I - A junção de documentos em sede de recurso reveste natureza excecional, devendo ser recusada quando os documentos visem provar factos que já antes da sentença a parte sabia estarem sujeitos a prova, não lhe servindo de pretexto invocar a surpresa quanto ao sentido da decisão para juntar documento que já poderia ter apresentado em 1.ª instância e ainda quando os documentos visem a prova de facto novo somente alegado em recurso, cujo conhecimento está vedado à Relação.
II - Numa situação de coligação ativa, ainda que a sentença seja desfavorável a todos os autores coligados, se apenas um deles manifesta vontade expressa de impugnar a sentença, só ele assume a qualidade de recorrente e o recurso são pode aproveitar aos demais se não os mesmos não derem a sua adesão ao recurso.
III - A liquidação de sentença visando concretizar o objeto da condenação, está vinculada aos limites e termos desta, recorrendo-se, se necessário aos respetivos fundamentos para fixar o sentido e alcance da decisão constante do dispositivo da sentença.
IV - A quantificação do concreto valor em dívida não pode ser efetuada com apelo a critérios e elementos diferentes dos contidos na decisão liquidanda.
Origem: Comarca do Porto, Juízo do Trabalho do Porto - Juiz 2
Acordam os juízes da secção social do Tribunal da Relação do Porto
Relatório
AA, BB, CC, DD, EE e FF, intentaram ação declarativa sob a forma de processo comum contra A..., S.A. (atualmente “B..., S.A.”), pedindo a condenação da ré a:
a) Classificar os autores na categoria profissional de TPJ, desde 01 de Janeiro de 1995;
b) Colocá-los nessa data no nível salarial 2, fazendo-os evoluir de acordo com o Acordo de Empresa aplicável, situando-se cada um dos Autores, em 30 de Setembro de 2005, na categoria profissional de TPJ, nível 5; e a pagar-lhes todas as diferenças retributivas e remuneratórias correspondentes desde 01 de Janeiro de 1995 até 30 de Setembro de 2005, no valor global de 76 439,42€, de acordo com os artigos 50º a 54º da petição inicial;
c) Pagar-lhes as diferenças retributivas e remuneratórias vincendas desde 01 de Outubro de 2005;
d) Pagar-lhes juros de mora à taxa legal, desde a data em que se verificou a violação do direito até integral pagamento.
Foi proferida sentença na qual o tribunal decidiu o seguinte:
“Nestes termos e com tais fundamentos, decido:
1. Julgar procedente a excepção de caso julgado invocada pela Ré e, em consequência, absolver esta da instância relativamente aos pedidos formulados pelo 5º e 6º Réus;
2. Classificar os 1º a 4º Autores na categoria profissional de TPJ, nível 2, desde 01 de Janeiro de 1995;
3. Fazer evoluir os 1º a 4º Autores de acordo com o Acordo de Empresa aplicável, situando-se cada um deles, em 30 de Setembro de 2005, na categoria profissional de TPJ, nível 5;
4. Pagar aos Autores todas as diferenças retributivas e remuneratórias correspondentes desde 01 de Janeiro de 1995 até 31 de Outubro de 1997, no montante mensal de 25 237$00, no que concerne aos 1º, 2º e 4º Autores; e de 15 916$00 relativamente ao 3º Autor (sem prejuízo de eventuais actualizações salariais que tenham sido efectuadas no decurso dos anos de 1997 e de 1998);
5. Pagar aos Autores todas as diferenças retributivas e remuneratórias correspondentes desde 01 de Janeiro de 1998 até à presente data, a liquidar em incidente de liquidação posterior;
6. Tudo acrescido de juros de mora, calculados sobre cada uma das prestações em dívida que se venceram a partir de 14/12/2000, à taxa legal, até integral pagamento.”
A ré interpôs recurso da sentença, o qual foi julgado procedente, tendo este Tribunal da Relação decidido revogar a sentença, substituindo-a por acórdão que decidiu:
“1. Julgar procedente a excepção de caso julgado invocada pela Ré e, em consequência, absolver esta dos pedidos formulados pelos 5º e 6º Réus;
2. Condenar a Ré a classificar os lº, 2º e 4º Autores na categoria profissional de TPJ, nível 1, desde 28 de Janeiro de 1995 e classificar o 3º Autor na categoria profissional de TPJ, nível 2, desde 28 de Janeiro de 1995;
3. Condenar a Ré a fazer evoluir os Autores nos níveis de progressão salarial de acordo com os Acordos de Empresa sucessivamente aplicáveis;
4. Pagar aos Autores todas as diferenças retributivas e remuneratórias correspondentes desde 28 de Janeiro de 1995 até à presente data, a apurar em incidente de liquidação deste acórdão;
5. Condenar a Ré a pagar juros de mora à taxa legal sobre as quantias que se vierem a apurar, a partir da liquidação e até integral pagamento.
No mais, absolve-se a requerida do peticionado.”
Os 1.º a 4.º autores deduziram incidente de liquidação da sentença, pretendendo a condenação da ré a pagar ao 1.º a quantia de € 20 811,91; ao 2.º a quantia de € 20 219,09; ao 3.º a quantia de € 30 247,76 e ao 4.º a quantia de € 18 346,59.
Alegaram (transcreve-se o relatório da sentença recorrida) que 28 de janeiro de 1995 é a data de entrada em vigor do 1º Acordo de Empresa da C..., com uma nova estrutura de carreiras e nova designação de categorias, em substituição das designações que existiam nas empresas fundidas.
Os requerentes eram oriundos da empresa D... e a sua integração na nova estrutura de categorias profissionais processou-se em conformidade com a especialidade refletida nas funções que desempenhavam, enquadrados no nível salarial igual ou superior conforme a correspondência remuneratória à data da integração – 28/01/1995 – transportando para efeitos de evolução na carreira o tempo de permanência que detinham no nível remuneratório da anterior estrutura.
Sucede que a requerida classificou os requerentes em categorias incorretas, fazendo-os progredir a partir de 28/01/1995 em termos salariais transpondo o tempo de permanência que detinham no nível da anterior estrutura, como aconteceu com todos os trabalhadores
Os requerentes não se conformaram com a sua classificação e integração enquanto TDPs, tendo intentado a ação judicial, cuja decisão final condenou a requerida nos termos acima transcritos.
Ao não fazer operar o transporte da antiguidade no nível de remuneração detida nos D..., a requerida, apesar de reclassificar os requerentes em categoria superior, baixou as suas remunerações, o que a decisão proferida não visou.
Pretendem, pois, os requerentes que a sua evolução se inicie enquanto TPJs nível salarial 1 e 2 em vez de TDPs nível salarial 6 e 7 (que a A... operou antes da decisão condenatória de reclassificação).
Regulamente notificada, a requerida contestou, alegando a insuficiência de factos essenciais para a decisão pretendida e impugnando a alegação dos requerentes.
Assim, refere a requerida que apenas a categoria que era detida pelos trabalhadores releva para a sua integração na nova estrutura de categorias profissionais e não a especialidade refletida nas funções que desempenhavam.
Depois, a tese dos requerentes de que a integração na nova estrutura de categorias profissionais salvaguardou o tempo de permanência que detinham no nível da anterior categoria é falsa e foi expressamente rejeitada pela decisão liquidanda.
Na nova estrutura da A..., os trabalhadores não progrediram todos automaticamente para o nível seguinte logo que completassem o tempo que lhes faltava nos D... – nalgumas situações foi contado esse tempo e noutras não, tendo todas essas situações sido estabelecidas no Protocolo de integração anexo ao AE de 1995. E, nas situações em que o tempo foi contado, tal só se verificou para uma única progressão automática para o nível seguinte, pois a partir daí aplicavam-se apenas as regras constantes do no AE (1995). Foi na estrita observância dessas regras que a requerida fez progredir os requerentes.
Ademais, não consta da petição dos requerentes que os mesmos tenham posto em causa a forma como foram integrados em TDP, ou seja, nunca afirmaram não terem sido integrados no nível de TDP a que tinham direito, nem que não tinham progredido corretamente na categoria de TDP. O que os requerentes fizeram em 2005 foi entenderem que as suas funções se reconduziam, não à categoria de TDP, mas à categoria de Técnico Projetista.
Ora, a Decisão liquidanda reconheceu aos requerentes tal categoria, desde 28 de janeiro de 1995, mas não a integração nessa data no nível 2 dessa categoria.
Assim, a Decisão Judicial não tem outro significado senão colocar todos os requerentes na categoria de Técnico Projetista em janeiro de 1995, os 1º, 2ª e 4º, no nível 1 e o 3º no nível 2 e aplicar-lhes a evolução profissional e salarial consagrada nos IRCT.
Foi o que a requerida fez.
Termina requerendo que a liquidação seja julgada improcedente.
Os requerentes responderam, pronunciando-se quanto à exceção invocada, pugnando pela sua improcedência.
Foi proferido despacho a convidar os requerentes a aperfeiçoarem o seu requerimento inicial, o que os mesmos acataram.
A requerida contestou o requerimento inicial aperfeiçoado, invocando a exceção de inexistência de título executivo relativamente a valores reclamados pelo 3º requerente e a inexigibilidade de diferenças salariais posteriormente a julho de 2017, relativamente aos 2º e 3º requerentes.
Assim, e quanto à primeira exceção, sustenta a requerida que o 3º requerente exige em dezembro de 1997, maio a novembro de 2000, fevereiro a abril e setembro de 2001, maio de 2011, novembro e dezembro de 2015, o pagamento de valores a título de “trabalho extra”. Sucede, porém, que a Decisão liquidanda não contempla o pagamento de quaisquer valores a título de trabalho suplementar.
