PROVA PERICIAL
DOCUMENTO ORIGINAL
Sumário

I – Existindo nos autos original de documento que está em discussão na causa, deve ser este o objecto da perícia à letra e não original de outro documento que apenas serve de comparação com aquele.
II – Constituindo a realização da perícia ao documento original de declaração de dívida elemento essencial à boa decisão da causa, sendo ainda possível o relatório pericial aferir e apurar ser possível o grau de probabilidade superior ao já provado, deve ser realizado novo exame pericial.

Texto Integral

PROC. N.º 6531/22.4T8MAI-A.P1
Tribunal Judicial da Comarca do Porto
Juízo de Execução da Maia - Juiz 2.

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Relator: Juiz Desembargador Álvaro Monteiro
1º Adjunto: Juiz Desembargador João Maria Espinho Venade
2º Adjunto: Juiz Desembargador Carlos Cunha Carvalho
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Sumário:
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I - Relatório:

Veio o executado AA deduzir embargos à execução instaurada pelo exequente BB alegando, em síntese:
- o documento particular dado à execução é falso, seja quanto ao seu teor, seja quanto à assinatura nele aposta e imputada ao embargante;
- igualmente falsos são os factos alegados pelo exequente no requerimento executivo como sendo a causa de pedir;
- a obrigação exequenda não é exigível uma vez que não foi fixado prazo para a mesma
Concluiu requerendo que os presentes embargos de executado sejam aceites e sejam os mesmos considerados integralmente procedentes e, em conformidade, seja extinta a execução.
Os presentes embargos foram recebidos.
Regularmente notificado veio o embargado BB contestar impugnando a factualidade alegada pelo embargante que reputou de falsa e reiterou que o mesmo assinou pelo seu punho o documento dado à execução.
Pugnou a final pela improcedência dos embargos com todas as consequências legais.

Foi proferido despacho que dispensou a realização de audiência prévia.
Procedeu-se à prolação do despacho saneador e foram fixados o objecto do litígio e os temas de prova.

