PROPRIEDADE INDUSTRIAL
MARCA
REGISTO
ANULAÇÃO
IMITAÇÃO
Sumário

(da responsabilidade do Relator)
1. A decisão recorrida revogou o despacho do INPI que tinha decidido pelo deferimento parcial do pedido de anulação da marca nacional n.º 680584, e, em consequência determinou a concessão do registo daquela marca nacional, quanto a todos os serviços requeridos, em concreto as classes 35, 39 e 43 da Classificação Internacional de Nice.
2. A marca aludida tem a seguinte configuração  (sinal misto).
3. A prioridade da invocada marca nacional n.º 574753, DALMA (sinal verbal), não é controversa.
4. Após a análise dos outros dois requisitos do conceito legal de “imitação”, conclui este tribunal ad quem, que entre a marca nacional n.º 574753 e a marca nacional n.º 680584, existe risco de confusão, devendo esta ser anulada quanto às Classes 39 e 43, julgando-se, assim, procedente o recurso.

Texto Integral

Acordam na Secção da Propriedade Intelectual, Concorrência, Regulação e Supervisão do Tribunal da Relação de Lisboa

I. Relatório

Recorrente: PRÓXIMA PALAVRA – UNIPESSOAL LDA (doravante, PRÓXIMA PALAVRA)
Recorrida: NOOR PROPERTIES – UNIPESSOAL, LDA (doravante, NOOR)

