I - A decisão genérica ou tabelar sobre pressupostos processuais, não faz caso julgado no processo.
II - O art. 71.º do CPP, consagra o princípio da adesão da acção civil ao processo penal, fazendo jus ao princípio da suficiência do processo penal (art. 7.º do CPP), de acordo com o qual a indemnização pelos danos causados pela prática de um crime (calculados nos termos da lei civil – art. 129.º do CP) devem ser pedidos no processo-crime, só podendo sê-lo em separado (na jurisdição/ tribunal normalmente competente) nos casos expressos lei.
III - Não tendo os arguidos demandos na acção penal, sido demandados ou intervenientes na acção administrativa proposta nos tribunais administrativos, que tem como causa a responsabilidade contratual e em que não foram parte, não há qualquer obstáculo à sua demanda no processo penal, em face da diferente causa de responsabilidade.
IV - Decorre dos princípios da adesão e da suficiência do processo penal que a apreciação da responsabilidade civil (extracontratual) emergente de um crime, não é excluída dos tribunais criminais pelo facto de o seu agente estar submetido, normalmente à jurisdição administrativa, ou qualquer outra.
V - Através dessa norma – art. 71.º do CPP – atributiva da competência aos tribunais criminais (civis) para resolver todas as questões que interessem à decisão da causa -, e mesmo que se decida suspender o processo penal para a questão ser solucionada fora do processo criminal, este readquire essa competência se findo o prazo de suspensão não tiver ainda sido decidida no foro próprio (n.º 4, in fine CPP) - decorre a prevalência do conhecimento da questão no processo penal.
VI - A declaração de perda de vantagens, ao abrigo do art. 110.º, n.os 1, al. b), 2 e 4, do CP, é consequência da prática do crime e não tendo o arguido recorrido do mesmo, não é admissível recurso quanto à decisão que declarou àquela perda (art. 400.º, n.º 1, al. c), do CPP).
Acordam, em conferência, os juízes, na 3ª Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça.
No Proc. C. C. nº 39/14.9TASCF.L1 a correr termos no Juízo Central Cível e Criminal de Angra do Heroísmo, do Tribunal Judicial da Comarca dos Acores em que são arguidos:
AA,
BB
Castanheira & Soares, Ld.ª,
Foi por acórdão de 24/11/2022 decidido:
“1. Não admitir neste processo crime o pedido de indemnização civil deduzido pelo Município das Lajes das Flores contra os arguidos/demandados AA e BB e absolver os demandados AA e BB da instância.
2. Condenar o arguido AA pela prática, em co-autoria material e na forma consumada, de um crime de falsificação de documento, previsto e punido pelos artigos 256.º, n.º 1, al. d), e n.º 4, 386.º, n.º 1, al. b), 26.º, 28.º, n.º 1, 11.º, n.ºs 2 e 7, e 12.º, todos do Código Penal, e art.º 5.º da Lei nº 34/87, de 16 de julho, na pena de 2 (dois) anos de prisão.
3. Condenar o arguido AA pela prática, em co-autoria material e na forma consumada, de um crime de peculato, previsto e punido pelo artigo 20.º, n.º 1, da Lei n.º 34/87, de 16 de julho, e artigo 28.º do Código Penal, na pena de 4 (quatro) anos e 5 (cinco) meses de prisão e de 70 (setenta) dias de multa, à taxa diária de € 20,00 (vinte euros), no total de € 1.400,00 (mil e quatrocentos euros).
4. Em cúmulo jurídico das penas parcelares de prisão referidas em 2 e 3 do dispositivo, condenar o arguido AA, na pena única de 5 (cinco) anos de prisão, suspensa na sua execução por (5) cinco anos, e de 70 (setenta) dias de multa, à taxa diária de € 20,00 (vinte euros), no total de € 1.400,00 (mil e quatrocentos euros).
5. Condenar o arguido BB pela prática, em co-autoria material e na forma consumada, de um crime de falsificação de documento, previsto e punido pelos artigos 256.º, n.º 1, al. d), e n.º 4, 386.º, n.º 1, al. b), 26.º, 28.º, n.º 1, 11.º, n.ºs 2 e 7, e 12.º, todos do Código Penal, e art.º 5.º da Lei nº 34/87, de 16 de julho, na pena de 2 (dois) anos de prisão.
6. Condenar o arguido BB pela prática, em co-autoria material e na forma consumada, de um crime de peculato, previsto e punido pelo artigo 20.º, n.º 1, da Lei n.º 34/87, de 16 de julho, e artigo 28.º do Código Penal, na pena de 3 (três) anos e 9 (nove) meses de prisão e de 60 (sessenta) dias de multa, à taxa diária de € 10,00 (dez euros), no total de € 600,00 (seiscentos euros).
7. Em cúmulo jurídico das penas parcelares de prisão referidas em 5 e 6 do dispositivo, condenar o arguido BB, na pena única de 4 (quatro) anos e 3 (três) meses de prisão, suspensa na sua execução por 4 (quatro) anos e 3 (três) meses, e de 60 (sessenta) dias de multa, à taxa diária de € 10,00 (dez euros), no total de € 600,00 (seiscentos euros).
8. Condenar a arguida Castanheira & Soares, Ld.ª pela prática, em co-autoria material e na forma consumada, de um crime de falsificação de documento, previsto e punido pelos artigos 256.º, n.º 1, al. d), e n.º 4, 386.º, n.º 1, al. b), 26.º, 28.º, n.º 1, 11.º, n.ºs 2 e 7, e 12.º, todos do Código Penal, e art.º 5.º da Lei nº 34/87, de 16 de julho, na pena de 500 (quinhentos) dias de multa, à taxa diária de € 100,00 (cem euros), o que perfaz o total de € 50.000,00 (cinquenta mil euros).
9. Não declarar perdida a favor do Estado a quantia de € 521.145,96 e não condenar os arguidos ao pagamento ao Estado de tal quantia.
10. Condenar os arguidos AA, BB e Castanheira & Soares, Ld.ª nas custas do processo, fixando-se a taxa de justiça em 4 (quatro) UC’s para cada arguido (cfr. art.º 8.º n.º 9 do Regulamento das Custas Processuais e tabela III anexa).
Após trânsito em julgado, remeta boletins ao Registo Criminal.
Após trânsito em julgado, nos termos do disposto no art.º 8.º, nº 2, da Lei nº 5/2008, de 12 de fevereiro, proceda à recolha de ADN dos arguidos AA e BB, nos moldes previstos no mencionado diploma legal.”
Desta decisão recorreram os arguidos BB e Castanheira & Soares, Ld.ª e ainda o Ministério Público e a assistente Município das Lajes das Flores, para a Relação de Lisboa suscitando as seguintes questões:
a) arguido BB:
i) Se ocorrem os vícios previstos no art.º 410.º, n.º 2, do Código Processo Penal, de conhecimento oficioso, nomeadamente o da insuficiência para a decisão da matéria de facto provada (al. a)), da contradição insanável entre a matéria de facto provada e a não provada e da fundamentação (al. b)) e do erro notório na apreciação da prova (al. c)) [conclusões 3ª, 4ª a 10ª, 12ª a 41ª];
ii) Se estão reunidos os pressupostos legais de que depende a reapreciação da prova produzida (artigo 412º, nº 3 e 4 do Código de Processo Penal) e, em caso afirmativo, se deve operar modificação da decisão do Tribunal a quo sobre a matéria de facto assente nos pontos 11 a 17 dos factos provados e, por via dela, ser o arguido absolvido [conclusões 2ª, 11ª a 40ª, 43ª, 46ª a 59ª];
b) arguida Castanheira & Soares, Lda.:
i) Se estão reunidos os pressupostos legais de que depende a reapreciação da prova produzida (artigo 412º, nº 3 e 4 do Código de Processo Penal) e, em caso afirmativo, se deve operar modificação da decisão do Tribunal a quo sobre a matéria de facto assente nos pontos 16, 16.1 e 16.2 dos factos provados e, por via dela, ser a arguida absolvida [conclusões 1ª a 6ª];
ii) Se ocorre erro de subsunção fáctico-jurídica relativamente à comunicabilidade da qualidade de funcionário/titular de cargo político;
iii) Se a medida concreta da pena é excessiva;
c) do Ministério Público:
i) Se a decisão de não declaração de perdimento a favor do Estado da quantia de € 521.145,96 €, é violadora do artigo 110º, nºs 1, 2 e 4 do Código Penal;
d) assistente Município das Lajes das Flores:
i) Se a decisão recorrida de não admissão do pedido de indemnização civil deduzido pelo assistente, contra os arguidos/demandados AA e BB e consequente absolvição dos mesmos da instância, está ferido de nulidade por violação do caso julgado formal e/ou violação do princípio da adesão.
Por acórdão de 11/4/2024 a Relação de Lisboa decidiu:
“1) Declarar a incompetência do tribunal criminal, em razão da matéria, para apreciar o pedido de indemnização civil formulado e consequentemente decidir manter a decisão recorrida de absolvição dos demandados da instância civil enxertada nos autos, ainda que com diverso fundamento, considerando prejudicada a apreciação dos fundamentos do recurso interposto pelo demandante civil/assistente Município das Lajes das Flores;
2) Conceder provimento ao recurso interposto pelo Ministério Público e, em consequência, revogar o acórdão recorrido na parte em que não declarou perdida a favor do Estado a quantia de € 521.145,96 (quinhentos e vinte e um mil, cento e quarenta e cinco euros e noventa e seis cêntimos) e condenar os arguidos AA, BB e Castanheira & Soares, Lda., a pagar, solidariamente, ao Estado tal quantia, a título de perda de vantagem;
3) Negar provimento aos recursos interpostos pelos arguidos BB e Castanheira & Soares, mantendo-se a decisão recorrida.
Custas pelos recorrentes BB e Castanheira & Soares, fixando-se em 4 UC´s a taxa de justiça devida por cada recorrente.”
Do assim decidido recorrem para este Supremo Tribunal de Justiça o arguido AA e o assistente Município das Lajes das Flores,
- O arguido AA coloca em causa a condenação proferida da perda de vantagem, formulando as seguintes conclusões:
“O presente recurso vem interposto de acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa, por via do qual, dando provimento ao recurso interposto pelo Ministério Público, decidiu revogar o acórdão de 1a instância, na parte em que não declarou perdida a favor do Estado a quantia de € 521.145,96 (quinhentos e vinte e um mil, cento e quarenta e cinco euros e noventa e seis cêntimos), e em consequência, condenar o arguido AA, a pagar (solidariamente) ao Estado tal quantia, a título de perda de vantagem. Na verdade, e salvaguardado o devido respeito, o ora recorrente não se conforma com a presente decisão, nos termos e fundamentos em que a mesma se sustenta. Dai que para o ora recorrente, a presente condenação que ora se impugna é, salvo melhor opinião, injusta e excessiva, violando os princípios da necessidade, proporcionalidade e adequação da aplicação das sanções. Da Perda das Vantagens do Crime a favor do Estado. Inconformado com o segmento do acórdão de primeira instância que não declarou perdido a favor do Estado a quantia de € 521.145,96 96 (quinhentos e vinte e um mil, cento e quarenta e cinco euros e noventa e seis cêntimos), correspondente à vantagem patrimonial resultante do cometimento dos ilícitos de falsificação e peculato em apreciação nos autos, recorreu o Ministério Público para o Tribunal da Relação de Lisboa, visando decisão que decretasse a perda da referida quantia, em nome da autonomia do instituto da perda de vantagens relativamente ao direito de indemnização do lesado e a sua compatibilidade legal. No seu acórdão, entendeu o Tribunal da Relação de Lisboa que: A questão que nos é colocada por via do recurso é a de saber se co-existindo uma acção judicial pendente no âmbito da qual foi formulado pelo lesado pedido de indemnização civil correspondente a tal vantagem patrimonial [sob a forma de danos/prejuízo patrimonial], poderá ser declarada a perda de tal valor, ao abrigo do regime previsto no artigo 110° do Código Penal. Tendo embora por certo que o demandado não poderá pagar duas vezes a mesma quantia, pois tal corresponderia a um empobrecimento injustificado, temos igualmente como mais consentâneo com o regime legal previsto a posição que sustenta não ocorrer qualquer incompatibilidade entre o decretamento do confisco previsto no art. 110° do Código Penal e a procedência do pedido de indemnização civil formulada pelo lesado, podendo este, nos termos do artigo 130°, nº2 do Código Penal "fazer-se pagar" quanto aos danos causados pelo valor das vantagens recebidas pelo Estado. Pelo exposto, contrariamente ao decidido pelo Tribunal recorrido, entendemos não ocorrer nenhuma incompatibilidade entre a pretensão de perda de vantagens formulada nos autos pelo Ministério Público e o pedido de indemnização deduzido pelo lesado no âmbito do Processo n° 269/15.6..., que corre termos no Tribunal Administrativo e Fiscal de ..., pelo que se impõe dar provimento ao recurso interposto pelo Ministério Público, condenando solidariamente os arguidos a pagar ao Estado a quantia de € 521.145,96, a título de perda de vantagem. Salvo melhor opinião e saber, pugnamos por entendimento contrário. E dizemo-lo porquanto, no quadro do nosso direito penal não se pode ter por verificado uma duplicação de penalizações para o agente do crime. O que se verificará no caso concreto, sempre que, pela procedência do pedido de indemnização civil correspondente à vantagem patrimonial, for declarada a perda do mesmo valor, ao abrigo do regime do confisco. Até porque, se a perda de vantagens tem como objetivo fazer com que o agente do crime não retire qualquer vantagem dessa prática - porque o crime não compensa, tal desiderato decai por inutilidade superveniente verificada a condenação em pedido indemnizatório. Dai que por maioria de razão, a declaração de perdas e vantagens apenas deverá operar, em paralelo com o pedido cível, sempre que de tal sintonia, não resulte uma dupla penalização para o agente do crime. Dai que não se justifica, nem tem fundamento o recurso à declaração de perda de bens a favor do Estado, com um objeto coincidente à dedução do pedido de indemnização, pois outra atitude, ofenderia a consciência jurídica e violaria os mais elementares princípios constitucionais. Pelo que a formulação do pedido de indemnização civil, quando seja pelo valor que o agente do crime obteve vantagem, deverá inviabilizar a declaração de perda de vantagens. Tudo numa espécie de binómio compressão/expansão entre essa formulação do pedido de indemnização civil e a declaração de perda de vantagens, sob pena de tal declaração se afigurar inútil e inconsequente. Donde, somos frontalmente a discordar da posição assumida na presente decisão, posto que a mesma acolhe uma interpretação do artigo 110.° do Código Penal, no sentido de que é compatível a declaração de perda de vantagens, com a pendência de pedido de indemnização formulado pelo lesado, mesmo nos casos em que o valor do pedido corresponde ao valor da vantagem patrimonial, porquanto tal entendimento consubstancia uma dupla penalização para o agente do crime. Razão pela qual entendemos por existente uma intrínseca incompatibilidade entre a pretensão de perda de vantagens formulada nos autos pelo Ministério Público e o pedido de indemnização deduzido pelo lesado no âmbito do Processo nº 269/15.6..., que corre termos no Tribunal Administrativo e Fiscal de .... Razão pela qual pugnamos que face aos argumentos debitados, sustentados na jurisprudência referenciada, se dê provimento ao recurso ora interposto pelo arguido, revogando-se o acórdão recorrido na parte em que declarou perdida a favor do Estado a quantia de € 521.145,96 (quinhentos e vinte e um mil, cento e quarenta e cinco euros e noventa e seis cêntimos) e em que condenou o arguido AA, a pagar, solidariamente, ao Estado tal quantia, a título de perda de vantagem.”
