I – A cláusula constante de uma doação por via da qual se consigna que a doação é feita com a condição de a donatária cuidar dos doadores não corresponde a uma condição resolutiva (que fique submetida ao regime previsto nos artigos 270.º e 276.º do CC), mas sim a uma cláusula modal que está submetida ao regime previsto nos artigos 963.º e seguintes do mesmo diploma.
II – Por essa razão, o incumprimento da referida cláusula ou encargo não determina, de forma automática, a resolução da doação e apenas faculta ao doador, nos termos previstos no art.º 966.º do CC, o direito a tal resolução se tal tiver sido previsto no contrato.
(Sumário elaborado pela Relatora)
Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra:
I.
AA, melhor identificada nos autos, veio instaurar acção com processo comum contra BB e CC, melhor identificados nos autos, alegando, resumo, ter doado um imóvel à Ré (sua filha) – mediante escritura celebrada em 10/07/2019 – com a condição de esta cuidar de si (da Autora) e do seu companheiro DD (já falecido) até à morte do último, condição que esta não cumpriu, sendo certo que, logo após a escritura, regressou para a Alemanha sem mais querer saber da sua mãe e do seu companheiro e sem que tivesse feito nada quando o companheiro da Autora sofreu uma queda que o obrigou a ficar acamado e dependente de terceiras pessoas durante mais de cinco meses (a Ré não o visitou, não telefonou e não diligenciou por arranjar alguém que dele e de sua mãe pudesse cuidar), vendo-se a Autora obrigada a diligenciar pelo seu internamento em unidade de cuidados continuados por não conseguir tratar dele e persistindo a Ré na sua conduta omissiva em relação à Autora após o óbito do seu companheiro, não lhe prestando qualquer auxilio.
Com esses fundamentos, conclui pedindo:
a) Que os Réus sejam condenados a reconhecer que a doação feita pela Autora, à Ré mulher, do prédio urbano identificado nesta PI, foi com a condição de a donatária, ora Ré cuidar da Autora e do seu falecido companheiro, DD, enquanto fossem vivos;
b) Que os Réus sejam condenados a aceitar e reconhecer que não cumpriu com a condição da doação, nunca tendo tomado conta, quer do falecido DD, quer da Autora, e desde a data da escritura de doação que aceitou em 10/07/2019;
c) Que os Réus sejam condenados a aceitar que devido ao incumprimento da condição modal da doação, a Autora teve de solicitar ajuda a terceiros;
d) Que seja declarada resolvida a doação, por incumprimento da condição modal contratual por parte da Ré donatária e serem os Réus condenados a reconhecê-lo;
e) Que, atenta a resolução da doação, se anule o registo de aquisição do prédio urbano supra identificado, por doação, através da Ap. ...52 de 2019/10/14;
E nessa medida,
f) Que se reconheça a Autora como única e exclusiva proprietária e possuidora do prédio urbano identificado e, nisso igualmente se condenando os Réus a respeitar.
O Réu CC contestou, invocando a sua ilegitimidade em virtude de estar divorciada da Ré e o bem em questão ser bem próprio desta.
A Ré BB também apresentou contestação, onde, além de invocar a nulidade da citação (em virtude de a carta para citação ter sido remetida para morada que já não é sua) e a ilegitimidade do Réu CC, sustenta ser legalmente inadmissível a resolução da doação na medida em que não resulta da escritura de doação que tenha sido conferido à doadora o direito de resolução fundada no incumprimento dos encargos, como impõe o art.º 966.º do CC, impugnando, de todo o modo, os factos alegados, sendo certo que nunca faltou ao cumprimento das obrigações assumidas perante a sua mãe e respectivo companheiro, sendo certo que, apesar de residir e trabalhar no estrangeiro (como era de conhecimento da Autora), cuidou dela quando foi operada à coluna (em 2019), fez obras no prédio no sentido de proporcionar maior conforto e qualidade de vida à sua mãe e companheiro que aí continuaram a residir, telefonava diariamente, vinha a Portugal com frequência e sempre que lhe era possível e cuidou do companheiro da mãe durante cerca de seis semanas aquando da queda que o mesmo sofreu.
A título subsidiário – e para o caso de a acção ser julgada procedente – pede, em reconvenção, que a Autora seja condenada a pagar-lhe:
1) todas as despesas realizadas com a outorga da escritura de doação, e registos, no valor global de 700€;
2) o montante de todos os valores despendidos desde a outorga da escritura de doação até à presente data, relacionadas com o Imposto Municipal sobre Imoveis, e seguros, no valor total de 2.057,10€;
3) o valor indemnizatório a título de benfeitorias realizadas no imóvel, no montante global de 49.740,70€, ou caso, assim não se entenda ser condenada em igual montante a título de enriquecimento sem causa.
