TRÂNSITO EM JULGADO
OBRIGAÇÃO EXEQUENDA
Sumário

I - A sentença transita em julgado quando se esgotaram os prazos de recurso ou de reclamação do despacho que não admitiu o recurso – art.º 628º CPC.
II - Ocorre o trânsito em julgado da sentença, com a prolação do acórdão pelo Supremo Tribunal de Justiça que confirma a decisão do relator de não admissão do recurso interposto ao abrigo do art.º 629º/1 d) CPC do acórdão que apreciou a reclamação.
III - Ocorrendo o trânsito em julgado da sentença que fixou a sanção pecuniária compulsória em momento posterior à entrega do imóvel, a sanção não é devida e a obrigação exequenda não é exigível.

Texto Integral

EmbExec-RMF-SançãoPecCompulsória-7513/22.1T8PRT-A.P1


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SUMÁRIO[1] (art.º 663º/7 CPC):

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Acordam neste Tribunal da Relação do Porto (5ª secção judicial – 3ª Secção Cível)

I. Relatório

Na execução para entrega de coisa certa, em que figuram como:

- Exequente: Clube ..., rua ..., ... PORTO; e

- Executado: A..., Lda., rua ..., ... PORTO,

veio a exequente requerer a entrega do prédio arrendado e o pagamento de uma sanção pecuniária compulsória pelo facto da executada não ter procedido à entrega do local no prazo legal, que liquidou em € 3 000,00, à qual acrescerá o valor de 500,00 € por cada dia de atraso na desocupação do locado até à sua entrega efetiva, acrescido de juros de mora, contabilizados desde a data dos respetivos vencimentos das quantias supra peticionadas até efetivo e integral pagamento.

Alegou para o efeito, que por contrato celebrado em 17/11/2015, o exequente, na qualidade de dono e legítimo proprietário, deu de arrendamento para fins não habitacionais à executada o estabelecimento comercial com entrada pelos n.ºs ... a ... da Rua ..., do prédio urbano inscrito na matriz predial da união de freguesias ..., ..., ..., ..., ... e ..., sob o art.º ...75 afeta a comércio, sito na Travessa ..., Praça ..., Praça ..., rua ... e rua ..., ... Porto.

Tal arrendamento foi celebrado pelo prazo de 30 (trinta) anos, com início em 01.11.2015. Pelo gozo e fruição do locado era devida pela executada ao exequente/senhorio a renda mensal de €. 1.100,00 (mil e cem euros), que se vencia no primeiro dia útil do mês imediatamente anterior àquele a que diz respeito.

A executada explorava no locado um estabelecimento de restauração denominado "Via ...". Apesar de ter ficado contratualmente estabelecido que qualquer obra que viesse a ser realizada no locado careceria da autorização do senhorio, autorização essa que jamais foi dada, no dia 30 de junho de 2020, o exequente tomou conhecimento que estavam em curso obras profundas de remodelação do interior do locado, levadas a cabo pela executada.

A realização de obras ilegais e não autorizadas pelo senhorio constitui um culposo e objetivamente grave incumprimento do contrato de arrendamento por parte do arrendatário, que pela sua gravidade e consequências torna inexigível a manutenção do arrendamento, sendo, por isso, causa objetiva para a resolução do contrato de arrendamento, por violação expressa quer do ajustado contratualmente entre as partes, nos termos do nº 1 do art.º 1083º e da al. d) do art.º 1038º do Código Civil.

A exequente intentou a competente ação declarativa com vista a obter resolução do contrato de arrendamento e a entrega do locado livre e desocupado de pessoas e bens, completamente limpo e asseado, com todas as paredes, portas, vidros e chaves e mais pertenças, em bom estado de funcionamento e sem deteriorações, bem como a condenação da Requerida no pagamento de uma sanção pecuniária compulsória de € 500,00 por cada dia em que mantivesse o locado ocupado após ter sido decretada a resolução do contrato de arrendamento.

Por sentença de 21/03/2021 foi a ação julgada procedente e a requerida condenada no pedido formulado.

A referida sentença, que serve de título à presente ação executiva, transitou em julgado a 24/02/2022.

A executada não procedeu à entrega do locado.

Não tendo a executada desocupado o locado no prazo legal, constituindo-se em mora, é ainda devida ao requerente uma sanção pecuniária compulsória de € 500,00 por cada dia em que mantenha o locado ocupado após ter sido decretada a resolução do contrato de arrendamento, valor que liquidou na quantia de 3.000,00 €.

Juntou certidão da sentença.


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Em novo requerimento renovou os fundamentos do requerimento executivo e indicou os bens que nomeou à penhora.

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Notificada a executada veio deduzir embargos à execução e oposição à penhora.

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Invocou para o efeito a inexistência e inexequibilidade do título executivo (art.º 729º a) do C.P.C.)

A exequente apresentou um requerimento executivo no dia 03/03/2022 e como título executivo, a sentença judicial proferida no âmbito do Proc. ..., Juízo Local Cível do Porto - Juiz 9, no dia 21/03/2021, da qual foi interposto recurso de apelação e recurso de revista. O recurso de revista foi interposto no dia 16/03/2022, tendo sido atribuído efeito devolutivo pelo Tribunal da Relação do Porto, por despacho datado de 27/04/2022.

O exequente apresentou o requerimento executivo quando ainda estava a correr o prazo para a interposição de recurso, e, portanto, quando a sentença condenatória ainda não era exequível. Também o fez antes que fosse proferido despacho de admissão do recurso e atribuição do seu efeito.

Tendo o Tribunal da Relação do Porto admitido o recurso com efeito devolutivo a 27/04/2022, a sentença proferida na 1ª instância tornou-se exequível a 27/04/2022.

Considera que o agente de execução devia ter recusado o requerimento executivo e suscitar a intervenção do juiz por se afigurar provável a ocorrência de alguma das situações previstas nos nº 2 do art.º 726º do C.P.C, mormente a manifesta inexequibilidade do título executivo, tanto mais, quando sequer constava qualquer certificação de trânsito em julgado da sentença apresentada.

Mais alegou que são nulos todos os atos praticados após o requerimento executivo, mormente o ato de entrega da coisa ao exequente, decorrentes de a execução ter sido requerida sem título exequível (art.º 195º nº 1 CPC).

Todos os atos praticados posteriormente à apresentação do requerimento executivo, não podiam ter sido praticados, pois que a lei veda a possibilidade de execução sem título executivo.

Alegou, ainda, que por manifesta inexistência e inexequibilidade do executivo se deve julgar extinta a execução e, em consequência, declarada a nulidade dos atos praticados, ordenar-se a restituição imediata da posse do imóvel à embargante e, bem assim, proceder ao levantamento da penhora dos bens.

Numa segunda ordem de argumentos, suscitou a falta de intervenção do réu no processo de declaração (art.º 729º aliena d) do C.P.C).

Na presente execução o título executivo é uma sentença judicial proferida a 21/03/2021 na ação de despejo que corre termos no Juízo Local Cível do Porto, Juiz 9, sob o Proc. nº ....

A sede da Executada/Embargante tem morada na rua ..., ..., no Porto, local onde se encontra instalado o estabelecimento comercial de restauração designado “Restaurante Via ...”.

Naquela ação declarativa, a citação da ré, aqui Embargante/Executada, foi tentada por via postal, através de carta registada com aviso de receção, expedida para a rua ..., a 01/09/2020, tendo sido devolvida ao remetente a 04/09/2020 com informação do funcionário dos CTT de “impossível a entrega - não tem recetáculo postal”. A segunda tentativa de citação postal foi expedida a 17/09/2023, para a mesma morada, por carta registada com aviso de receção, tendo sido devolvida ao remetente em 21/09/2020 com a informação aposta pelo funcionário dos CTT de “impossibilidade absoluta de depositar a carta por não haver recetáculo”.

Em ambas as tentativas de citação, o distribuidor postal não deixou qualquer aviso postal para que a carta pudesse ser levantada no balcão dos CTT. Foram preteridas as formalidades impostas na lei para a citação postal da Ré, não teve esta conhecimento de que contra si pendia uma ação. Não sendo possível o depósito da carta na caixa de correio, o distribuidor deixa um aviso, identificando-se o tribunal de onde provém e o processo a que respeita, averbando-se os motivos da impossibilidade de entrega e permanecendo a carta durante 8 dias à sua disposição em estabelecimento postal devidamente identificado.

A Embargante/Executada, ali Ré, não teve conhecimento do ato de citação por facto que nunca lhe pode ser imputado. A Ré tem a sua sede naquele local há mais de 20 anos e nunca o imóvel teve recetáculo postal, pois que, não pode ser instalado na sua fachada por se tratar de um edifício classificado, inserido em zona de proteção e classificado como conjunto de interesse público. As portas do estabelecimento comercial instalado na sede da Ré, são inteiramente em vidro, não sendo, assim, possível a instalação de recetáculo postal.

Tal circunstância, ausência de recetáculo postal, nunca impediu a sociedade aqui Embargante de receber a correspondência si endereçada, mesmo que registada e com aviso de receção. Era habitual as cartas com aviso de receção para levantamento no posto dos CTT serem deixadas por baixo da porta do estabelecimento, enquanto o estabelecimento comercial esteve encerrado devido à providência cautelar de embargo de obra movida pelo Clube ..., ora, Embargado. Na data de expedição das cartas de citação postal o estabelecimento comercial encontrava-se encerrado em virtude da providência cautelar de embargo de obra nova, intentado pelo Senhorio/Proprietário aqui Embargado/Exequente em 01/07/2020, que veio a correr termos no Juízo Local Cível do Porto – Juiz 3, sob o Proc. Nº ...-A, a qual veio a ser decretada em 18/02/2021 e revogada por Acórdão prolatado pelo Tribunal da Relação do Porto em 10/05/2021.

Na ação de despejo a ré foi considerada regularmente citada e por não ter conhecimento da ação que contra si pendida ficou, assim, impossibilitada de apresentar contestação dentro do prazo. No dia 04/12/2020, a Ré, ora Embargante, através da MM. Juiz e em plena audiência de julgamento da supra providencia cautelar, teve conhecimento que contra si pendia uma ação de despejo movida pelo Clube ..., pelo que, na mesma data, finda tal sessão de julgamento, constituiu mandatária através de junção de procuração aos autos de despejo.

A Ré arguiu a nulidade de citação (vide fls. 6 a 22 do Doc. 6), no entanto, não obstante toda a informação constante da tramitação eletrónica dos autos, por sentença proferida em 21/03/2021, foram considerados “confessados os factos articulados na petição inicial, por força do art.º 567º nº 1 do C.P.C”, tendo a ação sido julgado procedente e a Ré condenada de preceito.

