I - A morte do usufrutuário extingue o usufruto, fazendo reverter para o proprietário de raiz a plenitude da propriedade.
II - O contrato de arrendamento, outorgado por usufrutuário, caducou com a morte da última usufrutuária, ex vi art. 1051 c) CC.
III - A norma que estabelece que, não obstante a caducidade do arrendamento, se o locatário se mantiver no gozo da coisa pelo lapso de um ano, sem oposição do locador, o contrato considera-se renovado apenas se aplica quando permanecem idênticas as pessoas do senhorio e do arrendatário, o que não sucede quando o senhorio era usufrutuário e faleceu.
Origem: Tribunal Judicial da Comarca do Porto, V.N.Gaia - JL Cível - Juiz 1
Relatora: Ana Vieira
1º Adjunto Juiz Desembargador Dr. Aristides Rodrigues de Almeida
2º Adjunto Juiz Desembargador Dr. Paulo Duarte Mesquita Teixeira
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I- RELATÓRIO
AA, residente na Rua ..., nº ..., Edif. ..., 3º Dto., ... Porto, veio propor a presente ação de processo comum, contra BB, residente na Rua ..., 1º, ... Vila Nova de Gaia, a residir na Rua ..., nº ... - 1 andar, ... ..., Vila Nova de Gaia, pedindo que seja:
a) declarada a cessação, por caducidade, do contrato de arrendamento habitacional celebrado, em 01.03.2022, entre a A. e o pai do R., referente ao primeiro andar do prédio urbano sito na Rua ..., freguesia ..., concelho de Vila Nova de Gaia, distrito do Porto, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo matricial nº ..., descrito na 2ª Conservatória do Registo Predial de Vila Nova de Gaia sob o registo nº ... da citada freguesia;
b) o R. condenado, a entregar, de imediato, à A. o prédio identificado, livre de pessoas e bens e em bom estado de conservação;
c) Sempre se condenando o R. no pagamento das custas, procuradoria e demais encargos.
Alega, em suma, que é proprietária do imóvel descrito no artigo 3º da petição inicial adquirido aos pais do Réu, tendo o mesmo sido adquirido quando era menor e no mesmo dia foi constituído usufrutuo vitalício a favor dos seus pais. O referido imóvel foi dado de arrendamento pelo seu pai, CC, na qualidade de usufrutuário, em 01.07.1976, que o outorgou por si e como representante legal de sua filha menor – a aqui Autora – ao pai do Réu.
O progenitor da Autora faleceu, em 14.01.2007, tendo-lhe sucedido a sua mulher co-usufrutuária que passou a assumir a qualidade de senhoria do prédio e operou-se a manutenção do contrato de arrendamento.
Em 07.02.2022, a mãe da Autora faleceu, tendo esta comunicado ao pai do Réu o seu decesso e, como tal, o contrato de arrendamento havia caducado. Contudo, de modo a cumprir a vontade do seu falecido pai, seria celebrado um novo contrato com as mesmas condições, o que foi aceite pelo pai do Réu, tanto que, lhe remeteu o contrato assinado pelo aqui Réu e datado de 01.03.2022, uma vez que, o seu pai encontrava-se impossibilitado de o fazer.
Sucede, porém, que o pai do Réu faleceu em 14.02.2023 e, assim, a Autora comunicou ao aqui Réu que o contrato celebrado com o seu progenitor deixou de produzir os seus efeitos, por caducidade, na data do óbito do seu pai.
Autora e Réu acordaram telefonicamente as condições de um novo contrato de arrendamento, em 04.04.2023, todavia, o Réu além de não o assinar, remeteu missiva à Autora a comunicar que assumiu a qualidade de arrendatário atentando na transmissão da posição contratual de arrendatário
Alegou ainda que a Autora após a morte da sua mãe remeteu um novo contrato ao seu pai, alegando falsamente que o contrato de arrendamento deste com o progenitor daquela havia caducado, contudo, aquele não o assinou, uma vez que, já não o conseguia fazer encontrando-se muito debilitado acabando por falecer em fevereiro de 2023, o que foi transmitido à Autora.
Nessa sequência, a Autora de má fé, remeteu em abril de 2023 uma carta ao Réu a comunicar que o contrato de arrendamento celebrado em março de 2022 caducou e não houve transmissão do mesmo, dado que o Réu não vivia em economia comum com o arrendatário falecido há mais de um ano.
O Réu respondeu à missiva da Autora e comunicou-lhe a sua posição divergente, entendendo que o contrato celebrado em 01.07.1976 se mantinha vigente e, como tal, operou-se a sucessão do contrato de arrendamento, passando a ter a qualidade de arrendatário do referido imóvel.
Por fim, pugnou pela improcedência da presente ação e pela condenação da autora como litigante de má-fé em multa e numa indemnização.
Foi dispensada a audiência prévia e proferido despacho saneador.
Realizou-se a audiência de discussão e julgamento com estrita observância dos formalismos legais.
Em face do exposto decide-se julgar a ação totalmente procedente, por totalmente provada e consequentemente:
a) Condena-se o Réu, BB, a proceder à entrega imediata do prédio urbano situado na Rua ..., freguesia ..., em Vila Nova de Gaia, inscrito na matriz predial urbana sob o n.º ..., livre de pessoas e bens.
b) Absolver a Autora AA e o Réu BB, da litigância de má fé.
Custas pelo Réu (art.º 527.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil).
Valor da causa: €450,00 (quatrocentos e cinquenta euros). Registe e notifique….»(sic).
O autor com o requerimento de interposição do recurso apresentou alegações, formulando, a final, as seguintes conclusões: «… CONCLUSÕES:
I- Ora todos os factos considerados como não provados, estão confessados quer através da análise do teor da prova documental junta aos autos com os respetivos articulados, bem como dos que ressumam do acordo das partes nos respetivos articulados, não podendo por isto o Réu aqui Recorrente se conformar com isto.
II- Ora o pedido principal da Autora aquando intentou a presente acção foi o seguinte: a) que fosse declarada a cessação, por caducidade, do contrato de arrendamento habitacional celebrado, em 01.03.2022, entre a A. e o pai do R., referente ao primeiro andar do prédio urbano sito na Rua ..., freguesia ..., concelho de Vila Nova de Gaia, distrito do Porto, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo matricial nº ..., descrito na 2ª Conservatória do Registo Predial de Vila Nova de Gaia sob o registo nº ... da citada freguesia.
III- e o que o Tribunal apreciou e decidiu foi saber se ocorreu a caducidade do contrato de arrendamento outorgado em 1976 de que o pai do réu era titular e na negativa se existiu transmissibilidade desta titularidade para a esfera jurídica do réu, existindo uma divergência entre o que foi pedido pela Autora e o que foi apreciado e decidido pelo Tribunal de 1.ª instância
IV- Entendendo o Tribunal de 1.ª instância que no que concerne ao contrato de arrendamento celebrado em representação da autora atendendo à sua menoridade o mesmo caducou quando aquela atingiu a maioridade, operando o regime da caducidade imediatamente, e que o contrato celebrado pelos pais da autora enquanto locadores – usufrutuários cessou o arrendamento com o óbito do último usufrutuário, e tendo operado a caducidade do contrato de arrendamento celebrado com o pai do Réu, por óbito dos usufrutuários, apesar daquele continuar a residir no mesmo até ao seu falecimento não concede ao aqui réu o direito à transmissibilidade por morte do primitivo arrendatário previsto no artigo 1106.º, n.º 1, al. c) do Código Civil, uma vez que, na esfera jurídica do seu progenitor o contrato havia caducado e, como tal, nenhum direito havia a transmitir.
não podendo o Réu concordar com isto porque o presente contrato manteve se em relação a todas as partes e a Autora aqui passou ela a representar se a si mesma, tendo adquirido os poderes de administrar ela mesma o direito de propriedade sobre o imóvel de que era proprietária, e que estava duplamente onerado: não apenas com o usufruto, mas com o arrendamento.
