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ACIDENTE DE TRABALHO
REMIÇÃO OBRIGATÓRIA
Sumário
I - Os requisitos estabelecidos no n.º 1 do artigo 75.º da NLAT, relativamente a remição obrigatória de pensões aferem-se em função da pensão fixada ao sinistrado ou ao beneficiário, globalmente considerada, independentemente da divisão da responsabilidade pelo respetivo pagamento por várias entidades. II - O FAT apenas pode ser responsabilizado pelo reembolso ao CNP na medida dos montantes que forem suscetíveis de dedução e atenta ainda a quota-parte da sua responsabilidade.
Texto Integral
I – RELATÓRIO AA, viúva do sinistrado BB, com o patrocínio do Ministério Público, intentou ação especial emergente de acidente de trabalho contra EMP01... UNIPESSOAL, LDA., uma vez que na fase conciliatória foi homologada conciliação parcial obtida entre a beneficiária e a EMP02..., Companhia de Seguros ..., S.A. (Seguradora responsável), não tendo sido possível obter a conciliação com a entidade empregadora, por esta não concordar, que os valores pagos ao sinistrado, a título de gratificações, entre Setembro de 2020 e Agosto de 2021, integrassem o cálculo da retribuição anual, por isso veio pedir a condenação da Ré no pagamento:
- da pensão anual e vitalícia de 417,38€, a partir de 08.09.2021 (dia seguinte ao óbito), inclusive, correspondente a 30% da retribuição anual não transferida (1391,25€ euros x 30% = 417,38€), e respetivos juros de mora contados da referida data; - da pensão anual e vitalícia de 139,12€, a partir da idade de reforma por velhice da beneficiária ou da verificação de deficiência ou doença crónica que afecte sensivelmente a sua capacidade para o trabalho, correspondente a 10% (40%-30%) da retribuição anual não transferida (1391,25€ x 10% = 139,12€).
A Ré empregadora, regularmente citada não contestou.
Entretanto, foi obtida informação que a ré/entidade empregadora tinha sido declarada insolvente, por sentença transitada em julgado, após a citação e decurso do prazo de contestação, por isso, foi proferido despacho a determinar a intervenção do Fundo de Acidentes de Trabalho (FAT).
Regularmente citado, o FAT apresentou contestação, aceitando o acidente como de trabalho bem como a retribuição auferida pelo sinistrado, pugnando pela sua absolvição dos pedidos de condenação no pagamento do capital de remição após idade da reforma da beneficiária e no pagamento de juros de mora.
Foi proferido despacho saneador - sentença que apreciou do mérito dos autos, o qual terminou com o seguinte dispositivo
“Face ao exposto, julga-se procedente a presente acção para a efectivação de direitos emergentes de acidente de trabalho e, em consequência, decide-se: A. CONDENAR a ré/entidade empregadora, EMP01..., UNIPESSOAL, LD.ª, no pagamento à autora/beneficiária, AA: i. do capital de remição da pensão anual e vitalícia por morte no valor de 417,38€ (quatrocentos e dezassete euros e trinta e oito cêntimos), devida desde 08.09.2021 e até perfazer a idade da reforma por velhice, acrescida de juros de mora, à taxa legal, vencidos e vincendos, devidos desde aquela data e até integral pagamento; ii. do capital de remição da pensão anual e vitalícia por morte no valor de 139,13€ (cento e trinta e nove euros e treze cêntimos), se e após perfazer a idade da reforma por velhice ou verificação de deficiência crónica que afecte sensivelmente a sua capacidade para o trabalho, acrescida de juros de mora, à taxa legal, vencidos e vincendos, devidos desde essa data e até integral pagamento; B. CONDENAR o réu FUNDO DE ACIDENTES DE TRABALHO a pagar à autora/beneficiária, AA as quantias que lhe deveriam ser pagas pela ré/entidade empregadora, EMP01..., UNIPESSOAL, LD.ª, sem quaisquer juros de mora, sem prejuízo do seu reembolso ao Centro Nacional de Pensões no montante que se venha a apurar que este tenha pago à beneficiária.