Mais alegou que na ação declarativa a revelia da Ré foi absoluta, uma vez que aquando da junção de procuração forense a favor da mandatária, já tinha decorrido o prazo de contestação e, bem assim, já havia sido proferido despacho a considerar a ré regularmente

citada e confessados os factos alegados pelo autor na petição inicial.

Verifica-se nos autos da ação de despejo que corre termos no Juízo Local Cível do Porto – Juiz 9, sob o Proc. nº ..., ausência de citação da Ré por facto que não lhe é imputável e inobservância do contraditório, o que gera a respetiva nulidade, nos termos do disposto no art.º 188º nº 1 aliena e) do C.P.C. Verifica-se, ainda, nulidade de citação porque não foram observadas as formalidades prescritas na lei, conforme disposição vertida no nº 1 do art.º 191º do C.P.C.

Numa terceira ordem de argumentos, alegou que a obrigação exequenda se mostra incerta, inexigível e ilíquida.

A sentença exequenda não apresenta os requisitos de exequibilidade, pois que não permite, de forma transparente, aos destinatários, a perceção do alcance da condenação. O título executivo só é suficiente se contiver os requisitos necessários para, por si só, nos certificar da existência da obrigação e do direito correspondente.

A sanção pecuniária compulsória, no pressuposto de que possa versar sobre quantia certa e determinada, opera a partir de uma data exata, a do trânsito em julgado. Na data de apresentação do requerimento executivo, a sentença judicial que serve de título executivo à execução, ainda não havia transitado em julgado, não resultando demonstrado como resulta apurada a quantia peticionada de € 3 000,00, sendo o mesmo o raciocínio a fazer quanto ao pedido de condenação no pagamento de juros.

Em sede de oposição à penhora, alegou que não tendo ocorrido o trânsito em julgado da sentença, estava o agente de execução impedido de promover as diligências de penhora de bens móveis e de promover a entrega do imóvel.

Por fim, requereu a suspensão da execução.

Termina, por pedir, que se julgue extinta a execução e se ordene o levantamento da penhora:

- Pela inexistência e inexequibilidade do título executivo, julgando a execução extinta, consequentemente, declarando a nulidade dos atos praticados, a restituição imediata da posse do imóvel à Embargante e o levantamento da penhora dos bens;

Sem prescindir,

– Pela inexequibilidade do título executivo, em virtude da nulidade de citação na ação declarativa, assim a julgando extinta e, em consequência, ordenar a restituição imediata da posse do imóvel à Embargante e, bem assim, o levantamento da penhora dos bens;

Sem prescindir,

– Julgar incerta, inexigível e ilíquida a obrigação exequenda, decidindo pela extinção da execução, consequentemente ordenando a imediata restituição da posse do imóvel à Embargante e o levantamento das penhoras efetuadas;

Ainda sem prescindir,

– Decidir pela inadmissibilidade da penhora levada a cabo sobre a conta bancária da Oponente, por inadmissibilidade da penhora e ordenando-se o levantamento da penhora, com as demais consequências legais.


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Proferiu-se despacho liminar e determinou-se a notificação da exequente para contestar.

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Notificada a exequente veio contestar, alegando para o efeito e em síntese que a entrega do prédio já se concretizou.

Escassos dias após a dedução destes Embargos, a sentença condenatória que serve de base à presente Execução transitou efetivamente em julgado, o que veio a ocorrer no passado dia 16/11/2023.

A pretensão da Embargante no sentido de ser restituído o imóvel contrariaria decisão judicial transitada em julgado que veio ordenar a resolução do contrato e a entrega do imóvel. A Embargante não detém qualquer título que legitime a posse do imóvel.

Transitada em julgado que está a sentença que condenou a Embargada na entrega do imóvel objeto da presente execução, ficam os Embargos impossibilitados de alcançar o seu efeito útil normal, pelo que cumpre decretar a extinção da instância, por inutilidade superveniente da lide, nos termos da alínea e) do art.º 277.º do CPC.

Mais alegou que a embargante teve intervenção na ação declarativa, interpondo recurso da decisão. A previsão da al. d) do art.º 729º CPC destina-se aos casos em que não tenha havido intervenção do réu no processo de declaração, nalguma das situações previstas na alínea e) do artigo 696.º, ou seja, tendo corrido o processo à revelia, por falta absoluta de intervenção do réu, o que não foi aqui manifestamente o caso. A falta/nulidade da citação foi já discutida e decidida, por decisão transitada em julgado, na ação declarativa, incidente suscitado pela embargante, não podendo ser nesta sede novamente apreciada.

Mais alegou que a Embargante foi oportunamente notificada da sentença - já através da sua mandatária constituída – e teve oportunidade de recorrer da decisão que julgou improcedente a nulidade invocada, o que não fez no devido prazo. Tal recurso não foi admitido pelo Tribunal de 1ª instância, por ser intempestivo e a decisão transitou em julgado.

Alegou, ainda, que o requerimento executivo foi apresentado no dia 03/03/2022, tendo por título executivo a sentença judicial que havia sido proferida no dia 21/03/2021. Depois de proferida sentença que decretou a resolução do contrato de arrendamento e a consequente entrega do imóvel, a Embargante não recorreu da mesma dentro do prazo para o efeito, pelo que, a decisão se tornou definitiva.

O recurso apresentado da sentença que serve de título à presente execução foi rejeitado, por intempestivo, por despacho proferido em 28/05/2021. A Executada reclamou de tal despacho para o Tribunal da Relação do Porto, ao abrigo do disposto no art.º 643º do Código de Processo Civil. A rejeição foi confirmada pelo Tribunal da Relação do Porto por Decisão Singular do Relator, indeferido a Reclamação apresentada. Da decisão Singular de rejeição de recurso, a Executada reclamou para a Conferência do Tribunal da Relação, que confirmou o despacho reclamado. A Executada interpôs recurso de revista de tal decisão do Tribunal da Relação do Porto. No requerimento de interposição de recurso a própria Embargante requereu que fosse atribuído ao recurso efeito devolutivo. O recurso foi admitido com efeito devolutivo.

O processo foi efetivamente remetido para o Supremo Tribunal de Justiça que, por douto despacho de 2 de junho de 2023, não admitiu recurso por não se verificar o caso previsto no art.º 629º, nº 2, al. d) do CPC. A Executada não se conformou com a decisão do Tribunal Superior e, em 14/06/2023, veio reclamar para a Conferência do Supremo Tribunal de Justiça. Nessa sequência, o Supremo Tribunal de Justiça, por douto Acórdão de 31/10/2023 veio confirmar a não verificação do previsto no art.º 629º, nº 2, al. d) do CPC, não tendo, assim, admitido o recurso de revista do acórdão da Relação. O STJ indeferiu a reclamação e confirmou o despacho do Relator que decidiu não tomar conhecimento do objeto do recurso de revista.

Alegou, ainda, que a embargante litiga com má-fé, porque omitiu que o tribunal, por notificação datada de 18/03/2022 notificou o Embargado do seguinte: “Fica V.

Exª notificado, relativamente ao processo supra identificado, que este Tribunal não vai dar andamento a esta execução, por enquanto, uma vez que a Relação do Porto remeteu a este Tribunal p/o Apenso A-Reclamação nos termos do art.º 643º do CPC recurso de revista c/alegações da requerida Ré/reclamante/executada, o qual vai ser ainda apreciado”.

Proferida a decisão de não admissão do recurso de revista, o que veio a acontecer em 02/06/2023, a exequente requereu o prosseguimento das diligências executivas por requerimento de 07/06/2023. Em 27/04/2023, o Sr. Agente de Execução informou os autos de execução que ainda não tinha dado início às diligências executivas pelo facto de se encontrar pendente recurso de revista. As diligências executivas só tiveram, assim início, depois de rejeitado o recurso de revista – quando o efeito meramente devolutivo do mesmo já há muito tinha sido atribuído!

Mais alegou que caso fosse declarada extinta a execução, tal não teria qualquer efeito útil, uma vez que o imóvel nunca poderia ser restituído à Embargante por esta não possuir qualquer título sobre o mesmo, tendo a entrega sido judicialmente decidida por decisão transitada em julgado.

Considera não ser aplicável a uma execução para entrega de coisa certa a iliquidez da obrigação exequenda e quando o requerimento executivo foi apresentado, o Embargado tinha obtido uma certidão que atestava o trânsito em julgado da decisão, pelo que os montantes peticionados foram contados e liquidados a partir dessa data, tendo a Embargante especificado no seu requerimento executivo (ver Liquidação da Obrigação) a que se deviam os 3.000,00 € peticionados. Estando a Embargante a opor-se a uma execução para entrega de coisa certa, o que vem alegar quanto à iliquidez jamais poderia conduzir à extinção da execução e muito menos à restituição da posse do imóvel, podendo apenas e só eventualmente ser alegado em sede de oposição à penhora.

Em relação à oposição à penhora alegou que na data em que instaurou a execução tinha obtido uma certidão da sentença que atestava o trânsito em julgado da decisão, motivo pelo qual liquidou o montante da sanção pecuniária arbitrado.

Sucede que como decorre dos autos, o trânsito em julgado apenas ocorreu em data posterior à tomada de posse do imóvel, o pagamento de quantia certa peticionado, que correspondia à sanção pecuniária compulsória em que a então R. tinha sido condenada efetivamente não é devida.

Com o trânsito em julgado da sentença que serve de título à execução e com a

efetivação da entrega do imóvel, a acrescentar a tudo quanto ficou já alegado e se reproduz, deixa de ter qualquer efeito prático a peticionada suspensão da execução.


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A embargante veio pronunciar-se sobre os documentos juntos com a contestação e ainda, sobre a matéria das exceções.

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Realizou-se audiência prévia, sem se obter o acordo entre as partes.

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Em sede de saneador proferiu-se sentença com a decisão que se transcreve:

“Pelo exposto, julgo os presentes embargos totalmente improcedentes e consequentemente, determino o prosseguimento da execução nos seus precisos termos.

Condeno o embargante nas custas do processo.

Fixo o valor da causa em 33 000,00 €.

Registe, notifique e comunique ao Agente de Execução”.


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A executada veio interpor recurso da sentença.

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Nas alegações que apresentou a apelante formulou as seguintes conclusões:

I. Através do presente recurso pretende a Recorrente impugnar determinados segmentos da decisão da matéria de facto, através da reapreciação de documentos juntos aos autos que considera mal apreciados pela Meritíssima Juiz a quo que, consequentemente, incorreu em erro de julgamento, constituindo esta impugnação a primeira parte do recurso, pretendendo ainda ver reapreciada a decisão de mérito por considerar ter sido feita má interpretação e aplicação do Direito à matéria de facto provada, constituindo a segunda parte do recurso.