No que respeita à segunda exceção, refere a requerida que os contratos de trabalho dos 2º e 3º requerentes foram transmitidos à “E..., S.A.”, que em 22 de julho de 2017 assumiu a posição de empregador destes requerentes. Assim, eventuais diferenças salarias que lhes possam ser exigidas desde tal data jamais poderão ser exigíveis à requerida.
Os requerentes, em contraditório, responderam às exceções invocadas, admitindo o 3º requerente assistir razão à requerida quanto à primeira exceção e pronunciando-se quanto à segunda exceção no sentido de que o pagamento das diferenças salariais vencidas até ao transito em julgado do Acórdão transitado em julgado (04.06.2012), logo, antes da transmissão (22.07.2017) é da responsabilidade da requerida. Acresce que, tendo em conta a legislação em vigor à data de 22.07.2017, a requerida sempre responde solidariamente pelas obrigações vencidas até à data da transmissão, durante o ano subsequente a esta.
De resto, a alegada transmissão de estabelecimento comercial foi atacada judicialmente.
Foi proferido despacho saneador, fixados os factos assentes e enunciado os temas da prova.
Os requerentes apresentaram reclamação, a qual foi deferida.
Foi realizada audiência de julgamento, na sequência da qual foi proferida sentença que decidiu nos seguintes termos:
“Por tudo o exposto, julga-se o presente incidente de liquidação parcialmente procedente e, em consequência, decide-se liquidar os montantes devidos pela requerida aos 1º, 3º e 4º requerentes, respetivamente, nos valores de € 130,14; € 18.020,80; e € 173,52, acrescidos de juros de mora, à taxa legal de 4% ao ano, desde a data da presente decisão e até efetivo e integral pagamento.
Inconformado, o 3.º autor, CC interpôs o presente recurso formulando as seguintes conclusões (transcrevendo-se as conclusões na sua versão posterior ao aperfeiçoamento determinado pelo tribunal):
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A ré apresentou contra-alegações que concluiu nos seguintes termos:
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Nenhuma das partes se pronunciou sobre o parecer do Ministério Público.
Face ao teor do requerimento de interposição de recurso, à motivação e conclusões do recurso e às contra-alegações apresentadas pela recorrida, importa determinar o âmbito subjetivo do recurso.
Na verdade, apesar de a decisão liquidanda se reportar a quatro autores, apenas o autor GG vem identificado como recorrente no requerimento de interposição do recurso, tendo a recorrida alegado que o recurso está circunscrito àquele autor.
Notificado para se pronunciar nos termos do disposto pelos arts. 652.º, n.º 1, al. b), 655.º, n.ºs 1 e 2 e 654.º, n.º 2 do CPC, veio o autor alegar que o recurso não pode deixar de se considerar apresentado por todos os trabalhadores porque o mesmo aproveita a todos e o resultado da justa composição do litígio não pode excluir qualquer uma das partes. Subsidiariamente declarou que a expressão “outros” refere-se aos restantes autores da ação principal identificando os restantes requerentes da liquidação.
Analisado o requerimento de interposição do recurso, verifica-se que apenas GG, o 3.º autor, manifestou a vontade de impugnar a sentença proferida no incidente e liquidação, já que apenas o mesmo vem identificado como recorrente (quer no formulário “citius”, quer no próprio requerimento), que nem sequer foi feita qualquer menção a “outros” na identificação do recorrente (sendo por isso, desde logo inútil e inoperante a declaração feita pelo recorrente para o caso de se considerar que o recurso apenas foi por ele interposto) e que apesar das referências que faz aos demais autores ao longo das alegações e nas conclusões do recurso, os argumentos invocados e a liquidação dos valores efetuada apenas dizem respeito ao 3.º autor.
Nestes termos não pode haver dúvidas de que apenas o 3.º autor assume nos autos a qualidade de recorrente.
Alegou, porém, o recorrente que o recurso aproveita a todos os restantes autores.
Sem razão adiantamentos já.
Na verdade, em princípio, o recurso apenas aproveita ao recorrente e não se verifica no caso concreto, qualquer das situações em que o recurso aproveita aos compartes não recorrentes, a que alude o art.º 634.º do CPC.
É que apesar de quer a ação declarativa, quer o incidente de liquidação terem sido instaurados por vários autores, não se verifica entre eles uma situação de litisconsórcio necessário, caso em que, havendo apenas uma ação com pluralidade de sujeitos, o recurso interposto por um aproveita a todos (art.º 634.º, n.º 1 CPC).
A situação dos autos reconduz-se, antes, a uma coligação ativa, isto é a uma espécie de cumulação de ações conexas, já que sendo comum, pelo menos parcialmente, a causa de pedir, as pretensões deduzidas se desdobram em tantas relações materiais controvertidas quantos os autores, conduzindo à formulação de pedidos que poderiam ser apresentados individualmente por cada um dos autores, mas que estes optaram por exercer em coligação, nos termos permitidos pelo art.º 36.º do CPC.
Nessa medida, o recurso interposto apenas por um dos autores apenas poderia aproveitar aos demais, se se verificasse qualquer das seguintes hipóteses previstas pelo n.º 2 do citado art.º 634.º: a) se os não recorrentes derem a sua adesão ao recurso, na parte em que tenham um interesse comum ao do recorrente; b) se os não recorrentes tiverem um interesse que dependa essencialmente do interesse do recorrente (estão aqui em causa as situações em que se verifica um nexo de prejudicialidade entre as pretensões dos não recorrentes e as do recorrente); c) se a sentença recorrida tiver condenado os compartes em regime de solidariedade.
A única daquelas previsões que poderia ter aplicabilidade no caso dos autos é a da alínea a), já que apesar da autonomia de cada uma das ações, tratando-se de uma situação de coligação, existe um interesse, pelo menos, parcialmente comum.
Contudo, para que se pudesse admitir a extensão do efeito do recurso aos não recorrentes era necessário que os mesmos até ao início do prazo previsto pelo art.º 657.º, n.º 1 do CPC, tivessem aderido ao recurso interposto por meio de requerimento ou de subscrição das alegações do recorrente, nos termos do art.º 634.º, n.º 3 do CPC, o que não fizeram.
Por conseguinte, apenas o 3.º autor assume nos autos a qualidade de recorrente, não aproveitando o mesmo aos autores não recorrentes, tendo a decisão recorrida transitado em julgado relativamente a estes.
A apreciação do recurso restringe-se, pois, ao 3.º autor, GG.
Resulta do art.º 81.º, n.º 1 do CPT e das disposições conjugadas dos arts. 639.º, nº 1, 635.º e 608.º, n.º 2, todos do CPC, aplicáveis por força do disposto pelo art.º 1.º, n.º 1 e 2, al. a) do CPT, que as conclusões delimitam objetivamente o âmbito do recurso, no sentido de que o tribunal deve pronunciar-se sobre todas as questões suscitadas pelas partes (delimitação positiva) e, com exceção das questões do conhecimento oficioso, apenas sobre essas questões (delimitação negativa).
Assim, são as seguintes as questões a decidir:
1 – nulidade da sentença por violação do disposto pelo art.º 615.º, n.º 1, als. b), c) e d) do CPC;
2 – impugnação da decisão da matéria de facto;
3 – se ocorreu erro de interpretação do Acórdão liquidando, questão na qual se incluem a da invocada errada conclusão de que o recorrente suscitou uma questão nova e a da amissibilidade da liquidação.
Na decisão recorrida foram considerados provados os seguintes factos:
«1 - AA, BB, CC, DD, EE e FF, intentaram a presente ação emergente de contrato de trabalho contra "A..., S.A.", pedindo a condenação da ré a:
a) Classificar os autores na categoria profissional de TPJ, desde 01 de janeiro de 1995:
b) Colocá-los nessa data no nível salarial 2, fazendo-os evoluir de acordo com o Acordo de Empresa aplicável, situando-se cada um dos autores, em 30 de setembro de 2005, na categoria profissional de TPJ, nível 5; e a pagar-lhes todas as diferenças retributivas e remuneratórias correspondentes desde 01 de janeiro de 1995 até 30 de setembro de 2005, no valor global de € 76.439,42, de acordo com os artigos 50° a 54° da petição inicial;
c) Pagar-lhes as diferenças retributivas e remuneratória vincendas desde 01 de outubro de 2005;
d) Pagar-lhes juros de mora à taxa legal, desde a data em que se verificou a violação do direito até integral pagamento.
2 - Alegaram para tal, em síntese, os autores que, em janeiro de 1995 desempenhavam funções inerentes à categoria profissional de TPJ. Não obstante, a ré integrou-os então na categoria profissional de TDP, pelo que os autores foram indevidamente remunerados desde então.
3 - A ré contestou, começando por invocar a exceção de caso julgado relativamente aos 5° e 6° autores, uma vez que a presente ação é em tudo idêntica a uma outra ação que esses mesmos autores intentaram neste Tribunal do Trabalho do Porto e na qual o aqui 6° autor declarou desistir do pedido formulado e o aqui 5° autor aceitou ser promovido à categoria de TPJ, com efeitos reportados a 01/11/1997.
De seguida invocou a exceção de prescrição dos juros moratórios reclamados pelos autores que sejam anteriores a 01 de julho de 2000, por aplicação do disposto no artigo 310.° do Código Civil.
No mais, impugnou os factos alegados pelos autores.
