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PROPRIEDADE HORIZONTAL
LOGRADOURO
Sumário
I -O logradouro, como parte comum de um prédio constituído em propriedade horizontal, não pertence exclusivamente a um dos condóminos, pese embora poder estar afectado a seu uso. II - É ilegal a construção, por um dos condóminos, não autorizado pela Assembleia do Condomínio, de um anexo com 9 metros de comprimento e 3,50 de altura até ao cúmeo no centro do telhado, e 2,50 de altura, além do mais, por prejudicar a linha arquitectónica e o arranjo estético do edifício. III - A sanção para construção de tal tipo é a demolição, a cargo do condómino infractor.
Texto Integral
Acordam no Tribunal da Relação do Porto
I – RELATÓRIO
1- No Tribunal Judicial da Comarca de ........, o Autor Ilídio .........., residente em Rua .........., n.º .., .........., propôs a presente acção declarativa de condenação com processo ordinário contra, Eduardo ..........., residente em Rua .........., n.º .., ........., alegando resumidamente:
É dono e legítimo possuidor de uma fracção autónoma de um prédio constituído em propriedade horizontal, constituído por quatro fracções autónomas, sendo cada uma delas composta por r/c, 2 andares e logradouro.
A fracção autónoma do Autor confina do lado poente com a fracção autónoma pertencente ao réu, sendo que o réu construiu um anexo no logradouro, sem o consentimento dos demais condóminos, o qual altera a linha arquitectónica ou arranjo estético do edifício, e diminui a incidência da luz solar no logradouro contíguo do autor, tornando-o um local sombrio, frio e húmido, situação que lhe causa preocupações.
Conclui pedindo a sua condenação na demolição da obra construída no logradouro, repondo-o no estado anterior, bem como no pagamento da quantia de 650.000$00/3.242,18€, a título de indemnização por danos patrimoniais e morais
2 - Devidamente citado o réu contestou, impugnando, os factos vertidos pelo autor, excepcionando a sua ilegitimidade passiva por preterição de litisconsórcio necessário dos cônjuges, e acusando o Autor de litigância de má fé.
Concluí pugnando pela procedência da excepção e consequente absolvição da instância, ou pela total improcedência da acção e procedência do pedido de condenação por litigância de má fé, em multa condigna e indemnização não inferior a 150.000$00.
3 - Na réplica o autor defende-se da acusação de má fé e requereu a intervenção principal provocada da mulher do réu Anabela ............, a qual foi admitida.
Esta, regularmente citada, fez sua a contestação do réu.
4 - O processo prosseguiu termos, tendo tido lugar audiência de discussão e julgamento, sendo proferida sentença que julgou a acção totalmente improcedente.
5 - Apelou o Autor, nos termos de fls. 169 a 180, formulando as seguintes conclusões:
1ª- O despacho recorrido violou claramente as disposições de direito substantivo prevista no Art. 1422 do C.C..
2ª - O douto despacho proferido pelo tribunal a quo não fez correcto enquadramento jurídico da factualidade apurada aos normativos legais aplicáveis à situação sub judice.
3ª - Além disso, o despacho recorrido é totalmente destituído de fundamentação legal, é feita uma interpretação ab rogante das disposições aplicáveis, sem que exista o mínimo de correspondência na letra ou espírito da lei.
4ª - A construção do anexo no logradouro da fracção 'B', propriedade dos réus foi feita sem autorização ou consentimento do autor, bem como dos restantes condóminos, nunca existiu nem existe deliberação da assembleia de condomínio a autorizar a referida construção.
5ª - Estes factos constam da matéria de facto apurada pelo Tribunal a quo.
6ª - Não obstante, o Tribunal a quo afasta a aplicabilidade do disposto no artigo 1422 do C.C. por erradamente considerar que o anexo não consubstancia uma alteração linha arquitectónica ou do arranjo estético do edifício, ou constitua alteração do fim a que se destina o logradouro, logo não seria exigível a prévia autorização da Assembleia, prevista no Artigo 1442, nº 3 do C.C., "sendo, por isso, absolutamente inócua a sua apurada inexistência".
