RECURSO DE REVISÃO
RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO
FUNÇÃO JURISDICIONAL
FUNDAMENTOS
PRESCRIÇÃO
PRAZO
TRIBUNAL COMPETENTE
COMPETÊNCIA EM RAZÃO DA HIERARQUIA
COMPETÊNCIA DA RELAÇÃO
CONHECIMENTO DO MÉRITO
LITIGÂNCIA DE MÁ FÉ
TRÂNSITO EM JULGADO
Sumário


I - Nos termos do art. 697.º, n.º 1, do CPC, o recurso extraordinário de revisão deve ser interposto no tribunal que proferiu a decisão a rever, que é o tribunal da Relação, nos casos em que este confirmou uma sentença do tribunal de 1.ª instância que julgou a ação improcedente por prescrição do direito do autor.
II - Uma decisão proferida em resposta a um recurso extraordinário de revisão, interposto, com base na al. c) do art. 696.º do CPC, do acórdão da Relação proferido nos mesmos autos principais agora em causa, não pode constituir uma decisão revidenda para o presente recurso de revisão, interposto ao abrigo da al. h) do art. 696.º do CPC, porque não conheceu do mérito do pedido do autor.

Texto Integral


Processo n.º 20348/15.9T8LSB-D.P1.S1-B

Acordam em Conferência no Supremo Tribunal de Justiça

I – Relatório

1. AA, veio, ao abrigo do artigo 696.º, al. h) e 697.º, ambos do Código de Processo Civil (doravante, CPC), interpor recurso extraordinário de revisão do Acórdão deste Supremo Tribunal de Justiça, de 11-07-2023, contra o Estado Português, representado pelo Ministério Público e BB e outros, formulando as seguintes conclusões:

«1. No âmbito dos presentes autos foi proferida em 8/3/2017, pelo Tribunal de Primeira Instância, sentença que considerou a presente acção improcedente, com fundamento na prescrição do direito invocado pelo Recorrente, ou seja, três anos a contar da data em que o lesado teve conhecimento do direito que lhe compete, embora com desconhecimento da pessoa do responsável e da extensão integral dos danos – nº 1 do artigo 498º do Código Civil

2. Decisão esta confirmada pelo Tribunal da Relação do Porto, por Acórdão datado de 28/11/2017.

3. Em 4/7/2022, o ora Recorrente apresentou Recurso de Revisão, junto do Tribunal da Relação do Porto, com fundamento nos termos do disposto no artigo 696º c) do C.P.C.

a. O Recurso supra identificado, obteve decisão definitiva, proferida pelo Supremo Tribunal de Justiça, datada de 11/7/2023, nos seguintes termos:

b. Para além da ausência de novidade, suficiência e de préalegação, também em termos de direito material, considerando o regime da prescrição aplicado nos autos, a pretensão do autor, ainda que fosse atendível e se provassem os factos novos que o autor alega, também não seriam causais para permitir a procedência do pedido do autor, continuando a verificar-se a prescrição do direito que o autor invoca. Ou seja, o direito do autor sempre estaria prescrito, quer se tivesse por referência o pedido de apoio judiciário de 2010, quer o de 2011, em face da data em que o autor teve conhecimento do direito, maio de 2003.

4.Em 15/1/2024, o ora Recorrente apresentou novo Recurso de Revisão nos termos e para os

efeitos do disposto no artigo 696º c) do C.P.C., tendo por fundamento o Acórdão proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça, 1ª Secção Processo 11785/19.0T8SNT

5. Os autos supra identificados (Processo 11785/19.0T8SNT), embora digam respeito a relações societárias e contratos distintos, foram instaurados pelo ora Recorrente, precisamente

6. E, quanto ao prazo de prescrição do direito indemnizatório invocado pelo ora Recorrente, resultou da decisão do Supremo Tribunal de Justiça, o seguinte:

«I - A deliberação de destituição de gerente, quer com justa causa, quer sem qualquer fundamento (ad nutum), é sempre lícita.

II - Não obstante, a inexistência de justa causa fundamentadora de destituição é geradora de responsabilidade civil da sociedade por facto lícito, cabendo ao destituído o direito de indemnização pelos danos que tiver sofrido com a respetiva deliberação.

III - Prescreve no prazo de vinte anos a ação de indemnização intentada por gerente contra os sócios da sociedade por destituição sem justa causa.

IV- A interrupção é determinada por atos que tanto podem resultar de uma iniciativa do titular do direito (credor), como do beneficiário da prescrição (devedor).

V - O recurso à analogia pressupõe a existência de uma lacuna da lei, isto é, que uma determinada situação não esteja compreendida nem na letra nem no espírito da lei.

VI - Interpretação extensiva significa que a formulação adotada pela letra do texto legal diz menos do que aquilo que se pretendia dizer, habilitando o intérprete, com recurso a elementos racionais, a alargar ou a estender o texto, dando-lhe um alcance conforme ao pensamento legislativo

7. Resulta então, do histórico de Recursos apresentados nos presentes autos, assim como do próprio processo que correu em primeira instância, que o ora Recorrente, sempre pugnou que, no caso concreto, o prazo de prescrição do direito invocado pelo mesmo, seria o previsto no artigo 309º do C.C. , ou seja 20 anos.

8. Sendo que, quer a decisão de primeira instância, quer a do Tribunal da Relação do Porto, que a confirmou, por Acórdão datado de 28/11/2017, decidiram que, no caso em apreço se aplicaria um prazo de prescrição de três anos a contar da data em que o lesado teve conhecimento do direito que lhe compete, embora com desconhecimento da pessoa do responsável e da extensão integral dos danos - nº 1 do artigo 498º do Código Civil.

