdeiro ou o único interveniente num contrato, contrariando prova documental firma). Deve moderar-se a aplicação estrita daquele critério formal quando as dúvidas que tenham surgido acerca da titularidade da relação material possam ser resolvidas mediante acionamento do artº 590.º, n.º2, al.c), com vista à junção de documentos que clarifiquem a situação.»[17]
Todavia não é o caso dos autos, tendo-se já afirmado, na nossa óptica, qual o enquadramento a fazer quanto à alegação da citada procuração, a isso acrescendo a circunstância referida que, do ponto de vista do direito material, naturalmente considerado pelo apelado quando traçou a causa de pedir a construir, se deparou com uma procuração que, como se referiu, não pode conceder poderes para praticar actos que impliquem responsabilidade civil extracontratual, sequer havendo, também, à data da sua assinatura, legitimação substantiva para se outorgar procuração tendo por «objecto a Quinta (..)».
Dizer de resto, e é assim aproximadamente dito na resposta à contestação e nas contra-alegações, que tendo sido declarada a inabilitação da FF, com data fixada desde o início dos seus 18 anos[18], pareceria pouco consentâneo que se trouxesse à acção alguém para responder como representada por via de procuração que outorgou, por actos praticados pela representante, quando tal instrumento será facilmente reconhecido como inválido em acção a intentar[19].
Dizer a final que o recorrido, à data da outorga da procuração, conjuntamente com os demais herdeiros da herança deixada pelos respectivos pais, nela se incluindo a Quinta, não concederam à recorrente (também ela herdeira) procuração para administrar a Quinta.
Isto posto, quando muito, em face da traçada causa de pedir, poderia a FF surgir ao lado do recorrido, exigindo da recorrente o mesmo que aquele lhe exigiu – litisconsórcio voluntário activo (art.32.º do CC).
Improcede, pois, neste segmento o recurso.
Resulta impugnada a decisão da matéria de facto constante da sentença recorrida, relativamente aos seguintes factos:
a. – omissão de factos que deveriam ter sido dados como provados - factos contantes da contestação nos artigos 57 e 58 (conclusões 6-32), 59 a 63, 72 a 74 (conclusões 33 – 34), 84 e 86 (conclusões 35-38)
b. - indevida consideração como provados de factos que se pretendem como não provados - factos constantes dos pontos 33 (conclusões 39 – 45), 35, 40 a 45 (conclusões 46 a 58, 47 a 67)-, em consequência rectificação do facto conste do ponto 48 (conclusão 69).
«O presente recurso versa sobre o sentido da decisão da matéria de facto constante da sentença recorrida.
Os termos em que a Relação pode conhecer da matéria de facto impugnada em sede de recurso constam, no essencial, do art.º 662.º do Código de Processo Civil.
De acordo com o disposto no n.º 1 deste preceito, a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa.
Por seu turno, nos termos do n.º 2, a Relação deve ainda, mesmo oficiosamente:
a) ordenar a renovação da produção da prova quando houve dúvidas sérias sobre a credibilidade do depoente ou sobre o sentido do seu depoimento;
b) ordenar, em caso de dúvida fundada sobre a prova realizada, a produção de novos meios de prova;
c) anular a decisão proferida na 1.ª Instância quando, não constando do processo todos os elementos que, nos termos do número anterior, permitam a alteração proferida sobre a decisão da matéria de facto, repute deficiente, obscura ou contraditória a decisão sobre pontos determinados da matéria de facto, ou quando considere indispensável a ampliação desta;
d) determintar que, não estando devidamente fundamentada a decisão proferida sobre algum facto essencial para o julgamento da causa, o tribunal de 1º instância a fundamente, tendo em conta os depoimentos gravados ou registados.
Da leitura de tais dispositivos legais resulta que à Relação é, em sede de recurso em que esteja em causa a impugnação da matéria de facto, conferido um grau de autonomia especialmente relevante.
Na realidade, se, confrontada com a prova globalmente produzida, o seu juízo decisório for diverso do da 1.ª Instância, à Relação incumbe hoje, não a faculdade ou a simples possibilidade, mas um verdadeiro dever de introduzir as alterações que tenha por convenientes ou acertadas.
Por outro lado, se, confrontada com essa mesma prova, reputá-la insuficiente ou mesmo inconsistente, deverá, mesmo sem impulso das partes nesse sentido, o mesmo é dizer oficiosamente, ordenar a renovação de prova já produzida ou mesmo a produção de novos meios de prova.
Em sede de reapreciação da matéria de facto, cabe à Relação, por conseguinte, formar a sua própria convicção quanto à prova produzida, convicção essa que, caso divirja da firmada em 1.ª instância, prevalecerá sobre esta.
Ou seja, e como refere António Santos Abrantes Geraldes, a Relação atua nesta sede com “autonomia decisória” e “como verdadeiro tribunal de instância”, ao qual compete “introduzir na decisão da matéria de facto impugnada as modificações que se justificarem, desde que, dentro dos poderes de livre apreciação dos meios de prova, encontre motivo para tal” (in Recursos em Processo Civil, Almedina, 2022, p. 334).
A posição que a Relação deve adotar quando confrontada com um recurso em matéria de facto deve, pois, ser a mesma da 1.ª Instância aquando da apreciação da prova após o julgamento, valendo para ambos o princípio da livre apreciação da prova, conforme resulta, aliás, do disposto nos art. ºs 607.º, n.º 5 e 663.º, n.º 2 do CPC.
O mesmo é dizer, com Remédio Marques, que a “Relação tem o poder-dever de formar a sua convicção própria sobre a prova produzida e sobre a correção do julgamento da matéria de facto, não se devendo escusar a fazê-lo com base no princípio da livre convicção do julgador da 1.ª instância” (in Acção declarativa à luz do Código revisto, p. 637-638, apud José Lebre de Feitas, Armando Ribeiro Mendes e Isabel Alexandre, in Código de Processo Civil Anotado, Vol. 3.º, p. 172).
Só assim se garantirá, de resto, a efetiva sindicância, por parte da Relação, do julgamento da matéria de facto levado a cabo em 1.ª instância e, com isso, o princípio fundamental do duplo grau de jurisdição (v., neste sentido, e entre muitos outros, os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 24-09-2013, de 26-05-2021 e de 04-11-2021, todos disponíveis na internet, no sítio com o endereço www.dgsi.pt).
A autonomia decisória com que a Relação deve encarar a reapreciação da matéria de facto não pode implicar, contudo, a consideração genérica e indiscriminada de todos os factos e meios de prova já tidos em conta pela 1.ª Instância, como se aquela reapreciação impusesse a realização de um novo julgamento.
Dispõe, com efeito, o art.º 640.º, n.º 1 do CPC que quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
.- os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados (alínea a);
.- os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnada diversa da recorrida (alínea b);
.- a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas (alínea c).
Por outro lado, de acordo com a alínea a) do n.º 2, sempre que os meios de prova que, nos termos da alínea b) do n.º 1 devem ser especificados, tenham sido gravados, incumbe ao recorrente indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes.
Resulta de tais normativos legais que sobre o recorrente que pretenda ver sindicado pela Relação o julgamento da matéria de facto feito em 1.ª instância recai o ónus de, não só circunscrever e delimitar a concreta matéria de facto de cujo julgamento discorda, como o de enunciar os meios de prova que deveriam ter conduzido a decisão diversa - apontando, neste caso, em se tratando de depoimentos gravados, as passagens da gravação ou procedendo à transcrição dos excertos relevantes - e, ainda, o de indicar o sentido da decisão que, na sua perspetiva, deve ser proferida.
O sistema adotado pelo legislador quanto ao julgamento da matéria de facto pela Relação, ao invés de uma solução pautada pela simples “repetição dos julgamentos” e “pela admissibilidade de recursos genéricos contra a decisão da matéria de facto”, consiste, pois, num sistema caracterizado “por restringir a possibilidade de revisão de concretas questões de facto controvertidas relativamente às quais sejam manifestadas e concretizadas divergências por parte do recorrente”, como corolário do “princípio do dispositivo que se revela através da delimitação do objeto do recurso (da matéria de facto) através das alegações” (v., neste sentido, António Santos Abrantes Geraldes, in ob. cit., p. 195 e 341).
Isto, aliás, com reflexos na aferição da própria admissibilidade do recurso em matéria de facto, já que, como decorre expressamente do corpo do preceito que acaba de ser transcrito, o ónus que recai sobre o recorrente deve ser cumprido sob pena de rejeição do próprio recurso.