- O Município, coloca em causa a declaração de incompetência do tribunal civil /penal para conhecer do pedido de indemnização civil deduzido, absolvendo da instancia os demandados e não conhecendo dos fundamentos do pedido do assistente Município, formulando as seguintes conclusões:
“I. Por douto acórdão datado de 11 de abril de 2024, o Tribunal da Relação de Lisboa considerou que o Tribunal da 1.ª Instância é materialmente incompetente para conhecer do pedido cível, porquanto a causa de pedir insere-se no âmbito da responsabilidade civil por factos ilícitos, cometidos no âmbito de um contrato de empreitada de execução de obra municipal, pelo que a competência para julgar tal litígio é dos tribunais administrativos e fiscais, nos termos do disposto nos artigos 4º, alíneas f) e g) do ETAF, 212º, nº 3 da CRP e 144º, n.º 1 da LOSJ.
I. Esta decisão constitui uma decisão surpresa para o Recorrente, já que (i) tal intenção não foi previamente comunicada ao demandante nem demandados, (ii) as partes foi convidado a pronunciar-se sobre a alegada incompetência material.
III. Nos termos do art. 3º, nº 3, do C.P.C., aplicável ex vi pelo art.º 4º, do C.P.P. o Tribunal antes de decidir, deve convidar as partes que não tenham suscitado a questão para pronunciarem-se, seja qual for a fase do processo em que a questão se suscite.
IV. O Tribunal a quo ao decidir absolver os Recorridos da instância, com o fundamento da incompetência material do Tribunal da 1.ª Instância, sem previamente convidar as partes cíveis para se pronunciarem, cometeu uma nulidade, susceptível de influir na decisão da causa, pelo que o despacho é nulo nos termos do art.º 195º, n.º1, do C.P.C., aplicável ex vi pelo art.º 4º, do C.P.P.
Sem conceder;
V. É consabido que a jurisdição administrativa é exercida por tribunais administrativos, aos quais incumbe, na administração da justiça, dirimir os conflitos de interesses públicos e privados no âmbito das relações jurídicas administrativas (arts. 1º, nº 1, do ETAF e 212º, nº 3, da CRP).
VI. O critério determinante da competência material entre jurisdição comum e jurisdição administrativa assenta na distinção se a entidade pública age sob as normas de direito público e/ou pratica actos de gestão pública, ou actos de gestão privada.
VII. Nos termos do art.º 4º, n.º 1, alíneas f) e g), do E.T.A.F. é inquestionável que a jurisdição administrativa é competente para julgar os litígios decorrentes da responsabilidade civil contratual e extracontratual, desde que essa demanda seja emergente da actuação da Administração Pública e que daí possa advir responsabilidade civil das pessoas colectivas de direito público.
VIII. É jurisprudência unânime que a competência do tribunal é fixada, segundo o art. 5.º, n.º 1 do E.T.A.F., no momento da propositura da acção, devendo atender-se à relação jurídica material em discussão e ao pedido dela emergente, segundo a versão apresentada em juízo pelo A.
IX. Compulsado o pedido cível, constata-se que o Recorrente alegou que os Recorridos, em concertação de tarefas, procederam à elaboração dos autos de medição nºs 3 a 18, registando trabalhos que não estavam executados, no valor total de € 514.892,21, sobre os quais foram emitidas faturas e ordens de pagamento, com a intenção de ilegitimamente permitir que a arguida sociedade obtivesse um pagamento que ambos sabiam não ser devido, o que corresponde à prática de um crime de falsificação de documentos e peculato.
X. É, pois, patente que a causa de pedir não consubstancia uma relação jurídico administrativa, mas sim, uma acção lesiva e danosa, tipificada na lei como crime, cuja responsabilidade civil extracontratual dos Recorridos decorre diretamente dos crimes por eles praticados.
XI. Por todo o exposto afigura-se-nos que não se pode deixar de concluir pela competência material do tribunal de 1.ª Instância para conhecer do pedido civil deduzido pelo Recorrente.
XII. Certo é que, o douto Tribunal da Relação ao ter decidido como decidiu, violou os arts. 64º do CPC, 40º, n.º1 da LOSJ e arts. 71.° e 72.° do C.P.P.
Ainda se dirá;
XIII. O douto Tribunal da Relação de Lisboa por, erroneamente, ter concluído que o Tribunal da 1.ª Instância não era materialmente competente para conhecer do pedido cível do Recorrente, considerou prejudicado o conhecimento do recurso interposto.
XIV. Sucede que, face à circunstância do pedido cível visar o ressarcimento de danos emergentes dos factos que constituem os crimes dos presentes autos, e impondo o princípio da adesão a sua apreciação no processo penal,
XV. O Tribunal a quo não podia de considerar o Tribunal da 1.ª Instância materialmente competente, nem deixar de apreciar as questões suscitadas pelo Recorrente, em sede de recurso.
XVI. Pelo que ao proferir o acórdão nos termos relatados, o douto Tribunal a quo praticou o vício de omissão de pronúncia, que determina a de nulidade do acórdão recorrido, nos termos do disposto no artigos 122º, 379º, nº 1, al. c), aplicável por força do n.º 4 do art. 425.°, todos do C.P.P.
Por fim;
XVII. De acordo com os factos alegados pelo Recorrente, a indemnização que reclama aos demandados, encontra-se a coberto do regime da denominada solidariedade passiva, de acordo com o disposto no art.º 497º, n.º1 do C.C.
XVIII. Pese embora, Recorrente tenha proposto no Tribunal Administrativo e Fiscal de ... o processo, que corre termos com o número 269/15.8..., contra a sociedade arguida Castanheira & Soares, Ld.ª e os, entretanto, falecidos CC e DD, a reclamar o pagamento da totalidade do dano,
XIX. O Recorrente, apenas, com a notificação da acusação é que teve conhecimento da intervenção dos arguidos AA e BB, nos ilícitos criminais e da sua responsabilidade civil extracontratual.
XX. À data da dedução do pedido cível, tal como resulta de fls. 965 a 979 e do douto acórdão do Tribunal da 1.ª Instância, a arguida Castanheira & Soares, Ld.ª tinha sido declarada insolvente, por sentença proferida a 6 de Março de 2012 e transitada em julgado no Processo nº 19/12.9..., que correu termos no Tribunal Judicial de ....
XXI. Ainda no âmbito do citado processo, por decisão datada de 19 de Setembro de 2014 de encerramento do processo de insolvência, em virtude da homologação de Plano de Insolvência.
XXII. Como melhor resulta da certidão comercial, a fls. 965 a 979, com vista a garantir o cumprimento do acordo, era o ... judicial, EE, quem estava a administrar a Recorrida Castanheira & Soares, Lda.
XXIII. No que tange a CC e DD, conforme decorre de fls. 841 e 991 e da matéria de facto dada como provada, pelo Tribunal de 1ª Instância (vide ponto 37 e 38) , ambos faleceram, o primeiro a ... de ... de 2016 e o segundo a ... de ... de 2018.
XXIV. Atenta a factualidade exposta, é notório que o Recorrente, aquando da dedução do pedido cível, em 10 de Novembro de 2020, estava objectivamente impedido de obter o ressarcimento dos danos junto dos demandados, a sociedade Castanheira & Soares, Lda, CC e DD.
XXV. Ora, é precisamente para acautelar este tipo de situações, que a parte final do n.º1,
do art.º 519º, do C.P.C. prevê que sempre que esteja verificada a existência de uma razão atendível, o credor pode demandar judicialmente os restantes codevedores.
XXVI. Assim, o douto Tribunal da Relação de Lisboa ao desvalorizar o falecimento dos dois demandados singulares e débil situação económica da demandada sociedade, andou mal ao considerar que não se encontravam preenchidos todos os pressuposto do regime substantivo da solidariedade passiva.
XXVII. É inequívoco que o douto Tribunal da Relação de Lisboa ao ter decidido como decidiu, violou o disposto na parte final do n.º1, do art.º 519º, do C.C.
XXVIII. Face a todo o exposto, deve ser concedido provimento ao presente recurso e, em consequência, declarar-se nulo o acórdão em crise, devendo ser determinada a baixa do processo para o Tribunal a quo, com vista a suprir os vícios apontados.
XXIX. Assim não se entendendo, deve ser concedido provimento ao presente recurso e ser proferido douto acórdão a revogar o acórdão recorrido e, em consequência, (i) ser decidido que o Tribunal da 1.ª Instância é materialmente competente para julgar o pedido cível e que (ii) se encontram preenchidos os pressupostos da parte final do n.º 1, do art.º 519º, do C.C.”
O Mº Pº respondeu defendendo a improcedência do recurso do arguido e a procedência do recurso do Município.
Neste Supremo Tribunal de Justiça o ilustre PGA emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso do arguido e procedência do recurso do Município
Foi cumprido o disposto no artº 417º2 CPP
O arguido AA, respondeu, mantendo as razões do seu recurso e alegando que não pode ser duplamente penalizado.
Cumpridas as formalidades legais, procedeu-se à conferência.
Cumpre apreciar.
Consta do acórdão recorrido da Relação de Lisboa:(transcrição):
“II.2. Factos dados como provados pelo Tribunal de 1.ª Instância (transcrição):
Produzida a prova e discutida a causa resultaram provados os factos seguintes:
1. Nas datas e períodos abaixo indicados, o arguido AA exercia o cargo de ... da Câmara Municipal das Lajes das Flores (doravante designada apenas por CMLF), tendo atuado nos termos infra descritos no âmbito e por causa das funções inerentes a tal cargo.
2. A arguida Castanheira e Soares, Lda. (doravante designada apenas por CS) é uma sociedade por quotas, que foi constituída a 14/07/1982, e que se dedica, além do mais, à construção civil e obras públicas.
3. Nas datas e períodos infra indicados, o arguido BB trabalhava por conta e sob as ordens da arguida CS, e mediante remuneração prestada por esta.
4. Nas datas e períodos infra indicados, na sequência da celebração (decidida pelo arguido AA) de contratos de prestação de serviços de acompanhamento de processos de obras, emissão de pareceres e fiscalização de empreitadas, DD (doravante designado apenas por DD), já falecido, prestou serviços para a CMLF, tendo, nessa qualidade, e em representação da CMLF (enquanto dona da obra), procedido à fiscalização da obra infra indicada; DD atuou nos termos abaixo descritos no âmbito e por causa de tais funções de fiscalização por conta da CMLF.
5. Na sequência do procedimento do concurso público que correu termos para efeito da respetiva adjudicação, no dia 31/08/2009, nos Paços do Município de Lajes das Flores, entre a CMLF, representada pelo arguido AA, e a arguida CS, representada por FF, foi celebrado o contrato de empreitada para realização da seguinte obra: Empreitada do Pavilhão ... uma Piscina Aquecida Coberta (doravante designada apenas empreitada).
6. De acordo com o referido contrato:
6.1 A empreitada deveria ser realizada de acordo com a proposta, lista de preços unitários anexa, plano de trabalhos e plano de pagamento apresentados pela arguida CS, projeto de execução e cadernos de encargos, todos anexos ao contrato;
6.2 O preço da empreitada seria de €1.049.685,27, acrescido de IVA;
6.3 Os pagamentos seriam efetuados pela CMLF por fases, nos 60 dias seguintes à apresentação, pela arguida CS, das respetivas faturas acompanhadas dos correspondentes autos de medição, e após a aprovação de tais documentos (mediante a menção de conformidade e assinatura que aporia nas faturas e/ou autos de mediação) por DD enquanto responsável pela fiscalização;
6.4 O prazo para a execução da empreitada seria de 120 dias a contar da data da sua consignação.
7. Para financiar grande parte da referida empreitada, a 22/04/2009 a Câmara Municipal das Lajes das Flores, através do seu então ..., o arguido AA, candidatou-se ao incentivo previsto no Programa Operacional Proconvergência, inserido no período de programação de fundos estruturais 2007-2013 e co-financiado pelo fundo estrutural europeu FEDER e por fundos públicos regionais, com o projeto a que coube o código RAAFDR–08–..53–FEDER–....01 para realização daquela empreitada (doravante designado apenas por projeto 001).
8. No âmbito da candidatura acima referida:
8.1 Foi indicado como objetivo do projecto 001: “O objectivo do presente projecto é dotar o concelho de ... de instalações desportivas à prática da natação durante todo o ano. Com esta ampliação pretende-se criar condições de albergar pessoas com o intuito à prática de atividades desportivas diversificadas, concentrando assim a atividade desportiva. Tal como o pavilhão gimnodesportivo a piscina será posta à disposição do Pólo Escolar em construção no plano do pavilhão já construído nas imediações desta infra-estrutura”;
8.2 Foi estipulado o seguinte período para a realização física do projeto: de 01/08/2008 a 31/03/2012;
8.3 Foi aprovada a concessão de um apoio de €676.366,00, reportado a uma despesa elegível de €773.285,58;
8.4 O pagamento (quer os pagamentos parcelares, quer o saldo final) estava dependente da verificação das condições previstas para a respetiva atribuição (entre as quais a – efetiva – execução da empreitada, no prazo previsto para o efeito), bem como da apresentação dos comprovativos da realização da despesa (no caso, as ordens de transferência, acompanhadas dos comprovativos de transferência, faturas e autos de medição correspondentes).
