RECURSO DE REVISTA
REVISTA EXCECIONAL
ADMISSIBILIDADE DE RECURSO
DECISÃO SINGULAR
RECLAMAÇÃO PARA A CONFERÊNCIA
PRESSUPOSTOS
VALOR DA CAUSA
SUCUMBÊNCIA
CONTRADIÇÃO DE JULGADOS
DESOCUPAÇÃO
IMOVEL
CONTRATO DE ARRENDAMENTO
INDEFERIMENTO
Sumário


I – Sendo o valor da ação de 18.000 euros, é manifesto que o recurso de revista não é admissível por falta de valor da causa (artigo 629.º, n.º1, do Código de Processo Civil)
II – Tendo o recorrente invocado uma suposta contradição de acórdãos, nos termos da alínea d) do n.º 2 do artigo 629.º do CPC, é preciso ter em atenção que a jurisprudência deste Supremo Tribunal não considera a oposição de acórdãos uma exceção à regra da alçada abrangida na 1.ª parte do n.º 2 reportada à afirmação “Independentemente da valor da causa e da sucumbência” (cfr. Acórdãos do STJ, de 26-11-2019, proc. 1320/17, de 02-02-2019, proc. n.º 763/15).
III – Também não é aplicável a norma consagrada na al. a) do n.º 3 do artigo 629.º do CPC, que se reporta apenas aos recursos de apelação que serão admitidos independentemente do valor, não havendo qualquer razão ou teleologia para estender o alcance do texto a casos não previstos na hipótese legal.

Texto Integral


Processo nº 1451/22.5YLPRT-C.L1.S1

Acordam em Conferência no Supremo Tribunal de Justiça

I - Relatório

1. Zip Reoco Resi Portfolio, Sicafi, S.A., apresentou, no Balcão Nacional do Arrendamento, requerimento de despejo, contra AA, pretendendo a desocupação do imóvel sito na Rua ..., em ....

2. Já após a prolação da sentença, o requerido veio apresentar requerimento de suspensão da instância, o qual foi indeferido.

3. Não se conformando com tal decisão, o requerido dela interpôs recurso de apelação, que subiu no presente apenso.

4. Em 23/10/2023, foi proferida decisão sumária, nos termos do artigo 656º do Código de Processo Civil, a qual julgou a apelação improcedente.

Tal decisão foi notificada aos mandatários das partes, por via eletrónica, mediante notificação elaborada em 24/10/2023.

5. Em 12/11/2023, o recorrente apresentou requerimento no sentido de pretender que sobre a matéria daquela decisão de 23/10/2023 recaísse acórdão.

6. Em 5/12/2023, foi proferido o seguinte despacho:

«Requerimento de 12/11/2023, ref. 659623:

Veio o recorrente AA requerer que, sobre a decisão sumária que julgou a apelação improcedente, recaia acórdão, sendo tal matéria submetida à conferência.

Nos termos do art. 652º nº3 do Código de Processo Civil, «quando a parte se considere prejudicada por qualquer despacho do relator, que não seja de mero expediente, pode requerer que sobre a matéria do despacho recaia um acórdão; o relator deve submeter o caso à conferência, depois de ouvida a parte contrária».

Esta norma não prevê prazo especial para apresentação do requerimento de submissão da decisão do relator à conferência, o que significa que tal apresentação se encontra sujeita ao prazo geral de 10 dias do art. 149º do Código de Processo Civil1.

Ora a decisão em causa foi notificada à i. mandatária do apelante, por via electrónica, em 24/10/2023, presumindo-se a notificação recebida em 27/10/20232 (cfr. art. 248º nº1 do Código de Processo Civil).

Assim, constata-se que o prazo de 10 dias, para reclamar para a conferência, terminou em 6/11/2023, tendo o 3º dia útil posterior ocorrido em 9/11/2023.

É, pois, intempestivo o requerimento apresentado em 12/11/2023, pelo que, de acordo com o art. 139º nº3 o Código de Processo Civil, não se admite a reclamação apresentada.

Notifique».

7. Não se conformando com este despacho, o recorrente requereu que a questão fosse decidida por acórdão, entendendo ter existido erro no cálculo do prazo.

A recorrida nada disse.

