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CONTRA-ORDENAÇÃO LABORAL
PRESCRIÇÃO
LEIS TRANSITÓRIAS COVID-19
RESPONSABILIDADE DA PESSOA COLECTIVA
RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA
Sumário
- A prescrição do procedimento contraordenacional laboral tem sempre lugar quando, desde o seu início e ressalvado o tempo de suspensão, tenham decorrido 7 anos e 6 meses. - O n.º 3 do artigo 551.º do Código do Trabalho não exige que o representante da pessoa colectiva exerça de facto a gerência, limitando-se a estatuir a responsabilidade solidária dos seus representantes pelo pagamento das coimas aplicadas pela prática de contra-ordenações laborais.
Texto Integral
Acordam, em conferência, na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa:
Relatório
A arguida ... e AA, vieram impugnar judicialmente a decisão da AUTORIDADE PARA AS CONDIÇÕES DO TRABALHO (ACT) que aplicou à primeira a coima única de € 3.570,00, correspondente a 35 UC e a sanção acessória de publicidade, pela prática, a título de negligência, das seguintes contra-ordenações:
A- Uma contraordenação muito grave, por violação do disposto no n.º 1 do artigo 73.º da Lei n.º 102/2009, de 10 de Setembro, por falta de organização dos serviços de segurança e saúde no trabalho, punida nos termos do n.º 2 do mesmo artigo;
B- Uma contraordenação muito grave, por violação do disposto no n.º 1 do artigo 79.º da Lei n.º 98/2009 de 04 de Setembro, por falta de seguro de acidentes de trabalho para o trabalhador BB, punida nos termos do n.º 1 do artigo 171.º do referido diploma legal;
C- Uma contraordenação muito grave, por violação do disposto no n.º 1 do artigo 79.º da Lei n.º 98/2009, de 04 de Setembro, por falta de seguro de acidentes de trabalho para o trabalhador CC, punida nos termos do n.º 1 do artigo 171.º do referido diploma legal;
D- Uma contraordenação muito grave por violação do n.º 1 do artigo 15.º da Lei n.º 102/2009, de 10 de setembro, conjugado com o n.º 11 do mesmo artigo e com a alínea d) do n.º 1 do artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 243/86, de 20 de Agosto, por falta de limpeza diária periódica, punida nos termos do n.º 14 do artigo 15.º da Lei n.º102/2009 de 10 de Setembro; e
E- uma contraordenação muito grave, por violação do disposto no n.º 1 do artigo 15.º da Lei n.º 102/2009, de 10 de Setembro, conjugado com o n.º 11 do mesmo artigo e com a alínea d) do n.º 3 do artigo 38.º do Decreto-Lei n.º 243/86, de 20 de Agosto, por falta de sabonete líquido e dispositivo automático de secagem de mãos ou toalhas individuais de papel, punido nos termos do n.º 14 do artigo 15.º da Lei n.º 102/2009 de 10 de Setembro.
As contra-ordenações foram punidas com as coimas parcelares de € 2.142,00 e sanção acessória de publicidade.
Alegaram, em suma, a prescrição do procedimento contraordenacional e que AA não exercia as funções de gerente de facto da primeira arguida, pelo que não pode ser responsabilizada pelo pagamento das coimas. Mais impugnaram a prática dos factos que lhes são imputados.
Ao abrigo do disposto no artigo 36.º n.º 1 da Lei n.º 107/2009, de 14 de Setembro, a ACT apresentou alegações mantendo a sua decisão e remeteu os autos ao Ministério Público.
Ao abrigo do disposto no artigo 37.º da Lei n.º 107/2009, de 14 de Setembro, o Ministério Público fez os autos presentes ao Mmo. Juiz, consignando que o procedimento contraordenacional não se encontra prescrito e não se opondo a que fosse proferida decisão por despacho.
Em 27.02.2024, foi proferido despacho que admitiu a impugnação judicial e designou data para a audiência de julgamento.
O Citius certificou a elaboração da notificação do despacho de 27.02.2024 ao ilustre mandatário com data de 29.02.2024, presumindo-se a notificação a 04.03.2024.