Realizada audiência de julgamento, foi proferida a seguinte decisão:
“Nos termos e pelos fundamentos expostos julgam-se os presentes embargos de executado procedentes por provados e, em conformidade, declara-se extinta a execução instaurada pelo exequente contra o executado a que estes autos correm por apenso, com todas as consequências legais.
Custas pelo embargado.”
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É desta decisão que vem interposto o presente recurso pelo Exequente/Embargado/Apelante, apresentando as seguintes
CONCLUSÕES:
1- São os seguintes os motivos forçam o ora recorrente a apelar à Justiça de Vossas Excelências, a saber, a nulidade insuprível derivada do não acatamento pelo Tribunal a quo da decisão proferida em recurso pelo Tribunal da Relação do Porto em 12 de Dezembro de 2023, em clara violação do disposto no artigo 152º, nº 1 do CPC, a deficiente, incompleta e, salvo o devido respeito que é muito, errada fundamentação da Sentença em crise, o que constitui erro de julgamento, de facto e de direito, em clara violação do disposto no artigo 154º, que origina, em conjugação com o disposto no artigo 152º, nº 1, ambos do CPC, a violação do dever de administrar justiça, a apreciação do julgamento (matéria de facto - prova gravada e documentos juntos aos autos), acerca dos factos provados n.ºs 3, 4 a 6 e 10 a 14 da sentença e matéria de facto não provada constantes dos parágrafos 1, 2, 3, 5 e 6 da Sentença em crise
2- O recorrente dá aqui por reproduzida, por razões de economia e celeridade processuais, a matéria de facto julgada provada e não provada com relevância para a decisão das sobreditas questões
3- Quando o Tribunal a quo decidiu ordenar a perícia à letra e assinatura constante de um contrato de arrendamento, junto aos autos como meio de prova meramente comparativo quanto à assinatura do embargante, por ser contemporâneo do título executivo, o Recorrente interpôs recurso dessa decisão, tendo o Tribunal da Relação do Porto decidido: “PROVIDO O RECURSO. REVOGADO O DESPACHO RECORRIDO DETERMINANDO-SE A CORREÇÃO DO DESPACHO PROFERIDO A 18.09.2023 DEVENDO LER-SE “DECLARAÇÃO DE DIVIDA” ONDE SE ESCREVEU ARRENDAMENTO.” E acrescenta que a peritagem deverá ser realizada ao documento original, sob pena de “quiçá a de (in)existência de título executivo ou eventualmente a própria frustração do exame.
4- Não obstante o recurso interposto para o Tribunal da Relação do Porto, o Tribunal a quo entendeu que o mesmo não tinha efeito suspensivo e como tal ordenou e envio para perícia o contrato de arrendamento
5- Porque e apesar das reclamações apresentadas pelo recorrente, de decisão proferida pelo Tribunal da Relação do Porto e da não notificação para junção aos autos do original do título executivo, no dia seguinte à notificação da Decisão do Tribunal da Relação do Porto – 13 de Dezembro de 2023 - a Mandatária do recorrente fez chegar aos autos o original do título executivo para que o mesmo pudesse ser objeto da perícia superiormente determinada (Requerimento referencia CITIUS 37554547), facto de que alertou o tribunal a quo nos requerimentos, referencia CITIUS 37991703 e referencia CITIUS 38224682, este último na sequência do Despacho do Tribunal a quo de 21-02-2024 com o seguinte teor: “Na sequência do decidido pelo Tribunal da Relação, a perícia admitida no despacho saneador proferido nos autos, nos termos do disposto no artigo 578º, nº1 do CPC, tem como objecto determinar se a assinatura “AA” aposta na declaração de dívida datada de 9.10.2023 e junta como título executivo com o requerimento executivo foi manuscrita pelo punho do embargante.
Notifique e comunique à entidade nomeada para a realização da perícia a alteração do objecto da perícia remetendo cópia da declaração de dívida, indicando que não existe original a mesma.”
6- Apenas em 07-03-2024 é o recorrente notificado do despacho que ordena a remessa do original do título executivo para peritagem e em 22 de Março de 2024 é o recorrente notificado do resultado da peritagem que concluiu ser “Muitíssimo provável > 85% a 95%” ter sido a assinatura aposta no título executivo pelo próprio punho do Recorrido.
Referindo ainda que “A assinatura aposta no documento questionado apresenta características altamente específicas e individualizadoras que são muito idênticas às constantes dos documentos fidedignos, sendo o grau de similitude bastante alto e não sendo atribuída uma probabilidade ainda maior devida ao facto de o documento questionado ser uma cópia.” (sublinhado nosso)
7- Ora não obstante ter sido superiormente determinada a perícia ao original do título executivo por Acórdão de 12-12-2023, ter sido junto aos autos o original do título executivo em 13-12-2023, ter, pelo menos duas vezes em requerimentos diferentes, o recorrente referido estar o original junto aos autos, certo é que o seu envio ao Centro Médico Legal A... foi feito tardiamente não tendo chegado às mãos do perito em tempo útil e tendo o Tribunal a quo violado direta e claramente a decisão do Tribunal da Relação do Porto, podendo dizer-se que se recusando a remeter para peritagem o original em tempo útil, impediu que a mesma fosse feita.
8- O Tribunal a quo não acatou a decisão do Tribunal da Relação do Porto, não remetendo para peritagem o original do título executivo, junto aos autos desde 13-12-2023, e como tal constitui nulidade insuprível que desde já se requer seja decretada, com as legais consequências (neste sentido Ac. TRE no Acórdão nº 855/11.3TBLLE-E1, de 31-05-2012, in www.dgsi.pt)
9- Na prova pericial atribui-se a técnicos especializados a verificação/inspeção de factos não ao alcance direto e imediato do julgador, já que dependem de regras de experiência e de conhecimentos técnico-científicos que não fazem parte da cultura geral ou experiência comum que pode e deve presumir-se ser aquele possuidor. (Ac. TRG no processo nº 548/11.1TBCBT-D.G1, de 13-03-2014 in www.dgsi.pt)
10- A prova pericial tem por fim, segundo o artigo 388° do Código Civil, a perceção ou apreciação de factos por meio de peritos, quando sejam necessários conhecimentos especiais que os julgadores não possuem, ou quando os factos, relativos a pessoas, não devam ser objeto de inspeção judicial.
11- Os Peritos do Centro Médico Legal A..., laboratório escolhido pelo tribunal a quo para fazer a peritagem, oferecem credibilidade e, no seu relatório, expõem o método que seguiram, os ensaios realizados e o material que utilizaram, esclarecendo, ainda que a conclusão obtida (que, no caso, é a mais próxima da certeza científica, indicando o mais alto grau de semelhança) foi unânime entre os dois peritos que participaram no exame.
12- O juízo técnico e científico inerente à prova pericial presume-se subtraído à livre apreciação do julgador; o julgador está amarrado ao juízo pericial, sendo que sempre que dele divergir deve fundamentar esse afastamento, exigindo-se um acrescido dever de fundamentação.
13- Do relatório pericial junto aos autos conclui-se que é muitíssimo provável que a assinatura aposta no título executivo – declaração de dívida – é do recorrido, sendo que se o original do título executivo tivesse, como deveria, chegado às mãos dos peritos a conclusão, como decorre do relatório pericial, seria de que se daria por praticamente provado (> 95%) ter a assinatura aposto no título executivo o ter sido pelo recorrido.
14- Atentas as conclusões do relatório pericial o Tribunal a quo teria que fundamentar devida e claramente o porque do não atender às mesmas, o que não fez, degradando o relatório pericial para mera informação, “afastando a sua valia, simplesmente através do mero confronto com … as provas pessoais (e não testemunhais, mas de parte), que são precisamente as mais falíveis de todos os meios de prova.” (neste sentido Ac. STJ no Ac. 34/11.0TAAGH.L1.S1 de 24 de Fevereiro de 2021, in www.dgcs.pt)
15- Em nenhuma altura o tribunal colocou em questão as conclusões do relatório pericial, olvidando-se que o mesmo goza, como referiu o STJ, de uma presunção solidamente fundada, de certeza científica, afastando as suas conclusões com base, pasme-se, nas declarações de parte do embargante, aqui recorrido.