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Custas a cargo da ré/entidade empregadora - artigo 527.º, n.º 1 e 2, do Código de Processo Civil, aplicável por força do disposto no artigo 1.º, n.º 2, alínea a), do Código de Processo do Trabalho.
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Ao abrigo do disposto no artigo 120.º, n.º 1 e 2, do Código de Processo do Trabalho, fixa-se à causa o valor de 5588,30€ (cinco mil quinhentos e oitenta e oito euros e trinta cêntimos), correspondente à soma do resultado da multiplicação da pensão pela respectiva taxa constante das tabelas práticas aplicáveis ao cálculo do capital de remição [5588,30€ (417,38€ x 13,389) - corresponde à taxa para a idade mais próxima da beneficiária, cônjuge do sinistrado, à data do falecimento deste – 61 anos – prevista na tabela anexa à portaria n.º 11/2000].
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Registe e notifique.
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Oportunamente, proceda ao cálculo do respectivo capital de remição da pensão ora arbitrada - artigo 148.º, n.º 3 e 4, do Código de Processo do Trabalho, aplicável por força do artigo 149.º, do mesmo diploma legal.”
Inconformado com tal decisão veio o FAT gerido pela Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de Pensão (ASF) interpor recurso de apelação, no qual formulou as seguintes conclusões que passamos a transcrever:
(…)
O Ministério Público apresentou as suas contra-alegações, concluindo pela procedência do recurso.
O recurso foi admitido como apelação a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito devolutivo.
Nada obstando ao conhecimento do recurso, foram colhidos os vistos legais.
Cumpre agora apreciar e decidir.
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II OBJECTO DO RECURSO
Delimitado o objeto do recurso pelas conclusões da Recorrente (artigos 635.º, nº 4, 637.º n.º 2 e 639.º, nºs 1 e 3, do Código de Processo Civil, aplicável por força do disposto no artigo 87.º n.º 1 do CPT), as questões que cumpre decidir são as seguintes:
- da admissibilidade da remição obrigatória da pensão a cargo do FAT
- do reembolso do FAT ao CNP do valor pago à beneficiária a título de pensão de sobrevivência.
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III - FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
FACTOS PROVADOS 1. O sinistrado BB era motorista e manobrador de máquinas. 2. No dia 07.09.2021, o sinistrado trabalhava, sob as ordens, direcção e fiscalização de EMP01..., Unipessoal, Ld.ª, desempenhando as funções de motorista e manobrador de máquinas. 3. Na data referida em 2, cerca das 15h30, na Quinta ..., em ..., o sinistrado estava a fazer um carregamento de uvas quando a carrinha de que era motorista começou a deslocar-se, tendo o sinistrado ido no seu encalço e, acto contínuo, tentou entrar no habitáculo para a imobilizar, (…) 4. (…) o que não conseguiu, foi colhido e atropelado pela viatura, ficando preso debaixo das respectivas rodas traseiras. 5. Em virtude do aludido em 3 e 4 o sinistrado sofreu as lesões descritas no relatório de autópsia, que determinaram, directa e necessariamente, a sua morte, ocorrida no dia 07.09.2021. 6. Aquando da data aludida em 2 o sinistrado auferia retribuição mensal de 800€ x 14 meses (11 200€), 4,77€ x 22 dias x 11 meses (1154,34€), a título de subsídio de alimentação e valores variáveis denominados gratificações de balanço, nos seguintes termos:
i. Setembro de 2020: 354,14€;
ii. Outubro de 2020: 77,90€;
iii. Novembro de 2020: 86,49€;
iv. Dezembro de 2020: 61,79€;
v. Janeiro de 2021: 82,21€;
vi. Fevereiro de 2021: 78,44€;
vii. Março de 2021: 94,56€;
viii. Abril de 2021: 102,21€;
ix. Maio de 2021: 86,49€;
x. Junho de 2021: 82,21€;
xi. Julho de 2021: 90,25€;