8. O Tribunal da Relação, através de acórdão proferido em Conferência, datado de 5-03-2024, debruçou-se sobre a seguinte questão: «É, ou não, tempestiva a reclamação para a conferência apresentada em 12/11/2023», tendo decidido ser «intempestivo o requerimento apresentado em 12/11/2023, pelo que, de acordo com o art. 139º nº3 do Código de Processo Civil, não pode ser admitido, tal como foi decidido em 5/12/2023».

O acórdão apresentou o seguinte dispositivo:

«Pelo exposto, acorda-se em julgar improcedente a reclamação, mantendo-se a decisão proferida em 5/12/2023.

Custas pelo recorrente-requerente, fixando-se a taxa de justiça devida em uma UC – art. 7º nº4, com referência à Tabela II, do Regulamento das Custas Processuais».

10. Inconformado com este acórdão, o reclamante, AA, interpôs recurso de revista, em cuja alegação formulou as seguintes conclusões:

«- as regras previstas para a contagem de prazos constantes do artigo 138º do Código de Processo Civil, não se aplicam ao dia de INICIO da contagem dos prazos;

- as noções de suspensão e continuidade aplicam-se a prazos em curso;

- as regras de suspensão e continuidade não se aplicam a prazos ainda não iniciados;

- obedecendo ao estipulado no artigo 279º , o primeiro dia do prazo estipulado por notificação concretizada a uma sexta-feira é a segunda-feira seguinte (ou o primeiro dia útil seguinte se porventura essa segunda-feira for um feriado).

Pelo expost, requer a V.Exas. que decidam pela procedência deste recurso, revogando-se a decisão recorrida e declarando-se tempestivo o Recurso interposto da decisão da 1ª instância que indeferiu o pedido de suspensão da instância, Assim se fazendo JUSTIÇA!»

11. O recurso de revista não foi admitido pelo Tribunal da Relação, que proferiu despacho de não admissibilidade do recurso de revista com o seguinte teor:

«Veio AA interpor recurso de revista do acórdão proferido por este Tribunal da Relação em 5/3/2024.

O recurso de revista é um recurso ordinário – art. 627º nº2 do Código de Processo Civil.

Nos termos dos arts. 852º, 853º nº1 e 629º nº1 do Código de Processo Civil [e sendo certo que, no caso dos autos, não estamos perante nenhuma das situações a que aludem os nº2 e 3 deste art. 629º], o recurso ordinário só é admissível quando a causa tenha valor superior à alçada do tribunal de que se recorre e a decisão impugnada seja desfavorável ao recorrente em valor superior a metade da alçada desse tribunal.

A alçada dos tribunais da Relação é de € 30.000,00 – cfr. art. 44º nº1 da LOSJ.

O valor da causa, fixado na sentença proferida no processo principal, é de € 18.000,00.

Assim, sendo o valor da causa inferior à alçada do tribunal, o acórdão proferido não admite recurso ordinário [para além da questão de também não caber na previsão do art. 671º nº1 e 2 do Código de Processo Civil].

Note-se que, nos termos do art. 629º nº3 a) do Código de Processo Civil, o recurso nas acções em que se aprecie a validade, subsistência ou cessação dos contratos de arrendamento só é sempre admissível (independentemente do valor da causa) quando é interposto para a Relação, mas já não para o Supremo Tribunal de Justiça.

Pelo exposto, nos termos do art. 641º nº2 a) do Código de Processo Civil, indefere-se o requerimento de interposição de recurso.

Custas pelo recorrente – art. 6º nº2, com referência à Tabela I-B, do Regulamento das Custas Processuais.

Notifique».

12. Novamente inconformado, o recorrente apresentou reclamação para este Supremo Tribunal de Justiça, ao abrigo do n.º 1 do artigo 643.º do CPC, na qual formulou as seguintes conclusões:

«12.A decisão da Relação que admitiu o recurso não vincula o tribunal superior (ut 641º, nº 5 CPC).

13. O acórdão proferido em conferência, no Tribunal da Relação, que indefere a reclamação da decisão da 1.ª instância de não admissão de recurso de apelação, confirmando essa decisão é recorrível para o Supremo Tribunal de Justiça.

14.O nº 4 do art.º 643º do CPC remete para o regime do nº 3 do art.º 652º do mesmo código, sem estabelecer qualquer regra de recorribilidade especial para os acórdãos proferidos na conferência na sequência de reclamação da decisão do relator sobre a reclamação contra a não admissão do recurso.

