Na determinação da medida da pena não pode ser valorado negativamente ( contra o arguido) o ter-se furtado à acção da justiça sendo capturado 5 meses depois, pois não é imposto ao arguido que se deixe prender seria, apenas, positivo e poderia valorizar-se se o tivesse feito; do mesmo modo o não assumir a sua conduta (vg. confessar o ato) também não pode ser valorado negativamente nessa perspetiva, pois o arguido pode remeter-se ao silêncio sem que isso o desfavoreça, tal como pode prestando declarações faltar à verdade; do mesmo efeito o facto de não mostrar arrependimento; no contexto dos factos a ausência do local da ocorrência, não assume relevo especial face ao estado da vítima que morreu no local e enquadra-se na personalidade do arguido e a ponderar nessa sede.
Acordam, em conferência, os juízes, na 3ª Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça.
No Proc. C. C. nº 1261/22.PBSTB do Tribunal Judicial da Comarca de Setúbal - Juízo Central Criminal de ... - Juiz 4 em que são arguidos AA também conhecido por “AA”, BB, com alcunha de “BB”, CC, com alcunha de “CC”, DD, com alcunha de DD”, EE, com alcunha de “EE”, e FF
E assistente GG
foi por acórdão de 23/2/2024 decidido quanto ao arguido AA/ recorrente:
“A) Absolver os arguidos AA (…) dos crimes de homicídio qualificado e ameaça agravada na pessoa de HH, previsto e punido, respectivamente, pelos art.º 131º e 132º, nº 1 e 2, al. e), última parte, e h), primeira parte, e 153.º e 155.º, n.º 1 a), todos do Código Penal. (…)
C) Condenar o arguido AA como autor material, na forma consumada de um crime de Homicídio simples, previsto e punido pelo art.º 131º do Código Penal na pena de 15 anos de prisão.
D) Atribuir, a título de reparação pelos prejuízos causados, a quantia de 100.000,00€ (cem mil euros), a GG, vítima especialmente vulnerável, representada pela sua mãe.
E) Condenar o arguido no pagamento das custas do processo cuja taxa de justiça se fixa em 2 UC’s (cfr. artºs 8.º n.º 9 do Regulamento das Custas Processuais, com referência à tabela III anexa e 513.º do Código de Processo Penal).”
Recorreu o arguido AA para o Tribunal da Relação de Évora, suscitando, pelo menos as seguintes questões:
“1.ª Determinar se o acórdão recorrido é nulo por falta de exame crítico dos meios de prova, e por omissão e excesso de pronúncia – art.ºs 374.º, n.º 2, e 379.º, n.º 1, alíneas a) e c), do Código do Processo Penal;
2.ª Determinar se o acórdão recorrido padece dos vícios previstos no art.º 410.º, n.º 2, alíneas a) e c), do Código do Processo Penal – insuficiência da matéria de facto para a decisão e erro notório na apreciação da prova;
3.ª Determinar se se verifica um erro de julgamento por parte do tribunal de primeira instância relativamente aos factos dados como provados sob os pontos 3, 4, 5, 8, 13, 14, 15, 16, 20, 22 e 23; o princípio da livre apreciação da prova; a violação do in dubio pro reo;
4.ª Determinar se deverá convolar-se o crime de homicídio pelo qual o recorrente foi condenado para o crime de participação em rixa, previsto no art.º 151.º, do Código Penal.
5.ª Caso assim não se entenda, determinar se deverá ser diminuída a pena aplicada devendo ser fixada próximo dos 10 anos de prisão.”
O Tribunal da Relação de Évora por acórdão de 11/7/2024 proferiu a seguinte decisão: “Nestes termos, acordam, em conferência, os Juízes que integram a secção criminal do Tribunal da Relação de Évora, em negar provimento ao recurso interposto pelo arguido AA e confirmar o acórdão recorrido.