16- Desta forma ao relegar para mera informação o relatório pericial junto aos autos, não apresentando qualquer fundamentação bastante para o efeito a Sentença em crise apresenta erro notório na apreciação da prova, o que desde já se requer seja declarado.
17- Sendo deficiente, incompleta e errada a motivação ou fundamentação da sentença, a qual constitui uma causa de recurso por erro de julgamento, de facto ou de direito.
18- O recorrente entende, salvo o devido respeito por opinião diversa, que ao julgar provados os factos 3, 4 a 6 e 10 a 14 da sentença (cujo teor aqui se dá por reproduzido) e não provados os parágrafos 1, 2, 3, 5 e 6 dos factos não provados da Sentença, o tribunal incorreu em notório erro de julgamento, devendo tal decisão ser revogada nos termos que a seguir se deixam expressos.
19- Quanto à suposta “inexistência de qualquer elemento que suporte o alegado contrato de mútuo e à inexistência de prova testemunhal que sustente qualquer indício da existência do alegado empréstimo de diversas quantias em dinheiro” pelo recorrente ao recorrido, mais uma vez incorre o Tribunal a quo em erro.
20- Nos termos do disposto no artigo 458º do Código Civil “Se alguém, por simples declaração unilateral, prometer uma prestação ou reconhecer uma dívida, sem indicação da respetiva causa, fica o credor dispensado de provar a relação fundamental, cuja existência se presume até prova em contrário”.
21- Assim, impunha-se ao exequente, aqui recorrente, o ónus de alegação da relação fundamental, a servir de causa de pedir, aquando da apresentação do requerimento executivo sob pena de recusa do recebimento deste, ónus que o exequente cumpriu, encontrando-se a relação causal devidamente esclarecida e plasmada no requerimento executivo.
22- Ora, alegada a relação causal, sendo o recorrente detentor de uma declaração unilateral de dívida não lhe incumbe provar o facto constitutivo da obrigação, sendo antes ao devedor que compete provar, em oposição à execução, que a relação fundamental não existe ou é nula. (Ac. TRL no processo nº 3747/22.7T8LRS-A.L1-7, de 24-09-2024, Ac. do TRP de 14.05.2013 e Ac. do STJ de 04-04-2024, no processo nº 18679/21.8T8SNT-A.L1.S1, in www.dgsi.pt)
23- E ao contrário do decidido na Sentença em crise o recorrido não logrou fazer a contraprova que lhe incumbia
24- No que se refere à assinatura aposta no título executivo temos as declarações de parte do Recorrente, que de forma clara informou o tribunal de como e quando é que a referida assinatura foi aposta no mesmo pelo punho do Recorrido e o porquê de não ter guardado, após a assinatura da declaração de divida, os comprovativos dos empréstimos parcelares realizados (Declarações de parte de BB inquirido na audiência de discussão e julgamento de 29 de Maio de 2024 e cujo depoimento se encontra gravado digitalmente no sistema informático “H@bilus Media Studio” do minuto 15:55 ao minuto 16:36, transcritas nas alegações)
25- A atestar a veracidade das declarações de parte do Recorrente temos o relatório pericial que atesta, sem margem para quaisquer dúvidas, que a assinatura aposta no título executivo o foi pelo punho do Recorrido.
26- Mais temos as declarações da testemunha CC, filha do recorrido que e no que se refere à assinatura da declaração de divida explica que o pai não assinou a declaração de divida porque se ele diz que não assinou, ela acredita. (CC, Testemunha e filha do recorrido, inquirida na audiência de discussão e julgamento de 29 de Maio de 2024 e cujo depoimento se encontra gravado digitalmente no sistema informático “H@bilus Media Studio” do minuto 15:22 ao minuto 15: 51, transcritas nas alegações)
27- E ainda as declarações da testemunha DD (DD, testemunha do Recorrido, amigo e funcionário do mesmo, inquirido na audiência de discussão e julgamento de 29 de Maio de 2024 e cujo depoimento se encontra gravado digitalmente no sistema informático “H@bilus Media Studio” do minuto 14:37 ao minuto 14:52)
28- Pelo que mal andou o tribunal a quo ao entender não provado que a assinatura constante do documento referido em 1 dos factos provados foi aposta pelo punho do embargante e que a declaração de divida junta aos autos, foi assinado pelo próprio punho do Oponente (ponto 2 parte inicial dos factos não provados)
29- Pelo que e em atenção à prova realizada em audiência de discussão e julgamento (ou à sua falta) conjugada com o resultado do Relatório Pericial, deveriam os factos constantes dos parágrafos 1 e 2 (primeira parte) ter sido dados como provados. Pelo que é do nosso entendimento que deve ser proferida decisão que julgue provado o seguinte: “a assinatura constante do documento referido em 1 dos factos provados foi aposta/assinada pelo punho do embargante.”, o que se requer
30- No que se refere ao alegado pelo Recorrido: que nada deve ao recorrente, que o recorrente não detinha capacidade financeira “para emprestar qualquer quantia seja a quem quer que fosse” e que adquiriram com capitais próprios os prédios melhor descritos no ponto 3 dos factos provados, no referente ao parágrafo 3º dos factos não provados e ao ponto 4 dos factos provados, atenta a inversão do ónus da prova determinada pelo artigo 458º do CC, incumbia ao Recorrido a prova de que o Recorrente não lhe havia emprestado dinheiro para a compra e construção do imóvel sito em ..., ..., o que este claramente não fez, como resulta da prova realizada em audiência.
31- Quer a testemunha EE, (inquirida na audiência de discussão e julgamento de 03-07-2024, e cujo depoimento se encontra gravado digitalmente no sistema informático “H@bilus Media Studio” do minuto 14:23 ao minuto 15:23), quer o Recorrente em declarações de parte confirmaram as declarações constantes do Requerimento executivo no que ao negócio causal se prende (e note-se que não era a Recorrido a quem incumbia a prova)
32- Nenhuma das testemunhas arroladas pelo Recorrido tinham conhecimento destes factos, nem direta, nem indiretamente, ou seja não sabiam se o Recorrido devia ou não dinheiro ao Recorrente, como é que o Recorrido pagou a construção do imóvel em ..., se o Recorrente emprestou dinheiro ao recorrido e se o Recorrido adquiriu ou não os prédios descritos no ponto 3 dos factos provados com recurso a capitais próprio (DD, testemunha do Recorrido, amigo e funcionário do mesmo, inquirido na audiência de discussão e julgamento de 29 de Maio de 2024 e cujo depoimento se encontra gravado digitalmente no sistema informático “H@bilus Media Studio” do minuto 14:37 ao minuto 14:52, FF, Testemunha do recorrido inquirido na audiência de discussão e julgamento de 29 de Maio de 2024 e cujo depoimento se encontra gravado digitalmente no sistema informático “H@bilus Media Studio” do minuto 14:52 ao minuto 15: 06, GG, Testemunha do recorrido e seu amigo, inquirido na audiência de discussão e julgamento de 29 de Maio de 2024 e cujo depoimento se encontra gravado digitalmente no sistema informático “H@bilus Media Studio” do minuto 15:07 ao minuto 15: 21 e CC, Testemunha e filha do recorrido, inquirida na audiência de discussão e julgamento de 29 de Maio de 2024 e cujo depoimento se encontra gravado digitalmente no sistema informático “H@bilus Media Studio” do minuto 15:22 ao minuto 15: 51, depoimentos transcritos nas alegações)
33- Apenas uma testemunha, FF, declara que acha que o Recorrente não tinha como emprestar dinheiro ao recorrido porque também ele na altura se encontrava a construir a sua própria casa, mas quando questionado sobre as condições financeiras do Recorrente e da sua mulher nada sabia.
34- A testemunha CC, filha do Recorrido, apenas sabe o que o pai lhe dizia, apenas teve conhecimento da divida em causa nos presentes autos aquando da entrada em juízo do processo executivo, desconhece outros empréstimos a que o pai tenha recorrido, desconhece uma penhora da casa de ... feita pelo Banco 1..., afirmando apenas que se o pai diz que não deve ela acredita nele”