4 - Por sentença foi decidido:
1. Julgar procedente a exceção de caso julgado invocada pela ré e, em consequência, absolvida esta da instância relativamente aos pedidos formulados pelos 5° e 6° autores;
2. Classificar os 1° a 4° autores na categoria profissional de TPJ, nível 2, desde 01 de janeiro de 1995;
3. Fazer evoluir os 1° a 4° autores de acordo com o Acordo de Empresa aplicável, situando-se cada um deles, em 30 de setembro de 2005, na categoria profissional de TPJ, nível 5;
4. Pagar a todos os autores as diferenças retributivas e remuneratórias correspondentes desde 01 de janeiro de 1995 até 31 de outubro de 1997, no montante mensal de € 25.237$00 no que concerne aos 1-, 2- e 4° autores e de € 15.916$00 no que concerne ao 3° autor (sem prejuízo de eventuais alterações salariais que tenham sido efetuadas no decurso dos anos de 1997 e 1998).
5. Pagar aos autores as diferenças retributivas e remuneratórias correspondentes desde 01 de janeiro de 1998 até à presente data, a liquidar em incidente de liquidação posterior;
6. Tudo acrescido de juros de mora, calculados sobre cada uma das prestações em dívida que se venceram a partir de 14/12/2000, à taxa legal, até integral pagamento.
5 - Por Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, transitado em julgado, foi decidido, além do mais:
a) Condenar a ré a classificar os 1°, 2° e 4° autores na categoria profissional de TPJ1, nível 1, desde 28 de janeiro de 1995 e classificar o 3° autor na categoria de TPJ, nível 2, desde 28 de janeiro de 1995;
b) Condenar a ré a fazer evoluir os 1° a 4° autores de acordo com os Acordos de Empresa sucessivamente aplicáveis;
c) Pagar aos autores todas as diferenças retributivas e remuneratórias correspondentes desde 28 de janeiro de 1995 até à presente data, a liquidar em incidente de liquidação posterior;
d) Condenar a ré a pagar juros de mora à taxa legal sobre as quantias que se vierem a apurar, a partir da liquidação e até integral pagamento.
6 - Os autores, ora requerentes, no dia anterior à entrada em vigor do 1° AE da A..., estavam posicionados na categoria de Técnico de Projeto III da estrutura da D....
7 - Sendo o 1º requerente, AA, TPJ III Agrupamento J, nível salarial 3, desde 02/05/1993.
8 - A 2° requerente, BB, TPJ III Agrupamento J, nível salarial 3, desde 19/11/1993.
9 - O 3° requerente, CC, TPJ III Agrupamento J, nível salarial 3, desde 02/05/1993.
10 - O 4° requerente, DD, TPJ III Agrupamento J, nível salarial 3, desde 02/05/1993.
11 - Em 28 de janeiro de 1995, a ora requerida classificou os requerentes na seguinte categoria e nível salarial:
1° requerente, AA, como Técnico de Desenho e Projeto, nível salarial 6 (TDP 6);
2º requerente, BB, como Técnico de Desenho e Projeto, nível salarial 6 (TDP 6);
3° requerente, CC, como Técnico de Desenho e Projeto, nível salarial 7 (TDP 7);
4° requerente, DD, como Técnico de Desenho e Projeto, nível salarial 6 (TDP 6).
12 - De acordo com o disposto no Acordo de Empresa dos D... (de onde os requerentes eram originários), os tempos de permanência no nível de remuneração para progressão automática ao nível seguinte, eram os seguintes: nível J3 para J4 eram necessários 2 anos de permanência no nível; de J4 para J5, 3 anos de permanência no nível.
13 - A requerida, em relação aos requerentes, fê-los progredir, a partir de 28.01.1995, em termos salariais, transpondo o tempo de trabalho que detinham no nível da anterior estrutura.
14 - A requerida fez evoluir os requerentes da seguinte forma:
a) O 1° requerente (integrado em 28.01.1995 enquanto TPD 6), progrediu-o em 02.05.1995 para TDP, nível de remuneração 7;
b) A 2ª requerente (integrada em 28.01.1995 em TDP 6), progrediu-a em 19.11.1995 para TDP, nível de remuneração 7;
c) O 3° requerente (integrado em 28.01.1995 em TDP 7), progrediu-o em 1997 para TDP, nível de remuneração 8;
d) O 4° requerente (integrado em 28.01.1995 em TDP 6), progrediu-o em 02.05.1995 para TDP, nível de remuneração 7.
15 - Nos anos de 1995 a 2012, o 1º requerente recebeu as retribuições que constam das tabelas apresentadas na petição inicial aperfeiçoada, com as seguintes correções:
a) Entre abril e julho de 1995 auferiu 129.561$00;
b) O subsídio de férias de 1997 foi de 157.211$00;
c) O subsídio de férias de 2000 foi de 180.538$00;
d) Entre março e dezembro de 2003 auferiu € 1.130,70 e os subsídios de férias e de Natal foram de € 1.211,84;
e) O subsídio de férias de 2008 foi de 1.489,14.
16 - Nos anos de 1995 a 2018, a 2ª requerente recebeu as retribuições que constam nas tabelas da petição inicial aperfeiçoada, com as seguintes correções:
a) Entre agosto e outubro de 1995 auferiu 122.997$00 e o subsídio de férias foi de igual valor;
b) O subsídio de férias de 1997 foi de 151.432$00;
c) O subsídio de férias de 2000 foi de 215.799$00;
d) Em novembro e dezembro de 2003 auferiu € 1.132,70, o subsídio de férias foi de € 1.322,83 e o subsídio de Natal de € 1.393,50;
e) Em outubro de 2005 auferiu € 1.281,12 e o subsídio de férias foi de € 1.485,99;
f) No ano de 2006 auferiu € 1.302,90 e os subsídios de Natal e de férias foram de € 1.414,10;
g) De janeiro a outubro de 2007 auferiu € 1.322,50 e em novembro e dezembro auferiu € 1.355,10;
h) Entre junho e dezembro de 2013 auferiu € 1.432,85 e os subsídios de férias e de Natal foram de igual valor;
i) Os subsídios de férias e de Natal de 2014 foram de € 1.595,12.
17 - Nos anos de 1995 a 2018, o 3° requerente recebeu as retribuições que constam nas tabelas da petição inicial aperfeiçoada.
18 - Nos anos de 1995 a 2018, o 4° requerente recebeu as retribuições que constam nas tabelas da petição inicial aperfeiçoada, com as seguintes correções:
a) Entre janeiro e setembro de 2005 auferiu € 1.193,90;
b) Entre outubro e dezembro de 2005 auferiu € 1.292,58 e os subsídios de férias e de Natal foram de € 1.510,69;
c) Em 2006 auferiu € 1.308,10 e os subsídios de férias e de Natal foram de € 1.526,21;
d) Entre janeiro e outubro de 2007 auferiu € 1.346,50;
e) Em novembro e dezembro de 2008 auferiu € 1.378,30 e o subsídio de férias e de Natal foi de € 1.596,05;
f) Em julho de 2013 recebeu € 1.526,10;
g) Os subsídios de férias e de Natal de 2014 foram de € 1.521,24.
19 - Na nova estrutura de carreiras da C..., os trabalhadores não progrediram todos automaticamente para o nível seguinte logo que completassem o tempo que lhes faltava nos TPL - nalgumas situações foi contado esse tempo, noutras não, de acordo com o estabelecido no Protocolo de Integração Anexo ao AE.
20 - Nas situações em que o tempo foi contado, tal só se verificou para uma única progressão automática para o nível seguinte, sendo que a partir daí aplicavam-se apenas as regras de progressão constantes do novo AE (1995).
21 - Em novembro de 1997, o 1°, 2ª e 3° requerentes passaram a TPJ, nível salarial 2.
22 - Em 01.06.2019, a 2ª requerente e "F..., S.A." outorgaram um acordo de pré-reforma.
23 - É do seguinte teor o n.º 2 da cláusula 3ª de tal acordo: "o valor supra referido, tendo por referência o vencimento base, apenas poderá sofrer alteração por decisão judicial, transitada em julgado, decorrente de qualquer ação intentada pela segunda contraente contra a B..., S.A., em data anterior à transmissão de Unidade Económica, e na exata medida em que a B..., S.A. venha a ser obrigada/condenada a alterar o valor base de vencimento da segunda contraente e, por consequência, os efeitos dessa decisão se hajam de estender à primeira contraente".
24 - Por decisão proferida no âmbito do processo 862/18.5T8PNF, transitada em julgado em 15.02.2021, foi declara a "... nulidade da transmissão dos contratos de trabalho dos AA., da 1ª para a 2ª ré, com todas as consequência legais, nomeadamente, as de manutenção de todos os direito e regalias integrantes dos seus contratos individuais de trabalho com a 1ª ré que deverá ser considerada a sua entidade empregadora, com a consequente integração nos seus postos de trabalho ao serviço da 1ª ré e nas respetivas categorias profissionais, funções e com a antiguidade que lhes compete".
25 - Em tal processo figuravam como autores, entre outros, os aqui 2ª e 3° requerentes e como rés "B..., S.A." e "F..., S.A.".
26 - O aqui 3° requerente foi inserido no procedimento de despedimento coletivo da requerida.
27 - No processo referido em 24, a 2ª requerente declarou desistir dos pedidos aí formulados, declaração essa que foi objeto de despacho de homologação datado de 09.07.2019.»
*
Com as alegações de recurso, o recorrente requereu a junção de dois documentos, alegando que a sua junção se tornou necessária dada a insuficiência para se proceder à liquidação, da matéria de facto constante do número 26 da Sentença.
Juntou um documento emitido pela recorrida, relativo à data do despedimento coletivo onde foi integrado o recorrente (30/10/2021) e protestou juntar uma certidão judicial que atesta que o despedimento coletivo em questão foi impugnado, e que o processo se encontra pendente.
A recorrida, não se pronunciou.