Do sistema assim concebido pelo legislador podemos entrever, em suma, e como se referiu no Acórdão do STJ de 29-10-2015, um “ónus primário ou fundamental de delimitação do objecto e de fundamentação concludente da impugnação”, bem como de “um ónus secundário – tendente, não propriamente a fundamentar e delimitar o recurso, mas a possibilitar um acesso mais ou menos facilitado pela Relação aos meios de prova gravados relevantes” (sublinhados nossos; Acórdão disponível na internet, no sítio com o endereço www.dgsi.pt).
Sublinhe-se, ainda, que com a impugnação da decisão da matéria de facto proferida em 1.ª instância pretende-se, passe a redundância, alterar o julgamento feito quanto aos factos que, por via da impugnação, se reputam mal julgados.
Isto, contudo, não como fim em si mesmo, mas como meio ou instrumento de, mediante a alteração do julgamento dos factos impugnados, se poder concluir que - afinal - existe o direito que em 1.ª instância não foi reconhecido ou, pelo contrário, que não existe o direito que o foi; o mesmo é dizer, como meio de provocar um diverso enquadramento jurídico dos factos do levado a cabo em 1.ª instância e, com isso, obter uma decisão diversa da nele proferida quanto ao fundo da causa.
A impugnação da decisão da matéria de facto tem, por conseguinte, como referido no Acórdão da Relação de Guimarães de 15-12-2016, “carácter instrumental”, “não se justifica(ndo) a se, de forma independente e autónoma da decisão de mérito proferida, assumindo um carácter instrumental face à mesma” (Acórdão proferido no processo n.º 86/14.0T8AMR.G1, disponível na internet, no local já antes citado).
O seu fim último é, assim, como também referido no Acórdão da Relação de Coimbra de 24-04-2012, naquele citado, “conceder à parte uma ferramenta processual que lhe permita modificar a matéria de facto considerada provada ou não provada”, não com esse único intuito, mas sim “de modo a que, por essa via, obtenha um efeito juridicamente útil ou relevante”.
Por este motivo, o tribunal de recurso não deve conhecer a impugnação da matéria de facto sempre que, como se escreveu no Acórdão da Relação de Coimbra de 27-05-2014, também citado naqueloutro, “o(s) facto(s) concreto(s) objeto da impugnação for insuscetível de, face às circunstância próprias do caso em apreciação e às diversas soluções plausíveis de direito, ter relevância jurídica, sob pena de se levar a cabo uma atividade processual que se sabe, de antemão, ser inconsequente” (sublinhado nosso).»
Os factos em causa são os seguintes:
1.– Assim que entrou na Quinta ... para ali passar a residir, a R. deparou-se com um estado adiantado de degradação do imóvel fruto da incúria do A (57 da contestação).
2. – Na altura em que entrou na Quinta ... para ali passar a residir a R. mandou limpar e arranjar todas as partes exteriores do imóvel fazendo a limpeza de mato e vegetação, corte de relva, limpeza da piscina e espaços circundantes já que a Quinta estava sem esses cuidados pelo menos desde o ano de 2009 (58 da contestação).
3. – Na parte residencial, a R. encontrou pelo menos 3 (três) casas de banho da área residencial em estado de grosso e se qualquer hipótese de uso (59 da contestação).
4. – Foi a R. que mandou meter tectos falsos, iluminação, louças e chão em parquet naquelas casas de banho tornando-as assim utilizáveis (60 da contestação).
5. – Foi a R. que mandou forrar as janelas que existem no espaço dedicado à habitação da Quinta ao nível da bordadura/guarnição que estavam ainda em grosso – v.g. em cimento (61 da contestação).
6. – Foi a R. que mandou rebocar e pintar as paredes e tectos do hall de entrada da zona residencial que estavam inacabados (62 da contestação).
7. – Foi a R. que mandou instalar grades de segurança em todas as janelas que servem a habitação excepto as da fachada principal (63 da contestação).
8.– Foi a R. que durante o período em que lá esteve a coabitar a Quinta juntamente com a sua irmã FF mandou instalar um sistema de vídeo vigilância composto por 4 câmaras (72 da contestação).
9.– Foi a R. que mandou colocar um novo tecto da cozinha industrial para além do investimento que já lá tinha feito (73 da contestação).
10.– Foi a R. que mandou criar ligações de internet nos cómodos todos da casa quer da zona residencial quer da zona destinada a eventos (74 da contestação).
11.– A R. explorou economicamente a casa da eira em regime de locação temporária por via da plataforma ... que ainda teve alguma procura durante os anos de 2015 e 2016 (84 da contestação).
12.– Assim se foi mantendo a Quinta ... num estado de conservação aceitável conforme se poderá constatar pelas fotografias tiradas à época e que constam dos autos (86 da contestação).
- O Autor ficou em estado de choque ante o estado de degradação e de destruição em que a Quinta se encontrava.
- A última vez que o Autor pôde entrar na Quinta – Dezembro de 2010 – o imóvel estava em bom e cuidado estado de conservação, evidenciado pelo elevado número de eventos que lá se realizavam, pela grande procura que dele era feito e pelos comentários elogiosos que eram publicamente feitos ao imóvel e seus espaços circundantes, concretamente à piscina, ao relvado e à cobertura edificada no jardim.
Tais factos (o primeiro tem, inclusivamente, natureza conclusiva) não se mostram relevantes. Relevantes sendo os factos estruturantes da causa de pedir, factos principais, aqueles que dizem respeito ao comportamento da recorrente e que se materializem na danificação, deterioração, desvalorização da Quinta.
Quando muito, tais factos alegados pelo recorrido (que não foram selecionados pela sentença), caso a causa de pedir da acção assim o «exigisse», e na nossa óptica não o «exige»[22], auxiliaria o julgador (não tivessem sido alegados e apurados aqueloutros factos no paragrafo anterior referidos) a ter um retrato do «antes e do depois» do imóvel e como auxiliar à decisão de arbitramento da indemnização, nomeadamente em condenação a liquidar em execução de sentença. Consubstanciariam então factos concretizadores de factos principais alegado, factos estes que integram o núcleo essencial da causa de pedir e sem os quais a pretensão não pode proceder.
Mas mesmo que o recorrido os tivesse de alegar e provar (21 e 22 da p.i.), os factos que a recorrente pretende selecionados e provados (57 e 58 da contestação) não teriam de ser considerados como selecionáveis.
Seriam[23], então, tais factos, consubstanciadores daquilo que se designa de impugnação motivada.
De facto, a defesa por impugnação de facto tanto «ocorre quando o réu contradiz os factos alegados pelo A., seja por simples negação», como ocorre quando surge de forma motivada – «a designada impugnação per positionem» -, ou seja, «apresentando-se uma contraversão total ou parcialmente incompatível com a versão do autor.»
Significa isto que a defesa por impugnação de facto, neste caso, «se caracteriza por uma incompatibilidade total ou parcial no plano factual, competindo à parte sobre quem impende o respectivo ónus probatório a prova da respectiva versão»[24].
Ou seja, funcionando como impugnativos não seria de boa técnica relevar tais factos como factos a contemplar e a inserir na sentença[25].
Teriam de ser relevados, naturalmente, e na medida que com ela se pretendesse infirmar aquilo que ao recorrido caberia provar nos termos do art.342.º nº1 do CC[26].
De facto, «o direito à prova significa que as partes conflituantes, por via de ação e da defesa, têm o direito a utilizarem a prova em seu benefício e como sustentação dos interesses e das pretensões que apresentarem em tribunal. As partes têm ainda o direito a contradizer as provas apresentadas pela parte contrária ou suscitadas oficiosamente pelo tribunal bem como o direito à contraprova.
Haverá que constatar que, na prática, as partes têm sempre interesse em produzir provas, seja em relação aos factos que lhe são favoráveis, seja quanto à inexistência dos factos que a podem prejudicar (contraprova ou prova contrária).»[27]
Diríamos então, servissem tais factos como impugnativos de matéria que, de acordo com o perfil da causa de pedir, ao recorrido coubesse alegar e provar[28], tais factos, não devendo ser levados aos provados nem aos não provados[29], deveriam, no entanto, ser objecto de prova, trabalhados na motivação da decisão, e na medida que comprometessem a prova da versão que ao recorrido coubesse[30].
Temos, pois, para nós, que os factos em análise não tinham de ser considerados.
