PROPRIEDADE INTELECTUAL
RECURSO
CADUCIDADE
PRAZO
CONTAGEM
Sumário

I. O lapso temporal de dois meses previsto no art.º 41.º do Código da Propriedade Industrial corresponde a um prazo de caducidade e não de natureza processual;
II. Por força do estabelecido no art.º 296.º do Código Civil, são aplicáveis à contagem dos prazos de caducidade as regras constantes do art.º 279.º do mesmo encadeado normativo;
III. De acordo com este preceito, contando-se um prazo em meses, o mesmo «termina às 24 horas do dia que corresponda, dentro da última semana, mês ou ano, a essa data»;
IV. Inserindo-se essa data no período de férias judiciais, há que aplicar o estatuído na al. c) do referido art.º 279.º do Código Civil que manda transferir esse momento temporal para o primeiro dia útil posterior a tais férias.

Texto Integral

Acordam na Secção de Propriedade Intelectual, Concorrência, Regulação e Supervisão do Tribunal da Relação de Lisboa:
*
I. RELATÓRIO                   
VILKAS BYME, LDA., com os sinais identificativos constantes dos autos, interpôs recurso judicial do despacho do Instituto Nacional da Propriedade Industrial (doravante INPI), proferido em 31 Maio de 2023, que anulou parcialmente o registo da Marca Nacional Nº 626.858 “MCLASSIC” para os serviços das classes 35 e 37, sendo Recorrida a sociedade BAYERISCHE MOTOREN WERKE AKTIENGESELLSCHAFT, neles melhor identificada.
O Tribunal «a quo» descreveu os contornos dos autos em que se gerou o presente recurso e suas principais ocorrências processuais até à sentença nos seguintes termos:
VILKAS BYME, LDA., empresa comercial portuguesa com sede na Zona Industrial da Adua, Lote 25, 7050-001 Montemor-o-Novo, Portugal, veio, ao abrigo do disposto nos termos da alínea b) do art.38º, nº 1 do Art.º 39º, nº 1 do Art.º 40º e Art.º 41º, todos do Código da Propriedade Industrial (doravante CPI), interpor o presente recurso judicial do despacho do Instituto Nacional da Propriedade Industrial (doravante INPI), proferido em 31 Maio de 2023 que anulou parcialmente o registo da Marca Nacional Nº 626.858 “MCLASSIC” para os serviços das classes 35 e 37 com fundamento em imitação das marcas da recorrida BAYERISCHE MOTOREN WERKE AKTIENGESELLSCHAFT, sociedade comercial alemã com sede em Petuelring 130, 80809 München, Alemanha, doravante Recorrida ou BMW.
Notificada, a Recorrida requereu a sua absolvição com fundamento no facto do recurso ter sido interposto fora de prazo, defendendo ainda a manutenção do despacho proferido pelo INPI por considerar existir imitação e risco de confusão das marcas da Recorrente com as suas marcas.

Foi proferida sentença que decretou:
Nos termos das disposições legais indicadas e pelos fundamentos supra consignados, julga-se procedente o recurso apresentado pela Recorrente VILKAS BYME, LDA, e revoga-se o despacho proferido pelo Instituto Nacional da Propriedade Industrial que recusou parcialmente o registo da Marca Nacional Nº 626.858 “MCLASSIC” para os serviços das classes 35 e 37.