1. A ora Recorrente, PRÓXIMA PALAVRA, apresentou um pedido de anulação, nos termos do disposto no artigo 260.º, n.º 1 e com fundamento no artigo 232.º, ambos do Código da Propriedade Industrial, da marca nacional n.º 680584, da titularidade de NOOR PROPERTIES, ora Recorrida, por considerar que a mesma reproduzia e imitava a marca nacional n.º 574753 «DALMA» (marca verbal), da qual é titular.
2. Em tais autos, o INPI proferiu decisão final com o seguinte conteúdo:
“Do exposto, e tendo em conta os factos que o sustentam, o INPI decide, ao abrigo dos artigos 34.º, n.º 2, 260.º, n.º 1 e 265.º, n.º 2 do CPI, pelo deferimento parcial do pedido de anulação da marca nacional n.º 680584 https://servicosonline.inpi.justica.gov.pt/portal_resources/proc_images/8023704_01_thumb.jpg, por considerar que na sua concessão, para assinalar serviços de «prestação de informações turísticas sobre viagens: disponibilização de informação sobre viagens turísticas através da internet; disponibilização de informação a turistas sobre excursões e visitas turísticas» e «serviços hoteleiros serviços de alojamento hoteleiro; serviços de restaurante em hotéis» inseridos, respetivamente, nas classes 39 e 43 da referida Classificação Internacional, foi infringido o disposto no artigo 232.º, n.º 1, alínea b) do mesmo diploma. Consequentemente, deve manter-se vigente apenas para assinalar os serviços de «gestão de negócios de hotéis; gerência administrativa de hotéis; serviços publicitários relacionados com hotéis; apresentação de empresas e de seus bens e serviços através da internet», inseridos na classe 35 dessa mesma Classificação.
3. Ao abrigo do disposto nos artigos 38.º e seguintes do Código da Propriedade Industrial, a ora Recorrida, NOOR PROPERTIES, junto do TPI, interpôs recurso do aludido despacho do INPI que decidiu a anulação parcial da marca nacional nº 6800584.
4. Decidiu o TPI o seguinte (sentença recorrida):
Nos termos e pelos fundamentos expostos, julga-se procedente, por provado, o presente recurso judicial e, em consequência, revoga-se o despacho recorrido do Instituto Nacional da Propriedade Industrial, decisão 007/D.E.D./2024, que decidiu anular parcialmente o registo da marca nacional nº 680584 com fundamento na alegada violação do disposto no art.º 232º, nº 1, al. b) do Código da Propriedade Intelectual (CPI) quanto aos serviços da Requerente integrantes das classes 39 e 43 da Classificação Internacional de Nice e, em consequência determina-se a concessão do registo da marca nacional nº 680584, quanto a todos os serviços requeridos, designadamente os respeitantes às classes 39 e 43 da Classificação Internacional de Nice.”.
5. Inconformada com a sentença dela apelou a Recorrente, PRÓXIMA PALAVRA, formulando as seguintes
II. conclusões e pedido (reprodução integral)
a) A marca “DALMA” tem prioridade de registo em relação à marca “D’ALMA BOUTIQUE HOTEL”, uma vez que o pedido de registo da primeira foi efetuado em 2016, enquanto o da segunda ocorreu apenas em 2022, estabelecendo a prioridade do direito de marca.
b) Além da prioridade de registo, ambas as marcas se dedicam à prestação de serviços no setor hoteleiro, estando registadas na classe 43 da Classificação de Nice.
c) A marca "D'ALMA BOUTIQUE HOTEL" também detém a classe 39, que abrange serviços como a prestação de informações turísticas e reservas de viagens - serviços esses que são frequentemente complementares aos serviços hoteleiros da classe 43, uma vez que os hotéis costumam oferecer informações e realizar reservas para excursões, passeios turísticos e outras atividades relacionada existindo, assim, uma correlação inegável entre os serviços das classes 39 e 43.
d) O Tribunal “a quo” apenas se pronunciou quanto à similitude entre os serviços e produtos de ambas as marcas relativamente à Classe 43 da Classificação de Nice, não se pronunciando pela Classe 39 da Classificação de Nice – omitindo desta forma um elemento essencial para o caso em apreço.
e) Classe (39) esta que justifica o deferimento parcial do pedido de anulação da marca nacional nº 680584, tal como decidido pelo Instituto Nacional da Propriedade Industrial e que era imprescindível que o Tribunal “a quo” se tivesse pronunciado.
f) O d. Tribunal “a quo” decidiu que ambas as marcas são distintas, dando maior relevância às diferenças visuais e gráficas
g) Todavia, as marcas “DALMA” e “D’ALMA BOUTIQUE HOTEL” apresentam uma semelhança fonética e gráfica significativa, bem como uma semelhança entre os produtos e/ou serviços.
h) A semelhança entre “DALMA” e “D’ALMA” não se restringe à fonética, ambas partilham as mesmas letras, dispostas pela mesma ordem, sendo certo que o apóstrofo na marca “D’ALMA” é insuficiente para criar uma distinção visual ou gráfica efetiva.
i) Mais, a adição da expressão “BOUTIQUE HOTEL” na marca “D’ALMA BOUTIQUE HOTEL” não é suficiente para diferenciá-la da marca da Recorrida, pois é meramente descritiva e não contribui para uma distinção substancial, persistindo a possibilidade de confusão entre os consumidores.
j) A avaliação de um consumidor médio, geralmente pouco atento aos detalhes, é orientada por uma impressão de conjunto e não pela dissecação de pormenores.
k) Não se pode admitir que, ao afirmar-se que deve prevalecer uma avaliação global dos sinais, que seja atribuído um maior peso aos elementos gráficos e visuais da marca da Recorrente, ignorando, assim, a relevância da semelhança fonética entre ambas as marcas.
l) Pelo que se conclui pela verificação dos requisitos legais para a anulação do registo da marca “D’ALMA BOUTIQUE HOTEL”, conforme disposto nos artigos 260.º e 232.º, alínea b) do Código da Propriedade Industrial, em virtude da prioridade do registo, da identidade dos serviços oferecidos e da significativa semelhança entre as marcas, como bem decidiu o I.N.P.I.

