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PROCESSO ESPECIAL DE REVITALIZAÇÃO
OMISSÃO DE PUBLICAÇÕES
NULIDADE PROCESSUAL
MEIO DE REAÇÃO
Sumário
1- O processo especial de revitalização (PER) é um processo pré-insolvencial, recuperatório, híbrido, voluntário, concursal e urgente, que tem por finalidade que, na sequência das negociações nele encetadas entre a empresa (em situação económica difícil ou em situação de insolvência meramente iminente, mas ainda suscetível de ser recuperada) que a ele recorreu e os seus credores (com a participação e sob orientação e fiscalização do administrador judicial provisório), se alcance um acordo de recuperação daquela, que permita a sua revitalização (obstando, assim, que incorra numa situação de insolvência atual), o qual, uma vez aprovado por uma maioria qualificada de credores e homologado por sentença transitada em julgado, se impõe a todos os credores (independentemente de terem participado nas negociações e/ou na votação e, bem assim, do seu sentido de voto) quanto a créditos que detenham sobre aquela que se mostrem constituídos à data da prolação do despacho de nomeação do administrador judicial provisório. 2- Atenta essa finalidade prosseguida pelo PER e o seu regime processual, até ao termo do prazo de negociações (fixado legalmente em 2 meses, prorrogável por uma só vez, por um prazo máximo de um mês) a empresa tem de juntar ao processo um plano definitivo de recuperação, na sequência do que, a Secção tem de proceder à imediata publicação no portal Citius de anúncio, informando do depósito dessa proposta final de plano de recuperação apresentada pela empresa, para que todos os credores tomem conhecimento e o possam consultar caso nisso tenham interesse e possam, nos 5 dias subsequentes à publicação, proporem as alterações que entendam pertinentes ou alegar circunstâncias que impeçam a sua futura homologação judicial. 3- Verificando-se que a Seção não publicou aquele anúncio no portal Citius, incorreu-se numa nulidade processual secundária que acabou por ser sancionada pela sentença que o homologou (sentença recorrida), quando nem sequer se tinha iniciado o prazo de votação do mesmo pelos credores da empresa. 4- Essa nulidade processual secundária determina a nulidade de todo o processado posterior à junção ao PER do plano final de recuperação apresentado pela empresa, incluindo da sentença recorrida, que o homologou. 5- O modo de reação contra essa nulidade processual secundária é a interposição de recurso da sentença homologatória do plano final de recuperação junto pela empresa ao PER (que sancionou a nulidade processual secundária cometida).
Texto Integral
Acordam, em conferência, os Juízes Desembargadores da 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães no seguinte:
I- RELATÓRIO EMP01... – Unipessoal, Lda.,com sede no Parque Industrial ..., n.º 6, ..., instaurou, em 08/04/2024, ação especial de revitalização, pedindo que fosse nomeado para o cargo de administrador judicial provisório AA.
Por despacho de 11/04/2024, nomeou-se administrador judicial provisório AA, ordenou-se que fosse dado cumprimento ao disposto no art. 17º-C, n.ºs 5 e 8 do CIRE e consignou-se que: “Nos termos do art. 17º-D, n.º 2, qualquer credor dispõe de 20 dias contados da publicação no portal Citius do despacho a que se refere a alínea a), do n.º 3, do artigo anterior para reclamar créditos, devendo as reclamações ser remetidas ao administrador judicial provisório, que, no prazo de cinco dias, elabora uma lista provisória de créditos”.
Em 06/06/2024, o administrador judicial provisório juntou aos autos a lista provisória de créditos reconhecidos e não reconhecidos, a qual, uma vez publicada, não foi impugnada.
Em 05/08/2024, o administrador judicial provisório e a devedora, EMP01... – Unipessoal, Lda., requereram a prorrogação do prazo de negociações por um mês, tendo para o efeito junto aos autos acordo subscrito por ambos em 23 de junho de 2024.
Em 06/08/2024, a devedora juntou proposta definitiva de plano de recuperação.
Por despacho de 07/08/2024 prorrogou-se o prazo de negociações por um mês.
Em 04/10/2024, proferiu-se despacho em que se ordenou a notificação da devedora para, no prazo de três dias, dar cumprimento ao disposto no art. 17º, n.º 1, do CIRE.
Na sequência, por requerimento de 10/10/2024, a devedora informou e requereu: “(…), no passado dia 06 de agosto de 2024, procedeu ao envio do plano definitivo de revitalização – cfr. doc. n.ºs 1, 2 e 3. Por lapso o mesmo não foi publicitado, pelo que requer a V. Exa. que releve tal lapso e considere a apresentação do plano, uma vez que as mandatárias dos credores foram notificadas”. Não foi publicada a versão final do plano de recuperação apresentado pela devedora, conforme determinado pelo n.º 2, do art. 17º-F, do CIRE (cfr. teor da declaração antes parcialmente transcritae processo informático constante do Citius, onde não existe réstia de semelhante publicação). Também não foi pulicado no portal Citius o anúncio a que alude o n.º 3, do art. 17º-F, do CIRE (cfr. processo informático constante do Citius, de cuja consulta resulta que essa publicação não teve lugar).
Na sequência do requerimento apresentada pela devedora em 10/10/2024, em 14/10/2024, a 1ª Instância ordenou que se notificasse o administrador judicial provisório para que juntasse aos autos o resultado da votação do plano.
Nessa sequência, em 05/11/2024, o administrador judicial alegou e requereu que: “(…), nos termos do artigo 17º-F, vem muito respeitosamente juntar aos autos o resultado da votação, conforme Doc. 1, que se junta em anexo. Conforme se constata pelo referido documento, a devedora logrou aprovar o plano de recuperação, uma vez que foi votado por credores cujos créditos apresentam mais de um terço do total dos créditos (al. b), n.º 5, do art. 17º-F) e cumulativamente recolheu o voto favorável de mais de dois terços da totalidade dos votos emitidos (al. b.i), n.º 5, do art. 17º-F) e o voto favorável de mais de 50% dos votos emitidos (al. b.ii), n.º 5, do art. 17º-F)”.