V- Sendo que com a morte dos usufrutuários, ou seja dos seus pais, consolidou-se a propriedade, subsistindo o arrendamento, tendo inclusivamente tal facto sido demonstrado e consolidado com a actuação da mesma.
VI- Logo, não cessou, o direito de propriedade com base no qual o contrato de arrendamento foi celebrado.
VII- Muito pelo contrário, somente o usufruto caducou e se extinguiu, pelo que a Autora, que tinha adquirido o direito de propriedade (onerado), fica titular do direito de propriedade plena, portanto, titular do direito com base no qual foi celebrado o contrato, “sucedendo” nos direitos e obrigações do locador, nos termos previstos no art. 1057.º do CC.
VIII- Não se está, pois, perante um caso subsumível na previsão da alínea c) do art. 1051.º do CC. A este respeito, como bem se explica no “Comentário ao Código Civil, Direito das Obrigações, Contratos em Especial”, UCP Editora, abril 2023, pág. 443, “Esta causa de caducidade é uma manifestação do princípio «Nemo plus iuris …», segundo o qual ninguém pode transmitir um direito que não tem ou um direito mais forte do que aquele de que é titular. Correspondendo a locação, para o locador, à prática de um ato de administração ordinária (exceto se o contrato for celebrado por prazo superior a 6 anos, conforme refere o artigo 1024.º), pode este contrato ser celebrado por quem não é proprietário da coisa, bastando que seja titular de um direito que lhe confere o gozo da coisa objeto do contrato. É o que acontece com o usufrutuário que, não tendo poderes plenos sobre a coisa, a poderá dar em locação (artigo 1446.º). (…)
IX- Esta situação não pode, todavia, onerar o titular do direito de propriedade que incide sobre a coisa locada para além do âmbito temporal das situações referidas nesta alínea.
Assim, com a extinção do direito de usufruto, os poderes e faculdades que constituem o conteúdo deste direito real menor reintegram o conteúdo do direito de propriedade, recuperando o proprietário os poderes plenos sobre a coisa. É nisto que se traduz a elasticidade do direito de propriedade e a sua força expansiva. A extinção do direito de usufruto acarreta a caducidade do contrato de locação.” Na mesma linha de pensamento se pronuncia precisamente Elsa Sequeira dos Santos, no “Código Civil Anotado”, Coord. Por Ana Prata, 2019, Vol. I, Almedina, págs. 1313-1322, referindo que estão previstas na alínea c) do art. 1051.º do CC “situações em que o locador celebrou o contrato ao abrigo de poderes de natureza temporária. Cessando os poderes, cessará a locação, pois o locador não pode fazer existir direitos sobre a coisa por mais tempo do que aquele em que tem poderes sobre ela.
X- Aplica-se, pois, o princípio da subsistência da locação consagrado no art. 1057.º do CC, o qual, embora, em nosso entender, não seja suficiente para conferir natureza real ao direito de arrendamento, significa, como se explica no “Comentário ao Código Civil, Direito das Obrigações, Contratos em Especial”, UCP Editora, abril 2023, pág. 463, que aqui parece configurar-se “a tradução legal de uma compreensão da específica função pessoal, familiar e social que o contrato de locação desempenha na sociedade, e que impõe uma ligação especial entre contrato e a coisa objeto dele, bem como a sua manutenção em casos que poderiam conduzir à sua rutura, em ordem a salvaguardar a estabilidade do vínculo perante circunstâncias que, pelo normal funcionamento do regime obrigacional, poderiam determinar a sua extinção abrupta.
XII- Subjacente a esta solução legal está, se bem vemos, uma profunda preocupação social, mais do que uma qualquer tecnicidade do direito do locatário. Destarte, a lei impõe ao adquirente do «direito-base» que «assuma» a posição jurídica de locador, obrigando-o a manter o contrato de locação nos exatos termos em que ele havia sido celebrado e vinha sendo executado”.
XIII- Se a tese em que se fundamenta a sentença proferida pelo Tribunal de 1.ª instância vingasse, estaria encontrada uma forma hábil de contornar o referido princípio da subsistência da locação, o que configuraria uma fraude à lei: bastaria que o proprietário e senhorio, fosse menor, e os seus progenitores reservassem para si o usufruto (vitalício ou estabelecido por um prazo certo), para assim se lograr que, atingida a maioridade do proprietário, caducasse o contrato de arrendamento. Em suma, a situação dos autos não se reconduz à previsão do art. 1051.º, al. c), do CC, tendo em atenção os elementos de interpretação a considerar, desde logo a letra e a ratio dessa norma, que deve ser conjugada com o referido art. 1057.º do CC, como acima se expôs.
NESTES TERMOS E NOS MELHORES DE DIREITO QUE VOSSAS EXCELÊNCIAS, PROFICIENTEMENTE SUPRIRÃO, REQUER-SE SE DIGNEM CONCEDER PROVIMENTO AO PRESENTE RECURSO, REVOGANDO A SENTENÇA RECORRIDA SENDO ESTA SUBSTITUÍDA POR OUTRA QUE JULGUE PROCEDENTE A POSIÇÃO DO RÉU AQUI RECORRENTE SENDO RECONHECIDA A SUA POSIÇÃO COMO ARRENDATÁRIO
PORÉM, VOSSAS EXCELÊNCIAS DIRÃO COMO FOR DE JUSTIÇA...».