9. Estamos assim, perante duas decisões, que envolvem as mesmas partes; a mesma relação societária, pese embora com sociedades distintas e a mesma questão de direito, ou seja o prazo prescricional do direito invocado pelo Recorrente.

10. E perante estas duas decisões, sendo uma do Tribunal da Relação do Porto e outra do Supremo Tribunal de Justiça, são aplicados, para a mesma situação controvertida, prazos prescricionais diferentes.

11.O que, obviamente cria para o ora Recorrente, uma desigualdade de tratamento, na mesma situação jurídica, sem qualquer fundamento legal desigualdade esta, diretamente decorrente do exercício da função jurisdicional, que claramente proferiu nos presentes autos, uma decisão ferida de ilegalidade.

12. E sem que o Recorrente tenha contribuído, quer por acção, quer por omissão, para esta contraditoriedade/ilegalidade de decisões jurisdicionais para a resolução da mesma questão de direito.

13.No caso dos presentes autos, a decisão transitada em julgado, que como referido, está ferida de ilegalidade, impossibilitou o Recorrente de ser ressarcido, pelos danos provocados por uma destituição das suas funções de gerente, independentemente de existir ou não justa causa nessa destituição.

14. Em suma, dos presentes autos, resulta um conjunto de decisões jurisdicionais ilegais, que sem atender ao verdadeiro interesse da justiça e da descoberta da verdade material, “manipulam” as disposições legais a seu bel prazer e, não cumprem o seu desígnio primordial que é a correta e cabal interpretação da lei, com vista à realização da justiça.

15. Criando obstáculos inultrapassáveis ao Recorrente no seu direito constitucional de acesso à justiça e provocando danos na esfera jurídica do mesmo.

16. Nos termos do n.º 1 do art.º 1.º da Lei n.º 67/2007, de 31 de Dezembro (na redacção conferida pela Lei n.º 31/2008, de 17/07), “A responsabilidade civil extracontratual do Estado e das demais pessoas colectivas de direito público por danos resultantes do exercício da função legislativa, jurisdicional e administrativa rege-se pelo disposto na presente lei, em tudo o que não esteja previsto em lei especial”

17.Nos termos do n.º 1 do art.º 8.º da Lei n.º 67/2007, “Os titulares de órgãos, funcionários e agentes são responsáveis pelos danos que resultem de ações ou omissões ilícitas, por eles cometidas com dolo ou com diligência e zelo manifestamente inferiores àqueles a que se encontravam obrigados em razão do cargo”.

18.E nos termos do n.º 2 do art.º 8.º da Lei n.º 67/2007, “O Estado e as demais pessoas coletivas de direito público são responsáveis de forma solidária com os respetivos titulares de órgãos, funcionários e agentes, se as ações e omissões referidas no número anterior tiverem sido cometidas por estes no exercício das suas funções e por causa desse exercício”.

19.Determinando consequentemente, que a decisão proferida em primeira instância em 8/3/2017, confirmada pelo Tribunal da Relação do Porto em 28/11/2017 e posteriormente em 11/7/2023, e que absolveu os Recorridos do pedido, provocou danos irreparáveis ao Recorrente e a consequente responsabilidade civil do Estado nos termos da alínea h) do artigo 696º do C.P.C.

Nestes termos e nos demais de direito e, sempre com o muito douto suprimento de Vexas, deverá o presente recurso extraordinário de Revisão ser julgado procedente por provado, pelos fundamentos de facto e de direito atrás invocados e, em consequência deverá ser considerada provada a responsabilidade civil do Estado por danos emergentes do exercício da função jurisdicional, com todas as demais e legais consequências, com o que se fará a devida JUSTIÇA!!!!!!!»

2. A Relatora proferiu decisão singular de indeferimento liminar do recurso, com o seguinte fundamento:

«O recurso extraordinário de revisão, ao abrigo do artigo 696.º, al. h), e artigo 696.º-A do CPC (introduzidos pela Lei n.º 117/2019, de 13-09), com base em erro judiciário, nos termos do artigo 13.º, n.º 1, da Lei n.º 67/2007, de 31-12 (“responsabilidade por erro judiciário”) exige, que as decisões sejam “manifestamente inconstitucionais ou ilegais”. No Acórdão de 28-02-2023, Proc. n.º 25639/18.4T8LSB.L2.S1-A, entendeu-se que «Este segmento normativo pressupõe uma ligação entre a decisão e a Constituição, e, portanto, um juízo de inconstitucionalidade. Ou seja, o direito aplicado na decisão deve afrontar ostensivamente e de forma arbitrária os princípios e a normas constitucionais, de tal modo que se possa afirmar que a decisão é, na sua ratio decidendi, contrária à Constituição, pelo que o erro tem de ser ostensivo, a grosseiro, evidente, arbitrário, revelando uma actividade dolosa ou gravemente negligente».

O recorrente aponta como decisão revidenda, objeto do presente recurso de revisão contra o Estado, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 11-07-2023, que confirmou o Acórdão da Relação que decidiu o indeferimento liminar de um recurso extraordinário de revisão, intentado com base na alínea c) do artigo 696.º do CPC, contra o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 28-11-2017, que confirmou a sentença, datada 08-03-2017, que decidiu ser aplicável, na ação de condenação intentada pelo autor contra os sócios de uma sociedade de que tinha sido gerente, um prazo de prescrição de três anos a contar da data em que o lesado teve conhecimento do direito que lhe compete, nos termos do nº 1 do artigo 498º do Código Civil.