De todo o modo, não se pretendendo «deixar ponta solta», abalancemos na sua análise, se se devem considerar provados, mas exclusivamente o segundo dos factos cujo assentamento se pretende (58 da contestação).
A benefício da sua análise, e dos demais, impõe-se antes de tudo afirmar o seguinte, transcrevendo o escrito no Ac. da Relação de Guimarães de 2.11.27[31]:
«(…) o âmbito de apreciação do Tribunal da Relação, em sede de impugnação da matéria de facto, estabelece-se de acordo com os seguintes parâmetros: só tem que se pronunciar sobre a matéria de facto impugnada pelo Recorrente; sobre essa matéria de facto impugnada, tem que realizar um novo julgamento; e nesse novo julgamento forma a sua convicção de uma forma autónoma, mediante a reapreciação de todos os elementos probatórios que se mostrem acessíveis (e não só os indicados pelas partes).
Importa, porém, não esquecer - porque (como se referiu supra) se mantêm em vigor os princípios da imediação, da oralidade, da concentração e da livre apreciação da prova, e o julgamento humano se guia por padrões de probabilidade e não de certeza absoluta -, que o uso, pela Relação, dos poderes de alteração da decisão da 1ª Instância sobre a matéria de facto só deve ser usado quando seja possível, com a necessária segurança, concluir pela existência de erro de apreciação relativamente a concretos pontos de facto impugnados.
Por outras palavras, a alteração da matéria de facto só deve ser efectuada pelo Tribunal da Relação quando o mesmo, depois de proceder à audição efectiva da prova gravada, conclua, com a necessária segurança, no sentido de que os depoimentos prestados em audiência, conjugados com a restante prova produzida, apontam em direcção diversa, e delimitam uma conclusão diferente daquela que vingou na 1ª Instância. «Em caso de dúvida, face a depoimentos contraditórios entre si e à fragilidade da prova produzida, deverá prevalecer a decisão proferida pela primeira Instância em observância aos princípios da imediação, da oralidade e da livre apreciação da prova, com a consequente improcedência do recurso nesta parte» (Ana Luísa Geraldes, «Impugnação e reapreciação da decisão sobre a matéria de facto», Estudos em Homenagem ao Prof. Dr. Lebre de Freitas, Vol I, pág. 609).
Vejamos então.
Quanto ao primeiro (1.– Assim que entrou na Quinta ... para ali passar a residir, a R. deparou-se com um estado adiantado de degradação do imóvel fruto da incúria do A (57 da contestação), é o mesmo consubstanciador de um juízo conclusivo[32], não sendo matéria a considerar sob pena de ser considerado o que sobre ele se assentasse como não escrito a coberto do art.607.º n.º1 do CPC[33].
É o seguinte o teor do facto 2 que se pretende relevado e assente:
2. – Na altura em que entrou na Quinta ... para ali passar a residir a R. mandou limpar e arranjar todas as partes exteriores do imóvel fazendo a limpeza de mato e vegetação, corte de relva, limpeza da piscina e espaços circundantes já que a Quinta estava sem esses cuidados pelo menos desde o ano de 2009 (58 da contestação).
A propósito deste facto (e também do anterior e dos que se seguem constantes da contestação nos art.59 a 63, 72 a 74) a recorrente convoca como prova:
- CC (depõe, nos segmentos indicados, sobre obras no interior da casa e anexos, contactos com outros artistas) - (2.20 - 3.12, 4.3 - 4.46, 4.50 - 9.58) - (piscina verde) - (11.55 - 13.30);
- DD (a quinta não recebeu qualquer evento no decorrer de 2009) - (4.21 - 6.13), - (mato, tudo arrombado) – (8.18 – 10.40);
- EE – (limpeza da Quinta ao nível de espaços interiores) - (3.10 - 3.55) -, (cheio de silvas) -(3.58 – 4.27)
Declarações da R. -(16.35 - 19.50 / 20.05 - 21.20).
O apelado convoca os seguintes elementos de prova:
- o registo fotográfico da Quinta junto como doc.7
- JJ (identifica a Quinta e o seu estado nas fotografias que lhe foram exibidas);
- NN (confirmação de fotos quanto ao estado da mesma em 2010 e em 2018);
OO (estado da Quinta, organização de eventos)
- doc. 2 junto na primeira sessão de julgamento, email de 12.7.10 com vista a confirmar que na data ainda se realizam eventos na quinta
Ouvidos os segmentos invocado por ambas as partes, analisados os documentos segmentados, diremos que, a ter de relevar o facto em causa (58 da contestação) e aqueloutro (57), o local dos mesmos seria os não provados.
Sobraria, quanto mais não fosse, a dúvida quanto à verdade dos mesmos, assim se operando o disposto no art. 414 do CPC.
Como atrás se referiu, «a alteração da matéria de facto só deve ser efectuada pelo Tribunal da Relação quando o mesmo, depois de proceder à audição efectiva da prova gravada, conclua, com a necessária segurança, no sentido de que os depoimentos prestados em audiência, conjugados com a restante prova produzida, apontam em direcção diversa.»
Pelo exposto remete-se tão só o que consta do art.58 da contestação para os não provados e pelos motivos atrás referidos quanto ao que consta no art.57 da mesma peça.
Factos constantes da contestação nos art. 59 a 63, 72 a 74
São os seguintes factos que se pretendem relevados e provados:
3. – Na parte residencial, a R. encontrou pelo menos 3 (três) casas de banho da área residencial em estado de grosso e se qualquer hipótese de uso (59 da contestação).
4. – Foi a R. que mandou meter tectos falsos, iluminação, louças e chão em parquet naquelas casas de banho tornando-as assim utilizáveis (60 da contestação).
5. – Foi a R. que mandou forrar as janelas que existem no espaço dedicado à habitação da Quinta ao nível da bordadura/guarnição que estavam ainda em grosso – v.g. em cimento (61 da contestação).
6. – Foi a R. que mandou rebocar e pintar as paredes e tectos do hall de entrada da zona residencial que estavam inacabados (62 da contestação).
7. – Foi a R. que mandou instalar grades de segurança em todas as janelas que servem a habitação excepto as da fachada principal (63 da contestação).
8.– Foi a R. que durante o período em que lá esteve a coabitar a Quinta juntamente com a sua irmã FF mandou instalar um sistema de vídeo vigilância composto por 4 câmaras (72 da contestação).
9.– Foi a R. que mandou colocar um novo tecto da cozinha industrial para além do investimento que já lá tinha feito (73 da contestação).
10.– Foi a R. que mandou criar ligações de internet nos cómodos todos da casa quer da zona residencial quer da zona destinada a eventos (74 da contestação).
Dizem os factos em causa respeito a obras realizadas pela recorrente no interior da casa.
Diremos com o apelado que «os mesmos, sejam verdadeiros ou falsos, são absolutamente irrelevantes nesta sede, já que a responsabilidade que o Autor imputa à Ré (…) diz respeito a todo o espaço exterior e não a eventuais obras (…) feitas no interior.»
Temos para nós que estes factos, de certa maneira também aquele que se ajuizou, apenas relevariam se a apelante pretendesse exigir o pagamento ao apelado do que na Quinta despendeu a suas expensas, ainda que a título de compensação contra eventual valor indemnizatório apurada a favor do apelado.
Não deduziu, no entanto, reconvenção com pedido consequente.
Em face disto, quanto a esta matéria (obras no interior do imóvel) nada há a ajuizar em face da sua irrelevância para a decisão da causa.
Esteve bem o tribunal a quo em não os considerar.
Factos constantes da contestação nos art.84 e 86
São os seguintes factos que se pretendem relevados e provados:
11.– A R. explorou economicamente a casa da eira em regime de locação temporária por via da plataforma ... que ainda teve alguma procura durante os anos de 2015 e 2016 (84 da contestação).
12.– Assim se foi mantendo a Quinta ... num estado de conservação aceitável conforme se poderá constatar pelas fotografias tiradas à época e que constam dos autos (86 da contestação).
A propósito destes factos a recorrente convoca como prova:
- DD (a casa da eira foi locada em regime de AL pela recorrente, frequência de clientela na quinta reencaminha pela recorrente para fazerem refeições, bom estado da Quinta enquanto a recorrente nela habitou) - (12.00-12.39, 20.15-22.53, 21.17-22.16);
O apelado nada invoca em termos e prova quanto ao primeiro.
Quanto ao segundo invoca as fotografias juntas sob os números 16-29.