Em 10.05.2024 foi proferida a sentença que finalizou com o seguinte dispositivo: “Pelos fundamentos de facto e de direito supra expostos, o tribunal decide negar provimento à impugnação judicial e, consequentemente, decide: 1 – manter a decisão administrativa e, consequentemente, manter a condenação da Recorrente, ...pela prática de: a) uma contraordenação muito grave, por violação do disposto no nº 1 do artigo 73º da Lei 102/2009 de 10 de setembro, por falta de organização dos serviços de segurança e saúde no trabalho, na coima de 21 UC, que corresponde a € 2.142,00 e na sanção acessória de publicidade. b) uma contraordenação muito grave, por violação do disposto no nº 1 do artigo 79º da Lei 98/2009 de 04 de setembro, por falta de seguro de acidentes de trabalho para o trabalhador BB, na coima de 21 UC, que corresponde a € 2.142,00 e na sanção acessória de publicidade. c) uma contraordenação muito grave, por violação do disposto no nº 1 do artigo 79º da Lei 98/2009 de 04 de setembro, por falta de seguro de acidentes de trabalho para o trabalhador CC, na coima de 21 UC, que corresponde a € 2.142,00 e na sanção acessória de publicidade. d) uma contraordenação muito grave por violação do nº 1 do artigo 15º da Lei 102/2009, de 10 de setembro, conjugado com o nº 11 do mesmo artigo e com a alínea d) do nº 1 do artigo 7º do Decreto-Lei 243/86, de 20 de agosto, por falta de limpeza diária periódica das instalações sanitárias, na coima de 21 UC, que corresponde a € 2.142,00 e na sanção acessória de publicidade. e) uma contraordenação muito grave, por violação do disposto nº 1 do artigo 15º da Lei 102/2009, de 10 de setembro, conjugado com o nº 11 do mesmo artigo e com a alínea d) do nº 3 do artigo 38º do Decreto-Lei 243/86, de 20 de agosto, por falta de sabonete líquido e dispositivo automático de secagem de mãos ou toalhas individuais de papel, na coima de 21 UC, que corresponde a € 2.142,00 e na sanção acessória de publicidade. 2 – Fixar a coima única pela prática das cinco contraordenações, em 28 UC, que corresponde a € 2.856,00 (dois mil oitocentos e cinquenta e seis euros) e na sanção acessória de publicidade. 3 – Manter a responsabilidade acessória de AA pelo pagamento da coima aplicada, nos termos do artigo 551º, n.º 3 do Código do Trabalho. As custas são da responsabilidade da Recorrente, atento o seu decaimento. *** Proceda-se se ao depósito da presente decisão (artigo 372º, n.º 5 do Código Processo Penal, ex vi artigo 41º, n.º 1 do Decreto-Lei nº 433/82, de 27 de outubro, ex vi artigo 60.º da Lei n.º 107/2009, de 14 de Setembro). *** Comunique a presente decisão à autoridade administrativa (artigo 45.º n.º 3 da Lei n.º 107/2009, de 14.09).”
Inconformadas com a sentença, a arguida e a responsável solidária recorreram e formularam as seguintes conclusões:
“1- Em qualquer caso, a prescrição do procedimento tem sempre lugar quando, desde o seu início e ressalvado o tempo de suspensão, tiver decorrido o prazo da prescrição – in casu, 5 anos - acrescido de metade;
2- Os factos alegadamente praticados pela sociedade Arguida sucederam em momento anterior a 02/10/2017;
3- Uma vez que a acção inspectiva em apreço se realizou no dito dia 02/10/2017;
4- Pelo que ocorreu, entretanto, a prescrição, o que se requer a V. Excia. se digne determinar, com as legais consequências, designadamente, a extinção do procedimento de contra ordenação.
5- Caso assim não se entenda, em caso algum se pode responsabilizar a AA pelo pagamento da contra ordenação;
6- De facto, ficou provado que (vide sentença recorrida – factos 18 a 24):
“18 - AA não contratava, despedia ou dava ordens aos empregados da sociedade até à morte do seu marido DD, em 30 de Novembro de 2020.
19 – AA não fazia encomendas de bens ou contratava serviços, junto a terceiros.
20 - AA não ordenava, determinava ou controlava a produção e/ou a actividade da sociedade devedora originária.
21 - AA não fiscalizava as actividades executadas pela sociedade, mormente no que respeita a qualquer relação com as finanças, directamente ou através de TOC ou ROC.
22 - AA não celebrava quaisquer contratos com fornecedores ou outros de qualquer espécie.
23 - AA não agia por conta, à ordem ou no interesse da sociedade Arguida, nem, em seu nome, celebrava quaisquer negócios jurídicos.
24 - AA sempre foi doméstica.” (fim de citação);
7- Ou seja, a AA nunca exerceu, de facto, a gerência da sociedade Arguida, pois nunca praticou quaisquer actos de gerência da mesma;
8- São, efectivamente, os gerentes que exteriorizam a vontade de qualquer sociedade, mas “Não basta a gerência nominal ou de direito para implicar a responsabilidade dos gerentes, é necessário que tal gerência tenha sido efectiva, de facto, traduzida, portanto, na prática de actos de admnistração ou de disposição em nome e no interesse da sociedade” (EE, Manual I, Vol. I, Pág. 389);
9- É preciso, portanto, que haja uso efectivo dos poderes de administração da sociedade, só assim se podendo falar no exercício real e efectivo do cargo de gerente;
10- Ora, como se demonstrou em audiência de julgamento e foi transposto para os factos provados pela sentença do tribunal a quo, a AA pessoa singular nunca exerceu a gerência de facto da sociedade Arguida;
11- A AA tem mais de 80 anos e é e sempre foi doméstica (vulgo, dona de casa), pelo que nunca esta exerceu, real e efectivamente, o cargo de gerente da sociedade Arguida, pois quem o fazia era o seu falecido marido;
12- Nestes termos e assim sendo, de acordo com os princípios legais já enunciados, falta, in casu, o pressuposto que informa o regime legal da responsabilidade dos gerentes, designadamente, a responsabilidade solidária, o qual radica na presunção de uma culpa funcional;
13- De resto, a doutrina e a jurisprudência têm sido unânimes no entendimento de que só quem, efectivamente, ou seja, de facto, exerce a gerência de uma sociedade pode ser responsável, solidária ou subsidiariamente, pelas dívidas, contra-ordenações e coimas em cujo pagamento a mesma seja condenada;
14- Por outras palavras, é preciso que a gerência de direito seja acompanhada pela gerência de facto.