Assim,

II. Considerando a Recorrente que foi incorretamente apreciada a prova existente nos autos, pretende ver reapreciada a matéria de facto, fazendo-se uma análise crítica a toda a documentação junta aos autos, coadjuvada com o documento que segue junto com o presente recurso e pela apreciação crítica correta dos factos admitidos por acordo entre as partes (art.º 574º do CPC).

III. A Recorrente alegou nos art.º 3 e 4 da sua peça processual de oposição à execução mediante embargos de executado (Ref.: 47110640), que: da sentença judicial proferida no dia 21/03/2021 no âmbito do Proc. ..., Juízo Local Cível do Porto - Juiz 9, foi interposto Recurso de Apelação e Recurso de Revista, este ultimo interposto no dia 16/03/2022, ao qual foi atribuído efeito devolutivo por despacho do Tribunal da Relação do Porto no dia 27/04/2022.

IV. Para prova de tal facto, fez juntar Doc. 1 (certidão judicial emitida pelo Supremo Tribunal de Justiça) com o requerimento de 15/11/2023 (Referencia 47133315).

V. Nem o referido Doc. 1, nem o art.º 3 e 4 da Oposição, foram impugnados pela Recorrida.

Pelo contrário, é a própria recorrida quem alega na sua Contestação (Referência 47447169), designadamente, em 42., e 50. a 53 do seu articulado, e faz juntar um documento (Doc. 1), que foi interposto um recurso de revista para o Supremo Tribunal de Justiça no âmbito dos autos da ação declarativa (ação de despejo sob o Proc....).

VI. Não obstante, o tribunal a quo não considerou nem valorou tais documentos (não

impugnados), nem sequer os factos admitidos por acordo.

VII. Deve, assim, o facto vertido em 4. do articulado de Oposição à Execução ser considerado provado por acordo (nos termos do artigo 574º do CPC) e, em conjunto com a prova carreada para os autos, designadamente o documento nº 1 junto com o requerimento da Recorrente (Referencia 47133315) e o documento nº 1 junto com a Contestação (Referencia 47447169), devem ser valorados favoravelmente, no sentido de ser aditado à matéria de facto considerada como assente, cuja redação de seguida se sugere:

“11. Do Acórdão do Tribunal da Relação do Porto referido em 9., foi interposto no dia 16/03/2022, Recurso de Revista para Supremo Tribunal de Justiça, ao qual foi atribuído efeito meramente devolutivo por despacho do Tribunal da Relação do Porto proferido em 27/04/2022”.

Acresce que,

VIII. O aludido Doc. nº 1 junto pela Recorrida com Contestação para prova do facto vertido em 8º da sua peça processual, alegava o seguinte: “8. Uma vez que, escassos dias após a dedução destes Embargos, a sentença condenatória que serve de base à presente Execução transitou efetivamente em julgado, o que veio a ocorrer no passado dia 16/11/2023. – Cf. documento n.º 1 que se junta e cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido”.

IX. O documento, nada mais é do que uma certidão judicial emitida pelo Supremo Tribunal de Justiça que certifica que o Acórdão prolatado pelo Supremo Tribunal de Justiça a 31/10/2023, transitou em julgado a 16/11/2023.

X. Ou seja, a sentença proferida na ação de despejo e que serve de título à execução, só se pode considerar transitada em julgado no dia 16/11/2023, data em que, em definitivo, foi decidida a reclamação apresentada sobre o despacho que não admitiu o recurso interposto.

XI. Só após o decurso desse prazo é que se deve considerar a decisão como transitada em julgado (cf. art.º 628º do CPC).

XII. Não obstante, por se entender relevante e imprescindível para a boa decisão da causa, além de se demonstrar necessário face ao julgamento proferido pelo Tribunal a quo, ao abrigo da segunda parte do nº 1 do artigo 651º do CPC, segue junto com o presente recurso, um despacho proferido no dia 15/03/2024 na referida ação de despejo – cuja admissão desde já se Requer -, por se encontrarem reunidos os fundamentos justificados para a sua apresentação.

XIII. Do despacho judicial ora junto, duvidas não podem subsistir, que a sentença proferida no Proc. ... e que serve de título à execução, transitou em julgado no dia 16/11/2023.

XIV. Assim, face à prova documental junto aos autos, ao documento junto com este recurso, bem como, ao facto admitido por acordo, vertido em 8º da Contestação da Recorrida, deve ser valorado favoravelmente, no sentido de ser aditado ao reportório de factos considerados assentes, o facto cuja redação de seguida se sugere:

“12. A sentença proferida no Proc. ... que serve de título à execução, transitou em julgado no dia 16/11/2023”.

Posto isto,

XV. Da prova documental carreada pelas partes (Doc. nº 1 junto com o Requerimento apresentado pela Recorrente/Embargante em 15/11/2023 com a Referência: 47133315 e Doc. nº 1 junto com a Contestação oferecida pela Recorrida/Embargada, (Referencia 47447169), a que soma os factos admitidos por acordo - art.º 4º dos Embargos de Executado (Referência 47110640) e art.º 8. 42. 50, 51. e 52. da Contestação (Ref.: 47447169) e, bem assim, o documento junto com o presente recurso, deverão ser valorados favoravelmente, no sentido de serem aditados ao rol de factos considerados assentes, os factos cuja redação de seguida se sugere, para posterior subsunção legal:

“11. Do Acórdão do Tribunal da Relação do Porto referido em 9., foi interposto no dia 16/03/2022 Recurso de Revista para Supremo Tribunal de Justiça, ao qual foi atribuído efeito meramente devolutivo por despacho do Tribunal da Relação do Porto proferido em 27/04/2022”.

“12. A sentença proferida no Proc. ... que serve de título à execução, transitou em julgado no dia 16/11/2023”.

XVI. Pela decisão a quo foi violado o princípio geral da livre apreciação da prova, ferindo a mesma de ilegalidade, que se invoca para os devidos e legais efeitos.

XVII. O tribunal recorrido, ao preterir a análise crítica e correta dos documentos juntos aos autos e factos supra invocados, com o devido respeito, incorreu num erro de julgamento sobre os aludidos concretos pontos de facto, os quais deverão ser alterados por este Tribunal Superior atento ao facto da prova documental existente, e aos factos admitidos por acordo, impor decisão diversa.

XVIII. A matéria de facto deve, assim, e ao abrigo do art.º 662º, n.º 1 do CPC, ser alterada, aditando-se os factos 11. e 12. na redação já sugerida, para posterior subsunção legal, que

terá de desembocar na procedência do pedido oportunamente formulado.

XIX. O Tribunal recorrido reconheceu, erradamente, que à data de propositura da execução, a sentença já tinha transitado, e com base neste (falso) facto decidiu pela improcedência dos fundamentos da oposição, v.g., a inexistência e inexequibilidade do título executivo.

XX. No entanto, como já se viu, o título executivo era inexistente e inexequível, pois que, de acordo com o art.º 628º e 647º do C.P.C., as sentenças só são título executivo quando não sejam suscetíveis de recurso ordinário ou de reclamação ou quando a apelação tinha efeito meramente devolutivo, declarado pelo tribunal no despacho de admissão de recurso.

XXI. Vedando a lei a possibilidade de execução sem título executivo, todos os atos praticados após o requerimento executivo devem ser considerados nulos (art.º 195 nº 1 do CPC).

Acresce que,

XXII. A deficiente perceção sobre a data do trânsito em julgado levou, também, a erróneo julgamento quanto à exigibilidade e liquidez da obrigação exequenda.

XXIII. A sanção pecuniária compulsória prevista no art.º 829º -A do C.C. e peticionada no requerimento executivo, opera apenas a partir da data de resolução do contrato de arrendamento, a qual coincide com a data do trânsito em julgado, isto é 16/11/2023.

XXIV. Assim, na data de apresentação do requerimento executivo (03/03/2022), a sentença ainda não havia transitado em julgado, consequentemente, a obrigação não era nem exigível, nem líquida.

XXV. Mas também não era aquando da entrega coerciva do estabelecimento comercial ocorrida no dia 25/10/2023.

XXVI. Incorreu em erro de julgamento o tribunal recorrido porque, desvirtuado da realidade factual, julgou improcedentes todos os fundamentos da oposição à execução e, bem assim, da oposição à penhora.

XXVII. Dizer que, sempre terá de soçobrar a decisão quanto à legalidade da penhora concretizada nos autos, ao abrigo do art.º 784º nº 1 alínea a) do CPC.

XXVIII. Na estrita medida em que, conforme decorre do amplamente explanado, à data de instauração do processo executivo a Executada/ Embargante/Recorrente nada devia, seja a que título for, ao Exequente/Embargado/Recorrido, nomeadamente, a título de sanção pecuniária compulsória e juros de mora.

XXIX. É ilegal e inadmissível o ataque ao património da Recorrente, concretizado pela penhora de bens móveis e contas bancárias, constituindo um uso abusivo indevido desse meio.

Posto isto,

XXX. Deve ser revogada a decisão sob recurso, na medida em que, sempre os fundamentos da oposição à execução devem proceder, seja pela inexistência e inexequibilidade do titulo executivo, seja pela inexigibilidade e iliquidez da obrigação exequenda, tudo conforme, respetivamente, o previsto nos art.º 729º a), ex vi do art.º 860º nº 1, 626º nº 3, todos do C.P.C. e ao abrigo art.º 732º nº 4 e art.º 861º nº 5 do mesmo diploma.

Não procedendo, mas sem prescindir,

XXXI. A sentença sob apreciação padece de erro na interpretação e aplicação do direito, quanto à questão da nulidade de citação na ação declarativa.

XXXII. O entendimento de que, a pretensão da embargante improcede por se mostrar totalmente afastada por força do caso julgado material que se formou, e a aplicação do art.º

619º e 621º do CPC, merecem censura.

XXXIII. É que, a exceção do caso julgado pressupõe uma identidade objetiva quanto ao mérito, entre a ação definitivamente dirimida e a ação que se repete.

XXXIV. À luz do disposto no nº 1 do art.º 619.º do CPC, transitada em julgado a sentença, a decisão sobre a relação material controvertida tem força obrigatória dentro do processo e fora dele, observados os limites impostos pelos art.º 580º e 581º, sem prejuízo do disposto nos artigos 696.º a 702º, sendo certo que estes preceitos se referem apenas ao caso julgado material e, portanto, à relação material controvertida.

XXXV. Sucede que, o despacho proferido no processo declarativo que recaiu sobre a nulidade de citação (facto considerado assente em 6) é, salvo entendimento superior, de carácter processual, formando, tão só, caso julgado formal.