É dessa sentença que vem o presente recurso interposto por BAYERISCHE MOTOREN WERKE AKTIENGESELLSCHAFT, LDA, que alegou e apresentou as seguintes conclusões:
I. Em 09.07.2019, a Apelada apresentou o pedido de registo da marca nacional n.º 626858 MCLASSIC, o qual foi concedido pelo INPI em20.11.2019 para assinalar serviços nas classes 35 e 37 da Classificação de Nice.
II. Em 06.12.2021, a Apelante apresentou junto do INPI um pedido de anulação do registo da marca nacional n.º 626858 MCLASSIC, com fundamento na imitação e risco de confusão com as suas marcas prioritárias, designadamente, a Marca da União Europeia (nominativa)n.º 007134158 M, requerida em 05.08.2008 e registada em 24.11.2009, na classe 12, a Marca da União Europeia n.º 18001234, requerida em 18.12.2018 e registada em 20.01.2021, na classe 12, a Marca de registo internacional n.º 1456163, com designação da União Europeia, registada em 17.01.2019,com reivindicação de prioridade de 09.08.2018, na classe 12, a Marcada União Europeia n.º 18001222 , requerida em 18.12.2018 e registada em 20.01.2021, na classe 12, a Marca da União Europeia n.º 4398129 M2, requerida em 20.04.2005 e registada em 24.05.2006, na classe 37, a Marca da União Europeia n.º 4670436 M3, requerida em06.10.2005 e registada em 06.10.2006, na classe 37, a Marca da União Europeia n.º 4670378 M4, requerida em 06.10.2005 e registada em06.10.2006, na classe 37, a Marca da União Europeia n.º 4670287 M5,requerida em 06.10.2005 e registada em 06.10.2006, na classe 37, a Marca da União Europeia n.º 4670361 M6, requerida em 06.10.2005 e registada em 06.10.2006, na classe 37, a Marca da União Europeia n.º017955439 M Power, requerida em 14.09.2018 e registada em14.02.2019, na classe 37, e a Marca da União Europeia n.º 018002792M Town, requerida em 20.12.2018 e registada em 17.01.2021, na classe 35.
III. O pedido de anulação intentado pela BMW foi julgado procedente e, por despacho datado de 31.05.2023, o INPI anulou o registo da marca nacional n.º 626858 MCLASSIC para todos os respetivos serviços nas classes 35 e 37.
IV. Naquele despacho, o INPI considerou – e bem – que se encontram preenchidos in casu os requisitos do conceito de imitação legal demarca, pois as marcas da Apelante beneficiam de uma melhor prioridade, os produtos e os serviços em comparação são afins e as marcas M da BMW e MCLASSIC da Apelada são semelhantes e, por isso, confundíveis para os consumidores.
V. Ainda naquele despacho, o INPI reconheceu o prestígio das marcas M da BMW e concluiu que a coexistência da marca nacional n.º 626858 MCLASSIC com aquelas marcas M poderia dar origem a um aproveitamento indevido e a prejuízos na imagem da Apelante.
VI. O despacho do INPI foi publicado no Boletim da Propriedade Industrial em 07.06.2023.
VII. Não obstante o hiato temporal decorrido, a Apelada interpôs o presente recurso judicial em 20.09.2023.
VIII. Em 15.12.2023, a Apelante apresentou resposta ao recurso, na qual invocou que à data da interposição do recurso já havia decorrido o prazo de 2 (dois) meses previsto no art.º 41.º do Código da Propriedade Industrial (CPI), devendo o recurso ser julgado extemporâneo por verificação da exceção perentória de caducidade.
IX. Acresce que, ao nível substantivo, a Apelante demonstrou que as alegações da Apelada eram manifestamente desprovidas de qualquer fundamento, pelo que era manifesta a falta de mérito do recurso judicial interposto para o TPI.
X. Porém, surpreendentemente, por sentença datada de 17.09.2024, o TPI julgou o recurso tempestivo e totalmente procedente, tendo revogado o despacho do INPI.
XI. A Apelante discorda e não pode concordar com qualquer dos fundamentos daquela sentença, a qual, no seu entendimento, consubstancia uma decisão ilegal e formal e materialmente injusta, motivo pelo qual o presente recurso de apelação é interposto.
XII. Ora, é assente que o prazo de dois meses para a interposição do recurso das decisões do INPI para o Tribunal da Propriedade Intelectual, previsto no artigo 41.º do CPI, é um prazo de caducidade e, por isso, de natureza substantiva, cujo regime se encontra previsto nos artigos 298.º, n.ºs 2 e 296.º do Código Civil.
XIII. É entendimento pacífico na jurisprudência do próprio Tribunal da Propriedade Intelectual, bem como das instâncias superiores, incluindo do Tribunal da Relação de Lisboa e do Supremo Tribunal de Justiça, que, ao prazo de interposição do recurso judicial dos despachos do INPI se aplicam as regras constantes do artigo 279.º do Código Civil, nomeadamente as constantes das alíneas e) e f).
XIV. Tendo o despacho de anulação recorrido sido publicado no Boletim da Propriedade Industrial em 07.06.2023 – facto incontroverso dado que se encontra documentado no processo administrativo instrutor do INPI e admitido pela Recorrente, ora Apelada, (vide artigo 1.º das alegações de recurso) – o prazo de dois meses para a interposição do recurso judicial terminou em 07.08.2023.
XV. Porém, por se tratar de dia de férias judiciais em que os tribunais se encontravam encerrados, aquele prazo transferiu-se para o primeiro dia útil imediatamente a seguir à reabertura dos tribunais, isto é, para dia 01.09.2023, o último dia do prazo de que a Apelada dispunha para interpor o recurso judicial junto do TPI.
XVI. Porém apenas o veio a fazer no dia 20.09.2023, isto é, dezanove dias depois de esgotado o prazo.
XVII. Na sentença recorrida, o Tribunal a quo qualificou e tratou erradamente o prazo de caducidade previsto no artigo 41.º CPI como um prazo de natureza meramente processual, que suspende em férias judiciais, o que não é manifestamente o caso.
XVIII. Nesta conformidade, e em face do exposto, é absolutamente evidente que o recurso judicial interposto pela Apelada junto do TPI em20.09.2023 é manifestamente intempestivo, extemporâneo e legalmente inadmissível, devendo a sentença recorrida ser revogada e substituída por outra que não admita o recurso apresentado no TPI contra o despacho do INPI de 31.05.2023 e publicado em 07.06.2023por manifestamente extemporâneo, devendo, assim, ser mantido na íntegra o despacho recorrido do INPI que anulou o registo da marca nacional n.º 626858 M CLASSIC, o que se requer com todas as consequências legais.