Ouvido o depoimento de DD, impõe-se tão só o assentamento do primeiro dos factos referidos:
11.– A R. explorou economicamente a casa da eira em regime de locação temporária por via da plataforma ... que ainda teve alguma procura durante os anos de 2015 e 2016 (84 da contestação).
Quanto àqueloutro, com base no depoimento de NN e o registo fotográfico junto como doc.7, muito elucidativo, outrossim toda a argumentação produzida na motivação relativamente aos danos provados, que, como diremos, se entende irrepreensível, impõem-se dar como não provado este facto. O testemunho invocado pela recorrente não se mostra suficientemente consistente para contornar essa conclusão.
Como atrás se referiu, «a alteração da matéria de facto só deve ser efectuada pelo Tribunal da Relação quando o mesmo, depois de proceder à audição efectiva da prova gravada, conclua, com a necessária segurança, no sentido de que os depoimentos prestados em audiência, conjugados com a restante prova produzida, apontam em direcção diversa.»
Pelo exposto remete-se para os provados tão só o seguinte facto: A R. explorou economicamente a casa da eira em regime de locação temporária por via da plataforma ... que ainda teve alguma procura durante os anos de 2015 e 2016 (84 da contestação).
O facto constante do art.86 da contestação é remetido para os não provados: 12.– Assim se foi mantendo a Quinta ... num estado de conservação aceitável conforme se poderá constatar pelas fotografias tiradas à época e que constam dos autos (86 da contestação).
Conclusões 39 – 45
Factos dados como assente sob o ponto 33 e que se pretende como não provado.
33. Entre dezembro de 2010 e 2018, devido a falta de manutenção, as portadas da casa da eira, em vidro e madeira, degradaram-se, tendo algumas delas sido retiradas.
Fundamentou o tribunal a quo nos seguintes termos:
«A matéria da alínea 33 foi, em parte, reconhecida pela Ré nas suas declarações de parte (ref.ª citius 441478462), ao admitir que, durante o período compreendido de 2010 e 2018, algumas das portadas, da casa da eira, em vidro e madeira foram partidas. Acresce que a degradação e a retirada de portadas foi corroborada pelo depoimento da testemunha JJ e pelas fotografias que integram os documentos 7 (páginas 29 e seguintes do relatório) e 10 apresentados com a petição inicial. A testemunha PP (carpinteiro, prestou serviços ao Autor durante muitos anos) afirmou que fez essas portadas, a pedido do Autor, portanto, em data anterior a dezembro de 2010. Das fotografias colhidas em 2018 verifica-se, nomeadamente, que há falta de tinta em todas as portadas, o que é demonstrativo de que a deterioração das portadas se ficou a dever a falta de manutenção. Nas declarações de parte, a Ré reconheceu que algumas das portadas foram partidas, mas referiu que tal aconteceu por ação da sua irmã FF e devido à ação do vento e das condições climatéricas, mas a demais prova produzida não corroborou estas razões apontadas pela Ré. A testemunha HH, (assessora de imprensa, prima da Ré) disse, de forma genérica, que a Ré recuperou a casa da eira, mas não concretizou qualquer ato de recuperação. Esta mesma testemunha declarou que tinha ouvido dizer que a FF tinha descompensado e estava a dar problemas e por isso foi mudada para a casa da eira, nada tendo a testemunha referido quanto a danos causados por FF na casa da eira, nomeadamente, nas respetivas portadas. Pelo exposto, foi considerada provada a matéria da alínea 33.
Convoca a recorrente as suas declarações (20.13 – 20.28), e o apelado registo fotográfico (doc.7 junto com a p.i.), depoimento de JJ e NN.
Compulsados todos os elementos convocados, ouvido o que tinha de ser ouvido, igualmente relevando o percurso feito na sentença e atrás descrito, diremos que é incontornável reconhecer a bondade da decisão neste aspecto.
Como atrás se referiu, «a alteração da matéria de facto só deve ser efectuada pelo Tribunal da Relação quando o mesmo, depois de proceder à audição efectiva da prova gravada, conclua, com a necessária segurança, no sentido de que os depoimentos prestados em audiência, conjugados com a restante prova produzida, apontam em direcção diversa.»
Impõe-se a manutenção como provado do facto posto em crise.
Factos dados como assente sob os pontos 35, 40 a 45, e que se pretendem como não provado, igualmente e em consequência, a rectificação do facto constante do ponto 48
35. Entre dezembro de 2010 e 2018, a Ré não cuidou da manutenção e conservação da piscina, tendo da mesma sido arrancada parte do revestimento (pastilha) e não retendo a água devido a microfissuras na sua estrutura.
40. Entre dezembro de 2010 e 2018, a Ré cuidou pouco da manutenção e conservação do relvado da espécie Gramilha (Cynodon dactilon) existente no logradouro interior junto à casa e à volta da piscina – área de 466,00 m2.
41. A pouca manutenção e conservação proporcionada pela Ré, entre dezembro de 2010 e 2018, ao relvado da espécie Gramilha (Cynodon dactilon) que existia no logradouro interior junto à casa e à volta da piscina contribuiu para a destruição desse relvado.
42. Entre dezembro de 2010 e 2018, a Ré cuidou pouco da manutenção e conservação do relvado da espécie Zoysia (Zoysia Japónica) existente na área envolvente do engenho – área de 1.230,00 m2.
43. A pouca manutenção e conservação proporcionada pela Ré, entre dezembro de 2010 e 2018, ao relvado da espécie Zoysia (Zoysia Japónica) que existia na área envolvente do engenho contribuiu para a destruição desse relvado.
44. Entre dezembro de 2010 e 2018, a Ré cuidou pouco da manutenção e conservação do relvado, sem sistema de rega, localizado na zona do terreno mais afastada da casa – área de 6.530,00 m2;…
45…O que contribuiu para a destruição desse relvado.
48. O supra referido em 33), 35), 36), 38), 41), 43) e 44)-45) implicou uma diminuição do valor de mercado da Quinta ....
Fundamentou a o tribunal a quo quanto a estes factos nos seguintes termos:
«Quanto à alínea 35, nas declarações de parte prestadas pela Ré esta admitiu que, no período em que esteve a viver na Quinta ..., mandou arrancar a parte do revestimento em pastilha que ainda se encontrava na piscina; acrescentando que o fez tendo em vista a impermeabilização da mesma, tendo mandado reparar as fendas que a piscina tinha, rebocar a piscina e mandar pintar a piscina com tinta branca. A testemunha DD declarou que foi o seu marido quem forneceu a tinta para pintar a piscina. Ficou, assim, provado que no mencionado período foi arrancada a pastilha que revestia a piscina e que esta não retinha a água devido a microfissuras na sua estrutura. A testemunha HH afirmou que, durante o tempo em que a Ré esteve a viver na Quinta ..., às vezes, aos fins de semana, ia lá, tendo chegado a tomar banho na piscina e que esta estava limpa; a piscina era de pastilha, mas começaram a saltar pastilhas; disse que a Ré terá mandado cobrir a pastilha com tela, mas que não tinha a certeza. Importa referir que esta testemunha não localizou no tempo quando é que tomou banho na piscina ou quando é que a Ré terá mandado intervencionar a piscina. A testemunha II disse que foi várias vezes à Quinta ..., pois a sua filha era amiga da filha da Ré (sendo colegas no sétimo ano de escolaridade, tendo agora 25 anos), tendo a sua filha e a filha da Ré tomado banho na piscina. Por seu turno, resultou da fotografia da piscina em 2018 (documento 12 da petição inicial) e dos depoimentos das testemunhas JJ e QQ que a piscina não estava em estado de poder ser utilizada. Da conjugação dos meios de prova acabados de referir, entendemos que, entre dezembro de 2010 e 2018, houve uma fase em que a piscina foi utilizada, o que faz pressupor a sua manutenção e conservação, mas que depois a Ré deixou de cuidar da manutenção e conservação da piscina, o que é evidenciado, nomeadamente, pela fotografia 12. Sublinhe-se que é do conhecimento geral que uma piscina é um equipamento exigente em termos de manutenção e conservação.
(….)
A matéria das alíneas 40-41, 42-43 e 44-45 foi considerada provada conjugando o depoimento das testemunhas JJ, QQ, EE, DD, HH e II com a prova documental produzida sobre esta matéria (documentos 7, 15, 16 e 17 da petição inicial; documentos 18, 21, 25 e 29 da contestação).