9. Porque vivia com dificuldades financeiras, desde o início da execução da empreitada acima referida, a arguida CS não executou os trabalhos nos prazos inicialmente previstos.
10. Cientes de tal facto, e face ao arrastar e aumento dos atrasos na execução da empreitada por parte da arguida CS, os arguidos, CC (gerente da arguida CS e já falecido) e DD, rapidamente concluíram que não seria possível finalizar a empreitada no prazo previsto no âmbito projeto 001, o que implicaria o não pagamento do apoio, por incumprimento dos termos previstos para o seu pagamento.
11. Porque a arguida Castanheira & Soares Ld.ª vivia com dificuldades financeiras, os arguidos, em conjunto entre si e com CC e DD, agiram concertadamente entre si com vista a, por um lado, fazer da arguida CS quantias que pertenciam à CMLF e que não eram devidas àquela (nem eram devidas a nenhum daqueles outros) e, ao mesmo passo, justificar contabilisticamente, e aos olhos de terceiros, tais saídas de dinheiro das contas da CMLF e, por outro lado, levar a que o apoio atribuído no âmbito do projeto 001 fosse pago pela entidade responsável pelo pagamento não obstante o incumprimento, pela CMLF (beneficiária do apoio), das condições estipuladas para o efeito (entre as quais a execução dos trabalhos da empreitada nos prazos estipulados). Nos termos de tal atuação concertada:
11.1 A arguida CS:
11.1.1 Elaborou os autos de medição nºs 3 a 18 (que foram assinados pelo arguido BB ou por outros funcionários da arguida CS subordinados daquele, e que os elaboraram segundo as indicações dele, mormente quanto aos trabalhos realizados), atinentes à empreitada, dos quais fizeram constar que, no período a que se reporta cada um dos autos de medição em causa, tinham sido realizados os trabalhos nele descritos, sendo certo que parte desses trabalhos não foram, de facto, realizados;
11.1.2 Seguidamente, a arguida CS elaborou as faturas correspondentes aos autos de medição em causa (cujos valores englobaria o valor dos trabalhos que, de facto, não foram realizados, mas que dos autos de medição constavam como tendo sido executados) e apresentou-as, acompanhadas dos autos de medição, à CMLF para pagamento;
11.1.3 Recebido da CMLF o montante correspondente a cada auto de medição e correspondente fatura, a arguida CS fez sua a quantia em causa e emitiu a favor do Município o respetivo recibo;
11.2 DD, enquanto responsável pela fiscalização da obra em representação da CMLF (dona da obra), atestou – mesmo na parte desconforme – a conformidade dos autos de medição e faturas em causa com os trabalhos executados pela arguida CS no período correspondente, apondo nos autos de medição e/ou faturas a menção – em parte (na parte relativa aos trabalhos que não foram executados) inverídica – que estavam em conformidade com os trabalhos que tinham sido realizados; assim, e com tal menção, confirmou que os trabalhos descritos em cada auto de medição e faturados à CMLF (incluindo os que, na realidade, não tinham sido executados) tinham sido realizados; e
11.3 O arguido AA, no exercício do cargo acima indicado:
11.3.1 Rececionado cada um dos autos de medição em causa e correspondentes faturas, e após “aprovação” de tais documentos por DD nos moldes acima referenciados, deu ordens de pagamento dos montantes correspondentes aos valores constantes em cada auto de medição e correspondente fatura como sendo o dos trabalhos realizados no período neles indicados (que incluiu o valor daqueles trabalhos que, na realidade, não tinham sido executados, mas que constavam como tendo sido executados nos autos de medição) e, por essa via, levou ao pagamento do correspondente valor, mediante transferência bancária, assim fazendo da arguida CS dinheiro que pertencia à CMLF e que não era devido àquela, nem a qualquer um dos outros arguidos ou aos demais intervenientes na elaboração e execução de tal atuação concertada; e
11.3.2 Por forma a justificar (contabilisticamente e aos olhos de terceiros) as saídas de tais valores das contas da CMLF e respetiva entrega à arguida CS, simulando tratar-se de pagamentos devidos, e, também, por forma a fazer crer a entidade responsável pelo pagamento do apoio que estavam reunidas as condições para o efeito (o que, na realidade, não sucedia), utilizou tais documentos (autos de mediação e faturas, por um lado, e esses documentos, ordens de pagamento, comprovativos de transferências e recibos, por outro lado), como justificativo das ordens de pagamentos a seguir indicadas e os apresentou-os no âmbito do processo referente ao projeto 001, em anexo aos pedidos parcelares de pagamento, assim levando a que aquela entidade procedesse a pagamentos parcelares do apoio à CMLF.
12. Agindo concertadamente entre si, os arguidos e DD procederam do seguinte modo:
12.1 Relativamente aos trabalhos a que se reporta o auto de medição n.º 3:
12.1.1 A arguida CS elaborou o auto de medição n.º 3, datado de 02/03/2010, no valor global de €81.781,54, valor esse que englobou o a seguir indicado;
12.1.2 A par com a indicação dos trabalhos que efetivamente executou no período a que se reporta o auto em causa, nesse auto a arguida CS fez constar que tinha executado diversos trabalhos que, na realidade, nunca foram executados, aos quais atribuiu o valor global de €9.188,85;
12.1.3 De igual forma, a arguida CS emitiu, em nome do Município de Lajes das Flores, a fatura com o n.º 18/0110, datada de 26/02/2010, no valor de €81.781,54, deduzido o correspondente montante do reforço de dedução de garantia, o que perfaz €80.963,72, da qual consta, no descritivo, para além da menção à empreitada acima referenciada, que o valor se refere ao 3.º auto de medição daquela empreitada;
12.1.4 A arguida CS apresentou os documentos acima indicados na CMLF, para pagamento da fatura referenciada;
12.1.5 Recebidos tais documentos, DD rubricou o auto de medição e, na correspondente fatura, pelo seu punho, escreveu “concordo c/ as medições”, apondo, junto de tal menção, a sua assinatura, dessa forma confirmando que todos os trabalhos (incluindo aqueles que, na verdade, não foram realizados) descritos e nas quantidades indicadas naqueles documentos foram executados; seguidamente, encaminhou o auto de medição e a fatura em causa para o arguido AA;
12.1.6 Recebidos tais documentos, o arguido AA, valendo-se do cargo acima indicado, ordenou a emissão da ordem de pagamento n.º .07 do ano de 2010, emitida em nome Município de Lajes das Flores a favor da arguida CS, datada de 27/05/2010, no valor de €80.963,72, e referente ao pagamento da fatura acima indicada (incluindo do valor dos trabalhos que, na realidade, não foram executados), que assinou e pela qual ordenou a transferência daquele montante da conta bancária da CMLF (conta n.º .. .........18/30/10, do BANIF, domiciliada no balcão de ...) para a conta bancária da arguida CS, transferência essa que foi realizada a 31/05/2010;
12.1.7 Recebido o montante acima indicado, a arguida CS emitiu a favor do Município de Lajes das Flores o recibo com o n.º 53/2010, datado de 31/05/2010, da qual consta a menção às faturas n.ºs 10, 18 e 31, no valor global de €161.639,41, sendo o valor parcelar referente à fatura n.º 18 de €80.963,72;
12.2 Relativamente aos trabalhos a que se reporta o auto de medição n.º 4:
12.2.1 A arguida CS elaborou o auto de medição n.º 4, datado de 31/03/2010, no valor global de €38.137,00, valor esse que englobou o a seguir indicado;
12.2.2 A par com a indicação dos trabalhos que efetivamente executou no período a que se reporta o auto em causa, nesse auto a arguida CS fez constar que tinha executado diversos trabalhos que, na realidade, nunca foram executados, aos quais atribuiu o valor global de €24.167,14;
12.2.3 De igual forma, a arguida CS emitiu, em nome do Município de Lajes das Flores, a fatura com o n.º 31/0110, datada de 31/03/2010, no valor de €38.137,00, deduzido o correspondente montante do reforço de dedução de garantia, o que perfaz €37.755,63, da qual consta, no descritivo, para além da menção à empreitada acima referenciada, que o valor se refere ao 4.º auto de medição daquela empreitada;
12.2.4 A arguida CS apresentou os documentos acima indicados na CMLF, para pagamento da fatura referenciada;
12.2.5 Recebidos tais documentos, DD rubricou o auto de medição e, na correspondente fatura, pelo seu punho, escreveu “concordo c/ as medições apresentadas” e, junto a tal menção, apôs a sua assinatura, dessa forma confirmando que todos os trabalhos (incluindo aqueles que, na verdade, não foram realizados) descritos e nas quantidades indicadas naqueles documentos foram executados; seguidamente, encaminhou o auto de medição e a fatura em causa para o arguido AA;
12.2.6 Recebidos tais documentos, o arguido AA, valendo-se do cargo acima indicado, ordenou a emissão da ordem de pagamento n.º .06 do ano de 2010, emitida em nome Município de Lajes das Flores a favor da arguida CS, datada de 27/05/2010, no valor de €37.755,63, e referente ao pagamento da fatura acima indicada (incluindo do valor dos trabalhos que, na realidade, não foram executados), que assinou e pela qual ordenou a transferência daquele montante da conta bancária da CMLF (conta n.º .. .........18/30/10, do BANIF) para a conta bancária da arguida CS, transferência essa que foi realizada a 31/05/2010;
12.2.7 Recebido o montante acima indicado, a arguida CS emitiu a favor do Município de Lajes das Flores o recibo com o n.º 53/2010, datado de 31/05/2010, da qual consta a menção às faturas n.ºs 10, 18 e 31, no valor global de €161.639,41, sendo o valor parcelar referente à fatura n.º 31 de €37.755,63;
12.3 Relativamente aos trabalhos a que se reporta o auto de medição n.º 5:
12.3.1 A arguida CS elaborou o auto de medição n.º 5, datado de 30/04/2010, no valor global de €40.349,13, que englobou o a seguir indicado;
12.3.2 A par com a indicação dos trabalhos que efetivamente executou no período a que se reporta o auto em causa, nesse auto a arguida CS fez constar que tinha executado diversos trabalhos que, na realidade, nunca foram executados, aos quais atribuiu o valor global de €17.558,36.
12.3.3 De igual forma, a arguida CS emitiu, em nome do Município de Lajes das Flores, a fatura com o n. º 54/0110, datada de 30/04/2010, no valor de €40.349,13, deduzido o correspondente montante do reforço de dedução de garantia, o que perfaz €39.945,64, da qual consta, no descritivo, para além da menção à empreitada acima referenciada, que o valor se refere ao 5.º auto de medição daquela empreitada;
12.3.4 A arguida CS apresentou os documentos acima indicados na CMLF, para pagamento da fatura referenciada
12.3.5 Recebidos tais documentos, DD rubricou a fatura e escreveu no auto de medição “Concordo com as medições”, apondo, junto a tal menção, a sua assinatura, dessa forma confirmando que todos os trabalhos (incluindo aqueles que, na verdade, não foram realizados) descritos e nas quantidades indicadas naqueles documentos foram executados; seguidamente, encaminhou o auto de medição e a fatura em causa para o arguido AA;
12.3.6 Recebidos tais documentos, o arguido AA, valendo-se do cargo acima indicado, ordenou a emissão da ordem de pagamento n.º ...1 do ano de 2010, emitida em nome Município de Lajes das Flores a favor da arguida CS, datada de 09/07/2010, no valor de €39.945,64, e referente ao pagamento da fatura acima indicada (incluindo do valor dos trabalhos que, na realidade, não foram executados), que assinou e pela qual ordenou a transferência daquele montante da conta bancária da CMLF (conta n.º .. .........18/30/10, do BANIF) para a conta bancária da arguida CS, transferência essa que foi realizada a 13/08/2010;
12.3.7 Recebido o montante acima indicado, a arguida CS emitiu a favor do Município de Lajes das Flores o recibo com o n.º 74/2010, datado de 16/08/2010, da qual consta a menção às faturas n.ºs 54, 60, 76, no valor global de €236.141,19, sendo o valor parcelar referente à fatura n.º 54 de €39.945,6;
12.4 Relativamente aos trabalhos a que se reporta o auto de medição n.º 6:
12.4.1 A arguida CS elaborou o auto de medição n.º 6, datado de 26/05/2010, no valor global de €151.623,14, valor esse que englobou o a seguir indicado;
12.4.2 A par com a indicação dos trabalhos que efetivamente executou no período a que se reporta o auto em causa, nesse auto a arguida CS fez constar que tinha executado diversos trabalhos que, na realidade, nunca foram executados, aos quais atribuiu o valor global de €126.501,89.
12.4.3 De igual forma, a arguida CS emitiu, em nome do Município de Lajes das Flores, a fatura com o n. º 60/0110, datada de 27/05/2010, no valor de €151.623,14, deduzido o correspondente montante do reforço de dedução de garantia, o que perfaz €150.106,91, da qual consta, no descritivo, para além da menção à empreitada acima referenciada, que o valor se refere ao 6.º auto de medição daquela empreitada;
12.4.4 A arguida CS apresentou os documentos acima indicados na CMLF, para pagamento da fatura referenciada;
12.4.5 Recebidos tais documentos, DD escreveu no auto de medição e na correspondente fatura “concordo com as medições” e, ao lado de tais menções, apôs a sua assinatura, dessa forma confirmando que todos os trabalhos (incluindo aqueles que, na verdade, não foram realizados) descritos e nas quantidades indicadas naqueles documentos foram executados; seguidamente, encaminhou o auto de medição e a fatura em causa para o arguido AA;
12.4.6 Recebidos tais documentos, o arguido AA, valendo-se do cargo acima indicado, ordenou a emissão da ordem de pagamento n.º ..79 do ano de 2010, emitida em nome Município de Lajes das Flores a favor da arguida CS, datada de 09/07/2010, no valor de €150.106,91, e referente ao pagamento da fatura acima indicada (incluindo do valor dos trabalhos que, na realidade, não foram executados), que assinou e pela qual ordenou a transferência daquele montante da conta bancária da CMLF (conta n.º .. .........18/30/10, do BANIF) para a conta bancária da arguida CS, transferência essa que foi realizada a 13/08/2010;
12.4.7 Recebido o montante acima indicado, a arguida CS emitiu a favor do Município de Lajes das Flores o recibo com o n.º 74/2010, datado de 16/08/2010, da qual consta a menção às faturas n.ºs 54, 60 e 76, no valor global de €236.141,19, sendo o valor parcelar referente à fatura n.º 60 de €150.106,91;
12.5 Relativamente aos trabalhos a que se reporta o auto de medição n.º 7:
12.5.1 A arguida CS elaborou o auto de medição n.º 7, datado de 28/05/2010, no valor global de €46.554,18, valor esse que englobou o a seguir indicado;
12.5.2 A par com a indicação dos trabalhos que efetivamente executou no período a que se reporta o auto em causa, nesse auto a arguida CS fez constar que tinha executado diversos trabalhos que, na realidade, nunca foram executados, aos quais atribuiu o valor global de €31.729,50.