7ª - Mas na verdade, face à natureza, altura e dimensões da construção em causa, não restam dúvidas de que a mesma modifica a linha arquitetónica e o arranjo estético do edifício, pois a construção feita quebra, ofende a unidade sistemática que até aí o imóvel oferecia, ou seja, a traça geral que até aí tinha.
8ª- Aos condóminos é vedado fazerem, mesmo na sua fracção, obras que alterem física, volumétrica e esteticamente o prédio em que se integram, excepto se a obra for aprovada por maioria representativa de dois terços do valor total do prédio, nos termos do disposto no artigo 1422, nº 3, do código civil.
9ª - A referida decisão contraria in totum, quer na sua fundamentação quer na subsunção feita dos factos ao direito aplicável, o entendimento maioritário propugnado pela jurisprudência e doutrina dominantes.
10ª- As regras da propriedade horizontal previstas no artigo 1414 do Código Civil impõe inegáveis limitações ao exercício do direito de propriedade dos condóminos, afastar a aplicabilidade dessas regras fundamentando-se em juízos de valor acerca da justeza, razoabilidade, uso comum dos logradouros, é reduzir a tutela legal dos condóminos à ambiguidade, à incerteza, ao sabe-se "lá o que pode acontecer".
11ª- A lei, imperativo categórico do princípio da legalidade é simultaneamente, pilar do estado de direito em que vivemos e garantia de realização de justiça para o cidadão comum.
12ª - A inaplicabilidade das disposições que tutelam de forma clara e inequívoca Interesses e direitos dos condóminos, constitui uma violação clara de direitos e garantias que lhes assiste.
13ª - Pelo exposto, atendendo aos factos apurados pelo Tribunal a quo deve considerar-se que a obra levada a cabo no logradouro da fracção "E", constitui claramente uma alteração da linha arquitectónica ou arranjo estático do prédio, nos termos do disposto no Art. 1422, nº 2 e 3 do C.C..
14ª - Assim, deve-se revogar a decisão do Tribunal recorrido por contrária à lei, condenando-se o Réu na demolição do anexo construído sem previa ou posterior autorização de dois dos condóminos.
6 - Contra-alegou o recorrido, batendo-se pela confirmação do julgado.
II - FACTUALIDADE PROVADA
Encontram-se provados os seguintes factos:
A) O autor é dono e legítimo possuidor da fracção autónoma designada pela letra “A”, do prédio urbano constituído em regime de propriedade horizontal, composto de quatro fracções autónomas, sendo cada uma delas composta por rés-do-chão, 2 andares e logradouro, sendo comum a todas o terreno existente na parte posterior dos logradouros de cada fracção, sito na Rua ..........., n.º.., actual Rua ........., tendo a referida fracção o n.º.., e encontrando-se provisoriamente registada na competente Conservatória de Registo Predial em favor do autor, sob o n.º 010247091086-“A” (cfr. alínea A) dos factos assentes e documentos de fls. 8 e segs.);
B) Por sua vez, os réus, por escritura pública outorgada em 10/09/98, declararam comprar a Fernando ........... e mulher Maria ............, os quais declararam vender-lhes, a fracção autónoma designada pela letra “B”, do mesmo prédio (cfr. alínea B) dos factos assentes e documento de fls. 58 e segs. );
C) O réu marido construiu um anexo na área destinada a logradouro daquela fracção “B”, situado paralelamente ao muro de divisão desta com a referida fracção “A”, com cerca de 9 metros de comprimento e 3,50 metros de altura até ao cúmeo no centro do telhado e 2,50 metros de altura de parede (“pé direito”)- (cfr. alíneas C), G) e H) dos factos assentes e resposta explicativa ao quesito 1º da base instrutória);
D) Essa construção foi licenciada como “coberto-churrasqueira” e teve o seu início em 19/03/99, sem conhecimento e/ou autorização do autor, inexistindo deliberação da Assembleia de Condóminos a autorizá-la, e não estando sequer constituída a administração de condóminos (cfr. alíneas D), E) e F) dos factos assentes e documento de fls. 45 dos autos de procedimento cautelar apensos);
E) Essa construção diminui em alguma medida e durante o final da tarde, a incidência da luz solar sobre cerca de metade da extensão do logradouro da fracção “A” na sua parte mais estreita, aproximadamente correspondente ao comprimento da construção referido em 1.3. (cfr. resposta restritiva ao quesito 2º da base instrutória);
F) A referida fracção “A” confronta do nascente com um prédio com altura superior a 5 metros, em toda a extensão do seu logradouro, o qual tem potencialidades de lazer e jardinagem (cfr. alínea I) dos factos assentes e resposta positiva ao quesito 4º da base instrutória);
G) O autor ficou aborrecido com a referida construção dos réus (cfr. resposta restritiva ao quesito 9º da base instrutória).