xii. Agosto de 2021: 194,56€. 7. (…) o que perfaz a retribuição anual ilíquida de 13 745,59€ [11 200€ + 1154,34€ + 1391,25€ (soma dos valores recebidos nos últimos doze meses)]. 8. Na data referida em 2 a entidade empregadora tinha transferido para a entidade seguradora a responsabilidade emergente de acidentes de trabalho do sinistrado, sob a apólice n.º ...25, com base na remuneração mensal de 800€ x 14 meses (11 200€) e 4,77€ x 22 dias x 11 meses (1154,34€), de subsídio de alimentação, perfazendo a retribuição anual ilíquida de 12 354,34€ [11 200€ + 1154,34€]. 9. Na data referida em 2 a entidade empregadora não tinha transferido o valor correspondente à totalidade da remuneração real mensal auferida pelo sinistrado relativa às gratificações de balanço, no valor anual de 1391,25€ (soma dos valores recebidos nos últimos doze meses). 10. O sinistrado e a beneficiária contraíram casamento, entre si, em ../../1996. 11. A beneficiária nasceu a ../../1960. 12. A beneficiária não recebeu qualquer quantia por parte da ré/entidade empregadora. 13. Por sentença transitada em julgado em 07.12.2023, proferida no processo n.º 2465/23...., que corre termos no Juízo de Comércio de Vila Real, a entidade empregadora foi declarada insolvente. 14. A beneficiária é titular de uma pensão mensal de sobrevivência, que é paga pelo Centro Nacional de Pensões, em virtude da morte do sinistrado, no valor líquido de 273,77€, tendo-lhe sido paga a quantia de:
i. 4361,15€, no ano de 2022;
ii. 3551,06€, no ano de 2023;
iii. 2460,33€, no ano de 2024 (até ../../2024).
Por se tratar de factualidade documentada nos autos e respeitar a factos essenciais para a apreciação do objeto do recurso ao abrigo do prescrito no art.º 662.º n.º 1 do CPC. procede-se à ampliação da matéria de facto nos seguintes termos. 15. Resulta do auto de conciliação parcial de 15.05.2023 que a EMP02... – Companhia de Seguros ..., S.A. acordou no pagamento à beneficiária do sinistrado do capital de remição correspondente à pensão anual e vitalícia no montante de €3.706,30, calculada com base na retribuição anual auferida pelo sinistrada e para si transferida no valor de €12.354,34. 16. Tal acordo foi homologado, por decisão proferida nos autos em 30.05.2023
IV – APRECIAÇÃO DO RECURSO
1. Da admissibilidade da remição obrigatória da pensão a cargo do FAT
Antes de mais cumpre-nos desde já deixar consignado que atenta a data em que ocorreu o acidente a que os autos se reportam – 07.09.2021 - os direitos decorrentes da ocorrência de tal acidente são os definidos pelo regime jurídico resultante da Lei n.º 98/2009 de 04/09, doravante NLAT.
Resulta dos autos, que em face da insuficiência económica do empregador foi chamado a intervir o FAT, razão pela qual também é aplicável o DL n.º 142/99 de 30/04.
Insurge-se o FAT quanto ao facto de ter sido condenado no pagamento do capital de remição correspondente à pensão que lhe foi fixada no montante de €417,38, defendendo que a mesma não pode ser objeto de remição obrigatória.
Desde já podemos dizer que assiste inteira razão ao FAT, pois a pensão anual e vitalícia em que foi condenado não reúne os requisitos para o efeito, como passamos a demonstrar:
No caso está em causa a atribuição de uma pensão cujo pagamento foi repartido pelas duas entidades responsáveis a Seguradora e o Empregador (respondendo o FAT em sua substituição), uma vez que o valor da retribuição auferida pelo falecido sinistrado, à data do acidente, não estava totalmente transferido para a Seguradora responsável.
Com efeito, o sinistrado sofreu um único acidente, no caso mortal, tendo por isso a sua beneficiária legal (a viúva), desde que verificados os respectivos requisitos legais, direito a uma única pensão a suportar pela entidade ou entidades responsáveis consoante o valor da retribuição real ou devida ao sinistrado estivesse ou não transferida totalmente para uma entidade legalmente autorizada a realizar seguro de acidentes de trabalho.