4) o valor indemnizatório a título da valorização comercial do prédio no montante de 15.000€;
5) danos morais no montante de 2.000€, tudo acrescido de juros desde a data da notificação.
Pede ainda que a Autora seja condenada, por litigância de má fé, em multa e indemnização não inferior a 1.500,00€.
Em resposta, a Autora invoca a ineptidão do pedido reconvencional, reafirmando os factos alegados na petição inicial e alegando ter sido ela quem pagou quase todas as obras que foram realizadas no prédio.
Conclui pela improcedência do pedido reconvencional e do pedido referente à sua condenação por litigância de má fé.
Findos os articulados e depois de ter sido dada às partes a oportunidade de se pronunciarem, foi proferido despacho saneador onde, por se entender que o processo já fornecia os elementos necessários, se decidiu conhecer do mérito da causa, julgando-se a acção improcedente com a consequente absolvição dos Réus dos pedidos e julgando-se prejudicado o conhecimento do mérito da reconvenção.
Em desacordo com essa decisão, a Autora veio interpor recurso, formulando as seguintes conclusões:
(…).
Não foi apresentada resposta ao recurso.
II.
Questão a apreciar:
Atendendo às conclusões das alegações da Apelante – pelas quais se define o objecto e delimita o âmbito do recurso – a questão a apreciar e decidir consiste em saber se o eventual incumprimento do encargo estabelecido na doação feita pela Autora à Ré (que a sentença recorrida classificou como cláusula modal) pode (ou não) determinar a resolução da doação, seja por se entender que tal resolução resulta automaticamente do incumprimento do encargo, seja por se entender, em função das declarações das outorgantes, que o direito a tal resolução foi previsto no contrato.
III.
Na 1.ª instância, consideraram-se já assentes os seguintes factos:
a) A Autora é mãe da Ré mulher.
b) No dia 10 de Julho de 2019, no cartório notarial ..., sito na Urbanização ..., em ..., foi celebrada escritura de renúncia de usufruto e doação.
c) Na referida escritura, onde foram intervenientes DD, companheiro da Autora, como primeiro outorgante, a Autora, como segunda outorgante e a Ré mulher como terceira outorgante, ficou consignado o seguinte:
“E PELO PRIMEIRO OUTORGANTE, FOI DITO: Que é dono e legítimo possuidor do usufruto do seguinte prédio, sito na União de freguesias ... e ..., concelho ...: ... – EE, número 10 – composto de casa de habitação de rés-do-chão e andar com logradouro e anexo, descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o número ...92, da freguesia ..., aí registado o usufruto a seu favor pela inscrição Ap. mil trezentos e quinze, de onze de agosto de dois mil e onze, inscrito na respetiva matriz sob o artigo ...57 (que proveio do artigo urbano ...44 da extinta freguesia ...) (…) Que, pela presente escritura, renuncia ao referido usufruto.(…)
E PELA SEGUNDA OUTORGANTE, FOI DITO:
Que dada a renúncia de usufruto, é dona e legítima possuidora da totalidade do prédio urbano antes identificado, conforme inscrição Ap. mil trezentos e catorze, de onze de agosto de dois mil e onze, com o valor patrimonial IMI de € 72.822,63.
Que pela presente escritura e no valor de SETENTA E DOIS MIL, OITOCENTOS E VINTE E DOIS EUROS E SESSENTA E TRÊS CÊNTIMOS, DOA à terceira outorgante, sua filha, por conta da quota disponível, o prédio urbano atrás mencionado, bem como todos os bens móveis, que compõem o recheio do dito imóvel.
Que esta doação é feita com a condição de a donatária cuidar dos primeiro e segunda outorgantes enquanto forem vivos.
PELA TERCEIRA OUTORGANTE, FOI DITO:
Que, aceita a presente doação nos termos exarados. ASSIM O OUTORGARAM (…).
d) O prédio aludido em c) encontra-se registado em nome da Ré BB pela Ap. ...52 de 2019/10/14.
e) À data da doação, a ora Ré era casada com o R., CC, sob o regime da comunhão de adquiridos.
f) DD faleceu a ../../2022.
g) Os RR divorciaram-se na Alemanha, no Tribunal de Família da Comarca ..., por sentença judicial transitada em julgado, no dia 25.04.2023
IV.