XXXVI. Caso julgado formal que, nos termos do art.º 620 nº 1 do CPC, reporta-se aos despachos relativos a questões de caráter processual e só tem força obrigatória dentro do próprio processo em que a decisão é proferida, e impede que, na mesma ação, o juiz possa alterar o decidido, nada obstando que em outro processo decida em termos diversos a mesma questão processual concreta.

XXXVII. Entendimento diverso, esvazia a possibilidade de recurso extraordinário de revisão ou de oposição à execução, com fundamento na falta e/ou nulidade de citação.

XXXVIII. Pelo exposto, a decisão ora impugnada faz uma errónea subsunção legal, em manifesta violação do disposto no art.º 620º nº 1 do CPC, devendo em consequência ser revogada.

XXXIX. Pelo exposto, da decisão sob recurso foi violado o princípio da livre apreciação de prova, consequentemente, incorreu em erro de julgamento, fazendo, concomitantemente, uma errónea subsunção legal, em manifesta violação do disposto nos artigos 729º a), ex vi do art.º 860º nº 1 e 626º nº 3, art.º 732º nº 4 e art.º 861º nº 5 e 620 nº 1 do C.P.C, todos do CPC.

Termina por pedir o provimento do recurso e a revogação da decisão, sendo substituída por outra que tenha em conta a correta e consentânea apreciação das questões suscitadas e prova apresentada.

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A exequente apresentou resposta ao recurso, formulando as seguintes conclusões:

I. A sentença recorrida não alude ao recurso de revista interposto porquanto este não teve por objeto a decisão que se veio executar, mas sim o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto que manteve a decisão de não admitir o recurso daquela decisão e porque, como decorre da respetiva fundamentação, a sua apresentação em nada afeta a data do trânsito em julgado da decisão, sendo assim a sua existência indiferente para a matéria em discussão, sendo correta e devendo manter-se a não inclusão nos factos provados.

II. A sentença não inclui no elenco dos factos provados a data de trânsito em

julgado da sentença por tal não se tratar de um facto, mas sim de matéria conclusiva, de direito, que aliás constitui o próprio thema decidendum, afigurando-se correta a sua não inclusão que deve, por isso, ser mantida.

III. O trânsito em julgado da sentença que decretou o despejo ocorreu quando se esgotaram os meios de reação à mesma, o que ocorreu passados dez dias da notificação do acórdão que julgou improcedente a reclamação do despacho que não admitiu o recurso por intempestivo.

IV. A sentença recorrida não padece de qualquer erro na interpretação e aplicação do direito no que diz respeito à questão da nulidade de citação na ação declarativa, porquanto tendo a Recorrente arguido tal nulidade no processo declarativo e tendo a mesma sido apreciada e decidida, sem que sobre decisão tenha sido apresentado recurso tempestivamente, transitou em julgado formando caso julgado material e não podendo, assim, ser novamente apreciada.

Termina por pedir que se julgue improcedente o recurso, mantendo-se a decisão recorrida.


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O recurso foi admitido como recurso de apelação.

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Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

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II. Fundamentação

1. Delimitação do objeto do recurso

O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente não podendo este tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, sem prejuízo das de conhecimento oficioso – art.º 639º do CPC.

As questões a decidir:

- admissibilidade da junção do documento com as alegações do recurso;

- reapreciação da decisão de facto /ampliação da decisão de facto;

- nulidade da citação;

- exigibilidade e liquidação da obrigação exequenda, quanto ao montante da sanção pecuniária compulsória.


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2. Os factos

Com relevância para a apreciação das conclusões de recurso cumpre ter presente os seguintes factos provados no tribunal da primeira instância:

1. O exequente pede na execução de sentença nos próprios autos de que estes autos dependem a entrega do estabelecimento comercial com entrada pelos n.ºs ... a ... da Rua ..., do prédio urbano inscrito na matriz predial da união de freguesias ..., ..., ..., ..., ... e ..., sob o art.º ...75 afeta a comércio, sito na Travessa ..., Praça ..., Praça ..., rua ... e rua ..., ... Porto e o pagamento de uma sanção pecuniária compulsória por cada dia de atraso na entrega do locado e que atualmente ascende à quantia de €. 3000,00 (três mil euros), a que acrescerá o valor de 500,00 € por cada dia de atraso na desocupação do locado até à sua entrega efetiva.

2. O requerimento executivo foi apresentado no dia 03/03/2022 no processo ..., que corria termos pelo Juízo Local Cível do Porto - Juiz 9.

3. A secretaria judicial daquele Juízo remeteu o requerimento executivo a este Juízo de Execução, para distribuição, por transferência eletrónica a este Juízo de Execução do Porto, em 22-04-2022 (Referência: 435864247), acompanhado de cópia da sentença proferida naqueles autos, e a que se refere o requerimento executivo (Referência: 421722151).

4. Mais remeteu uma certidão, datada de 22-04-2022, da qual constava que nesse Juízo Local Cível do Porto - Juiz 9 correm uns autos de ação de processo comum com o nº ... e que:


5. Nesses autos era autor Clube ... e ré A..., Lda. e na petição inicial o autor pedia: Nestes termos e nos mais e melhores de Direito que V. Exa. tão douta quanto proficientemente suprirá, deverá a presente ação ser julgada totalmente procedente, por provada e em consequência, deve ser decretada a resolução do contrato de arrendamento sub judice celebrado entre A. e R. em 17 de novembro de 2015 e melhor identificado no art.º 5º desta petição inicial, sendo a Ré condenada a entregar ao Autor o locado, livre e desocupado de pessoas e bens, completamente limpo e asseado, com todas as paredes, portas, vidros e chaves e mais pertenças, em bom estado de funcionamento e sem deteriorações, com todas as legais e devidas consequências.

Mais se requer seja a Ré condenada no pagamento de uma sanção pecuniária

compulsória de € 500,00 por cada dia em que mantenha o locado ocupado após ter sido decretada a resolução do contrato de arrendamento.

Deve a R. ser ainda condenada em custas e demais encargos legais”.

6. Nesses autos a ré arguiu a nulidade da citação, tendo sobre tal requerimento sido proferida decisão em 21/03/2021, que julgou: «Por tudo o exposto, concluímos pela regularidade da citação da ré e pela improcedência da nulidade da citação invocada. Notifique.»

7. No mesmo dia foi proferida sentença, com o seguinte teor:

I. Nesta ação declarativa de condenação, com processo comum, que Clube ... intentou contra A..., Lda., pede o autor que se decrete a resolução do contrato de arrendamento para fins não habitacionais relativo ao espaço correspondente à entrada pelos n.ºs ... a ... da Rua ... do prédio que identifica, celebrado com a ré, por esta estar a levar a cabo obras profundas que extravasam as contratualmente autorizadas sem que o autor tenha consentido.

II. A ré foi regular e pessoalmente citada não tendo contestado.

Ulteriormente constituiu mandatário e arguiu a nulidade da sua citação o que

foi julgado improcedente.

III. Considero confessados os factos articulados na petição inicial, por força do preceituado no art.º 567.º, n.º 1, do Código de Processo Civil.

IV. Atento o disposto no art.º 154.º, n.º 1, do Código de Processo Civil - a lei que permite o mais nos pedidos não controvertidos (falta de fundamentação) permite o menos (fundamentação por remissão) –, adiro à fundamentação de facto e à fundamentação de direito alegada na petição inicial.

Pelo exposto, julgo a ação procedente e condeno a ré no pedido formulado.

Custas a cargo da ré.

Valor da causa: o indicado pelo autor.»

8. Dessa sentença a ré ora embargante interpôs recurso, que não foi admitido, por despacho proferido em 28/05/2021.

9. Desse despacho de não admissão de recurso foi deduzida reclamação, que foi julgada improcedente por Acórdão do Tribunal da Relação do Porto datado de 08/02/2022.

10. Na ação executiva o Agente de Execução procedeu à entrega do imóvel locado no dia 25-10-2023.


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3. O direito

- Da admissibilidade da junção do documento com as alegações do recurso-

A apelante nas alegações de recurso veio requerer a junção de um documento: nota de notificação, com data de 20 de março de 2024 e cópia do despacho proferido em 15 de março de 2024 (ref. Citius 458062877), no âmbito do Proc. ..., que corre os seus termos no Tribunal Judicial da Comarca do Porto, Juízo Local Cível do Porto - Juiz 9 (inserido a página 1471 do processo eletrónico), com o seguinte teor:

“ O exposto já se mostra antecipadamente apreciado no despacho proferido em 29/11/2023, esclarecendo-se que a sentença só se pode considerar transitada em julgado quando em definitivo for decidida a reclamação apresentada sobre o despacho que não admitiu o recurso interposto, pois até lá, em hipótese, o recurso poderá vir a ser sempre admitido, ainda que esteja apenas em causa uma reclamação para o STJ que acabou por ser julgada inadmissível.

Desta feita, está, pois, correta a certidão emitida pela secretaria.

Notifique”.

Os documentos destinados a fazer prova dos fundamentos da oposição à execução são apresentados com o respetivo articulado, como decorre do disposto no art.º 423º/1 CPC.

A junção de documentos em sede de recurso está, contudo, subordinada ao critério estabelecido no art.º 651º CPC, no qual se determina que:

“As partes apenas podem juntar documentos às alegações nas situações excecionais a que se refere o art.º 425º ou no caso de a junção se ter tornado necessária em virtude do julgamento proferido na 1ª instância”.

Dispõe o art.425ºCPC:

“Depois do encerramento da discussão só são admitidos, no caso de recurso, os documentos cuja apresentação não tenha sido possível até aquele momento”.

Decorre deste regime que, em sede de recurso, nas alegações, as partes podem juntar documentos, quando:

- a sua apresentação não tenha sido possível até esse momento – superveniência objetiva (fundada na data do facto a provar ou do documento comprovante) ou subjetiva (baseada no desconhecimento da existência do documento, na indisponibilidade dele por parte do interessado ou na necessidade de alegação e prova do facto);

- se tenha revelado necessária por virtude do julgamento proferido, maxime quando esta se revele de todo surpreendente relativamente ao que seria expectável em face dos elementos já constantes do processo[2].

No caso em análise, o documento em causa – despacho com data de 15 de março de 2024 - formou-se em data posterior à realização da audiência prévia, a qual se realizou em 20 de fevereiro de 2024.

Porém, a informação já constava dos autos, conforme decorre do ofício de 11 de janeiro de 2024 (inserido a página 1244 do processo eletrónico sistema Citius). Pretendendo o apelante algum esclarecimento em relação ao despacho proferido em 29 de novembro de 2023 devia ter sido suscitado até à data em que foi realizada a audiência prévia, de forma a permitir a sua junção nessa data. Com a prolação do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça em 31 de outubro de 2023, a apelante não podia ignorar a data do trânsito da sentença.