I. Antes de mais, o presente requerimento de interposição de recurso apresentado pelo Recorrente é intempestivo, uma vez que foi apresentado fora do prazo legal para o efeito, pelo que conforme plasma o art. 641º, nº 2, al. a) do Código de Processo Civil (CPC), tal requerimento deverá ser indeferido se for interposto fora de prazo, o que sucede;
II. Assim, constata-se que a Ilustre Mandatária do Recorrente foi notificada em 21.05.2024, via CITIUS, notificação essa que se considerou efetuada em 24.05.2024 (conforme o art. 248º, nº 1 do CPC), tendo, por isso, iniciado o prazo de 30 dias para interpor recurso em 25.05.2024, com termo a 23.06.2024 (domingo), pelo que o seu termo passou para o dia útil imediatamente a seguir, para 24.06.2024 (segunda-feira), de acordo com o art. 138.º, nº 2 do CPC;
III. Desta forma, o Recorrente dispunha de prazo por mais três dias úteis mediante o pagamento da respetiva multa (art. 139.º, nº 5 do CPC), pelo que o último dia do prazo, com multa, era a 27.06.2024 (quinta-feira), sendo que o presente recurso foi apenas submetido em 28.06.2024 (sexta-feira), pelas 11h56, ou seja, fora do prazo legal e já para além dos três dias úteis subsequentes com multa;
IV. Neste sentido, e na ausência de invocação de justo impedimento, não tendo o ato sido praticado dentro dos prazos peremptórios, dúvidas não subsistem que o direito do Recorrente interpor o recurso extinguiu-se, devendo, por isso, ser indeferido pelo Tribunal a quo nos termos do art. 641.º, nº 2, al. a) do CPC;
Se assim não se entender, o que não se concede,
V. O Apelante vem recorrer da decisão em primeira instância que o condenou a entregar, de imediato, livre de pessoas e bens, o prédio urbano situado na Rua ..., freguesia ..., em Vila Nova de Gaia, inscrito na matriz predial urbana sob o n.º ..., propriedade da Recorrida;
VI. Primeiramente, o Apelante inicia a sua alegação dizendo que “todos os factos considerados como não provados, estão confessados quer através da análise do teor da prova documental junta aos autos com os respetivos articulados, bem como dos que ressumam do acordo das partes nos respetivos articulados”, contudo, é mister evidenciar que a impugnação da matéria de facto deve cumprir o ónus específico previsto no art. 640.º, nº 1, al. b) do CPC, caso contrário, a sua inobservância, como sucede, implica “a rejeição imediata do recurso na parte afetada” - vide Ac. Tribunal da Relação de Guimarães proc. nº 5397/18.3T8BRG.G1 (MARIA JOÃO MATOS);
VII. De seguida, o Apelante vem alegar que o Tribunal a quo decidiu pedido diverso do peticionado pela Recorrida na inicial, o que improcede, uma vez que o objeto da presente ação é a efetivação da cessação da situação jurídica do arrendamento, com as suas consequências jurídicas inerentes, através da ação de despejo, aliás, como bem refere a sentença recorrida: “In casu, a livre convicção do julgador alicerçou-se na análise concatenada de toda a prova e dos factos admitidos por acordo entre as partes e que, no caso, dizem respeito ao acordo celebrado em 01.07.1976.”
VIII. Neste pressuposto, o Tribunal recorrido apreciou, e bem, que, “atendendo à factualidade apurada a questão a decidir prende-se em saber se ocorreu a caducidade do contrato de arrendamento que o pai do réu era titular e na negativa se existiu transmissibilidade desta titularidade para a esfera jurídica do réu.”, contrato esse que o Apelante veio alegar que não caducou, uma vez que, com a morte dos usufrutuários, a propriedade (plena) consolidou-se na esfera jurídica da Recorrida, que passou a ser titular do direito com basse no qual foi celebrado o mencionado contrato;
IX. Ora, não pode colher esta alegação, pelo que partilhamos na íntegra o decidido em primeira instância, já que do direito aplicado aos factos apurados resulta que o dito arrendamento foi celebrado por um locador-usufrutuário e em representação da autora enquanto menor, pelo que, “no que concerne ao contrato de arrendamento celebrado em representação da autora, atendendo à sua menoridade, o mesmo caducou quando aquela atingiu a maioridade, operando o regime da caducidade imediatamente, conforme dispõe o artigo 1051.º (no mesmo sentido, veja-se o acórdão do Tribunal da Relação do Porto, processo n.º 9620876)”;
X. É patente que o regime de caducidade opera quando cessa, em geral, o regime de administração a que o prédio está sujeito e com base no qual se atribuíram esses poderes, por isso, quando a Recorrida atingiu a maioridade, caducou, de imediato, o contrato de arrendamento celebrado pelo pai em representação desta enquanto menor, proprietária.
XI. Já em relação aos senhorios-usufrutuários que também outorgaram o referido contrato, foi decidido, corretamente, que ocorreu também a caducidade, opes legis aquando da morte do último usufrutuário (mãe da Recorrente) em 07.02.2022, conforme o art. 1051.º, nº 1, al. c) do CC;
XII. Daí concluir-se que o Tribunal andou bem ao decidir que, apesar do pai do Recorrente ter continuado a residir no locado até ao seu falecimento, não se pode conceder ao aqui Recorrente o direito à transmissibilidade por morte do primitivo arrendatário previsto no artigo 1106.º, n.º 1, al. c) do Código Civil, uma vez que, na esfera jurídica do seu progenitor o contrato já havia caducado e, como tal, nenhum direito havia a transmitir;
XIII. Pelo que, como a referida caducidade ocorreu há mais de seis meses (conforme estatui o art. 1053º do Código Civil), o Recorrente só poderia ser, como foi, condenado na restituição imediata do locado, livre de pessoas e bens; NESTES TERMOS e nos melhores de Direito, e com o douto suprimento de Vossas Excelências, deve o presente recurso ser rejeitado, por extemporâneo, por contrário ao disposto no artigo 638º, n.º 1 do CPC; ou, caso assim não seja considerado, o que apenas se hipotisa, deve sucumbir a apelação, mantendo-se na íntegra a decisão recorrida, assim se fazendo inteira J U S T I Ç A!..».
Foi proferido despacho de admissão de recurso nos seguintes termos: «… Sem delongas, a interposição de recurso é tempestiva, porquanto concretizada no terceiro dia útil com multa, considerando que o dia 24/06/2024 foi Feriado Municipal.
No mais, somos de considerar inexistir qualquer outra questão a apreciar por esteTribunal.
Admite-se a interposição de recurso da decisão final, apresentado pelo réu, por ser tempestivo, conter a alegação do recorrente, por ser legalmente permitida e o recorrente ter legitimidade.
O recurso é de apelação, com efeito suspensivo, a subir imediatamente e nos próprios autos. Subam os autos ao Venerando Tribunal da Relação do Porto.».
1. Definição do objecto do recurso
O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, não podendo este tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso – cfr. arts. 635º, nº 4, 637º, nº 2, 1ª parte e 639º, nºs 1 e 2, todos do Código de Processo Civil[1].
Porque assim, atendendo á estrutura das conclusões das alegações apresentadas pelos apelantes, resulta que as questões a analisar são as seguintes:
1-Intempestividade do recurso
2- Impugnação da matéria de facto.
3- Alteração da decisão de mérito
Nesse contexto, cumpre referir que a sentença recorrida consignou a seguinte matéria de facto: «… III – Da matéria de facto:
III.1 – Factos provados:
Com relevo para a decisão, resultam provados os seguintes factos:
1. Pela AP. ... de 1976/11/30 e sob o n.º ..., na 2ª Conservatória do Registo Predial de Vila Nova de Gaia encontra-se descrita a favor da autora, o primeiro andar do prédio urbano situado na Rua ..., freguesia ..., em Vila Nova de Gaia, inscrito na matriz predial urbana sob o n.º ....
2. À data da aquisição do prédio pela Autora, foi também constituído usufruto vitalício, por compra, a favor dos pais desta, CC e DD, casados no regime de comunhão geral de bens.
3. A aquisição e usufruto do prédio referidos em 1. e 2. foram adquiridas aos pais do aqui Réu, BB e EE, casados no regime de comunhão geral de bens.