As decisões às quais imputa ilegalidade e inconstitucionalidade, para o efeito de gerar responsabilidade civil do Estado, são aquelas que foram proferidas em 08-03-2017, pelo tribunal de 1.ª instância, e o Acórdão de Relação que a confirmou, entendendo que, por aplicação do prazo de prescrição previsto no n.º 1 do artigo 498.º do Código Civil, o direito do réu a obter uma indemnização por danos já estava extinto por prescrição.

Este Supremo Tribunal de Justiça, no Acórdão de 11-07-2023, nunca se pronunciou sobre o mérito da questão relativa ao prazo de prescrição, mas apenas sobre os requisitos de um documento como causa de revisão de uma sentença, tendo indeferido o pedido, em síntese, com o seguinte fundamento: «Um documento relativo a um processo administrativo de apoio judiciário, que podia ter sido junto ao processo principal, para demonstrar que à data da proposição desta ação ainda não tinha decorrido o prazo de prescrição do direito, não reúne os requisitos da novidade, da suficiência e da pré-alegação para servir de base a um recurso extraordinário de revisão, ao abrigo da al. c) do artigo 696.º do CPC».

Assim sendo, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 11-07-2023, não pode ser a decisão a rever. Aliás, resulta das próprias alegações, que, embora o recorrente tenha identificado como decisão a rever o citado Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, o que ele pretende obter é o reconhecimento da ilegalidade da sentença e do Acórdão da Relação que extinguiram o seu direito por prescrição. São estas, pois, as decisões a rever.

Ora, o Supremo Tribunal de Justiça, na medida em que não decidiu a questão de saber qual o prazo de prescrição aplicável ao caso - se o previsto no artigo 498.º com a duração de 3 anos, se o prazo geral de 20 anos fixado no artigo 309.º - não tem competência para conhecer do presente recurso extraordinário de revisão ao abrigo da al. h) do artigo 696.º do CPC, competência essa que cabe ao tribunal que proferiu a decisão que se pretende pôr em causa, nos termos do artigo 697.º, n.º 1, do CPC.

Em qualquer caso, já decorreu o prazo de 60 dias para a interposição de recurso, após o trânsito em julgado da decisão que se pretende impugnar, nos termos da al. b) do n.º 2 do artigo 697.º do CPC.»

3. Inconformado, o recorrente, notificado da Decisão Singular que indeferiu o presente Recurso de Revisão, veio, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 652.º, n.º 3, do CPC, requerer que sobre a matéria da decisão singular recaia acórdão, com os seguintes fundamentos que aqui se transcrevem:


«1º


Entendeu a Meritíssima Juiz Conselheira , que:

Este Supremo Tribunal de Justiça, no Acórdão de 11-07-2023, nunca se pronunciou sobre o mérito da questão relativa ao prazo de prescrição, mas apenas sobre os requisitos de um documento como causa de revisão de uma sentença, tendo indeferido o pedido, em síntese, com o seguinte fundamento: «Um documento relativo a um processo administrativo de apoio judiciário, que podia ter sido junto ao processo principal, para demonstrar que à data da proposição desta ação ainda não tinha decorrido o prazo de prescrição do direito, não reúne os requisitos da novidade, da suficiência e da pré-alegação para servir de base a um recurso extraordinário de revisão, ao abrigo da al. c) do artigo 696.º do CPC».

Assim sendo, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 11-07-2023, não pode ser a decisão a rever. Aliás, resulta das próprias alegações, que, embora o recorrente tenha identificado como decisão a rever o citado Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, o que ele pretende obter é o reconhecimento da ilegalidade da sentença e do Acórdão da Relação que extinguiram o seu direito por prescrição. São estas, pois, as decisões a rever.

Ora, o Supremo Tribunal de Justiça, na medida em que não decidiu a questão de saber qual o prazo de prescrição aplicável ao caso – se o previsto no artigo 498.º com a duração de 3 anos, se o prazo geral de 20 anos fixado no artigo 309.º - não tem competência para conhecer do presente recurso extraordinário de revisão ao abrigo da al. h) do artigo 696.º do CPC, competência essa que cabe ao tribunal que proferiu a decisão que se pretende pôr em causa, nos termos do artigo 697.º, n.º 1, do CPC.

Em qualquer caso, já decorreu o prazo de 60 dias para a interposição de recurso, após o trânsito em julgado da decisão que se pretende impugnar, nos termos da al. b) do n.º 2 do artigo 697.º do CPC.




Ora, salvo o devido respeito o ora recorrente não pode concordar em absoluto com a presente decisão, porquanto:



No âmbito dos presentes autos foi proferida em 8/3/2017, pelo Tribunal de Primeira Instância, sentença que considerou a presente acção improcedente, com fundamento na prescrição do direito invocado pelo Recorrente, ou seja, três anos a contar da data em que o lesado teve conhecimento do direito que lhe compete, embora com desconhecimento da pessoa do responsável e da extensão integral dos danos – nº 1 do artigo 498º do Código Civil



Decisão esta confirmada pelo Tribunal da Relação do Porto, por Acórdão datado de 28/11/2017.



Em 4/7/2022, o ora Recorrente apresentou Recurso de Revisão, junto do Tribunal da Relação do Porto, com fundamento nos termos do disposto no artigo 696º c) do C.P.C.



O Recurso supra identificado, obteve decisão definitiva, proferida pelo Supremo Tribunal de Justiça, datada de 11/7/2023, nos seguintes termos

Para além da ausência de novidade, suficiência e de pré-alegação, também em termos de direito material, considerando o regime da prescrição aplicado nos autos, a pretensão do autor, ainda que fosse atendível e se provassem os factos novos que o autor alega, também não seriam causais para permitir a procedência do pedido do autor, continuando a verificar-se a prescrição do direito que o autor invoca. Ou seja, o direito do autor sempre estaria prescrito, quer se tivesse por referência o pedido de apoio judiciário de 2010, quer o de 2011, em face da data em que o autor teve conhecimento do direito, maio de 2003.