Juntou em anexo a esse requerimento o “Quadro de Votação” que se segue:
A B C D E F G
N.º Nome do credor Créditos reconhecidos % Votos emitidos Favor Contra
1 AT 104.901,34 euros 21,53% 0,00 euros
2 EMP02... – Segurança, Higiene e Saúde no Trabalho, Lda. 982,32 euros 0,20% 0,00 euros
3 Instituto da Segurança Social, IP (...) 147.710,88 euros 30,32% 0,00 euros
4 EMP03... – Serviços de Comunicação
E Multimédia, S.A. 1.609,50 euros 0,33% 0,00 euros
5 EMP04... – Máquinas de Costura Industriais, Sociedade Unipessoal, Lda. 231.949,36 euros 47,61% 231.949,36 euros 231.949,36 euros
6 EMP05... Alarmes, Dissuasão Portugal, Unipessoal, Lda. 11,07 euros 0,00% 0,00 euros
Total em Euros 487.164,47 euros 100% 231.949,36 euros 231.949,36 euros 0,00 euros
Quadro de resultados
Quórum - Al. b), n.º 5, do art. 17º-F (E:C) - (superior a 1/3) 47,61%
Al. b.i), n.º 5, do art. 17º-F (F:E) – (superior a 2/3) 100,00%
Al. b.ii), n.º 5, do art- 17º-F (F:E) – (superior a 50%) 100,00%
Seguiu-se ao requerimento acabado de referir a prolação, em 11/11/2024, de sentença homologando o plano de recuperação apresentado pela devedora, a qual consta do seguinte teor (que aqui se transcreve ipis verbis): “Nos termos do artigo 17-F nº 5 do CIRE, o Juiz decide se deve homologar o Plano ou recusar a homologação, “nos dez dias seguintes à receção da documentação mencionada nos números anteriores, (…) aplicando, com as necessárias adaptações, as regras vigentes em matéria de aprovação e homologação do plano de insolvência previstas no Título IX, em especial, o disposto nos artigos 194º a 197º, no n.º 1 do art.º 198º, 200º a 202º, 215º e 216º (…)”. A aprovação do plano, ou melhor, a aferição da aprovação do plano, é um pressuposto da sua homologação, pois só um plano aprovado, seja por unanimidade ou por maioria, é sujeito ao juízo de homologação previsto no n.º 7 do art.º 17º- F (cfr. Ac. da RL de 11/01/2022, processo 289/19.1T8VFX.L1-1, consultável in www.dgsi.pt/jtrl). Conforme se constata pelo referido documento, a Devedora logrou aprovar o plano de recuperação, uma vez que foi votado por credores cujos créditos representam mais de um terço do total dos créditos (alin. b, n.º 5 do art. 17-F) e cumulativamente recolheu o voto favorável de mais de dois terços da totalidade dos votos emitidos (alin. b.i, n.º 5 do art. 17-F) e o voto favorável de mais de 50% dos votos emitidos (alin. b.ii, n.º 5 do art. 17-F). Estando reunidos os pressupostos de reunião e de deliberação do plano, com votação favorável pela maioria exigida no art. 17.º-F n.º 5 do C.I.R.E. e inexistindo os fundamentos a que aludem os arts. 215.º e 216.º do C.I.R.E. ex vi art. 17.º, n.º 5 do mesmo diploma que impusessem a não homologação do plano de revitalização junto aos autos, homologa-se o plano de recuperação conducente à revitalização da devedora EMP01... - Unipessoal, Lda. (NIF ...22) junto aos autos (art. 17.º-F, n.º4 do C.I.R.E), sendo que a referida homologação vincula os credores (art. 17-F.º, n.º11 do CIRE).
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Notifique, publique e registe nos termos do disposto no art. 37.º e 38.º do CIRE ex vi art. 17.º-F, n.º11 do mesmo diploma legal.
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Custas do processo de homologação a cargo do devedor, devendo ser emitida e respetiva nota de custas (cfr. art. 17.º-F, n.º12)”.
Inconformado com o decidido, o credor Centro Distrital de Segurança Social de ..., do Instituto da Segurança Social, I.P., interpôs recurso da sentença homologatória acabada de referir, em que formulou as seguintes conclusões:
A) A douta sentença viola as regras aplicáveis quanto à votação dos credores previstas no Código da Insolvência e da recuperação de Empresas;
B) Sendo certo que ainda não começou a correr o prazo para votação dos credores, ainda não tendo sido publicado o anúncio nos termos do n.º 3, do art. 17º F do CIRE: anúncio da junção ou não junção de nova versão do plano.
C) Não pode haver homologação de plano de revitalização considerando a violação de formalidade essencial na votação.
D) Nos termos do art. 17º F, n.º 1 do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas até ao último dia do prazo de negociações a empresa deposita no tribunal a versão final do plano de revitalização, acompanhada de todos os elementos previstos no art. 195º, aplicável com as devidas adaptações, sendo de imediato publicada no portal Citius a indicação do depósito.
E) O que no caso não se verifica: não foi publicada em Citius a informação de depósito do plano.
F) Não tendo havido a publicitação do plano os credores não foram avisados do seu conteúdo nem puderam nos autos alegar o que tivessem por conveniente, designadamente circunstâncias suscetíveis de levar à sua não homologação.
G) Nem tendo tampouco existido verdadeira negociação posterior ao conhecimento da versão do plano.
H) Verifica-se igualmente que não foi publicada a não junção de nova versão do plano como sempre se imporia por força do art. 17º F, no seu n.º 3, que se passa a reproduzir «findo o prazo previsto no número anterior é publicado no portal Citius anúncio advertindo da junção ou não junção de nova versão do plano, correndo desde a publicação referida o prazo de votação de 10 dias, no decurso do qual qualquer interessado pode solicitar a não homologação do plano, nos termos e para os efeitos previstos nos artigos 215º e 216º, com as devidas adaptações».
I) Assim sendo, o prazo para a votação do plano ainda não se iniciou nos termos da citada norma legal, n.º 3 do art. 17º F.
J) Termos nos quais à falta de publicitação pela secretaria, a sentença recorrida deve ser substituída por decisão judicial que ordene a publicitação quer do depósito do plano de revitalização, quer posteriormente da junção ou não junção aos autos de nova versão do plano de revitalização, cumprindo-se o determinado nos artigos 17º F, n.º 1 e n.º 3, e enquanto formalidades essenciais: publicidade aos credores.
K) Só aí se iniciando o prazo para a votação dos credores, nos termos legais,
L) Assim sendo, a sentença recorrida viola o disposto no art. 17º F do CIRE, com nulidade de todo o processado após a preterição da formalidade essencial da publicidade obrigatória no processo de revitalização nos termos do art. 195º do Código de Processo Civil, a partir do depósito do plano de revitalização.
O que requer.
Termos em que, deverá o presente recurso ser julgado procedente, revogando-se a sentença recorrida no processo em epígrafe, com todas as ínsitas consequências, como é de Justiça.
Também o Ministério Público, em representação da credora Fazenda Nacional, interpôs recurso da sentença homologatória do plano de recuperação, em que formulou as conclusões que se seguem:
1. A 11.11.2024 foi proferida sentença homologatória do plano (PER) apresentado pela sociedade devedora “EMP01... – Unipessoal, Lda.”, plano este que prevê, além do mais, que:
“b. Credores Públicos
i. Os créditos das entidades públicas serão liquidados pela sociedade nos termos legais em vigor à data da aprovação do plano, no prazo máximo legalmente admissível, de 150 prestações iguais e sucessivas.
ii. Nos mesmos termos legais anteriormente referidos serão reduzidos as taxas e os valores dos juros vencidos e vincendos.
iii. Farão parte integrante do plano a aprovar e homologar os despachos que vierem a ser emitidos pelas entidades públicas.”
2. A sociedade devedora, não obstante ter junto ao processo a versão final do plano de recuperação, a 6 de agosto de 2024, renovando-o a 10 de outubro de 2024, o mesmo não foi publicado no Citius, conforme imposto pelo artigo 17º - F, n.º 1, do CIRE.