Custas a cargo do recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 4 (quatro) UCs (art.ºs 513.º e 514.º, ambos do Código de Processo Penal, e art.º 8.º, n.º 9, e Tabela III do Regulamento das Custas Processuais).”
Desta condenação recorre o arguido, para o Supremo Tribunal de Justiça, o qual no final da sua motivação apresenta as seguintes conclusões:
“I - Por Douto Acórdão, ora recorrido, proferido a 23 de Fevereiro de 2024, foi o aqui recorrente condenado como autor material, na forma consumada de um crime de Homicídio simples, previsto e punido pelo art.º 131º do Código Penal na pena de 15 anos de prisão, o Recorrente interpôs recurso para Tribunal da Relação de Évora, que por Acórdão datado de 11 de Julho de 2024, julgou improcedente o recurso e manteve a pena de 15 anos de prisão.
II - O Recorrente impugnou os pontos 3, 4, 5, 8, 13, 14, 15, 16, 20, 22 e 23 da matéria de facto dada como provada, porquanto, não se produziu prova dos mesmos, e noutros produziu-se prova que levaria a absolvição do arguido vejamos: XVIII Os pontos 3, 4, 8, 10, 13, 14, 15, 16, 20, 22, 23 e 24 da matéria de facto dada como provada são conclusivos e não estão sustentados por quaisquer, meio de prova ou prova.
III - Ao contrário do que afirma o Douto Acórdão do Tribunal da Relação do Évora o Recorrente deu cumprimento ao disposto no art. 412º do CPP., para comprovar o que afirmou em sede de recurso, para fundamentar a renovação dos pontos concretos que impugnou e defende a sua renovação face ao por si alegado, indicou o nome das testemunhas, a data da acta em que foram ouvidas o registo da gravação do sistema áudio utilizado pelo tribunal, assim como os minutos e segundos concretos do depoimento relevante e ainda a transcrição do mesmo Vejase o que resulta das conclusões:
"Declarações da testemunha II, ouvida perante magistrada do ministério público, ouvida a ... de ... de 2023, registada .............. ....... .....35.wma empregada do ... que presenciou os factos esclarece que
10:24 Não me lembro de nada quando olho para cima o vejo o JJ em pé
10:45 Ministério Público: quem é que estava na cozinha, na porta da cozinha nessa altura?
II: eu não sei porque..., mas ... Eu o JJ, suponho que tenha sido o BB porque ele veio a correr, mas estava mais gente pelo menos 3 ou 4 pessoas dentro da cozinha.
MP: 3, 4 pessoas dentro da cozinha?
II: Eu, o JJ mais 2 ou 3 pessoas.
MP: Para além de vocês cabem mais 3 ou 4 pessoas na cozinha?
II: Não, connosco.
13:44 Nunca me apercebi o que lhe tinha acontecido, só me apercebi quando o INEM chegou!
Nunca se apercebeu em momento algum se apercebeu de faca Haviam várias facas, no chão, no lava loiça...
MP Nunca chegou a ver a cara dos arguidos que estavam na cozinha?
II: Não!
Declarações da testemunha KK, ouvida perante magistrada do ministério público, ouvida a ... de ... de 2023, registada
.............. .............35.wma
11:37 JJ está na cozinha e o BB e o AA foram para lá e foi tudo ao mesmo tempo
... no meio da confusão toda não sei explicar mais
18:36 MP: Onde o BB estava conseguia alcançar o JJ facilmente?
KK: Sim toda gente consegue alcançar toda gente.
MF A dada altura consegue aperceber de alguma faca, alguma garrafa partida algum objecto... ?
KK: Nada, nada!