A existência, em dezembro de 2010 e em bom estado, do relvado da espécie Gramilha (Cynodon dactilon) existente no logradouro interior junto à casa e à volta da piscina, do relvado da espécie Zoysia (Zoysia Japónica) existente na área envolvente do engenho e do relvado, sem sistema de rega, localizado na zona do terreno mais afastada da casa foi corroborada pelas testemunhas JJ e QQ e decorre dos documentos 15, 16 e 17 da petição inicial, sendo os relvados visíveis nas fotografias, bem como do documento 7 da petição inicial (pp. 57-59, 60-62 e 63-64. A última frase da página 64 resulta de um manifesto lapso de escrita, pois constitui a repetição do verbalizado nas páginas anteriores; sendo que o título que encabeça as pp. 63-64 é «16.1.12 Relvado extenso, sem sistema de rega, na zona do terreno mais afastada da casa (área Ar6 = 6.530,00 m2)»; e sendo alegado na petição inicial que o relvado da zona do terreno mais afastada da casa não tinha sistema de rega). Quanto às áreas (referidas nas alíneas 40, 42 e 44), a convicção do Tribunal baseou-se no documento 7 da petição inicial, de onde consta a medição dessas áreas.
No que concerne à existência do sistema de rega automática no relvado do logradouro interior junto à casa e à volta da piscina e no relvado da área envolvente do engenho, nenhuma das testemunhas inquiridas se pronunciou sobre tal existência e nas fotografias juntas ao processo não é visível qualquer vestígio de sistema de rega automática nesses relvados. Apenas no relatório que constitui o documento 7 da petição inicial se encontram escassas menções aos mencionados sistemas de rega automática: a pp. 57-59 do relatório, no título que encabeça tais páginas, pode ler-se «16.1.10 Relvado da espécie Gramilha (Cynodon dactilon) no logradouro interior, junto à casa e à volta da piscina, incluindo sistema de rega automático (área Ar4 = 466,00 m2)», e, na página 59, pode ler-se «o relvado, incluindo o sistema de rega, encontra-se totalmente destruído; a reposição da situação anterior implica uma nova plantação (incluindo tratamento da terra e adubagem) e um novo sistema automático de rega»; a pp. 60-62 do relatório, no título que encabeça tais páginas, pode ler-se «16.1.11 Relvado da espécie Zoysia (Zoysia Japónica) na área envolvente do engenho, incluindo sistema de rega automático (área Ar5 = 1.230,00 m2)», e, na página 62, pode ler-se «o relvado encontra-se totalmente destruído, sem possibilidade de recuperação; a reposição da situação anterior implica uma nova sementeira incluindo tratamento da terra e adubagem e sistema de rega». Estas escassas menções, quando nas fotografias que integram o relatório não são visíveis quaisquer vestígios dos sistemas de rega, desacompanhadas de qualquer outro meio de prova demonstrativo da existência dos sistemas de rega, foram consideradas manifestamente insuficientes para comprovar a veracidade da matéria fáctica das alíneas XX e XXII.
Relativamente à atividade da Ré no âmbito da manutenção e conservação do relvado, durante o tempo em que procedeu à gestão e administração da Quinta ..., o Tribunal teve em consideração o depoimento das testemunhas EE, DD, HH e II, conjugados com os documentos 7, 15, 16 e 17 da petição inicial e os documentos 18, 21, 25 e 29 da contestação. A testemunha EE declarou que, mais ou menos, há cerca de 11 ou 12 anos, a Ré lhe pediu para limpar a Quinta; que andou lá dois dias, com o trator, tendo limpo muitas silvas. Resultou dos depoimentos das testemunhas DD, HH e II que os relvados não foram completamente abandonados, tendo as testemunhas referido que, quando estiveram na Quinta, durante o tempo em que a Ré lá habitou, a relva estava cortada. Acresce que, caso a Ré, durante os anos em que habitou na Quinta nada tivesse feito quanto à manutenção e conservação dos relvados, as fotografias da Quinta ... relativas aos relvados – cfr., nomeadamente, os documentos 7, 15, 16 e 17 da petição inicial e os documentos 18, 21, 25 e 29 da contestação – mostrariam essas áreas de terreno tomadas pelas silvas, as quais, como é do conhecimento geral, na zona norte do nosso país, ‘apoderam-se’ das áreas de terreno que não são cuidadas, anos a fio. Ora, da análise das fotografias da Quinta ... relativas aos relvados, enquanto a Ré esteve na Quinta e após a Ré ter saído da Quinta os documentos 7, 15, 16 e 17 da petição inicial e os documentos 18, 21, 25 e 29 da contestação – verifica-se que os espaços dos relvados tiveram uma manutenção mínima – cfr., nomeadamente, os documentos 18, 21, 25 e 29 da contestação; o que também teve apoio na prova testemunhal –, caso contrário estariam tomados pelas silvas. A este propósito é significativa a expressão utilizada pela testemunha DD ao referir que a Ré procedeu à manutenção da Quinta, conforme podia (resultou do depoimento da testemunha CC – carpinteiro e taqueiro, reformado –, que prestou serviços à Ré, nomeadamente, de carpintaria, que a ação da Ré se focou, de modo principal, na zona habitacional da Quinta ...). Pelo exposto, o Tribunal considerou provado que, entre dezembro de 2010 e 2018, a Ré cuidou pouco da manutenção e conservação dos relvados (alíneas 40, 42 e 44). Admite-se que a verbalização cuidou pouco não é exemplar, mas exprime que a Ré desenvolveu alguma atividade no âmbito da manutenção e conservação dos relvados.
Resultou dos depoimentos das testemunhas JJ, NN e QQ, conjugados com os documentos 7, 15, 16 e 17 da petição inicial que, quando a Ré saiu da Quinta ..., os relvados existentes no logradouro interior junto à casa e à volta da piscina, na área envolvente do engenho e na zona mais afastada da casa estavam destruídos, pois tal é visível nas fotografias que integram os referidos documentos e foi relatado pelas testemunhas. Consideramos que a pouca manutenção e conservação proporcionada pela Ré aos relvados, entre dezembro de 2010 e 2018, contribuiu para a destruição dos relvados, porque de acordo com as regras da experiência comum quando não é feita a manutenção e não são dispensados cuidados de conservação aos relvados estes ficam destruídos. Todavia, também é da experiência comum que, devido a fatores diversos (por exemplo, climatéricos ou pragas), as plantas são destruídas, pelo que, considerando o longo tempo em causa, cerca de 8 anos, e a circunstância de não se ter apurado em concreto o que foi sucedendo aos relvados ao longo desse tempo, apenas se considerou provado que a pouca manutenção e conservação proporcionada pela Ré aos relvados contribuiu para a destruição dos relvados, ou seja, não foi a única razão para a destruição dos relvados (alíneas 41, 43 e 45).
A implantação de novos relvados tem custos, é inequívoco.
(…)
Com vista a alterar o sentido da decisão quanto a esta matéria a apelante convoca o seu depoimento de parte, os depoimentos de HH – (Quinta em bom estado), CC (reparou a bomba da piscina a mando da apelante, tentou impermeabilizar ..)[34], (…) e registo fotográfico.
O apelado convoca a confissão da recorrente quanto ao ponto 35, remetendo para os depoimentos considerados pelo tribunal a quo quanto à restante matéria.
Compulsados todos os elementos convocados, ouvido o que tinha de ser ouvido, igualmente relevando o percurso feito na sentença e atrás descrito, diremos que, como já se disse atrás quanto a outra matéria, é incontornável reconhecer a bondade da decisão.
Como atrás se referiu, «a alteração da matéria de facto só deve ser efectuada pelo Tribunal da Relação quando o mesmo, depois de proceder à audição efectiva da prova gravada, conclua, com a necessária segurança, no sentido de que os depoimentos prestados em audiência, conjugados com a restante prova produzida, apontam em direcção diversa.»
Impõe-se a manutenção dos factos em crise como provocado, em consequência ficando prejudicada a pretendida rectificação do facto constante do ponto 48.
– A R. explorou economicamente a casa da eira em regime de locação temporária por via da plataforma ... que ainda teve alguma procura durante os anos de 2015 e 2016 (84 da contestação).
Aos dados como não provados, juntam-se os seguintes:
- Na altura em que entrou na Quinta ... para ali passar a residir a R. mandou limpar e arranjar todas as partes exteriores do imóvel fazendo a limpeza de mato e vegetação, corte de relva, limpeza da piscina e espaços circundantes já que a Quinta estava sem esses cuidados pelo menos desde o ano de 2009 (58 da contestação).