Nestes termos e nos demais de direito que Vs. Exas. mui doutamente suprirão, deve ser julgado procedente o presente recurso e consequentemente se dignem a revogar a decisão recorrida, mantendo-se a anulação do registo da marca “D’ALMA BOUTIQUE HOTEL” decidida pelo I.N.P.I., só assim se fazendo a costumada JUSTIÇA!
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6. A Recorrida apresentou resposta ao recurso de apelação, pugnando pela improcedência do recurso e, consequentemente, pela manutenção do decidido.
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7. Em sede do presente recurso de apelação, foi cumprido o disposto nos artigos 657.º, n.º 2 e 659.º, do Código de Processo Civil.
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III. Questões a decidir
a) A decisão recorrida incorreu em nulidade por omissão de pronuncia, relativamente à Classe 39 da Classificação de Nice?
b) A marca controversa constitui uma “imitação” da alegada marca prioritária?
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IV. Fundamentação
Factos provados
1) A PRÓXIMA PALAVRA apresentou em 19.12.2016 um pedido de registo da marca “DALMA”, a que foi atribuído o n.º 574753, que veio a ser concedido e publicado no Boletim da Propriedade Industrial n.º 252/2016 a 28.12.2016, com início de vigência em 29.05.2017.
2) A sociedade comercial com a firma “NOOR PROPERTIES – UNIPESSOAL, LDA”, apesentou em 09.02.2022 um pedido de registo da marca “D’ALMA BOUTIQUE HOTEL”, a que foi atribuído o n.º 680584, que veio a ser concedido e publicado no Boletim de Propriedade Industrial a 18.02.2022, com início de vigência em 17.05.2022.
3) Por decisão 007/D.E.D./2024, o INPI, I. P. decidiu anular parcialmente o registo da marca nacional nº 680584 com fundamento na alegada violação do disposto no art.º 232º, nº 1, al. b) do Código da Propriedade Intelectual (CPI) quanto aos serviços da Requerente integrantes das classes 39 e 43 da Classificação Internacional de Nice (cfr. Doc. 1 junto com o requerimento inicial).
4) Decisão esta que foi proferida no seguimento do pedido de anulação do registo da marca nacional n.º 680584 (“D’ALMA BOUTIQUE HOTEL”), apresentado pela PRÓXIMA PALAVRA.
5) A Recorrente e a Recorrida possuem em comum a classe 43 da classificação de Nice, detendo também a Recorrente a classe 39, cuja decisão do INPI foi no sentido de considerar afim aos serviços de atividade hoteleira definidos na classe 43.
6) As duas marcas em confronto são as seguintes (conforme Doc.s 2 e 3, junto com o requerimento inicial:

MARCA INVOCADA COMO PRIORITÁRIA
(marca nacional n.º 574753)
MARCA CONTROVERSA
(marca nacional n.º 680584)





DALMA




      https://servicosonline.inpi.justica.gov.pt/portal_resources/proc_images/8023704_01_thumb.jpg

Tipo de Sinal: VERBAL
Registada para assinalar:

i. serviços hoteleiros, inseridos na classe 43
Tipo de Sinal: MISTO
Registada para assinalar:

a. “gestão de negócios de hotéis;
gerência administrativa de hotéis;
serviços publicitários relacionados
com hotéis; apresentação de
empresas e de seus bens e serviços
através da internet, inseridos na
classe 35;

b. prestação de informação sobre
viagens turísticas através da internet;
disponibilização de informação a
turistas sobre excursões e visitas
turísticas, inseridos na classe 39;

c. serviços hoteleiros; serviços de
alojamento hoteleiro; serviços de
restaurante em hotéis, inseridos na
classe 43.