19:10 KK: O JJ estava ao pé do BB
24:00 KK: Conhecia mais o Senhor BB por isso falou mais com BB. "
IV - E por fim a razão de ciência do Recorrente: "Como podemos constactar ninguém viu quem desferiu a facada, resulta da motivação da decisão da matéria de facto dada como provada, teve por base a análise concatenada e crítica da prova produzida em audiência de julgamento, ligando-se a mesma entre si, segundo as regras da experiência comum e a livre convicção e apreciação do Tribunal a que alude o art.º 127 do CPP, designadamente: Pericial - Relatório de autopsia médico-legal e exame toxicológico de fls. 874 a 881 onde consta, nomeadamente que (e que prova desde logo o ponto que não se obtiveram resultados, ou estes não foram concludentes quanto aos demais itens, neles se incluindo o item relativo à faca apreendida...." De todo o modo, tal falta de resultados não abalou a convicção do tribunal quanto ao autor dos factos, nem quanto à utilização da faca de cozinha (com cabo de plástico cinzento) apreendida, encontrada na sarjeta junto ao número 182 da Av. ª ... (cfr. recolha de vestígios fls. 155 e 156 - foto n.º 24 a 26 e inspecção judiciária de fls. 83)." Ou seja não há provas mas condena-se o arguido!
V - O douto Acórdão da Relação de Évora, mais uma vez, viola o artigo 32º, n.º 1 da Constituição da República Portuguesa violando direitos fundamentais de defesa uma vez que não permite o exercício pleno do contraditório que, por sua vez, consubstancia a "expressão, ao nível jurídico-processual, do princípio da igualdade" (cf. Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, pág. 202), bem como viola o princípio da imediação da prova em audiência, o princípio do Estado de Direito democrático, o princípio da segurança jurídica e da confiança dos cidadãos, o princípio da prevalência da lei e o princípio das garantias processuais e procedimentos ou do processo justo e equitativo, cf. artigo 2º, 13º 16º, 18º, 20º e 32º, n.º 5 da CRP.
VI Pretendeu-se, essencialmente, com o supra exposto evidenciar a inexistência de uma prova concreta que foi o Recorrente que desferiu a facada. Não havendo prova, subsiste a dúvida que o douto acórdão do Tribunal da Relação de Évora não conseguiu fundamentar socorrendo-se da livre interpretação da prova art. 127º, do CPP que só por si e por conclusões não basta para condenar o Recorrente e traduzindo-se numa omissão de pronúncia do acórdão recorrido sobre a invocada prova.
VII O Tribunal recorrido tinha que se ter pronunciado sobre os depoimentos das testemunhas dos factos, as declarações do recorrente, dos co-arguidos e dos peritos e o relatório pericial (a faca apreendida, não tinha vestígios do seu manuseamento pelo recorrente, como resulta do referido relatório) o que não o fez! O acórdão recorrido constituiu omissão de pronúncia e falta de fundamentação, representa, portanto, uma clara violação das regras sobre a prova, nomeadamente sobre a experiência comum que consabidamente atribui maior razão de ciência e, portanto, maior credibilidade, ao depoimento das testemunhas, testemunhas que estavam no local.
VIII Mantém o douto Acórdão que se recorre a Violação do disposto nos artigos 127º, do Cód. Proc. Penal e do princípio do "in dubio pro reo", artigo 32º da C.R.P. art. 6º da C.E.D.H. A valoração da prova produzida, ou no caso a falta dela, levou o Tribunal a quo a apreciar e a valorar e dar como provados factos dos quais não se produziram qualquer prova e sem qualquer fundamento legal, violando-se assim o princípio da legalidade.
Aliás, o espaço onde todos estavam era diminuto. Deverão estes factos vertidos no ponto 3, 4, 5 e 8 serem renovados como mais à frente se demonstra através da transcrição dos depoimentos das testemunhas.
IX - Não existe prova, e existem muitas dúvidas, assim resta apenas ser aplicado o princípio in dubio pro reo, por força do qual essa dúvida nunca poderá ser valorada em desfavor do arguido (art.32º da CRP). Com efeito, em processo penal não há presunções de culpa, sendo certo que uma condenação há-de basear-se sempre num juízo de certeza, assente necessariamente em dados objectivos não bastando, a este propósito, meros juízos de maior ou menor razoabilidade sobre determinada realidade, sem o suficiente suporte objectivo na prova produzida.