35- Desta forma e atentos os depoimentos das testemunhas e declarações de parte do recorrente, facilmente se comprova que o Recorrido não fez prova do que alegou, como aliás lhe competia, pelo que e necessariamente deverá ser dado como provado o paragrafo 3º dos factos não provados, ou seja que “entre os anos 2000 e 2003, o exequente emprestou ao executado diversas quantias em numerário e através de cheque bancário, quantias essas que se destinaram à aquisição, pelo executado e sua mulher HH, de um terreno sito em ... ou ..., freguesia ..., concelho ... e posterior construção de uma moradia de férias no referido imóvel, o qual se encontra descrito na Conservatória do registo Predial de Vila Nova de Cerveira sob o nº ...50/20000314 e inscrito na respetiva matriz predial urbana sob o artigo ...00”
36- Acresce ao exposto que o Tribunal a quo deu como provado que para aquisição dos prédios melhor descritos no ponto 3 dos factos provados, bem como respetivos registos e escrituras e início da edificação do imóvel usaram capitais próprios (nomeadamente resgatando investimentos que possuíam) e que para custear a empreitada recorreram ao crédito bancário e fê-lo, como consta da motivação, com recurso aos documentos juntos aos autos com a oposição.
37- Acontece que não foi apurado em sede de audiência de discussão e julgamento, nem resulta dos documentos juntos aos autos qual o real valor da compra dos prédios constantes do ponto 3 dos factos provados, pois que como é do conhecimento geral os prédios rústicos são muitas vezes vendidos por quantias muito superiores aquelas declaradas, sendo que o Recorrido adquiriu os prédios constantes do ponto 3 dos factos provados no ano de 2000, tendo declarado como valor global da compra a quantia de € 4.000,00 e dois anos após aos mesmos prédios foi atribuído pelo banco o valor de € 12.470,00, ou seja superior em €8.470,00 ao valor da compra
38- Desta forma e do ponto 3 dos factos provados deveria constar em referencia ao valor da compra que o mesmo seria o valor escriturado: “3 - Em 20 de Janeiro de 2000, o executado e a esposa adquiriram dois prédios: um terreno para construção, pelo valor declarado em escritura de trezentos mil escudos (€1.500,00) e um prédio rústico, pelo valor declarado em escritura de € quinhentos mil escudos (€2.500,00) confinantes entre si e sitos na freguesia ..., concelho ...,”
39- Em relação aos pontos 4 e 5 dos factos provados não foi feita qualquer prova em audiência de discussão e julgamento sobre como, quando e quem pagou ou se tal o foi com recurso a fundos próprios do recorrido os imóveis descritos no ponto 3 dos factos provados, impostos, registos e escrituras, nem que após a anexação mandaram edificar um imóvel destinado a habitação mais uma vez com recurso a fundos próprios resgatando inclusive investimentos que possuíam.
40- Dos documentos 3, 4, 5 e 6 não resulta provado que o resgate de fundos próprios tenham sido usados para os fins constantes dos pontos 4 a 6 dos factos provados, ou que o tenham sido por exemplo para constituição paralela de garantia bancária do crédito concedido de € 74.819,68 (e constante do ponto 6 dos factos provados) e cuja única garantia bancária constante da escritura são os imóveis do ponto 3 dos factos provados já anexado, no valor de €12.470,00.
41- Como é bem sabido, nenhum banco concede crédito sem que tenha uma garantia capaz de pagamento do mesmo, pelo que, em 2002, quando este foi concedido ou a construção do imóvel já e encontrava em estado muito adiantado, não obstante não existir ainda registo do mesmo por não se encontrar concluído, o que prova que o Recorrido teve que arranjar fundos para pagar a construção, e/ou o recorrido entregou ao banco outras garantias, que não também a fiança, pois que tal teria que constar da escritura para ser válida.
42- Acresce ao exposto que os documentos 3, 4, 5 e 6 juntos aos autos com a oposição à execução (embargos de executado), são: O documento nº 3, datado de 07-12-2001 é uma carta do Banco 2... (Banco 2...) a converter a quantia existente na conta à ordem nº ...85 de escudos para euros; O documento nº 4 é de facto um resgate de um investimento efetivado em 0-11-2001 do Banco 2... da quantia de € 9.975,96 e ordem de transferência para a conta à ordem nº ...85; O documento nº 5 é novamente um resgate de um investimento efetivado em 22-01-2002 com ordem de transferência para a conta à ordem, de valor indeterminado e O documento nº 6 é também um resgate de um investimento efetivado em 04-02-2002 com ordem de transferência para a conta à ordem, de valor indeterminado.
43- Ora o recorrido não junta aos autos qualquer fatura de pagamento de escrituras, impostos, ou outros, nem de obras realizadas no terreno urbano de ..., nem mesmo fatura de quaisquer obras aí realizadas, únicos documentos que provariam os pagamentos por si alegados e dados como provados na sentença em crise.
44- O mútuo com hipoteca constante dos factos provados, nº 6, prova a existência de um crédito, com garantia, para construção de um imóvel, como aí descrito, não obstante não resulta provado, nem do depoimento das testemunhas ouvidas em sede de audiência de discussão e julgamento, nem dos documentos juntos aos autos, qual o valor da construção do imóvel propriedade do Recorrido em ..., nem o estado de construção em que o mesmo se encontrava à data da concessão do referido crédito.
45- Desta forma entendemos ser de considerar os factos constantes dos pontos 4 e 5 dos factos provados devem ser considerados não provados
46- E ao ponto 6 dos factos provados deveria ser dada a seguinte redação “6 - Contraindo, em 14 de fevereiro de 2002, um empréstimo bancário, garantido por hipoteca, junto do então Banco 2..., S.A., no valor de €74.819,68 (setenta e quatro mil, oitocentos e dezanove euros e sessenta e oito cêntimos), pelo prazo de vinte anos, com vista a custear a empreitada, ou parte da mesma, pois que não foi apurado o seu custo final, nem o estado em que a obra se encontrava a esta data.”
47- Os pontos 10, 11, 12, 13 e 14 dos factos provados, atenta a prova já transcrita acima, deverão ser dados como não provados, não obstante tal matéria não ter qualquer interesse para a decisão da causa e também porque a mesma se encontra a ser julgada com o processo nº 4108/23.6T8MAI-A, não o podendo ser 2 vezes (documento junto aos autos pelo recorrido)
Beneficiando o aqui Recorrente da presunção da existência da relação fundamental descrita no requerimento executivo, competia ao aqui Recorrido ilidir tal presunção, o que claramente não fez.
Conclui pelo provimento do recurso.
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A Embargada apresentou contra-alegações, pugnando pela improcedência do recurso.
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No exame preliminar considerou-se nada obstar ao conhecimento do objecto do recurso.
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
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II - OBJECTO DO RECURSO
O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação dos recorrentes, não podendo este tribunal conhecer de questões nelas não incluídas, salvo se forem de conhecimento oficioso (cf. artigos 635.º, n.º 4, 637.º, n.º 2, 1.ª parte, e 639.º, nºs 1 e 2, todos do Código de Processo Civil (C. P. Civil).
Assim, partindo das conclusões das alegações apresentadas pela Apelante, as questões a decidir no presente recurso, são as seguintes:
- Se o Tribunal a quo não acatou a decisão do Tribunal da Relação do Porto, não remetendo para peritagem o original do título executivo, junto aos autos desde 13-12-2023, e como tal constitui nulidade insuprível;
- Se existem razões válidas para modificar a decisão da matéria de facto, por erro de julgamento, havendo matéria de facto dada por provada que devia ser dada por não provada, bem como matéria de facto não provada que deve ser dada por provada.
- Alteração da decisão da primeira instância.
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III - FUNDAMENTAÇÃO