Analisado o documento em confronto com os fundamentos dos articulados e com teor da decisão proferida em 1ª instância, resulta que na sentença o juiz do tribunal “a quo” não veio invocar novos e diferentes argumentos, limitando-se a fazer uma diferente interpretação dos elementos dos autos a respeito do trânsito em julgado da sentença proferida em 21 de março de 2021.

A junção de documentos em sede de alegações face ao julgamento em 1ª instância, funda-se no imprevisto da decisão proferida, quer por razões de direito quer por razões de prova[3].

No caso presente a decisão proferida não se funda em normas jurídicas com cuja aplicação a parte não contava, nem a junção do documento, como meio de prova pode contribuir para apurar factos diferentes daqueles que se mostram alegados e provados, com relevância na decisão final.

Conclui-se, assim, que atento o critério previsto no art.º 651º/1 CPC carece de fundamento legal e não se mostra pertinente a requerida junção do documento, motivo pelo qual se determina o seu desentranhamento e devolução ao apresentante.

O incidente será tributado com custas a cargo do apelante, fixando-se a taxa de justiça em € 60,00 (sessenta euro) – art.º 443º/1 CPC e art.º 27º/1/3 Regulamento das Custas Processuais.


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- Ampliação da decisão de facto -

Nas conclusões de recurso, sob os pontos I a XVIII, a apelante veio requerer a ampliação da decisão de facto, no sentido de se incluírem nos factos provados os factos alegados pela embargante nos art.º 3º e 4º da petição de embargos e art.º 8º, 42, 50, 51 e 52 da contestação, passando a constar sob os pontos:

“11. Do Acórdão do Tribunal da Relação do Porto referido em 9., foi interposto no dia 16/03/2022 Recurso de Revista para Supremo Tribunal de Justiça, ao qual foi atribuído efeito meramente devolutivo por despacho do Tribunal da Relação do Porto proferido em 27/04/2022”.

“12. A sentença proferida no Proc. ... que serve de título à execução, transitou em julgado no dia 16/11/2023”.

A apelada considera que a fixação da data do trânsito em julgado da sentença, resume-se a uma questão de direito, não justificando a ampliação da decisão de facto.

Nos termos do art.º 666º/2 c) CPC mostrando-se indispensável ampliar a matéria de facto, deve o tribunal da Relação alterar a decisão da matéria de facto, se a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa. Não sendo possível fazer uso de tal faculdade, deve o tribunal anular a decisão.

A ampliação da matéria de facto mostra-se indispensável, quando se tenham omitido dos temas da prova factos alegados pelas partes que se revelam essenciais para a resolução do litígio, na medida em que assegurem enquadramento jurídico diverso do suposto pelo juiz do tribunal “a quo”[4].

Os factos essenciais são aqueles que permitem individualizar a situação jurídica alegada na ação ou na exceção.

Os factos complementares são aqueles que são indispensáveis à procedência dessa ação ou exceção, mas não integram o núcleo essencial da situação jurídica alegada pela parte.

Ambos integram a categoria de factos principais porque são necessários à procedência da ação ou exceção, por contraposição aos factos instrumentais, probatórios ou acessórios que são aqueles que indiciam os factos essenciais e que podem ser utilizados para a prova indiciária destes últimos[5].

Em conformidade com o critério legal, a ampliação da matéria de facto tem de ser indispensável, o que significa que cumpre atender às várias soluções plausíveis de direito, o enquadramento jurídico em face do objeto do recurso e ainda, com a possível intervenção e interpretação do Supremo Tribunal de Justiça, ao abrigo do art.º 682º/3 CPC.

No caso concreto, a apelante pretende que se considere nos factos provados os seguintes factos alegados na petição de embargos e na contestação:

a) petição embargos:

“3. Apresentou como título executivo, a sentença judicial proferida no âmbito do Proc...., Juízo Local Cível do Porto - Juiz 9 no dia 21/03/2021, da qual foi interposto Recurso de Apelação e Recurso de Revista.

4. O Recurso de Revista foi interposto no dia 16/03/2022, tendo sido atribuído efeito devolutivo pelo Tribunal da Relação do Porto, por despacho datado de 27/04/2022; - cf. adiante segue junto em Doc. 1 que, para todos os efeitos, se dá por reproduzido e integrado, como por reproduzidos e integrados se dão os demais documentos juntos com a presente peça processual”.

b) contestação:

“8. Uma vez que, escassos dias após a dedução destes Embargos, a sentença condenatória que serve de base à presente Execução transitou efetivamente em julgado, o que veio a ocorrer no passado dia 16/11/2023. – cf. documento n.º 1 que se junta e cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido.

42. Sucede que a Executada interpôs recurso de revista de tal decisão do Tribunal da Relação do Porto;

50. Sendo que o processo foi efetivamente remetido para o Supremo Tribunal de Justiça que, por douto despacho de 2 de junho de 2023, não admitiu recurso por não se verificar o caso previsto no art.º 629º, nº 2, al. d) do CPC, despacho que se junta como doc. nº 11, dando-se o seu conteúdo aqui por integralmente reproduzido e valendo como certidão visto ter sido obtido do citius.

51. Mais uma vez a Executada não se conformou com a decisão do Tribunal Superior e, em 14/06/2023, veio reclamar para a Conferência do Supremo Tribunal de Justiça, por requerimento que se junta como doc. nº 12 e que por ter sido extraído do citius vale como certidão judicial.

52. Nessa sequência, o Supremo Tribunal de Justiça, por douto Acórdão de 31/10/2023 veio confirmar a não verificação do previsto no art.º 629º, nº 2, al. d) do CPC, tendo, assim, admitido o recurso de revista do acórdão da Relação;

53. Pelo que, o STJ indeferiu a reclamação e confirmou o despacho do Relator que decidiu não tomar conhecimento do objeto do recurso de revista, tudo como decorre do Acórdão que se junta como Doc. nº 13 e cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido, o qual vale como certidão por ter sido retirado do citius”.

No processo de execução constitui título executivo uma sentença.

Questiona-se, nos embargos, se o título é exequível e se a obrigação é exigível, porque na posição defendida pela apelante a execução foi instaurada sem que a sentença tivesse transitado em julgado e sem que ao recurso fosse atribuído efeito meramente devolutivo.

Acresce que foram fornecidos ao processo diferentes informações sobre o trânsito em julgado da sentença e se é certo que a determinação do trânsito em julgado constitui uma decisão de direito, não é menos verdade que a tal conclusão só se chega através de factos relevantes e que constam dos autos e não foram considerados na decisão de facto, sendo essenciais para apurar desde logo se existia, ou não, título executivo.

Com efeito, resulta das certidões juntas aos autos (inseria a páginas 687 e 752), como documento nº 1 e nº 6, da contestação e do ofício inserido a páginas 1244 que no âmbito do Proc. ..., Juízo Local Cível do Porto, Juiz 9, Tribunal Judicial da Comarca do Porto:

- em 21 de março de 2021 foi proferida a sentença que constitui o título executivo;

- interposto recurso, não foi admitido, por ter sido interposto fora de prazo;

- o recorrente apresentou reclamação nos termos do art.º 643º CPC;

- a reclamação não foi atendida, mantendo-se o despacho que não admitiu o recurso;

- o reclamante requereu a conferência e foi proferido em 08 de fevereiro de 2022 acórdão que manteve a decisão sumária;

- certificou-se que em 24 de fevereiro 2022 transitou em julgado o acórdão do Tribunal da Relação (informação inserida a página 752 do processo eletrónico sistema Citius);

- o reclamante interpôs recurso de revista;

- por despacho proferido em 27 de abril de 2022 foi admitido o recurso de revista com efeito meramente devolutivo;

- em 31 de outubro de 2023 no Supremo Tribunal de Justiça proferiu-se acórdão que manteve o acórdão proferido pelo Tribunal da Relação;

- certificou-se no Supremo Tribunal de Justiça o trânsito do acórdão em 16 de novembro de 2023.

O presente processo de embargos deu entrada em 13 de novembro de 2023, já depois de ter sido proferido o acórdão no Supremo Tribunal de Justiça.

Como se prevê no art.º 628º CPC a decisão considera-se transitada em julgado logo que não seja suscetível de recurso ordinário ou de reclamação.

Enquanto não se estabilizar definitivamente a decisão em causa, não ocorre o trânsito em julgado. Quando a decisão seja suscetível de recurso ordinário, mas este seja rejeitado, nos termos do art.º 641º/2, o trânsito em julgado da decisão ocorre quando se esgotarem as vias de impugnação do despacho de rejeição[6].

No caso concreto apenas com a prolação do acórdão de 31 de outubro de 2023, pelo Supremo Tribunal de Justiça, se operou o trânsito da sentença, por não ser tal decisão suscetível de impugnação e por isso, o trânsito em julgado verificou-se em 16 de novembro de 2023.

Conclui-se, perante o caráter particular em que ocorreu o trânsito em julgado da sentença que constitui o título executivo e por se tratarem de factos essenciais para a apreciação das restantes questões suscitadas, que se justifica aditar aos factos provados os factos indicados pela apelante e ainda, a data em que ocorreu o trânsito em julgado, passando a constar da sentença, sob os pontos 11 e 12, os seguintes factos:

“11. Do Acórdão do Tribunal da Relação do Porto referido em 9., foi interposto no dia 16/03/2022 Recurso de Revista para Supremo Tribunal de Justiça, ao qual foi atribuído efeito meramente devolutivo por despacho do Tribunal da Relação do Porto proferido em 27/04/2022”.

“12. A sentença proferida no Proc. ... que serve de título à execução, transitou em julgado no dia 16/11/2023”.

Procedem, nesta parte, os pontos I a XVIII das conclusões de recurso.


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Na apreciação das restantes questões, cumpre ter presente os seguintes factos, com as alterações introduzidas por efeito da ampliação da matéria de facto (estes últimos em itálico):

1. O exequente pede na execução de sentença nos próprios autos de que estes autos dependem a entrega do estabelecimento comercial com entrada pelos n.ºs ... a ... da Rua ..., do prédio urbano inscrito na matriz predial da união de freguesias ..., ..., ..., ..., ... e ..., sob o art.º ...75 afeta a comércio, sito na Travessa ..., Praça ..., Praça ..., rua ... e rua ..., ... Porto e o pagamento de uma sanção pecuniária compulsória por cada dia de atraso na entrega do locado e que atualmente ascende à quantia de €. 3000,00 (três mil euros), a que acrescerá o valor de 500,00 € por cada dia de atraso na desocupação do locado até à sua entrega efetiva.