X Mesmo que assim não se entenda, poderá o crime ser convolado para o crime de participação em rixa, p. e p. no art 151º do C.P. pois apesar do tribunal da Relação de Évora afirmar que "Relembramos que a matéria de facto provada e não provada manteve-se incólume. Nessa medida, e resultando provado que foi o recorrente quem, munido de uma faca de cozinha, encontrando-se de frente para a vítima, JJ, lhe desferiu dois golpes, ... provocando-lhe a morte, não pode proceder a pretensão do recorrente.
Improcede, igualmente, este segmento recursório." A verdade é não respondeu às nulidades apontadas nulidades como omissão de pronúncia e cumprimento do art. 412º, do CPP que deixou de analisar sendo questões de direito V. Exas têm competência para o fazer e responder e caso seja esse o entendimento ser o Recorrente condenado pelo crime de participação em rixa.
XI Resultou provado sim que houve várias pessoas envolvidas e sabemos que os movimentos entre elas eram dinâmicos e rápidos, mesmo quem usou a faca poderia não ter tido a intenção de espetar na zona do peito e nem sabemos quais eramos movimentos das pessoas envolvidas pode ter sido até empurrada que ao actuar não sabia que atingia a vítima e muito menos as zonas do corpo da vítima, e muito menos que lhe provocaria a morte. Os bens jurídicos protegidos pelo art. 151º CP, são a vida (art. 131º CP) e a integridade física (art. 144º CP).. Ora no caso em apreço estamos perante todos estes elementos!
XII - Todavia, atentos à matéria provada nos autos e aqui descritas é verdade que o Recorrente AA esteve naquele local juntamente com os demais arguidos identificados nos autos e que todos eles se envolveram em confronto físico e parece-me que ficou explícito que ninguém quis tirar avida a ninguém e no meio da confusão alguém se usou uma faca que estava no local, e infelizmente, o resultado foi a morte de uma pessoa, Deverá então o Recorrente ser absolvido da prática do crime de homicídio p. e p. pelo art. 131º, do código Pena e condenado pelo art. 151º, do mesmo código, pela prática do crime de participação em rixa!
XIII Contudo, mesmo que V. Exas entendam pela condenação do arguido pelo crime de homicídio parece-nos, salvo outro e melhor entendimento, ser tal condenação manifestamente exagerada, atentos os factos apurados, a culpa do agente, à ilicitude, os seus antecedentes, as suas perspectivas de reinserção social, bem como o universo de condenações em Portugal, por estes e outros crimes, forçoso será de concluir pela inadequabilidade de tal condenação.
XIV - Afirma o Douto Acórdão que aqui se recorre na sua pág. 71 "Resulta, ainda, da matéria de facto que não só o recorrente revela uma personalidade com propensão para a prática de ilícitos, que atentam contra bens jurídicos eminentemente pessoais, tendo já sofrido uma condenação pela prática de crime de violência doméstica, no âmbito do processo comum singular n.º 54/14.2..., do juízo local criminal de ..., como ainda que cometeu os factos objecto destes autos cerca de um ano depois da pena ter sido extinta naquele processo." Ora, o crime pelo qual o arguido foi condenado é de natureza diversa a este crime, e os factos datam de 2014 já se passaram 10 anos, cumpriu a pena e nada deve à sociedade. Nem se quer justifica a pena a um ano da pena máxima aplicada ao arguido.
XV - Assim como, o Recorrente não tem culpa da morosidade da Justiça se os factos são de 2014 e se a pena se extinguiu um ano antes da prática dos factos em apreço só demonstra mais uma vez amorosidade da Justiça, e como percebemos é uma situação alheia ao arguido nem ele poderá ser penalizado por esse facto.