Resulta da factualidade provada que o valor da retribuição auferida pelo sinistrado à data do acidente estava apenas parcialmente transferido para a Seguradora responsável, razão pela qual, e em conformidade com o prescrito no n.º 4 do art.º 79.º da NLAT, incumbe ao empregador a responsabilidade pela reparação do acidente, no que respeita à diferença entre o valor auferido pelo sinistrado e o transferido para a Seguradora.
Melhor concretizando, diremos que na sentença recorrida reconheceu-se que a quantia auferida mensalmente pelo sinistrado a título de gratificação, com o valor global anual de €1.391,25, configura retribuição variável, integra a retribuição anual do sinistrado e não estava transferida para a Seguradora responsável, sendo o empregador o responsável pela reparação do acidente, atento o referido montante.
Importa salientar, aliás, como a este propósito, nos pronunciámos, no acórdão de 05.11.2020, proferido no processo n.º 34/09.0TTVRL.G1[1] que “(…) o valor da pensão é uno, ainda que no auto de tentativa de conciliação se tenha consignado apenas os valores parcelares da responsabilidade de cada uma das entidades e com base neles se ter procedido ao cálculo da pensão fazendo logo recair sobre cada uma das entidades responsáveis a sua quota-parte. Com efeito, o carácter unitário das pensões por acidente de trabalho devidas ao sinistrado ou aos seus beneficiários, ainda que a responsabilidade pelo seu pagamento seja imputável a duas entidades – seguradora e empregador -, não permite uma apreciação individualizada de cada quota parte da pensão devida por cada um dos responsáveis pelo seu pagamento. Ou seja, sendo a pensão uma só para saber se é remível obrigatoriamente ou facultativamente tem de se considerar como um todo único, independentemente de serem duas ou mais entidades responsáveis pelo seu pagamento. Em suma, a identidade da pensão como um todo único em nada interfere com a responsabilidade pelo seu pagamento (um ou mais responsáveis). Como é consabido a reparação do dano resultante de acidente de trabalho pode ser efectuado através do pagamento de uma pensão anual e vitalícia ou com o pagamento do capital de remição, podendo a remição ser obrigatória ou facultativa.”
O valor da pensão é, assim, de considerar de uno ainda que do auto de tentativa de conciliação se tenha consignado apenas os valores parcelares da responsabilidade da seguradora, fazendo desde logo recair sobre esta última a sua quota-parte.
Não querendo ser repetitiva, acresce apenas dizer que, na aferição dos pressupostos respeitantes à remição da pensão, esta tem de ser considerada na sua globalidade, independentemente de serem duas entidades responsáveis pelo seu pagamento, uma vez que o seu carácter unitário não nos permite fazer uma apreciação individualizada da cada quota-parte da pensão devida por cada um dos responsáveis para efeitos de se apurar se a pensão é ou não remível e em que condições, sob pena de se excederem os limites previstos na lei.
No caso sub judice, está assim, em causa o apuramento de uma única pensão cujo pagamento é da responsabilidade da Seguradora e do Empregador, que deve e tem de ser por eles repartido, na proporção da respetiva responsabilidade aferida em função do valor da retribuição auferida pelo sinistrado.
Não restando qualquer dúvida de que estamos perante uma única pensão importa apurar se o tribunal a quo podia ter determinado a remição total da quota-parte da pensão cuja responsabilidade pelo pagamento incumbia ao empregador.
Resulta da factualidade provada que a pensão devida à beneficiária ascende ao valor de €4.123,78, devida a partir de 08-09-2021, sendo €3.706,30 da responsabilidade da seguradora e €417,48 da responsabilidade da entidade empregadora.
Prescreve o art.º 75º, n.º 1, da NLAT, que é obrigatoriamente remida a pensão anual vitalícia devida a sinistrado com incapacidade permanente parcial inferior a 30% e a pensão anual vitalícia devida a beneficiário legal desde que, em qualquer dos casos, o valor da pensão anual não seja superior a seis vezes o valor da retribuição mínima mensal garantida, em vigor no dia seguinte à data da alta ou da morte.
O valor da pensão devida à beneficiária ascende ao montante de €4.123.78, sendo assim superior a seis vezes a retribuição mensal mínima garantida em vigor à data da morte do sinistrado, que à data do falecimento do sinistrado (../../2021) tinha o valor de €3.990,00 (665,00€ x 6).