2. O requerimento executivo foi apresentado no dia 03/03/2022 no processo ..., que corria termos pelo Juízo Local Cível do Porto - Juiz 9.

3. A secretaria judicial daquele Juízo remeteu o requerimento executivo a este Juízo de Execução, para distribuição, por transferência eletrónica a este Juízo de Execução do Porto, em 22-04-2022 (Referência: 435864247), acompanhado de cópia da sentença proferida naqueles autos, e a que se refere o requerimento executivo (Referência: 421722151).

4. Mais remeteu uma certidão, datada de 22-04-2022, da qual constava que nesse Juízo Local Cível do Porto - Juiz 9 correm uns autos de ação de processo comum com o nº ... e que:


5. Nesses autos era autor Clube ... e ré A..., Lda. e na petição inicial o autor pedia: Nestes termos e nos mais e melhores de Direito que V. Exa. tão douta quanto proficientemente suprirá, deverá a presente ação ser julgada totalmente procedente, por provada e em consequência, deve ser decretada a resolução do contrato de arrendamento sub judice celebrado entre A. e R. em 17 de novembro de 2015 e melhor identificado no art.º 5º desta petição inicial, sendo a Ré condenada a entregar ao Autor o locado, livre e desocupado de pessoas e bens, completamente limpo e asseado, com todas as paredes, portas, vidros e chaves e mais pertenças, em bom estado de funcionamento e sem deteriorações, com todas as legais e devidas consequências.

Mais se requer seja a Ré condenada no pagamento de uma sanção pecuniária

compulsória de € 500,00 por cada dia em que mantenha o locado ocupado após ter sido decretada a resolução do contrato de arrendamento.

Deve a R. ser ainda condenada em custas e demais encargos legais”.

6. Nesses autos a ré arguiu a nulidade da citação, tendo sobre tal requerimento sido proferida decisão em 21/03/2021, que julgou: «Por tudo o exposto, concluímos pela regularidade da citação da ré e pela improcedência da nulidade da citação invocada. Notifique.»

7. No mesmo dia foi proferida sentença, com o seguinte teor:

I. Nesta ação declarativa de condenação, com processo comum, que Clube ... intentou contra A..., Lda., pede o autor que se decrete a resolução do contrato de arrendamento para fins não habitacionais relativo ao espaço correspondente à entrada pelos n.ºs ... a ... da Rua ... do prédio que identifica, celebrado com a ré, por esta estar a levar a cabo obras profundas que extravasam as contratualmente autorizadas sem que o autor tenha consentido.

II. A ré foi regular e pessoalmente citada não tendo contestado.

Ulteriormente constituiu mandatário e arguiu a nulidade da sua citação o que

foi julgado improcedente.

III. Considero confessados os factos articulados na petição inicial, por força do preceituado no art.º 567.º, n.º 1, do Código de Processo Civil.

IV. Atento o disposto no art.º 154.º, n.º 1, do Código de Processo Civil - a lei que permite o mais nos pedidos não controvertidos (falta de fundamentação) permite o menos (fundamentação por remissão) –, adiro à fundamentação de facto e à fundamentação de direito alegada na petição inicial.

Pelo exposto, julgo a ação procedente e condeno a ré no pedido formulado.

Custas a cargo da ré.

Valor da causa: o indicado pelo autor.»

8. Dessa sentença a ré ora embargante interpôs recurso, que não foi admitido, por despacho proferido em 28/05/2021.

9. Desse despacho de não admissão de recurso foi deduzida reclamação, que foi julgada improcedente por Acórdão do Tribunal da Relação do Porto datado de 08/02/2022.

10. Na ação executiva o Agente de Execução procedeu à entrega do imóvel locado no dia 25-10-2023.

11. Do Acórdão do Tribunal da Relação do Porto referido em 9., foi interposto no dia 16/03/2022, recurso de Revista para Supremo Tribunal de Justiça, ao qual foi atribuído efeito meramente devolutivo por despacho do Tribunal da Relação do Porto proferido em 27/04/2022.

12. A sentença proferida no Proc. ... que serve de título à execução, transitou em julgado no dia 16/11/2023.


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- Da inexistência e inexequibilidade do título executivo -

Nas conclusões de recurso, sob os pontos XIX a XXI, a apelante insurge-se contra o segmento da sentença que julgou improcedente a exceção de inexistência e inexequibilidade do título executivo. Defende que na sentença se considerou indevidamente que à data da instauração da execução a sentença já tinha transitado. Pretende que os atos praticados após o requerimento executivo se considerem nulos (art.º 195º CPC).

Na sentença apreciando da inexistência do título executivo decidiu-se como se passa a transcrever:

“O embargante diz que à data da propositura da execução a sentença não tinha transitado. No entanto, isso não corresponde à verdade. A secretaria daquele processo declarativo é que cometeu um lapso, pois remeteu a este tribunal uma (rectius, duas) certidão desatualizada.

De facto, à data da apresentação do requerimento executivo, em 03/03/2022, não só a sentença já tinha transitado em julgado, por força do Acórdão do Tribunal da Relação do Porto datado de 08/02/2022 que confirmou a decisão de não admissão do recurso, como até já constava uma certidão naqueles autos passada pela Sr.ª Escrivã de Direito atestando, e bem, «que a sentença proferida nos presentes autos transitou em julgado em 24/02/2022» (Referência:434423537, de 11-03-2022.

Por razões que se desconhecem, em 22-04-2022 (Referência: 435859842) é passada uma certidão dizendo que «a sentença ora acima certificada AINDA NÃO TRANSITOU EM JULGADO, uma vez que ainda se encontra a correr no Tribunal da Relação do Porto o Apenso A de Reclamação - art.º 643º do CPC em que é reclamante a ora aqui Ré (uma vez que não lhe foi admitido o recurso da sentença final)», informação manifestamente desatualizada e 08-01-2024 ainda emitem uma terceira certidão (Referência: 455562136) dizendo que a sentença ora acima certificada transitou em julgado a 16/11/2023, o que não tem qualquer tipo de adesão à realidade processual naqueles autos.

Mas não são as certidões bem ou mal passadas pela secretaria que definem o trânsito em julgado de uma sentença. É o facto de a mesma já não admitir recurso ou reclamação – art.º 628º do Código de Processo Civil.

No caso dos autos, a sentença transitou em julgado 10 dias depois da notificação do acórdão que julgou improcedente a reclamação do despacho que não admitiu o recurso.

Assim, aquando da propositura da execução, já tinha transitado em julgado a sentença”..

Cumpre apreciar da exequibilidade da sentença, que constitui o título executivo na execução.

A exequibilidade do direito à prestação pressupõe:

- que o dever de prestar conste de um título – o título executivo;

- a prestação deve mostrar-se certa, exigível e líquida[7].

O título executivo constitui um pressuposto de ordem formal, que extrinsecamente condiciona a exequibilidade do direito, na medida em que lhe confere o grau de certeza que o sistema reputa suficiente para a admissibilidade da ação executiva.

O título executivo determina os fins e limites da execução, ou seja, o tipo de ação, o seu objeto, bem como, a legitimidade ativa e passiva e por isso, constitui um pressuposto específico do processo de execução – art.º 10º/5 CPC.

Como refere o Professor CASTRO MENDES o título executivo é o “meio dotado de força legalmente bastante para convencer o tribunal da existência do mesmo direito”[8].

O título executivo constitui condição necessária e suficiente da ação executiva, na medida em que não há execução sem título, o qual tem de acompanhar o requerimento de execução e a obrigação exequenda tem de constar do título e a sua existência é por ele presumida[9].

A enumeração dos títulos executivos é taxativa, conforme resulta da previsão do art.º 703º CPC.

As sentenças condenatórias constituem títulos executivos depois do trânsito em julgado e no caso de interposto recurso, quando ao mesmo seja atribuído efeito meramente devolutivo – art.º 703º/1 a) e 704º/1 CPC.

Em sede de embargos, sendo reconhecido a falta de título executivo, julga-se extinta a execução – art.º 732º/4 CPC.

No caso concreto cumpre ter presente os seguintes factos:

1. O exequente pede na execução de sentença nos próprios autos de que estes autos dependem a entrega do estabelecimento comercial com entrada pelos n.ºs ... a ... da Rua ..., do prédio urbano inscrito na matriz predial da união de freguesias ..., ..., ..., ..., ... e ..., sob o art.º ...75 afeta a comércio, sito na Travessa ..., Praça ..., Praça ..., rua ... e rua ..., ... Porto e o pagamento de uma sanção pecuniária compulsória por cada dia de atraso na entrega do locado e que atualmente ascende à quantia de €. 3000,00 (três mil euros), a que acrescerá o valor de 500,00 € por cada dia de atraso na desocupação do locado até à sua entrega efetiva.

2. O requerimento executivo foi apresentado no dia 03/03/2022 no processo ..., que corria termos pelo Juízo Local Cível do Porto - Juiz 9.

3. A secretaria judicial daquele Juízo remeteu o requerimento executivo a este Juízo de Execução, para distribuição, por transferência eletrónica a este Juízo de Execução do Porto, em 22-04-2022 (Referência: 435864247), acompanhado de cópia da sentença proferida naqueles autos, e a que se refere o requerimento executivo (Referência: 421722151).

4. Mais remeteu uma certidão, datada de 22-04-2022, da qual constava que nesse Juízo Local Cível do Porto - Juiz 9 correm uns autos de ação de processo comum com o nº ... e que:


8. Dessa sentença a ré ora embargante interpôs recurso, que não foi admitido, por despacho proferido em 28/05/2021.

9. Desse despacho de não admissão de recurso foi deduzida reclamação, que foi julgada improcedente por Acórdão do Tribunal da Relação do Porto datado de 08/02/2022.

10. Na ação executiva o Agente de Execução procedeu à entrega do imóvel locado no dia 25-10-2023.

11. Do Acórdão do Tribunal da Relação do Porto referido em 9., foi interposto no dia 16/03/2022, recurso de Revista para Supremo Tribunal de Justiça, ao qual foi atribuído efeito meramente devolutivo por despacho do Tribunal da Relação do Porto proferido em 27/04/2022.

12. A sentença proferida no Proc. ... que serve de título à execução, transitou em julgado no dia 16/11/2023.

Para além destes factos é de considerar face ao que resulta do processo de execução:

- em 18 de março de 2022 o exequente recebeu a seguinte notificação do tribunal:

“Fica V. Exª notificado, relativamente ao processo supra identificado, que este Tribunal não vai dar andamento a esta execução, por enquanto, uma vez que a Relação do Porto remeteu a este Tribunal p/o Apenso A-Reclamação nos termos do art.º 643º do CPC recurso de revista c/alegações da requerida Ré/reclamante/executada, o qual vai ser ainda apreciado”.