Os documentos destinados a fazer prova dos fundamentos da ação ou da defesa devem ser apresentados com os articulados em que se aleguem os factos correspondentes ou, em caso de comprovada impossibilidade de assim fazer, até 20 dias antes da data em que se realize a audiência final ou até ao encerramento da discussão em 1.ª instância, como decorre do disposto no art.º 63.º do CPT e do art.º 423.º, n.ºs 1, 2 e 3 do CPC.
Admite-se, porém, por força do estipulado pelos arts. 425.º e 651.º do CPC que, depois daquele último momento, os documentos supervenientes possam, também, ser juntos com as alegações de recurso, mas, ainda assim, apenas, nos casos excecionais em que a sua apresentação não tenha sido possível, até ao encerramento da discussão em 1.ª instância, quando a sua apresentação se tenha tornado necessária, por virtude de ocorrência posterior, ou quando a sua junção apenas se tenha tornado necessária, em virtude do julgamento proferido em 1.ª instância.
Estatui o artigo 651.º, n.º 1 do CPC que “1 - As partes apenas podem juntar documentos às alegações nas situações excecionais a que se refere o artigo 425.º ou no caso de a junção se ter tornado necessária em virtude do julgamento proferido na 1.ª instância. 2 – As partes podem juntar pareceres de jurisconsultos até ao início do prazo para a elaboração do projeto de acórdão.”
Por seu turno, o art.º 425.º do CPC estabelece: “Depois do encerramento da discussão só são admitidos, no caso de recurso, os documentos cuja apresentação não tenha sido possível até àquele momento”.
Assim, a possibilidade de junção de documentos às alegações reveste carácter excecional - para além da situação em que tal junção se mostra necessária em virtude do julgamento proferido em 1.ª instância (decisões surpresa), uma vez encerrada a discussão, e sendo interposto recurso, apenas serão admitidos os documentos cuja apresentação não tenha sido possível até àquele momento.
Nesta segunda hipótese incluem-se os casos de superveniência objetiva (aqueles em que o documento é posterior ao encerramento da discussão em 1.ª instância) e de superveniência subjetiva (situações nas quais, pese embora a parte tenha atuado de forma diligente, só posteriormente teve conhecimento da existência do documento).
Como referem Abrantes Geraldes e outros[1], após o momento do encerramento da discussão da causa em primeira instância «apenas se pode congeminar a junção excecional de documentos nos termos previstos no art.º 651º, n.º 1, em sede de recurso de apelação: para além dos documentos que sejam objetiva e subjetivamente supervenientes (…) são admissíveis aqueles cuja necessidade se revelar em função da sentença proferida, o que pode justificar-se perante a imprevisibilidade do resultado (…)».
No que se refere à parte final do citado art.º 651.º, pressupõe-se a novidade da questão decisória justificativa da junção do documento com o recurso, como questão operante (apta a modificar o julgamento) só revelada pela decisão recorrida, o que exclui que essa decisão se tenha limitado a considerar o que o processo já desde o início revelava ser o “thema decidendum”.
Com esta disposição «o legislador quis cingir-se aos casos que, pela fundamentação da sentença, ou pelo objecto da condenação, se tornou necessário provar factos com cuja relevância a parte não podia razoavelmente contar antes de a decisão ser proferida, significando o advérbio “apenas”, inserto no segmento normativo em causa, que a junção só é possível se a necessidade do documento era imprevisível antes da decisão da 1ª instância»[2].
Assim, a junção deve ser recusada quando os documentos visem provar factos que já antes da sentença a parte sabia estarem sujeitos a prova, não lhe servindo de pretexto invocar a surpresa quanto ao sentido da decisão para juntar documento que já poderia ter apresentado em 1.ª instância[3].
Por outro lado, igual recusa deve ocorrer quando os documentos visem a prova de facto novo somente alegado em recurso, cujo conhecimento está vedado à Relação.
O recorrente alegou que a junção dos documentos se tornou necessária dada a insuficiência para se proceder à liquidação, da matéria de facto constante do número 26 da Sentença.
Tal alegação não é subsumível a qualquer das situações abarcadas pela previsão do citado at.º 651.º, designadamente à necessidade da junção em virtude do julgamento proferido em 1.ª instância, reconduzindo-se afinal à junção de um meio de prova novo para fundamentar a pretensão, que o recorrente mais adiante formula, de impugnação da decisão da matéria de facto, quanto ao ponto 26. dos factos provados na sentença recorrida.
De todo o modo, sempre se dirá que os documentos dizem respeito, respetivamente, à decisão de inclusão do 3.º autor no despedimento coletivo que produziu efeitos em 31/10/2021 e à pendência de ação de impugnação do dito despedimento pelo mesmo promovida.
A ré alegou através do requerimento de 11/05/2022 que o contrato de trabalho que mantinha com aquele autor cessou em 31/10/2021 em virtude da sua inclusão no processo de despedimento coletivo. O 3.º autor não se pronunciou sobre tal alegação, apesar de poder tê-lo feito na sequência da notificação do aludido requerimento e também não requereu a junção de qualquer documento.
Não pode, pois, o recorrente invocar que a junção só se tornou necessária em virtude do julgamento em 1.ª instância, pois, os factos a que respeitam foram trazidos aos autos em momento anterior ao encerramento da discussão.
Por outro lado, dos documentos juntos resulta que o 3.º autor muito antes do encerramento da discussão em 1.ª instância tinha conhecimento dos factos a que aqueles se referem, pois a decisão do despedimento coletivo está datada de 11/08/2021 e a ação de impugnação do despedimento está pendente desde 31/12/2021 e ainda que a certidão só tenha sido emitida em 22/05/2024, bem podia ter sido requerida em momento anterior, designadamente antes do encerramento da discussão em 1.ª instância (ocorrido em 22/06/2022, com o encerramento da audiência de julgamento).
Nessa medida não pode o recorrente invocar a superveniência quer objetiva, quer subjetiva dos documentos.
Os documentos são, assim, intempestivos.
Por todo o exposto, decide-se não admitir os documentos juntos pelo recorrente com as alegações de recurso, condenando-o na multa de 0,5 UC nos termos do disposto pelo art.º 443.º do CPC em conjugação com o disposto pelo art.º 27.º, n.º 1 do Regulamento das Custas Processuais.
Seguindo a ordem imposta pela precedência lógica (cfr. art.º 608.º, n.º 1 do Código de Processo Civil), importa começar a apreciação do recurso pela questões relativas à nulidade da sentença.
Nas conclusões aperfeiçoadas, o recorrente conclui que foram violadas as alíneas b), c) e d) do art.º 615.º do CPC, preceitos cujo teor é o seguinte:
“1 - É nula a sentença quando:
(…) b) Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão;
c) Os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível;
d) O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento;
(…)”.
Quer nas conclusões, quer na motivação do recurso, a este respeito, o recorrente apenas alinha argumentos suscetíveis de se reconduzirem à nulidade da sentença com fundamento na al. d), ou seja, à nulidade com fundamento na omissão de pronúncia, nada sendo invocado quanto à falta de fundamentação da decisão, quanto à ininteligibilidade da decisão ou quanto à contradição entre os fundamentos e a decisão, apesar de o recorrente afirmar esta última, mas de forma meramente conclusiva, na conclusão 3.ª.
Ainda assim, sempre se dirá que a sentença se mostra fundamentada, quer de facto, quer de direito, não contém qualquer ambiguidade ou obscuridade, sendo absolutamente ininteligível e não se deteta qualquer contradição entre os fundamentos e a decisão, motivo pelo qual não se vislumbra existir qualquer das nulidades a que se referem as als. b) e c) do n.º 1 do art.º 651.º do CPC.
Por sua vez, a nulidade da sentença por omissão de pronúncia foi alegada com fundamento no facto de o tribunal “a quo” não se ter pronunciado sobre a liquidação das diferenças salariais que sempre serão devidas mesmo que se considere que não há lugar ao transporte do tempo de permanência do recorrente no nível salarial na anterior estrutura dos D....
Nos termos do art.º 615.º, n.º 1, al. d) a sentença é nula quando o juiz deixe de se pronunciar sobre questões que devesse apreciar.
Sobre o assunto refere Lebre de Freitas[4]: «Devendo o juiz conhecer de todas as questões que lhe estão submetidas, isto é, de todos os pedidos deduzidos, todas as causas de pedir e excepções invocadas e todas as excepções de que oficiosamente lhe caiba conhecer (art. 660º/2), o não conhecimento do pedido, causa de pedir ou excepção cujo conhecimento não esteja prejudicado pelo anterior conhecimento de outra questão constitui nulidade (…)”.
Com efeito, decorre do art.º 608º, n.º 2 do CPC que na sentença o juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, não podendo ocupar-se senão dessas questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras questões.
E como se pode ler no Ac. RG de 15/03/2018 “O dever imposto no nº 2, do artigo 608º diz respeito ao conhecimento, na sentença, de todas as questões de fundo ou de mérito que a apreciação do pedido e da causa de pedir apresentadas pelo autor (ou, eventualmente, pelo réu reconvinte) suscitam.”
Sendo assim, importa ter em atenção que o dever de decidir se impõe quanto a questões suscitadas e quanto a questões do conhecimento oficioso, logo a omissão de pronúncia, geradora de nulidade da sentença, consubstancia-se no incumprimento do dever de decidir aquelas questões.
Salienta-se, contudo, que as causas de nulidade da sentença a que se refere o art.º 615.º do CPC não incluem o chamado erro de julgamento, a não conformidade dela com o direito substantivo aplicável. O erro da decisão nos pressupostos de facto e de direito não determina a nulidade da sentença, mas a revogação ou anulação da mesma.