4. Por documento escrito, datado de 01 de julho de 1976, entre o pai da Autora, por si e como representante legal da sua filha menor, aqui Autora, na qualidade de “senhorio” e o pai do Réu, BB, na qualidade de “arrendatário”, subscreveram um acordo que denominaram de “contrato de arrendamento ”, através do qual o pai da Autora cedeu a este o gozo e o usa do prédio indicado em 1..
5. O referido acordo mencionado em 4. foi celebrado pelo prazo de um ano, renovável por igual período.
6. Ficou acordado o pagamento mensal de três mil escudos.
7. O pai do Réu entregava a quantia referida em 6. ao pai da Autora.
8. Em 14.01.2007, o pai da Autora faleceu, tendo-lhe sucedido a sua mulher co usufrutuária, mãe da Autora.
9. Em data não concretamente apurada, a mãe da Autora comunicou ao pai do Réu o óbito do seu marido e a manutenção do acordo mencionado em 4..
10. Em 07.02.2022, a mãe da Autora faleceu.
11. Por missiva, datada de 22.02.2022, rececionada em 23.02.2022, a Autora comunicou ao pai do Réu “ (…) Serve a presente comunicação para levar ao conhecimento de V. Exa. que a Exma. Senhora D. DD, que era usufrutuária e senhoria do prédio urbano sito na Rua ..., 1º, em ..., Vila Nova de Gaia, dado de arrendamento habitacional a V. Exa., faleceu no passado dia 07/02/2022, conforme se comprova pela cópia da certidão de óbito que se anexa.
Assim, de acordo com o disposto na 1.ª parte do art. 1443º e nº 1 do art. 1476º, ambos do Código Civil, o usufruto extingue-se por morte da usufrutuária, pelo que, como o contrato de arrendamento em apreço fora celebrado por esta na qualidade de senhoria usufrutuária, o mesmo deixou de produzir os seus efeitos por caducidade na data do verificado óbito, uma vez que se extinguiu o direito de usufruto, conforme dispõe o art. 1051º, c) do Código Civil.
Sucede que como proprietária da raiz do identificado imóvel, para além de única herdeira da falecida senhoria usufrutuária, passei a exercer na plenitude a propriedade do dito prédio, pelo que nessa qualidade decidi manifestar, desde já, a minha intenção de o dar de arrendamento a V. Exa.
Para tal, dado que o anterior contrato deixou legalmente de produzir efeitos por caducidade, impõe-se a outorga de novo contrato de arrendamento habitacional com V. Exa. no qual assumirei a qualidade de senhoria. Desta forma, logo que o referido contrato esteja elaborado, prontamente o enviarei a V. Exa. para a outorga do mesmo.
Por fim, devo realçar que, já a partir do mês de Março de 2022 e nos meses que se seguirem, deverá V. Exa. proceder ao pagamento mensal da renda, pelo mesmo meio utilizado até ao momento, mas ao meu cuidado. (…)”.
12. A Autora remeteu missiva para o pai do Réu, através de carta registada e aviso de receção, rececionada em 08.03.2022.
13. O pai do Réu faleceu em 09.02.2023, no estado de viúvo.
14. Por missiva registada, datada de 26.04.2023, a Autora comunicou ao Réu “(…) Serve a presente para comunicar a V. Exa. que, face ao falecimento do Exmo. Senhor BB, no passado dia 09.02.2023, devidamente comprovado por assento de óbito n.º ... do ano de 2023, o contrato de arrendamento para fins habitacionais com prazo certo, celebrado em 01.03.2022, do qual era este arrendatário habitacional do prédio urbano sito na Rua ..., 1º, em Vila Nova de Gaia, deixou de produzir os seus efeitos, por caducidade, na data do verificado óbito.
Como é do meu conhecimento, V. Exa. é filho do identificado falecido arrendatário e também residente no locado, pelo que estando em causa a apreciação dos efeitos operados pela morte deste na relação contratual, no sentido de averiguar se ocorreu a caducidade do contrato de arrendamento ou a transmissão da posição contratual do falecido, é aplicável o regime legal em vigor à data do óbito, analisado à luz do artigo 1106° do Código Civil, tanto mais que o dito contrato de arrendamento fora celebrado ao abrigo da Lei n.° 6/2006, de 27 de Fevereiro que aprovou o Novo Regime do Arrendamento Urbano (NRAU).
Assim, de acordo com o mencionado artigo, o seu n.° 1 prevê que o arrendamento para habitação não caduca por morte do arrendatário quando lhe sobreviva:
a) Cônjuge com residência no locado;
b) Pessoa que com ele vivesse em união de facto há mais de um ano;
c) Pessoa que com ele vivesse em economia comum há mais de um ano.
Assim, considerando que o contrato de arrendamento em apreço foi celebrado em 01.03.2022 e a data do óbito ocorreu em 09.02.2023, é patente não se verificar a situação de residência em economia comum por mais de um ano na vigência do referido contrato, o que leva a que V. Exa, não tenha direito a que a posição contratual de arrendatário seja transmitida por morte daquele.
Todavia, atendendo à situação de V. Exa., que bem conheço, manifesto, desde já, a minha intenção de dar de arrendamento habitacional a V. Exa o locado supra identificado, pelo que para tal impõe-se a outorga de contrato de arrendamento habitacional com prazo certo, no qual V. Exa, assumirá a qualidade de arrendatário, pelo que logo que o referido contrato esteja elaborado, prontamente o farei enviar a V. Exa. para apreciação, bem assim para agendarmos data para a outorga do mesmo. (…)”.
15. Em 02.06.2023, o Réu remeteu à autora missiva, rececionada em 06.06.2023, com o seguinte teor “(…) Na qualidade de filho do arrendatário de V. Exa. - BB e como já lhe foi comunicado e é do V. conhecimento, o meu pai, arrendatário de V. Exa. desde 26 de Janeiro de 1977 faleceu em 09 Fevereiro de 2023.
Como eu vivo no arrendado conjuntamente com o meu pai há mais de 50 anos, e à data do óbito do mesmo eu tinha 65 anos, o contrato de arrendamento outorgado pelo meu pai com V. Exa. o primeiro na qualidade de arrendatário e V. Exa. na qualidade de senhoria, opera-se a sucessão do contrato de arrendamento, do qual eu passarei após a morte do meu pai, a ser o arrendatário.
Para os devidos efeitos, junto cópia do contrato de arrendamento outorgado em 26 de janeiro de 1977, cópia da certidão de óbito do meu pai, cópia da minha certidão de nascimento para prova da minha idade e irei solicitar às Finanças Comprovativo do m. RABC comprovativo dos meus rendimentos, a qual assim que esteja emitida lhe enviarei. (…)”.
16. Por missiva, datada de 19.06.2023, rececionada em 22.06.2023, a Autora respondeu à missiva referida em 14. e comunicou ao Réu que “Perante a posição que antecede, dada a vontade manifestada por V. Exa. em não outorgar o aludido novo contrato de arrendamento e por ser manifesto que não ocorre a transmissão do contrato de arrendamento celebrado em 01/03/2022 por óbito do arrendatário e pai de V. Exa., a morte deste constitui causa legal da caducidade automática desse contrato e da consequente obrigação de restituição do locado após o decurso de 6 (seis) meses contados sobre a data do óbito (09.02.2023) conforme determina o art. 1053º do Código Civil, isto é, deverá V. Exa. desocupar o locado de pessoas e bens na data de 10.08.2023 e entregar-mo livre e em perfeitas condições de habitabilidade (…)”.