15- Face aos fundamentos supra expostos, cada um per si (prescrição e inexistência de gerência de facto), deverão os autos ser arquivados sem qualquer cominação para a Arguida e, acrescidamente, no que respeita à AA;
16- Determinando-se a extinção do procedimento de contra ordenação sub judice, o que se requer a V. Excias. se dignem determinar, assim alterando a decisão recorrida e fazendo a costumada
JUSTIÇA!”
Foi proferido despacho que admitiu o recurso e determinou o cumprimento do disposto no artigo 411º, n.º 6 do Código de Processo Penal.
O Ministério Público respondeu e formulou as seguintes conclusões:
“1.º- No que respeita à invocada prescrição da contraordenação, importa referir que a pessoa singular se considera notificada em 08.09.2022 (fls. 23 e art.º 8.º, n.º 1, da LPCLSS) e a pessoa coletiva em 05.09.2022 (fls. 25 e art.º 113.º, n.º 2, do CPP, ex vi art.º 41.º, n.º 1, RGCO por força do art.º 60.º, da LPCLSS).
2.º- Assim sendo, a prescrição interrompeu-se relativamente à pessoa singular em 08.09.2022 e à pessoa coletiva em 05.09.2022.
3.º- Com a notificação do despacho proferido que procedeu ao exame preliminar do recurso da decisão da autoridade administrativa, em 04.03.2024, a prescrição suspendeu-se – art.º 53.º, n.º 1, al. d), da LPCLSS.
4.º- Da data da infração, 02.10.2017, até 08.09.2022 decorreram 4 anos, 11 meses e 6 dias, e até 05.09.2022 decorreram 4 anos, 11 meses e 3 dias.
5.º- Até 03.03.2024, pois a partir de 04.04.2023 iniciou-se um período de suspensão, decorrem 6 anos, 5 meses e 2 dias.
6.º- Foi proferida sentença 10.05.2024, pelo que a prescrição voltou a correr a partir de 11.05.2024.
7.º- Ora, faltando 1 ano e 28 dias para atingir o prazo máximo de prescrição, descontando o prazo de suspensão, importa concluir que o procedimento criminal apenas prescreverá em 08.06.2025.
8.º- Pelo que fica dito, dúvidas não se suscitam que, contrariamente ao invocado pela recorrente, o procedimento criminal não se mostra prescrito, pelo que não lhe assiste razão nesta parte.
9.º- Como acima se referiu, a responsabilidade solidária a que alude o n.º 3, do art.º 551.º, do CT, não pressupõe que a pessoa singular tenha, a qualquer título, praticado uma contraordenação.
10.º- Com efeito, ali apenas se estabelece uma garantia de satisfação do pagamento da coima, conforme se refere no sumário do a acórdão acima transcrito
11.º- Assim sendo, a recorrente AA enquanto gerente da arguida, e independentemente de ser só gerente de direito, é responsável solidária pelo pagamento da coima.
12.º- Pelo exposto, mais não resta do que referir que a douta sentença recorrida não padece de qualquer vício ou lapso e que na mesma foi feita uma correta interpretação dos preceitos legais aplicáveis, pelo que não é merecedora de qualquer censura, devendo, por isso, ser mantida.
Por todo o exposto, deve a douta sentença recorrida ser mantida, negando-se, consequentemente, provimento ao recurso interposto.
Porém, V. Exªs. decidindo farão
JUSTIÇA.”
Subidos os autos a este Tribunal da Relação, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto deu por reproduzidas as doutas contra-alegações apresentadas na 1.ª instância e emitiu Parecer no sentido de ser mantida a sentença recorrida.
Não houve resposta ao Parecer.
Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir.
Objecto do recurso
De acordo com os artigos 33.º n.º 1 e 50.º n.º4 da Lei n.º 107/2009, de 14 de Setembro, e, subsidiariamente, com os artigos 403.º n.º 1 e 412.º n.º 1 do CPP aplicáveis ex vi do artigo 74.º n.º 4 do DL nº 433/82, de 27 de Outubro e com a jurisprudência fixada pelo Acórdão do Plenário das Secções do STJ de 19.10.1995 (in DR, série I-A, de 28.12.1995), o âmbito do recurso define-se pelas conclusões que o recorrente extraia da respectiva motivação, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso, designadamente a verificação dos vícios indicados no n.º 2 do artigo 410.º do CPP.
No presente recurso foram submetidas à apreciação deste Tribunal as questões seguintes:
1.ª- Se o procedimento contraordenacional prescreveu.
2.ª- Se AA não pode ser responsabilizada pelo pagamento da coima.
Fundamentação de facto
A sentença recorrida considerou provados os seguintes factos:
1 - A Arguida exerce a atividade de “importação, exportação e comercialização de equipamentos industriais, projectos e montagens”.