H) Na escritura da constituição da propriedade horizontal (fls. 13 a 16) consta que "o prédio urbano, composto de quatro edifícios, destinados a 4 moradias unifamiliares, de r/c, 1º e 2º andares, destinados a habitação, com a superfície coberta de 321,5m2 e logradouro com 808,5 m2" é "submetido ao regime de propriedade horizontal, o qual fica a ser composto de quatro fracções autónomas".
Consta também do documento complementar elaborado nos termos do artigo 64 do Código de Notariado, (fls. 17 a 21), que todas as fracções têm um logradouro constando ainda desse documento que "é comum a todas as fracções o terreno existente na parte posterior dos logradouros de cada fracção, com a área de 174,40m2", (doc. de fls. 13 a 16 e de fls. 17 a 21).
III – DA SUBSUNÇÃO - APRECIAÇÃO
Verificados que estão os pressupostos de actuação deste tribunal, corridos os vistos, cumpre decidir.
O objecto do recurso é definido pelas conclusões da alegação do recorrente, artigo 684 nº 3 do Código de Processo Civil.
A) A questão a decidir é essencialmente uma, a saber:
Pode um condómino construir no logradouro afecto á sua fracção um anexo situado paralelamente ao muro de divisão desta com a referida fracção “A”, com cerca de 9 metros de comprimento e 3,50 metros de altura até ao cúmeo no centro do telhado e 2,50 metros de altura de parede (“pé direito”).
Impõe-se referir que aquela construção foi realizada sem conhecimento e sem autorização da Assembleia de Condóminos (e do Autor) e que a mesma diminui em alguma medida e durante o final da tarde, a incidência da luz solar no logradouro afecto à fracção do Autor.
B) Em nossa opinião a resposta àquela questão terá, ao contrário do decidido na decisão recorrida, de ser negativa.
Vejamos.
Dispõe o artigo 1420 nº 1 do Código Civil que "cada condómino é proprietário exclusivo da fracção que lhe pertence e comproprietário das partes comuns do edifício".
E, nos termos do artigo 1421 nº 1 do mesmo diploma "são comuns as seguintes partes do edifício:
a) O solo........., "acrescentando o nº 2 que se presumem ainda comuns:
a) "os pátios e jardins anexos ao edifício".
"O título constitutivo pode afectar ao uso exclusivo de um dos condóminos certas zonas das partes comuns", nº 3 do mesmo artigo”.
O artigo 1422 do Código Civil dispõe:
1. Os condóminos, nas relações entre si, estão sujeitos, de um modo geral, quanto às fracções que exclusivamente lhes pertencem e quanto às partes comuns, às limitações impostas aos proprietários e aos comproprietários de coisas imóveis”.
2. É especialmente vedado aos condóminos:
a) Prejudicar, quer com obras novas, quer por falta de reparação, a segurança, a linha arquitectónica ou o arranjo estético do edifício;
b) Destinar a sua fracção a usos ofensivos dos bons costumes;
c) Dar-lhe uso diverso do fim a que é destinada.
3. As obras que modifiquem a linha arquitectónica ou o arranjo estético do edifício, podem ser realizadas se para tal se obtiver prévia autorização da assembleia de condóminos (...);
4. Sempre que o título constitutivo não disponha sobre o fim de cada fracção autónoma, a alteração ao seu uso carece de autorização da assembleia de condóminos (...)”.