Dito isto, analisada a sentença recorrida, na parte que respeita ao recorrente, verifica-se que na mesma o tribunal “a quo” liquidou as quantias devidas pela recorrida no montante de € 18.020,80, sendo ostensiva a inexistência de qualquer omissão, já que o que se impunha ao tribunal era precisamente liquidar as quantias devidas ao recorrente por força do Ac. do Tribunal da Relação.
Questão diversa, atinente ao mérito da pretensão, é saber se os pressupostos em que o tribunal assentou a sua decisão para determinar o valor concretamente devido estão certos ou errados.
Improcede, pois, a invocada nulidade da sentença.
Importa começar por relembrar que, em consonância com o decidido supra quanto ao âmbito subjetivo do recurso, a pretensão deduzida apenas poderá ser apreciada por referência ao recorrente, carecendo o mesmo de legitimidade para pôr em causa a matéria de facto na parte em que a mesma diz apenas respeito aos não recorrentes.
Consequentemente, a apreciação incidirá somente sobre o aditamento ao facto provado em 17 e sobre o facto provado em 26, na medida em que os demais (pontos 15, 16, 18 e 21) não respeitam ao recorrente, nem relevam para a definição do direito que o mesmo pretende fazer valer.
A recorrida, no que foi acompanhada pelo Ministério Público, invocou o incumprimento pelo recorrente dos ónus previstos pelo art.º 640.º do CPC de indicação dos concretos pontos impugnados e da concreta decisão que devia ser tomada quanto aos pontos de facto em questão.
Na verdade, nos termos do art.º 662.º, n.º 1 CPC «A Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa.»
A Relação tem efetivamente poderes de reapreciação da decisão da matéria de facto decidida pela 1.ª instância, impondo-se-lhe no que respeita à prova sujeita à livre apreciação do julgado, a (re)análise dos meios de prova produzidos em 1.ª instância, desde que o recorrente cumpra os ónus definidos pelo art.º 640.º do CPC.
Efetivamente, quando estão em causa meios de prova sujeitos à livre apreciação do julgador, decorre da conjugação dos art.º 635.º, nº 4, 639.º, nº 1 e 640.º, nº 1 e 2, todos do CPC, que quem impugna a decisão da matéria de facto deve, nas conclusões do recurso, especificar quais os pontos concretos da decisão em causa que considera errados e, ao menos no corpo das alegações, deve, sob pena de rejeição, identificar com precisão quais os elementos de prova que fundamentam essa pretensão, sendo que, se esses elementos de prova forem pessoais, deverá ser feita a indicação com exatidão das passagens da gravação em que se funda o recurso (reforçando a lei a cominação para a omissão de tal ónus, pois que repete que tal tem de ser feito sob pena de imediata rejeição na parte respetiva) e qual a concreta decisão que deve ser tomada quanto aos pontos de facto em questão.
Como refere António Santos Abrantes Geraldes[5], quanto às funções atribuídas à Relação em sede de intervenção na decisão da matéria de facto, «foram recusadas soluções maximalistas que pudessem reconduzir-nos a uma repetição dos julgamentos, tal como foi rejeitada a admissibilidade de recursos genéricos contra a decisão da matéria de facto, tendo o legislador optado por restringir a possibilidade de revisão de concretas questões de facto controvertidas e relativamente às quais sejam manifestadas e concretizadas divergências por parte do recorrente.»
A modificação da matéria de facto constitui um dever da Relação a ser exercido sempre que a reapreciação dos meios de prova (sujeitos à livre apreciação do tribunal) determine um resultado diverso daquele que for declarado pela 1.ª instância. Porém, como também sublinha António Santos Abrantes Geraldes[6] «(...) a reapreciação da matéria de facto pela Relação no âmbito dos poderes conferidos pelo art. 662.° não pode confundir-se com um novo julgamento, pressupondo que o recorrente fundamente, de forma concludente, as razões por que discorda da decisão recorrida, aponte com precisão os elementos ou meios de prova que impliquem decisão diversa da produzida e indique a resposta alternativa que pretende obter».
Nos termos do n.º 1 do art.º 640.º do CPC, impõe-se, pois, ao recorrente, na impugnação da matéria de facto, a obrigação de especificar, sob pena de rejeição:
“a) os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.”
E nos termos do n.º 2 da mesma disposição legal, no caso da alínea b) deve ser observado o seguinte:
“a) quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes;
b) independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes.”
Apesar de apenas ter sido fixada jurisprudência a respeito da alínea c) do n.º 1 do art.º 640.º do CPC, o certo é que a fundamentação do Acórdão Uniformizador de Jurisprudência n.º 12/2023[7] contém um conjunto de considerações com importância determinante quanto à interpretação dos ónus a que se referem as demais alíneas, que, pela sua relevância, a seguir se transcrevem (sem menção das notas de rodapé, por desnecessária):
«(...) Da articulação dos vários elementos interpretativos, com cabimento na letra da lei, resulta que em termos de ónus a cumprir pelo recorrente quando pretende impugnar a decisão sobre a matéria de facto, sempre terá de ser alegada e levada para as conclusões, a indicação dos concretos pontos facto que considera incorretamente julgados, na definição do objeto do recurso.
(…)
5 - Em síntese, decorre do artigo 640, n.º 1, que sobre o impugnante impende o dever de especificar, obrigatoriamente, sob pena de rejeição, os concretos pontos de facto que considera julgados de modo incorreto, os concretos meios de probatórios constantes do processo, de registo ou de gravação nele realizado, que imponham decisão diversa da recorrida, bem como aludir a decisão que no seu entender deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
Tais exigências, traduzidas num ónus tripartido sobre o recorrente, estribam-se nos princípios da cooperação, adequação, ónus de alegação e boa-fé processuais, garantindo a seriedade do recurso, num efetivo segundo grau de jurisdição quanto à matéria de facto, necessariamente avaliado de modo rigoroso, mas sem deixar de ter em vista a adequada proporcionalidade e razoabilidade, de modo a que não seja sacrificado um direito das partes em função de um rigorismo formal, desconsiderando aspetos substanciais das alegações, numa prevalência da formalidade sobre a substância que se pretende arredada.(...).»
Assim, e como se mostra sintetizado no Acórdão desta Secção Social de 20/05/2024, «[d]o que nos afigura também resultar da citada fundamentação, entendemos como adequado, em face do que resulta da lei, o entendimento de que, para cumprir os ónus legais aqui analisados, o recorrente sempre terá de alegar e levar para as conclusões, sob pena de rejeição do recurso, a indicação dos concretos pontos facto que considera incorretamente julgados, como estabelecido na alínea a) do n.º 1 do preceito citado, enquanto definição do objeto do recurso, sendo que, noutros termos, já quanto ao cumprimento do disposto nas alíneas b) e c) do mesmo número, desde que vertido no corpo das alegações, a respetiva não inclusão nas conclusões não determina tal rejeição do recurso».
Por conseguinte, nos termos da al. a) do n.º 1 do art.º 640.º do CPC, é imprescindível ao recebimento e apreciação da impugnação da decisão da matéria de facto, a indicação nas alegações e respetivas conclusões dos concretos pontos impugnados.
Quanto ao cumprimento do ónus previstos pelo art.º 640.º, n.º 1, al. c) do CPC, importa ter presente o Acórdão do STJ n.º 12/2023, supra identificado, que uniformizou a jurisprudência nos seguintes moldes:
«Nos termos da alínea c), do n.º 1 do artigo 640.° do Código de Processo Civil, o Recorrente que impugna a decisão sobre a matéria de facto não está vinculado a indicar nas conclusões a decisão alternativa pretendida, desde que a mesma resulte, de forma inequívoca, das alegações.».
Importa também referir que, no que toca ao recurso da decisão da matéria de facto, como vem sendo entendimento do STJ[8], que se perfilha, não é possível despacho de aperfeiçoamento[9].
Vejamos o caso dos autos.
Sob ponto 17 o que o tribunal “a quo” considerou provado seguinte:
“17 – Nos anos de 1995 a 2018, o 3º requerente recebeu as retribuições que constam nas tabelas da petição inicial aperfeiçoada.”
O recorrente deduz duas pretensões:
- o aditamento como provadas das retribuições que devia ter recebido enquanto TPJ e as diferenças entre estas e as retribuições que recebeu como TDP;
- que se considerem não provadas as correções às tabelas alegadas no requerimento inicial, introduzidas pelo tribunal.
Quanto à 1.ª questão importa referir que o recorrente não cumpre qualquer dos ónus supra mencionados, pois, apesar de referir que impugna a decisão do ponto 17 da matéria de facto provada o que requer é o aditamento de factos como provados, sem pôr em causa o ali decidido e no que respeita aos factos a aditar o recorrente não os concretiza.
Por outras palavras o cumprimento do ónus de indicação dos concretos pontos impugnados, no caso concreto, impunha ao recorrente a indicação dos factos que, tendo sido alegados, não foram considerados provados ao contrário do que a prova produzida impunha, ónus que o recorrente não cumpriu limitando-se à alegação de que os valores da retribuição que deveria ter recebido são os que resultam dos documentos juntos ao requerimento inicial, sendo que os documentos são meios de prova não substituindo a alegação dos factos.
E o recorrente também não cumpriu o ónus de indicação da decisão alternativa, já que se limitou a dizer que deveriam ser aditados aos factos provados os valores da retribuição que deveria ter auferido e o valor das diferenças retributivas, sem nunca os concretizar.
Assim, nos termos do disposto pelo art.º 640.º, n.º 1 do CPC. é de rejeitar a impugnação nesta parte.
Não podemos deixar de dizer que, mesmo que fosse de admitir a impugnação, esta nunca poderia ser julgada procedente, uma vez que a matéria que o recorrente pretendia ver aditada aos factos provados, é meramente conclusiva e jurídico valorativa, não podendo ser incluída no acervo factual.