2 - De acordo com o Relatório Único referente ao ano de 2016, a Arguida obteve um volume de negócios de € 64.788,00.
3 - No dia 02 de Outubro de 2017, foi realizada pela inspetora autuante, acompanhada pelo Inspetor FF, visita inspetiva ao local de trabalho supra identificado.
4 - No local foi identificado ao serviço da Arguida, sob as suas ordens, direção, fiscalização e mediante retribuição, o trabalhador BB, admitido a 01 de Agosto de 2009, com a categoria de empregado de armazém e a auferir uma retribuição mensal no valor de € 557,00.
5 - Foi também apurado que a empresa tinha ao seu serviço um outro trabalhador CC, admitido em 1 de Abril de 1997, com a categoria de encarregado de armazém e a auferir mensalmente uma remuneração de € 1.200,00.
6 - Na sequência da visita inspetiva foi a Arguida notificada para apresentação de documentos até ao dia 9 de Outubro de 2017, onde foram solicitados, entre outros, documentos relativos a questões de segurança e saúde no trabalho.
7 - Posteriormente, foi efetuada consulta à Base de Dados dos Relatórios Únicos, nomeadamente o anexo D, tendo-se verificado que a Arguida não tinha os serviços de segurança e saúde no trabalho organizados.
8 - Assim, constatou-se que, à data da visita inspetiva, a Arguida não tinha organizados os serviços de segurança e saúde no trabalho, em nenhuma das modalidades legalmente previstas, pelo que incorreu na contraordenação pela qual vem acusada.
9 - Acresce ainda que na referida notificação para apresentação de documentos foi também solicitado o envio ou apresentação da apólice de acidentes de trabalho e de doenças profissionais para entidades legalmente autorizadas a realizar estes seguros.
10 - Ora, na data agendada para o efeito, nem posteriormente, a Arguida fez prova de ter transferido essa responsabilidade para uma companhia de seguros.
11 - Constatou-se assim que a entidade empregadora, não transferiu a responsabilidade emergente por acidentes de trabalho e doenças profissionais para entidade legalmente autorizada a realizar este seguro, para os trabalhadores BB e CC.
12 - A Arguida, ao não efetuar um seguro de acidentes de trabalho, fragilizou a posição dos seus trabalhadores no que respeita a acidentes de trabalho.
13 - A Arguida não agiu com a diligência a que estava obrigada enquanto entidade empregadora.
14 - Ao não transferir a responsabilidade civil pela reparação dos danos emergentes dos acidentes de trabalho para uma entidade seguradora para os seus dois trabalhadores incorre nas duas contraordenações de que vem acusada.
15 - Ainda no decorrer da visita inspetiva verificou-se que as instalações sanitárias existentes e usadas pelos trabalhadores não eram limpas e não dispunham de sabonete líquido, nem de um meio individual de secagem de mãos.
16 - Notificada para tomar medidas e promover a limpeza periódica das instalações sanitárias, bem como para colocar na mesma, sabão líquido e um meio individual de secagem das mãos, nada fez.
17 - A Arguida não agiu com a diligência a que estava obrigada e de que era perfeitamente capaz, incorrendo desta forma nas contraordenações de que vem acusada.
Mais se provou que:
18 - AA não contratava, despedia ou dava ordens aos empregados da sociedade até à morte do seu marido DD, em 30 de Novembro de 2020.
19 – AA não fazia encomendas de bens ou contratava serviços, junto a terceiros.
20 - AA não ordenava, determinava ou controlava a produção e/ou a actividade da sociedade devedora originária.
21 - AA não fiscalizava as actividades executadas pela sociedade, mormente no que respeita a qualquer relação com as finanças, directamente ou através de TOC ou ROC.
22 - AA não celebrava quaisquer contratos com fornecedores ou outros de qualquer espécie.
23 - AA não agia por conta, à ordem ou no interesse da sociedade Arguida, nem, em seu nome, celebrava quaisquer negócios jurídicos.
24 - AA sempre foi doméstica.
25 - AA foi nomeada gerente da Arguida em 2010.
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As expressões constantes dos factos provados 8 (“pelo que incorreu na contraordenação pela qual vem acusada”) e 17 (“incorrendo desta forma nas contraordenações de que vem acusada)” integram matéria conclusiva e de direito, razão pela qual são eliminadas.
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Com interesse para a decisão, dos autos, ainda resultam provados os seguintes factos:
- O Auto de Notícia foi elaborado em 08.08.2022;
- As notificações para a arguida e a responsável solidária apresentarem defesa escrita foram elaboradas com data de 01.09.2022 e as cartas com A/R foram enviadas com data de 02.09.2022.
- AA foi notificada em 05.09.2022.
- A carta enviada à sociedade arguida em 02.09.2022 foi devolvida ao remetente ACT com a menção “ Não atendeu” e “Objecto não reclamado”.
- Em 30 de Setembro de 2022 apenas AA apresentou defesa escrita.
- Em 19.10.2022 foi elaborada nova notificação para a sociedade arguida.
- A carta com aviso de recepção para notificação da sociedade foi expedida com data de 19.10.2022.