1. OS FACTOS
1.1. Factos provados
O tribunal de que vem o recurso julgou provados os seguintes factos:
1 – O exequente deu à execução um documento particular intitulado “Declaração de Dívida” do qual consta o seguinte texto “ AA, natural da freguesia ..., concelho ..., titular do B.I. ...57, emitido em ../../1998, pelos SIC de ... e portador do NIF ...40..., casado sob o regime de comunhão de adquiridos com HH, residente na Rua ..., ..., ..., declara, para os devido e legais efeitos, que é devedor da quantia de 88.642,81 Euros (oitenta e oito mil seiscentos e quarenta e dois euros e oitenta e um cêntimos) ao Sr. BB, comprometendo-se a pagar a este tal montante em prazo a acordar entre ambos.
Por corresponder à verdade, vai o ora declarante assinar o presente documento de confissão de dívida.
..., 09 de Outubro de 2003.
AA”.
2 – O exequente /embargado invocou os seguintes factos no requerimento executivo como causa de pedir:
“Entre os anos 2000 e 2003, o exequente emprestou ao executado diversas quantias em numerário e através de cheque bancário, quantias essas que se destinaram à aquisição, pelo executado e sua mulher HH, de um terreno sito em ... ou ..., freguesia ..., concelho ... e posterior construção de uma moradia de férias no referido imóvel, o qual se encontra descrito na Conservatória do Registo Predial de Vila Nova de Cerveira sob o nº ...50/20000314 e inscrito na respetiva matriz predial urbana sob o artigo ...00 (doc. nº 1).
Em 09 de Outubro de 2003 o executado confessou ser devedor ao exequente da quantia de €88.642,81, mediante documento particular assinado pelo próprio.
Por diversas vezes o Exequente solicitou o pagamento da quantia em débito ao executado, quantia que este confessa ser devedor, mas cujo pagamento vem protelando com recurso às mais diversas manobras.”
3 - Em 20 de Janeiro de 2000, o executado e a esposa adquiriram dois prédios: um terreno para construção, pelo valor de trezentos mil escudos (€1.500,00) e um prédio rústico, pelo valor de € quinhentos mil escudos (€2.500,00) confinantes entre si e sitos na freguesia ..., concelho ...,
4 - Os quais, bem como os respectivos impostos, registos e escrituras, pagaram com dinheiro que possuíam.
5 - Prédios nos quais, após anexação, viriam a mandar edificar um imóvel destinado à habitação, recorrendo, uma vez mais, a fundos próprios, resgatando inclusive investimentos que possuíam.
6 - Contraindo, em 14 de fevereiro de 2002, um empréstimo bancário, garantido por hipoteca, junto do então Banco 2...,S.A., no valor de €74.819,68 (setenta e quatro mil, oitocentos e dezanove euros e sessenta e oito cêntimos), pelo prazo de vinte anos, com vista a custear a empreitada .
7 - Mútuo hipotecário cuja obrigação de pagamento terminou em 2022, em sequência do cumprimento do contratado, tendo sido emitido o documento de cancelamento da hipoteca constituída a favor da entidade bancária mutuante.
8 - O Exequente é casado com uma irmã do Executado, sendo, assim, cunhados e tendo trabalhado juntos, em três sociedades, a saber: B..., Lda.,NIPC ...55, C..., Lda, NIPC ...27 e D..., Lda, NIPC ...20.
9 - O Executado mediante escrituras públicas de cessão de quotas, outorgadas em 09 de Outubro de 2002, cedeu as quotas de que era sócio nas duas primeiras sociedades acima referidas, a da B... à sua irmã, EE, e a da C... ao Exequente.
10 - Acordando as partes, não obstante o declarado nas escrituras de cessão de quotas atrás referidas que, em contrapartida de tais cessões de quotas, o Exequente pagaria ao Executado a quantia de €62.350,00, em quatro prestações anuais, iguais e sucessivas, de €15.587,50, vencendo-se a primeira no dia 09 de Outubro de 2003 e as restantes em igual dia dos anos subsequentes.
11 - Alegando dificuldades, o Exequente apenas pagou a 1ª prestação acordada em 07.11.2003.
12 - Pagando a 2ª prestação acordada apenas em 20.07.2005 - cfr.Doc.13 a) e b);
13 - E, da 3ª prestação, até ao presente, apenas pagou a quantia de €6.000,00, em entregas parcelares de:
- € 1.000,00, em 03.01.2006 -cfr.Doc.14;
- € 1.000,00, em 03.02.2006– cfr.Doc.15;
- € 1.000,00, em 11.04.2006 -cfr.Doc.16;
- € 1.000,00, em 30.12.2006 – cfr.Doc.17 e
- € 2.000,00, em 25.01.2007 -cfr.Doc.18;
14 - Encontrando-se, assim, o Exequente em dívida para com o Executado, ora Embargante, pela quantia de €25.175,00, desde 09.10.2005.
15 - Sendo que, relativamente à terceira e última das acima citadas sociedades, não tendo as partes alcançado acordo nessa mesma altura, foi, em 30 de Março de 2007, alvo de cessão de quotas a terceiros por todos os sócios.
16 - O embargado remeteu ao embargante carta registada com AR, datada de 20 de Fevereiro de 2009, com o seguinte teor:
“Ex.mo Senhor,
A carta enviada anteriormente a V/Exª era de facto para si tendo havido contudo, um lapso ao escreve o seu nome, o que retifica.
V/Ex.a sabe muito bem que deve a quantia de 88.642,81 Euros, conforme acordo celebrado em 9 de Outubro de 2003.
Assim, V/Ex.a não é credor mas devedor, pelo que nada tenho a pagar-lhe, mas sim a receber.
Atento o lapso anterior, convido novamente V/Ex.a a pagar a totalidade da quantia no prazo de 5 dias a contar da recepção da presente carta.
Findo esse prazo sem que tal quantia seja paga, irei recorrer aos meios legais para obter o pagamento da mesma.
Convido ainda V/Ex.a a apresentar as queixas crime que entender e a accionar os processos de dívida que entender.
Apresento os m/ cumprimentos, ficando a aguardar resposta positiva.”