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Inexistem factos não provados com relevância para a decisão a proferir.
*
V. Do mérito do recurso
i. A decisão recorrida incorreu em nulidade por omissão de pronuncia, relativamente à Classe 39 da Classificação de Nice?
8. Nesta sede, alega a ora Recorrente que “O Tribunal “a quo” apenas se pronunciou quanto à similitude entre os serviços e produtos de ambas as marcas relativamente à Classe 43 da Classificação de Nice, não se pronunciando pela Classe 39 da Classificação de Nice – omitindo desta forma um elemento essencial para o caso em apreço.”.
9. Por sua vez, entende a Recorrida que “não se verifica qualquer omissão de pronúncia”.
Apreciação da questão por este tribunal
10. A decisão recorrida é efetivamente parca nas referências que faz à classe 39 da Classificação de Nice.
11. Efetivamente, em sede de Direito (p. 8), a decisão recorrida refere o seguinte:
O registo da marca da Recorrida goza indiscutivelmente de prioridade em relação ao pedido de registo da marca da recorrente.
Por outro lado, também se constata a similitude de serviços e produtos, ambos da classe 43, o que sequer é colocado em causa.”.
12. Seguidamente, a decisão recorrida apresenta um quadro onde se reproduz cada uma das marcas em confronto e discrimina os respetivos serviços que as mesmas visam assinalar, em suma, a classe 43 relativamente à marca nacional 574753 e classes 35, 39 e 43 relativamente à marca nacional 680584 (marca controversa).
13. Logo de seguida, a decisão recorrida entra na apreciação do risco de confusão entre os sinais: “a impressão sensitiva e memorial global que a marca registanda deixa é desmarcadamente distintiva da marca prioritária para que ocorra risco de confusão ao consumidor”.
14. Ou seja, a decisão recorrida efetivamente não se pronuncia, pelo menos de forma expressa, sobre a afinidade entre os produtos/serviços assinalados da classe 39 da marca controversa, com os produtos/serviços assinalados pela invocada marca prioritária.
15. Contudo, julga-se que a apreciação da aludida afinidade entre produtos/serviços está implicitamente contida na decisão recorrida, até porque esta fez questão de descrever, em sede jurídica, todos os produtos/serviços que a marca controversa visava assinalar.
16. De qualquer forma, o processo já contém todos os elementos necessários para proferir uma decisão sobre o mérito da causa, pelo que a anulação da decisão recorrida sempre seria contrária ao princípio da economia processual.
17. Nestes termos, a alegada nulidade deve ser julgada improcedente, o que se decide.
ii. A marca controversa constitui uma “imitação” da alegada marca prioritária?
18. Resulta do artigo 1.º do CPI que a propriedade industrial desempenha a função de garantir a lealdade da concorrência, pela atribuição de direitos privativos sobre os diversos processos técnicos de produção e desenvolvimento da riqueza.
19. Neste domínio, como é sabido, a marca destina-se a distinguir produtos e serviços de uma empresa dos de outras empresas (artigo 208.º, do CPI), não sendo admissíveis marcas desprovidas de qualquer carácter distintivo (artigo 209.º, n.º 1, alínea a), do CPI).
20. Daí que se afirme que a função essencial da marca é a função de garantir aos consumidores a proveniência do produto ou serviço (a chamada função de indicação de origem), ainda que possa complementarmente desempenhar outras funções, designadamente, a função de garantia da qualidade dos produtos e serviços e/ou as funções de comunicação, de investimento ou de publicidade.
21. Está em causa nestes autos o conceito legal de imitação e respetiva aplicação ao caso concreto.
22. Conforme resulta do artigo 238.º, n.º 1, do CPI, o conceito de imitação inclui 3 requisitos cumulativos:
a) A prioridade de uma marca registada;
b) As marcas em confronto visam assinalar produtos ou serviços idênticos ou afins;
c) Tenham tal semelhança gráfica, figurativa, fonética ou outra que induza facilmente o consumidor em erro ou confusão, ou que compreenda um risco de associação com marca anteriormente registada, de forma que o consumidor não as possa distinguir senão depois de exame atento ou confronto.
23. Mais resulta do n.º 2 do mesmo preceito que para aferir da identidade ou afinidade entre produtos:
a) Produtos e serviços que estejam inseridos na mesma classe da classificação de Nice podem não ser considerados afins;
b) Produtos e serviços que não estejam inseridos na mesma classe da classificação de Nice podem ser considerados afins.
24. No caso concreto, é consensual a prioridade de registo da marca nacional n.º 680584 relativamente à marca nacional n.º 574753.
25. Passemos, assim, à apreciação dos outros dois requisitos da imitação.
Da identidade e/ou afinidade entre produtos assinalados pelas marcas
26. A comparação dos produtos/serviços em questão deve ser feita sem ter em conta o grau de semelhança dos sinais contraditórios ou o carácter distintivo da marca anterior. É apenas na avaliação geral de uma decisão que deverão ser levados em conta todos os fatores relevantes.