Deveremos ter ainda em consideração o disposto no artigo 1425 do Código Civil.
Tendo em atenção estes princípios jurídicos relembremos a matéria de facto provada.
Autor e Réu são proprietários de duas fracções autónomas de um prédio constituído em propriedade horizontal, sendo que ambas as fracções dispõem de logradouro os quais confinam entre si e confrontam com o terreno existente na parte posterior dos logradouros de cada fracção, com a área de 174,40m2, o qual é comum a todas as fracções.
O Réu no logradouro afecto á sua fracção construiu um anexo que diminui em alguma medida e durante o final da tarde, a incidência da luz solar no logradouro afecto à fracção do Autor.
Da matéria provada resulta que cada uma das quatro fracções que compõem o prédio objecto de propriedade horizontal dispõe de um logradouro privativo havendo ainda um terreno, na parte posterior desses logradouros, que é comum a todas as fracções.
A lei não define o que é um logradouro, nem refere expressamente se estamos perante uma parte comum do prédio ou não.
A doutrina bem assim como a jurisprudência encontram-se divididas.
Há quem entenda que o logradouro só é comum se outra qualificação não resultar do título constitutivo da propriedade horizontal.
A generalidade da jurisprudência entende que os logradouros são presuntivamente comuns, (cabendo desta forma no nº 2 al. a) do artigo 1421 do Código Civil ), havendo ainda quem defenda que os logradouros são imperativamente comuns (cabendo desta forma no nº 1 al. a) do artigo 1421 do Código Civil), - para análise das diversas posições cfr. por exemplo o Ac. da Relação de Lisboa de 18.1.2001, Col. Jur. pag. 87 e seguintes; Sandra Passinhas, A Assembleia de Condóminos e o Administrador na Propriedade Horizontal, pag 28 e 29; Aragão Seia, Propriedade Horizontal, pag 67 nota 2.
O logradouro de um prédio mais não é senão o "terreno não edificado que circunda o prédio, podendo servir fins diversos: estacionamento, delimitação do prédio, entrada, base de edificações secundárias, entre outros", cfr. Sandra Passinhas, A Assembleia de Condóminos e o Administrador na Propriedade Horizontal.
O logradouro "é o terreno contíguo a uma habitação para serventia, o lugar onde todos podem entrar"- cfr. Dicionário de Língua Portuguesa, Porto Editora, "é um eido anexo a uma casa...., rossio, terreiro, lugar público onde o povo pode espairecer", cfr. Grande Dicionário da Língua Portuguesa.
Resulta de forma clara, quer da análise do conceito - logradouro -, quer da leitura do artigo 1421 que o logradouro é parte comum do prédio (quer se entenda que o é presuntivamente quer se entenda que o é imperativamente).
Temos, por isso, dificuldade em aceitar, tal como o faz a decisão recorrida, que no caso concreto o réu levou a efeito "a construção de um anexo, constituído e licenciado como “cobertura-churrasqueira”, levada a cabo pelos réus no logradouro da sua fracção autónoma, contígua à fracção autónoma do autor, ou seja, uma obra nova realizada por um condómino numa parte do edifício que lhe pertence exclusivamente".
Os logradouros se são partes comuns dos prédios não podem pertencer exclusivamente a um dos condóminos. Podem, isso sim estar afectados ao uso exclusivo de um dos condóminos, não perdendo a sua característica de comuns.
É certo resultar da matéria provada que o Autor é dono e legítimo possuidor da fracção autónoma designada pela letra “A”, do prédio urbano constituído em regime de propriedade horizontal, composto de quatro fracções autónomas, sendo cada uma delas composta por rés-do-chão, 2 andares e logradouro (II - A).
Mas também resulta da factualidade provada (II - H) que na escritura da constituição da propriedade horizontal (fls. 13 a 16) consta que "o prédio urbano, composto de quatro edifícios, destinados a 4 moradias unifamiliares, de r/c, 1º e 2º andares, destinados a habitação, com a superfície coberta de 321,5m2 e logradouro com 808,5 m2" é "submetido ao regime de propriedade horizontal, o qual fica a ser composto de quatro fracções autónomas".