3. A falta de publicação impediu os credores, designadamente a Fazenda Nacional, de conhecer o teor do plano de recuperação, de alegar nos autos oque tivesse por conveniente quanto ao plano depositado pela empresa, designadamente circunstâncias suscetíveis de levar à não homologação do mesmo, e de solicitar a não homologação do plano.
4. A falta de publicação do plano no portal Citius não pode ser corrigido através de mero despacho do M. Juiz, o qual inclusivamente não foi proferido.
5. O incumprimento desta norma legal, que impõe a publicação no portal Citius – artigo 17º F, do CIRE, constitui uma nulidade, que deverá ser declarada, anulando-se todos os atos posteriores ao depósito do plano de recuperação, conforme previsto no artigo 195º, n.º 1 e n.º 2, do Código de Processo Civil.
6. Conclui-se, assim que, a sentença homologatória doplano de recuperação ora recorrida viola o disposto nos artigos 17º - F, n.º 1, n.º 2 e n.º 3, do CIRE.
7. Acresce que, da cláusula do plano de recuperação supratranscrita (9. Credores públicos, b), ii) resulta claramente uma redução do pagamento pela devedora dos juros e taxas vencidos e vincendos devidos ao Estado - Fazenda Nacional. O que constitui, sem margem para dúvida, uma diminuição unilateral dos créditos fiscais, o que é expressa e imperativamente proibido pelos artigos 30º, n.º 2 e n.º 3, e 36º, da Lei Geral Tributária e artigos 85º, 196º e 199º, do Código de Procedimento e Processo Tributário. Ou seja, o crédito tributário é indisponível.
8. A sentença homologatória do plano de recuperação viola o disposto nos artigos 30º, n.º 2 e n.º 3, e 36º, da Lei Geral Tributária e artigos 85º, 196º e 199º, do Código de Procedimento e Processo Tributário, pelo que, deverá ser revogada.
9. Caso assim não se entenda, e no que concerne à Fazenda Nacional, deverá então ter-se por não escrito e ineficaz o estabelecido no ponto 9, alínea b), ii), do plano de recuperação apresentado nos autos, atenta indisponibilidade dos créditos fiscais.
Nestes termos, deverá ser concedido provimento ao presente recurso, revogando-se a sentença homologatória ora recorrida ou substituindo-a por outra que, no que concerne à Fazenda Nacional, consigne como não escrito e ineficaz o plano de recuperação apresentado nos autos, atenta indisponibilidade dos créditos fiscais.
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Não foram apresentadas contra-alegações.
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A 1ª Instância admitiu os recursos como sendo de apelação, com subida imediata, nos próprios autos e com efeito devolutivo, o que não foi alvo de modificação no tribunal ad quem.
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Corridos os vistos legais, cumpre decidir.
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II- DO OBJETO DOS RECURSOS
O objeto dos recursos é delimitado pelas conclusões da alegação dos recorrentes, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que sejam de conhecimento oficioso - cfr. artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1 e 2, do CPC.
Acresce que, o tribunal ad quem também não pode conhecer de questão nova, isto é, que não tenha sido, ou devesse ser, objeto da decisão sob sindicância, salvo se se tratar de questão que seja do conhecimento oficioso, dado que, sendo os recursos os meios específicos de impugnação de decisões judiciais, mediante o reexame de questões que tenham sido, ou devessem ser, nelas apreciadas, visando obter a anulação da decisão recorrida (quando padeça de vício determinativo da sua nulidade) ou a sua revogação ou alteração (quando padeça de erro de julgamento, seja na vertente de erro de julgamento da matéria de facto e/ou na vertente de erro de julgamento da matéria de direito), nos recursos, salvo a já enunciada exceção, não podem ser versadas questões de natureza adjetivo-processual e/ou substantivo material sobre as quais não tenha recaído, ou devesse recair, a decisão recorrida[1].
No seguimento desta orientação cumpre ao tribunal ad quem apreciar as seguintes questões:
No âmbito dos dois recursos
1- Se a sentença recorrida e, bem assim, todo processado subsequente à junção aos autos pela devedora, em 06 de agosto de 2024, da versão final do plano de recuperação homologado são nulos (decorrente de não se ter procedido à publicação daquela versão final do plano de recuperação, determinada pelo n.º 2, do art. 17º-F do CIRE, e de não se ter publicado no portal Citius o anúncio a que se reporta o n.º 3 da mesma disposição legal) e se, em consequência, se impõe declarar a nulidade de todo o processado após a junção ao processo, em 06 de agosto de 2024, da referida versão final de plano de recuperação apresentada pela devedora, incluindo a sentença recorrida, que o homologou, e determinar que a 1ª Instância proceda às ditas publicações? A improceder a questão acabada de referir, no âmbito do recurso interposto pelo Ministério Público, em representação da credora Fazenda Nacional
2- Se a sentença recorrida (ao homologar o plano de recuperação quanto ao crédito detido pela credora Fazenda Nacional sobre a devedora) padece de erro de direito, por violação do regime jurídico dos arts. 30º, n.º 2, 36º, da Lei Geral Tributária, 85º, 196º e 199º do Código de Procedimento e Processo Tributário, e se, em consequência, se impõe revogar aquela ou, subsidiariamente, declarar ineficaz o estabelecido no ponto 9º, alínea b.ii) do plano de recuperação homologado em relação à credora Fazenda Nacional?
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III- DA FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
Os factos que relevam para a decisão a proferir no âmbito dos presentes recursos são os que constam do «I-Relatório» supra elaborado, que aqui se dão por integralmente reproduzidos.
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IV- DA FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA
A- Da omissão das publicações previstas nos n.ºs 2 e 3, do art. 17º do CIRE
Tendo a devedora, EMP01... – Unipessoal, Lda., junto ao presente processo especial de revitalização, em 06 de agosto de 2024, proposta definitiva de plano de recuperação, não tendo sido realizada a publicação prevista no n.º 2, do art. 17º-F do CIRE daquela proposta final, nem do anúncio a que alude o n.º 3 do mesmo dispositivo legal, está em causa no âmbito dos presentes recursos determinar quais as consequências jurídicas decorrentes de se ter omitido o cumprimento das mencionadas formalidades legais previstas nas ditas disposições legais.
A.1- Processo especial de revitalização
O processo especial de revitalização (doravante PER) foi introduzido na ordem jurídica nacional pela Lei n.º 16/2012, de 20 de abril, que procedeu à revisão do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (CIRE), e teve origem no memorando celebrado, em 2011, entre o Estado Português, o Banco Central Europeu, a Comissão Europeia e o Fundo Monetário Internacional, no qual se consignou como medida estrutural para a estabilidade financeira a revisão do Código de Insolvência, “a fim de facilitar o resgaste efetivo de empresas viáveis e apoiar a reabilitação de indivíduos financeiramente responsáveis”.