V- Factos Não Provados:
Não se provou que
– a assinatura constante do documento referido em 1 dos factos provados foi aposta pelo punho do embargante.
- a declaração de divida junta aos autos, foi assinado pelo próprio punho do Oponente no escritório do Exmo. Sr. Dr. II, Ilustre Advogado, com escritório sito na Avenida ..., na ...,
- entre os anos 2000 e 2003, o exequente emprestou ao executado diversas quantias em numerário e através de cheque bancário, quantias essas que se destinaram à aquisição, pelo executado e sua mulher HH, de um terreno sito em ... ou ..., freguesia ..., concelho ... e posterior construção de uma moradia de férias no referido imóvel, o qual se encontra descrito na Conservatória do registo Predial de Vila Nova de Cerveira sob o nº ...50/20000314 e inscrito na respetiva matriz predial urbana sob o artigo ...00
- no período alegado de 2000 a 2003, o Exequente debatia-se com inúmeras responsabilidades, não possuindo capacidade financeira para emprestar qualquer quantia a quem quer que fosse;
- não foi só ao exequente que o Oponente recorreu para pedir dinheiro emprestado
- também JJ e mulher KK emprestaram ao oponente quantia de cerca de € 120.000,00.
***

1.3 – Questão prévia
- Se o Tribunal a quo não acatou a decisão do Tribunal da Relação do Porto, não remetendo para peritagem o original do título executivo, junto aos autos desde 13-12-2023, e como tal constitui nulidade insuprível.
Conhecendo:
No despacho saneador proferido em 17.05.2023 consta como “Objecto do litígio:
Constitui objecto do litígio aferir as circunstâncias em que foi elaborado o documento apresentado como título executivo, se o mesmo é verdadeiro e se do mesmo resultou alguma obrigação para o executado.
Temas de prova:
1 – Apurar as circunstâncias em que foi elaborado e por quem foi elaborado o documento junto como título executivo e intitulado como “declaração de dívida”.
2 – Apurar se a assinatura constante do documento referido em 1 foi aposta pelo punho do executado.
3 – Apurar se e em que circunstâncias o executado solicitou ao exequente o empréstimo da quantia de € 88 642,81 e se foi acordado prazo para a devolução de tal quantia.
4 – Apurar se o exequente é devedor de alguma quantia ao executado.
5 – Averiguar se as partes litigam de má fé.