 Sem prescindir,
XIX. Ao nível substantivo, não merece censura a sentença recorrida na parte em que reconheceu a prioridade dos registos de marca M da Apelante, bem como a identidade e afinidade entre os produtos e os serviços assinalados pelas marcas em confronto.
XX. Porém, conforme acima referido, na sentença recorrida o TPI assumiu uma posição diametralmente oposta ao INPI, e considerou erradamente que o registo da marca nacional n.º 626858 M CLASSIC não seria semelhante nem confundível com as marcas prioritárias M da BMW, inexistindo risco de confusão para o consumidor.
XXI. Na sentença recorrida, o TPI considerou também, não menos erradamente, que as marcas da Apelante não seriam marcas de prestígio e que, em qualquer caso, não teria sido demonstrado que o registo da marca M CLASSIC poderia dar origem a um aproveitamento indevido e a prejuízos na imagem da Apelante.
XXII. Na sentença recorrida, o TPI entendeu essencialmente que M CLASSIC não seria semelhante nem confundível com as marcas M da Apelante, uma vez que se trata de (i) uma marca nominava, (ii) composta por dois elementos verbais (iii) sem que nenhum desses elementos se desassocie ou assuma preponderância sobre o outro.
XXIII. Não se concebem, porém, os argumentos do Tribunal a quo, pois também as marcas M da Apelante reúnem aquelas características. Senão vejamos.
 XXIV A Marca da EU n.º 00713458 M, a Marca da EU n.º 017955439 MPOWER e a Marca da EU n.º 018002792 M TOWN da Apelante são todas marcas nominativas, tal como a marca em crise.
XXV. A Marca da EU n.º 017955439 M POWER e a Marca da EU n.º 018002792 M TOWN são também, tal como a marca em crise, compostas por dois elementos verbais.
XXVI. Acresce que é absolutamente falso que em MCLASSIC nenhum desses elementos se desassocie ou assuma preponderância sobre o outro, e a invocação deste argumento demonstra um profundo desconhecimento em matéria de direito de marcas.
XXVII. Com efeito, em MCLASSIC é a letra M que assume destaque gráfico,pois ocupa o primeiro lugar na composição da marca, sendo aquela que irá ser imediatamente lida e percebida pelos consumidores.
XXVIII. Em MCLASSIC é também a letra M que assume destaque fonético, pois é pronunciada de forma isolada como [éme], desassociando-se foneticamente da expressão CLASSIC que se lê como uma só ao contrário de M.
XXIX. Por sua vez, o elemento verbal CLASSIC, que significa “clássico” em português, é uma indicação muitíssimo banal e meramente genérica, que se refere tanto às características dos serviços assinalados pela Apelada como aos produtos objeto dos serviços em causa, tendo tem pouquíssima distintividade para assinalar tais serviços, tal como decorre do disposto nos artigos 208.º e 209.º, n.º 1, alínea c), ambos do CPI.
XXX. É evidente que a letra M é o elemento predominante e distintivo da marca nacional n.º 626858 MCLASSIC e não se entende como pode viro Tribunal a quo defender que CLASSIC não se desassocia de M e tema mesma preponderância de M!
XXXI. Em MCLASSIC, M é uma letra isolada que surge antes da expressão CLASSIC, que não faz parte do significado desta e que se lê autonomamente como [éme].
XXXII. Por sua vez, nas marcas M da Apelante, também M é o elemento claramente predominante e o denominador comum a todas as marcas da BMW invocadas: a Família das Marcas M.
XXXIII. M é o único elemento da marca da União Europeia n.º 7134158, M é o elemento que se destaca em primeiro lugar na composição de todas as marcas M supra invocadas, por exemplo, M2, M3, M4, M5, M6, M power.
XXXIV. Ora, é doutrinal e jurisprudencialmente incontroverso que a comparação das marcas deve centrar-se nos respetivos elementos predominantes, os quais são exatamente o mesmo M, e a sentença recorrida é absolutamente omissa quanto a esta questão fulcral.
XXXV. O elemento distintivo e predominante da marca nacional n.º 626858 – M – reproduz totalmente a Marca da União Europeia n.º 7134158M e o elemento distintivo das demais marcas M da BMW invocadas na ação de anulação.
XXXVI. M é o elemento que o consumidor retém na memória das marcas da BMW e M é o elemento da marca nacional n.º 626858 que apela a atenção do consumidor como única indicação de proveniência comercial.
XXXVII. Assim face à afinidade e à identidade entre os produtos e serviços assinalados pelas marcas M da BMW, aliada à reprodução do elemento distintivo e predominante M, dúvidas não restam de que os consumidores serão inevitavelmente induzidos em erro e, quando confrontados com os serviços assinalados com MCLASSIC acreditarão que aqueles têm a mesma proveniência que os serviços assinalados com as marcas M da BMW ou que estes provêm de uma entidade com alguma relação com a BMW.
XXXVIII. Por outro lado, são irrelevantes para este efeito as justificações da sentença recorrida quanto ao facto de se todas as marcas compostas por um “M inicial” fossem rejeitadas, seria distorcida a liberdade concorrencial.
XXXIX. Da mesma forma, é errado o raciocínio do Tribunal a quo relativamente ao facto de estarmos perante um público consumidor mais atento e, nessa medida, acima da média.
XL. O Tribunal a quo não indica qualquer fundamento para o seu raciocínio, porém é evidente que a grande maioria dos consumidores compra veículos automóveis e recorre aos respetivos serviços de assistência, reparação, limpeza, com uma frequência diária, pelo que o público relevante que é o consumidor médio.
XLI. Nesta conformidade e em face de tudo quanto se expôs, resulta demonstrada a verificação do último requisito do conceito de imitação de marca, constante da alínea c) do artigo 238.º do CPI, pelo que andou mal a sentença recorrida ao decidir como decidiu e a mesma não pode manter.
XLII. Importa, ainda, referir que o risco de confusão e associação resulta agravado pelo facto de a BMW ter uma verdadeira Família de Marcas M, relativamente à qual a sentença recorrida é totalmente omissa.
XLIII. Conforme se demonstrou, no caso em apreço é inquestionável que MCLASSIC apresenta, por si só, características – em particular, o elemento dominante comum M e o mesmíssimo método de composição – que a ligam automaticamente à Família de Marcas M da BMW.