O objetivo do PER foi dotar o ordenamento jurídico nacional de um mecanismo com cariz de revitalização empresarial, em detrimento da liquidação das empresas e dos empresários, quando se encontrassem em situação economicamente difícil ou em situação de insolvência meramente iminente, que fossem suscetíveis de serem revitalizados, de modo a evitar que incorressem numa situação de insolvência atual[2], mediante a aprovação de um plano de recuperação (n.º 1, art. 17º-A do CIRE, a que se referem todas as disposições que se venham a citar sem menção em contrário).
Com efeito, nos termos do art. 17º-A, n.º 1, o processo em causa caracteriza-se pelo facto de permitir à empresa entabular negociações com os seus credores com a finalidade de celebraram um acordo de recuperação que conduza à sua revitalização, de modo a evitar que incorra em situação de insolvência.
O PER consubstancia-se, portanto, num processo especial, pré-insolvencial e recuperatório aplicável às empresas, entendidas enquanto organização de capital e de trabalho destinada ao exercício de qualquer atividade económica (art. 5º), quer sejam detidas por pessoa singular, pessoa coletiva ou integrem um património autónomo (art. 2º, n.º 1), que se encontrem em situação económica difícil ou em situação de insolvência meramente iminente, mas que ainda sejam suscetíveis de recuperação, em que nele são entabuladas negociações entre a empresa e os seus credores, com a participação e sob orientação e fiscalização do administrador judicial provisório, com o objetivo de que entre aqueles (empresa e credores) chegarem a um acordo que possibilite a revitalização da empresa, evitando que incorra em situação de insolvência.
Por conseguinte, o processo em causa prossegue dois objetivos: um imediato, que consiste na renegociação do passivo da empresa em situação económica difícil ou em situação de insolvência iminente; e um mediato, que é a recuperação da empresa[3].
O evitar que a empresa em situação económica difícil ou de insolvência iminente caia numa situação de insolvência atual passa pela adoção de medidas recuperatórias, as quais naturalmente se traduzem ou na redução do seu passivo e/ou no prolongamento do prazo para a liquidação deste.
Destarte, enquanto o processo de insolvência visa dar “resposta para a superação de uma situação de insolvência já verificada, a que a ordem jurídica pretende pôr cobro, o processo de revitalização dirige-se a evitá-la, assegurando a recuperação do devedor e, nessa medida, a satisfação, também, dos interesses dos seus credores”[4].
Em face do que se vem dizendo, o PER, além de ser um processo especial, pré-insolvencial e recuperatório, tem também natureza híbrida, na medida em que é composto por uma forte componente extrajudicial (a fase das negociações entre a empresa e os credores, com a participação, orientação e fiscalização do administrador judicial provisório), e uma fase judicial ou intra-processual, em que o juiz é chamado a intervir em momentos chave, que reclamem um controlo jurisdicional efetivo, como é o caso: do controlo inicial do processo, a fim de verificar se a empresa devedora que se apresenta a PER se encontra efetivamente numa situação de facto que lhe permita recorrer ao processo em causa e, bem assim se estão (ou não) cumpridas as formalidades necessárias para o prosseguimento do processo (arts. 17º-A, nºs 1 e 2, 17º-B, n.ºs 1 e 2); a nomeação de administrador judicial provisório (arts. 17º-C, n.º 3, al. a) e 17º-E, n.º 2); a instrução e a decisão do incidente relativo à impugnação dos créditos (art. 17º-D, n.º 2 in fine); o cômputo dos votos e a prolação de decisão de homologação (ou não) do plano de recuperação aprovado pela maioria qualificada dos credores da empresa devedora (arts. 17º-F, nºs 4 e 5, 215º e 216º).
Constituindo, porém, o princípio do pactum sunt servanda pedra angular da ordem jurídica civil nacional (art. 406º, n.º 1 do CC), nos termos do qual os contratos têm de ser pontualmente cumpridos, apenas podendo modificar-se ou extinguir-se por mútuo consentimento dos contraentes e nos casos admitidos na lei (art. 406º, n.º 1 do CC), naturalmente que as medidas de revitalização da empresa em situação económica difícil ou em situação de insolvência meramente iminente não possam ser impostas unilateralmente à empresa nem aos seus credores.
Daí que o PER se caracterize por ser um processo voluntário, no sentido de apenas poder ser instaurado por iniciativa insubstituível da empresa que se encontre em situação económica difícil ou em situação de insolvência meramente iminente, mas que ainda seja suscetível de recuperação.
Dito por outras palavras, apenas a empresa que se encontre numa das referidas situações que lhe consentem o recurso a PER tem legitimidade ativa para instaurar o mencionado processo especialíssimo.
Acresce que, quando a ela recorra, a empresa tem a faculdade de pôr termo a todo o tempo às negociações iniciadas com os seus credores, independentemente da causa que preside a essa sua decisão (art. 17º-G, n.º 2), com o que põe termo ao mencionado processo.
Por outro lado, porque os credores de empresa que se encontre em situação económica difícil ou em situação de insolvência meramente iminente, mas que ainda seja suscetível de recuperação, não podem ser compelidos a entrar com ela em negociações com vista à sua revitalização (o que passará, reafirma-se, pela redução dos créditos que sobre ela detêm ou pela extensão do prazo de pagamento desses créditos), o processo em causa tem de ser instaurado pela empresa devedora, acompanhado de uma declaração escrita, subscrita por si e por credor ou credores que, não estando especialmente relacionados com a mesma, sejam titulares de, pelo menos 10% de créditos não subordinados, relacionados ao abrigo da alínea b), do n.º 3, do art. 17º-C, em que manifestem ser sua vontade entabularem negociações conducentes à revitalização da empresa, por meio de aprovação de plano de recuperação (art. 17º-C, n.º 1).
Além disso, atento a natureza voluntário do PER, reconhece-se aos credores o direito de a todo o tempo aderirem às negociações que nele foram encetadas entre a empresa devedora e os seus credores (art. 17º-D, n.º 7) e, bem assim, o direito de voto (arts. 17º-I e 73º, n.º 1), o qual são livres de o exercerem ou não e, no caso de o exercitarem, de o fazer como bem entenderem.
O PER, para além das já enunciadas características de processo especial, pré-insolvencial, recuperatório e voluntário, é ainda um processo consensual, na medida em que o atingimento do fim essencial por ele prosseguido (a recuperação da empresa em situação económica difícil ou em situação de insolvência meramente iminente, mas que ainda seja suscetível de recuperação, mediante a celebração de um acordo de recuperação entre a empresa devedora e os seus credores, que permita a sua revitalização) se processa através do estabelecimento de negociações entre a empresa e os seus credores (art. 17º-D, n.º 5), em que a aprovação do acordo de recuperação passa pela formação de um quórum constitutivo e deliberativo qualificado de credores (art. 17º-F, n.º 5), que justifica que a vontade maioritária qualificada dos credores que aprovaram o acordo de recuperação que veio a ser homologado judicialmente, por sentença transitada em julgado, se imponha a todos os credores, ou seja: aos credores que aprovaram o plano de recuperação que foi homologado judicialmente, por sentença transitada em julgado, mas também aos credores que não puderam participar nas negociações, nem na votação daquele acordo de recuperação (por não terem reclamado os seus créditos no prazo legal, ou que, tendo-o feito, ou que viram os seus créditos, apesar de não reclamados, reconhecidos pelo administrador provisório de insolvência na lista provisória de créditos, viram-nos impugnados, com sucesso, pela empresa e/ou pelos restantes credores), e ainda aos que decidiram não participar naquelas negociações e/ou na votação do plano que veio a ser aprovado pela maioria qualificada dos credores e que acabou por ser homologado, por vontade própria, e, também, aos que tendo participado ou não nas negociações votaram contra a sua aprovação.