Em 18.09.2023 é proferido o seguinte despacho:
“A perícia admitida no despacho saneador proferido nos autos, nos termos do disposto no artigo 578º, nº 1, do CPC, tem como objecto determinar se a assinatura “AA” aposta no contrato de arrendamento junto aos autos no requerimento de 14.08.2023 foi manuscrita pelo punho do embargante.
A perícia será realizada pela entidade A..., Lda., com sede no Porto.
Solicite a marcação de data para recolha de autógrafos ao embargante e remeta o original do contrato e os elementos de identificação do embargante juntos aos autos.

Em 11.10.2023 o Recorrente requer o seguinte:
1º - Apenas nesta data se apercebeu o Embargado que, no Douto Despacho de 18-09-2023, notificado ao Embargado a 19-09-2023 – Refªs Citius 451731912 e 451837899 -, consta que a perícia requerida tem por objeto determinar se a assinatura do Embargante, “aposta no contrato de arrendamento junto aos autos no requerimento de 14-08-2023” foi manuscrita pelo seu punho.
2º - Acontece que a perícia deverá ter por objeto, salvo o devido respeito, determinar se a assinatura de AA aposta no título executivo (Declaração de Divida) foi manuscrita pelo seu punho.
3º - De facto está em causa nos presentes autos um documento de declaração de divida, cuja assinatura o Embargante alega que “não reconhece, nunca viu o documento dado à execução, não tendo sido por si elaborado, nem sendo do seu punho a assinatura aí constante,” – artigo 26º da Oposição à execução
4º - O contrato de arrendamento e demais documentos cuja junção se requereu aos autos contêm também a assinatura do Embargante e servem para ajudar na determinação da assinatura aposta na Declaração de divida
Nestes termos se requer a correção do Douto despacho referido no sentido de ser pedida a perícia à letra e assinatura do documento – Declaração de Divida – Junta aos autos principais como título executivo.

Em 18.10.2023 foi prolatado o seguinte despacho:
“Requerimento de 11.10.2023:
O despacho a admitir a perícia a fixar o seu objecto foi proferido em 18.09.2023 e notificado às partes, sendo que relativamente ao mesmo não foram apresentadas quaisquer reclamações ou objeções, pelo que se consolidou, esgotando-se, quanto a esta matéria, o poder jurisdicional do tribunal.
De qualquer forma sempre se dirá que o mesmo foi ao encontro daquilo que foi requerido pela parte e na medida em que foi requerida, de forma algo confusa, a perícia à assinatura de diversos documentos cujo original se requeria fosse junto, sendo certo que apenas relativamente ao contrato de arrendamento o mesmo foi junto.
Ora, não sendo possível realizar perícias com base em meras cópias, o objecto da perícia limitou-se ao documento original junto.
Pelo exposto, mantém-se integralmente o despacho proferido.”

Em 18.10.2023 o Embargado efectua requerimento aos autos onde diz entre outros:
“10º Apesar de não estar junto aos autos o original do título executivo (por desconhecer o Embargado se a perícia seria admitida no momento em que apresenta a contestação), certo é que este refere no artigo 7º da Contestação “A Declaração do divida junta aos presentes autos pelo Exequente é cópia do contrato original que se encontra na sua posse, pelo que e logo que determinado o exequente fará chegar aos autos o original do referido documento.”
11º Nesta data irá o Embargado remeter aos autos o referido original da Declaração de Divida (título executivo) em sua posse, pelo que não assiste ao Embargante qualquer razão, mantendo-se a perícia requerida e determinada ao título executivo – Declaração de divida – em conjunto com os demais documentos originais juntos aos autos os quais comprovam a identidade das referidas assinaturas.”

Em 14.12.2023 é prolatado o seguinte despacho:
Uma vez que o recurso foi admitido com efeito devolutivo, devem os autos prosseguir os seus termos, devendo, em conformidade, ser oficiado para o prosseguimento da perícia nos termos anteriormente determinados.

Entretanto em 07.11.2023 o Embargado recorreu para o Tribunal da Relação para “ ser ordenada a perícia à letra e assinatura do recorrido constante da declaração de divida junta aos autos com o requerimento executivo.”

Em 12.12.2023 é proferida decisão sumária pelo Tribunal da Relação com a seguinte decisão: “PROVIDO O RECURSO. REVOGADO O DESPACHO RECORRIDO DETERMINANDO-SE A CORREÇÃO DO DESPACHO PROFERIDO A 18.09.2023 DEVENDO LER-SE “DECLARAÇÃO DE DIVIDA” ONDE SE ESCREVEU ARRENDAMENTO.”