Com efeito quer o que o recorrente deveria ter recebido, quer as diferenças retributivas devidas são asserções conclusivas e jurídico-valorativas que, por se subsumirem de forma relevante ao “thema decidendum” não têm lugar ao nível da matéria de facto.
Na verdade, como é entendimento pacífico da jurisprudência dos tribunais superiores[10], as conclusões, apenas, podem extrair-se de factos materiais, concretos e precisos que tenham sido alegados, sobre os quais tenha recaído prova que suporte o sentido dessas alegações, sendo esse juízo conclusivo formulado a jusante, na sentença, onde cabe fazer a apreciação crítica da matéria de facto provada.
Ou seja, só os factos materiais são suscetíveis de prova e, como tal, podem considerar-se provados. As conclusões, envolvam elas juízos valorativos ou um juízo jurídico, devem decorrer dos factos provados, não podendo elas mesmas serem objeto de prova.
Ademais, como se decidiu no Acórdão do STJ de 12.03.2014[11] “Só acontecimentos ou factos concretos podem integrar a seleção da matéria de facto relevante para a decisão, sendo, embora, de equiparar aos factos os conceitos jurídicos geralmente conhecidos e utilizados na linguagem comum, verificado que esteja um requisito: não integrar o conceito o próprio objeto do processo ou, mais rigorosa e latamente, não constituir a sua verificação, sentido, conteúdo ou limites objeto de disputa das partes”.
Caso constem da decisão da matéria de facto expressões ou conceitos com aquela natureza e relação com o objeto do litígio, os mesmos devem ser eliminados[12].
Ora, estando em causa a determinação das diferenças retributivas devidas ao recorrente em consequência da correção da sua categoria e nível salarial, são ostensivamente conclusivas e jurídico valorativas, inserindo-se na análise do “thema decidendum”, como já referido, as matérias que o recorrente pretendia que constassem da decisão da matéria de facto.
Por conseguinte, nunca a impugnação da decisão da matéria de facto, nesta parte, poderia ser julgada procedente, o que torna irrelevante a invocação de que a matéria em causa deve ser considerada plenamente provada por documento (documentos 5, 6, 7 e 8 juntos com o requerimento inicial) por a ré não ter impugnado os documentos de que ela resulta.
Acresce que, a verificar-se tal efeito, a impugnação estaria isenta do cumprimento dos ónus do art.º 640.º do CPC, cabendo mesmo nos poderes de conhecimento oficioso do Tribunal da Relação. Porém, os documentos em causa não cumprem os requisitos dos arts. 374.º e 376.º do Código Civil para que pudessem fazer prova plena das declarações neles constantes, pois não se trata sequer de documentos elaborados e/ou assinados pela recorrida, mas antes de documentos elaborados pelo recorrente.
Ainda a propósito do ponto 17, o recorrente pretendia que fossem eliminadas as correções introduzidas pelo tribunal.
Verifica-se, contudo, que relativamente ao recorrente a 1.ª instância não fez qualquer correção tendo considerado provado que o mesmo recebeu as retribuições que constam nas tabelas da petição inicial aperfeiçoada, sem qualquer ressalva ou modificação, pelo que improcede, por inconcludente, a pretensão deduzida.
Quanto à matéria do ponto 26 foi dado como provado em 1.ª instância que “O aqui 3º requerente foi inserido no procedimento de despedimento coletivo da Requerida”.
O recorrente cumpriu o ónus de indicação do concreto ponto impugnado seja na motivação (cfr. pontos 66 a 749), seja nas conclusões (cfr. conclusões 29.ª a 31.ª) e infere-se também da alegação e das conclusões, com mediana clareza, o cumprimento do ónus de indicação da decisão alternativa, pretendendo o recorrente que seja considerado provada a data do despedimento (30/10/2021) e que se encontra pendente ação de impugnação do despedimento coletivo.
Nem por isso, a impugnação poderá ser julgada procedente.
De facto, não vem posto em causa o que foi considerado provado. O que o recorrente alega é que tal matéria é insuficiente porque não precisa a data do despedimento, sendo esta essencial para saber até quando deve ser feita a liquidação.
A insuficiência da matéria de facto, a existir, no caso concreto, como também alega o recorrente, ainda que subsidiariamente, remete para a aplicação do disposto pelo art.º 662.º, n.º 2 al. c) do CPC, sendo causa de anulação da decisão proferida em 1.ª instância, se os autos não contiverem os elementos necessários ao suprimento da deficiência.
Contudo, para que se possa concluir que a matéria de facto é deficiente é necessário que esteja em causa matéria de facto relevante para a decisão.
Ora, ao contrário do alegado pelo recorrente, a data em que produziu efeitos o despedimento do recorrente não é essencial para saber até quando deve ser feita a liquidação, pois, a decisão liquidanda fixou de forma expressa e definitiva tal limite, já que nela se condenou a recorrida a pagar ao autor “todas as diferenças retributivas e remuneratórias correspondentes desde 28 de Janeiro de 1995 até à presente data, a apurar em incidente de liquidação deste acórdão” (sublinhado nosso), tendo o acórdão sido proferido em 04/06/2012.
Por conseguinte, é irrelevante saber se o despedimento coletivo produziu efeitos em 30/10/2021 e se tal despedimento foi impugnado, já que a liquidação das diferenças retributivas tem como limite data muito anterior.
Improcede, pois, a impugnação da matéria de facto, também nesta parte.
Alega o recorrente que a sentença fez tábua rasa do sentido global do Acórdão no qual, ao contrário do afirmado pela Mm.ª Juiz “a quo”, não se fez a progressão salarial do recorrente e se decidiu que para apurar as diferenças retributivas era necessário saber qual foi a respetiva progressão na categoria de TDP e qual deveria ter sido a progressão na categoria de TPJ.
Concluiu que a liquidação tem de ser feita com base no que o recorrente recebeu enquanto TDP com a evolução salarial respetiva, que foi feita com transporte da antiguidade no nível salarial na anterior estrutura D..., e no que o recorrente deveria ter recebido quanto TPJ com a evolução salarial determinada nos mesmos termos (com transporte da antiguidade no nível salarial da anterior estrutura). Conclui ainda que a questão do transporte da antiguidade no nível salarial na anterior estrutura dos D... para determinação da progressão salarial não podia ter sido tratada no Acórdão pois, precisamente porque não se conhecia a progressão salarial enquanto TDP é que se tornou necessária a liquidação das diferenças, na medida em que só depois de ser determinada tal progressão é que era possível determinar igual progressão enquanto TPJ e, consequentemente, apurar as diferenças retributivas devidas.
A recorrida, por sua vez alegou que no Acórdão liquidando ficou definitivamente resolvida a questão da evolução profissional do requerente, blindada pela autoridade do caso julgado e que a decisão recorrida não fez qualquer “errada ou descontextualizada interpretação” desse Acórdão, bem pelo contrário, os Requerentes é que pretendem desvirtuar o seu sentido e alcance, através da introdução de questões que o seu dispositivo não permite que sejam apreciadas porque cobertas pela força do seu trânsito em julgado.
Vejamos!
O incidente de liquidação é, no essencial, uma exigência que emerge da regra de que só a obrigação líquida pode ser coercivamente efetivada em juízo (art.º 713.º do CPC). Em particular, no que à sentença condenatória respeita, ela só constituirá título executivo depois do trânsito em julgado (excecionando-se os casos em que o recurso tiver efeito devolutivo- art.º 704.º, n.º 1 do CPC) e, sendo a condenação genérica, nos termos do art.º 609º, nº 2, do CPC, após a respetiva liquidação no processo declarativo (art.º 704.º, n.º 6 do CPC).
Ora, tal como se refere na sentença, o incidente de liquidação previsto pelos arts. 358.º a 361.º do CPC, “destina-se, precisamente, a proceder à determinação - quantitativa ou qualitativa - do objeto do direito, cujos elementos não se encontrem logo especificados - como refere Salvador da Costa [Os Incidentes da Instância, pág. 292], «a liquidação de sentença só visa concretizar, como é natural, o objeto da condenação, com o respeito pelo caso julgado decorrente da ação declarativa».
Ou seja, a liquidação da sentença destina-se tão somente a ver concretizado o objeto da sua condenação (genérica), mas, obviamente, sempre respeitando (ou nunca ultrapassando) o caso julgado formado na mesma sentença condenatória a liquidar: a liquidação tem, pois, forçosamente, de obedecer ao que foi decidido no dispositivo da sentença.”
Releva ainda assinalar, como elucida Alberto dos Reis[13], que o caso julgado exerce duas funções, uma positiva e outra negativa. Exerce a primeira quando faz valer a sua força e autoridade, tendo a sua expressão máxima no princípio da exequibilidade, servindo de base à execução. Exerce a segunda através da exceção de caso julgado. Porém, “(..) autoridade de caso julgado e excepção de caso julgado não são duas figuras distintas; são antes, duas faces da mesma figura. O facto jurídico «caso julgado» consiste afinal nisto: em existir uma sentença, com trânsito em julgado, sobre determinada matéria. Ora bem, esta sentença pode ser utilizada, numa acção posterior, ou pelo autor ou pelo réu (..). Temos, pois, que o caso julgado pode ser invocado pelo autor ou pelo réu; invoca-o o autor quando faz consistir nele o fundamento da sua acção: invoca-o o réu quando se serve dele para deduzir excepção. Mesmo quando funciona como excepção, por detrás desta está sempre a força e autoridade de caso julgado».