- O aviso de recepção da carta enviada à sociedade arguida foi assinado mas dele não consta a data em que foi aposta a assinatura tendo, depois, dado entrada na ACT com data de 25.10.2022.
- Com data de 15.11.2022 foram elaboradas novas notificações para a arguida sociedade e para AA apresentarem resposta escrita.
-Em 16.11.2022 foram enviadas à sociedade arguida e a AA novas cartas com aviso de recepção para apresentarem resposta escrita.
-O A/R da carta enviada a AA foi assinado com data de 16.11.2022 por terceiro.
- O A/R da carta enviada à sociedade arguida foi assinado por CC e por outra pessoa com assinatura ilegível, com data de 18.11.2022.
-A decisão administrativa foi proferida no dia 02.10.2023.
-A carta para notificação da sociedade arguida, da decisão administrativa, veio devolvida.
- Em 08.11.2023 a ACT lavrou cota no processo fazendo constar que, “através do ofício n.º 2178/CO notifique a arguida com correio simples, nos termos da al. d) do art.º 8.º da alteração introduzida pela lei n.º 13/2023, de 03/04.”
- AA foi notificada da decisão administrativa em 06.10.2023.
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Fundamentação de direito
Comecemos, então, por apreciar se, como defendem as Recorrentes, o procedimento contraordenacional já prescreveu.
Sobre a questão pronunciou-se a sentença nos seguintes termos: “Da prescrição do processo contraordenacional Nos termos do artigo 54º, n.º 1 da Lei n.º 107/2009, de 14 de Setembro, o prazo de prescrição previsto no artigo 52º do mesmo diploma, que é de 5 anos, interrompe-se nas seguintes situações: “a) Com a comunicação ao arguido dos despachos, decisões ou medidas contra ele tomados ou com qualquer notificação; b) Com a realização de quaisquer diligências de prova, designadamente exames e buscas, ou com o pedido de auxílio às autoridades policiais ou a qualquer autoridade administrativa; c) Com a notificação ao arguido para exercício do direito de audição ou com as declarações por ele prestadas no exercício desse direito; d) Com a decisão da autoridade administrativa competente que procede à aplicação da coima.” No que concerne aos presentes autos, relativo aos factos praticados entre 02 de Outubro de 2017, com o início de procedimento com a inspecção ao local dos factos e a verificação das situações em causa. A Arguida foi notificada em 01 de Setembro de 2022 para exercer o contraditório ao auto de notícia elaborado em 08 de Agosto de 2022. Ora, nos termos do artigo supra citado, na sua alínea c), o prazo da prescrição interrompeu-se com a notificação para exercício do direito de audição em Setembro de 2022. Assim, aquando da prolação da decisão, em 02 de Outubro de 2023, ainda não tinham decorrido 5 anos desde a última interrupção do prazo de prescrição, nem tinha decorrido o prazo de prescrição acrescido de metade do mesmo, pelo que, sem necessidade de outros considerandos, é de improceder a prescrição invocada.”
Invocam as Recorrentes, por sua banda, que o procedimento contraordenacional já prescreveu.
Vejamos:
Dispõe o artigo 52.º da Lei n.º 107/2009, de 14 de Setembro, que “Sem prejuízo das causas de suspensão e interrupção da prescrição previstas no regime geral das contra-ordenações, o procedimento extingue-se por efeito da prescrição logo que sobre a prática da contra-ordenação hajam decorrido cinco anos”
Os factos imputados à arguida (e cuja prática não vem posta em crise) foram praticados em 02.10.2017, pelo que, atento o disposto no artigo 52.º da citada Lei, a prescrição ocorreria no dia 02.10.2022.
Contudo, importa apurar se, no caso dos autos, ocorreu alguma causa de suspensão ou interrupção da prescrição.
Dispõe o n.º 1 do artigo 54.º da Lei 107/2009, de 14 de Setembro, sob a epígrafe “Interrupção da prescrição” 1 - A prescrição do procedimento por contra-ordenação interrompe-se: a) Com a comunicação ao arguido dos despachos, decisões ou medidas contra ele tomados ou com qualquer notificação; b) Com a realização de quaisquer diligências de prova, designadamente exames e buscas, ou com o pedido de auxílio às autoridades policiais ou a qualquer autoridade administrativa; c) Com a notificação ao arguido para exercício do direito de audição ou com as declarações por ele prestadas no exercício desse direito; d) Com a decisão da autoridade administrativa competente que procede à aplicação da coima.”
Contudo, estabelece o n.º 3 da mesma norma que “A prescrição do procedimento tem sempre lugar quando, desde o seu início e ressalvado o tempo de suspensão, tenha decorrido o prazo da prescrição acrescido de metade”. Assim, a prescrição do procedimento contraordenacional tem sempre lugar quando, desde o seu início e ressalvado o tempo de suspensão, tenham decorrido 7 anos e 6 meses.