- Assim se foi mantendo a Quinta ... num estado de conservação aceitável conforme se poderá constatar pelas fotografias tiradas à época e que constam dos autos (86 da contestação).
Vista a decisão que antecede relativamente à matéria de facto, o que dela resultou provado, ou seja, que «R. explorou economicamente a casa da eira em regime de locação temporária por via da plataforma ... que ainda teve alguma procura durante os anos de 2015 e 2016 (84 da contestação)», sem significado, o pressuposto factual da decisão do tribunal a quo continua presente.
Entende a apelante que o instituto convocado para ajuizar o objecto dos autos foi acertado[36], sendo-o de facto ainda que se relevasse a citada representação[37].
Refere, no entanto, «(…) que era importante analisar e decidir se estão preenchidos os pressupostos da responsabilidade civil por factos ilícitos a saber: facto voluntário do lesante; a ilicitude, a imputação do facto ao lesante (culpa), o dano e o nexo de causalidade entre o facto e o dano. (…)»
Afirmando de seguida que «[t]udo quanto iremos argumentar só fará sentido acaso não se altere a matéria de facto nos termos acima defendidos pois, caso assim aconteça como se espera, faltará desde logo um dos elementos mais importantes para subsunção desta questão ao instituto da responsabilidade civil por factos ilícitos: o dano! E como não há dano nada haverá a reparar! Na verdade, tal como acima vimos não está minimamente provado que a Quinta ..., antes da entrada da R., estava emmelhores condições do que aquelas em que a R. a deixou em Abril de 2018 – bem pelo contrário! Daí que não se pode danificar aquilo que já está danificado como será bom de compreender.»
Pois bem, o facto pressuposto da conclusão que antecede não resultou provado, ou seja, que a Quinta com a apelante ficou em melhores condições.
Não será, pois, por via desta circunstância que a decisão em crise está inquinada nos seus pressupostos.
Mas mesmo pressupondo a ausência de qualquer influência resultante da alteração factual, entende a recorrente que não existe ilicitude e culpa, ou seja, pressuposto estruturantes da responsabilidade civil prevista no art.483.º do CC
Esgrimindo com o que resulta provado no ponto 17) dos factos dados como provados, entende que «a legítima propriedade total ou parcial da Quinta ... era uma questão controversa e controvertida e, por isso, e por via disso, a mesma teve que ser dirimida e esclarecida pelo tribunal (…)», concluindo opinião, que «em todo o período que vai de Dezembro de 2010 até ao trânsito em julgado da decisão que determinou a direito a ser proprietário de metade da Quinta ..., não existiu qualquer violação do direito do A. porque este ainda não existia!».
Dizer quanto a esta argumentação que, s.m.o, não colhe.
O recorrido, então herdeiro, com o ingresso na compropriedade do imóvel por reconhecimento por via da aquisição originária (factos constantes dos 17-19), fica legitimado na tutela dessa propriedade, ainda que por actos de terceiros anteriores ao reconhecimento referido.
É que, diferentemente do que acontece relativamente à procuração outorgada quando a FF não era ainda comproprietária[38], releva aqui o que dispõe o art.1288.º e 1317.º al.c) do CC.
De facto, a usucapião é uma forma de aquisição originária. A tal ponto assim é que, uma vez obtida, faz retroagir o direito de propriedade, ou outro direito real de gozo usucapível, à data do início da posse.
A usucapião faz nascer o direito, logo «ex novo», na esfera do usucapiente, como se pela primeira vez (a 1ª vez de todas) fosse constituído.
Como observa Oliveira Ascensão[39], ele surge na esfera do novo titular, «independente do direito do titular antigo».
Aliás, para este autor a constituição do direito real por usucapião provoca necessariamente a extinção de quantos direitos reais que recaiam sobre a coisa[40].
Por conseguinte, não temos como negar a compropriedade do apelado com data anterior à ocupação pela apelante, resultando desta, em face dos factos apurados, danos que o tribunal a quo quantificou, aritmética esta, de resto, que não foi posta em causa: o argumento decisivo era que o apelado não tinha um direito que, ao abrigo do artº 1305.º do CC e art.62 da CRP, pudesse tutelar.
Quanto à culpa diremos que a mesma assenta na censura que se faça de um comportamento que caia fora da moldura ditada pela leitura da bitola do exigido a um diligente pai de família - n. 2.º, do art. 487.º do CC.
Refere Antunes Varela[41] que «agir com culpa significa atuar em termos de a conduta do agente merecer a reprovação ou censura do direito. E a conduta do lesante é reprovável quando, pela sua capacidade e em face das circunstâncias concretas da situação, se concluir que ele podia e devia ter agido de outro modo».
Quanto a este aspecto, vistos o contexto factual provado, não pode deixar de se acompanhar a sentença, configurando o comportamento da apelante, por acção e omissão, merecedor de censura, no mínimo a título de negligência por violação na ocupação que fez da Quinta os deveres de cuidado exigíveis atentas as circunstâncias concretas.
Improcede, também neste segmento, o recurso.
Pelo exposto, acorda este tribunal julgar o presente recurso não provido, e, por via disso, confirma-se a decisão recorrida no enquadramento jurídico que fez da responsabilidade da apelante.
Custas pela apelante.
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Porto, 6/2/2025
Carlos Cunha Rodrigues Carvalho
Isabel Peixoto Pereira
António Paulo Vasconcelos
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[1] Cfr. a citação da doutrina a propósito no Ac. do STJ de 6.6.2018 proc. 4691/16.2T8LSB.L1.S1: (a) António Santos Abrantes Geraldes - «[a]s conclusões exercem ainda a importante função de delimitação do objeto do recurso, como clara e inequivocamente resulta do artigo 635º, n.º 3, do CPC. Conforme ocorre com o pedido formulado na petição inicial, as conclusões do recurso devem corresponder à identificação clara e rigorosa daquilo que se pretende obter do tribunal Superior, em contraposição com aquilo que foi decidido pelo Tribunal a quo.» - in Recursos no Novo Código de Processo Civil, 2017 – 4ª edição, Almedina, página 147. / (b) Fenando Amâncio Ferreira - «[n]o momento de elaborar as conclusões da alegação pode o recorrente confrontar-se com a impossibilidade de atacar algumas das decisões desfavoráveis. Tal verificar-se-á em dois casos; por preclusão ocorrida aquando da apresentação do requerimento de interposição do recurso, ou por preclusão derivada da omissão de referência no corpo da alegação. Se o recorrente, ao explanar os fundamentos da sua alegação, defender que determinada decisão deve ser revogada ou alterada, mas nas conclusões omitir a referência a essa decisão, o objeto do recurso deve considerar-se restringido ao que estiver incluído nas conclusões.» - in Manual dos Recursos em Processo Civil, Almedina, 2000, página 108 / (c) José Augusto Pais do Amaral - «[o] recorrente que tenha restringido o âmbito do recurso no requerimento de interposição, pode ainda fazer maior restrição nas conclusões da alegação. Basta que não inclua nas conclusões da alegação do recurso alguma ou algumas questões, visto que o Tribunal ad quem só conhecerá das que constem dessas conclusões.» - Direito Processual Civil, 2013, 11ª edição, Almedina, páginas 417/418.
[2] Pretende-se que sejam dados como provados os seguintes factos:
– Assim que entrou na Quinta ... para ali passar a residir, a R. deparou-se com um estado adiantado de degradação do imóvel fruto da incúria do A (57 da contestação).
– Na altura em que entrou na Quinta ... para ali passar a residir a R. mandou limpar e arranjar todas as partes exteriores do imóvel fazendo a limpeza de mato e vegetação, corte de relva, limpeza da piscina e espaços circundantes já que a Quinta estava sem esses cuidados pelo menos desde o ano de 2009 (58 da contestação).
– Na parte residencial, a R. encontrou pelo menos 3 (três) casas de banho da área residencial em estado de grosso e se qualquer hipótese de uso (59 da contestação).
– Foi a R. que mandou meter tectos falsos, iluminação, louças e chão em parquet naquelas casas de banho tornando-as assim utilizáveis (60 da contestação).
– Foi a R.que mandou forrar as janelasque existem no espaço dedicado à habitação da Quinta ao nível da bordadura/guarnição que estavam ainda em grosso – v.g. em cimento (61 da contestação).
– Foi a R. que mandou rebocar e pintar as paredes e tectos do hall de entrada da zona residencial que estavam inacabados (62 da contestação).