Na mesma linha doutrinária, afirma-se no sumário do Ac. do STJ de 22/06/2017[14] “[II] A eficácia do caso julgado, na sua dupla vertente que se impõe considerar, tem por um lado a sua função negativa, que impede que as questões alcançadas se possam voltar a suscitar entre as mesmas partes em ação futura, e, por outro, uma função positiva, designada por autoridade do caso julgado, através da qual a solução neste compreendida se torna vinculativa no quadro de outros casos a ser decididos no mesmo ou em outros tribunais – tal autoridade visa precisamente evitar que a questão decidida pelo órgão jurisdicional próprio possa ser validamente definida mais tarde, em termos diferentes, por outro ou pelo mesmo tribunal».
Por outro lado, nos termos do disposto pelo art.º 621.º do CPC, a sentença constitui caso julgado nos precisos limites e termos em que julga, pelo que importa, em cada situação, determinar exatamente tais limites e termos, o que no caso em apreço significa que importa interpretar a decisão com vista a fixar os efetivos contornos da obrigação liquidanda.
A este propósito pode ler-se na sentença recorrida, que se acompanha:
“Tal como vem sendo entendido, nesta interpretação há que fazer apelo às regras da interpretação dos negócios jurídicos (artigos 236° ss do Código Civil).
Com efeito, sendo as decisões judiciais atos formais, amplamente regulamentados pela lei de processo, tem de se lhes aplicar a regra fundamental segundo a qual não pode a sentença valer com um sentido que não tenha no documento que a corporiza um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso.
Por outro lado, vem também sendo entendimento dominante que a força do caso julgado material abrange, para além das questões diretamente decididas na parte dispositiva da sentença, as que sejam antecedentes lógico necessário à emissão da parte dispositiva do julgado.
Ou seja, a interpretação da sentença não pode assentar exclusivamente na análise do sentido da parte decisória, tendo naturalmente que considerar os seus antecedentes lógicos, toda a fundamentação que a suporta.
Como se refere no AC STJ de 26-04-2012 (www.dgsi.pt), «em qualquer caso, interpretar o conteúdo de uma sentença de mérito é pressuposto indispensável da determinação do âmbito do caso julgado material, naturalmente. E sabe-se que, para o efeito, não basta considerar a parte decisória, cabendo tomar na devida conta a fundamentação ("é ponto assente na doutrina que os fundamentos da sentença podem e devem ser utilizados para fixar o sentido e alcance da decisão contida na parte final da sentença, coberta pelo caso julgado", escrevem Antunes Varela, J. M. Bezerra e Sampaio e Nora, Manual de Processo Civil, 2- ed., Coimbra, 1985, pág. 715, como se recorda no acórdão de 29 de Abril de 2010, www.dgsi.pt, proc. n 102/2001.L1.S1), o contexto, os antecedentes da sentença e outros elementos que se revelem pertinentes (acórdão de 8 de Junho de 2010, www.dgsi.pt, proc. n° 25.163/05.5YLSB.L1.S1). Para além disso, e porque se trata de um ato formal, aliás particularmente solene, cumpre garantir que o sentido tem a devida tradução no texto (cfr., com o devido desenvolvimento, o acórdão de 3 de Fevereiro de 2011, www.dgsi.pt, proc. n° 190-A/1999.E1.S1 e o acórdão de 25 de Junho de 2009, www.dgsi.pt, proc. n° 351/09.9YFLSB».”
A divergência do recorrente relativamente ao decidido na sentença recorrida, assenta precisamente numa diferente interpretação do alcance do Acórdão do Tribunal da Relação, o qual transitou em julgado (cfr. arts. 619.º r art.º 628.º ambos do CPC), impondo-se a respetiva interpretação.
Ora, iniciaram-se os presentes autos, pelo pedido de que a ré fosse condenada a classificar o recorrente na categoria profissional de TPJ, desde 01/01/1995; colocando-o nessa data no nível salarial 2, fazendo-o evoluir de acordo com o Acordo de Empresa aplicável, situando-se o recorrente, em 30/09/2005, na categoria profissional de TPJ, nível 5, e a pagar- lhe todas as diferenças retributivas e remuneratórias correspondentes desde 01/01/1995 até 30/09/2005 e a pagar-lhe as diferenças retributivas e remuneratórias vincendas desde 01/10/2005.
Em 1.ª instancia a ré foi condenada a classificar o recorrente na categoria profissional de TPJ, nível 2, desde 01/01/1995; a fazê-lo evoluir de acordo com o Acordo de Empresa aplicável, situando-se aquele em 30/09/2005, na categoria profissional de TPJ, nível 5; a pagar-lhe todas as diferenças retributivas e remuneratórias correspondentes desde 01/01/1995 até 31/10/1997, no montante mensal de 15.916$00 (sem prejuízo de eventuais atualizações salariais que tenham sido efetuadas no decurso dos anos de 1997 e de 1998); e a pagar-lhes todas as diferenças retributivas e remuneratórias correspondentes desde 1 de Janeiro de 1998 até à data da sentença, a liquidar em incidente de liquidação posterior, improcedendo a ação quanto ao pedido de condenação relativo às diferenças retributivas e remuneratórias vincendas.
O Tribunal da Relação do Porto revogou tal sentença, constando da parte decisória do acórdão prolatado o seguinte: a condenação da ré a classificar o 3° autor (o aqui recorrente) na categoria profissional de TPJ, nível 2, desde 28 de Janeiro de 1995; a fazer o autor evoluir nos níveis de progressão salarial de acordo com os Acordos de Empresa sucessivamente aplicáveis; a pagar ao autor todas as diferenças retributivas e remuneratórias correspondentes desde 28 de Janeiro de 1995 até à data do acórdão, a apurar em incidente de liquidação.
Através do incidente de liquidação o recorrente pretende que as diferenças retributivas e remuneratórias sejam quantificadas até 2018, sem ignorar as vincendas.
Ressalta, desde logo da decisão em liquidação que, como já referimos a propósito da impugnação do ponto 26 da matéria de facto, a obrigação de pagamento das diferenças foi fixada de forma expressa e definitiva com um âmbito temporal determinado (de 28/01/1995 até 04/06/2012), pelo que, na parte em que excede essa data a pretensão do recorrente ultrapassa os limites do caso julgado.
Por outro lado, do nosso ponto de vista, a interpretação feita pelo tribunal “a quo” do Acórdão liquidando, não merece censura, não tendo o entendimento do recorrente qualquer correspondência na mesma decisão, que de resto, até contraria.
Com efeito, ao contrário do alegado pelo recorrente, não só o dito Acórdão decidiu definitivamente a progressão salarial do recorrente como TPJ até 2005, como em parte alguma afirmou que tal progressão deveria ser feita da mesma forma que a progressão que o recorrente teve na categoria de TPD.
Não se suscitam dúvidas quanto ao momento inicial da contagem da progressão salarial na categoria de TPJ, já que o Acórdão o fixou expressamente em 28/01/1995.
Depois, pode ler-se na fundamentação do Acórdão:
“O que sucedeu também foi que desde Janeiro de 2005 os AA. passaram a desempenhar funções que correspondem à categoria de TPJ, criada pelo 1° AE. Do que se trata portanto é de categorizar os AA. na categoria que corresponde às funções que desempenham — categoria essa que a Ré lhes não deu nessa altura e que é o primeiro pedido dos AA. Ora, é facto que enquanto TDP os AA. auferiram salários correspondentes a esta categoria, sendo certo que se tivessem sido categorizados de acordo com as funções que efectivamente desempenhavam, teriam auferido salários correspondentes à categoria de TPJ. Para apurar as diferenças entre uns e outros, importa perceber qual foi a progressão na categoria de TDP que os AA. tiveram e qual teria sido a progressão na categoria de TPJ, ou seja, qual devia ter sido a progressão nesta categoria. Tendo estabelecido um ponto de contagem inicial desta progressão, a questão é de saber qual o nível salarial da categoria de TPJ em que os AA. deviam ser colocados nesse ponto.
Rege a dita cláusula 20ª n° 2, cuja interpretação ou aplicação prática nos parece ser a seguinte:
- se a remuneração é igual numa e noutra categoria, é neste nível que colocamos o trabalhador; se a remuneração na categoria antiga é inferior ao do nível inicial da categoria nova, o trabalhador é colocado nesta; se a remuneração é superior ao nível inicial da categoria nova, o trabalhador é colocado no nível imediatamente seguinte da categoria nova.
Digamos portanto que no caso dos 1°, 2º e 4-° AA. que como TDP nível 6 ganhavam 117.700$00, o nível inicial da categoria de TPJ tinha a remuneração de 125.145$00 (de acordo com a tabela de remuneração mínima constante do Anexo III do AE) e em Janeiro de 1995, de 126.396$00, pelo que esta remuneração era superior à que os AA. auferiam, e por isso e por via da al. b) da cláusula 20.ª n° 2, deviam ter sido colocados no nível 1 desta categoria. Já no caso do 3° A., que como TDP 7 auferia 127.021$00, não havendo correspondência de remuneração na categoria de TPJ, e não sendo a remuneração do nível inicial de TPJ superior à que ganhava, devia ter sido colocado no nível imediatamente superior ao da sua remuneração, que no caso, era o nível 2 -142.937$00 — por aplicação da parte final da alínea a) da dita cláusula 20- ».
Mas o Acórdão não se fica por aqui, tendo respondido também à questão de saber como devia ter sido a progressão do recorrente, colocado em TPJ nível 2, e a propósito dela à questão de saber qual o tempo de permanência em cada nível salarial para a progressão para o nível seguinte, divergindo nessa parte do entendimento perfilhado pela sentença da 1.ª instância.
Lê-se no Acórdão:
«O Mmº Juiz a quo considerou: “Para a apreciação desta parte do pedido (que a Ré faça evoluir os AA de acordo com o AE aplicável situando-se cada um deles em 30.0.2005 em TPJ nível 5) há que ter em consideração o disposto nas cláusulas 24ª a 26ª do Acordo de Empresa aplicável, relativas à progressão na carreira.