Resultando assim evidente que, o Acordão proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça, pronunciou-se efetivamente, como resulta acima transcrito, acerca da duração do prazo de prescrição.



Pelo que, o Supremo Tribunal de Justiça, tem competência para conhecer do presente recurso extraordinário de revisão ao abrigo da al. h) do artigo 696.º do CPC, competência essa que cabe ao tribunal que proferiu a decisão que se pretende pôr em causa – no caso concreto a extinção do direito por prescrição- , nos termos do artigo 697.º, n.º 1, do CPC.



Por outro lado, a decisão que se pretende impugnar, apenas transitou em julgado em 23/05/2024, na sequência de Acordão proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça, no âmbito de Recurso de Revisão apresentado pelo Recorrente ao abrigo do disposto no artigo 696º c) do C.P.C.,

10º


Acórdão este notificado ao Recorrente em 13/5/2024.

11º


Ora, existindo um prazo de interposição do presente Recurso de 60 dias após o trânsito em julgado da decisão que se pretende impugnar, nos termos da al. b) do n.º 2 do artigo 697.º do CPC.

12º


E tendo o presente Recurso dado entrada em 12/7/2024, encontra-se integralmente cumprido o prazo de 60 dias de que o Recorrente dispunha para apresentar o seu Recurso nos termos da al. b) do n.º 2 do artigo 697.º do CPC.

Termos em que e nos demais de direito e, sempre com o muito douto suprimento de Vexas, se requer que seja proferido Acórdão sobre a decisão singular de não admissão do Recurso e, em consequência o presente recurso extraordinário de Revisão ser julgado procedente por provado, pelos fundamentos de facto e de direito invocados e, em consequência deverá ser revogada a Mui Douta Sentença, que julgou a acção improcedente, com o que se fará a devida Justiça!».

Cumpre apreciar e decidir.

II - Fundamentação

1. Como é sabido, à luz do recurso extraordinário de revisão a paz jurídica alcançada com o trânsito em julgado da decisão proferida pelo tribunal em ordem a resolver o litígio que lhe fora apresentado pode ser questionada em casos excecionais, taxativamente enunciados no artigo 696.º do CPC, em que se considera que a justiça foi ou pode ter sido seriamente afetada por vícios atinentes ao julgador (a decisão resulta de crime praticado pelo juiz no exercício das suas funções), à tramitação processual (o processo correu indevidamente à revelia do réu), às partes (nulidade ou anulabilidade de confissão, desistência ou transação em que a decisão se fundou; o litígio assenta sobre ato simulado das partes, sem que o tribunal se tivesse apercebido da fraude), à prova produzida (a decisão foi determinada por documento, ato judicial, depoimento, declarações de peritos ou árbitros que se revelou serem falsos, sem que essa matéria tenha sido alvo de discussão no processo em que a decisão foi proferida; a decisão foi proferida sem que se tivesse levado em consideração, por não ter sido apresentada perante o tribunal, documento de que a parte não tinha conhecimento ou de que não pôde fazer uso no processo em que foi proferida a decisão a rever e que, por si só, seria suficiente para modificar a decisão em sentido mais favorável à parte vencida; ou ainda a decisão proferida é inconciliável com decisão definitiva de uma instância internacional de recurso vinculativa para o Estado Português, ou resulta de erro jurisdicional suscetível de responsabilizar civilmente o Estado Português.

2. Esta em causa um ecurso extraordinário de revisão, previsto nos artigos 696º, alínea h) e 697.º, nº 1, do CPC, de decisão transitada em julgado suscetível de originar responsabilidade civil do Estado por danos emergentes do exercício da função jurisdicional.

Visa o recorrente obter a revogação do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 11 de julho de 2023 – que confirmou uma decisão do Tribunal da Relação do Porto, de 22-11-2022, que indeferiu liminarmente um recurso extraordinário de revisão (baseado na al. c) do artigo 696.º do CPC) do acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 28-11-2017, que julgou extinto o direito do autor por prescrição – e pedir uma indemnização ao Estado por erro judiciário, nos termos do artigo 13.º da Lei n.º 67/07, de 31-12.

3. Os autos principais consistiram numa ação de responsabilidade civil proposta pelo agora recorrente, AA, contra os sócios da sociedade B..., Lda., alegando que, por força da destituição do autor da gerência desta sociedade, que lhe foi comunicada em 13-05-2003, os réus deixaram de pagar as quantias devidas ao autor, que se endividou junto da banca, em nome próprio, mas no interesse da referida sociedade.

Por sentença proferida em 08-03-2017, foi a ação considerada improcedente, com fundamento na prescrição do direito invocado pelo Recorrente, tendo sido aplicada a norma ínsita no n.º 1 do artigo 498.º do Código Civil que estipula um prazo de três anos a contar da data em que o lesado teve conhecimento do direito que lhe competia.

Por acórdão do Tribunal da Relação do Porto, datado de 28-11-2017, foi a sentença confirmada.

No apenso D, o autor, AA, apresentou recurso extraordinário de revisão, nos termos do artigo 696.º, al. c), do CPC, do acórdão do Tribunal da Relação do Porto, datado de 28-11-2017, tendo o Tribunal da Relação do Porto, por acórdão datado de 22-11-2022, decidido indeferir liminarmente este recurso de revisão, por considerar, em suma, que o documento com o qual o recorrente fundamentou o recurso – emitido pelo Conselho Distrital de Lisboa da Ordem dos Advogados, quanto processo interno de nomeação de patrono oficioso para a propositura de ação (processo NP n.º 251327/2010) – não reunia os requisitos da novidade e da suficiência.