- em 27 de abril de 2023 o agente de execução prestou a seguinte informação:

“AA, Agente de Execução nomeado nos presentes autos, tendo sido notificado para informar o estado dos mesmos, vem comunicar que ainda não iniciou as diligências executivas atento o conteúdo da certidão do Juízo Local Cível do Porto - Juiz 9, que se anexa, a sentença objeto da presente execução ainda não transitou em julgado uma vez que se encontra a correr no Tribunal da Relação do Porto o Apenso A de Reclamação - art.º 643º do CPC”.

- as diligências de penhora iniciaram-se em 17 de agosto de 2023.

- após conclusão das diligências de penhora o executado - aqui apelante - foi notificado em 02 de novembro de 2023 para deduzir oposição à execução e penhora.

Constata-se da análise destes factos, que não são mais do que resulta dos atos praticados nos sucessivos processos, que na data em que foi instaurada a execução – 03 de março de 2022 – a sentença que constitui o título executivo não tinha transitado em julgado, porque apesar de proferido acórdão no Tribunal da Relação do Porto que apreciou da reclamação deduzida com fundamento no art.º 643º CPC, subsistia a possibilidade de impugnação de tal decisão, o que veio a ocorrer, com o recurso de revista, com fundamento no art.º 629º/2 d) CPC.

Por despacho de 27 de abril de 2022 foi atribuído ao recurso o efeito meramente devolutivo.

Durante este período, entre 03 de março de 2022 e 27 de abril de 2022, não foi praticado qualquer ato no processo de execução. Quando em 27 de abril de 2023 o agente de execução vem prestar informação, constata-se que nenhum ato tinha sido praticado no processo. Apenas em agosto de 2023 se iniciaram as diligências de penhora.

Daqui resulta que o exequente dispunha de título executivo – a sentença condenatória – a qual se tornou exequível, quando ao recurso de revista do acórdão proferido pelo Tribunal da Relação do Porto, que apreciou a decisão da reclamação, foi atribuído o efeito meramente devolutivo. Contudo, as diligências de penhora apenas se iniciaram cerca de um ano após ter sido atribuído esse efeito.

Refira-se, ainda, que o juiz de execução não teve qualquer intervenção no processo de execução, na medida em que se tratava de execução sem despacho liminar. De facto, o processo manteve-se suspenso, sem tal suspensão ser validada por despacho judicial. Por outro lado, no concreto circunstancialismo, sempre seria de proferir despacho de convite ao suprimento de falta de formalidades, como determina o art.º6º/2 CPC e só após tomar posição sobre a verificação dos pressupostos processuais. Conforme decorre dos factos provados foi o próprio Tribunal da Relação do Porto que comunicou ao processo a pendência da reclamação, o que necessariamente, levaria a aguardar o trânsito da decisão que apreciou a reclamação.

Conclui-se que sendo a sentença de condenação exequível, constituía título executivo e nada obstava à promoção da execução com a realização da penhora.

Desta forma, ainda que por motivos diferentes, considera-se que a decisão não merece censura quando concluiu que não se verifica o fundamento de oposição invocado de inexistência e inexequibilidade do título executivo.

Improcedem as conclusões de recurso, sob os pontos XIX a XXI.


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- Da nulidade da citação -

Nas conclusões de recurso, sob os pontos XXXI a XXXIX, a apelante insurge-se contra o segmento da decisão que apreciou outros dos fundamentos de oposição à execução: a nulidade da citação e a falta de intervenção da ré (aqui apelante) no processo declarativo (art.º 729º/d) CPC).

Na sentença, julgou-se improcedente a exceção, com os fundamentos que se passam a transcrever:

“B. Quanto à “nulidade de citação”, logo se vê que a questão foi já conhecida no processo declarativo por despacho proferido em 21/03/2021, há muito transitado em julgado.

Os argumentos ora expendidos pela executada poderiam ser fundamentos para recorrer da sentença exequenda, ou melhor, daquele despacho.

Mas não podem servir de base a estes embargos.

Isto porque a pretensão da embargante improcede por se mostrar totalmente afastada por força do caso julgado material que se formou sobre os mesmos.

Bem se compreende tal regime processual.

O mesmo visa respeitar a eficácia do caso julgado, em homenagem aos princípios da certeza e da segurança jurídica, sob pena de qualquer ação declarativa jamais obter o seu efeito útil, mesmo após o respetivo trânsito em julgado.

Na verdade, há que respeitar a força de caso julgado material que recaiu sobre tais decisões definitivas de harmonia com o disposto nos arts. 619º e 621º do Código de Processo Civil.

Aliás, até por via da aplicação princípios gerais do processo civil, tais como o da preclusão e da segurança e confiança jurídica (este último com reflexo na própria definição legal da exceção do caso julgado), a conclusão não poderá deixar de ser a do funcionamento do caso julgado e do respeito devido pela força do mesmo.

Efetivamente, e não perdendo de vista a unidade da ordem jurídica pressuposta no art.º 9º, do C. Civil, não seria entendível nem razoável, salvo o devido respeito, admitir que nestes embargos de executado a uma execução de sentença, o aí decidido definitivamente não tivesse reflexos na presente oposição à execução e nesta.

Aliás, seria mesmo, salvo o devido respeito, desmerecer o labor e o valor da sentença transitada em julgado e da força de caso julgado de que a mesma se mostra revestida, com evidente risco de contradição de julgados e, em última análise, de desprestígio para o próprio sistema judicial.

O que leva, sem necessidade de outras considerações, à improcedência de mais este fundamento dos presentes embargos”.

Argumenta a apelante que a decisão proferida na ação declarativa tem o valor de caso julgado formal e tem força obrigatória dentro do próprio processo em que a decisão é proferida e impede que na mesma ação, o juiz possa alterar o decidido, nada obstando que em outro processo decida em termos diversos a mesma questão processual concreta.

A questão que se coloca consiste em apurar se na ação declarativa, onde se formou o título executivo, suscitada a nulidade da citação e julgada improcedente, por decisão com trânsito em julgado, tal decisão obsta a que se deduza oposição na execução com tal fundamento.

Determina o art.º 729º/d) que “fundando-se a execução em sentença, a oposição só pode ter algum dos fundamentos seguintes:

[…]

d) Falta de intervenção do réu no processo de declaração, verificando-se alguma das situações previstas na alínea e) do artigo 696º;[…]”

Prevê o art.º 696º e) CPC:

“A decisão transitada em julgado só pode ser objeto de revisão quando:[…] tendo corrido o processo à revelia, por falta absoluta de intervenção do réu, se mostre que:

i) Faltou a citação ou que é nula a citação feita;

ii) O réu não teve conhecimento da citação por facto que não lhe é imputável;

iii) O réu não pode apresentar a contestação por motivo de força maior”.

De acordo com o art.º 732º/5 CPC “em caso de procedência dos embargos fundados em qualquer das situações previstas na alínea e) do art.º 696º, é admitida a renovação da instância deste processo a requerimento do exequente, apresentado no prazo de 30 dias a contar do trânsito em julgado da decisão dos embargos”.

Este fundamento de oposição à execução visa retirar exequibilidade ao título executivo, a sentença, na medida em que se formou, sem que o réu/executada tenha tido oportunidade de se defender, por vícios relacionados com o ato de citação.

A citação é o ato pelo qual se dá conhecimento ao réu de que foi proposta contra ele determinada ação e se chama ao processo para se defender (art.º 219º CPC).

A lei estabelece vários mecanismos de reação processual contra a nulidade da citação: reclamação através da arguição da nulidade, nos termos previstos nos artigos 191.º e seguintes do CPC; interposição de recurso ordinário se a mesma tiver sido explicita ou implicitamente objeto de decisão judicial, e desde que verificados os pressupostos de recorribilidade; interposição de recurso extraordinário de revisão se arguida após o trânsito em julgado e verificados os pressupostos mencionados nos artigos 696.º e seguintes do CPC; e, finalmente, através de oposição à execução, conforme estipula o artigo 729.º, alínea d) do CPC.

Daqui resulta que o que varia é o modo ou a forma processual de levar a cabo a sua invocação, sendo que cada uma destes modos ou formas está sujeito a requisitos específicos.

No âmbito do processo de embargos à execução a verificação da exceção pressupõe que se prove:

- a revelia do réu na ação declarativa; e

- a nulidade da citação[10].
Nos termos do preceituado no art.º 566.º do CPC, a revelia do réu só é absoluta na situação de não dedução de contestação, de não constituição de mandatário e de omissão de intervenção por qualquer forma no processo.

No caso concreto, não resulta demonstrada a revelia absoluta da ré, porque teve intervenção na ação declarativa onde suscitou a nulidade da citação, a qual foi apreciada e decidida por despacho que transitou em julgado. Interpôs recurso da decisão e reclamou do despacho de não admissão, bem como interpôs os competentes recursos de apelação e de revista. Suscitada a nulidade tem intervenção no processo e tomou conhecimento do processo.

A ré, executada no processo de execução e aqui apelante, optou por suscitar a nulidade logo com a primeira intervenção no processo declarativo e decidida a questão por despacho com trânsito em julgado, estava a executada impedida de suscitar de novo em sede de embargos a mesma nulidade processual, desde logo em obediência ao caso julgado formado com a decisão proferida em sede de ação declarativa e porque se verificou que teve intervenção no processo antes da prolação da sentença.

A decisão produz os seus efeitos fora do processo e em sede de ação executiva, porque está em causa apurar se existe o título executivo que se formou na ação declarativa, a sentença condenatória. Apesar da ré não contestar a ação, decidiu-se que foi regularmente citada e por esse motivo, a falta de contestação não impedia a prolação da sentença, mostrando-se válido o título executivo. A sentença passou a ter eficácia de caso julgado contra a ré, não podendo como tal ser invalidada no processo executivo.

Desta forma, não merece censura a sentença que julgou improcedente a exceção.

Improcedem as conclusões de recurso sob os pontos XXXI a XXXIX.


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- Da exigibilidade e indevida liquidação da quantia peticionada a título de sanção pecuniária compulsória e juros -

Nos pontos XXII a XXX das conclusões de recurso insurge-se a apelante contra o segmento da sentença que julgou improcedente a exceção de inexigibilidade e indevida liquidação da obrigação exequenda, deduzida pela apelante, com fundamento no art.º 729º/e) CPC.

Na sentença apreciando a exceção, decidiu-se como se passa a transcrever:

“C. liquidação da quantia exequenda: sanção pecuniária compulsória;

Mais uma vez, esta questão está prejudicada pelo caso julgado formato pela sentença exequenda.