Assim, a cláusula 24ª define progressão como a passagem de um trabalhador para nível de progressão superior na sua categoria profissional.
Por sua vez, a cláusula 25ª nº 1 prevê que a progressão pode ser automática ou por nomeação, esclarecendo o nº 2 que a progressão automática é a que decorre da antiguidade no nível; e o nº 6 que a progressão por nomeação é a que decorre de iniciativa exclusiva da empresa". Mais adiante conclui, "aplicando tais princípios ao caso presente, temos que os AA. deveriam ter sido promovidos ao nível TPJ 3 após quatro anos de TPJ 2, ou seja em Janeiro de 1999. Consequentemente, eles deveriam ter sido promovidos ao nível TPJ 4 em Janeiro de 2003; e ao nível TPJ 5 em Janeiro de 2010".
Mas repensa: "Contudo, aquando da revisão a este Acordo de Empresa publicada no Boletim do Trabalho e Emprego nº 11, de 22/03/2001, esta Tabela de Integrações sofreu uma alteração substancial, passando aí a constar que a passagem a TPJ 3 é efectuada após 3 anos em TPJ 2; a passagem a TPJ 4 é efectuada após 3 anos em TPJ 3; a passagem para TPJ 5 é efectuada após 4 anos em TPJ 4; a passagem a TPJ 6 é efectuado após 5 anos em TPJ 5
Insurge-se a recorrente contra a aplicação retroactiva do AE 2001.
Por virtude do disposto no artº 2º do DL 519-C1/79 já acima citado, as condições de vigências dum acordo de empresa são as mesmas que as da lei, ou seja, que a lei não tem aplicação retroactiva nos termos do arte 12º do Código Civil. Desse modo, o encurtamento de prazos de permanência em determinado nível de progressão salarial só pode produzir efeitos a partir da entrada em vigor da revisão e no máximo, se esta entrada em vigor coincidir com prazo em curso, encurtar este. Se porém o encurtamento entra em vigor quando já decorreu o prazo anteriormente vigente, não pode este deixar de ser atendido.
É de acordo com este entendimento que a progressão salarial de todos os AA. tem de ser feita, partindo da categorização dos mesmos como TPJ (nível 1 para os 1º, 2º e 4º AA e nível 2 para o 3º A) em 28.1.1995 - e assim obtendo para os 2º e 4º AA. a sua passagem a TPJ 2 em 1.1.98, a TPJ3 em 1.1.2001 e a TPJ 4 em 1.1.2004 e para o 3º A. a sua passagem a TPJ 3 em 1.1.98, a TPJ 4 em 1.1.2001 e a TPJ 5 em 1.1.2005 - e é com base nela que se terão de apurar em liquidação do presente acórdão, as diferenças salariais. O apuramento de diferenças salariais não será prejudicado, pensamos, pela circunstância da categoria de TPJ ter sido extinta em 2007. Os autos não nos fornecem elementos, mas seguramente a errada categorização dos AA. e a sua progressão profissional nessa errada categoria, com a entrada em níveis incorrectos quando foram passados a TPJ, terá determinado a sua integração na categoria que se sucedeu a TPJ em nível salarial inferior ao devido. Por isso, por si só e para a questão das diferenças salariais, a extinção de tal categoria é irrelevante.»
É, pois, evidente que o Acórdão se pronunciou quanto ao tempo de permanência necessário em cada nível salarial da categoria de TPJ no sentido de ser aplicável o regime consagrado no AE de 2001 e que reconstruiu a progressão salarial que o recorrente deveria ter tido até 01/01/2005 definindo as datas em que produziria efeito a progressão ao nível seguinte nesse período de tempo. E fê-lo em termos que não poderão agora voltar a ser reequacionados, face ao trânsito em julgado da decisão.
Por isso, nenhum reparo merece a decisão recorrida quando afirma que “(…) a própria decisão liquidanda faz a progressão dos autores, em termos de níveis salariais, da mesma se constatando que nessa progressão não foi levado em consideração o tempo de permanência que os mesmos detinham na antiga estrutura dos D....
Efetivamente, lida tal decisão em momento algum se vislumbra qualquer alusão ao transporte do tempo de permanência nos níveis da estrutura de onde os requerentes eram oriundos para a estrutura da requerida.
E, porque assim é, com o devido respeito por diversa opinião, afigura-se-nos que a questão que os ora requerentes trazem à colocação no presente incidente de liquidação é uma questão nova. E, nessa medida a pretendida liquidação - que se alicerça na contagem desse tempo de permanência - não se harmoniza com o teor do título que lhe está subjacente, por forma a que a decisão que liquide o valor antes não apurado complete a decisão principal condenatória e isto porque tal questão não foi tida em conta no acórdão que ora se pretende liquidar, não o podendo ser agora em sede de liquidação, pois que esta, como vimos, destina-se apenas à concretização do objeto da condenação.”
Acresce que a interpretação que o recorrente defende não só não é conforme ao decidido pelo Acórdão, como violaria o ali decidido.
Na verdade, do ponto de vista do recorrente a sua passagem ao nível TPJ 3 ocorreria em Outubro de 1997, mas o que foi decidido no Acórdão é que tal progressão ocorreria em 01/01/1998.
Por outro lado, do Acórdão resulta também expressamente quais os elementos necessários à liquidação da obrigação da ré, referindo que “(…) o apuramento concreto das diferenças salariais terá de ser relegado para liquidação do presente acórdão, como de resto resolvido pelo Mmº Juiz a quo, porque os autos não contêm os elementos suficientes para se saber a progressão salarial que os AA. tiveram como TDP nem de resto temos nota dos vencimentos concretamente auferidos.”
Em momento algum do Acórdão se afirma que a progressão salarial do recorrente como TPJ devesse ser feita nos exatos termos em que foi feita a progressão salarial como TDP, o que se afirma é que, tendo a recorrida atribuído erradamente ao recorrente a categoria de TDP, quando o mesmo devia ser TPJ, com a progressão salarial ali fixada, para determinar o valor das diferenças retributivas devidas é necessário saber qual foi a progressão salarial como TDP, determinando os valores auferidos. De onde resulta que os únicos elementos em falta e que determinaram que a condenação fosse genérica com a subsequente necessidade e liquidação, são os relativos ao concretos valores auferidos pelo recorrente na categoria de TDP nos seus diferentes níveis salarias.
Ora, como se pode ler no sumário do Ac. do STJ de 04/07/2019[15] “Na liquidação, não se trata de apurar novos elementos que ultrapassem a condenação genérica proferida, mas tão só de determinar os elementos ou valores já contidos naquela condenação que têm de ser especificados”.
E o Tribunal da Relação especificou tais elementos e identificou quais os que estavam em falta, não sendo admissível fazer apelo a elementos diferentes (muito menos contornar a decisão proferida e transitada em julgado, na tentativa de fazer repristinar a orientação seguida pela sentença revogada) para quantificar o concreto valor em dívida.
Por conseguinte, não poderia proceder, como não procedeu a pretensão do recorrente de que a liquidação fosse feita com base em critérios diferentes dos fixados na decisão em liquidação, designadamente com base na progressão salarial na categoria de TPJ efetuada com contabilização do tempo de permanência em estrutura anterior da ré, no caso os D..., que o Tribunal da Relação não acolheu, não merecendo reparo a decisão recorrida, quando afirma que “(…) a liquidação que ora se pretende excede o objeto do presente incidente.”
Já não se concorda com a sentença recorrida quando, por aquele motivo, conclui que, com exceção da confissão da requerida quanto a algumas diferenças, a liquidação não é admissível.
Salvo o devido respeito não está em causa a admissibilidade da liquidação, mas os seus limites, que se devem restringir aos constantes da decisão liquidanda. Pelo que se o peticionado exceder tais limites, a liquidação deve improceder quanto ao excesso. De resto, sendo a liquidação processualmente admissível, em último caso, ela sempre terá de ser feita, nem que seja por recurso à equidade (cfr. art.º 566.º, n.º 3 do Código Civil)[16].
Nem por isso, se alcançará decisão diversa da proferida pela Mm.ª Juiz “a quo”.
Na verdade, no que respeita ao recorrente, a obrigação da recorrida foi liquidada em € 18 020,80, por ser esse o valor que a recorrida confessou dever ao recorrente.
Os autos continham, porém, os elementos necessários à liquidação em função dos critérios fixados pelo Acórdão liquidando, já que ficou provado o valor das retribuições auferidas pelo recorrente desde 1995 até 2018 e que as retribuições que deveria ter auferido se apuram face aos instrumentos de regulamentação coletiva aplicáveis, correspondendo a matéria de direito.
Ora, estando as diferenças retributivas devidas temporalmente balizados pelo período de 28/01/1995 a 04/06/2012, considerando os valores convencionalmente estabelecidos para cada um dos níveis salariais correspondentes à progressão do recorrente na categoria de TPJ, tal como determinada pelo Acórdão, sempre se apuraria um valor substancialmente inferior ao confessado pela recorrida e fixado pelo tribunal.
Mas, não tendo a recorrida impugnado a decisão está vedada ao tribunal a possibilidade de diminuir o montante da condenação.
Com efeito atento o disposto pelo art.º 635.º, n.º 5 do CPC, a decisão do recurso não pode ser mais desfavorável ao recorrente do que a decisão recorrida[17].
Neste pressuposto, inexiste fundamento para alterar a quantia liquidada pela sentença recorrida, improcedendo o recurso.
Por todo o exposto acorda-se julgar o recurso totalmente improcedente, confirmando a decisão recorrida.
Custas pelo recorrente.