12.5.3 De igual forma, a arguida CS emitiu, em nome do Município de Lajes das Flores, a fatura com o n. º 76/0110, datada de 30/06/2010, no valor de €46.554,18, deduzido o correspondente montante do reforço de dedução de garantia, o que perfaz €46.088,64, da qual consta, no descritivo, para além da menção à empreitada acima referenciada, que o valor se refere ao 7.º auto de medição daquela empreitada;
12.5.4 A arguida CS apresentou os documentos acima indicados na CMLF, para pagamento da fatura referenciada;
12.5.5 Recebidos tais documentos, DD rubricou o auto de medição e, na correspondente fatura, pelo seu punho, escreveu, “concordo com as medições”, apondo, junto a tal menção, a sua assinatura, dessa forma confirmando que todos os trabalhos (incluindo aqueles que, na verdade, não foram realizados) descritos e nas quantidades indicadas naqueles documentos foram executados; seguidamente, encaminhou o auto de medição e a fatura em causa para o arguido AA;
12.5.6 Recebidos tais documentos, o arguido AA, valendo-se do cargo acima indicado, ordenou a emissão da ordem de pagamento n.º ..80 do ano de 2010, emitida em nome Município de Lajes das Flores a favor da arguida CS, datada de 09/07/2010, no valor de €46.088,64, e referente ao pagamento da fatura acima indicada (incluindo do valor dos trabalhos que, na realidade, não foram executados), que assinou e pela qual ordenou a transferência daquele montante da conta bancária da CMLF (conta n.º .. .........18/30/10, do BANIF) para a conta bancária da arguida CS, transferência essa que foi realizada a 13/08/2010;
12.5.7 Recebido o montante acima indicado, a arguida CS emitiu a favor do Município de Lajes das Flores o recibo com o n.º 74/2010, datado de 16/08/2010, da qual consta a menção às faturas n.ºs 54, 60 e 76, no valor global de €236.141,19, sendo o valor parcelar referente à fatura n.º 76 de €46.088,64;
12.6 Relativamente aos trabalhos a que se reporta o auto de medição n.º 8:
12.6.1 A arguida CS elaborou o auto de medição n.º 8, datado de 31/07/2010, no valor global de €46.870,97, valor esse que englobou o a seguir indicado;
12.6.2 A par com a indicação dos trabalhos que efetivamente executou no período a que se reporta o auto em causa, nesse auto a arguida CS fez constar que tinha executado diversos trabalhos que, na realidade, nunca foram executados, aos quais atribuiu o valor global de €32.116,38.
12.6.3 De igual forma, a arguida CS emitiu, em nome do Município de Lajes das Flores, a fatura com o n. º 94/0110, datada de 31/07/2010, no valor de €46.870,97, deduzido o correspondente montante do reforço de dedução de garantia, o que perfaz €46.402,26, da qual consta, no descritivo, para além da menção à empreitada acima referenciada, que o valor se refere ao 8.º auto de medição daquela empreitada;
12.6.4 A arguida CS apresentou os documentos acima indicados na CMLF, para pagamento da fatura referenciada;
12.6.5 Recebidos tais documentos, DD rubricou o auto de medição e, na correspondente fatura, pelo seu punho, escreveu “concordo com as medições apresentadas”, assinando junto a tal menção, dessa forma confirmando que todos os trabalhos (incluindo aqueles que, na verdade, não foram realizados) descritos e nas quantidades indicadas naqueles documentos foram executados; seguidamente, encaminhou o auto de medição e a fatura em causa para o arguido AA;
12.6.6 Recebidos tais documentos, o arguido AA, valendo-se do cargo acima indicado, ordenou a emissão da ordem de pagamento n.º ..37 do ano de 2010, emitida em nome Município de Lajes das Flores a favor da arguida CS, datada de 27/08//2010, no valor de €46.402,26, e referente ao pagamento da fatura acima indicada (incluindo do valor dos trabalhos que, na realidade, não foram executados), que assinou e pela qual ordenou a transferência daquele montante da conta bancária da CMLF (conta n.º .. ..........8/30/10, do BANIF) para a conta bancária da arguida CS, transferência essa que foi realizada a 03/11/2010;
12.6.7 Recebido o montante acima indicado, a arguida CS emitiu a favor do Município de Lajes das Flores o recibo com o n.º 103/2010, datado de 03/11/2010, da qual consta a menção à fatura n.º 94, no valor de €46.402,26;
12.7 Relativamente aos trabalhos a que se reporta o auto de medição n.º 9:
12.7.1 A arguida CS elaborou o auto de medição n.º 9, datado de 28/08/2010, no valor global de €40.504,55, valor esse que englobou o a seguir indicado;
12.7.2 A par com a indicação dos trabalhos que efetivamente executou no período a que se reporta o auto em causa, nesse auto a arguida CS fez constar que tinha executado diversos trabalhos que, na realidade, nunca foram executados, aos quais atribuiu o valor global de €34.827,76;
12.7.3 De igual forma, a arguida CS emitiu, em nome do Município de Lajes das Flores, a fatura com o n. º 100/0110, datada de 26/08/2010, no valor de €40.504,55, deduzido o correspondente montante do reforço de dedução de garantia, o que perfaz €40.099,50, da qual consta, no descritivo, para além da menção à empreitada acima referenciada, que o valor se refere ao 9.º auto de medição daquela empreitada;
12.7.4 A arguida CS apresentou os documentos acima indicados na CMLF, para pagamento da fatura referenciada;
12.7.5 Recebidos tais documentos, DD, pelo seu punho, escreveu no auto de medição “concordo com as medições apresentadas”, assinou junto a tal menção, e rubricou a correspondente fatura, dessa forma confirmando que todos os trabalhos (incluindo aqueles que, na verdade, não foram realizados) descritos e nas quantidades indicadas naqueles documentos foram executados; seguidamente, encaminhou o auto de medição e a fatura em causa para o arguido AA;
12.7.6 Recebidos tais documentos, o arguido AA, valendo-se do cargo acima indicado, ordenou a emissão da ordem de pagamento n.º .16 do ano de 2011, emitida em nome Município de Lajes das Flores a favor da arguida CS, datada de 18/02/2011, no valor de €40.099,50, e referente ao pagamento da fatura acima indicada (incluindo do valor dos trabalhos que, na realidade, não foram executados), que assinou e pela qual ordenou a transferência daquele montante da conta bancária da CMLF (conta n.º .. .........18/30/10, do BANIF) para a conta bancária da arguida CS, transferência essa que foi realizada a 01/03/2011;
12.7.7 Recebido o montante acima indicado, a arguida CS emitiu a favor do Município de Lajes das Flores o recibo com o n.º 21/2011, datado de 01/03/2011, da qual consta a menção à fatura n.º 100, no valor de €40.099,50;
12.8 Relativamente aos trabalhos a que se reporta o auto de medição n.º 10:
12.8.1 A arguida CS elaborou o auto de medição n.º 10, datado de 28/09/2010, no valor global de €24.719,17, valor esse que englobou o a seguir indicado;
12.8.2 A par com a indicação dos trabalhos que efetivamente executou no período a que se reporta o auto em causa, nesse auto a arguida CS fez constar que tinha executado diversos trabalhos que, na realidade, nunca foram executados, aos quais atribuiu o valor global de €12.283,00;
12.8.3 De igual forma, a arguida CS emitiu, em nome do Município de Lajes das Flores, a fatura com o n. º 113/0110, datada de 28/09/2010, no valor de €24.719,17, deduzido o correspondente montante do reforço de dedução de garantia, o que perfaz €24.471,98, da qual consta, no descritivo, para além da menção à empreitada acima referenciada, que o valor se refere ao 10.º auto de medição daquela empreitada;
12.8.4 A arguida CS apresentou os documentos acima indicados na CMLF, para pagamento da fatura referenciada;
12.8.5 Recebidos tais documentos, DD, pelo seu punho, escreveu no auto de medição e na fatura “concordo com as medições apresentadas”, e assinou junto a tais menções, dessa forma confirmando que todos os trabalhos (incluindo aqueles que, na verdade, não foram realizados) descritos e nas quantidades indicadas naqueles documentos foram executados; seguidamente, encaminhou o auto de medição e a fatura em causa para o arguido AA;
12.8.6 Recebidos tais documentos, o arguido AA, valendo-se do cargo acima indicado, ordenou a emissão da ordem de pagamento n.º .17 do ano de 2011, emitida em nome Município de Lajes das Flores a favor da arguida CS, datada de 18/02/2011, no valor de €24.471,98, e referente ao pagamento da fatura acima indicada (incluindo do valor dos trabalhos que, na realidade, não foram executados), que assinou e pela qual ordenou a transferência daquele montante da conta bancária da CMLF (conta n.º .. .........18/30/10, do BANIF) para a conta bancária da arguida CS, transferência essa que foi realizada a 15/03/2011;
12.8.7 Recebido o montante acima indicado, a arguida CS emitiu a favor do Município de Lajes das Flores o recibo com o n.º 26/2011, datado de 15/03/2011, da qual consta a menção à fatura n.º 113, no valor de €40.099,50;
12.9 Relativamente aos trabalhos a que se reporta o auto de medição n.º 11:
12.9.1 – A arguida CS elaborou o auto de medição n.º 11, datado de 25/10/2010, no valor global de €25.013,54, valor esse que englobou o a seguir indicado;
12.9.2 A par com a indicação dos trabalhos que efetivamente executou no período a que se reporta o auto em causa, nesse auto a arguida CS fez constar que tinha executado diversos trabalhos que, na realidade, nunca foram executados, aos quais atribuiu o valor global de €3.586,17;
12.9.3 De igual forma, a arguida CS emitiu, em nome do Município de Lajes das Flores, a fatura com o n.º 123/0110, datada de 25/10/2010, no valor de €25.013,54, deduzido o correspondente montante do reforço de dedução de garantia, o que perfaz €24.723,40, da qual consta, no descritivo, para além da menção à empreitada acima referenciada, que o valor se refere ao 11.º auto de medição daquela empreitada;
12.9.4 A arguida CS apresentou os documentos acima indicados na CMLF, para pagamento da fatura referenciada;
12.9.5 Recebidos tais documentos, DD, pelo seu punho, escreveu no auto de medição e na fatura “concordo com as medições apresentadas”, e assinou junto a tais menções, dessa forma confirmando que todos os trabalhos (incluindo aqueles que, na verdade, não foram realizados) descritos e nas quantidades indicadas naqueles documentos foram executados; seguidamente, encaminhou o auto de medição e a fatura em causa para o arguido AA;
12.9.6 Recebidos tais documentos, o arguido AA, valendo-se do cargo acima indicado, ordenou a emissão da ordem de pagamento n.º .18 do ano de 2011, emitida em nome Município de Lajes das Flores a favor da arguida CS, datada de 18/02/2011, no valor de €24.723,40, e referente ao pagamento da fatura acima indicada (incluindo do valor dos trabalhos que, na realidade, não foram executados), que assinou e pela qual ordenou a transferência daquele montante da conta bancária da CMLF (conta n.º .. .........18/30/10, do BANIF) para a conta bancária da arguida CS, transferência essa que foi realizada a 15/04/2011;
12.9.7 Recebido o montante acima indicado, a arguida CS emitiu a favor do Município de Lajes das Flores o recibo com o n.º 35/2011, datado de 15/03/2011, da qual consta a menção à fatura n.º 123, no valor de €24.723,40;
12.10 – Relativamente aos trabalhos a que se reporta o auto de medição n.º 12:
12.10.1 A arguida CS elaborou o auto de medição n.º 12, datado de 29/11/2010, no valor global de €46.686,92, valor esse que englobou o a seguir indicado;
12.10.2 A par com a indicação dos trabalhos que efetivamente executou no período a que se reporta o auto em causa, nesse auto a arguida CS fez constar que tinha executado diversos trabalhos que, na realidade, nunca foram executados, aos quais atribuiu o valor global de €21.180,37;
12.10.3 De igual forma, a arguida CS emitiu, em nome do Município de Lajes das Flores, a fatura com o n. º 141/0110, datada de 29/11/2010, no valor de €25.013,54, deduzido o correspondente montante do reforço de dedução de garantia, o que perfaz €46.686,92, da qual consta, no descritivo, para além da menção à empreitada acima referenciada, que o valor se refere ao 12.º auto de medição daquela empreitada;
12.10.4 A arguida CS apresentou os documentos acima indicados na CMLF, para pagamento da fatura referenciada;
12.10.5 Recebidos tais documentos, DD, pelo seu punho, rubricou o auto de medição e, na fatura, escreveu “concordo com as medições apresentadas” e assinou junto a tal menção, dessa forma confirmando que todos os trabalhos (incluindo aqueles que, na verdade, não foram realizados) descritos e nas quantidades indicadas naqueles documentos foram executados; seguidamente, encaminhou o auto de medição e a fatura em causa para o arguido AA;
12.10.6 Recebidos tais documentos, o arguido AA, valendo-se do cargo acima indicado, ordenou a emissão da ordem de pagamento n.º .19 do ano de 2011, emitida em nome Município de Lajes das Flores a favor da arguida CS, datada de 18/02/2011, no valor de €46.220,05, e referente ao pagamento da fatura acima indicada (incluindo do valor dos trabalhos que, na realidade, não foram executados), que assinou e pela qual ordenou a transferência daquele montante da conta bancária da CMLF (conta da CGD, domiciliada no ...) para a conta bancária da arguida CS, transferência essa que foi realizada a 24/06/2011;
12.10.7 Recebido o montante acima indicado, a arguida CS emitiu a favor do Município de Lajes das Flores o recibo com o n.º 51/2011, datado de 26/06/2011, da qual consta a menção às faturas n.ºs 141 e 145, no valor global de €92.230,25, sendo o valor parcelar referente à fatura n.º 141 de €46.220,05;
12.11 Relativamente aos trabalhos a que se reporta o auto de medição n.º 13:
12.11.1 A arguida CS elaborou o auto de medição n.º 13, datado de 29/11/2010, no valor global de €46.474,95, valor esse que englobou o a seguir indicado;
12.11.2 A par com a indicação dos trabalhos que efetivamente executou no período a que se reporta o auto em causa, nesse auto a arguida CS fez constar que tinha executado diversos trabalhos que, na realidade, nunca foram executados, aos quais atribuiu o valor global de €41.905,47;
12.11.3 De igual forma, a arguida CS emitiu, em nome do Município de Lajes das Flores, a fatura com o n. º 145/0110, datada de 10/12/2010, no valor de €46.474,95, deduzido o correspondente montante do reforço de dedução de garantia, o que perfaz €46.010,19, da qual consta, no descritivo, para além da menção à empreitada acima referenciada, que o valor se refere ao 13.º auto de medição daquela empreitada;
12.11.4 A arguida CS apresentou os documentos acima indicados na CMLF, para pagamento da fatura referenciada;
12.11.5 Recebidos tais documentos, DD, pelo seu punho, rubricou o auto de medição e, na fatura, escreveu “concordo com as medições apresentadas” e assinou junto a tal menção, dessa forma confirmando que todos os trabalhos (incluindo aqueles que, na verdade, não foram realizados) descritos e nas quantidades indicadas naqueles documentos foram executados; seguidamente, encaminhou o auto de medição e a fatura em causa para o arguido AA;
12.11.6 Recebidos tais documentos, o arguido AA, valendo-se do cargo acima indicado, ordenou a emissão da ordem de pagamento n.º .58 do ano de 2011, emitida em nome Município de Lajes das Flores a favor da arguida CS, datada de 18/05/2011, no valor de €46.010,19, e referente ao pagamento da fatura acima indicada (incluindo do valor dos trabalhos que, na realidade, não foram executados), que assinou e pela qual ordenou a transferência daquele montante da conta bancária da CMLF (conta da CGD acima indicada) para a conta bancária da arguida CS, transferência essa que foi realizada a 28/06/2011;
12.11.7 Recebido o montante acima indicado, a arguida CS emitiu a favor do Município de Lajes das Flores o recibo com o n.º 51/2011, datado de 26/06/2011, da qual consta a menção às faturas n.ºs 141 e 145, no valor global de €92.230,25, sendo o valor parcelar referente à fatura 145 de €46.010,19;
12.12 Relativamente aos trabalhos a que se reporta o auto de medição n.º 14:
12.12.1 A arguida CS elaborou o auto de medição n.º 14, datado de 13/01/2011, no valor global de €40.162,08, valor esse que englobou o a seguir indicado;
12.12.2 A par com a indicação dos trabalhos que efetivamente executou no período a que se reporta o auto em causa, nesse auto a arguida CS fez constar que tinha executado diversos trabalhos que, na realidade, nunca foram executados, aos quais atribuiu o valor global de €35.330,78;
12.12.3 De igual forma, a arguida CS emitiu, em nome do Município de Lajes das Flores, a fatura com o n. º 2/0111, datada de 13/01/2011, no valor de €40.162,08, deduzido o correspondente montante do reforço de dedução de garantia, o que perfaz €39.760,46, da qual consta, no descrito, para além da menção à empreitada acima referenciada, que o valor se refere ao 14.º auto de medição daquela empreitada;
12.12.4 A arguida CS apresentou os documentos acima indicados na CMLF, para pagamento da fatura referenciada;
12.12.5 Recebidos tais documentos, DD, pelo seu punho, escreveu no auto de medição “concordo com as medições apresentadas” e assinou junto a tal menção, dessa forma confirmando que todos os trabalhos (incluindo aqueles que, na verdade, não foram realizados) descritos e nas quantidades indicadas naqueles documentos foram executados; seguidamente, encaminhou o auto de medição e a fatura em causa para o arguido AA;
12.12.6 Recebidos tais documentos, o arguido AA, valendo-se do cargo acima indicado, ordenou a emissão da ordem de pagamento n.º .74 do ano de 2011, emitida em nome Município de Lajes das Flores a favor da arguida CS, datada de 15/02/2011, no valor de €39.760,46, e referente ao pagamento da fatura acima indicada (incluindo do valor dos trabalhos que, na realidade, não foram executados), que assinou e pela qual ordenou a transferência daquele montante da conta bancária da CMLF (conta da CGD acima indicada) para a conta bancária da arguida CS, transferência essa que foi realizada a 06/10/2011;
12.12.7 Recebido o montante acima indicado, a arguida CS emitiu a favor do Município de Lajes das Flores o recibo com o n.º 65/2011, datado de 06/10/2011, da qual consta a menção à fatura n.º 2/001, no valor de €39.760,46;
12.13 – Relativamente aos trabalhos a que se reporta o auto de medição n.º 15:
12.13.1 A arguida CS elaborou o auto de medição n.º 15, datado de 22/02/2011, no valor global de €30.436,97, valor esse que englobou o a seguir indicado;
12.13.2 A par com a indicação dos trabalhos que efetivamente executou no período a que se reporta o auto em causa, nesse auto a arguida CS fez constar que tinha executado diversos trabalhos que, na realidade, nunca foram executados, aos quais atribuiu o valor global de €25.741,29;
12.13.3 De igual forma, a arguida CS emitiu, em nome do Município de Lajes das Flores, a fatura com o n. º 12/0111, datada de 23/02/2011, no valor de €30.436,97, deduzido o correspondente montante do reforço de dedução de garantia, o que perfaz €30.132,60, da qual consta, no descritivo, para além da menção à empreitada acima referenciada, que o valor se refere ao 15.º auto de medição daquela empreitada;
12.13.4 A arguida CS apresentou os documentos acima indicados na CMLF, para pagamento da fatura referenciada;
12.13.5 Recebidos tais documentos, DD, pelo seu punho, assinou o auto de medição e, na fatura, escreveu “concordo com as medições” e assinou junto a tal menção, dessa forma confirmando que todos os trabalhos (incluindo aqueles que, na verdade, não foram realizados) descritos e nas quantidades indicadas naqueles documentos foram executados; seguidamente, encaminhou o auto de medição e a fatura em causa para o arguido AA;
12.13.6 Recebidos tais documentos, o arguido AA, valendo-se do cargo acima indicado, ordenou a emissão da ordem de pagamento n.º .71 do ano de 2011, emitida em nome Município de Lajes das Flores a favor da arguida CS, datada de 27/02/2011, no valor de €30.132,60, e referente ao pagamento da fatura acima indicada (incluindo do valor dos trabalhos que, na realidade, não foram executados), que assinou e pela qual ordenou a transferência daquele montante da conta bancária da CMLF (conta da CGD acima indicada) para a conta bancária da arguida CS, transferência essa que foi realizada;
12.13.7 Recebido o montante acima indicado, a arguida CS emitiu a favor do Município de Lajes das Flores o recibo com o n.º 6/2012, datado de 28/02/2012, da qual consta a menção às faturas n.ºs 12 e 33, no valor global de €52.826,21, sendo o valor parcelar referente à fatura n.º 12 no montante de €30.132,60;
12.14 Relativamente aos trabalhos a que se reporta o auto de medição n.º 16:
12.14.1 A arguida CS elaborou o auto de medição n.º 16, datado de 29/04/2011, no valor global de €22.922,84, valor esse que englobou o a seguir indicado;
12.14.2 A par com a indicação dos trabalhos que efetivamente executou no período a que se reporta o auto em causa, nesse auto a arguida CS fez constar que tinha executado diversos trabalhos que, na realidade, nunca foram executados, aos quais atribuiu o valor global de €11.482,87;
12.14.3 De igual forma, a arguida CS emitiu, em nome do Município de Lajes das Flores, a fatura com o n. º 33/0111, datada de 30/04/2011, no valor de €22.922,84, deduzido o correspondente montante do reforço de garantia, o que perfaz €22.693,61, da qual consta, no descritivo, para além da menção à empreitada acima referenciada, que o valor se refere ao 16.º auto de medição daquela empreitada;
12.14.4 A arguida CS apresentou os documentos acima indicados na CMLF, para pagamento da fatura referenciada;
12.14.5 Recebidos tais documentos, DD, pelo seu punho, rubricou o auto de medição e, na fatura, escreveu “concordo com as medições apresentadas” e assinou junto a tal menção, dessa forma confirmando que todos os trabalhos (incluindo aqueles que, na verdade, não foram realizados) descritos e nas quantidades indicadas naqueles documentos foram executados; seguidamente, encaminhou o auto de medição e a fatura em causa para o arguido AA;
12.14.6 Recebidos tais documentos, o arguido AA, valendo-se do cargo acima indicado, ordenou a emissão da ordem de pagamento n.º .72 do ano de 2011, emitida em nome Município de Lajes das Flores a favor da arguida CS, datada de 27/02/2011, no valor de €22.693,61, e referente ao pagamento da fatura acima indicada (incluindo do valor dos trabalhos que, na realidade, não foram executados), que assinou e pela qual ordenou a transferência daquele montante da conta bancária da CMLF (conta da CGD acima indicada) para a conta bancária da arguida CS, transferência essa que foi realizada;
12.14.7 Recebido o montante acima indicado, a arguida CS emitiu a favor do Município de Lajes das Flores o recibo com o n.º 6/2012, datado de 28/02/2012, da qual consta a menção às faturas n.ºs 12 e 33, no valor global de €52.826,21, sendo o valor parcelar referente à fatura n.º 33 no montante de €22.693,61;
12.15 Relativamente aos trabalhos a que se reporta o auto de medição n.º 17:
12.15.1 A arguida CS elaborou o auto de medição n.º 17, datado de 13/01/2011, no valor global de €72.358,91, valor esse que englobou o a seguir indicado;
12.15.2 A par com a indicação dos trabalhos que efetivamente executou no período a que se reporta o auto em causa, nesse auto a arguida CS fez constar que tinha executado diversos trabalhos que, na realidade, nunca foram executados, aos quais atribuiu o valor global de €49.867,85;
12.15.3 De igual forma, a arguida CS emitiu, em nome do Município de Lajes das Flores, a fatura com o n. º 12/1011, datada de 30/07/2011, no valor de €72.358,91, deduzido o correspondente montante do reforço de garantia, o que perfaz €71.635,31, da qual consta, no descritivo, para além da menção à empreitada acima referenciada, que o valor se refere ao 17.º auto de medição daquela empreitada;
12.15.4 A arguida CS apresentou os documentos acima indicados na CMLF, para pagamento da fatura referenciada;
12.15.5 Recebidos tais documentos, DD, pelo seu punho, rubricou o auto de medição e, na fatura, escreveu “concordo com as medições apresentadas” e assinou junto a tal menção, dessa forma confirmando que todos os trabalhos (incluindo aqueles que, na verdade, não foram realizados) descritos e nas quantidades indicadas naqueles documentos foram executados; seguidamente, encaminhou o auto de medição e a fatura em causa para o arguido AA;
12.15.6 Recebidos tais documentos, o arguido AA, valendo-se do cargo acima indicado, ordenou a emissão da ordem de pagamento n.º .26 do ano de 2012, emitida em nome Município de Lajes das Flores a favor da arguida CS, datada de 22/02/2012, no valor de €71.635,31, e referente ao pagamento da fatura acima indicada (incluindo do valor dos trabalhos que, na realidade, não foram executados), que assinou e pela qual ordenou a transferência daquele montante da conta bancária da CMLF (conta da CGD acima indicada) para a conta bancária da arguida CS, transferência essa que foi realizada a 13/11/2012;
12.16 Relativamente aos trabalhos a que se reporta o auto de medição n.º 18:
12.16.1 A arguida CS elaborou o auto de medição n.º 18, datado de 28/10/2011, no valor global de €45.330,20, valor esse que englobou o a seguir indicado;
12.16.2 A par com a indicação dos trabalhos que efetivamente executou no período a que se reporta o auto em causa, nesse auto a arguida CS fez constar que tinha executado diversos trabalhos que, na realidade, nunca foram executados, aos quais atribuiu o valor global de €43.678,28;
12.16.3 De igual forma, a arguida CS emitiu, em nome do Município de Lajes das Flores, a fatura com o n. º 107/1011, datada de 28/10/2011, no valor de €45.330,2091, deduzido o correspondente montante do reforço de garantia, o que perfaz €44.876,9031, da qual consta, no descritivo, para além da menção à empreitada acima referenciada, que o valor se refere ao 18.º auto de medição daquela empreitada;
12.16.4 A arguida CS apresentou os documentos acima indicados na CMLF, para pagamento da fatura referenciada;
12.16.5 Recebidos tais documentos, DD, pelo seu punho, rubricou o auto de medição e a fatura; seguidamente, encaminhou o auto de medição e a fatura em causa para o arguido AA;
12.16.6 Recebidos tais documentos, o arguido AA, valendo-se do cargo acima indicado, ordenou a emissão da ordem de pagamento n.º .36 do ano de 2012, emitida em nome Município de Lajes das Flores a favor da arguida CS, datada de 23/02/2012, no valor de €44.876,90, e referente ao pagamento da fatura acima indicada (incluindo do valor dos trabalhos que, na realidade, não foram executados), que assinou e pela qual ordenou a transferência daquele montante da conta bancária da CMLF (conta da CGD acima indicada) para a conta bancária da arguida CS, transferência essa que foi realizada a 13/11/2012.
13. Nos dias 22/04/2009, 27/07/2010, 28/05/2010, 07/06/2010, 27/08/2010, 13/09/2010, 29/08/2011 e 30 08/2011, a CMLF, por ordem do arguido AA, apresentou no âmbito do processo referente ao projeto 001 pedidos de pagamento do apoio, juntando aos mesmos, a fim de comprovar a realização das despesas elegíveis, os documentos (autos de medição, faturas, ordens de pagamento, comprovativos de transferência e recibos) acima indicados, obtendo o pagamento de parte do apoio.