Está em causa nos presentes autos uma doação feita pela Autora à Ré que a sentença recorrida classificou como doação com encargo (cláusula modal) – prevista no art.º 963.º do CC[1] – na medida em que havia sido feita com a condição de a donatária cuidar da Autora e respectivo companheiro enquanto fossem vivos.
Peticionando a Autora a resolução dessa doação com fundamento no incumprimento do encargo/condição, considerou, no entanto, a decisão recorrida – citando diversa jurisprudência nesse sentido – que, conforme previsto no art.º 966.º, o direito a tal resolução pressupunha que ele estivesse previsto no contrato, o que não acontecia no caso em análise, uma vez que tal não constava da escritura pública por via da qual foi realizada a doação. Mais considerou que também não seria aplicável o regime previsto nos artigos 970.º e 974.º (revogação por ingratidão do donatário) na medida em que os factos alegados na petição inicial não integram o conceito legal de “ingratidão”. Com esses fundamentos, julgou a acção improcedente.
Discordando da decisão, sustenta a Apelante, em resumo: que as declarações constantes da escritura foram erradamente analisadas pela decisão recorrida, porquanto o que delas resulta é a vontade expressa e declarada do estabelecimento da condição modal e da resolução da doação em caso de incumprimento da condição; que a resolução do contrato por força do incumprimento da condição da liberalidade é uma consequência legal desse incumprimento; que aquela condição foi essencial para a realização da doação; que, ao aceitar a doação, a donatária aceitou também a condição e a consequência resultante do respectivo incumprimento, ou seja, a respectiva resolução por parte da donatária - ou seja, o contrato ficaria automaticamente resolvido se não fosse cumprida a condição – tendo sido essa a vontade real e declarada das partes e que tudo isso foi explicado às partes aquando da leitura da escritura, como consta da própria letra da escritura/contrato, tendo a Ré ficado ciente que o incumprimento constituía fundamento para a resolução da doação.
Apreciemos.
Não vem questionada no recurso – pelo menos de modo expresso – a classificação do negócio que foi feita pela decisão recorrida, segundo a qual está em causa uma doação com encargo (cláusula modal), prevista e regulada nos artigos 963.º e seguintes do CC. Foi, aliás, nesses termos que a Autora classificou o negócio na petição e foi esse o regime legal que aí invocou.
Está em causa, portanto, uma doação onde se impôs à donatária um encargo (cláusula modal) que se traduzia na obrigação ou dever jurídico de cuidar da doadora e do seu companheiro enquanto fossem vivos e o que está agora em causa é a resolução da doação que é pretendida pela doadora (a Autora/Apelante) com fundamento no alegado incumprimento do encargo por parte da donatária.
Sobre essa matéria, dispõe o art.º 966.º que “O doador, ou os seus herdeiros, também podem pedir a resolução da doação, fundada no não cumprimento de encargos, quando esse direito lhes seja conferido pelo contrato”.
Ora, o que resulta – claramente – da citada disposição legal é que, ao contrário do que sustenta a Apelante, a resolução do contrato não é uma consequência legal (e automática) do incumprimento do encargo ou cláusula modal; o direito a tal resolução apenas existe se e na medida em que tiver sido previsto no contrato como consequência do incumprimento. Conforme referem Pires de Lima e Antunes Varela[2], tal resolução não opera os seus efeitos ipso iure ou ope legis; o direito a tal resolução apenas é legalmente reconhecido quando seja atribuído no contrato e tal resolução tem que ser requerida – apenas operando por via judicial – o que se explica “...pelo carácter especial do modo, que não afecta a essência da liberalidade, podendo o doador querer manter esta, mesmo que o modo não tenha sido cumprido”[3].
Ao argumentar nos termos em que argumenta – pretendendo, ao que parece, extrair do incumprimento do encargo a automática resolução do contrato –, a Apelante parece estar a confundir a cláusula modal com a condição resolutiva, sendo certo que é esta – e não aquela – que opera a destruição automática e retroactiva dos efeitos do negócio (cfr. art.º 276.º). Sucede, no entanto, que são realidades jurídicas distintas cujas diferenças são normalmente estabelecidas pela seguinte fórmula: “o modo obriga mas não resolve (só autoriza a revogação); a condição resolutiva resolve mas não obriga”[4] ou “a condição resolutiva resolve automaticamente, mas não obriga e o modo obriga, mas dá apenas o direito de pedir a resolução”[5].