27. A semelhança dos produtos e serviços foi abordada na jurisprudência do Tribunal de Justiça no processo Canon (acórdão de 29/09/1998, Canon, C-39/97). O Tribunal de Justiça sustentou que para apreciar a semelhança entre os produtos importa levar em conta todos os fatores pertinentes que caracterizam a relação entre os produtos. Estes fatores incluem, em especial, a sua natureza, destino, utilização bem como o seu carácter concorrente ou complementar (n.º 23).
28. A enumeração dos fatores supracitados pelo Tribunal é apenas indicativa. A semelhança dos produtos e serviços não pode depender de qualquer número fixo e limitado de critérios que possam ser, em termos gerais, determinados previamente. Poderão existir outros fatores além ou em substituição dos referidos pelo Tribunal que sejam pertinentes para o caso específico, tais como identidade de canais de distribuição; público relevante ou a origem habitual dos produtos/serviços.
29. Deve ser considerado que determinado produto ou serviço é complementar de outro se existir uma relação estreita entre si, no sentido de que um é indispensável (essencial) ou importante (significativo) para a utilização do outro, de molde a que os consumidores possam entender que é a mesma empresa que é responsável pela sua produção. Por definição, os produtos destinados a diferentes públicos não podem ser complementares.
30. O tribunal a quo, neste ponto, conforme já supra aludido, constatou a “similitude de serviços e produtos, ambos da classe 43.”.
31. Precisando tal conclusão, dir-se-á que existe identidade entre os serviços hoteleiros visados por ambas as marcas, e evidente afinidade entre estes e os demais serviços da classe 43 assinalados pela marca controversa (serviços de alojamento hoteleiro; serviços de restaurante em hotéis).
32. A tal acresce, tal como já resultava da decisão do INPI, que também existe afinidade entre os serviços hoteleiros (classe 43), assinalados pela marca prioritária (e também pela marca controversa), e os serviços da classe 39 assinalados pela marca controversa, “prestação de informação sobre viagens turísticas através da internet disponibilização de informação a turistas sobre excursões e visitas turísticas”.
33. Tal conclusão é certeira, porquanto os serviços da classe 39 em causa, devem ser considerados complementares de serviços hoteleiros.
34. Desde logo visam, pelo menos em importante medida, o mesmo público (turistas e outros viajantes) e são prestados, como é de conhecimento geral, muitas vezes pelos próprios hotéis, como complemento dos serviços hoteleiros essenciais (disponibilização temporária de quartos).
35. Há, pois, que concluir pela afinidade de serviços das classes 43 e 39.
Do risco de confusão entre marcas
36. Nesta sede, a ora Recorrente, discordando das conclusões do tribunal a quo, sustenta a efetiva confundibilidade entre as marcas em confronto, salientando que “Não se pode admitir que, ao afirmar-se que deve prevalecer uma avaliação global dos sinais, que seja atribuído um maior peso aos elementos gráficos e visuais da marca da Recorrente, ignorando, assim, a relevância da semelhança fonética entre ambas as marcas.”.
37. Por seu turno, a Recorrida, concordando com a decisão recorrida, salienta que “Apesar da eventual semelhança da sonoridade entre “DALMA” e “D’ALMA” que possa existir (se não se fizer a pausa no discurso derivada do apóstrofo e se faça a leitura seguida como se ele não existisse); as diferenças acima referidas ao nível visual, gráfico e conceptual são indubitavelmente mais significativas e impactantes.”.
38. Como é sabido, existe risco de confusão entre marcas (incluindo um risco de associação) se existir a possibilidade de o público relevante - o consumidor atual ou potencial dos produtos em questão -, considerar que os produtos ou serviços em causa, presumindo que ostentam a marca em questão, provêm da mesma empresa ou de empresas economicamente ligadas, consoante o caso.
39. Quer as instâncias da Justiça Europeia (TJ e TG) quer o nosso Supremo Tribunal de Justiça têm pugnado que em última instância a conclusão sobre a existência ou não de risco de confusão se deverá basear na impressão global deixada na memória de um consumidor médio do tipo de produtos em causa.
40. O juízo de existência ou não de risco de confusão entre os sinais em confronto, depende de uma apreciação global de vários fatores interdependentes, incluindo:
(i) a intensidade da semelhança/afinidade entre os produtos e serviços,
(ii) a semelhança dos sinais em situação de conflito,
(iii) os elementos distintivos e dominantes dos sinais,
(iv) o carácter distintivo da marca anterior, e
(v) o público relevante.
41. No conhecido acórdão do TJUE, de 11/11/1997, C-251/95, caso «Sabèl», n.º 23, o Tribunal afirmou que “(...) apreciação global deve, no que respeita à semelhança visual, fonética ou conceptual das marcas em causa, basear-se na impressão de conjunto produzida pelas marcas, atendendo, designadamente, aos elementos distintivos e dominantes destas”.
42. Tendo em conta estas considerações, apesar das diferenças verbais e visuais existentes entre as marcas em confronto, julgamos que o tribunal a quo errou quando concluiu pela inexistência de risco de confusão entre as mesmas.
43. As marcas em confronto, recorde-se, são as seguintes:

MARCA INVOCADA COMO PRIORITÁRIA
(marca nacional n.º 680584)
MARCA CONTROVERSA
(marca nacional n.º 574753)





DALMA




      https://servicosonline.inpi.justica.gov.pt/portal_resources/proc_images/8023704_01_thumb.jpg

Tipo de Sinal: VERBAL
Registada para assinalar:

i. serviços hoteleiros, inseridos na classe 43
Tipo de Sinal: MISTO
Registada para assinalar:

a. “gestão de negócios de hotéis;
gerência administrativa de hotéis;
serviços publicitários relacionados
com hotéis; apresentação de
empresas e de seus bens e serviços
através da internet, inseridos na
classe 35;

b. prestação de informação sobre
viagens turísticas através da internet;
disponibilização de informação a
turistas sobre excursões e visitas
turísticas, inseridos na classe 39;

c. serviços hoteleiros; serviços de
alojamento hoteleiro; serviços de
restaurante em hotéis, inseridos na
classe 43.

44. No que toca ao sinal prioritário, constituído apenas e tão só pela expressão verbal DALMA, obviamente que é central o aspeto fonético. Atenta a não presença de quaisquer elementos descritivos ou genéricos, este sinal é de capacidade distintiva normal ou média.
45. No que toca à marca controversa (D'ALMA BOUTIQUE HOTEL), há desde logo que reconhecer que a expressão “boutique hotel”, é meramente descritivo dos serviços de hotelaria que visa assinalar (também assinalados pela marca prioritária) e, por isso, desprovida de capacidade distintiva.
46. Ainda quanto à marca controversa, há que reconhecer que os elementos figurativos que a integram – dois retângulos, um contido no outro, e o desenho de um “D” –, são banais e dotados, por isso, de fraca distintividade.
47. Há, pois, que concluir, quanto ao sinal controverso, que predomina o elemento fonético, DALMA, que, tal como a marca prioritária, é dotado de capacidade distintiva normal ou média.
48. Por seu turno, como vimos supra, os serviços relativos à classe 39 em causa, são complementares de serviços hoteleiros. Acresce a supra apontada identidade e afinidade entre os serviços da classe 43, assinalados pelas marcas em confronto. Existe, pois, elevado grau de semelhança entre os serviços assinalados por ambas as marcas.
49. Ora, como é bom de ver o vocábulo presente no sinal prioritário, D’ALMA, pronuncia-se exatamente da mesma forma que o vocábulo DALMA. Apresenta-se, pois isso, de pouca ou nenhuma relevância a diferença consistente no apóstrofe presente no sinal controverso.
50. Neste contexto, há que concluir por um elevado grau de semelhança entre os sinais em confronto.
51. Assim, visando os sinais o mesmo tipo de público (turistas e viajantes) e, em importante medida serviços afins em elevado grau, há que concluir pelo efetivo risco de confusão entre as marcas, devendo o recurso ser julgado procedente.
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VI. Decisão
Pelo exposto, acorda-se em julgar o presente recurso procedente e, consequentemente, revoga-se a decisão recorrida, anulando-se o registo da marca nacional n.º 680584, na parte em que visa assinalar serviços de classes 39 e 43 da Classificação Internacional de Nice, mantendo-se vigente apenas para assinalar os serviços de classe 35 dessa mesma Classificação.
Custas pela Recorrida (art.º 527.º n.º 1 e 2 do CPC).
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Lisboa, 27-01-2025
Alexandre Au-Yong Oliveira
Eleonora Viegas
Carlos M. G. de Melo Marinho