14. Com as condutas acima descritas, os arguidos (em conjunto entre eles e com CC e DD) fizeram da arguida CS as quantias acima indicadas, no total de €521.145,96, que pertenciam à CMLF e que não eram devidas à arguida CS ou a outrem e às quais acederam por intermédio do arguido AA que, para tanto, usou do cargo supra enunciado.
15. A arguida CS atuou por intermédio de CC e/ou do arguido BB e estes atuaram em seu nome e no seu interesse e em nome e no interesse da arguida CS.
16. Os arguidos (bem como CC e DD, já falecidos) atuaram de modo livre, voluntário e consciente, em comunhão de intentos e esforços, cientes que o arguido AA agia enquanto ... da CMLF e que DD agia no âmbito e por causa das funções de fiscalização acima referenciadas, e com o propósito, conseguido de:
16.1 Adulterar os autos de medição e faturas supra identificados (deles fazendo constar a realização de trabalhos que descreveram, e cujas quantidades e valores indicaram, mas que, na verdade, não foram executados), bem como (através de DD) apor nesses documentos menções de conformidade quanto aos trabalhos executados inverídicas, do que todos estavam cientes, e usar (em especial através do arguido AA) tais documentos nos termos e para os moldes supra indicados, designadamente para ocultar a indevida apropriação, a favor da arguida CS, das quantias acima referidas;
16.2 Aproveitando-se do facto do arguido AA (no exercício do cargo acima indicado) ter acesso (designadamente mediante as ordens de pagamento que dava aos serviços financeiros da CMLF) ao dinheiro da CMFL, bem como ter poderes de conformação e decisão do processo referente à empreitada acima mencionada, usar de tais acesso e poderes para, no âmbito do referido processo de empreitada, em violação das regras aplicáveis e em prejuízo do erário público (em especial do erário da autarquia que representava e que lhe cumpria preservar), conformar e decidir o processo em causa em violação da lei, de modo a beneficiar a arguida CS, atuando da forma acima descrita (em especial dando, através do arguido AA, as referenciadas ordens de pagamento) e, assim, fazendo da arguida CS as quantias supra indicadas, no montante total de €521.145,96, quantias essas pertencentes à CMLF e a que a arguida CS não tinha direito (tal como não tinham direto os demais arguidos, CC ou DD), do que todos estavam cientes.
17. Todos os arguidos, tal como CC e DD, sabiam que as suas condutas eram proibidas e punidas pela lei penal.
Da situação pessoal, social e económica dos arguidos.
18. O arguido AA, nesta data com 67 anos de idade (nascido em .../.../1954), é natural do concelho das ..., o pai foi ... e a mãe foi doméstica, ambos falecidos, constituindo-se o filho mais novo de nove elementos.
19. O arguido concluiu o 7º ano de escolaridade, na ilha ..., quando cumpriu, aos 21 anos de idade, o serviço militar obrigatório, naquela ilha.
20. Em ..., regressou à ilha das ... e desenvolveu atividade laboral como ..., na Câmara Municipal das Lajes das Flores, durante 12 anos, atividade que associou à exploração agrícola/lavoura, quer enquanto ..., quer de ..., chegando a exportar gado para outras ilhas, atividade que esteve sempre presente ao longo da sua vida.
21. O arguido contraiu casamento em ..., tendo duas filhas, atualmente com 36 e 37 anos de idade, financeiramente autónomas.
22. O arguido foi eleito, pela 1ª vez, ... da Câmara Municipal das Lajes, em ..., tendo sido reeleito em ..., ... e ..., sendo que o Processo em apreço, ocorreu no decurso do último mandato autárquico.
23. O arguido AA é definido pelas pessoas que o acompanharam nos mandatos como ... como sendo detentor de grande dinamismo na defesa da causa pública, capacidade negocial e de trabalho e adequadas relações interpessoais no exercício das responsabilidades autárquicas.
24. O arguido AA apresenta hábitos regulares de trabalho, adequada inserção sócio residencial, condição económica abastada (é empresário na área da construção civil e do arrendamento turístico) e relações familiares adequadas.
25. O arguido BB, nesta data com 58 anos de idade (nascido em .../.../1964), é natural do concelho de ..., o pai foi ..., já falecido, e a mãe foi ..., constituindo-se o arguido o segundo elemento de uma fratria de três.
26. O arguido BB frequentou a faculdade de ... do ..., onde se licenciou aos 24 anos, em ..., tendo, de imediato, sido chamado ao cumprimento do Serviço Militar Obrigatório, em função do qual foi deslocado, primeiro para ... e, posteriormente, para ....
27. Findo o período referido no facto anterior, o arguido integrou o quadro pessoal da Empresa Castanheira e Soares, onde desempenhou cargos diretivos.
28. O arguido exerceu o cargo de ... de Santa Cruz das Flores durante dois mandatos (de ... a ... e de ... a ...).
29. Foi chamado pelo então denominado Tribunal de ... à realização de peritagens.
30. Exerceu funções de ... junto do Serviço de Finanças de ... (...) e junto do então B.. . ....., durante vários anos, até se ter transferido para ..., em ..., na sequência do colapso financeiro da empresa Castanheira e Soares, e onde permanece, por conta da empresa portuguesa de construção civil “C..., Lda”, com sede na cidade da ....
31. O arguido contraiu casamento aos 25 anos de idade, tendo dois filhos, atualmente com 30 e 27 anos de idade, financeiramente autónomos.
32. O arguido BB é definido pelas pessoas que o acompanharam nos vários cargos que desempenhou como sendo detentor de grande dinamismo na defesa da causa pública, capacidade negocial e de trabalho e adequadas relações interpessoais.
33. A arguida Castanheira & Soares, Ld.ª foi declarada insolvente por sentença proferida em 6 de março de 2012, transitada em julgado em 03/05/2012, no Processo nº 19/12.9..., que correu termos no Tribunal Judicial de ..., tendo sido proferida decisão em 19/09/2014 de encerramento do processo de insolvência em virtude da homologação de Plano de Insolvência.
Do certificado do registo criminal dos arguidos.
34. O arguido AA não tem antecedentes criminais, nem qualquer registo criminal.
35. Por sentença transitada em julgado em 14/12/2015, proferida no Processo Comum Singular nº 100007/12.9..., que correu termos no Juízo de Competência Genérica de ... do Tribunal Judicial da Comarca dos Açores, referente a factos cometidos em 10/11/2012, a arguida Castanheira & Soares, Ld.ª foi condenada pela prática de um crime de abuso de confiança na forma continuada, previsto e punido pelo art.º 105.º, nº 1, e nº 5, do Regime Geral das Infrações Tributárias (RGIT), e art.º 30.º do Código Penal, com referência aos art.ºs 6.º, 7.º e 12.º, nº 2, do RGIT, na pena de 300 dias de multa, à taxa diária de € 5,00, no total de € 1.500,00.
36. Por acórdão transitado em julgado em 29/10/2018, proferido no Processo Comum Coletivo nº 57/10.6..., que correu termos no Juízo Central Cível e Criminal de..., Juiz 1, do Tribunal Judicial da Comarca dos Açores, referente a factos cometidos em 29/11/2009, a arguida Castanheira & Soares, Ld.ª foi condenada pela prática de três crimes de falsificação ou contrafação de documento, previstos e punidos, cada um, pelos art.ºs 255.º, al. a), e 256.º, nº 1, al. a), e 4, do Código Penal, com referência aos art.ºs 11.º, nº 1, e 2 e 386.º, nº 4, do Código Penal, e art.ºs 2.º e 3.º, nº 1, al. I), e 5.º, todos da Lei nº 34/87, 16/07, na pena única de 360 dias de multa, à taxa diária de € 100,00, no total de € 36.000,00, substituída pela caução no montante de € 5.000,00.
37. O arguido BB não tem antecedentes criminais, nem qualquer registo criminal.
39. DD faleceu em ... de ... de 2018.
41. Na esquadra da PSP, o arguido BB foi brevemente questionado acerca dos seus dados pessoais, informado sobre os factos em questão e sobre se pretendia prestar declarações, ao que respondeu negativamente.
42. Toda a interação do arguido BB com a PSP ocorreu entre as 18:40 horas e as 18:50 horas, do dia .../.../2017.
II.3. Factos dados como não provados pelo Tribunal de 1.ª Instância (transcrição):
Não resultou provado:
a) Que, em data concretamente não apurada, mas após a emissão pela arguida CS do auto de medição n.º 2 (a 02/02/2010) e antes da emissão do auto de medição n.º 3 (a 02/03/2010) – ambos referente à referenciada empreitada –, os arguidos tivessem delineado um plano com vista a, por um lado, fazer da arguida CS quantias que pertencessem à CMLF e que não eram devidas àquela (nem eram devidas a nenhum daqueles outros) e, ao mesmo passo, justificar contabilisticamente, e aos olhos de terceiros, tais saídas de dinheiro das contas da CMLF e, por outro lado, levar a que o apoio atribuído no âmbito do projeto 001 fosse pago pela entidade responsável pelo pagamento não obstante o incumprimento, pela CMLF (beneficiária do apoio), das condições estipuladas para o efeito (entre as quais a execução dos trabalhos da empreitada nos prazos estipulados).
b) Que, após o ato descrito em 41 dos factos provados, a PSP tivesse apresentado de imediato ao arguido BB a documentação constante de fls. 534 a 538 dos autos, e tivesse ordenado a sua assinatura.
c) Que o Arguido tivesse perguntado do que se tratava, tendo-lhe sido comunicado pelos agentes da PSP que, para já, tinha que assinar a documentação e, mais tarde, poderia ver do que se tratava.
d) Que não tivessem sido indicados e explicados ao arguido BB os direitos e deveres processuais referidos no artigo 61.º, do CPP.
e) Que não tivesse sido entregue ao arguido BB cópia da documentação constante de fls. 534 a 538 dos autos, nem qualquer outra da qual constasse a identificação do processo e os direitos e deveres processuais referidos no artigo 61.º, do CPP.
f) Que o arguido BB não tivesse sido informado do seu direito a ser assistido por advogado durante o interrogatório.
II.4. Do acórdão recorrido, sob a epígrafe «Questão prévia», consta a seguinte decisão, relativa ao pedido de indemnização civil (transcrição):
«Questão prévia.
Do pedido de indemnização civil.
O pedido de indemnização civil deduzido pelo Município das Lajes das Flores foi admitido liminarmente por despacho de 03/03/2021, «por estar em tempo e ter legitimidade».
Cumpre proferir despacho definitivo de admissão ou de não admissão do pedido de indemnização civil, na esteira do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 23/03/1995, proferido no Processo nº 46967, citado no Código de Processo Penal Anotado, de Simas Santos e Leal-Henriques, 2ª edição, Rei dos Livros, I volume, página 399, no sentido em que a prolação de despacho de admissão liminar do pedido de indemnização civil não dispensa a prolação de um despacho definitivo de admissão ou de não admissão.
O Município das Lajes das Flores instaurou ação administrativa comum contra a sociedade Castanheira e Soares, Ld.ª, CC e DD, que corre termos no Tribunal Administrativo e Fiscal de ..., sob o nº 269/15.6..., pedindo a condenação dos Réus no pagamento solidário ao Município das Lajes das Flores da quantia de € 442.888,55, pelos mesmos factos que constam da acusação dos presentes autos, ainda não tendo sido proferida sentença (cfr. ofício junto em 19/07/2018 pelo município das Lajes das Flores datado de 12/07/2018, ofício junto pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de ... datado de 22/11/2018, oriundo do processo nº 269/15.6..., dando conta que «a instância encontra-se suspensa, por falecimento de uma das partes na acção» e ofício emitido pelo município das Lajes das Flores junto em 06/10/2020, a fls. 994, datado de 02/10/2020).
Considerando que o Município das Lajes das Flores instaurou ação administrativa comum contra a sociedade Castanheira e Soares, Ld.ª, CC e DD, que corre termos no Tribunal Administrativo e Fiscal de ..., sob o nº 269/15.6..., pedindo a condenação dos Réus no pagamento solidário ao Município das Lajes das Flores da quantia de € 442.888,55, pelos mesmos factos que constam da acusação dos presentes autos, exercendo a opção pelo tribunal cível/administrativo e contra aqueles Réus/demandados que o art.º 72.º, nº 1, al. a), do Código de Processo Penal, lhe faculta, afigura-se-nos que não pode deduzir idêntico pedido no processo penal, com base nos mesmos factos (mesma causa de pedir), contra outros demandados/arguidos, in casu, os demandados/arguidos AA e BB.
Ou seja, tendo o Município das Lajes das Flores recorrido ao foro cível para obter o ressarcimento dos danos sofridos pelo crime, com fundamento no facto de, volvidos oito meses sobre a notícia do crime, não haver sido deduzida acusação, fazendo uso da faculdade prevista no art.º 72.º, nº 1, al. a), do Código de Processo Penal (a queixa crime foi apresentada em juízo em 31/07/2014 e a acusação foi deduzida em 15/10/2020, isto é, seis anos depois da apresentação da queixa crime), não se nos afigura admissível que possa deduzir o mesmo pedido, com base nos mesmos factos, no processo penal contra demandados/arguidos que optou por não demandar no processo cível.
Ao optar pelo tribunal cível/administrativo e ao fazer uso da faculdade prevista no art.º 72.º, nº 1, al. a), do Código de Processo Penal, a fim de obter o ressarcimento dos danos sofridos, o Município das Lajes das Flores ficou impedido de deduzir pedido cível idêntico no processo penal ainda que contra outros demandados/arguidos.
Pelo exposto, ao abrigo do disposto no art.º 72.º, nº 1, al. a), do Código de Processo Penal e considerando que o Município das Lajes das Flores instaurou ação administrativa comum contra a sociedade Castanheira e Soares, Ld.ª, CC e DD, que corre termos no Tribunal Administrativo e Fiscal de ..., sob o nº 269/15.6..., pedindo a condenação dos Réus no pagamento solidário ao Município das Lajes das Flores da quantia de € 442.888,55, pelos mesmos factos que constam da acusação dos presentes autos, exercendo a opção pelo tribunal cível/administrativo que o citado dispositivo legal lhe faculta, não se admite o pedido de indemnização civil deduzido nestes autos pelo Município das Lajes das Flores contra os arguidos/demandados AA e BB e, em consequência, absolve-se os demandados AA e BB da instância.