No caso, estamos claramente perante uma cláusula modal (que institui uma obrigação a cargo do donatário) e não perante uma cláusula resolutiva. É isso que resulta do disposto no citado art.º 963.º e é isso que resulta da aplicação do critério ou fórmula acima referida[6], sendo, aliás, nesses termos que a própria Autora/Apelante classifica a referida cláusula, não obstante dela pretenda extrair consequências que não correspondem às que lhe estão legalmente associadas.
Estando em causa, como vimos, uma cláusula modal, é certo – conforme referimos – que o respectivo incumprimento não acarreta, de modo automático, a resolução do contrato; tal incumprimento apenas confere ao doador (ou aos seus herdeiros) o direito de pedir a resolução da doação e este direito apenas existe se tiver sido previsto e conferido no contrato (cfr. citado art.º 966.º).
Ora, no caso em análise, o contrato não prevê esse direito, sendo totalmente omisso em relação às consequências do eventual incumprimento do encargo nele previsto. E não adianta dizer – como diz a Apelante – que aquele encargo foi essencial para a realização da doação, uma vez que, conforme refere Carlos Alberto da Mota Pinto[7] para que possa ser pedida a resolução do contrato, não basta provar “...que a cláusula modal foi causa impulsiva da doação, isto é, que o doador a não teria feito se soubesse que o inadimplemento teria lugar; é necessário que o direito de resolução lhe tenha sido conferido pelo contrato, e, portanto, corresponda a uma vontade real susceptível de desentranhar a sua eficácia em sede interpretativa”[8].
Por outro lado, não obstante o esforço argumentativo que a Apelante parece desenvolver nesse sentido, não vislumbramos como se possa retirar do contrato uma qualquer vontade das partes (nem expressa, nem tão pouco tácita) no sentido de ali se ter estipulado o direito à resolução do contrato em consequência do incumprimento da cláusula modal nele estabelecida, importando notar que, conforme previsto no art.º 238º., nos negócios formais, a declaração não pode valer com um sentido que não tenha um mínimo de correspondência no texto do respectivo documento, ainda que imperfeitamente expresso.
O contrato em questão contém apenas: a declaração da doadora no sentido de doar à Ré (sua filha), por conta da quota disponível, o prédio ali identificado e os bens móveis que compõem o seu recheio; a declaração da doadora de que a doação “...é feita com a condição de a donatária cuidar dos primeiro e segunda outorgantes enquanto forem vivos” e a declaração da donatária de que “...aceita a presente doação nos termos exarados”. Não é feita qualquer alusão às consequências do incumprimento do encargo e não é feita qualquer outra declaração da qual pudesse ser extraída uma qualquer vontade das partes no sentido de pretenderem estabelecer o direito à resolução do contrato em caso de incumprimento do encargo.
Ao contrário do que parece sugerir a Apelante, não é possível retirar uma qualquer previsão contratual no sentido da resolução do contrato em caso de incumprimento do encargo da mera circunstância de a donatária ter aceitado a doação e, consequentemente, também o encargo. É claro que, ao aceitar a doação nos termos em que ela foi feita, a donatária aceitou também o encargo e ficou vinculada ao respectivo cumprimento, mas isso não permite afirmar que tenha ficado previsto o direito à resolução da doação em caso de incumprimento. Estando em causa uma efectiva obrigação ali assumida pela donatária, a doadora pode exigir o cumprimento do encargo (nos termos previstos no art.º 965.º) e poderá até ter direito de exigir, nos termos gerais, uma indemnização pelos danos sofridos em consequência do incumprimento, mas, para que lhe assistisse também o direito de resolução da doação, era necessário que essa possibilidade tivesse sido prevista e, na verdade, NÃO FOI. Não se diga, portanto – como diz a Apelante – que a Ré estava ciente de que o incumprimento constituía fundamento para a resolução da doação porque tudo isso foi explicado às partes aquando da leitura da escritura, como consta da própria letra da escritura/contrato; o texto da escritura não faz qualquer alusão à resolução da doação ou às consequências do incumprimento do encargo e, portanto, é evidente que a sua leitura não permitiria retirar a conclusão a que alude a Apelante.