XLIV. Aliás, a estratégia comercial da Apelada em matéria de marcas não é inocente e vai muito além da marca nacional n.º 626858 M CLASSIC, encontrando-se a mesma a agir no sentido de, à semelhança da BMW, criar uma Família de Marcas que imita a Família das Marcas M da BMW.
XLV. Com efeito, para além da marca nacional n.º 626858 M CLASSIC, a Apelada tentou obter proteção para outros registos de marca “M” junto do INPI, nomeadamente a Marca Nacional n.º 484254 MRACING, a Marca Nacional n.º 489392 M RACING e a Marca Nacional n.º 663114 M TECHNOLOGY.
XLVI. A Família de Marcas que a Apelada tentou construir apresenta – tal como em MCLASSIC – um denominador comum, que é o facto de todas elas serem compostas pela letra M, à exata semelhança da Família de Marcas M da BMW, precisamente para assinalar produtos e serviços idênticos e afins aos assinalados pelas marcas M da BMW.
XLVII. Sucede que, em virtude das (re)ações proactivamente movidas pela BMW, a Marca Nacional n.º 663114 M TECHNOLOGY foi recusada pelo INPI e, posteriormente, pelo TPI em 11.05.2023, a Marca Nacional n.º489392 M RACING aguarda prolação de decisão na ação de caducidade intentada pela BMW em 29.10.2021, e a Marca Nacional n.º 484254 M RACING foi anulada pelo INPI em 31.05.2023, estando pendente recurso de apelação tal como no caso sub iudice.
XLVIII. Por fim, merece, ainda, censura a sentença recorrida na parte em que concluiu que o prestígio que a Apelante goza é essencialmente relativamente à marca mãe “BMW” e mesmo quando se trate de prestígio é necessário verificar-se o aproveitamento da marca de prestígio, o que não sucederia no caso.
XLIX. O prestígio das marcas M da Apelante na União Europeia foi reconhecido e declarado pelo INPI no despacho recorrido e não foi colocado em crise pela Apelada, não integrando o objeto do recurso interposto para o TPI.
L. Fica assim por entender, com que fundamento legal vem a sentença recorrida pronunciar-se sobre o prestígio das marcas da Apelante, sobretudo relativamente à suposta “marca mãe BMW” que não foi sequer invocada pela BMW na ação de anulação.
LI. Em todo o caso, é evidente que a marca M da BMW conta já com mais de 50 anos de história e tem vindo a ser extensiva e ininterruptamente usada na União Europeia sobretudo em relação produtos na classe 12, mas também em serviços relacionados, nas classes 35 e 37.
LII. A marca M é usada para distinguir os veículos da BMW integralmente desportivos ou nas gamas mais desportivas dos diversos modelos, munidos de peças que permitem uma performance elevada na condução diária, inspiradas no desporto motorizado, que cumprem elevados padrões de funcionalidade, design, qualidade e vida útil.
LIII. Os produtos e serviços assinalados pela marca M são caracterizados pela sua qualidade superior, encontrando-se subjacente um rigoroso processo de desenvolvimento e produção e exaustivos testes de qualidade.
LIV. A notoriedade e o prestígio das marcas M da BMW tem vindo a ser constantemente reconhecidos por diversos Institutos de propriedade industrial de vários países da União Europeia, incluindo o Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI) e o Instituto da Propriedade Intelectual da União Europeia (EUIPO), sendo certo que estas múltiplas decisões foram completamente ignoradas de forma não fundamentada pelo Tribunal a quo.
LV. A marca nacional n.º 626858 é de tal forma semelhante às umas marcas M da BMW, anteriormente registadas, as quais gozam de prestígio em Portugal e na União Europeia, que o uso daquela marca pela Apelada retira, evidentemente, partido indevido do carácter distintivo ou do prestígio das marcas M da BMW, sendo apta a prejudicá-los, tendo aplicação o disposto no artigo 235.º do CPI.
LVI. O uso de MCLASSIC em serviços de negócios comerciais, serviços de reparação, manutenção, limpeza e serviços grossistas e retalhistas, todos referentes a veículos automóveis e suas peças componentes e acessórios, despoleta a transferência da imagem e características que o consumidor associa a M para aquela e, desse modo, a Apelada beneficiará injustificadamente da sua função publicitária, sem qualquer compensação financeira para a BMW.
LVII. Os consumidores procurarão os serviços da Apelada por referência aos serviços assinalados pelas marcas M, relacionando-os com a BMW, pelo que o uso de MCLASSIC reduz o carácter distintivo de M já que é apto a comprometer a associação imediata e intuitiva aos produtos e serviços da BMW.
LVIII. Tal prejuízo é tanto mais provável quanto o uso do sinal MCLASSIC poderá transmitir aos demais concorrentes no mercado que podem usar um sinal identicamente semelhante às marcas M, resultando num efeito cascata.
LIX. Em face do exposto, mesmo que se considerasse que não se têm por verificados os requisitos do conceito legal de imitação de marca in casu, o que não se concede, ao analisar todos os elementos de facto supra referidos, teria necessariamente de se concluir que andou bem o INPI ao decidir como decidiu, ao anular o registo da marca nacional n.º 626858, também por verificação dos requisitos do artigo 235.º do CPI.
LX. Em face do exposto, e por todos os motivos aduzidos, deve a sentença recorrida ser revogada e proferido Acórdão que confirme o despacho do INPI de 31.05.2023 que cancelou o registo da marca nacional n.º 626858 MCLASSIC, com todas as consequências legais.
Nestes termos, e nos mais de Direito, deve o presente recurso de Apelação ser julgado procedente e, consequentemente, deve a sentença recorrida ser revogada e substituída por um Acórdão do Tribunal ad quem que:
a. reconheça e declare a extemporaneidade do recurso interposto em 20.09.2023 contra o despacho do INPI de 31.05.2023 e publicado em 07.06.2023, e que, consequentemente, não admita esse recurso e mantenha na íntegra o despacho do INPI que anulou o registo da marca nacional n.º 626858 M CLASSIC; Subsidiariamente,
b. julgue totalmente procedente o recurso, revogue a sentença recorrida e confirme a manutenção do despacho do INPI de 31.05.2023, anulando o registo da marca nacional n.º 626858 MCLASSIC, com todas as consequências legais.