Recurso do arguido AA:
- Se devem ou não ser declaradas perdidas a favor do Estado as vantagens obtidas com a prática dos crimes.
Recurso do assistente Município:
- Se o tribunal criminal é competente em razão da matéria para conhecer do pedido civil deduzido no processo penal.
Atento o disposto nos artºs 400º 2 e 3, e 32º1 CPP e artº 629º2 a) CPC ex vi artº 4º CPP e tendo presente as questões a apreciar, há que conhecer desde logo da incompetência material do tribunal (incompetência absoluta) para conhecer do pedido civil deduzido, e depois importa analisar se deve ser admitido o recurso do arguido relativamente à declaração de perda de vantagens, o que faremos adiante face à autonomia dos recursos e dos recorrentes.
Conhecendo.
O assistente Município de Lages das Flores deduzira pedido de indemnização civil contra dois dos arguidos acusados neste processo quais sejam o arguido AA e o arguido BB.
O Tribunal de 1ª instancia resolveu não admitir tal pedido, após audiência de julgamento, no seu acórdão, como questão prévia, por o mesmo Município haver instaurado na pendencia do processo (inquérito) acção administrativa comum contra a sociedade arguida Castanheira e Soares, Ld.ª, e seu sócio CC e o fiscal DD, a correr termos no Tribunal Administrativo e Fiscal de ..., sob o nº 269/15.6...
O Tribunal da Relação recorrido, por seu lado, decidiu “Declarar a incompetência do tribunal criminal, em razão da matéria, para apreciar o pedido de indemnização civil formulado e consequentemente decidir manter a decisão recorrida de absolvição dos demandados da instância civil enxertada nos autos, ainda que com diverso fundamento, considerando prejudicada a apreciação dos fundamentos do recurso interposto pelo demandante civil/assistente Município das Lajes das Flores”.
Apreciando.
Resulta dos autos que:
O processo crime foi instaurado em 31/7/2014
A acusação foi deduzida em 15/10/2020
O Município, no Tribunal Administrativo e Fiscal de ..., sob o nº 269/15.6... instaurou acção administrativa comum contra a sociedade arguida Castanheira e Soares, Ld.ª, o seu sócio CC e contra DD, tendo por base o contrato celebrado e em apreciação nestes autos criminais, pedindo a condenação destes Réus no pagamento solidário ao Município das Lajes das Flores da quantia de € 442.888,55, pelos mesmos factos que constam da acusação dos presentes autos.
O Município, nestes autos, deduziu pedido civil de indemnização pelos factos em apreciação nestes autos contra os arguidos AA e BB, que foi liminarmente admitido em 3/3/2021.
A jurisprudência tem reiteradamente assumido que a decisão genérica ou tabelar sobre pressupostos processuais, não faz caso julgado, o que tem em termos amplos expressado nos AFJ 2/95 de 16/5/95 (legitimidade do Mº Pº em processo crime) e AFJ 5/2019 (despacho de admissão da impugnação contraordenacional), doutrina que é aplicável ao caso sobre a admissão tabelar do pedido de indemnização civil, pelo que nada obstava à apreciação feita no acórdão pelo tribunal da 1ª instância, uma vez que não houve anteriormente um debruçar sobre essa questão.
O Tribunal da 1ª instancia veio a não admitir o pedido civil de indemnização, ao abrigo do artº 72º1a) CPP por o Município haver recorrido aos tribunais administrativos para se ressarcir dos factos imputados nestes autos, pedindo a condenação dos demandados sociedade e seu sócio (Castanheira e Soares, Ld.ª, e seu sócio CC) e do fiscal DD) a pagar-lhe a quantia de € 442.888,55 e não poder demandar agora, no processo penal, os demais arguidos AA e BB.
Por seu lado a Relação de Lisboa entende que se trata de incompetência material do tribunal por essa apreciação competir apenas aos tribunais administrativos e a mais nenhum outro, donde nunca poderia vingar nesta matéria o principio de adesão/ enxerto cível.
Vejamos.
O artº 71º CPP, consagra o principio da adesão da acção civil ao processo penal, fazendo jus ao principio da suficiência do processo penal (artº 7º CPP), de acordo com o qual a indemnização pelos danos causados pela prática de um crime (calculados nos termos da lei civil – artº 129ºCP) devem ser pedidos no processo crime, só podendo sê-lo em separado (na jurisdição/ tribunal normalmente competente) nos casos expressos lei. Sendo esta a regra (quando um facto é crime e que gera a obrigação de indemnizar pelos danos que provoca) uma das exceções é a da demora no andamento do processo crime, previsto na al. a) do nº1 do artº 72º CP, o que aqui ocorreu, pois, decorridos oito meses sem acusação ou andamento do processo, pode ser instaurada acção visando a responsabilidade civil por facto ilícito criminal.
Não existirá duvida de que sendo os arguidos em processo penal os demandados na acção autónoma de indemnização, que existirá impedimento para a dedução posterior (à instauração da acção de indemnização) do pedido de indemnização na acção penal, mais que não fosse pela existência de pedidos idênticos contra as mesmas pessoas e pelos mesmos factos (exceção da litispendência).
No caso dos autos os demandados são diferentes.
Na acção administrativa foram demandados os intervenientes no contrato administrativo (a sociedade e o seu sócio CC e o fiscal DD), e aqui demandados são apenas os arguidos ( AA e BB e já não a arguida Castanheira e Soares Lda.) como causadores com os demais eventuais responsáveis que com a sociedade nada têm a ver. Além ocorre a acção com base num contrato administrativo e responsabilidade contratual e aqui com base na responsabilidade emergente de um crime. Se o facto “concreto” donde emerge (que lhe deu causa) a responsabilidade civil é a mesma (a existência de um contrato de empreitada celebrado entre o Município e a sociedade construtora), a causa na acção penal é a imputação de um crime, sem qualquer responsabilidade contratual.
Assim não tendo os arguidos ora demandos na acção penal, sido demandados ou intervenientes na acção administrativa, não vemos qualquer obstáculo à sua demanda no processo penal, por esta via em face da diferente causa de responsabilidade
No que respeita à competência dos tribunais administrativos, versus tribunal criminal, também cremos nada obstar à dedução do pedido civil de indemnização pelo ilícito criminal.
No acórdão recorrido invoca-se:
- o art. 4º do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais, aprovado pela Lei n.º 13/2002 de 19/02, na parte que ora releva (nº 1 alíneas f) e g)), em face do que compete aos tribunais administrativos “a apreciação dos litígios que tenham por objecto questões relativas a:
f) Responsabilidade civil extracontratual das pessoas coletivas de direito público, incluindo por danos resultantes do exercício das funções política, legislativa e jurisdicional (…); g) Responsabilidade civil extracontratual dos titulares de órgãos, funcionários, agentes, trabalhadores e demais servidores públicos, incluindo ações de regresso”.
Analisando tais normas, há desde logo que excluir a al.f) porque não está em causa a responsabilidade de pessoas coletivas de direito publico (foi apenas demandada uma pessoa coletiva / sociedade comercial de direito privado, e pessoas singulares), e o mesmo ocorre quanto aos demandados (al. g) nessa acção que são a sociedade contratante, o seu sócio e o fiscal afecto à obra por um contrato de prestação de serviço) e a responsabilidade que emerge na acção administrativa é uma responsabilidade contratual.
- o nº2 do art. 4º do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais que atribui competência aos tribunais administrativos para dirimir os litígios nos quais devam ser conjuntamente demandadas entidades públicas e particulares entre si ligados por vínculos jurídicos de solidariedade, designadamente por terem concorrido em conjunto para a produção dos mesmos danos…” também não colhe pois não estamos perante entidades publicas e privadas demandadas conjuntamente ou que o devessem ser, pois há apenas uma entidade privada demandada, sendo os demais demandados na acção administrativa pessoas singulares (já falecidas: em 13/6/2016 e 18/6/2018)
- no que respeita ao alegado artº 519º, nº 1 CC que estabelece que “O credor tem o direito de exigir de qualquer dos devedores toda a prestação, ou parte dela, proporcional ou não à quota do interpelado; mas, se exigir judicialmente a um deles a totalidade ou parte da prestação, fica inibido de proceder judicialmente contra os outros pelo que ao primeiro tenha exigido, salvo se houver razão atendível, como a insolvência ou risco de insolvência do demandado, ou dificuldade, por outra causa, em obter dele a prestação” como causa que impediria a demanda dos ora arguidos AA e BB, não tem cabimento, visto que a CS (Castanheira e Soares Lda.) demanda na acção administrativa (e não o foi ora no pedido civil), foi declarada insolvente em 6/3/2012 o que constitui nos termos da norma transcrita razão atendível para demandar os arguidos como o foram.
Afigura-se-nos, em face do exposto e do principio da adesão e da suficiência do processo penal que a apreciação da responsabilidade civil (extracontratual) emergente de um crime, não é excluída dos tribunais criminais pelo facto de o seu agente estar submetido, normalmente à jurisdição administrativa, ou qualquer outra. Através dessa norma – artº 7º1 CPP – atributiva da competência aos tribunais criminais (civis) para resolver todas as questões que interessem à decisão da causa -, e mesmo que se decida suspender o processo penal para a questão ser solucionada fora do processo criminal, este readquire essa competência se findo o prazo de suspensão não tiver ainda sido decidida no foro próprio (nº 4 in fine CPP) - decorre a prevalência do conhecimento da questão no processo penal.
Deste modo, e em face desta norma resolvem-se no processo penal todas as questões que interessam à causa seja qual for a sua natureza, e tem como fundamento o de afastar de quaisquer obstáculos que possam ser levantados para paralisar e retardar a acção penal, e desse modo evitar o julgamento e a punição dos culpados pelo ilícito criminal. Castanheira Neves, sustenta “ A razão deste principio é clara: só garantida nestes termos a independência e a suficiência da acção penal fica ela ao abrigo de quaisquer obstáculos que indiretamente se quisessem pôr ao seu exercício”5. Figueiredo Dias6, diz-nos também que “ O processo penal é, em principio, o lugar adequado ao conhecimento de todas as questões cuja resolução se revele necessária à decisão a tomar. No iter que conduz a esta decisão podem, na verdade, surgir questões de diversa natureza (penal, civil, administrativa, etc) cuja resolução condiciona o ulterior desenvolvimento do iter.” ou seja, conclui, o processo penal “é auto suficiente” de modo a evitar a colocação em risco das exigências de concentração processual ou de continuidade do processo.
Ora o principio de adesão, em principio obrigatório tem efectivamente em mente evitar esses riscos e resolver de uma única vez o caso com todas as suas implicações (penais e de responsabilidade civil).
Ora estando em causa, quanto aos demandados, pessoas singulares, a responsabilidade civil conexa com a criminal, e em virtude da prática de ilícitos criminais, não vemos qualquer obstáculo legal à sua demanda neste processo penal ao abrigo do artº 71º CPP, sendo certo que para o seu conhecimento não se suscita nenhuma questão de outra natureza jurídica que obstasse ao seu conhecimento ou lhe fosse prejudicial, ou os exima de responsabilidade por facto ilícito.
Donde, deve ser admitido e conhecido o pedido civil deduzido pelo Município Lages das Flores contra aos arguidos AA e BB, assim dar provimento ao recurso revogando o acórdão recorrido nesta parte.
A 1ª instância negou essa perda pelo facto de haver sido instaurada pelo lesado (Município Lages das Flores) a acção administrativa nº 269/15.6... no Tribunal Administrativo e Fiscal de ... que acautelaria o seu direito de reparação dos danos, e consequentemente não haveria interesse útil na declaração de perdimento, o qual só ocorreria se o lesado não manifestasse interesse na reparação do seu direito, e Relação revertendo a decisão (de não condenação) condenou os arguidos no perdimento da quantia de € 521.145,96 a titulo de perda de vantagem, sendo certo que a parte criminal foi confirmada (dupla conforme ). Donde para aquilatar da sua recorribilidade ou não, face à decisão e aos artºs 400º al. e) e 432º b) CPP, importa saber se tal condenação se integra na condenação crime ou tem outra natureza e se se reveste de autonomia.
Conhecendo desta questão prévia:
Diversas são as concepções sobre a natureza jurídica do instituto de perda de vantagens, sendo nuns ordenamentos jurídicos tratada como pena acessória, enquanto medida de carácter retributivo, ao passo que noutras é havida como medida de segurança de carácter preventivo, sendo, ainda, noutras, classificada como uma medida de natureza mista, dadas as finalidades concorrentes de prevenção geral e especial, que a definem como uma medida de natureza análoga ora à da pena, ora à da medida de segurança7
No CP 1886 era considerada efeito da pena ou da condenação
Na doutrina e jurisprudência portuguesa as concepções vão deste a consideração de que se trata de uma medida sancionatória análoga à medida de segurança com intuitos exclusivamente preventivos, ou como a apelida Figueiredo Dias8 “providência sancionatória análoga à da medida de segurança” visando prevenir a prática de futuros crimes, e tendo “como finalidade subtrair ao arguido (ou a terceiros) os proventos obtidos em resultado da prática de factos ilícitos típicos.” No mesmo sentido opinam Pinto de Albuquerque, e Leal Henriques e Simas santos,
Como pena acessória, vê-a Damião da Cunha, o que, ora, não será sustentável por a perda não depender da condenação, e portanto da aplicação de uma pena, e Pedro Caeiro vê-a como um tertium genus mas não lhe reconhecendo, tal como João Correia, carácter análogo à medida de segurança porque não se dirige à perigosidade do agente. Hélio Rodrigues vê-a como quarta via das reações contra o crime mas sem ligação a este, não assumindo a natureza de sanção mas de restituição, assumindo por isso a natureza de consequência civil.