15.Devem, pois, seguir-se as regras gerais de admissibilidade da revista.

16.O acórdão proferido durante a pendência do processo na Relação relativamente à (in)admissibilidade do recurso de apelação, é susceptível de recurso de revista nos termos do art.º 673º do CPC.

17. No caso de não admissibilidade do recurso de apelação, em recurso autónomo nos termos da al. a) daquele artigo uma vez que a inexistência de decisão de mérito ou absolvição da instância torna absolutamente inútil a imposição da impugnação conjunta com a impugnação da decisão final, constituindo o acórdão recorrido a decisão final (o que sempre nos reconduziria ao corpo do artigo).

18.Deve, pois, ser admitido o recurso de revista».

13. A Relatora, por decisão singular, confirmou o despacho de não admissibilidade do recurso de revista, com base, para o que aqui releva, no seguinte fundamento:

«5.1. Em primeiro lugar, constata-se que o valor da presente ação é de 18.000 euros, e, portanto, inferior ao valor da alçada.

5.2. Em segundo lugar, e, diferentemente do que entende o reclamante, a decisão que indefere uma reclamação com base em intempestividade não tem natureza interlocutória, pelo que não lhe é aplicável o regime dos artigos 672.º e 673.º do CPC.

5.3. Em terceiro lugar, estando em causa uma ação de cessação do contrato de arrendamento, o recurso é sempre admissível para o Tribunal da Relação, mas não para o Supremo Tribunal de Justiça (artigo 629.º, n.º 3, al. a), do CPC).

5.4. Nem poderia ser equacionada a aplicabilidade da al. c) do n.º 1 do artigo 629.º, do CPC, em virtude de o recorrente não ter apresentado um acórdão contraditório com o acórdão agora recorrido, quanto à mesma questão fundamental de direito. O único acórdão citado na sua alegação de recurso - Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 04-02-2010, processo n.º 1593/064TBOER.l1-8 - não se reporta à mesma questão suscitada no objeto do recurso de revista agora interposto porque se refere não ao início do prazo mas ao seu termo.

6. Assim sendo, não se admite o recurso de revista e confirma-se o despacho reclamado.»

14. Novamente inconformado, o reclamante apresentou, neste Supremo, reclamação para a Conferência do despacho singular da Relatora, que confirmou o despacho do Tribunal da Relação, que, por sua vez, não admitiu o recurso de revista, com alegações que aqui se consideram integralmente transcritas, às quais juntou o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 04-11-2021, proc. n.º 427/19.4YLPRT.L1.S1.

15. O reclamante solicita que seja admitido recurso de revista do acórdão da Relação, que indeferiu a sua reclamação contra a decisão singular que considerou improcedente o recurso de apelação, por ter apresentado, fora do prazo legal, o seu pedido de que sobre a decisão singular recaísse acórdão.

Baseia a reclamação agora apresentada contra a decisão singular proferida no Supremo Tribunal de Justiça, que não admitiu o recurso de revista, na natureza da decisão recorrida, que afirma tratar-se de uma decisão que pôs termo ao processo e que conheceu do mérito e, portanto, recorrível, ao abrigo das regras gerais do n.º 1 do artigo 671.º do CPC.

Invoca, ainda, para fundamentar a admissibilidade do recurso de revista, os pressupostos específicos do recurso de revista excecional previstos na lei para questões cuja apreciação, pela sua relevância jurídica, seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito (artigo 672.º, n.º 1, al. a), do CPC) e para aqueles casos em que o acórdão da Relação esteja em contradição com outro, já transitado em julgado, proferido por qualquer Relação ou pelo Supremo Tribunal de Justiça, no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito (artigo 672.º, n.º 2, al. c), do CPC).

Vejamos.

16. Está em causa uma decisão recorrida que indeferiu uma reclamação contra uma decisão singular, por não ter sido respeitado o prazo de dez dias para o efeito previsto no artigo 149.º do CPC, conjugado com o artigo 139.º, n.º 3, do CPC. Esta decisão, diferentemente do que afirma o reclamante, não conhece do mérito da causa, mas tão-só de uma intercorrência processual.

A decisão recorrida constitui é certo, como afirmou a Relatora no despacho singular e invoca agora o reclamante, uma decisão final, que põe termo ao processo, uma vez que tem como efeito a definitividade da improcedência do recurso de apelação interposto da sentença que indeferiu a suspensão da instância.