VILKAS BYME, LDA. respondeu às alegações de recurso concluindo:
Em suma, a conclusão a extrair do que procede é pois que não deve ser anulado o registo da Marca Nacional da Apelada.
Como ficou exposto neste articulado, o conceito de imitação estipulado no art.º 238º no CPI não se verifica no caso em apreço.
Ou seja, como ficou demonstrado, gráfica e foneticamente as marcas em causa são completamente distintas.
As marcas da Apelante da forma como são expostas ao público não deixam qualquer margem para dúvida que estão sempre associadas à BMW.
Os documentos juntos nas contra-alegações pela Apelante são suficientes para demonstrar isso.
Consequentemente, não se afigura existir qualquer risco de associação das marcas.
Também resulta que a expressão letra “M” não é uma marca de prestígio.
Os requisitos exigidos pelo art.º 235º do CPI para consideramos estarmos perante uma marca de prestígio não se verificam.
Não foi provado que tenha havido um aproveitamento da marca de prestígio por parte da marca da Apelada.
Não foi provado que durante estes anos da coexistência das marcas no mercado, de alguma forma, a marca da Apelada tenha prejudicado o prestígio ou reputação das marcas da Apelante.
Desde modo, face ao exposto é a douta Sentença posta em crise merecedora de confirmação superior.
NESTES TERMOS, e pelo mais que o Venerando Tribunal se dignar suprir, espera a Apelada que seja negado provimento ao recurso confirmando-se a Sentença recorrida e, em consequência, seja revogado o despacho do INPI que anulou o registo de marca nacional nº 626.858 – MCLASSIC, para assinalar serviços das classes 35 e 37.