Após a interposição de recurso de revista, este Supremo Tribunal, por Acórdão proferido em 11-07-2023, agora acórdão revidendo, negou a revista e manteve o acórdão recorrido.

4. O Acórdão de 11-07-2023, foi já objeto de outro recurso extraordinário de revisão interposto pelo autor, AA, com base na al. c) do artigo 696.º, tendo o autor/recorrente invocado como documento um Acórdão deste Supremo Tribunal de Justiça proferido em 16-11-2023 no proc. n.º 11785/19.0T8SNT. que entendeu que o prazo de prescrição aplicável, noutro processo de responsabilidade civil em que o agora recorrente também foi autor, era o prazo geral de prescrição de 20 anos previsto na lei para a responsabilidade civil contratual.

O Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 07-05-2024, após constatar que que surge como anómalo um recurso de revisão interposto contra um acórdão (Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 11-07-2023) que foi ele próprio proferido num recurso de revisão no mesmo processo e que, portanto, não se pronunciou sobre o mérito da questão de fundo discutida no processo principal – a natureza da responsabilidade civil invocada pelo autor e a duração do prazo de prescrição – mas tão-só sobre os requisitos de admissibilidade de um recurso extraordinário de revisão com fundamento na al. c) do artigo 696.º do CPC – concluiu que uma sentença não constitui documento para efeitos de recurso de revisão com base no disposto no artigo 696.º, al. c), do CPC, confirmando a decisão singular que indeferiu liminarmente o recurso.

5. A Lei n.º 117/2019, de 13-09, acrescentou mais um fundamento de recurso de revisão. Pela alínea h), para tal aditada, passa também a poder ser objeto do recurso extraordinário de revisão a decisão transitada em julgado quando “seja suscetível de originar a responsabilidade civil do Estado por danos emergentes do exercício da função jurisdicional, verificando-se o disposto no artigo seguinte”.

Tem-se aqui em vista a Lei n.º 67/2007, de 31.12, que aprovou o regime de responsabilidade civil extracontratual do Estado e demais entidades públicas.

No artigo 13.º, n.º 1 desse regime estatui-se que “sem prejuízo do regime especial aplicável aos casos de sentença penal injusta e de privação injustificada da liberdade, o Estado é civilmente responsável por danos decorrentes de decisões jurisdicionais manifestamente inconstitucionais ou ilegais ou injustificadas por erro grosseiro na apreciação dos respetivos pressupostos de facto.”

O n.º 2 deste artigo exige que o pedido de indemnização seja fundado na prévia revogação da decisão danosa pela jurisdição competente.

Ora, a referida alínea veio instituir o recurso de revisão como meio processual adequado à revogação da decisão de onde emerge a responsabilização civil do Estado.

A responsabilidade baseada no erro judiciário pode assentar quer no erro de direito (quando a decisão é inconstitucional ou ilegal) quer no erro de facto (quando existe erro grosseiro no julgamento da matéria de facto).

6. O recorrente invoca no presente recurso um erro de direito quanto à norma aplicável, que seria, não a norma do artigo 498.º, n.º 1, do Código Civil, que prevê para a obrigação de indemnização decorrente de responsabilidade civil extracontratual um prazo de prescrição curto de 3 anos, como entendeu o acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 28-11-2017, que constituiu a última decisão transitada que incidiu sobre esta questão, mas o prazo geral de 20 anos aplicável à responsabilidade civil contratual nos termos do artigo 309.º do Código Civil.

Entendeu a Relatora, na decisão singular, que o Supremo não é o tribunal competente para conhecer do presente recurso, pois não proferiu a decisão que o autor pretende rever – aquela que declarou extinto o seu direito por prescrição, sendo abusiva a conclusão 19 da alegação de recurso quando afirma que esta decisão do Supremo absolveu os réus do pedido.

Como ficou demonstrado com a descrição da tramitação processual atrás apresentada, a decisão a rever é o acórdão da Relação do Porto, de 28-11-2017, que confirmou a sentença do tribunal de 1.ª instância de 08-03-2017. Com efeito, foi esta a última decisão transitada em julgado a pronunciar-se sobre o mérito da questão, em relação à qual o recorrente considera ter havido erro grosseiro.

Quanto ao Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 11-07-2023, reiteramos que não conheceu do mérito da questão, nem absolveu os réus do pedido, tendo apenas analisado os requisitos de um documento para constituir fundamento para um recurso extraordinário de revisão interposto do citado acórdão da Relação de 28-11-2017, como se pode ler nos seus fundamentos e no dispositivo.

« 10. Assim, o objeto do recurso de revisão interposto pelo autor AA traduz-se em saber se o documento por si apresentado reúne os requisitos exigidos pelo artigo 696.º, al. c), do CPC.

O Tribunal da Relação, por acórdão datado de 22-11-2022, decidiu indeferir liminarmente este recurso de revisão, por considerar, em suma, que, por referência ao documento junto pelo recorrente, não se mostram verificados os requisitos da novidade e da suficiência.

Quid iuris?

Este documento integra várias comunicações que o CDLOA fez, ao longo do tempo, ao recorrente, bem como cartas e requerimentos feitos pelo autor ao Conselho de Deontologia, pelo que apesar de se poder considerar que, na íntegra, ele não era do conhecimento do recorrente, resulta da análise do processo que o recorrente era conhecedor das comunicações que sucessivamente lhe iam sendo feitas, bem como das missivas e requerimentos que remetia ao referido processo. Ademais, sempre esteve na sua disponibilidade conhecê-lo na íntegra, pois o processo de nomeação da Ordem dos Advogados existe desde 2010.