Não há dúvidas que a dita sentença condenou a ré a pagar uma sanção pecuniário compulsória de € 500,00 por cada dia em que mantenha o locado ocupado após ter sido decretada a resolução do contrato de arrendamento.

Uma obrigação não é certa se existir uma pluralidade de possibilidades, cuja escolha ainda não foi feita - vide artigo 400º do Código Civil – como é o caso das obrigações alternativas ou genéricas indeterminadas – artigos 543º e 539º do Código Civil.

A liquidez de uma obrigação depende de a mesma estar ou não quantificada - vide artigos 358º a 361 do Código de Processo Civil.

Por sua vez, a exigibilidade de uma obrigação está associada à sua natureza (as obrigações naturais, como as dívidas de jogo, ou as prescritas não são exigíveis – vide artigos 402º a 404º, 304º do Código Civil), ou ao vencimento da mesma.

Os pressupostos da ação executiva, incluindo a certeza, liquidez e exigibilidade da obrigação, devem constar do título executivo, salvo nos casos em que a lei permite que a execução principie pela sua concretização – vide artigos – art.º 10º, nº 5 e 713º a 716º do Código de Processo Civil.

Não há assim dúvidas que face ao título a obrigação relativa ao pagamento da quantia de 3.000,00 € é certa – é uma obrigação pecuniária, não estando prevista outra forma de cumprimento e é exigível por estar vencida.

Resta saber se é líquida.

Não, mas é liquidável por mero cálculo aritmético - €500 por dia, desde a resolução do contrato até à entrega.

Resta saber se o cálculo levado a cabo pelo exequente está correto.

Afigura-se que a data da resolução do contrato de arrendamento não pode deixar de coincidir com a data do trânsito da sentença - 24-02-2022. Por seu lado, o RE foi entregue 8 dias depois, pelo que à data até já era maior o montante em dívida, que só não se considera por força do princípio do pedido.

Pelo que também improcede este fundamento dos embargos”.

Argumenta a apelante que a sanção pecuniária compulsória prevista no art.º 829º -A do C.C. e peticionada no requerimento executivo, opera apenas a partir da data de resolução do contrato de arrendamento, a qual coincide com a data do trânsito em julgado, isto é 16/11/2023.

Na data de apresentação do requerimento executivo (03/03/2022), a sentença ainda não havia transitado em julgado, consequentemente, a obrigação não era nem exigível, nem líquida. Mas também não era aquando da entrega coerciva do estabelecimento comercial ocorrida no dia 25/10/2023.

A questão a apreciar consiste em determinar se é devida a sanção pecuniária compulsória e se foi devidamente liquidada.

A obrigação exequenda é certa, líquida e exigível, como decorre do art.º 713º CPC.

Os requisitos da obrigação exequenda constituem um dos pressupostos específicos do processo de execução. A sua falta justifica a oposição por embargos, nos termos do art.º 729º/e) CPC.

Como refere ABRANTES GERALDES, PAULO PIMENTA, LUIS FILIPE PIRES DE SOUSA, em anotação ao artigo 729º/e) CPC: “ [a] inexigibilidade a que se refere a alínea e) respeita aos casos em que, nos termos da sentença, a obrigação está dependente de condição suspensiva ou de uma prestação por parte do credor ou terceiro, mas a execução é instaurada sem observar o art.º 715º”[11].

A apelante não questiona que o termo inicial da sanção coincide com o trânsito em julgado da sentença, tal como decidido na sentença, entendimento que vai ao encontro da mais recente jurisprudência, citando-se entre outros, o Ac. STJ 28 de novembro de 2023, Proc. 3709/12.2YYPRT-I.P1.S1 (acessível em www.dgsi.pt).

A apelante apenas se insurge contra o facto de se considerar que o trânsito em julgado ocorreu em 24 de fevereiro de 2022.

Provou-se que a sentença proferida no Proc. ... que serve de título à execução, transitou em julgado no dia 16 de novembro de 2023 (ponto 12 dos factos provados).

A sanção pecuniária compulsória, nos termos do art.º 869º-A CC, visa compelir o devedor ao cumprimento voluntário nas obrigações de facto infungível.

Fixada a sanção pecuniária compulsória na sentença condenatória o seu caráter acessório determina que a mesma apenas é devida quando a obrigação principal seja exequível, o que implica o trânsito em julgado da decisão.

A sanção visa constranger o devedor ao cumprimento da obrigação tal como determinada na sentença. Estando pendente recurso da decisão, a obrigação definitiva e principal não está ainda determinada. Desta forma, a sanção apenas é devida a partir do trânsito em julgado da sentença que a fixou.

No caso concreto a sanção seria devida a “cada dia em que mantenha o locado ocupado após ter sido decretada a resolução do contrato de arrendamento”.

A resolução do contrato operou-se com o trânsito em julgado da sentença que reconheceu o direito à resolução. A obrigação primária consiste na entrega do local arrendado, a qual apenas se consolida na ordem jurídica com o trânsito em julgado da sentença que decretou a entrega, por efeito da resolução do contrato.

Sucede que a entrega do local arrendado ocorreu, ainda que de forma coerciva, em data anterior ao trânsito em julgado da sentença, pelo que não é devida a quantia fixada a título de sanção pecuniária compulsória, já que a mesma visava coagir a executada ao cumprimento de tal obrigação. A obrigação não é, pois, exigível, porque a obrigação estava sujeita a duas condições que não se verificaram: o trânsito em julgado da sentença que decretou a entrega e o incumprimento por parte do devedor.

Este, aliás, foi o entendimento expresso pelo exequente na contestação, quando refere:

“- 92. No que aos fundamentos de oposição à penhora diz respeito, como já se disse, quando o requerimento executivo foi apresentado, o Embargado tinha obtido uma certidão que atestava o trânsito em julgado da decisão

93. Estando, portanto convencido (como até o tribunal estava) de que o trânsito já tinha efetivamente ocorrido.

94. Pelo que os montantes peticionados foram contados e liquidados a partir dessa data, tendo a Embargante especificado no seu requerimento executivo (ver Liquidação da Obrigação) a que se deviam os 3.000,00 € peticionados.

95. Sucede que, atendendo a que, como decorre dos autos, o trânsito em julgado apenas ocorreu em data posterior à tomada de posse do imóvel, o pagamento de quantia certa peticionado, que correspondia à sanção pecuniária compulsória em que a então R. tinha sido condenada efetivamente não é devida”.

Contudo, de tal alegação não extraiu os devidos efeitos, nomeadamente desistindo do pedido executivo e a oposição ao recurso, sob este aspeto, apenas se explica face aos fundamentos da sentença e por esse motivo, não se extrai de tal conduta qualquer efeito em sede de litigância de má-fé.

Conclui-se que a obrigação exequenda que tem por objeto a quantia liquidada e peticionada a título de sanção pecuniária compulsória e juros, não é exigível, porque não se chegou a vencer, o que determina a extinção da execução, quanto ao valor peticionado, ficando sem efeito a penhora realizada para cobrança do valor peticionado a título de sanção e juros (art.º 732º/4 CPC).

A penhora subsiste, apenas, para garantir o pagamento das custas da execução e por esse motivo não se determina o respetivo levantamento.

Procedem, nesta parte, as conclusões de recurso.


-

Nos termos do art.º 527º CPC as custas nos embargos e na apelação são suportadas pela apelante e apelada, na mesma proporção.

-


III. Decisão:

Face ao exposto, acordam os juízes desta Relação em julgar parcialmente procedente a apelação e revogar, em parte, a sentença e nessa conformidade, julgar, em parte, extinta a execução, quanto à quantia liquidada e peticionada a título de sanção pecuniária compulsória e ainda, em relação à obrigação de pagamento de juros.


-

Custas, nos embargos e na apelação, pela apelante e apelada, na mesma proporção.

-

Desentranhe e devolva o documento.

Custas do incidente pela apelante, fixando-se em € 60,00 a taxa de justiça.


*

Porto, 27 de janeiro de 2025

(processei, revi e inseri no processo eletrónico – art.º 131º, 132º/2 CPC)

Assinado de forma digital por

Ana Paula Amorim

Juiz Desembargador-Relator

Maria de Fátima Andrade

1º Adjunto Juiz Desembargador

José Eusébio Almeida

2º Adjunto Juiz Desembargador


________________________________________
[1] Texto escrito conforme o Novo Acordo Ortográfico de 1990. 

[2] ANTÓNIO SANTOS ABRANTES GERALDES Recursos no Novo Código de Processo Civil, Coimbra, Almedina, julho 2013, pág.184-185.

ANTUNES VARELA et al Manual de Processo Civil, 2ª edição, Revista e Atualizada, Coimbra, Coimbra Editora, Limitada, 1985, pág. 532.


[3] AMÂNCIO FERREIRA Manual dos Recursos em Processo Civil, 9ª ed., Coimbra, Almedina, 2009, pág. 215.
[4] ANTÓNIO SANTOS ABRANTES GERALDES Recursos no Novo Código de Processo Civil, Coimbra, Almedina, 2013, pág. 240.

[5]  MIGUEL TEIXEIRA DE SOUSA Estudos sobre o Novo Processo Civil, 2ª edição, Lisboa, Lex, 1997, pág. 77, 78.   

 JOSÉ LEBRE DE FREITAS, JOÃO REDINHA E RUI PINTO Código de Processo Civil Anotado, vol. I, Coimbra, Coimbra Editora, 1999, pág. 467-468.


[6] Cf. ANTÓNIO SANTOS ABRANTES GERALDES, Recursos em Processo Civil, 8ª ed. Atualizada, Almedina, Coimbra novembro de 2024, pág. 43.

[7]  JOSÉ LEBRE DE FREITAS A ação executiva – Á Luz do Código de Processo Civil de 2013, 6ª edição, Coimbra Editora, Coimbra, 2014, pág. 37.

[8]  JOÃO DE CASTRO MENDES Direito Processual Civil, vol. I, AAFDL, pág. 332.

[9] JOSÉ LEBRE DE FREITAS A ação executiva – Á Luz do Código de Processo Civil de 2013, ob. cit., pág. 86


[10] Cf. JOSÉ LEBRE DE FREITAS A Ação Executiva – À luz do Código de Processo Civil de 2013, 6ª edição, Coimbra Editora, Coimbra, fevereiro de 2024, pág. 197.

[11]ANTÓNIO SANTOS ABRANTES GERALDES, PAULO PIMENTA, LUIS FILIPE PIRES DE SOUSA  Código de Processo Civil Anotado, Vol. II, Almedina, Coimbra, 2020, pág. 84.