17. O Réu, por carta datada de 06.07.2023, respondeu à Autora, reiterando o conteúdo da sua missiva de 02.06.2023 e alegando, no mais, que teria direito de habitar o imóvel enquanto sucessor da posição do arrendatário e que, por isso, não iria desocupar o locado, documento que junta e dá por reproduzido – doc. nº 15
18. Por missiva, datada de 20.07.2023, a Autora, por intermédio do seu mandatário, remeteu ao Réu carta registada com o seguinte teor “ (…) a dita representação legal, aliás invocada sem substrato pelo pai da m/constituinte no aludido contrato e, sobretudo, sem qualquer vínculo obrigacional, não produziu qualquer efeito, sendo absolutamente ineficaz, isto por ao proprietário de raiz estar vedado o uso, fruição e administração da coisa!
Por outro lado, como é sabido, uma das causas de extinção do usufruto é a morte do usufrutuário, in casu, a morte do último usufrutuário, porquanto, no transe, se tratava de usufruto simultâneo, o que veio a suceder com a morte da senhoria e também usufrutuária vitalícia, DD, finada em 07/02/2022, conforme comunicado, sem oposição, ao falecido pai de V. Exa., por carta remetida sob registo em 22.02.2022 acompanhada de cópia do assento de óbito.
Neste sentido, é indubitável que, com a morte da mãe da m/constituinte, cessou – de jure – o direito de usufruto à sombra do qual o contrato de arrendamento fora celebrado, extinção imediata e absoluta do usufruto a resultar da primeira parte do art.º 1443.º e do art.º 1476.º, n.º 1, alínea a) do Código Civil(…).
Deste modo, o contrato de arrendamento celebrado pelo usufrutuário de um prédio, na qualidade de senhorio, caduca pela morte do/a usufrutuário/a (art. 1051.º, al. c) CC), sendo, pois, a caducidade uma mera consequência – automática – da “morte” do usufruto, sem qualquer interferência da vontade do seu titular ou do titular da nua propriedade que possa ser (ou não ser) ofensiva da boa fé, dos bons costumes ou do fim económico e social do direito.
O contrato de arrendamento originário caducou, pelo que por economia se dá aqui por reproduzido e integrado tudo quanto a tal propósito se mostra escrito na carta de 21.06.2023 que a minha representada dirigiu a V. Exa. e a que já se fez referência.
Perante a posição que antecede, por ser manifesto que não ocorre a transmissão do contrato de arrendamento celebrado em 01.03.2022 por óbito do arrendatário e pai de V. Exa., é patente que o seu decesso constitui causa legal da caducidade automática desse contrato e da consequente obrigação de restituição do locado após o decurso do prazo de 6 (seis) meses contado sobre a data do óbito (09.02.2023), conforme determina o art. 1053º CC, pelo que deverá V. Exa. desocupar o locado e entregá-lo à m/constituinte, livre de pessoas e bens e em perfeitas condições de habitabilidade, na data de 10.08.2023. (…)”.
19. O Réu respondeu através de carta, à missiva referida em 18., em 03.08.2023 e rececionada em 07.08.2023, com o seguinte teor “(…) Venho pelo presente responder à V. carta datada de 20 de julho 2023, face ao teor da mesma venho comunicar o seguinte:
A minha posição é diametralmente oposta à vertida na V. missiva.
O contrato de arrendamento foi firmado pelo meu pai, na qualidade de arrendatário, em julho de 1976 na qual os senhorios eram - a V, constituinte na qualidade de proprietária e o pai da mesma - na qualidade de usufrutuário. Tal contrato mantém-se válido na presente data, na qual ocupo a posição de arrendatário por transmissão.
Atento a natureza vinculística de tal contrato, assiste-me o direito de habitar o imóvel enquanto arrendatário, pelo que não irei dar cumprimento à solicitação da entrega do mesmo. (…)”.
20. O pai do Réu encontrava-se impossibilitado de assinar.
A. A Autora com a missiva referida em 12. enviou um acordo que designou de “contrato de arrendamento” relativo ao prédio identificado em 1.
B. O pai do Réu devolveu por missiva o acordo assinado referido em A).
C. O acordo referido em A) foi assinado e rubricado pelo Réu em representação do seu pai.
D. A Autora comunicou e registou o contrato referido em A) junto da Autoridade Tributária.
E. Por força do acordo mencionado em A) a Autora emitiu mensalmente os recibos de rendas.
F. O Réu comunicou por escrito à Autora em 14.02.2023 que o seu pai tinha falecido.
G. Em 26.04.2023 a Autora remeteu ao Réu dois exemplares do acordo que designaram de “contrato de arrendamento habitacional com prazo certo” com os termos e condições acordadas telefonicamente em 04.04.2023.
H. O Réu vive no prédio referido em 1. desde a construção do mesmo.
I. O Réu viveu com o seu pai no prédio referido em 1. por mais de 50 anos.
J. O Réu nasceu em ../../1958.
III. 3 – Fundamentação da matéria de facto:
…In casu, a livre convicção do julgador alicerçou-se na análise concatenada de toda a prova e dos factos admitidos por acordo entre as partes e que, no caso, dizem respeito ao acordo celebrado em 01.07.1976.
Vejamos em concreto:
Os factos constantes dos pontos 1. a 6. da matéria de facto assentaram na análise ao teor da prova documental junta aos autos com os respetivos articulados, concretamente, caderneta predial (cf. documento n.º 1, junto com a petição inicial), certidão predial online, do acordo que designaram como “Contrato Arrendamento” (cf. documento n.º 2, junto com a petição inicial), além de que ressumam do acordo das partes nos respetivos articulados.
O ponto 7. a 9. resultou do depoimento da testemunha FF, esposa do Réu, que demonstrou ter conhecimento dos factos aqui em causa, uma vez que, residia com o pai do Réu há pelo menos 38 anos. Também afirmou que a renda era paga ao pai da Autora, CC e, após a sua morte passou, o seu sogro, a pagar a renda a DD, viúva daquele.
O ponto 8. extraiu-se ainda do assento de óbito de CC que faleceu no estado de casado com DD (cf. documento n.º 3, junto com a petição inicial).
No que tange ao ponto 10. e 13. assentou a convicção do Tribunal do compulsar dos respetivos assentos de óbito de DD e BB, este no estado de viúvo de EE (cf. documentos n.º 4 e 10, juntos com a petição inicial).
No que concerne ao ponto 12. ressumou do aviso de receção junto aos autos com o documento n.º 8.
A materialidade assente sob os pontos 11., 14. a 19. ressumou do escrutinar das respetivas missivas juntas aos autos com a petição inicial sob os documentos n.º 5, 6, 7, 8, 11, 12, 13, 14, 15, 16, 17.
Por fim, o ponto 20. extraiu-se do depoimento da testemunha FF, esposa do Réu, que afirmou que o seu sogro já não podia assinar atendendo ao seu estado de saúde.
No que concerne aos factos não provados:
A factualidade não provada, resultou da total ausência de prova quanto à mesma.