Consta ainda do documento complementar elaborado nos termos do artigo 64 do Código de Notariado, (fls. 17 a 21), que todas as fracções têm um logradouro constando ainda desse documento que "é comum a todas as fracções o terreno existente na parte posterior dos logradouros de cada fracção, com a área de 174,40m2", (doc. de fls. 13 a 16 e de fls. 17).
Vemos, deste modo, que na escritura da constituição da propriedade horizontal o logradouro tinha 808,5 m2.
Necessariamente, tal logradouro, pois nada se dizia em contrário, tinha de ser comum ás "4 moradias unifamiliares, de r/c, 1º e 2º andares, destinados a habitação, com a superfície coberta de 321,5m2".
Posteriormente, no documento complementar elaborado nos termos do artigo 64 do Código de Notariado, afectaram parte desse logradouro (comum) ao uso exclusivo de cada um dos condóminos, ficando ainda uma parte - que se passou a designar por "terreno existente na parte posterior dos logradouros de cada fracção, com a área de 174,40m2" - para o uso comum de todos.
Entendemos que esta atribuição do logradouro a cada uma das fracções não lhes confere a propriedade em exclusivo sobre esse logradouro mas apenas o uso exclusivo permanecendo a propriedade comum.
Sendo a propriedade do logradouro comum a todos os condóminos, nomeadamente ao Autor e ao Réu não podia este edificar o anexo que aí construiu, o qual viola e prejudica de forma flagrante a linha arquitectónica e o arranjo estético do edifício.
Podemos ainda acrescentar que tal obra não podia ser realizada por um outro motivo. Sendo o logradouro parte comum o Réu como condómino pode usar, fruir tal espaço mas não o pode ocupar a título definitivo, o que passou a fazer com a construção do referido anexo.
Mas ainda que se entenda (o que não é o nosso caso) que a propriedade daquele logradouro pertencia em exclusivo ao Réu, nem nesta hipótese ele poderia construir o anexo que construiu.
Na verdade, como claramente dispõe o artigo 1422 do Código Civil é especialmente vedado aos condóminos prejudicar, com obras novas, a linha arquitectónica ou o arranjo estético do edifício.
Construir um anexo no logradouro (ou no jardim ou no pátio nas expressões da al. a) do nº 2 do artigo 1421 do Código Civil) com as dimensões e características que constam dos autos (com cerca de 9 metros de comprimento e 3,50 metros de altura até ao cúmeo no centro do telhado e 2,50 metros de altura de parede (“pé direito”)) é manifesto que prejudica de forma clara não só a linha arquitectónica do edifício bem como o seu arranjo estético.
Não nos podemos esquecer que o prédio em propriedade horizontal, do qual Autor e Réu são condóminos engloba não só as quatro moradias em si mesmas, mas também os logradouros afectos às mesmas e ainda o dito terreno existente na parte posterior dos logradouros de cada fracção, que mais não é senão o prolongamento dos logradouros.
Ora, para qualquer condómino não é indiferente ter na traseira das moradias um terreno (logradouro) amplo, eventualmente arranjado com um jardim ou com um pátio, ou ter um anexo como o que foi construído pelo Réu.
Como bem se refere no Ac. STJ de 27.7.82, BMJ, 319 p. 301 "A expressão "linha arquitectónica", referida a um prédio urbano, significa o conjunto dos elementos estruturais de construção que, integrados em unidade sistemática, lhe conferem a sua individualidade própria e específica".
E continua "a obra que modifica ........consistente na implantação de pilares no logradouro traseiro por forma a sobre eles se fazer assentar uma extensão de certa fracção autónoma.....ofende a unidade sistemática que até aí o imóvel oferecia na sua linha arquitectónica".
Esta situação é similar à dos presentes autos.