– Foi a R. que mandou instalar grades de segurança em todas as janelas que servem a habitação excepto as da fachada principal (63 da contestação).
– Foi a R. que durante o período em que lá esteve a coabitar a Quinta juntamente com a sua irmã FF mandou instalar um sistema de vídeo vigilância composto por 4 câmaras (72 da contestação).
– Foi a R. que mandou colocar um novo tecto da cozinha industrial para além do investimento que já lá tinha feito (73 da contestação).
– Foi a R. que mandou criar ligações de internet nos cómodos todos da casa quer da zona residencial quer da zona destinada a eventos (74 da contestação).
– A R. explorou economicamente a casa da eira em regime de locação temporária por via da plataforma ... que ainda teve alguma procura durante os anos de 2015 e 2016 (84 da contestação).
– Assim se foi mantendo a Quinta ... num estado de conservação aceitável conforme se poderá constatar pelas fotografias tiradas à época e que constam dos autos (86 da contestação).
[3] 4. «A Recorrente iniciou a sua impugnação da matéria de direito, revisitando a exceção de ilegitimidade por si invocada na contestação, reiterando que a ação deveria ter sido instaurada também contra a sua irmã FF, comproprietária do imóvel, por ter sido esta quem passou à Ré uma procuração que lhe conferia poderes de gestão, administração e disposição de todos os seus bens. Exceção essa que já foi apreciada e decidida pelo tribunal a quo em 26.01.2021, julgando-a totalmente improcedente, pelo que, s.m.o., não tendo a Ré dela recorrido a mesma consolidou-se com o seu trânsito em julgado.»
[4] Abrantes Geraldes, Recursos em Processo Civil, 8º ed. Almedina, pág.285/286
[5] Acórdão da RP de 4.10.2021, processo 1910/20.4T8PNF.P1.
[6] Serve o maior desenvolvimento que segue a benefício também da análise da responsabilidade da apelante que se fará final.
[7] «Uma das fontes do poder de representação é a procuração, definida pelo artigo 262.º do Código Civil como o ato pelo qual alguém (dominus) atribui a outrem (procurador), voluntariamente, poderes representativos. Trata-se, portanto, de acto unilateral, por intermédio do qual, é conferido ao procurador o poder de celebrar negócios jurídicos em nome de outrem (dominus), em cuja esfera jurídica se vão produzir os seus efeitos (artigo 262.º do Código Civil). A concessão desses poderes de representação não é ilimitada. Está circunscrita ao âmbito dos poderes contidos na procuração, sob pena de, sendo tais poderes extravasados, existir abuso de representação.» – Ac. STJ de 27.09.2018, proc.17/14.8TBVZL.C1.S1
[8] «No direito civil, no direito privado, dentro do campo dos negócios jurídicos patrimoniais (para actos pessoalíssimos, a lei interdita-a por vezes expressamente), a representação voluntária é permitida de um modo geral. Quer nos contratos (e para ambas as partes), quer nos negócios unilaterais entre vivos. E ainda nos atos quase negociais, por força do artigo 295.º. Mas não nos actos materiais ou reais, como por exemplo, na posse. Nem nos actos ilícitos extracontratuais, onde falta uma declaração, e a eventual imputação da conduta alheia obedece a outros mecanismos e a critérios diferentes.» - Comentários ao Código Civil, parte Geral, 2º Ed., UCP Editora, pág.767.
[9] Tendo por objecto tais actos, seria semelhante procuração, negócio jurídico unilateral, nulo por via do disposto no art. 294.º do CC
[10] E actos jurídicos – art.295.º do CC
[11] Matéria incontrovertida: «…nos termos do qual todos acordaram, designadamente, que seriam adjudicados ao Autor e à sua irmã FF, em comum e partes iguais, os imóveis identificados nos lotes nºs ... e ... da «Relação dos Bens Anexa ao Contrato Promessa de Partilha Outorgado em 20.12.96.
Do lote n.º ... da «Relação dos Bens Anexa ao Contrato Promessa de Partilha Outorgado em 20.12.96» faz parte a verba n.º 5.1, com a seguinte descrição: «um prédio misto, denominado “Quinta ...”, constituído por casa de rés-do-chão e andar, com 198,0 m2, quintal, com 400 m2 e terreno junto com 12.800 m2, sito no lugar ..., freguesia ..., concelho de Santo Tirso, inscrito na matriz sob os arts. ... urbano, ... e ... rústicos descrito na Conservatória do registo Predial de Santo Tirso sob o nº ..., descrito na Conservatória deste concelho sob o n.º ...».
[12] Ac. do TRG de 8.10.2015, processo 743/13.0TBPRG.G1
[13] José Fonseca Martins. Herança indivisa: sua natureza Jurídica. Responsabilidade dos herdeiros pelas dívidas da Herança, ROA, Set.1986, p.571./ https://mail.google.com/mail/u/0/?hl=pt_PT#inbox?projector=1
[14] Matéria incontrovertida: «por acórdão proferido pelo Tribunal da Relação do Porto de 11-09-2018, já transitado em julgado, a referida decisão foi parcialmente revogada, e, consequentemente, julgada a ação parcialmente procedente, declarando-se a aquisição por usucapião, pela apelante e apelado BB, em comum e em partes iguais da propriedade da Quinta ..., determinando a inscrição da propriedade em conformidade, tendo, quanto ao mais, sido confirmada a decisão recorrida.
Pela apresentação n.º 3625, de 2018/11/07, foi definitivamente inscrita no registo predial a decisão judicial que declarou a aquisição do imóvel denominado Quinta ..., por usucapião, por BB e por FF, em comum e em partes iguais.»
[15] Rui Pinto, Cláudia Trindade, CC anotado, coordenado por Ana Prata, V.II, 3º edº, Almedina: nota 4, pág.114.
[16] De resto, a configuração da causa de pedir em termos de considerar toda a actuação da recorrentes em nome e por conta da FF, levaria a definir esta como única com interesse directo em contradizer e vista a natureza a natureza da representação: «O representante pratica ou conclui o acto negocial; depois sai do palco, nunca ficando vinculado, mesmo que não disponha dos necessários poderes»- Comentários ao Código Civil, parte Geral, 2º Ed., UCP Editora, pág.766-
[17] Código de Processo Civil anotado, V.I, 3º Ed., Almedina, pág.68.
[18] Está provado e não é posto em crise: «13. A referida ação judicial culminou com a prolação da sentença, datada de 05-09-2015, na qual FF foi declarada inabilitada por anomalia psíquica, para dispor a qualquer título dos seus bens imóveis, alienando-os ou onerando-os, tendo o início da incapacidade sido fixado desde os 18 anos e tendo sido nomeada como curadora a sua irmã AA, ora Ré.»
[19] Cfr. o revogado artº150 do CC, e o actual 154º, n.º 3 do mesmo diploma.
[20] Do qual fomos adjunto.
[21] Assim os epigrafando: «C)DA IMPUGNAÇÃO»
[22] Nas acções de responsabilidade civil extracontratual, a causa de pedir é complexa, como complexa é normalmente a situação de facto de onde emerge o direito à indemnização, pressupondo, segundo as circunstâncias, a alegação de matéria de facto relacionada com o evento, a ilicitude, a conduta culposa ou uma situação coberta pela responsabilidade objectiva, os prejuízos e o nexo de causalidade adequada entre o evento e os danos. – Abrantes Geraldes, Temas da Reforma do Processo Civil, V.I, 2º Ed., Almedina, pág.205
[23] E são, mas de matéria que não é constitutiva (factos principais) do direito alegado pelo recorrido.
[24] Ac. do TRL de 19.12.2013, Tomé Gomes, processo 3004/08.1TJSB.L1-7
[25] Ónus da prova como critério de selecção de factos.
[26] Com a consequência de, não provados todos os factos que ao autor cabe provar, a acção soçobrar: ónus da prova como critério de decisão.
[27] Ac. ds RC de 21.04.2015, proc. 124/14.1TBFND-A.C1.
[28] Já afirmámos que não.
[29] Era assim no regime anterior ao CPC actual (2013), sendo que não se perscrutam motivos que impeçam transportar as regras então utilizadas, em vista à selecção de factos com relevo para a decisão, para o regime actual e no momento da sentença (as normas citadas pertencem ao CPC de Macau, em tudo iguais às que, no lugar paralelo, vigoraram no anterior CPC português):
(…)
«a matéria de facto que deve ser levada a qualquer das peças é a matéria relevante para a decisão da causa, segundo as várias soluções plausíveis da questão de direito, como resulta do disposto no artº429ºnº1 do CPC.