Ora, conforme resulta provado, as notificações para a arguida e a responsável solidária apresentarem defesa escrita foram elaboradas com data de 01.09.2022 e as cartas com A/R foram enviadas com data de 02.09.2022; AA foi notificada em 05.09.2022; a carta enviada à sociedade arguida em 02.09.2022 foi devolvida ao remetente ACT com a menção “ Não atendeu” e “Objecto não reclamado”; em 19.10.2022 foi elaborada nova notificação para a sociedade arguida; a carta com aviso de recepção para notificação da sociedade foi expedida com data de 19.10.2022; e o aviso de recepção da carta enviada à sociedade arguida foi assinado mas dele não consta a data em que foi aposta a assinatura tendo, depois, dado entrada na ACT com data de 25.10.2022.
Face à mencionada factualidade e atendo o que dispõe o artigo 8.º da Lei n.º 107/2009, de 14 de Setembro, na anterior redacção, entendemos resultar que a sociedade arguida foi notificada para apresentar defesa escrita apenas no dia 25.10.2022 e não em Setembro de 2022 como refere a sentença recorrida. Ou seja, quando a sociedade arguida foi notificada para apresentar defesa escrita, face ao disposto no artigo 52.º da Lei n.º 107/2009, de 14 de Setembro, o procedimento contraordenacional já estaria prescrito (como vimos, os 5 anos completavam-se no dia 02.10.2022).
Contudo, o prazo do procedimento contraordenacional suspendeu-se em virtude da aprovação das denominadas Leis Covid.
Senão vejamos.
Como é sabido, com vista a fazer face à situação epidemiológica gerada pelo Coronavírus-COVID 19 e na sequência da pandemia decretada pela Organização Mundial de Saúde em 11 de Março de 2020, foram adoptadas várias medidas, nomeadamente a nível legislativo.
Assim, no dia 19 de Março de 2021 foi publicada a Lei n.º 1-A/2020 que procedeu à ratificação dos efeitos do Decreto-Lei n.º 10-A/2020, de 13 de Março (Estabelece medidas excecionais e temporárias relativas à situação epidemiológica do novo Coronavírus - COVID 19) e aprovou medidas excecionais e temporárias de resposta à situação epidemiológica provocada pelo coronavírus SARS-CoV-2, agente causador da doença COVID-19 (art.1.º da referida Lei).
De acordo com o artigo 2.º da mesma Lei “O conteúdo do Decreto-Lei n.º 10-A/2020, de 13 de março, é parte integrante da presente lei, produzindo efeitos desde a data de produção de efeitos do referido decreto-lei”.
E quanto aos institutos da prescrição e da caducidade referia o n.º 3 do artigo 7.º da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de Março, que “A situação excecional constitui igualmente causa de suspensão dos prazos de prescrição e de caducidade relativos a todos os tipos de processos e procedimentos.”
Nos termos do n.º 4 do mesmo artigo “O disposto no número anterior prevalece sobre quaisquer regimes que estabeleçam prazos máximos imperativos de prescrição ou caducidade, sendo os mesmos alargados pelo período de tempo em que vigorar a situação excecional.”
Tendo sido suscitada a inconstitucionalidade destas duas normas, o Acórdão do Tribunal Constitucional 500/2021, de 9 de Junho de 2021, Processo n.º 353/2021, 3.ª Secção, Relator Conselheira Joana Fernandes Costa, decidiu “Não julgar inconstitucional o artigo 7.º, n.ºs 3 e 4, da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, interpretado no sentido de que a causa de suspensão do prazo de prescrição do procedimento contraordenacional aí prevista é aplicável aos processos a correr termos por factos cometidos antes do início da respetiva vigência;”
Por seu turno, dispõe o artigo 10.º da referida Lei que “A presente lei produz efeitos à data da produção de efeitos do Decreto-Lei n.º 10-A/2020, de 13 de março.”
De acordo com o seu artigo 37.º, o Decreto-Lei n.º 10-A/2020, de 13 de Março, produziu efeitos no dia da sua aprovação (12 de Março), com excepção do disposto nos artigos 14.º a 16.º, que produziu efeitos desde 9 de Março de 2020 e do disposto no capítulo VIII que produziu efeitos a 3 de Março de 2020.
Posteriormente, a Lei n.º 4-A/2020, de 06 de Abril alterou os artigos 7.º e 8.º da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de Março, mantendo-se, no entanto, a anterior redacção do n.º 3 do artigo 7.º
De acordo com o artigo 5.º desta Lei (Norma interpretativa) “O artigo 10.º da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, deve ser interpretado no sentido de ser considerada a data de 9 de março de 2020, prevista no artigo 37.º do Decreto-Lei n.º 10-A/2020, de 13 de março, para o início da produção de efeitos dos seus artigos 14.º a 16.º, como a data de início de produção de efeitos das disposições do artigo 7.º da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março.”
E nos termos do artigo 6.º da mesma Lei: “1 - Sem prejuízo do disposto no número seguinte, a presente lei produz efeitos à data de produção de efeitos do Decreto-Lei n.º 10-A/2020, de 13 de março. 2 - O artigo 7.º da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, na redação introduzida pela presente lei, produz os seus efeitos a 9 de março de 2020, com exceção das normas aplicáveis aos processos urgentes e do disposto no seu n.º 12, que só produzem efeitos na data da entrada em vigor da presente lei.”
Posteriormente, as Leis n.º 4-B/2020, de 6 de Abril e n.º 14/2020, de 9 de Maio, que também alteraram a Lei n.º 1-A/2020 de 19 de Março, não introduziram alterações nos n.ºs 3 e 4 do artigo 7.º.