O Tribunal Constitucional (cfr. ac. n.º 595/2020, citando o ac. n.º 392/2015, in https://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos, segue a tese da providencia sancionatória, salientando que “não está em causa a imposição de um mal, mas a supressão dos benefícios do crime, cuja manutenção na esfera do visado poderia induzi-lo à prática de novos ilícitos e criar na comunidade perniciosas sensações de impunidade. (...)”9
O STJ segue o mesmo caminho, como resulta do Ac. de 25/03/2015, Proc. n.º 244/10.7JAAVR.C1.S1, em www.dgsi.pt, assumindo-se embora no ac. STJ de 12/01/2022, Proc. n.º 3519/16.8T8LLE.E1.S1, em www.dgsi.pt que a sua natureza “não é estritamente civil”
As posições têm sido sintetizadas, para uns como instituto de natureza sancionatória, mais próximo das penas uns e mais próximo da medida de segurança para outros e ainda como um tertium genus ou quarta espécie das reações contra atos ilícitos típicos
A perda de vantagem ou confisco tem a sua ligação ao crime, porque prevista no Cód. Penal mas com autonomia, e tem como fonte a pratica de um ato ilícito típico, que a legitima, tal como a responsabilidade civil pode emergir do mesmo facto ilícito e tem previsão também no Código penal na sua ligação ao crime, e é decretada no respetivo processo, o que legitima, cremos, a sua consideração de providencia sancionatória, e não estando dependente da condenação, não é pena nem seu efeito penal, mas apesar disso está prevista no Código penal.
Não revestirá natureza penal ou estritamente penal, porque visa repor a situação patrimonial que existiria se não ocorresse o facto ilícito típico (como reparação civil), e prescinde da existência de crime ou da atuação do agente e da culpa, e é independente de alguém ser perseguido, podendo ser decretada contra quem não é perseguido e portanto independentemente de um juízo de condenação de natureza penal, mas a sua ligação ao facto ilícito típico, ou seja, ao facto previsto na lei penal como crime, retira-lhe a natureza de natureza estritamente civil.
Controvertida a sua natureza, importa assinalar a sua natureza preventiva, e por isso não pode ser confundida com sanção penal, e aproxima-se mais de uma restituição do indevido, porque retira ao agente a favor da vitima ou do Estado aquilo de que se apropriou e a que não tem direito, e por isso se aproxima mais da natureza civil. Será por isso, o confisco, uma providencia sancionatória de caracter patrimonial, de reposição do indevido (restituição ou reparação) emergente de um ato ilícito típico, dotado de autonomia face ao crime10, autonomia consolidada pelo Código penal de 1995.
Como questão dotada de autonomia, e não dependente da condenação penal em face do principio da cindibilidade das questões recursivas (artºs 400º 2 e 3, e 403ºCP, é de conhecer da mesma e admitir o recurso quanto a ela.
Apreciando:
Tendo presente o disposto no artº 110º 1b) CP que estabelece que “1 - São declarados perdidos a favor do Estado: ...
b) As vantagens de facto ilícito típico, considerando-se como tal todas as coisas, direitos ou vantagens que constituam vantagem económica, direta ou indiretamente resultante desse facto, para o agente ou para outrem”, e que tal não prejudica os direitos do ofendido (nº6), e que se mostram verificados os respetivos requisitos (a prática de um ato ilícito, e a existência de proveitos obtidos com a prática desse ato) a Relação de Lisboa, ponderando a existência de “duas correntes jurisprudenciais relativamente à questão da cumulação da condenação na perda de vantagens decorrentes da prática do crime com a condenação no pedido de indemnização civil: (i) a que sustenta que não pode ocorrer duplicação de penalizações para o agente do crime, pelo que a procedência do pedido de indemnização civil, quando seja pelo valor que o agente do crime obteve, deverá afastar a declaração de perda de vantagens5; (ii) a que entende não ocorrer incompatibilidade entre ambos os institutos, devendo a eventual duplicação de penalizações ser resolvida na fase posterior da execução coerciva”, e sendo que “o demandado não poderá pagar duas vezes a mesma quantia” considera “como mais consentâneo com o regime legal previsto a posição que sustenta não ocorrer qualquer incompatibilidade entre o decretamento do confisco previsto no art. 110º do Código Penal e a procedência do pedido de indemnização civil formulada pelo lesado, podendo este, nos termos do artigo 130º, nº 2 do Código Penal “fazer-se pagar” quanto aos danos causados pelo valor das vantagens recebidas pelo Estado”.
A perda de vantagem prevista no citado normativo do CP - 11(sendo esta “ todo e qualquer beneficio patrimonial que resulta do crime ou através dele tenha sido alcançado” -, é maioritariamente, como vimos, considerada uma medida ou “providencia sancionatória de natureza análoga à da medida de segurança” e não uma pena acessória ou efeito da pena, e através dela visa-se um fim de prevenção geral demonstrativo de que o crime não compensa, (daí que a tenhamos visto como uma providencia sancionatória de caracter patrimonial, de reposição do indevido (restituição ou reparação) emergente de um ato ilícito típico), devendo ser aplicada sempre que se verifiquem os respetivos pressupostos e devendo constar da acusação deduzida, para que o visado possa exercer, em pleno, o seu direito de defesa.
Em face desse desiderato, e pela circunstância de poder ser deduzido pelo ofendido/ lesado pedido de indemnização civil e o decretamento dessa perda não poder prejudicar os direitos do ofendido (que se pode fazer reparar pelos bens ou vantagens declaradas perdidas a favor do Estado - artº 130º2 CP), o que desde logo demonstra a possibilidade de coexistência dos dois pedidos (o pedido de indemnização civil e declaração de perda, são independentes um do outro e não um dependente da inexistência do outro), o STJ foi chamado a solucionar as diferentes decisões sobre tal temática o que fez, fixando através do Ac. STJ n.º 5/2024, de 9 de maio a seguinte jurisprudência obrigatória “Nos termos do disposto no artigo 111.º, n.os 2 e 4, do Código Penal, na redacção dada pela Lei n.º 32/2010, de 02/09, e no artigo 130.º, n.º 2, do Código Penal, na redacção anterior à Lei n.º 30/2017, de 30/05, as vantagens adquiridas pela prática de um facto ilícito típico devem ser declaradas perdidas a favor do Estado, mesmo quando já integram a indemnização civil judicialmente pedida e atribuída ao lesado pelo mesmo facto” assim afastando a tese da inutilidade de um em face do outro, ou o mesmo é dizer que deduzido pedido civil não haveria lugar à perda de vantagens tal como não haveria se o lesado se fizesse ressarcir de outro modo, e só haveria declaração de perda em face do desinteresse do ofendido na reparação / ressarcimento dos seus danos.
Como o STJ refere no seu ac. de 2/6/202212 com a declaração de perda de vantagens visa-se “… demonstrar ao arguido que o crime não compensa e, por outro lado, que se houver bens obtidos através da prática do crime devem ser usados para indemnizar os lesados. Deste modo, nem o Estado está impedido de confiscar os proventos do crime, nem o lesado vê a sua compensação dificultada, nem o arguido pode ser constrangido a pagar duas vezes" e nessa medida o legislador optou pelo sistema misto no que a este instituto se refere, traduzido na situação em que “o Estado deve articular o confisco com a integral protecção dos direitos das vítimas (é o modelo que procura conjugar os interesses em jogo,… garantindo que o confisco é sempre declarado e que os direitos das vítimas são, também, sempre assegurados) e, deste modo, o legislador pode salvaguardar integralmente os efeitos preventivos do confisco (reduzir o arguido ao estado patrimonial anterior à prática do crime, assim demonstrando que ele não compensa) e respeitar os direitos da vítima”13
A citada doutrina fixada pelo AFJ nº 5/2024 inexistente à data do acórdão da Relação é aplicável à situação dos autos e está em conformidade com essa doutrina, e por isso é de manter a decisão da Relação nessa parte, pelo que se confirma o decretamento da perda de vantagens e em consequência a condenação solidaria dos arguidos a pagar ao Estado, a título de perda de vantagens a quantia de € 521.145,96 (quinhentos e vinte e um mil, cento e quarenta e cinco euros e noventa e seis cêntimos). E daí não resulta que os arguidos tenham de pagar duas vezes a mesma quantia, uma vez que a quantia perdida será afeta ao lesado, caso ainda não tenha sido o demandante/ lesado ressarcido (artºs 110º6 e 130º2 CP)
Não há outras questões alegadas ou de que cumpra conhecer
- Julgar procedente o recurso interposto pelo assistente Município Lages das Flores e em consequência revoga parcialmente o acórdão da Relação de Lisboa e admite a dedução de pedido civil de indemnização pela assistente contra os arguidos /demandados AA e BB, e determina o seu conhecimento;
Determina o envio do processo ao Tribunal da Relação de Lisboa, em face da admissão do pedido civil a fim de dele conhecer ou determinar, se não for possível, o seu conhecimento e apreciação pelo tribunal de 1ª instância;
Sem custas.
- julgar improcedente o recurso interposto pelo arguido AA e em consequência mantem a decisão que condena os arguidos AA, BB e Castanheira & Soares, Lda., a pagar, solidariamente, ao Estado a quantia de € 521.145,96 (quinhentos e vinte e um mil, cento e quarenta e cinco euros e noventa e seis cêntimos, a título de perda de vantagem;
Condena o arguido recorrente no pagamento da taxa de justiça de 6 Ucs e nas demais custas
Registe e notifique.
José A. Vaz Carreto (relator)
António Augusto Manso
Maria do Carmo Silva Dias
__________
1. Ac. do STJ de 19/6/1996, in BMJ n.º 458, pág. 98 e Prof. Germano Marques da Silva, in “Curso de Processo Penal” III, 2.ª Ed., pág. 335
2. in DR I-A de 11/12/94 e DR. I-A de 28/12 / 95
3. G. Marques da Silva, “Curso de Processo Penal”, III vol. pág. 367, e Simas Santos e Leal Henriques, “C.P.Penal Anotado”, II vol., pág. 742,
4. - cfr. Ac. STJ 29/01/92 CJ XVII, I, 20, Ac. TC 5/5/93 BMJ 427, 100
5. Castanheira Neves, Sumários de Processo Criminal, Lições 1967-1968, pág. 88, apud Maia Gonçalves, Cod. Proc. Penal, 16ª ed. pág. 70.
6. Direito Processual Penal, I vol. Coimbra edit. 1984, pág. 163 e 164.
7. Para aprofundamento do tema e diversas cambiantes em Portugal e no direito comparado, cfr. o Ac. F. J. nº 5/2024 de 9/5;
8. In Direito Penal Português – As Consequências Jurídicas do Crime, Reimpressão, Coimbra, Coimbra Editora, 2005, p. 418, a propósito da natureza jurídica do regime da perda de vantagens, em que refere tratar-se de "uma providência sancionatória análoga à da medida de segurança (...), no sentido de que é sua finalidade prevenir a prática de futuros crimes, mostrando ao agente e à generalidade que, em caso de prática de facto ilícito-típico, é sempre e em qualquer caso (e sublinharíamos o sempre e em qualquer caso) instaurada uma ordenação dos bens adequada ao direito; e que, por isso mesmo, esta instauração se verifica com inteira independência de o agente ter ou não atuado com culpa".
9. Cfr também o Ac. n.º 336/2006, do TC em www.tribunalconstitucional.pt/tc/
10. Cfr. Ac. do STJ, de 29/04/2020, Proc. n.º 928/08.0TAVNF.G1.S1, em www.dgsi.pt, quando diz que “(...) a declaração de perda, independentemente da classificação que lhe possa ser atribuída, sendo uma consequência jurídica de carácter patrimonial dos ilícitos cometidos, não é uma pena nem uma medida de segurança, nem uma forma de indemnização civil por danos emergentes do crime, regulada na lei civil (artigo 129.º do Código Penal, Título VI da Parte Geral). Devendo notar-se, a este propósito, que a perda não se inclui nos capítulos relativos às penas (Capítulo II), às penas acessórias e efeitos das penas (Capítulo III) ou às medidas de segurança (Capítulo VII), mas num capítulo autónomo (Capítulo IX) do Título III (Das consequências jurídicas do crime) da Parte Geral (Livro I) do Código Penal.” in AFJ 5/24;
11. F Dias, As Conseq. Juridicas, págs 632, 638
12. Proc. n.º 61/21.9GBMTS.S1 Cons. Orlando Gonçalves in www.dgsi.pt).
13. Cfr. AFJ 5/24 D.R n.º 90/2024, Série I de 2024/05/09 citando JOÃO CONDE CORREIA e HÉLIO RIGOR RODRIGUES, em “O Confisco das Vantagens e a Pretensão Patrimonial da Autoridade Tributária e Aduaneira nos Crimes Tributários (Anotação ao Acórdão do TRP de 23/11/2016, Processo n.º 905/15.4IDPRT.P1)”, Revista Julgar On Line, 2017, cit., pp. 14-15, disponível em http://julgar.pt/wp-content/uploads/2017/01/20170123-ARTIGO-JULGAR-Confisco-e-pretens%C3%A3o-da-Autoridade-Tribut%C3%A1ria-J-Conde-Correia-e-H%C3%A9lio-R-Rodrigues.pdf, onde se descreve que “são várias as formas possíveis de compatibilização destes institutos: i) o Estado pode confiscar os proventos do crime indiferente aos direitos das vítimas - como ocorre actualmente no âmbito da civil recovery do Reino Unido -, pois há uma obrigação geral de confiscar os proventos do crime e ao lesado cabe, apenas, opor-se ao mesmo. Com efeito, se nada fizer, o bem transfere-se para a esfera jurídica do Estado - este modelo privilegia o interesse comunitário no integral confisco dos proventos em detrimento dos direitos individuais; ii) o Estado não pode confiscar os bens quando exista uma vítima com a possibilidade abstracta de formular um pedido de indemnização civil ou de utilizar qualquer outro meio formal para compensar os seus prejuízos (é o que acontece no sistema alemão - Verfall, que transfere para a vítima o ónus de actuar em vez de assumir o confisco como uma obrigação estadual - em vez de ser uma proclamação geral, transforma-se num mero efeito esporádico e aleatório perdendo muito da eficácia preventiva que a justifica); iii) o Estado deve articular o confisco com a integral protecção dos direitos das vítimas (é o modelo que procura conjugar os interesses em jogo, situando-se a meio caminho dos anteriores, mas garantindo que o confisco é sempre declarado e que os direitos das vítimas são, também, sempre assegurados) e, deste modo, o legislador pode salvaguardar integralmente os efeitos preventivos do confisco (reduzir o arguido ao estado patrimonial anterior à prática do crime, assim demonstrando que ele não compensa) e respeitar os direitos da vítima.”