Em face do exposto teremos de concluir que não se mostram reunidos os requisitos que determinam a remição obrigatória da pensão, sendo assim devida à beneficiária pelo FAT, em substituição do empregador, uma pensão anual, vitalícia e atualizada no valor de €417,48, devida desde 8.09.2021.
Resumindo, os requisitos estabelecidos no n.º 1 do artigo 75.º da NLAT, relativamente a remição obrigatória de pensões aferem-se em função da pensão fixada ao sinistrado ou ao beneficiário, globalmente considerada, independentemente da divisão da responsabilidade pelo respetivo pagamento por várias pessoas ou entidades.
Ora, não sendo admissível a remição obrigatória, a decisão a este propósito proferida pelo tribunal a quo terá de ser revogada, procedendo nesta parte a apelação.
2. Do reembolso do FAT ao CNP do valor pago à beneficiária a título de pensão de sobrevivência.
Insurge-se o FAT quanto à condenação no reembolso ao Centro Nacional de Pensões dos montantes que se venha a apurar que este tenha pago à beneficiária, uma vez que não cabe ao FAT proceder ao reembolso da totalidade das pensões liquidadas pelo CNP, pois este apenas deverá incidir sobre os montantes que forem suscetíveis de dedução, não se sabendo se o CNP pagou ou não montantes superiores aos devidos a título de pensões, sendo certo que o reembolso tem como limite estes últimos.
A este propósito consignou-se o seguinte na sentença recorrida: “No caso em apreço, apurou-se que a beneficiária é titular de pensão de sobrevivência, que vem sendo paga pelo Centro Nacional de Pensões, em virtude da morte do sinistrado, no valor de 273,37€. Nessa sequência, o FAT, alegando – apenas no requerimento datado de 17.05.2024 e não na sua contestação – que a pensão recebida pela beneficiária não é cumulável com a que resultar do presente acidente de trabalho, esse valor deverá ser deduzido ao valor que vier a ser fixado a título de capital de remição e, caso seja superior, não terá que liquidar nada à beneficiária. Concorda-se com a premissa que os beneficiários de pensões por acidente de trabalho mortal não as podem cumular com as pensões de sobrevivência a cargo do Centro Nacional de Pensões, sob pena de se criar, a seu favor, uma situação de duplicação de proveitos pelo mesmo facto, que a lei não consente. Mas isso significa isso que a entidade devedora das pensões pelo acidente de trabalho pode deduzir nelas as pensões de sobrevivência?
Na senda da posição assumida no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça datado de 15.11.2006 , desde já se adianta que não. O artigo 70.º, da Lei n.º 4/2007, que aprovou a Lei das Bases Geras do Sistema de Segurança Social, dispõe que: «No caso de concorrência pelo mesmo facto do direito a prestações pecuniárias dos regimes de segurança social com o de indemnização a suportar por terceiros, as instituições de segurança social ficam sub-rogadas nos direitos do lesado até ao limite do valor das prestações que lhes cabe conceder». Já o artigo 4.º, do Decreto-Lei n.º 59/89, de 22 de Fevereiro, dispõe que «os devedores da indemnização são solidariamente responsáveis, até ao limite do valor daquela, pelo reembolso dos montantes que tenham sido pagos pelas instituições». Do que se deixou dito resulta que as pensões de sobrevivência não se cumulam com as pensões de acidente de trabalho, salvo no montante em que aquelas excedam estas, por não dever ser a Segurança Social a ter que suportar, a final, os valores de tais pensões de sobrevivência, mas sim as entidades responsáveis pela reparação do acidente de trabalho (entidade empregadora e/ou seguradora ou FAT) ou do terceiro que tenha sido o responsável pela ocorrência do acidente. Nesses casos, como se refere no preâmbulo daquele diploma legal, a Segurança Social assegura provisoriamente a protecção do beneficiário, dentro das suas atribuições assistenciais, mas tais quantias devem ser-lhe reembolsadas. Isto significa também, lógica e obviamente, que as entidades responsáveis finais (sejam a empregadora, a