Todavia, a natureza final da decisão não é um requisito suficiente para admitir um recurso de revista. Desde logo, a ação tem de ter valor, nos termos do artigo 629.º, n.º 1, do CPC. Como vimos, o valor da ação é de 18.000 euros, o que o reclamante não contesta. Situa-se este valor num patamar manifestamente inferior ao valor da alçada da Relação, que, como é sabido e resulta da lei, é de 30.000,00 euros (artigo 44.º da Lei n.º 61/2013, de 26-08).

Como afirma Abrantes Geraldes, in Recursos em processo civil, 6.ª edição, Almedina Coimbra, 2020, p. 46, «(…) com a regulação da recorribilidade em função do valor ou da sucumbência o legislador visou compatibilizar o interesse da segurança jurídica , potenciado por múltiplos graus de jurisdição, com outros ligados á celeridade processual, à racionalização dos meios humanos e materiais ou à dignificação e valorização da intervenção dos Tribunais Superiores».

Conclui-se, pois, que o recurso de revista não é admissível por falta de valor da ação, sendo que também não estamos perante nenhuma das exceções legalmente previstas à regra da alçada. Com efeito, é manifesto que no presente recurso de revista não foi suscitada a violação de regras de competência em razão da nacionalidade, da matéria ou da hierarquia, ou a ofensa de caso julgado formal ou material (artigo 629.º, n.º 2, alíneas a), b) e c), do CPC), nem estamos perante uma decisão proferida contra jurisprudência uniformizada do Supremo Tribunal de Justiça, suscetível de integrar a alínea c) do n.º 2 do artigo 629.º do CPC.

Relativamente à alínea d) do n.º 2 do artigo 629.º do CPC, que se reporta a casos de contradição jurisprudencial, é preciso ter em atenção que a jurisprudência deste Supremo Tribunal tem feito uma interpretação restritiva desta norma e que não a considera abrangida nas hipóteses do n.º 2 reportadas à afirmação “Independentemente da valor da causa e da sucumbência” (cfr. Acórdãos do STJ, de 26-11-2019, proc. 1320/17, de 02-02-2019, proc. n.º 763/15).

A alínea d) do n.º 2 do artigo 629.º foi pensada para os casos em que por força da matéria tratada no processo (p.ex. expropriação, procedimento cautelar, impugnação judicial de decisões do conservador do registo predial, comercial ou civil) a lei excluiu o recurso de revista e que, portanto, não fosse esta previsão legal especial as contradições jurisprudenciais verificadas nestes processos nunca chegariam ao Supremo, o que o legislador quis evitar. O fundamento para esta posição é a referência aos “motivos estranhos à alçada do tribunal”, o que permite antever que a causa de não admissibilidade da revista não é a falta de valor da ação – as ações devem respeitar os valores da alçada necessários para o terceiro grau de jurisdição – mas uma determinação da lei (ex. artigo 66.º, n.º 5, do Código das Expropriações, artigo 370.º, n.º2, do CPC, artigo 180.º do Código do Notariado, artigos 240.º, n.º 3, 251.º, n.º 2 e 291.º do Código do registo Civil e preceitos idênticos no Código de Registo Comercial, Código do Registo Predial e Código da Propriedade Industrial). Nestes termos, a norma ínsita na alínea d) do n.º 2 do artigo 629.º do CPC visa, pois, exclusivamente, possibilitar o acesso ao terceiro grau de jurisdição nos casos em que, por determinação legal, tal estaria à partida impedido (cfr. Abranges Geraldes, ob. cit., p. 64 e jurisprudência aí citada) e não alargar a admissibilidade dos recurso de revista a conflitos jurisprudenciais de ações abaixo do valor da alçada.

17. O reclamante invoca ainda, a favor da tese da admissibilidade do recurso de revista, o artigo 629.º, n.º 3, al. a), do CPC, segundo o qual nas ações em que se aprecie a validade, a subsistência ou a cessação de contratos de arrendamento, é sempre admissível recurso para a Relação, independentemente do valor da causa e da sucumbência.

Mas não tem razão.