Sucede que a suspensão dos prazos de prescrição e caducidade que vigorava desde 9 de Março de 2020 veio a cessar com a Lei n.º 16/2020, de 29 de Maio, que entrou em vigor no dia 3 de Junho de 2020, pois o seu artigo 8.º revogou o artigo 7.º da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de Maio.
Contudo, o artigo 6.º da Lei n.º 16/2020, de 29 de Maio estabeleceu que “Sem prejuízo do disposto no artigo 5.º, os prazos de prescrição e caducidade que deixem de estar suspensos por força das alterações introduzidas pela presente lei são alargados pelo período de tempo em que vigorou a sua suspensão.”
Posteriormente, a Lei n.º 4-B/2021, de 1 de Fevereiro, aditou à Lei n.º 1-A/2020, de 19 de Março o artigo 6.º-B que determinou nos números 3 e 4 o seguinte: “3 - São igualmente suspensos os prazos de prescrição e de caducidade relativos a todos os processos e procedimentos identificados no n.º 1. 4 - O disposto no número anterior prevalece sobre quaisquer regimes que estabeleçam prazos máximos imperativos de prescrição ou caducidade, aos quais acresce o período de tempo em que vigorar a suspensão. “
E o n.º 1 do artigo 6.º-B estatuía: “1 - São suspensas todas as diligências e todos os prazos para a prática de atos processuais, procedimentais e administrativos que devam ser praticados no âmbito dos processos e procedimentos que corram termos nos tribunais judiciais, tribunais administrativos e fiscais, Tribunal Constitucional e entidades que junto dele funcionem, Tribunal de Contas e demais órgãos jurisdicionais, tribunais arbitrais, Ministério Público, julgados de paz, entidades de resolução alternativa de litígios e órgãos de execução fiscal, sem prejuízo do disposto nos números seguintes.”
Por seu turno, o artigo 4.º da Lei n.º 4-B/2021, de 1 de Fevereiro determinou que o disposto nos artigos 6.º-B a 6.º-D da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de Março, produzia efeitos a 22 de Janeiro de 2021, sem prejuízo das diligências judiciais e actos processuais entretanto realizados e praticados.
A Lei n.º 13-B/2021, de 5 de Abril (Cessa o regime de suspensão de prazos processuais e procedimentais adotado no âmbito da pandemia da doença COVID-19, alterando a Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março), que entrou em vigor no dia 6 de Abril de 2021 (art.7.º), no seu artigo 6.º procedeu, à revogação dos artigos 6.º-B e 6.º-C da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de Março.
E o artigo 5.º da Lei n.º13-B/2021, de 5 de Abril estatuía que “Sem prejuízo do disposto no artigo anterior, os prazos de prescrição e caducidade cuja suspensão cesse por força das alterações introduzidas pela presente lei são alargados pelo período correspondente à vigência da suspensão. “
Assim, por força das citadas Leis, todos os prazos de prescrição e de caducidade estiveram suspensos de 9 de Março de 2020 a 2 de Junho de 2020 (86 dias), retomando a sua contagem no dia 03.06.2020 e de 22 de Janeiro de 2021 a 5 de Abril de 2021 (74 dias), no total de 160 dias. Ou seja, antes de verificada a prescrição do presente procedimento contraordenacional (02.10.2022) ocorreram duas suspensões do prazo da prescrição ditadas pelas Leis Covid, pelo que entendemos que o prazo de prescrição é alargado por 160 dias, donde, a prescrição ocorreria em 12 de Março de 2023.
Sucede, porém, que, em 25.10.2022, interrompeu-se o prazo de prescrição pelo facto de a arguida ter sido notificada para apresentar defesa por escrito. E da data da infracção (02.10.2017) até 25.10.2022, ressalvados os períodos de suspensão das Leis Covid, tinham decorrido 4 anos, 5 meses e 29 dias.
Em 04.03.2024, com a prolação do despacho preliminar, ocorreu nova suspensão, sendo que, até 03.03.2024 tinham decorrido 5 anos, 10 meses e 9 dias.
A sentença foi proferida em 10.05.2024, pelo que se reiniciou a contagem do prazo de prescrição a partir do dia seguinte, ou seja, a partir de 11.05.2024.
Assim, considerando, por um lado, o prazo de prescrição de 7 anos e 6 meses e, por outro, a data de 11.05.2024, faltam 1 ano, 7 meses e 26 dias para o respectivo termo que ocorrerá em 6 de Janeiro de 2026.
Relativamente à responsável solidária AA, como se escreve no Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 16.04.2015, consultável em www.dgsi.pt”Não se confundem o arguido com o responsável solidário. Ao primeiro é imputada a autoria de um ilícito contra-ordenacional, e é a esse nível que se situa a sua responsabilidade; o segundo é apenas civilmente responsável, enquanto co-devedor da sanção pecuniária relativa à infração. E a própria lei processual é clara a fazer essa distinção, quando no art.º 20º da citada Lei 107/2009 manda aplicar ao sujeito solidariamente responsável pelo pagamento da coima, com as necessárias adaptações, as disposições dos arts.º 17º, 18º e 19º, do mesmo diploma, todas elas respeitantes ao arguido, e apenas a ele.”