No dia seguinte à decisão proferida pelo Tribunal da Relação do Porto, ou seja, 13 de Dezembro de 2023 - a Mandatária do recorrente fez chegar aos autos o original do título executivo para que o mesmo pudesse ser objeto da perícia superiormente determinada;

A 22.01.2024, o Tribunal a quo, na sequência do acórdão do Tribunal da Relação, profere a seguinte decisão:
“Atenta a decisão proferida nos autos de recurso, notifique as partes para tomarem posição, em 10 dias.”

Na sequência de tal despacho, em 30.01.2024, o Embargado “notificado para “tomar posição”, vem manter a posição que toma ab initio, devendo, aliás como decidiu o Tribunal da Relação, a peritagem se feita à letra e assinatura constante do título executivo – declaração de divida assinada pelo Embargante e cujo original se encontra junto aos autos.”

Em 20.02.2024 o Tribunal a quo prolata o seguinte despacho:
“Na sequência do decidido pelo Tribunal da Relação, a perícia admitida no despacho saneador proferido nos autos, nos termos do disposto no artigo 578º, nº 1 do CPC, tem como objecto determinar se a assinatura “AA” aposta na declaração de dívida datada de 9.10.2023 e junta como título executivo com o requerimento executivo foi manuscrita pelo punho do embargante.
Notifique e comunique à entidade nomeada para a realização da perícia a alteração do objecto da perícia remetendo cópia da declaração de dívida, indicando que não existe original a mesma.”

Em 05.03.2024 é prolatado despacho “Remeta o original da declaração de dívida junto pelo exequente à entidade que irá realizar a perícia informando que que já se dispõe do original e que a perícia deverá incidir sobre o mesmo.”

Do atrás exposto decorre, insofismavelmente, que o Tribunal a quo incorreu em manifesto erro inicial quando afirmou que não existe original da declaração da dívida, quando o documento tinha sido junto aos autos em 13.12.2023.
Nos autos foi requerida a perícia à letra constante da assinatura aposta ao título exequendo que é constituído por declaração confessória de divida.
Esta perícia com este objeto, foi admitida no despacho que fixou os temas de prova, posteriormente foi proferido novo despacho no qual se faz referência à perícia a realizar à assinatura aposta ao contrato de arrendamento.
Como já se disse na decisão sumária deste Tribunal do “iter processual podemos retirar duas conclusões (i) que a prova pericial requerida é referida ao titulo exequendo (ii) que esta prova referida ao titulo exequendo foi deferida pelo despacho de 17/05/2023 que admitiu as provas.
Ora, da simples comparação dos despachos: proferido em 17/05/2023 e em 18.09.2023 se constata a existência de erro material de escrita.
Com efeito pode ler-se no despacho de 17/05/2023 sobre os temas de prova:
(…) Apurar as circunstâncias em que foi elaborado e por quem foi elaborado o documento junto como título executivo e intitulado como “declaração de dívida”.
(…) Apurar se a assinatura constante do documento referido em 1 foi aposta pelo punho do executado.
(…) Por não se afigurar meramente dilatória e revestir interesse para a decisão da causa admite-se a prova pericial requerida e no despacho de 18.09.2023
“A perícia admitida no despacho saneador proferido nos autos, nos termos do disposto no artigo 578º, nº1 do CPC, tem como objeto determinar se a assinatura “AA” aposta no contrato de arrendamento junto aos autos no requerimento de 14.08.2023 foi manuscrita pelo punho do embargante.
Temos assim, que a perícia admitida no despacho subsequente ao saneador não foi admitida ao contrato de arrendamento, que nem está em discussão no processo. Esta perícia foi admitida, mas à assinatura constante da declaração de divida.
Efetivamente os autos não versam qualquer relação de arrendamento (como a embargada vem sustentar, no processo, o contrato de arrendamento destina-se a servir como meio de prova meramente comparativo quanto à assinatura do embargante); nem este exame ao contrato de arrendamento foi pedido.”
Serve o exposto para dizer que o lapso do Tribunal a quo ao não determinar logo após a junção do documento, em 13.12.2023, a remessa do original da declaração de dívida, tem relevância, tanto mais relevante, quando este documento constitui um elemento fundamental para apreciação da decisão final, face ao conteúdo da declaração, sendo que quando determinou o envio do mesmo já não foi a tempo de ser objecto de perícia.
A realização da perícia ao documento original de declaração de dívida constitui um elemento relevante e essencial à boa decisão da causa, sendo ainda possível o relatório pericial aferir e apurar haver um grau de probabilidade superior ao já provado, ou seja, “Praticamente provado”, pelo que se considera ser de anular a decisão recorrida nos termos do artº 662º, nº 2, c), do CPC.

Assim sendo, procede o recurso, determinando-se a realização da perícia ao original da declaração de dívida, após o que deve ser proferida nova sentença, tendo em conta o resultado da perícia.

***


IV – Dispositivo
Pelo exposto, acordam os Juízes que integram a 3ª secção deste Tribunal da Relação do Porto:
a) Na procedência do recurso interposto pelo Apelante, anulando-se a sentença recorrida e determinando a realização da perícia ao original do documento de confissão de dívida, após o que deve ser prolatada nova decisão.
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Custas a cargo do Apelado – artigo 527º, do Código de Processo Civil.

Notifique.








Álvaro Monteiro
João Maria Espinho Venade
Carlos Cunha Rodrigues Carvalho