Em primeiro lugar, o objeto da presente revista é tão só a questão de saber se foi ou não cumprido pelo recorrente-reclamante o prazo para reclamar para a Conferência de decisão singular do relator, que declarou o recurso de apelação improcedente, e não a questão da cessação do contrato de arrendamento.

Em segundo lugar, a al. a) do n.º 3 do artigo 629.º do CPC não levanta qualquer dúvida de interpretação, dada a clareza do argumento literal que se reporta apenas aos recursos de apelação que serão admitidos independentemente do valor, não havendo qualquer razão ou teleologia para estender o alcance do texto da lei a casos não previstos na hipótese legal. O intérprete deve presumir, dado o sentido objetivo e claro da letra da lei, que o legislador soube exprimir o seu pensamento em termos adequados (artigo 9.º, n.º 3, do Código Civil). Não se trata, pois, de qualquer lapso do legislador que deva ser corrigido pelo julgador para harmonizar a solução da lei dentro do sistema. A norma em causa apenas assegura o segundo grau de jurisdição, ficando o recurso para o Supremo dependente da verificação dos requisitos gerais, entre os quais, o requisito do valor da ação.

18. Por último, sustenta o reclamante que o recurso de revista deve ser admitido, ao abrigo do artigo 672.º, als a) e c), do CPC, por estar em causa uma questão de relevância jurídica e uma contradição jurisprudencial com o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 04-11-2021.

Mas não é assim.

O recurso de revista excecional está apenas previsto para os casos em que o Tribunal da Relação confirma, sem voto de vencido e sem fundamentação essencialmente diferente, a sentença do tribunal de 1.ª instância – as situações de dupla conformidade, delimitadas nos termos do artigo 671.º, n.º 3, do CPC. Ora, no caso vertente o acórdão recorrido limitou-se a decidir, ex novo, a questão processual do prazo de reclamação de decisão singular para a conferência, bem como da sua contagem. Por outro lado, os recursos de revista excecionais estão sujeitos aos pressupostos gerais de admissibilidade e faltando o valor da ação nunca podem ser admitidos. Ademais, a questão objeto de revista – o prazo da reclamação para a conferência e a sua contagem - não é idêntica à questão decidida no Acórdão junto pelo reclamante (Acórdão de 04-11-2021), que se refere ao prazo do recurso de apelação quando está em causa a impugnação de uma sentença de despejo, questão que, podendo ter relevância numa fase anterior do processo, já não é a que foi agora objeto da revista.

A decisão impugnada é, portanto, irrecorrível.

19. O legislador ordinário não está vinculado pela Constituição a consagrar um duplo grau de jurisdição, nem existe, para além do caso das sentenças de condenação proferidas em processo penal, um direito fundamental ao recurso extraível do direito de acesso à justiça e à tutela jurisdicional (artigo 20.º da CRP).

Assim sendo, confirma-se a decisão singular que não admitiu o recurso de revista do Acórdão da Relação de 5 de março de 2024.

20. Anexa-se sumário elaborado de acordo com o n.º 7 do artigo 663.º do CPC:

I – Sendo o valor da ação de 18.000 euros, é manifesto que o recurso de revista não é admissível por falta de valor da causa (artigo 629.º, n.º1, do Código de Processo Civil)

II – Tendo o recorrente invocado uma suposta contradição de acórdãos, nos termos da alínea d) do n.º 2 do artigo 629.º do CPC, é preciso ter em atenção que a jurisprudência deste Supremo Tribunal não considera a oposição de acórdãos uma exceção à regra da alçada abrangida na 1.ª parte do n.º 2 reportada à afirmação “Independentemente da valor da causa e da sucumbência” (cfr. Acórdãos do STJ, de 26-11-2019, proc. 1320/17, de 02-02-2019, proc. n.º 763/15).

III – Também não é aplicável a norma consagrada na al. a) do n.º 3 do artigo 629.º do CPC, que se reporta apenas aos recursos de apelação que serão admitidos independentemente do valor, não havendo qualquer razão ou teleologia para estender o alcance do texto a casos não previstos na hipótese legal.

III – Decisão

Pelo exposto, decide-se indeferir a reclamação e confirmar a decisão singular reclamada, nos seus exatos termos.

Custas pelo reclamante

Lisboa, 15 de outubro de 2024

Maria Clara Sottomayor (Relatora)

Maria João Tomé (1.º Adjunta)

Henrique Antunes (2.º Adjunto)