De salientar, ainda, que o apenso B dos autos principais respeita a recurso de revisão precedente do presente, no qual o documento apresentado corresponde a parte do documento que agora apresenta na totalidade (cfr. apenso B do processo físico).

Ademais, considerando o teor da decisão do acórdão cuja revisão se pretende, a ratio decidendi desse acórdão prende-se com a prescrição do direito invocado pelo Recorrente, o qual, nos termos do artigo 498.º, n.º 1, do Código Civil, é de 3 anos a contar da data em que o lesado teve conhecimento do direito que lhe compete, embora com desconhecimento da pessoa do responsável e da extensão integral dos danos. E considerou esse acórdão que o recorrente terá tido conhecimento do direito pelo menos em maio de 2003, pelo que, tendo instaurado a ação em 17-07-2015, já o seu direito se mostrava prescrito.

Este acórdão, proferido pelo Tribunal da Relação nos autos principais, para aferir da prescrição do direito do autor, considerou o pedido de apoio judiciário efetuado pelo autor/recorrente em 12-04-2011, por ter sido esse o único pedido apresentado e alegado pelo autor, ora recorrente.

O autor não invocou naqueles autos, e podia tê-lo feito, nem o pedido de apoio judiciário que agora invoca, nem a ação n.º 1728/06.7..., que terá transitado em julgado em abril de 2014, para deles extrair os efeitos processuais que pretendia (cfr. processo principal do presente apenso).

Logo à data da proposição da ação principal, em 2015, se o autor pretendia beneficiar do disposto no artigo 33.º, n,º 4, da Lei do Apoio Judiciário (LAJ), segundo o qual a ação se considera proposta na data em que for apresentado o pedido de nomeação de patrono, com referência ao pedido de apoio judiciário datado de 2010, que agora junta, devia tal facto ter sido desde logo alegado, por se tratar de um facto pessoal de que o autor tinha conhecimento.

O documento que sustenta este pedido, e que agora foi junto, e bem assim a cópia do pedido de apoio judiciário que lhe deu origem, servem como meio de prova documental de facto que, necessariamente, devia ter sido alegado naquela ocasião, aquando da propositura da ação onde foi proferida a decisão cuja revisão o autor pretende.

O autor devia, igualmente, ter alegado e provado a existência da ação n.º 1728/06.7..., o que também não fez, embora nessa data também tivesse conhecimento desses factos e o seu acesso fosse público.

Para além da ausência de novidade, suficiência e de pré-alegação, também em termos de direito material, considerando o regime da prescrição aplicado nos autos, a pretensão do autor, ainda que fosse atendível e se provassem os factos novos que o autor alega, também não seriam causais para permitir a procedência do pedido do autor, continuando a verificar-se a prescrição do direito que o autor invoca. Ou seja, o direito do autor sempre estaria prescrito, quer se tivesse por referência o pedido de apoio judiciário de 2010, quer o de 2011, em face da data em que o autor teve conhecimento do direito, maio de 2003.

Quanto ao trânsito em julgado da ação n.º 1728/06.7..., que também agora o autor usa como argumento para sustentar a interrupção do prazo de prescrição, este facto não foi invocado na ação cuja revisão se pretende.

O autor, ora recorrente, não poderia, pois, beneficiar do prazo legal de dois meses previsto no artigo 327.º, n.º 3, do Código Civil, pois para além de ter conhecimento do seu direito desde 2003, bem como das pessoas que alegadamente praticaram os atos cuja responsabilidade o autor reclama, a verdade é que autor não alegou nos autos principais os factos atinentes ao proc. n.º 1728/06.7... e que já eram do seu conhecimento. E, para que o autor pudesse beneficiar da sucessão de factos que agora alega, devia tê-los invocado na ação principal, pois deles tinha prévio conhecimento.

11. Assim, deve entender-se que, de acordo com a jurisprudência constante do Supremo Tribunal de Justiça, o documento agora apresentado não reúne os requisitos para que seja admitido um recurso de revisão extraordinário interposto com fundamento na alínea c) do artigo 696.º do CPC, por três motivos:

1) o documento apresentado não é suscetível de destruir o juízo probatório realizado em sede da decisão revidenda, nem impõe uma decisão mais favorável ao recorrente quanto ao decurso do prazo de prescrição (requisito da suficiência);

2) o documento apresentado não é novo, no sentido exigido pela lei, pois que já podia o recorrente ter feito uso dele no processo principal na medida em que conhecia (ou podia facilmente conhecer) a sua existência (requisito da novidade);

3) o documento apresentado visa obter a prova de factos novos, não discutidos nem alegados no processo principal, e que não se revestem de essencialidade para a decisão de mérito colocada em crise (requisito da pré-alegação).

12. Concluímos, pois, que a pretensão do recorrente deverá improceder em face da ausência de novidade, suficiência e pré-alegação do documento apresentado.

13. Anexa-se sumário elaborado pela Relatora, de acordo com o n.º 7 do artigo 663.º do CPC:

I – No recurso de revisão interposto com fundamento na alínea c) do artigo 696.º do CPC, a jurisprudência constante do Supremo Tribunal de Justiça considera que a apresentação de documento só será admissível, quando: (i) o documento, por si só, e sem apelo a demais elementos probatórios, seja capaz de destruir o juízo probatório realizado em sede da decisão revidenda e imponha uma decisão mais favorável ao recorrente (requisito da suficiência); (ii) e quando o recorrente não tenha podido fazer uso do documento por desconhecimento da sua existência ou pela sua inexistência (requisito da novidade); iii) o documento deve visar a demonstração ou a impugnação de factos alegados pelas partes ou adquiridos para o processo que tenham sido essenciais para a decisão de mérito colocada em crise, não podendo em caso algum visar a prova de factos novos (requisito da pré-alegação).