O plano de recuperação aprovado pela maioria qualificada dos credores da empresa e que veio a ser homologado, por sentença transitada em julgado, aplica-se/vincula todos os credores da empresa devedora quanto aos créditos que detêm sobre a última e que se encontravam constituídos à data em que foi proferido o despacho nomeando à empresa administrador judicial provisório (art. 17º-F, n.º 11).
Acresce frisar que o PER é também um processo concursal, na medida em que permite que todos os credores da empresa que tenham interesse em participar nas negociações e na votação do plano de recuperação o possam fazer efetivamente, impondo-se para o efeito que a empresa que recorra ao PER, logo que seja proferido despacho nomeando-lhe administrador judicial provisório, tenha de notificar todos os seus credores que não tenham subscrito a declaração que acompanha a petição inicial, por carta registada, informando-os que deu início a negociações com vista à sua revitalização e convidando-os a participar nessas negociações (art. 17º-D, n.º 1). E o acordo de recuperação que venha a ser aprovado pela maioria qualificada dos credores e homologado judicialmente, por sentença transitada em julgado, conforme antedito, vincula todos os seus credores que detenham créditos sobre aquela constituídos à data da prolação do despacho nomeando-lhe administrador judicial provisório (n.º 11, do art. 17º-F).
Finalmente, atenta a finalidade prosseguida pelo PER (a revitalização de empresa em situação económica difícil ou em situação de insolvência meramente iminente, mas que ainda seja suscetível de ser recuperada), este tem natureza urgente (art. 17º-A, n.º 3).
A natureza urgente atribuída legalmente ao PER não se cinge apenas à relação do tribunal com o processo, mas faz-se sentir ao longo de toda a sua tramitação processual, onde este se encontra submetido a regras próprias e específicas para a notificação de atos processuais, se limita ao máximo os atos processuais a serem nele praticados, estabelecem-se prazos perentórios extremamente curtos para a prática dos atos processuais neles previstos, sujeita-se a contagem desses prazos a regras específicas, as quais, em determinadas situações fogem à regra geral da continuidade dos prazos processuais do art. 138º do CPC, e em que se estabelece um prazo máximo de dois meses para a empresa concluir as negociações com os seus credores, e limites à prorrogação desse prazo, o qual apenas pode ser prorrogado por uma só vez e por um mês (n.º 7, do art. 17º-D)[5].
Por último, importa referir que, dadas as especificidades próprias do mencionado processo especialíssimo e o seu caráter urgente, quando a sua disciplina jurídica (regulada nos arts. 17º-A a 17-J) não seja autossuficiente para regular todos os aspetos jurídicos que nele se suscitem, a resolução dos casos omissos faz-se por recurso, em primeiro lugar às disposições gerais do CIRE, mas apenas na medida em que estas não se mostrem incompatíveis com a disciplina jurídica do PER e os princípios próprios e específicos que inspiram o seu regime jurídico (n.º 3, do art. 17º-A), e apenas quando estas são solucionem o caso omisso, se impõe recorrer, a título secundário, às disposições do CPC, mas apenas na estrita medida em que estas não contrariem o regime jurídico e os princípios que inspiram o CIRE, mormente, o regime específico do PER nele regulado (n.º 1, do art. 17º)[6].
Em suma, decorre do excurso antecedente que o PER é um processo especial, pré-insolvencial, recuperatório, híbrido, voluntário, consensual, concursal e urgente, que tem por finalidade que, na sequência das negociações nele entabuladas entre a empresa que a ele recorra (por via de se encontrar em situação económica difícil ou em situação de insolvência meramente iminente, mas que ainda seja suscetível de ser recuperada) e os seus credores se obtenha um acordo de recuperação que permita a sua revitalização, acordo esse que, uma vez aprovada por uma maioria qualificada dos seus credores e que, uma vez homologado por sentença transitado em julgado vincula todos os seus credores quanto aos créditos que sobre ele detenham que se mostrem constituídos à data em que foi proferido despacho nomeando-lhe administrador judicial provisório, obstando-se por esta via que aquela incorra numa situação de insolvência atual[7]. A.2- Nulidades processuais e modos de reação contra aquelas
Posto isto, urge referir que o processo jurisdicional, do ponto de vista estrutural, é composto por uma sequência de atos jurídicos, logicamente encadeados entre si, ordenados em fases sucessivas, com vista à obtenção da providência requerida pelo autor, requerente ou exequente[8], cujos requisitos e formalidades variam em função das diferentes formas de processos previstas e reguladas na lei adjetiva.
Sempre que o juiz se desvie do formalismo processual prescrito para a forma processual em que se encontra a laborar, praticando nele um ato que a lei adjetiva não admita (proíba), omita um ato que esta prescreva, ou pratique um ato imposto ou permitido pela lei adjetiva, mas com preterição das formalidades por aquela requeridas, o mesmo incorre em error in procedendo, erro esse que se reconduz ao cometimento de uma nulidade processual quando a lei o determine expressamente (nulidade principal) ou quando não o faça, o desvio cometido à lei adjetiva possa influir no exame (instrução e discussão) ou na decisão da causa, ressalvadas as situações em que a própria lei adjetiva estatua uma consequência jurídica distinta para esse desvio.
As nulidades processuais consubstanciam-se, portanto, em quaisquer desvios ao formalismo processual determinado na lei adjetiva quando esta comine expressamente o desvio cometido enquanto nulidade processual (principal), ou quando aquele seja suscetível de influir no exame ou na decisão da coisa (art. 195º, n.º 1 do CPC) e a lei não estatua expressamente uma outra consequência jurídica aquele.
Note-se que as nulidades processuais não se confundem com as nulidades de sentença enunciadas, de modo taxativo, no art. 615º, n.º 1, do CPC (aplicáveis aos acórdãos, por força do art. 666º, n.º 1 do CPC, e aos despachos, por via do disposto no art. 613º, n.º 1), na medida em que as primeiras se traduzem em quaisquer desvios ao formalismo processual prescrito na lei, que esta qualifique expressamente como nulidade processual, ou em que não o fazendo, esse desvio seja suscetível de influir no exame ou na decisão da causa, e a lei adjetiva não preveja para o mesmo uma outra consequência jurídica[9], enquanto as nulidades da sentença (acórdão ou despacho) se situam no âmbito restrito da elaboração destas específicas peças processuais, desde que o desvio nelas cometido preencha um dos casos taxativamente contemplados numa das alíneas do art. 615º , n.º 1, os quais se reconduzem a vícios formais ou de conteúdo da sentença (acórdão ou despacho) decorrentes de neles o juiz não ter observado as normas que regulam a sua elaboração e/ou estruturação e/ou as que balizam o seu campo de cognição em termos de fundamentos (causa de pedir e/ou exceções - incorrendo em nulidade por omissão ou excesso de pedido), ou de pretensão (pedido), incorrendo em nulidade por condenação ultra petitum[10].