XVI - Acresce ainda que, por culpa da morosidade da Justiça este processo ainda está averbado ao seu registo criminal pois se fosse julgado de imediato à prática dos factos a pena já extinta há mais de sete anos e já não estava averbada no seu registo criminal. Com o devido respeito andou mal o douto Tribunal na falta de melhor fundamentação apenas argumentou a condenação por um crime de natureza divergente e não se pronunciou pelos factos relevantes e abonatórios apresentados pelo Recorrente em sede de recurso.
XVII Continua o Douto Acórdão "Por outro lado, o arguido não se coibiu de se ausentar do local, imediatamente após os factos, sem se ter certificado se a vítima estava ou não morta, e tentou esconder a arma do crime." Ora, nem ficou o arguido/Recorrente, nem ninguém ficou no local porque deveria o arguido ficar? Reitera-se o que já foi aqui argumentado, mais uma vez o douto Tribunal não respondeu à nulidade por omissão dos factos abonatórios arguidos em sede de recurso.
XVIII O crime de homicídio, é punido com pena de prisão de 8 a 16 anos (art.º 131.º, do Cód. Penal). A pena de 15 anos de prisão aplicada ao recorrente é praticamente a pena máxima!
Entende-se que deverá ser diminuída.
XV Tendo em consideração tudo o que já se expos neste recurso, e, ainda o que ficou provado nos pontos 29 a 43 da matéria de facto dada como provada:"29. Tem o 6º ano de escolaridade.
30. A partir dos 13 anos, deixou a escola, e passou a ajudar os pais nas vendas ..., em mercados 31. Aos 18 anos começou a trabalhar como ajudante de ... na P....... tendo, posteriormente, realizado formação nessa área.
32. Com 30 anos de idade realizou formação na L......, tendo ficado, na referida empresa, a trabalhar como ..., na manutenção de navios.
33. À data dos factos trabalhava na referida empresa, auferindo mensalmente a quantia de cerca de 997,00 €.
34. E, vivia com a companheira, companheira, LL, na casa que havia sido dos seus avós, sita na ..., e com o tio de 82 anos.
35. Tem duas filhas, atualmente, com 6 e 2 anos de idade.
36. A companheira não desempenhava atividade laboral remunerada, prestando cuidados às filhas menores e realizando as tarefas domésticas.
37. Em prisão preventiva desde ... de 2023, mantém conduta adequada às normas, tendo concluído o 3º ciclo, pretendendo prosseguir a escolaridade.
38. Tem uma relação cordial com a população reclusa e com os elementos dos Serviços de Educação e Vigilância. 39. Não tem registo de ocorrências disciplinares.
40. Recebe visitas regulares da família mais próxima, que o tem apoiado.
41. À data dos factos havia consumido em excesso álcool.
42. Só consome bebidas alcoólicas em excesso, pontualmente e em contexto social.
43. A companheira depende de apoios sociais para fazer face às necessidades da família."
XIX O Tribunal da Relação de Évora não se pronunciou sobre o que vem vertido no relatório social é exactamente o contrário ao decidido, com a referência ........10, de 30 de Outubro de 2023 afirma na pág 4 e 5:
Sob a epígrafe II- Impacto da situação jurídico-penal
"...O arguido tem consciência da gravidade e ilicitude dos alegados factos, tendo denotado, em entrevista, habilidade para avaliar a censurabilidade social dos mesmos ...
XX Como podemos observar o Tribunal decidiu contra a prova produzida nos autos e omitiu essa mesma prova e decidiu em desfavor do arguido existe nulidade do douto acórdão por omissão de pronúncia, nos termos e ara os efeitos do art. 37º, n.º1, al. c) do C.P.P "Quando o tribunal deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ..."