II - Um documento relativo a um processo administrativo de apoio judiciário, que podia ter sido junto ao processo principal, para demonstrar que à data da proposição desta ação ainda não tinha decorrido o prazo de prescrição do direito, não reúne os requisitos da novidade, da suficiência e da pré-alegação para servir de base a um recurso extraordinário de revisão, ao abrigo da al. c) do artigo 696.º do CPC.

III – Decisão

Pelo exposto, decide-se negar a revista e confirmar o acórdão recorrido».

Custas pelo recorrente».

7. A frase citada pelo recorrente nas conclusões do recurso (conclusão n.º 3, al. b) e na reclamação para a Conferência (conclusão 6.ª), para além de constituir um obiter dictum, que não constituiu o fundamento efetivo da decisão, não significa sequer que este Supremo tenha entendido que o prazo de prescrição aplicável fosse o prazo de 3 anos vigente para a responsabilidade civil extracontratual. Tratou-se, tão-só, como bem sabe a mandatária do recorrente, de analisar a suficiência do documento apresentado para fundamentar um recurso extraordinário de revisão que implicasse, como pretendia o recorrente, a revogação de uma decisão transitada, não por ser outro o direito aplicável – o que nem seria possível analisar no recurso extraordinário de revisão, que não tem por objeto re-discutir a questão de direito dos autos principais – mas por ser outra, na perspetiva do recorrente, a data do conhecimento do direito em função do documento apresentado, o que teria por consequência uma mudança no início da contagem do prazo de 3 anos.

A tese do recorrente, que transforma o recurso de revisão num reexame das questões de direito decididas no processo principal, como se estivesse em causa um recurso ordinário, torna as decisões judiciais indefinidamente recorríveis e discutíveis, com a agravação de que o recorrente usa sistematicamente o expediente anómalo de interpor recursos extraordinários de revisão de acórdãos proferidos também em recursos extraordinários de revisão.

Embora o inconformismo seja legítimo, esta conduta, pela sua reiteração, pode vir a constituir uma litigância de má fé da mandatária, uma vez que se presume que o recorrente, não tendo formação jurídica, não domina conceitos de direito e delega essas questões na mandatária.

8. Dispõe o artigo 697.º, n.º 1, do Código Civil, que o recurso extraordinário de revisão é interposto no tribunal que proferiu a decisão a rever.

A jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça acerca desta questão apresenta grande uniformidade no sentido de que a revisão compete ao tribunal que proferiu a decisão transitada em julgado que se pretende rever.

Para o efeito, veja-se os acórdãos deste Supremo Tribunal de Justiça, de 05-06-2019 (proc. n.º 15/10.0TTPRT-B.P1.S1) e o de 19/10/2017 (proc. n.º 181/09.8TBAVV-A.G1.S1), onde respetivamente se sumariou que «Nos termos do art.º 697.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, o recurso extraordinário de revisão deve ser interposto no tribunal que proferiu a decisão a rever, que é o Tribunal da Relação nos casos em que este confirmou uma sentença do Tribunal de 1ª instância» e ainda que «Tendo a sentença proferida em 1.ª instância sido impugnada e tendo a Relação proferido acórdão confirmatório da mesma, apreciando definitivamente a questão de facto e de direito controvertida, é à Relação que cabe conhecer do recurso extraordinário de revisão por ter proferido a decisão a rever (art. 697.º, n.º 1, do CPC).»

O Acórdão deste Supremo de 05-06-2019 cita outros acórdãos que adotaram a mesma posição (Acórdãos de 19/9/2013, processo n.º 663/09.1TVLSB.S1; de 08-03-2012, processo n.º 970/05.2PEOER-C.S1; de 13/3/2009, processo n.º 09P316, de 12/2/2009, processo n.º 09B076; de 12/2/2004, processo n.º 03B3461; de 18/12/2003, processo n.º 03B2840 e de 23/3/1992, processo n.º 083337).

No passado dia 26 de novembro de 2024, em Acórdão proferido nesta Secção no processo n.º 31206/15.7T8LSB.E1-A.S1, entendeu-se, em consonância com o agora decidido, o seguinte:

«V – A jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça é, praticamente, uniforme no sentido de que a revisão compete ao Tribunal que proferiu a decisão transitada em julgado que se pretende rever.

VI – O Tribunal da Relação conhece do mérito da causa quando se tenha envolvido efetivamente na resolução material do litígio, no todo ou em parte, máxime nos casos em que julga procedente ou improcedente o pedido ou algum dos pedidos ou aprecia a procedência ou improcedência de alguma exceção perentória.

VII – Tendo a sentença proferida em 1.ª instância sido impugnada e tendo a Relação proferido acórdão confirmatório da mesma, apreciando definitivamente a questão de facto e de direito controvertida, é à Relação que cabe conhecer do recurso extraordinário de revisão por ter proferido a decisão a rever (art. 697º/1, do CPCivil)».

Na doutrina também é este o entendimento, conforme se escreve no Código de Processo Civil Anotado, coord. por Lebre de Freitas/Ribeiro Mendes/Isabel Alexandre (Volume 3.º, 3.ª edição, Almedina, Coimbra, 2022, pp. 320-321), onde se afirma que “O tribunal competente é o tribunal que proferiu a decisão que se pretende pôr em causa”, ou seja, “o tribunal de recurso, que, confirmando a decisão, a cobriu com a sua autoridade, formando o caso julgado”.