Cumprido o disposto na 2.ª parte do n.º 2 do art.º 657.º do Código de Processo Civil, cumpre apreciar e decidir.
Dado que o objecto do recurso é delimitado pelas conclusões dos recorrentes (cf. arts. 635.º, n.º 4, e 639.º, n.º 1, ambos do Código de Processo Civil) – sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso (cf. art.º 608.º, n.º 2, por remissão do art.º 663.º, n.º 2, do mesmo Código) – são as seguintes as questões a avaliar:
1. Deve ser reconhecida e declarada a extemporaneidade do recurso interposto em 20.09.2023 contra o despacho do INPI de 31.05.2023 e publicado em 07.06.2023?
2. No caso em apreço, estão verificados os requisitos do conceito legal de imitação de marca?
3. Os factos provados apontam para a verificação dos requisitos enunciados no artigo 235.º do Código da Propriedade Industrial?

II. FUNDAMENTAÇÃO
Fundamentação de facto
Vem provado que:
1. Em 9 de Julho de 2019, a Recorrente apresentou, junto do INPI, o pedido de registo do sinal “MCLASSIC” para assinalar os seguintes serviços das seguintes classes da Classificação Internacional de produtos e de serviços do Acordo de Nice de 1957, entretanto revisto e modificado: Classe 35: serviços de representação de negócios comerciais; serviços de venda a retalho ou a grosso de peças e acessórios para veículos; e b. Classe 37: assistência em caso de avaria de veículos [reparação]; automóveis (conservação e reparação de -); automóveis (lavagem de -); automóveis (limpeza de ); avaria de veículos (assistência em caso de -) [reparação]; estações de serviço; estofos (reparação de -); lavagem de automóveis; lavagem de veículos; limpeza de automóveis; lubrificação de veículos; pneus (rechapagem ou recauchutagem de -); pneus (vulcanização de -) [reparação]; recauchutagem de pneus; rechapagem de pneus; refrigeração (instalação e reparação de aparelhos de -); renovação de motores usados ou parcialmente destruídos; renovação de máquinas usadas ou parcialmente destruídas; tratamento contra a ferrugem; tratamento preventivo contra a ferrugem para veículos; veículos (assistência em caso de avaria de -) [reparação]; veículos (conservação de -); veículos (lavagem de -); veículos (limpeza de -); veículos (lubrificação de -); veículos (polimento de -); veículos (tratamento preventivo contra a ferrugem para -); vulcanização de pneus [reparação].
2. Ao pedido foi atribuído o n.º 626858, o qual foi publicado a páginas 14 do Boletim da Propriedade Industrial (a seguir, BPI) de 11.09.2019.
3. A páginas 35 do BPI de 13.09.2019, foi publicada a seguinte retificação: “Por ter sido publicado com inexatidão retifica-se: no campo (512) do BPI de 11/09/2019, deve ler-se: classe 35 - serviços de representação de negócios comerciais; serviços de venda a retalho ou a grosso de peças e acessórios para veículos. classe 37 - assistência em caso de avaria de veículos [reparação]; automóveis (conservação e reparação de -); automóveis (lavagem de -); automóveis (limpeza de -); avaria de veículos (assistência em caso de -) [reparação]; estações de serviço; estofos (reparação de -); lavagem de automóveis; lavagem de veículos ; limpeza de automóveis; lubrificação de veículos; pneus (rechapagem ou recauchutagem de -); pneus (vulcanização de ) [reparação]; recauchutagem de pneus; rechapagem de pneus; refrigeração (instalação e reparação de aparelhos de -); renovação de motores usados ou parcialmente destruídos; renovação de máquinas usadas ou parcialmente destruídas; tratamento contra a ferrugem; tratamento preventivo contra a ferrugem para veículos; veículos (assistência em caso de avaria de -) [reparação]; veículos (conservação de -); veículos (lavagem de -); veículos (limpeza de -); veículos (lubrificação de -); veículos (polimento de -); veículos (tratamento preventivo contra a ferrugem para -); vulcanização de pneus [reparação].”.
4. Em 20.11.2019, o INPI pronunciou-se no sentido da concessão da marca por considerar cumpridas todas as formalidades legais e inexistentes motivos absolutos e relativos de recusa, tendo o respetivo despacho sido publicado a páginas 71 do BPI de 25.11.2019.
5. A Recorrente é titular também da Marca Nacional nº 484.254  para assinalar :“Automóveis; amortecedores de suspensão para veículos; assentos de veículos; assentos de veículos (cintos de segurança para -); automóveis (chassis para -); automóveis (carroçarias para -); chassis de veículos; eléctricos (veículos -); motores para veículos terrestres” - produtos protegidos pela Classe 12, “Automobilistas (vestuário para -); barretes (bonés); blusas; bonés; botas; calçado; calças; camisas; camisetas; casacos; combinação (roupa interior); parkas; t-shirts; uniformes” - produtos protegidos pela Classe 25, “Actualização de documentação publicitária; afixação de cartazes; agências de publicidade; aluguer de espaços publicitários; aluguer de material publicitário; anúncios publicitários (difusão de -); assessores (serviços de -) para a organização e a direcção de negócios; demonstração de produtos; difusão de material publicitário (folhetos, prospectos, impressos, amostras); documentos (reprodução de -); estudo de mercados; patrocínios (angariação de -); públicas (relações -); publicidade”- serviços protegidos pela Classe 35, E “Competições desportivas (organização de -); livros (publicação de -); livros (publicação de -)” - serviços protegidos pela Classe 41;
6. É também titular da Marca Nacional nº 489.392 “MRACING” para assinalar: “Afixação de cartazes; agências de publicidade; aluguer de espaços publicitários; aluguer de material publicitário; aluguer de tempo para publicidade nos meios de comunicação; serviços de assessores para a direcção de negócios; demonstração de produtos; difusão de anúncios publicitários; reprodução de documentos; estudos de mercados; angariação de patrocinadores; publicidade” - serviços protegidos pela Classe 35.
7. Em 06.12.2021, Bayerische Motoren Werke Aktiengesellschaft a Recorrida apresentou junto do INPI um pedido de anulação do registo da marca nacional n.º 626858 M CLASSIC, com fundamento na imitação e risco de confusão com as suas marcas prioritárias, a seguir identificadas:
8. Marca da União Europeia (nominativa) n.º 007134158 «M», requerida em 05.08.2008 e registada em 24.11.2009, para assinalar automóveis e peças para os mesmos; acessórios para veículos automóveis, incluídos na classe 12;
9. Marca da União Europeia n.º 18001234  , requerida em 18.12.2018 e registada em 20.01.2021, para assinalar, entre outros, veículos; aparelhos de locomoção por terra, por ar ou por água; motorizações, incluindo motores, para veículos terrestres; componentes e acessórios de veículos, assim como rodas, pneus e lagartas para veículos, na classe 12;
10. Marca de registo internacional n.º 1456163    , com designação da União Europeia, registada em 17.01.2019, com reivindicação de prioridade de 09.08.2018, e que assinala “vehicles and conveyances; powertrains, including engines and motors, for land vehicles; parts and fittings for vehicles as well as wheels and tyres, and continuous tracks for vehicles, hub caps”, na classe 12;
11. 8.É ainda titular de vários registos de marcas contendo a letra “M”:
12. Marca da União Europeia n.º 18001222 , requerida em 18.12.2018 e registada em 20.01.2021, para assinalar, entre outros, veículos; aparelhos de locomoção por terra, por ar ou por água; motorizações, incluindo motores, para veículos terrestres; componentes e acessórios de veículos, assim como rodas, pneus e lagartas para veículos, na classe 12;
13. Marca da União Europeia n.º 4398129 «M2», requerida em 20.04.2005 e registada em 24.05.2006, para assinalar, entre outros, Reparação e manutenção de automóveis e seus acessórios, na classe 37;
14. Marca da União Europeia n.º 4670436 «M3», requerida em 06.10.2005 e registada em 06.10.2006, para assinalar, entre outros, Reparação e manutenção de automóveis e seus acessórios, na classe 37;
15. Marca da União Europeia n.º 4670378 «M4», requerida e em 06.10.2005 e registada em 06.10.2006, para assinalar, entre outros, Reparação e manutenção de automóveis e seus acessórios, na classe 37;
16. Marca da União Europeia n.º 4670287 «M5», requerida em 06.10.2005 e registada em 06.10.2006, para assinalar, entre outros, Reparação e manutenção de automóveis e seus acessórios, na classe 37; a. Marca da União Europeia n.º 4670361 «M6» requerida em 06.10.2005 e registada em 06.10.2006, para assinalar, entre outros, Reparação e manutenção de automóveis e seus acessórios, na classe 37;
17. Marca da União Europeia n.º 017955439 M Power, requerida em 14.09.2018 e registada em 14.02.2019, para assinalar, entre outros, Trabalhos de instalação, limpeza, reparação e manutenção de veículos e meios de transporte, componentes e acessórios para veículos, rodas, pneus, motores, dínamos para veículos terrestres, filtros para motores e máquinas, filtros de ar, filtros de óleo, sistemas, tubos e panelas de escape, catalisadores, motores de arranque, turbocompressores, radiadores de refrigeração para motores, dispositivos de comando para motores e máquinas, bombas, compressores e ventiladores, robôs, geradores de eletricidade, máquinas distribuidoras, aparelhos para mudanças e aparelhos de transporte; Trabalhos de instalação, limpeza, reparação e manutenção de aparelhos de navegação, de orientação, de localização, de seguimento e de cartografia, instrumentos, dispositivos e reguladores de medida, de deteção e de monitorização, aparelhos de ensino e simuladores, sistemas de iluminação e refletores de luz, aparelhos e instalações de aquecimento, de ventilação, de climatização e de purificação do ar, sistemas de tratamento do ar; Consultadoria e informações relacionadas com os serviços atrás referidos, incluídos nesta classe, na classe 37;
18. Marca da União Europeia n.º 018002792 M Town, requerida em 20.12.2018 e registada em 17.01.2021, para assinalar, entre outros, Serviços de comércio retalhista e grossista de veículos e respetivos componentes e acessórios, lacas e vernizes, produtos de pintura com ação conservante, óleos essenciais e extratos aromáticos, ambientadores, produtos para a limpeza de veículos, produtos para limpeza e polimento de couro, combustíveis e matérias de iluminação, aditivos para combustíveis, lubrificantes, assim como gorduras industriais, ceras e fluidos, bombas, compressores e ventiladores, geradores de eletricidade; Serviços de assistência, gestão e administração de negócios, na classe 35.
19. Em consequência do pedido de anulação e por despacho de 31 de maio de 2023, publicado no Boletim da Propriedade Industrial nº 110/2023, editado em 7 de junho de 2023, o Instituto Nacional da Propriedade Industrial (doravante INPI), anulou parcialmente o registo da Marca Nacional Nº 626.858 “MCLASSIC” para os serviços das classes 35 e 37.
20. A Recorrente interpôs o presente recurso em 20.09.2023.
21. As marcas “M” da BMW da Recorrida têm mais de 40 anos de história para assinalar sobretudo produtos da classe 12, mas também serviços das classes 35 e 37 da referida Classificação e têm vindo a ser extensiva e ininterruptamente usadas na União Europeia para distinguir os veículos da BMW “integralmente desportivos ou nas gamas mais desportivas dos diversos modelos, munidos de peças que permitem uma performance elevada na condução diária, inspiradas no desporto motorizado, que cumprem elevados padrões de funcionalidade, design, qualidade e vida útil”;
22. A Marca Nacional Nº 626.858 “MCLASSIC” titularidade da Recorrente coincide no mercado desde Novembro de 2019 com as várias marcas da Requerente do pedido de anulação que contêm também a letra M.
23. A MCLASSIC é uma marca da empresa Vilkas, especializada no restauro e personalização de veículos clássicos e que presta serviços de restauração em veículos de marca, devidamente autorizado pelos titulares das mesmas.
24. A BMW é uma empresa mundialmente conhecida e um dos maiores fabricantes de veículos automóveis, motociclos e suas peças e acessórios, prestando os respetivos serviços de manutenção e reparação.