respectiva seguradora ou o FAT, ou o terceiro a quem é imputável a verificação do acidente) podem reter o montante da pensão por acidente de trabalho que não exceda o montante da pensão de sobrevivência que está a ser paga ou foi paga, não fazendo entrega do mesmo ao beneficiário do acidente, mas entregando-o, para reembolso, ao Centro Nacional de Pensões. Não podem é limitar-se a não pagar esses montantes ao beneficiário por acidente de trabalho, sem fazerem entrega dos mesmos ao Centro Nacional de Pensões, entidade que a eles tem direito, a final. No caso, o FAT limita-se a alegar que a beneficiária recebeu pensões de sobrevivência do Centro Nacional de Pensões, não acumuláveis com as pensões de acidentes de trabalho, o que, a seu ver, lhe permite deduzir tal montante nestas pensões. Conforme acima referido, efectivamente, uma vez que a beneficiária já recebeu pensão de sobrevivência do Centro Nacional de Pensões não pode cumular a mesma com a pensão que aqui lhe é devida, pelo que, perfazendo o valor do capital de remição acima referido, o FAT não terá que proceder ao respectivo pagamento à beneficiária, sem prejuízo de o ter que entregar ao Centro Nacional de Pensões. Desconhecendo-se, neste momento, qual o valor global pago pelo Centro Nacional de Pensões à beneficiária a título de pensão de sobrevivência, será o FAT condenado a proceder a tal pagamento, sem prejuízo do reembolso do valor que se vir a apurar.”
Com esta motivação foi o FAT condenado no reembolso ao Centro Nacional de Pensões no montante que se venha a apurar que este tenha pago à beneficiária.
Salvo o devido respeito por opinião em contrário, não podemos concordar com tal condenação, uma vez que não incumbe ao FAT proceder ao reembolso da totalidade das pensões liquidadas pelo CNP, pois a responsabilidade pela reparação do acidente encontra-se repartida, a que acresce o facto de tal reembolso apenas incidir sobre os montantes que efetivamente forem suscetíveis de dedução, tendo ainda em consideração a medida da responsabilidade, tem de se atender à quota parte da pensão a cargo do FAT, que no caso não é de 100%, mas sim 10,12%.
Daqui resulta inequívoco que assiste razão ao Recorrente, uma vez que o FAT apenas pode ser responsabilizado pelo reembolso ao CNP na medida dos montantes que forem suscetíveis de dedução e atenta ainda a quota-parte da sua responsabilidade.
Procede o recurso, sendo também nesta parte de revogar a sentença recorrida dela se fazendo constar a condenação do FAT no reembolso ao CNP na medida dos montantes liquidados a título de pensão de sobrevivência suscetíveis de dedução e o montante da pensão cujo pagamento está a cargo do FAT.
V - DECISÃO
Nestes termos, acordam os juízes que integram a Secção Social deste Tribunal da Relação em julgar procedente a apelação, revogando parcialmente a decisão recorrida, e consequentemente decide-se:
Condenar o FUNDO DE ACIDENTES DE TRABALHO a pagar à autora/beneficiária, AA as quantias que lhe deveriam ser pagas pela ré/entidade empregadora, EMP01..., UNIPESSOAL, LD.ª e que se traduzem.
i. no pagamento da pensão anual, vitalícia e atualizável no valor de 417,38€, devida desde 08.09.2021, que deverá ser acrescida de 10% a partir do momento em que a beneficiária atingir a idade da reforma ou da verificação de deficiência crónica que afete sensivelmente a sua capacidade para o trabalho, e que deverá ser paga em mensalmente até ao dia 3 de cada mês, correspondendo cada prestação a 1/14 da pensão anual, sendo os subsídios de férias e de Natal, no valor de 1/14 cada da pensão anual pagos respetivamente nos meses de junho e novembro; tudo isto sem prejuízo, do reembolso ao Centro Nacional de Pensões na medida dos montantes apurados que tenham sido liquidados à beneficiária, atenta a quota parte da responsabilidade do FAT.
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Sem custas.
Notifique.
Guimarães, 23 de Janeiro de 2025
Vera Maria Sottomayor (relatora)
Maria Leonor Barroso
Francisco Sousa Pereira