Acresce enfatizar que as nulidades processuais também não se confundem com os erros de julgamento (error in judicando) na medida em que estes se traduzem na circunstância de o julgador ter incorrido na sentença, acórdão ou despacho em erro de julgamento da matéria de facto (em virtude da prova produzida impor um julgamento de facto diverso do que realizou) e/ou ter incorrido em erro de direito (por ter errado na seleção que fez das normas jurídicas aplicáveis à relação jurídica material controvertida neles apreciada, na interpretação que fez dessas normas jurídicas e/ou na aplicação que delas fez aos factos que julgou como provados ou não provados), acabando por proferir uma decisão injusta, porque desconforme à prova produzida e, por isso, à realidade ontológica verificada, e/ou ao direito substantivo aplicável, ou seja, dissonante com a realidade normativa[11].
Conforme resulta do que se vem dizendo, as nulidades processuais classificam-se em: principais e secundárias.
São nulidades processuais principais (típicas ou nominadas) as que se encontram especifica e expressamente previstas na lei (v.g., nulidade de todo o processo por ineptidão da petição inicial – art. 186º -; por erro na forma do processo quando o processo utilizado pelo autor não possa ser convolado para a forma processualmente adequada sem que daí resulte uma diminuição de garantias do réu – art. 193º -; nulidade de todo o processo depois da petição inicial, salvando-se apenas esta, por falta de citação do réu, ou por falta de citação do Ministério Público, nos casos em que deva intervir como parte principal – arts. 187º e 188º -; e por falta de vista ou exame do Ministério Público como parte acessória quando a causa corra à revelia da parte que devia por ele ser assistida – art. 194º). E são nulidades secundárias as que se encontram genericamente referidas na fórmula geral do art. 195º, n.º 1 do CPC, (em que se estatui que: “Fora dos casos previstos nos artigos anteriores, a prática de um ato que a lei não admita, bem como a omissão de um ato ou de uma formalidade que a lei prescreve, só produzem nulidade quando a lei o declare ou quando a irregularidade cometida possa influir no exame ou na decisão da causa”)e a lei não comine esses desvios com uma consequência jurídica distinta.
Cingindo-nos às nulidades processuais secundárias, uma vez que são estas que os recorrentes afirmam ocorrerem no presente processo especial de revitalização, ao nele se ter omitido as publicações determinadas no art. 17º-F, n.ºs 2 e 3 do CIRE, importa referir que, a verificar-se estarmos efetivamente perante nulidades processuais secundárias, estas não são de conhecimento oficioso, apenas podendo ser invocadas pelo interessado na observância da formalidade ou na repetição ou eliminação do ato (art. 197º, n.º 1 do CPC, ex vi, art. 17º, n.º 1 do CIRE), dentro do prazo de arguição previsto no art. 199º, n.º 1 do CPC, ou seja, nos casos em que aquele estiver presente, por si ou mandatário, no momento em que a nulidade processual secundária foi cometida, enquanto o ato não terminar; se não o estiver, no prazo de dez dias, mediante incidente de reclamação, a apresentar junto do tribunal que a cometeu, a contar da intervenção do interessado na sua arguição ou da prática de ato por aquele praticado no processo ou da sua notificação para qualquer termo daquele e seja de presumir que então tomou conhecimento da nulidade processual secundária cometida ou dela podia ter tomado conhecimento se agisse com a devida diligência.
Não obstante o que se acaba de dizer e continue a ser válida a consideração de que “dos despachos recorre-se, contra as nulidades reclama-se”, e de que reclamação e recurso não são meios de impugnação concorrentes, cabendo à parte reclamar da nulidade cometida para obter decisão, a qual pode ser impugnada através de recurso, não convém olvidar que já Alberto dos Reis defendia que sempre que houvesse um despacho ou sentença a ordenar a prática de um ato processual proibido por lei, ou a sancionar a omissão de um ato processual por ela imposto ou a prática de ato processual imposto ou permitido por aquela, mas sem observância das formalidades por ela requeridas, ou quando a decisão, mormente sentença, for precedida de nulidade de conhecimento oficioso ou tiver faltado alguma formalidade de cumprimento obrigatório, como é o caso da observância do princípio do contraditório, na sua dimensão positiva do n.º 3, do art. 3º do CPC, o meio de reação contra a nulidade processual secundária cometida não é a reclamação, mas sim o recurso[12]. A.4- Do caso concreto
Assentes nas premissas acabadas de enunciar, revertendo ao caso em análise, a devedora, EMP01... – Unipessoal, Lda., instaurou ação especial de revitalização, em 08/04/2024, no âmbito do qual lhe foi designado, em 11/04/2024, administrador judicial provisório.
Iniciadas as negociações entre a sociedade devedora e os seus credores, requereu, mediante acordo por ela e pelo administrador judicial subscrito em 23/06/2024, a prorrogação do prazo de negociações por mais um mês, o que acabou por ser deferido, por despacho de 07/08/2024.
Em 06/08/2024 a devedora juntou aos autos proposta definitiva de plano de recuperação.
Preceitua o art. 17º-F, n.º 1 que: “Até ao ultimo dia do prazo de negociações, a empresa deposita no tribunal a versão final do plano de recuperação, contendo, pelo menos, as seguintes informações, e sendo de imediato publicado no portal Citius a indicação do depósito: (…)”(destacado nosso).
O n.º 2 do mesmo art. 17º-F acrescenta que: “No prazo de cinco dias subsequente à publicação, qualquer credor pode alegar nos autos o que tiver por conveniente quanto ao plano depositado pela empresa, designadamente circunstâncias suscetíveis de levar à não homologação do mesmo, dispondo a empresa de cinco dias após o termo do primeiro prazo para, querendo, alterar o plano em conformidade, e, nesse caso, depositar a nova versão nos termos previstos no número anterior”.
E o seu n.º 3 que: “Findo o prazo previsto no número anterior é publicado no portal Citius anúncio advertindo da junção ou não junção de nova versão do plano, correndo desde a publicação referida o prazo de votação de 10 dias, no decurso do qual qualquer interessado pode solicitar a não homologação do plano, nos termos e para os efeitos previstos nos artigos 215º e 216º, com as devidas adaptações”.
Sendo o PER, conforme antedito, um processo especial, pré-insolvencial, recuperatório, híbrido, voluntário, consensual, concursal e urgente, em que são nele encetadas negociações entre a empresa que a ele recorreu e os respetivos credores, com a finalidade de ser alcançado um acordo de recuperação destinado a obter a sua revitalização, de modo a obstar que incorra numa situação de insolvência atual, acordo esse que, uma vez aprovado por uma maioria qualificada de credores e homologado, por sentença judicial transitada em julgado, vincula e se impõe a todos os credores que sejam detentores de créditos que se mostrem constituídos à data da prolação do despacho de nomeação de administrador judicial provisório (e que, assim, deferiu o prosseguimento do processo em causa), decorre das normas que se acabam de transcrever (que são, aliás, emanação da natureza consensual do PER), que, até ao termo do prazo legal fixado para as negociações, tem a empresa de elaborar um plano definitivo (proposta de plano definitivo) de recuperação e juntá-lo ao processo.