Para se saber qual é a matéria de facto relevante é evidentemente necessário proceder a um estudo do direito substantivo aplicável e conhecer as soluções que, na doutrina e na jurisprudência, sejam dadas a questões levantadas nos autos.
A consideração do direito substantivo aplicável ao caso tratado no processo é essencial para a condução das fases de pré-condensação e condensação.
(…)
Em terceiro lugar, a selecção da matéria de facto deve respeitar as regras de distribuição do ónus da prova.
A questão do ónus da prova deve ser equacionada em todas as fases do processo. É por via dele que o direito substantivo se introduz e atravessa nos actos processuais, nas fases anteriores à sentença.
A experiência ensina que a maioria das acções pode ser facilmente decidida simplesmente com apelo às regras de distribuição do ónus da prova, previstas no artigo 335º do C.C., e à sua conjugação com o resultado da decisão de facto.
E mesmo nos casos mais complexos, depois de superada, na sentença, a dificuldade da determinação de regime jurídico aplicável aos factos provados, coloca-se constantemente a questão do cumprimento, ou não, do ónus da prova, por parte do autor ou do réu, consoante esteja em causa o direito invocado pelo primeiro, ou excepções deduzidas pelo segundo.
Tendo em vista uma correcta decisão jurídica do pleito, é pois essencial que desde a fase da pré-condensação se tenha uma ideia clara sobre a quem cabe o ónus da prova e de quê.
O critério de distribuição do ónus da prova constante do disposto no artigo 335º do C.C., constitui a regra de ouro que deve orientar a selecção da matéria de facto relevante e a própria redacção das alíneas do Factos Provados e dos quesitos da Base Instrutória.
Assim, é na versão apresentada por quem está onerado com o respectivo ónus da prova que os factos devem ser levados àquelas peças. Pelo que os factos constitutivos do direito do autor devem ser dados como assentes ou levados à base instrutória na versão em que por este foram alegados, e os factos que servem de fundamento a excepções alegadas pelo réu deve ser levados às mesmas peças na versão por este alegada.» - Regras para a elaboração do Despacho Saneador (CPC de Macau), policopiados Centro Formação Jurídica e Judiciária de Macau, CCCarvalho.
[30] A coberto da Teoria da Norma de Rosemberg, critério identificativo do que sejam factos actos constitutivos, extintivos e impeditivos (art.º 342.º do CC): a repartição do ónus da prova processa-se de harmonia com a previsão (geral e abstracta) traçada na norma jurídica que serve de fundamento à pretensão de cada uma das partes. Ao autor caberá a prova dos factos que, segundo a norma jurídica substantiva aplicável, servem de pressuposto ao efeito jurídico por ele pretendido. Ou seja: incumbe-lhe o ónus de provar os factos correspondentes à situação de facto traçada na norma substantiva em que fundamenta a sua pretensão, ou seja, factos cuja verificação favorecem a respectiva pretensão, os pressupostos para a ocorrência do dever de indemnizar pela R. - Cfr. Varela, Antunes. Comentário ao acórdão do STJ de 22.10.81 in RLJ, anos 116 e 117, pág. 313 e segts / 377 e segts / 26 e segts / Reis Alberto. Código de Processo Civil Anotado, V. III, 4º ed., pág. 278.
[31] Proc.501/12.8TBCBC.G1
[32] O Acórdão da Relação de Lisboa de 18-04-2021 sintetiza no seu sumário as linhas orientadoras seguidas pela jurisprudência nesta matéria (também citado pelo Ac.de 27.06.2024 da RE, proc. 252/21.2T8FAR.E1):
«IV – os denominados juízos ou conclusões de facto situam-se numa zona intermédia ou campo intermédio entre os puros factos e as questões ou matéria de direito, encontrando-se incluídos na legislação como parte integrante ou constituinte da hipótese legal de várias normas jurídicas;
V - tais juízos ou conclusões de facto numas situações aproximam-se mais de uma verdadeira questão de facto, enquanto que noutros a proximidade é com uma questão de direito;
VI – pelo que, aquilo que é matéria de facto ou matéria de direito não é estanque ou fixo, mas antes volátil, dependendo dos termos em que a lide controvertida se apresenta ou modela, donde o mesmo juízo ou conclusão de facto pode ser, numa situação facto ou juízo de facto e, noutra, juízo de direito;
VII - devendo apenas terem-se como proibidos os juízos de facto conclusivos que impliquem e apreciem determinados acontecimentos à luz de uma norma jurídica, caso em que tal juízo de facto conclusivo contém em si a resposta a uma questão de direito, ou seja, possui um sentido normativo
[33] «No CPC anterior, o artigo 644.º, n.º 4, determinava que se desse como não escritas as respostas sobre questões de direito. Não era pacífico que esta regra também se aplicasse às respostas que encerrassem matéria conclusiva, como bem dá nota o Ac. do STJ, de 28-05 2015, embora se propendesse, como também ali é referido, a aceitar que «igual solução mereciam
as respostas sobre pontos que encerrassem matéria de natureza conclusiva, por serem idênticas as razões justificativas do regime estabelecido.».
Apesar do atual CPC não inserir norma com igual teor, é consensual na jurisprudência que o artigo 607.º, n.º 4, ao prescrever que «na fundamentação da sentença, o juiz declara quais os factos que julga provados (...)» se deve continuar a sancionar como não escrito o que seja matéria de direito e/ou com teor conclusivo.» - Ac.de 27.06.2024 da RE, proc. 252/21.2T8FAR.E1
[34] Em relação a outras testemunhas não se indicam as «passagens» concretas na gravação.
[35] Remete-se, a benefício deste item e na parte que releva, o que atrás se deixou referido a propósito da excepção da ilegitimidade.
[36] «Tendo prosseguido os autos, deve dizer-se, no entanto, que o tribunal a quo tipificou bem a questão a decidir na medida em que era importante analisar e decidir se estão preenchidos os pressupostos da responsabilidade civil por factos ilícitos (…).»
[37] O instituto da responsabilidade civil vem, hodiernamente, saindo das sua amarras tradicionais, servindo a tutela de outras situações para além daquelas que conservadoramente se consideravam tuteladas.
«Com efeito, além dos direitos subjectivos, existe um importante conjunto de outras posições activas concedidas por vários sectores do ordenamento jurídico e que estão acolhidas, designadamente, em determinadas disposições constitucionais, civis e criminais, cujo conteúdo oferece vantagens que, frustadas, são passiveis de gerar danos aos respectivos titulares. A protecção indemnizatória deve, assim, intervir como meio normal de tutela dessas situações jurídicas sempre que a sua substância material seja atingida , impedindo o titular de auferir as correspondentes utilidades e que lhe foram reservadas pelo ordenamento jurídico, visto estarem reunidos os fundamentos essenciais que desencadeiam os mecanismos de responsabilidade, isto é, substância de imputação e função de exclusão.
(…)
É o caso, por exemplo, da violação das expectativas jurídicas, a qual também pode justificar a defesa proporcionada pela ordem de responsabilidade (….). De igual modo, independentemente de obterem a nulidade dos actos simulados praticados pelo autor da sucessão com o intuito de os prejudicar (artigo 241.º, n.º2), as expectativas sucessórias dos herdeiros legitimários também podem ter sofrido prejuízos ressarcíveis pela disciplina aquiliana» – Rui Coutinho Ataíde, Direito da Responsabilidade Civil, Geslegal, pág.174
[38] Dissemos atrás:
Notar que, com o reconhecimento dessa propriedade não se pode repristinar o que invalidamente foi praticado na ausência de legitimidade substantiva para o efeito e apesar do disposto no art.1288.º do CC.
Notar também que o reconhecimento foi feito com base na invocação da usucapião e não com base na sucessão por morte, dado que afasta a invocação do disposto no art. 1317.º, al.b) do CC.
Mas mesmo que se relevasse este preceito, só com aceitação da herança pelos herdeiros se provocaria o efeito retroactivo ao momento da abertura da sucessão de acordo com o nº2 do art.2050.º do CC.
Nesse caso, a FF não teria, igualmente, legitimidade substantiva para, sozinha, outorgar a procuração citada (vide facto constante no ponto 6).
[39] Direito Civil, Reais, 5º ed., Coimbra Editora, pág.300.
[40] Op. cit., pág.391.
[41] Direito das Obrigações, 6ª edição, a pá. 531