Nos termos do mesmo aresto, o responsável solidário goza de legitimidade para interpor recurso. E, acrescentamos nós, que, no âmbito do recurso, pode suscitar a questão da prescrição do procedimento contraordenacional.
E como também elucida o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 10.07.2019, Processo n.º 3405/18.7T8PNF.P1, consultável em www.dgsi.pt, que vem citado pelo Ministério Público,“I- A responsabilidade solidária de administradores, gerentes e directores pelo pagamento de coimas aplicadas às empresas, prevista no art.º 551º, nº 3, do CT, não pressupõe a prática, por estes, de qualquer ilícito contra-ordenacional, com base na culpa ou com base na culpa presumida, nem há qualquer transmissão da responsabilização pela prática da contra-ordenação. II - O art.º 551º, nº 3 do CT, apenas, institui uma solidariedade no pagamento da coima não na infracção, ou seja, consagra uma garantia de satisfação do pagamento da coima. III - Com efeito, os sujeitos ficam apenas responsáveis pelo pagamento da coima, não lhes sendo transmitida a autoria do ilícito contra-ordenacional em si mesma considerada.”
Ora, no caso, discute-se se ocorreu a prescrição do procedimento contraordenacional, procedimento este que respeita às contra-ordenações que foram praticadas pela sociedade e pelas quais a gerente da sociedade não é considerada co-autora. Como dito supra, a responsabilidade solidária do gerente cinge-se ao pagamento da coima, e só.
Sendo assim, como entendemos ser, uma vez que se concluiu que o presente procedimento contraordenacional não prescreveu relativamente à sociedade infractora, tal significa que se mantém a sua condenação no pagamento da coima que lhe foi aplicada e, consequentemente, que subsiste a obrigação solidária da gerente AA de proceder a esse pagamento, sem prejuízo da apreciação da 2.ª questão suscitada no recurso.
Donde, não fazer qualquer sentido estar a apreciar autonomamente se, relativamente a ela, o procedimento contraordenacional não prescreveu.
Em suma, conclui-se que, contrariamente ao que invocam os Recorrentes, o procedimento contraordenacional ainda não prescreveu.
Improcede, pois, o recurso nesta parte.
*
Vejamos, por fim, se a gerente AA não pode ser responsabilizada pelo pagamento da coima.
Sobre esta questão escreve-se na sentença recorrida: Da responsabilidade da gerente AA Veio AA recorrer ainda da decisão administrativa que a considera solidariamente responsável pelo pagamento da coima aplicada, porquanto à data dos factos não era gerente de facto, mas apenas gerente de direito. Dispõe o artigo 551º, n.º 3 do Código do Trabalho que: “3 - Se o infractor for pessoa colectiva ou equiparada, respondem pelo pagamento da coima, solidariamente com aquela, os respectivos administradores, gerentes ou directores.” A norma que prevê a responsabilidade do gerente pelo pagamento da coima não exige a gerência de facto da sociedade, estabelecendo que os gerentes ou administradores da empresa respondem pelo pagamento das mesmas. Tal responsabilidade não deriva da responsabilidade pela prática das infrações, mas da responsabilidade pela pessoa colectiva que praticou as mesmas. Ora, AA é agora a única gerente da arguida, logo a única responsável pela mesma, mantendo-se a sua solidariedade no pagamento da coima.”
Defende a responsável solidária, em suma, que nunca exerceu, de facto, a gerência da sociedade arguida, pois nunca praticou quaisquer actos de gerência da mesma.
Adiantamos, desde já, que não lhe assiste razão e que não merece censura o decidido pelo Tribunal a quo”
O n.º 3 do artigo 551.º do Código do Trabalho determina que “3 - Se o infractor for pessoa colectiva ou equiparada, respondem pelo pagamento da coima, solidariamente com aquela, os respectivos administradores, gerentes ou directores.”
Ora, a norma em causa institui a responsabilidade solidária dos administradores, gerentes ou directores da pessoa colectiva pelo pagamento das coimas aplicadas àquelas pessoas colectivas pela prática de contra-ordenações laborais.
A norma não exige que o representante da pessoa colectiva exerça de facto a gerência, limitando-se a estatuir a responsabilidade solidária dos seus representantes pelo pagamento das coimas aplicadas pela prática de contra-ordenações laborais.
Como refere a sentença recorrida, a gerente AA é a única gerente da arguida, pelo que é solidariamente responsável pelo pagamento da coima.
Improcede, pois, a pretensão dos Recorrentes e o recurso em toda a sua extensão.
As custas do recurso são da responsabilidade dos recorrentes (artigo 513.º n.º 1 e 3 do CPP e artigo 6.º n.º 2 do RCP).
Decisão
Face ao exposto, acorda-se em julgar o recurso improcedente e confirmar a sentença recorrida.
Custas do recurso pelos recorrentes, fixando-se a taxa de justiça no mínimo.
Lisboa, 29 de Janeiro de 2025
Celina Nóbrega
Alexandra Lage
Alda Martins