XXI Pois a omissão destes factos são bastantes abonatórios para o arguido na determinação da medida da pena factos que o Tribunal omitiu concluindo por desfavor do arguido e desacompanhados de prova. Também aqui deverão douto acórdão ser renovado e a final ser estes factos tidos em consideração na medida da pena a aplicar.
XXII Caso se entenda pela condenação do arguido, justifica-se uma diminuição da pena a que o arguido veio a ser condenado, uma vez que a pena de 15 anos pelo crime de homicídio, se mostra manifestamente exagerada, desproporcional e desadequada, atendendo ao preceituado legal quanto à função repressiva e preventiva das penas de privação de liberdade.
XXIII Houve uma notória violação da medida da pena aplicada ultrapassado em muito a medida da culpa concreta do arguido face aos factos dados como provados, tendo ainda, o acórdão em crise violado disposto nos artigos 40º, n.º 2 e 71, n.º 1 al. a), do Cód Penal;
XXIV Acresce o facto de, os fins de prevenção geral atendidos no douto acórdão ora em crise ultrapassam a medida da culpa do recorrente, a qual deve ser o primeiro e último limite na determinação da pena concreta a aplicar, bem como, descurou os fins de prevenção especial expressos na necessidade de reintegração do arguido encarado na vertente humana e social.
Violaram-se: os artigos 13º, 18º, 32º da CRP, 131º, 151º, 14º, 26º 40º, n.º 2, 70º, e 72º, do CP,, 127º, 374º, n.º 2, 379º n.1, al. c) e 412º, do CPP.
Termos em que, e pelo mais que V. Ex.as mui doutamente suprirão, deve ser concedido provimento ao presente recurso, e, em consequência, deverão ser sanadas as nulidades arguidas e o Recorrente absolvido do crime de que foi condenado, caso não seja esse o entendimento deverá a medida da pena ser diminuída e ficar perto da pena mínima,…”
A assistente respondeu ao recurso defendendo a improcedência do recurso.
Não houve outras respostas.
Neste Supremo Tribunal de Justiça o ilustre PGA emitiu parecer no sentido da rejeição parcial do recurso e por outro lado pela procedência com diminuição da pena;
Foi cumprido o disposto no artº 417º2 CPP, e não houve resposta
Cumpridas as formalidades legais, procedeu-se à conferência.
Cumpre apreciar.
Consta da fundamentação do acórdão da 1ª instância (parcialmente transcrito pela Relação) relativa ao recorrente:
II. Fundamentação
Matéria De Facto Provada:
1. No dia .../.../2022, JJ encontrava-se a trabalhar, como empregado de balcão, no estabelecimento comercial de diversão noturna “B...... ...”, sito em Avenida ....
2. Nesse mesmo dia, pela 01h.20m., os arguidos AA, CC, FF, EE, BB e DD, fazendo uso do veículo automóvel de marca Renault, modelo Clio, cinzento escuro, com a matrícula ..-..-NS, utilizado habitualmente por este último, e de outro veículo de marca Citroen, modelo Picasso, com a matrícula ..-ZV-.., propriedade do arguido BB, dirigiram-se ao supra referido bar noturno, local onde estiveram a conviver.
3. Aí chegados os arguidos AA e BB foram ao encontro de JJ, que se encontrava junto ao balcão a trabalhar, e por motivo não concretamente apurado, iniciou-se uma discussão com este.
4. No decurso da discussão verbal, o arguido AA desferiu uma bofetada na face de JJ.
5. Nesse momento, os arguidos AA e BB envolveram-se fisicamente com o mesmo, chegando a empurrarem, com as suas mãos, o corpo de JJ.
6. O arguido BB deslocou-se até junto da porta que dá acesso ao exterior, proferindo a expressão: “eu vou buscar uma pistola ao carro”.
7. E chamou os arguidos FF, EE, CC e DD, solicitando a sua presença no interior do bar.
8. De imediato, estes entraram no bar, espalhando-se pelo seu interior, enquanto AA se mantinha junto de JJ, no interior do bar, atrás do balcão, estando na altura o ambiente tenso, com arremesso de cadeiras, copos e garrafas por diversas pessoas, também, na direcção de JJ.