Junta a referida proposta definitiva de plano de recuperação pela empresa que se apresentou a PER é imediatamente publicado no portal Citius a menção do respetivo depósito, com a finalidade de que todos os credores que nisso tenham interesse poderem, no prazo de cinco dias subsequentes a essa publicação, consultar a proposta final de plano de recuperação apresentada pela empresa e poderem apresentar as alterações ao mesmo que entendam por pertinentes, ou alegar circunstâncias que, a seu ver, são impeditivas à sua futura homologação judicial (art. 17º-F, n.ºs 1 e 2).
Note-se que as finalidades almejadas com a publicação acabada de referir são tão mais relevantes quanto é certo que, conforme supra já se deixou demonstrado, ainda que a proposta final do plano de recuperação apresentada pela empresa se mostre concordante com a posição maioritária assumida pelos seus credores nas negociações que com eles encetou (de contrário, dificilmente logrará obter a maioria qualificada de credores necessária à sua futura aprovação), por um lado, poderá acontecer que existam credores que tenham decidido não participar nessas negociações (relembra-se, os credores da empresa que recorre a PER são livres de participar ou não nas negociações nele entabuladas entre a empresa e os credores) e, por outro, poderão existir credores que nas negociações entabuladas poderão ter manifestado uma posição distinta daquela que foi a manifestada pela maioria dos credores e que acabou por ser plasmada na versão final de plano de recuperação apresentada pela empresa e, inclusivamente, mesmo os que participaram em tais negociações e que manifestaram posição conforme à posição maioritária nelas manifestada pelos credores poderão ter, entretanto, mudado de posição.
Por conseguinte, ao não se ter publicado no portal Citius a indicação do depósito da versão final do plano de recuperação apresentada pela empresa devedora em 06/08/2024, conforme é determinado pelo n.º 1, do art. 17º-F do CIRE, omitiu-se uma formalidade que é imposta por lei, mais concretamente, pelo dispositivo legal que se acaba de referir, e a omissão dessa formalidade, atentas as finalidades que prossegue (acabadas de referir e enunciadas no n.º 2 daquela disposição legal) é suscetível de influir, e influiu efetivamente na decisão da causa, além de que, conforme decorre da conjugação do disposto no n.ºs 2 e 3 do art. 17º-F, essa omissão inviabilizou que se tivesse iniciado o prazo de votação do plano de recuperação.
Destarte, a omissão da formalidade processual que se acaba de referir (determinada pelo art. 17º-F, n.º 1, parte final do CIRE) consubstancia uma nulidade processual secundária (arts. 17º-F, n.ºs 1, 2 e 3 do CIRE e 195º, n.º 1 do CPC), a qual foi sancionada pela sentença homologatória da versão final de plano de recuperação que foi junta aos autos pela empresa devedora em 06/08/2024 (sentença recorrida), quando não se procedeu à publicação no portal Citius da indicação do depósito dessa versão final e quando, consequentemente, nem sequer ainda se tinha iniciado o prazo de votação, pelo que o meio adequado de reação contra a nulidade processual assim cometida não é a reclamação, mas antes o recurso da referida sentença homologatória.
A nulidade processual assim cometida, nos termos do disposto no art. 199º, n.º 2 do CPC, determina que se tenham de anular todos os atos processuais subsequentes à apresentação, em 06 de agosto de 2024, da versão final do plano de recuperação apresentada pela empresa devedora, incluindo a sentença homologatória recorrida, salvando-se apenas o despacho proferido em 07 de agosto de 2024, em que a 1ª Instância deferiu a prorrogação do prazo de negociações por mais um mês.
Decorre do que se vem dizendo, procederem os recursos interpostos pelo Centro Distrital de Segurança Social de ..., do Instituto da Segurança Social, I.P., e pelo Ministério Público, em representação da Fazenda Nacional e, em consequência, impõe-se declarar a nulidade de todo o processado subsequente à apresentação pela empresa devedora em 06 de agosto de 2024, da versão final do plano de recuperação, incluindo a sentença homologatória recorrida, com ressalva do despacho proferido em 07 de agosto de 2024, em que a 1ª Instância deferiu a prorrogação do prazo de negociações por mais um mês, determinando-se que o tribunal a quo diligencie pela publicação no portal Citius da indicação do depósito daquele versão final de plano de recuperação, seguindo-se após o formalismo processual previsto no art. 17º-F, n.ºs 2, 3 e seguintes do CIRE.
A.5- Da condenação em custas
Nos termos do disposto no art. 547º, n.ºs 1 e 2 do CPC, a decisão que julgue o recurso condena em custas a parte que a elas houver dado causa ou, não havendo vencimento, quem do processo tirou provado, entendendo-se que dá causa às custas processuais a parte vencida, na proporção em que o for.
Os recursos que se acabam de apreciar têm por objeto a sentença homologatória do plano de recuperação apresentado pela recorrida em 06 de agosto de 2024, na sequência daquela sentença ter sido proferida quando nem sequer se tinha iniciado o prazo de votação desse plano pelos respetivos credores, decorrente de não se ter procedido às publicações previstas nos n.ºs 2 e 3 do art. 17º-F.
A recorrida EMP01... – Unipessoal, Lda. é alheia à omissão das mencionadas publicações, uma vez que cabia à Secção do tribunal a quo proceder à publicação da indicação do depósito da versão final do plano de recuperação que aquela juntou ao processo em 06 de agosto de 2024, incorrendo em nulidade processual secundária, que foi sancionada pela sentença recorrida, que homologou aquele plano de recuperação, quando não tinha sido realizada a publicação do respetivo depósito no portal Citius a que alude o art. 17º-F, n.º 1, parte final, e, consequentemente, nem sequer se tinha iniciado o prazo de votação desse plano pelos credores da empresa recorrida.
Acresce que, no âmbito dos presentes recursos, a empresa recorrida não contra-alegou, pugnando pela improcedência daqueles.
Decorre do que se vem dizendo que a recorrida EMP01... – Unipessoal, Lda., não ficou neles “vencida”.
Por sua vez, os recorrentes que obtiveram vencimento de causa no âmbito dos recursos que interpuseram, não são neles “vencidos”, mas antes “vencedores”.
Destarte, não havendo vencimento, as custas dos presentes recursos ficam a cargo das recorrentes (Centro Distrital de Segurança Social de ..., do Instituto de Segurança Social, I.P., e Fazenda Nacional, representada pelo Ministério Público), que foram quem tiraram proveito da sua procedência (art. 527º, n.º 1, parte final, do CPC).