Fundamentação de Direito
1. Deve ser reconhecida e declarada a extemporaneidade do recurso interposto em 20.09.2023 contra o despacho do INPI de 31.05.2023 e publicado em 07.06.2023?
A questão suscitada no recurso e agora apreciada centra-se nos factos provados sob os números 19 e 20, com o seguinte conteúdo:
19. Em consequência do pedido de anulação e por despacho de 31 de maio de 2023, publicado no Boletim da Propriedade Industrial nº 110/2023, editado em 7 de junho de 2023, o Instituto Nacional da Propriedade Industrial (doravante INPI), anulou parcialmente o registo da Marca Nacional Nº 626.858 “MCLASSIC” para os serviços das classes 35 e 37.
20. A Recorrente interpôs o presente recurso em 20.09.2023.

As normas relevantes e situadas no epicentro da abordagem da problemática suscitada são os arts. 38.º e 41.º do Código da Propriedade Industrial, que têm os seguintes conteúdos:
Artigo 38.º
Decisões que admitem recurso
Cabe recurso, de plena jurisdição, para o tribunal competente das decisões do INPI, I. P.:
a) Que concedam ou recusem direitos de propriedade industrial;
b) Relativas a transmissões, licenças, declarações de caducidade, declarações de nulidade e anulações ou a quaisquer outros atos que afetem, modifiquem ou extingam direitos de propriedade industrial.