Concretizando,
Os factos não provados em A) a C) ressumaram do depoimento da testemunha FF, esposa do Réu, que mereceu credibilidade aos olhos do Tribunal apesar de ter interesse na resolução da causa, tendo concretizado que não se recorda de terem recebido qualquer contrato aquando da morte de DD, nem do seu marido ter assinado qualquer documento pelo seu sogro, pois, aquele não tinha qualquer procuração para o representar.
Também a testemunha GG, marido da Autora, durante o seu depoimento afirmou que “não entenderam, nem deixaram de entender que o réu representava o seu pai”, mais afirmando que, o mesmo nunca remeteu qualquer procuração e nunca se intitulou seu representante.
Nenhuma prova se fez quando aos pontos D), E) e G), sendo insuficiente para a sua positivada o depoimento da testemunha GG, marido da Autora, que afirmou que após a morte da sua sogra, a sua esposa se tornou senhoria e, como tal, remeteu novo contrato em 2022 ao pai do Réu.
No que tange ao facto não provado em F) resultou da falta de prova da sua positividade, somente resultando que o Réu comunicou o falecimento do seu pai, mas não resultou que o mesmo se concretizou por escrito e naquela data.
Os pontos não provados em H) e I) ressumou dos depoimentos das testemunhas FF, esposa do Réu, que afiançou ao Tribunal que lá vivem há 38 anos e ainda da testemunha HH, filha do Réu, que mereceu a credibilidade do Tribunal, pois, falou de forma espontânea e escorreita apesar do interesse na causa, pormenorizando que ainda vive com os seus progenitores na casa aqui em discussão, especificando que durante 5 ou 6 anos saíram, quando tinha 12 anos de idade e regressaram quando tinha 19 ou 20 anos.
Aquando da sua identificação a testemunha afirmou que nasceu em ../../1986, como tal, significa que regressaram à casa em discussão nos autos há 17 ou 18 anos.
Por fim, no que concerne ao dia de nascimento do Réu, facto não provado em J), nenhuma prova se produziu da sua positividade.
As testemunhas II e JJ, vizinhos do Réu, em nada contribuíram para a descoberta da verdade dos factos que constituem o objeto do processo.…»(sic).
1- Tempestividade do recurso
A recorrida pugna pela intempestividade do recurso pelos fundamentos acima referidos nas conclusões, alegando em resumo que tendo a sentença sido notificada em 21.05.2024, via CITIUS, considerou-se feita a 24.05.2024 (conforme o art. 248º, nº 1 do CPC), tendo, por isso, iniciado o prazo de 30 dias para interpor recurso em 25.05.2024, com termo a 23.06.2024 (domingo), pelo que o seu termo passou para o dia útil imediatamente a seguir, para 24.06.2024 (segunda-feira), de acordo com o art. 138.º, nº 2 do CPC. Como tinha mais três dias úteis mediante o pagamento da respetiva multa (art. 139.º, nº 5 do CPC), pelo que o último dia do prazo, com multa, era a 27.06.2024 (quinta-feira), sendo que o presente recurso foi apenas submetido em 28.06.2024 (sexta-feira), pelas 11h56, e nessa medida considera ser intempestivo.
Compulsados os autos verifica-se que o recurso é tempestivo porque tendo a notificação da sentença ocorrido a 21.05.2024, a mesma presume-se efetuada no 3º dia posterior à data certificada pelo CITIUS como sendo a da elaboração, ou no primeiro dia útil seguinte a este, quando aquele 3º dia corresponda a um dia não útil, ainda que tenha sido lida pelo notificado em data anterior. Nessa medida e atento o teor do artigo 248 do CPcivil verifica-se que a notificação ocorreu no dia 24.05.2024, pelo que o prazo de 30 dias para interposição do recurso de apelação iniciou-se em 25.05.2024.
O fim do prazo para interposição de recurso seria a 23.06.2024 (domingo), contudo, como dispõe o nº 2 do art. 138º do CPC, quando o prazo para a prática do ato processual terminar em dia em que os tribunais estiverem encerrados, transfere-se o seu termo para o 1.º dia útil seguinte, pelo que o termo se transferiu para o dia 25.06.2024 (terça-feira) isto porque o dia 24.6.2024 (segunda feira) foi feriado de São João na comarca do Porto.
Pelo que tendo sido o presente recurso apresentado no dia 28 de Junho de 2024 é o mesmo tempestivo, porque foi apresentado dentro do prazo legal concedido para o efeito, atento o teor do artigo 139, nº5 do CPCivil.
Pelo exposto, improcede a invocada questão sobre a intempestividade do recurso.
O recorrente pugna por uma alteração da matéria de facto tendo invocado na motivação de recurso o seguinte: «… 11.º Ora deu o Tribunal de 1.ª Instância deu como não provados os seguintes factos:
A. A Autora com a missiva referida em 12. enviou um acordo que designou de “contrato de arrendamento” relativo ao prédio identificado em 1.
B. O pai do Réu devolveu por missiva o acordo assinado referido em A).
C. O acordo referido em A) foi assinado e rubricado pelo Réu em representação do seu pai.
D. A Autora comunicou e registou o contrato referido em A) junto da Autoridade Tributária.
E. Por força do acordo mencionado em A) a Autora emitiu mensalmente os recibos de rendas.
F. O Réu comunicou por escrito à Autora em 14.02.2023 que o seu pai tinha falecido.
G. Em 26.04.2023 a Autora remeteu ao Réu dois exemplares do acordo que designaram de “contrato de arrendamento habitacional com prazo certo” com os termos e condições acordadas telefonicamente em 04.04.2023.
H. O Réu vive no prédio referido em 1. desde a construção do mesmo.
I. O Réu viveu com o seu pai no prédio referido em 1. por mais de 50 anos.
J. O Réu nasceu em ../../1958.
Ora todos os factos considerados como não provados, estão confessados quer através da análise do teor da prova documental junta aos autos com os respetivos articulados, bem como dos que ressumam do acordo das partes nos respetivos articulados, não podendo por isto o Réu aqui Recorrente se conformar com isto.» (sic).
Os tribunais da Relação, sendo tribunais de segunda instância, têm actualmente competência para conhecer tanto de questões de direito, como de questões de facto.
Segundo o nº1 do artigo 662º do NCPC, a decisão proferida sobre a matéria de facto pode ser alterada pela Relação, “se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa”.
Para que o tribunal se encontre habilitado para proceder à reapreciação da prova, o artigo 640º, do CPC, impõe as seguintes condições de exercício da impugnação da matéria de facto:
“1 – Quando seja impugnada a decisão proferida sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
2 – No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:
a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso no que se refere à impugnação da matéria de facto, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevante;
b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exactidão as passagens em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes.”
A impugnação da matéria de facto que tenha por fundamento a errada valoração de depoimentos gravados, deverá, assim, sob pena de rejeição, preencher os seguintes requisitos:
a) Indicação dos concretos pontos de facto considerados incorrectamente julgados, que deverão ser enunciados na motivação do recurso e sintetizados nas conclusões;
b) indicação dos concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nela realizada, que impõem decisão diversa, sobre os pontos da matéria de facto impugnados;
c) indicação, ou transcrição, exacta das passagens da gravação erradamente valoradas.