Na verdade, aquilo que resulta desta alegação é – mais uma vez – a circunstância de a Apelante pretender retirar do incumprimento do encargo a automática resolução da doação porque, na sua perspectiva – e conforme se depreende das suas alegações – a inclusão da cláusula modal apenas podia ter o significado de que o seu incumprimento implicava a resolução da doação (por isso, questiona a dado ponto das suas alegações: “...se assim não fosse, qual seria a razão de ter sido colocada a condição modal em tal contrato?”). Ou seja, a Apelante argumenta como se estivesse em causa uma condição resolutiva. Já vimos, no entanto, que essa perspectiva da Apelante não está correcta. O que está em causa não é uma condição resolutiva (submetida ao regime previsto no art.º 276.º), mas sim uma cláusula modal que está submetida ao regime previsto nos artigos 963º e seguintes do CC, cujo incumprimento não determina a automática resolução do contrato e apenas confere o direito a tal resolução se tal tiver sido previsto no contrato. A cláusula modal existe, naturalmente (e é essa a sua função), para o efeito de vincular o donatário ao respectivo cumprimento, mas o facto de o donatário ficar obrigado – como fica – ao cumprimento da obrigação ali fixada não significa, só por si, que o seu incumprimento dê ao doador a possibilidade de resolver o contrato. Precisamente porque o donatário ficou obrigado ao cumprimento do encargo, o doador terá sempre o direito de exigir o respectivo cumprimento e poderá ter ainda o direito de lhe exigir indemnização pelos danos que o incumprimento lhe tenha causado; só terá, no entanto, o direito de resolver a doação com fundamento nesse incumprimento se essa faculdade/possibilidade estiver prevista no contrato, uma vez que a lei, de modo expresso, assim o determinou.
Acrescente-se apenas – e por último – que o Acórdão do STJ que é citado pela Apelante – o Acórdão de 01/07/2010, proferido no processo n.º 15/09.3T2AND.C1.S1[9] – não dá qualquer cobertura ou apoio à sua pretensão porque na situação aí tratada (conforme resulta da matéria de facto que ali se considerou provada) o contrato previa expressamente a resolução do contrato em caso de incumprimento do encargo e é isso que não acontece no caso dos autos.
Nessas circunstâncias, não podendo ser reconhecido à Autora/Apelante o direito à resolução da doação – em virtude de esse direito não ter sido previsto no contrato – é inútil a produção de prova sobre o alegado incumprimento do encargo, já que, ainda que este incumprimento viesse a ser demonstrado, a pretensão formulada pela Autora (a resolução da doação) não podia proceder.
Em face do exposto, resta concluir pela improcedência do recurso e pela confirmação da sentença recorrida.
SUMÁRIO (elaborado em obediência ao disposto no art. 663º, nº 7 do Código de Processo Civil, na sua actual redacção):
(…).
V.
Pelo exposto, nega-se provimento ao presente recurso e, em consequência, confirma-se a sentença recorrida.
Custas a cargo da Apelante.
Notifique.
Coimbra,
(Maria Catarina Gonçalves)
(Helena Melo)
(Chandra Gracias)
[1] Diploma a que se reportam as demais disposições legais que venham a ser citadas sem menção de origem.
[2] Código Civil Anotado, Vol. II, 3.ª edição revista e actualizada, pág. 293.
[3] Cfr. Acórdão do STJ de 03/10/2019 , proferido no processo n.º 1574/13.1TBFIG.C2.S1; Acórdãos da Relação do Porto de 08/07/2010, processo n.º 4590/06.6TBMAI.P1 e de 23/02/2006, processo n.º 0536416; Acórdão da Relação de Coimbra de 02/04/2019, processo n.º 1574/13.1TBFIG.C2 e Acórdãos da Relação de Guimarães de 17/01/2019, processo n.º 2838/17.0T8BCL.G1; de 04/04/2017, processo n.º 386/15.2T8VCT.G1; de 09/12/2012, processo n.º 358/10.3TBPTL-F.G1 e de 12/07/2011, processo nº 122/10.0TBEPS.G1, todos disponíveis em http://www.dgsi.pt.
[4] Cfr. Manuel de Andrade, Teoria Geral da Relação Jurídica, Vol. II, Coimbra, 1987, pág. 394
[5] Cfr. Carlos Alberto da Mota Pinto, Teoria Geral do Direito Civil, 3.ª edição actualizada, 1986, pág. 581
[6] Cfr. neste sentido, o Acórdão do STJ de 03/10/2019, proferido no processo n.º 1574/13.1TBFIG.C2.S1, disponível em http://www.dgsi.pt.
[7] Ob. cit., pág. 583.
[8] Neste sentido, veja-se também o Acórdão da Relação do Porto de 14/03/2016, proferido no processo n.º 463/13.4TBFLG.P1 e o Acórdão da Relação de Guimarães de 04/04/2017, processo n.º 386/15.2T8VCT.G1, disponíveis em http://www.dgsi.pt.
[9] Disponível em http://www.dgsi.pt.