Igualmente um caso semelhante foi decidido no Ac. R. C. de 14.4.93, Col. Jur. 1993, t.2, pag. 42, tendo-se aí decidido que "a construção no logradouro de uma fracção, de um anexo de alvenaria e betão com rés-do-chão e primeiro andar.... prejudica a linha arquitetónica do prédio em condomínio". E acrescenta "O condómino não pode levantar obras na sua fracção que alterem física, volumétrica e esteticamente o prédio em que se integra, salvo acordo de todos os interessados, quando seja caso disso, ou alteração do título".
A obra efectuada pelo Réu demonstra-se assim claramente ilegal.
Acresce que não podemos afirmar que a construção levada a cabo pelo Réu se insere numa utilização normal dos logradouros como espaços destinados ao lazer e ao convívio.
Se a construção ou colocação de uma pequena churrasqueira (até existem churrasqueiras móveis) se poderia enquadrar numa utilização normal, já o mesmo não se pode dizer da construção de um anexo, ainda que licenciado sob a designação "coberto/churrasqueira" com cerca de 9 metros de comprimento e 3,50 metros de altura até ao cúmeo no centro do telhado e 2,50 metros de altura de parede (“pé direito”).
Tal construção afecta os direitos pessoais do Autor, pois, como ficou provado, essa construção diminui em alguma medida e durante o final da tarde, a incidência da luz solar sobre cerca de metade da extensão do logradouro da fracção “A” na sua parte mais estreita, aproximadamente correspondente ao comprimento da construção referido em 1.3.
A qualidade de vida do Autor, ainda que de forma atenuada - face à factualidade provada - foi afectada, o autor viu reduzida essa qualidade de vida na medida em que ao final da tarde viu diminuída a incidência da luz solar sobre cerca de metade da extensão do logradouro da sua fracção.
O autor não pode fruir na plenitude o seu logradouro. Pode continuar a nele praticar jardinagem mas, por exemplo, ao fim da tarde não pode gozar de "um banho de sol".
Dúvidas não restam de que a obra realizada pelo Réu lesa direitos do Autor.
Esta obra levada a cabo pelo Réu, sem autorização e sem o conhecimento da assembleia de condóminos, é ilícita.
Em conclusão, impõe-se, nesta parte, a procedência do recurso e consequentemente, nesta parte, a procedência da presente acção com a condenação do Réu na demolição da obra construída no logradouro, repondo-o no estado anterior.
C) Encontra-se também formulado um pedido de condenação do Réu no pagamento da quantia de 650.000$00/3.242,18€, a título de indemnização por danos patrimoniais e morais sofridos pelo Autor.
No que a este pedido concerne não se provou qualquer dano patrimonial sofrido pelo Autor.
Relativamente a este ponto apenas se provou que o autor ficou aborrecido com a referida construção dos réus.
Entendemos que esta factualidade é manifestamente insuficiente para consubstanciar qualquer dano moral.
Assim, nesta parte impõe-se a improcedência da acção.
D) Em suma, a construção por um condómino, no logradouro afecto á sua fracção, de um anexo, com cerca de 9 metros de comprimento e 3,50 metros de altura até ao cúmeo no centro do telhado e 2,50 metros de altura de parede (“pé direito”), sem autorização e sem o consentimento da Assembleia de Condóminos é ilegal, pelo que se impõe a procedência do recurso e a procedência, ainda que parcial, da presente acção.
E) Tal como decidido na decisão recorrida não se vislumbra qualquer litigância de má-fé.
VI – Decisão
Por tudo o que se deixou exposto e nos termos dos preceitos citados, acorda-se em
dar provimento ao recurso e, em consequência revoga-se a decisão recorrida condenando-se o Réu a demolir o anexo que construiu na área destinada a logradouro da sua fracção, o qual está situado paralelamente ao muro de divisão desta com a referida fracção “A”, com cerca de 9 metros de comprimento e 3,50 metros de altura até ao cúmeo no centro do telhado e 2,50 metros de altura de parede (“pé direito”)-.
Custas pelo Réu.
Porto, 20 de Outubro de 2003
José António Sousa Lameira
António José Santos Oliveira Abreu
António Augusto Pinto dos Santos Carvalho