O recorrente, sob pena de rejeição do recurso, deve determinar com toda a precisão os concretos pontos da decisão que pretende questionar – delimitar o objeto do recurso -, motivar o seu recurso através da transcrição das passagens da gravação que reproduzem os meios de prova, ou a indicação das passagens da gravação que, no seu entendimento, impunham decisão diversa sobre a matéria de facto - fundamentação - e ainda, indicar a solução alternativa que, em seu entender, deve ser proferida pela Relação.
Estes requisitos visam assegurar a plena compreensão da impugnação deduzida à decisão sobre a matéria de facto, mediante a identificação concreta e precisa de quais os pontos incorrectamente julgados e de quais os motivos de discordância, de modo a que se torne claro com base em que argumentação e em que elementos de prova, no entender do impugnante, se imporia decisão diversa da que foi proferida pelo tribunal a quo.
Para outros desenvolvimentos, vide o Ac da RC (Relator: CARLOS MOREIRA) de 10-09-2019:«Sumário: I - A não discriminação, nem no corpo das alegações, nem nas conclusões, quer do início e fim dos depoimentos na gravação, quer, muito menos, das concretas passagens dos mesmos em que o recorrente funda a sua pretensão, implica a liminar rejeição do recurso sobre a decisão da matéria de facto – artº 640º nº 1 al. b) e nº2 al. a) do CPC.
II - A simples discordância, por exegese diferenciada, do teor dos depoimentos não impõe – salvo lapso material ou erro lógico patente do julgador na apreciação dos mesmos – a censura da sua convicção…»
Tal como dispõe o nº 1 do art. 662º a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto “ […] se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa”, o que, na economia do preceito, significa que os poderes para alteração da matéria de facto conferidos ao tribunal de recurso constituem apenas um remédio a utilizar nos casos em que os elementos constantes dos autos imponham inequivocamente uma decisão diversa da que foi dada pela 1ª instância.
Para outros desenvolvimentos, vide o Ac da RC (Relator: CARVALHO MARTINS) de 02-12-2014: «Sumário:.. 3- Não bastará uma qualquer divergência na apreciação e valoração da prova para determinar a procedência da impugnação, sendo necessário constatar um erro de julgamento. A efectiva garantia do duplo grau de jurisdição em matéria de facto (consignado no art. 662° do N.C.P.Civil), impõe que o Tribunal da Relação, depois de reapreciar as provas apresentadas pelas partes, afirme a sua própria convicção acerca da matéria de facto questionada no recurso, não podendo limitar-se a verificar a consistência lógica e a razoabilidade da que foi expressa pelo tribunal recorrido. É este, afinal, o verdadeiro sentido e alcance que deve ser dado ao princípio da liberdade de julgamento fixado no art. 607°, n°5 do N.C.P.Civil…»
Conforme defende Abrantes Geraldes, in In Recursos no Novo Código de Processo Civil, pág. 225; que funcionando o Tribunal da Relação como órgão jurisdicional com competência própria em matéria de facto, nessa reapreciação tem autonomia decisória, devendo fazer uma apreciação crítica das provas, formulando, nesse julgamento, com inteira autonomia, uma nova convicção, com renovação do princípio da livre apreciação da prova (artigo 396 do Código Civil). O tribunal da Relação quando reaprecia a prova deve considerar os meios de prova indicados pelas partes e confrontá-los com os outros meios de prova e verificar se foi ou não cometido erro de apreciação da prova que deva ser corrigido (vide, A. Geraldes, in Recursos, pág. 299).
No caso dos autos, verifica-se, que a recorrente nas suas alegações de recurso invoca argumentos manifestamente insuficientes para fundamentar qualquer alteração quanto aos pontos não provados, sendo que por imperativo do disposto no artº 640º/1-b) do CPC a recorrente teria de indicar os concretos meios probatórios que justificariam a alteração do que vem dado como provado e nessa medida improcede a peticionada alteração, atenta á análise critica da prova.
Assim que, uma vez que a recorrente não indica qualquer elemento de prova concreto que justificaria a alteração pretendida quanto á impugnação da matéria de facto improcede a mesma, nomeadamente no que concerne à análise critica da prova.
Limitou-se o apelante a invocar acordo entre as partes quanto aos factos, sem concretizar essa alegação e não se vislumbra nos articulados nenhum acordo ou confissão quanto aos factos tidos como não provados. Igualmente não concretiza que prova documental demonstra essa factualidade não provada limitando-se a alegar genericamente resultar dos documentos.
Pelo exposto, é manifesto que a recorrente não dá cumprimento ao artigo 640º, nº1, al. b) e nº 2 do n.C.P.Civil, o que constitui um obstáculo à reapreciação pedida e implica, nos termos da mesma, a imediata rejeição do recurso, na parte da impugnação da matéria de facto.
Pelo exposto, decide-se rejeitar o recurso relativo à impugnação da matéria de facto.
Em conclusão, a factualidade a atender no âmbito da apelação em julgamento é a fixada pelo tribunal a quo.
Nas alegações de recurso a recorrente pugna por fim, que a acção deveria ser julgada improcedente, invocando neste segmento do recurso que o pedido principal da Autora aquando intentou a presente acção foi o seguinte:
a) que fosse declarada a cessação, por caducidade, do contrato de arrendamento habitacional celebrado, em 01.03.2022, entre a A. e o pai do R., referente ao primeiro andar do prédio urbano sito na Rua ..., freguesia ..., concelho de Vila Nova de Gaia.
E refere que o que o Tribunal apreciou e decidiu foi saber se ocorreu a caducidade do contrato de arrendamento outorgado em 1976 de que o pai do réu era titular e na negativa se existiu transmissibilidade desta titularidade para a esfera jurídica do réu, existindo uma divergência entre o que foi pedido pela Autora e o que foi apreciado e decidido pelo Tribunal de 1.ª instância.
Refere que o tribunal considerou no que concerne ao contrato de arrendamento celebrado em representação da autora atendendo à sua menoridade o mesmo caducou quando aquela atingiu a maioridade, operando o regime da caducidade imediatamente, e que o contrato celebrado pelos pais da autora enquanto locadores – usufrutuários cessou o arrendamento com o óbito do último usufrutuário, e tendo operado a caducidade do contrato de arrendamento celebrado com o pai do Réu, por óbito dos usufrutuários, apesar daquele continuar a residir no mesmo até ao seu falecimento não concede ao aqui réu o direito à transmissibilidade por morte do primitivo arrendatário previsto no artigo 1106.º, n.º 1, al. c) do Código Civil, uma vez que, na esfera jurídica do seu progenitor o contrato havia caducado e, como tal, nenhum direito havia a transmitir.
Invoca o apelante que não concorda com este entendimento porque o presente contrato manteve se em relação a todas as partes e a Autora aqui passou ela a representar se a si mesma, tendo adquirido os poderes de administrar ela mesma o direito de propriedade sobre o imóvel de que era proprietária, e que estava duplamente onerado: não apenas com o usufruto, mas com o arrendamento.
Alega que com a morte dos usufrutuários, ou seja dos seus pais, consolidou-se a propriedade, subsistindo o arrendamento, tendo inclusivamente tal facto sido demonstrado e consolidado com a actuação da mesma. Considera o apelante que não cessou, o direito de propriedade com base no qual o contrato de arrendamento foi celebrado.