No citado Acórdão deste Supremo, de 05-06-2019 refere-se também neste sentido a opinião de outros processualistas:

«(…) Fernando Amâncio Ferreira (Manual dos Recursos em Processo Civil, Almedina, 8,ª edição, pág.327) defende que, por interpretação sistemática, o recurso deve ser dirigido ao tribunal onde foi cometida a anomalia ou aconteceu a omissão que suporta o fundamento da revisão.

Já Ribeiro Mendes (Recursos em Processo Civil – Reforma de 2007, pág. 201) sustenta que «Tendo havido recurso da decisão da 1.ª instância confirmada pelo tribunal de recurso, deve entender-se que a decisão revidenda é a última decisão confirmatória».

Também Abrantes Geraldes (Recursos no Novo Código de Processo Civil, Almedina, 3.ª edição, pág. 454), ao anotar o art.º 697.º do Código de Processo Civil, refere que «Da norma decorre que a competência para a apreciação do recurso de revisão pode pertencer ao tribunal de 1.ª instância, à Relação ou ao Supremo Tribunal de Justiça. Tudo depende do órgão jurisdicional que proferiu a decisão transitada em julgado.

Na verdade, uma vez que o nosso sistema de recursos está estruturado na regra da substituição (art.º 665.º do Código de Processo Civil) e não na cassação, em caso de recurso a decisão definitiva que subsiste para todos os efeitos é a do tribunal superior.

Como sublinha Alberto dos Reis (Código de Processo Civil Anotado, Coimbra Editora, Vol. VI, 1981, pág. 379) «A revisão deve ser interposta perante o tribunal que proferiu a decisão a rever», pois «Não fazia sentido que se requeresse a revisão na 1.ª instância quando a finalidade era obter a substituição por outro de acórdão da Relação ou do Supremo».

O mesmo autor dá o exemplo de a Relação confirmar a sentença de 1.ª instância e havendo recurso de revista que confirme o acórdão da Relação, o tribunal competente para a revisão será o Supremo».

No caso concreto dos autos, analisado todo o processado, a decisão transitada em julgado, cuja revisão se pretende, não pode deixar de ser o acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 28-11-2017, que incidiu sobre o prazo de prescrição do direito do autor, absolvendo, de forma definitiva, os recorridos do pedido do autor.

Embora o autor invoque como decisão revidenda o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 11-07-2023 – o que parece tratar-se de uma estratégia para contornar a inobservância de prazos para impugnar o acórdão da Relação de 28-11-2017 – resulta da interpretação de todo o processado (v. conclusões 8 a 11 do recurso agora interposto) que é ao acórdão da Relação, de 28-11-2017, que se pronunciou sobre o mérito da ação por si proposta, julgando-a improcedente, que o autor imputa um erro grosseiro de direito, pelo que o recurso extraordinário de revisão tem de ser interposto no tribunal de 2.º grau e não no Supremo.

9. Nos termos do artigo 697.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, o recurso extraordinário de revisão deve ser interposto no tribunal que proferiu a decisão a rever, que é o Tribunal da Relação, nos casos em que este confirmou uma sentença do tribunal de 1ª instância que julgou a ação improcedente por prescrição do direito do autor.

Conclui-se, pois, que em face desta regra de competência, uma decisão proferida em resposta a um recurso extraordinário de revisão, interposto, com base na al. c) do artigo 696 do CPC, do acórdão da Relação proferido nos mesmos autos principais agora em causa, não pode constituir uma decisão revidenda para o presente recurso de revisão, interposto ao abrigo da al. h) do artigo 696.º do CPC, porque não conheceu do mérito do pedido do autor.

10. Em consequência, nos termos dos artigos 99.º, n.º 1, segunda parte, e 641.º, n.º 1, parte final, «ex vi» do artigo 699.º, n.º 1, todos do Código de Processo Civil, a incompetência absoluta implica, no caso, o indeferimento do requerimento de interposição do recurso extraordinário de revisão, conforme decidiu a decisão singular, que se confirma nos seus exatos termos.

11. O conhecimento da questão do prazo para a interposição do recurso de revisão fica prejudicada pela resposta dada à questão do tribunal competente.

12. Anexa-se sumário elaborado de acordo com o n.º 7 do artigo 663.º do CPC:

I - Nos termos do artigo 697.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, o recurso extraordinário de revisão deve ser interposto no tribunal que proferiu a decisão a rever, que é o Tribunal da Relação, nos casos em que este confirmou uma sentença do tribunal de 1ª instância que julgou a ação improcedente por prescrição do direito do autor.

II – Uma decisão proferida em resposta a um recurso extraordinário de revisão, interposto, com base na al. c) do artigo 696.º do CPC, do acórdão da Relação proferido nos mesmos autos principais agora em causa, não pode constituir uma decisão revidenda para o presente recurso de revisão, interposto ao abrigo da al. h) do artigo 696.º do CPC, porque não conheceu do mérito do pedido do autor.

III – Decisão

Pelo exposto, decide-se, em Conferência, no Supremo Tribunal de Justiça, indeferir a reclamação e confirmar a decisão singular de indeferimento liminar do recurso.

Custas pelo recorrente à taxa de 3 UC’s

Lisboa, 10 de dezembro de 2024

Maria Clara Sottomayor (Relatora)

Nelson Borges Carneiro (1.º Adjunto)

Maria João Vaz Tomé (2.º Adjunto)