Artigo 41.º
Prazo
O recurso deve ser interposto no prazo de dois meses a contar da publicação no Boletim da Propriedade Industrial das decisões previstas no artigo 38.º, da decisão final, de manutenção ou revogação, proferida ao abrigo do artigo 22.º, ou da data da emissão das respetivas certidões, pedidas pelo recorrente, quando forem anteriores.

Resultam da subsunção dos factos a estas normas duas conclusões in itinere, na senda da resolução da problemática proposta: a) a decisão do INPI de 31 de Maio de 2023 podia ser objecto de recurso de plena jurisdição para o tribunal competente e b) tal recurso tinha que ser interposto «no prazo de dois meses a contar da publicação no Boletim da Propriedade Industrial».
Emerge, de imediato, desta última noção, quanto à contagem do prazo referido, corresponder ao momento inicial de tal cômputo o dia 7 de Junho de 2023.
Quanto à definição do seu termo final, verifica-se, face ao conteúdo da decisão criticada em sede de recurso, que a questão de fundo se centra mais na definição da adequada mecânica da contagem do que, propriamente, na fixação da essência ou natureza técnica desse prazo, já que o próprio Tribunal «a quo» admitiu, na decisão impugnada, corresponder o mesmo a um lapso temporal de caducidade e não de natureza processual ao referir: «Também não se põe em causa que esse prazo seja de caducidade e, por isso, de natureza substantiva, estando sujeito ao regime dos artigos 298.º, n.ºs 2 e 296.º do Código Civil».
 Teve razão ao assim apontar, porquanto o referido prazo de dois meses se reporta não a um período de tempo atribuído para o exercício de faculdades e direitos num quadro intra-processual, ou seja, para o exercício de faculdades definidas num encadeado de normas de Direito adjectivo, mas a um lapso temporal de preparação de uma vera acção, sob a denominação de «recurso» (mas de plena jurisdição), e consequente activação de direitos materiais, mais concretamente, período relativo à exercitação de um determinado direito que tem um certo prazo para ser concretizado. Sob um tal contexto, estamos diante de um insofismável prazo de caducidade.
Por força do estabelecido no art.º 296.º do Código Civil, são aplicáveis à contagem dos prazos de caducidade «as regras constantes do art.º 279.º» do mesmo encadeado normativo.
Este artigo contém critérios claros e que dispensavam o debate que chegou a este Tribunal de recurso.
Com efeito, a al. c) do referido artigo é muito claro a estabelecer que, contando-se um prazo em meses, o mesmo «termina às 24 horas do dia que corresponda, dentro da última semana, mês ou ano, a essa data».
Ora, o dia correspondente ao do fim do prazo de caducidade de dois meses iniciado em 7 de Junho de 2023 é, inquestionavelmente, à luz da descrita arquitectura legal, 7 de Agosto de 2023.
Inserindo-se essa data no período de férias judiciais (face ao disposto no art.º 28.º da Lei Da Organização Do Sistema Judiciário aprovada pela Lei n.º 62/2013, de 26 de Agosto), havia que aplicar o estatuído na al. c) do referido art.º 279.º do Código Civil que regula nos seguintes termos:
e) O prazo que termine em domingo ou dia feriado transfere-se para o primeiro dia útil; aos domingos e dias feriados são equiparadas as férias judiciais, se o acto sujeito a prazo tiver de ser praticado em juízo.

É muito claro, a esta luz que, terminando o prazo em 7 de Agosto de 2023, data inserida em período de férias judiciais, o referido termo final transferiu-se para o primeiro «dia útil» (leia-se, aqui, o primeiro dia posterior às férias judiciais, em que o acto pudesse ser praticado). Tal dia corresponde a 1 de Setembro de 2023. Nesta data terminou, pois, o prazo de dois meses definido no art.º 41.º do Código da Propriedade Industrial.
Aqui chegados, sabendo nós que o recurso previsto nesse artigo foi interposto em 20.09.2023, torna-se manifesta e segura a extemporaneidade da impugnação judicial deduzida em primeira instância e que motivou a prolação da decisão jurisdicional criticada nestes autos.
Impõe-se, pois, responder afirmativamente à questão ora apreciada.
Tal torna mandatória a declaração de procedência do presente recurso, ora analisado, o que se concretizará na parte dispositiva desta decisão.
 
2. No caso em apreço, estão verificados os requisitos do conceito legal de imitação de marca?
Face ao apreciado e decidido no âmbito da avaliação da questão anterior, ficou prejudicada a ponderação da matéria abrangida pela presente pergunta, designadamente face ao princípio da economia processual que tem afloramento no art.º 130.º do Código de Processo Civil que proscreve a prática, no processo, de actos inúteis.


3. Os factos provados apontam para a verificação dos requisitos enunciados no artigo 235.º do Código da Propriedade Industrial?
Pela razão enunciada na resposta à questão anterior, não se responde também à presente pergunta.

III. DECISÃO
Pelo exposto, julgamos procedente o recurso e, em consequência, revogamos a sentença impugnada.
Custas pela Apelada.
*
Lisboa, 10 de Fevereiro de 2025
Carlos M. G. de Melo Marinho
José Paulo Abrantes Registo
Alexandre Au-Yong Oliveira