9. Na sequência do arremesso dos referidos objectos, II empurrou JJ para o interior da cozinha contígua, de dimensões exíguas, a fim de evitar que este continuasse a ser agredido, refugiando-se ambos no seu interior.
10. O arguido AA, primeiro e o BB, mais tarde, correram no encalço de JJ, para a cozinha, a fim de prosseguirem com as agressões, tendo KK agarrado com força os braços do BB, para o dissuadir de o fazer.
11. As agressões prosseguiram nessa dependência, onde se encontravam então, para além dos arguidos AA e BB, JJ, II e KK, tendo II sido também agredida com uma garrafa na cabeça.
12. Nessa sequência II ficou atordoada.
13. Já no interior da cozinha, o arguido AA muniu-se de uma faca de cozinha com o cabo em plástico cinzento, com o cumprimento total de 21,5cm, dos quais 11,5cm são lâmina serrilhada, que se encontrava em cima da bancada junto aos lava loiças.
14. O arguido AA, que se encontrava de frente para JJ, desferiu dois golpes com a faca referida em 13., concretamente, um no terço médio da região paraesternal à direita, prolongando-se em trajeto orientado da frente para trás, de baixo para cima e ligeiramente da esquerda para a direita, determinando perfuração do esterno, do pericárdio e do coração culminando no interior do ventrículo direito do mesmo e, outro no terço inferior da face anterior do tórax, a nível da linha hemiclavicular esquerda, prolongando-se por trajeto orientado da frente para trás, de baixo para cima e da esquerda para a direita, determinando perfuração do músculo reto abdominal.
15. Na sequência da expressão proferida por AA “ vamos embora que já fiz merda”, todos os arguidos abandonaram o local, à excepção daquele, que se ausentou para parte incerta, seguindo no veículo Renault Clio de matrícula ..-..-NS, tripulado pelo arguido DD, para a residência de BB, onde se juntaram.
16. O arguido AA, após sair do bar, colocou a faca descrita em 13. na sarjeta instalada no asfalto do lado direito da faixa de rodagem, frente ao n.º 182 da Av. ..., em ..., com o propósito de esconder a mesma e desta não ser apreendida.
17. MM, constatando que JJ se encontrava caído no chão envolto em sangue, efectuou manobras de reanimação.
18. Às 02h.53m., o arguido BB contactou telefonicamente KK e perguntou-lhe por JJ, tendo esta lhe respondido que tinha falecido.
19. O arguido BB durante o telefonema proferiu a expressão “ele não iria trabalhar mais no bar”.
20. Como consequência direta e necessária da conduta do arguido AA, JJ sofreu as seguintes lesões:
- no hábito externo:
a) feridas inciso-perfurantes no tórax;
b) feridas incisas na cabeça e no membro superior direito, a este último nível admissível enquanto lesões de defesa passiva;
c) escoriações na cabeça, tórax, abdómen e no membro superior esquerdo; e
d) equimoses na cabeça e nos membros superiores.
- no hábito interno:
a) lesões traumáticas na cabeça: infiltração sanguínea do tecido celular subcutâneo e do músculo temporal esquerdo;
b) lesões traumáticas torácicas: perfuração do músculo reto abdominal;
c) perfuração do corpo do esterno;
d) perfuração da porção cartilagínea da sétima costela;
e) perfuração do saco pericárdico;
f) perfuração do coração, hemopericárdio e hemotórax bilateral, as quais lhe determinaram morte, que foi declarada às 02h.15m., do dia .../.../2022.
21. Apesar de os clientes que se mantiveram no local e dos colegas de trabalho de JJ lhe terem prestado imediato auxílio, fazendo manobras de reanimação, e terem contactado simultaneamente o INEM, este acabou por falecer, no referido bar, devido à gravidade dos ferimentos.