Refere que entende que somente o usufruto caducou e se extinguiu, pelo que a Autora, que tinha adquirido o direito de propriedade (onerado), fica titular do direito de propriedade plena, portanto, titular do direito com base no qual foi celebrado o contrato, “sucedendo” nos direitos e obrigações do locador, nos termos previstos no art. 1057.º do CC.
Considera que não se está perante um caso enquadrável na previsão da alínea c) do art. 1051.º do CC. E assim, com a extinção do direito de usufruto, os poderes e faculdades que constituem o conteúdo deste direito real menor reintegram o conteúdo do direito de propriedade, recuperando o proprietário os poderes plenos sobre a coisa. E considera que se aplica, o princípio da subsistência da locação consagrado no art. 1057.º do CC, e assim a lei impõe ao adquirente do «direito-base» que «assuma» a posição jurídica de locador, obrigando-o a manter o contrato de locação nos exatos termos em que ele havia sido celebrado e vinha sendo executado.
Conclui o apelante que a situação dos autos não se reconduz à previsão do art. 1051.º, al. c), do CC, tendo em atenção os elementos de interpretação a considerar, desde logo a letra e a ratio dessa norma, que deve ser conjugada com o referido art. 1057.º do CC.
Verifica-se que o tribunal a quo considerou que a questão a decidir nos autos visa saber se ocorreu a caducidade do contrato de arrendamento que o pai do réu era titular e na negativa se existiu transmissibilidade desta titularidade para a esfera jurídica do réu.
Considerou que o contrato de arrendamento em litígio foi outorgado em 01.07.1976 entre o pai da autora na qualidade de usufrutuário e em representação legal da mesma, atendendo à sua menoridade, que teve por objeto um prédio urbano que se destinava a habitação do arrendatário pai do aqui réu. Refere-se que o arrendamento foi celebrado por um locador-usufrutuário e em representação da autora enquanto menor.
E considera-se que no que concerne ao contrato de arrendamento celebrado em representação da autora atendendo à sua menoridade o mesmo caducou quando aquela atingiu a maioridade, operando o regime da caducidade imediatamente, conforme resulta do artigo 1051.º.
E considerou também que o contrato celebrado pelos pais da autora enquanto locadores – usufrutuários também caducou, cessando o arrendamento com o óbito do último usufrutuário que sucedeu em 07.02.2022 – cf. artigo 1051.º, n.º 1 al. c) do Código Civil.
Concluiu o tribunal recorrido que tendo operado a caducidade do contrato de arrendamento celebrado com o pai do Réu, por óbito dos usufrutuários, apesar daquele continuar a residir no mesmo até ao seu falecimento não concede ao aqui réu o direito à transmissibilidade por morte do primitivo arrendatário previsto no artigo 1106.º, n.º 1, al. c) do Código Civil, uma vez que, na esfera jurídica do seu progenitor o contrato havia caducado e, como tal, nenhum direito havia a transmitir.
E determinou a restituição imediata do locado pese embora o teor di artigo 1053.ºdo Código Civil (casos de caducidade previstos nas alíneas b) e seguintes do artigo 1051.º, a restituição do prédio, tratando-se de arrendamento, só pode ser exigida passados seis meses sobre a verificação do facto que determina a caducidade) porque considerou que a caducidade do contrato de arrendamento por falecimento do locatário que ocorreu em 07.02.2022 e, portanto, há mais de seis meses (podendo o réu ser condenado a restituir imediatamente o imóvel).
Desde logo cumpre referir que ao contrário do invocado o tribunal não decidiu de forma divergente do peticionado pela autora, porque determinar se existiu ou não a caducidade do contrato de arrendamento outorgado em 1976 de que o pai do réu era titular e na negativa se existiu transmissibilidade desta titularidade para a esfera jurídica do réu, está contido no objeto do processo, na sua causa de pedir e pedido.
Por outro lado, consideramos que no presente caso se deve aderir á fundamentação jurídica da sentença recorrida porque a morte do usufrutuário-senhorio implica, ipso jure, a caducidade do contrato de arrendamento com efeito automático, afastando a aplicação do princípio da subsistência da locação consagrado no art. 1057.º do CC que o apelante invoca.
Nos termo do artigo 1476.º, n.º 1, al. a), do Código Civil: “O usufruto extingue-se: a) Por morte do usufrutuário, ou chegado o termo do prazo por que o direito foi conferido, quando não seja vitalício (...)”. Por outro lado, estipula o artigo 1056.º, do Código Civil: “Se, não obstante a caducidade do arrendamento, o locatário se mantiver no gozo da coisa pelo lapso de um ano, sem oposição do locador, o contrato considera-se igualmente renovado nas condições do artigo 1054.
No caso dos autos, o usufruto com fundamento no qual foi celebrado o arrendamento com o pai do réu, ora apelante, extinguiu-se com a morte da co- usufrutuária, nos temos da al. a) do nº 1 do art. 1476º do C. Civil. Nos termos do artigo 1051 alínea c) do CCivil, essa circunstância, determinou a caducidade do arrendamento que tinha por objecto o imóvel em causa, cujo direito de propriedade se expandiu até à sua plenitude, na esfera jurídica da autora.
Estabelece o art. 1056º do CCivil que se, não obstante a caducidade do arrendamento, o locatário se mantiver no gozo do locado, o contrato considera-se renovado nas condições do art. 1054º, isto é, segundo o disposto no nº 2 desta norma, pelo prazo de um ano (salvo se o prazo do contrato for mais curto). Mas o contrato só pode renovar-se se as partes forem as mesmas, (mesmo senhorio e mesmo arrendatário do contrato que vigorava imediatamente antes da sua caducidade).
Portanto, se o usufrutuário deu de arrendamento um imóvel, o contrato caducará com a morte daquele, ante a cessação do usufruto, nos termos conjugados dos artigos 1476.º, n.º 1, al. a), 1.ª parte, e 1051.º, al. c), 1.ª parte, ambos do CC.
A norma que estabelece que, não obstante a caducidade do arrendamento, se o locatário se mantiver no gozo da coisa pelo lapso de um ano, sem oposição do locador, o contrato considera-se renovado apenas se aplica quando permanecem idênticas as pessoas do senhorio e do arrendatário, o que não sucede quando o senhorio era usufrutuário e faleceu.
Portanto, o contrato de arrendamento caducou em face da extinção do direito de usufruto de causado pelo respectivo óbito da co usufrutuária.
O réu tem o dever de restituir o imóvel devido á cessação do contrato e porque não foi celebrado nenhum contrato de arredamento por oposição da autora.
Há, assim, lugar à declaração da cessação do contrato de arrendamento, por caducidade, com consequente condenação do réu à restituição do arrendado livre de pessoas e bens
Pelos fundamentos acima expostos, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar a apelação improcedente, confirmando-se a decisão recorrida.
Custas a cargo do apelante (art. 527º, nºs 1 e 2).
Porto, 6/2/2025
Ana Vieira
Aristides Rodrigues de Almeida
Paulo Duarte Teixeira
_______________
[1] Diploma a atender sempre que se citar disposição legal sem menção de origem.