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V- Decisão
Nesta conformidade, os Juízes Desembargadores da 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães, acordam em julgar os recursos interpostos pelo Centro Distrital de Segurança Social de ..., do Instituto da Segurança Social, I.P., e pelo Ministério Público, em representação da Fazenda Nacional, procedentes e, em consequência:
I- Declaram a nulidade de todo o processado subsequente à apresentação pela empresa devedora, EMP01... – Unipessoal, Lda., em 06 de agosto de 2024, da versão final do plano de recuperação que juntou aos autos, incluindo da sentença homologatória recorrida, que o homologou, com ressalva do despacho proferido em 07 de agosto de 2024, em que a 1ª Instância deferiu a prorrogação do prazo de negociações por mais um mês;
II- Determinam que a 1ª Instância determine a publicação no portal Citius da indicação do depósito da versão final de plano de recuperação junta aos autos pela empresa devedora em 06 de agosto de 2024, seguindo-se após o formalismo processual previsto no art. 17º-F, n.ºs 2, 3 e seguintes do CIRE.
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Custas dos recursos pelos recorrentes (art. 527º, n.º 1, parte final, do CPC).
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Notifique.
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Guimarães, 06 de fevereiro de 2025
José Alberto Moreira Dias – Relator
João Peres Coelho – 1º Adjunto
Susana Raquel Sousa Pereira – 2ª Adjunta
[1] Ferreira de Almeida, “Direito Processual Civil”, vol. II, 2015, Almedina, págs. 395 e 396. [2] Exposição de motivos da proposta de Lei n.º 39/XII, de 30 de dezembro de 2011, em que se lê pretender-se mediante o processo especial de revitalização consagrar “um mecanismo célere e eficaz que possibilite a revitalização dos devedores que se encontram em situação económica difícil ou em situação de insolvência meramente iminente, mas que ainda não tenham entrado em situação de insolvência atual”. [3] Catarina Serra, “Lições de Direito da Insolvência”, Almedina, abril de 2018, pág. 340; Maria do Rosário Epifânio, “Manual de Direito da Insolvência”, 7ª ed., Almedina, pág. 413; Marco Carvalho Gonçalves, “Processo de Insolvência e Processos Pré-Insolvenciais”, Almedina, págs.683 a 685. [4] Carvalho Fernandes e João Labareda, “Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas Anotado”, 3ª ed., Quid Juris, pág. 137. [5] Catarina Serra, ob. cit., pág. 337. [6] Catarina Serra, ob. cit., págs. 349 a 353. [7] Ac. RL. de 09/05/2013, Proc. 1008/12.9TYLSB.L1-8, in base de dados da DGSI, onde constam todos os acórdãos a que se venha a fazer referência sem menção em contrário. [8] Ac. STJ, de 17/05/2017, Proc. 4111/13.4TBBRG.G1.S1 [9] Antunes Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, “Manual de Processo Civil”, 2ª ed, Coimbra Editora, 1985, pág. 387, em que se lê: “(…), a nulidade do processo consiste sempre num desvio de caráter formal, traduzido num dos três tipos: a) prática de um ato proibido; b) omissão de um ato prescrito na lei; c) realização de um ato imposto ou permitido por lei, mas sem as formalidades requeridas”.
Manuel de Andrade, “Noções Elementares de Processo Civil”, Coimbra Editora, 1979, págs. 176 e 177: “As nulidades de processo podem definir-se nestes termos: são quaisquer desvios do formalismo seguido, em relação ao formalismo processual prescrito na lei, e a que esta faça corresponder – embora não de modo expresso – uma invalidação mais ou menos extensa de atos processuais. Princípio geral acerca de quais sejam as irregularidades ou desvios no formalismo processual que constituem nulidade de processo. São só as que possam influir no exame (instrução e discussão) ou na decisão da causa; as que possam ter reflexos de ordem substancial (hoc sensu). Não assim, todavia, quando a lei preveja diferentemente. As outras são irrelevantes. Disso temos exemplo quando não seja deduzida discriminadamente a reconvenção, ou quando não seja articulada a narração da petição inicial ou da contestação (pelo menos se, em qualquer destas hipóteses, não for notavelmente prejudicada a clareza da respetiva peça); e também, dum modo geral, quando a formalidade preterida não impediu que o ato em questão atingisse a sua finalidade”.
Acs. STJ., de 17/10/2007, AD, 554º, pág. 461; de 25/11/2008, Proc. 08A3501. [10] Abílio Neto, “Novo Código de Processo Civil Anotado”, 2ª ed., janeiro/2014, Ediforum, pág. 734, em que expende: “Os vícios determinativos de nulidade da sentença correspondem a casos de irregularidades que afetam formalmente a sentença e provocam dúvida sobre a sua autenticidade, como é a falta de assinatura do juiz, ou ininteligibilidade do discurso decisório por ausência total de explicação da razão por que decide de determinada maneira (falta de fundamentação), quer porque essa explicação conduz, logicamente, a resultado oposto do adotado (contradição entre os fundamentos e a decisão), ou uso ilegítimo do poder jurisdicional em virtude de pretender resolver questões de que não podia conhecer (excesso de pronúncia) ou não tratar de questões de que deveria conhecer (omissão de pronúncia) – als. a) a e) do n.º 1 do art. 615º. São sempre vícios que encerram um desvalor que excede o erro de julgamento e que, por isso, inutilizam o julgado na parte afetada”. [11] Acs. STJ., de 27/11/2008, Proc. 08B2608; de 06/05/2010, Proc. 4670/2000.S1; de 30/09/2010, Proc. 341/08.9TCGMR.G1.S2. [12] Antunes Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, ob. cit. pág. 393: “Se, entretanto, o ato afetado de nulidade for coberto por qualquer decisão judicial, o meio próprio de o impugnar deixará de ser a reclamação (para o próprio juiz) e passará a ser o recurso”; Manuel de Andrade, ob. cit., pág. 183; Abrantes Geraldes, “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, 2017, 4ª ed., págs. 25 a 26; Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, “Código de Processo Civil Anotado”, vol. I, 2ª ed., pág. 249, em que ponderam: “Mantém-se a atualidade e pertinência do brocardo segundo o qual “dos despachos recorre-se, contra as nulidades reclama-se”. A reclamação e o recurso não são meios de impugnação concorrentes, cabendo à parte reclamar previamente para suscitar a prolação de despacho sobre a arguida nulidade. Mas se houver um despacho a ordenar ou autorizar a prática de um ato ou se determinada decisão (máxime a sentença) for precedida de nulidade de conhecimento oficioso ou tiver faltado alguma formalidade de cumprimento obrigatório, ajustar-se-á a imediata interposição de recurso”. Os mesmos anteriores reafirmam esta posição na mesma obra, a fls. 762.
No mesmo sentido, Acs. STJ, de 22/02/2017, Proc. 5384/15.3T8GMR.G1.S1; de 23/06/2016, Proc. 1937/15.8T8BCL.S1; RG., de 20/01/2022, Proc. 1167/20.7T8VRL.G1; de 23/06/2016, Proc. 713/14.0T8VRL.G1; R.L., de 15/03/2018, Proc. 2367/17.0T8LSB.L1-6; de 30/11/1995, CJ, t. V, pág. 129;