22. Sabia o arguido AA que, desferindo os aludidos golpes em zonas do corpo de JJ onde se alojam órgãos vitais, como o tórax e o abdómen, com uma faca de serrilha e lâmina de 11,5 cm, provocaria a morte JJ, o que veio a acontecer.
23. O arguido AA agiu de forma deliberada, livre e consciente, com o propósito concretizado de matar JJ.
24. O arguido AA sabia que a sua conduta era proibida e punida por lei.
25. No dia .../.../2022, pelas 23h.30m., no estabelecimento comercial “Café S....”, sito em ..., se encontravam CC e um outro indivíduo cuja identidade não foi possível apurar.
26. O arguido CC se aproximou de NN, olhando-o e “fazendo-lhe peito”, enquanto pedia a quem o acompanhava que lhe tirasse uma foto, o que foi recusado.
27. O arguido CC e quem o acompanhava saíram do estabelecimento, dirigindo-se para um veículo que se encontrava estacionado nas proximidades e olharam para si.
Mais se provou que:
28. GG nasceu a ... de ... de 2021 e é filha do falecido JJ e de OO.
E, mais se provou que os arguidos:
AA
29. Tem o 6º ano de escolaridade. 30. A partir dos 13 anos, deixou a escola, e passou a ajudar os pais nas vendas de roupas e calçado, em mercados 31. Aos 18 anos começou a trabalhar como ajudante de ... na P....... tendo, posteriormente, realizado formação nessa área. 32. Com 30 anos de idade realizou formação na L......, tendo ficado, na referida empresa, a trabalhar como ..., na manutenção de navios. 33. À data dos factos trabalhava na referida empresa, auferindo mensalmente a quantia de cerca de 997,00 €. 34. E, vivia com a companheira, LL, na casa que havia sido dos seus avós, sita na ..., e com o tio de 82 anos. 35. Tem duas filhas, atualmente, com 6 e 2 anos de idade. 36. A companheira não desempenhava atividade laboral remunerada, prestando cuidados às filhas menores e realizando as tarefas domésticas. 37. Em prisão preventiva desde ... de 2023, mantém conduta adequada às normas, tendo concluído o 3º ciclo, pretendendo prosseguir a escolaridade. 38. Tem uma relação cordial com a população reclusa e com os elementos dos Serviços de Educação e Vigilância. 39. Não tem registo de ocorrências disciplinares. 40. Recebe visitas regulares da família mais próximos, que o tem apoiado. 41. À data dos factos havia consumido em excesso álcool. 42. Só consome bebidas alcoólicas em excesso, pontualmente e em contexto social. 43. A companheira depende de apoios sociais para fazer face às necessidades da família. 44. Por decisão de .../.../2018, proferida no proc. comum singular n.º 54/14.2..., do juízo local criminal de ...– juiz 5, por facto de ..., transitado em julgado em .../.../2018, o arguido foi condenado pela prática de 1 crime de violência doméstica, previsto e punido pelo art.º 152º n.º 1 a) e b) e n.º2 do Código Penal, na pena de 2 anos e 2 meses de prisão, suspensa na sua execução pelo mesmos período, condicionada ao regime de prova, extinta pelo cumprimento por decisão de .../.../2021. (…)
Nada mais se provou com relevo para autos, nomeadamente, das contestações dos arguidos uma vez que a matéria nelas inserta consta em suma da factualidade apurada.
B) Matéria De Facto Não Provada
a. Que os arguidos actuaram da forma descrita em 3, por cerca da 01h.30m., desagradados por ainda não terem sido atendidos. b. Os arguidos actuaram da forma descrita em 5, em comunhão de esforços e intentos. c. Ao ver as agressões físicas perpetradas pelos dois arguidos na pessoa de JJ, o cliente MM, que também se encontrava no estabelecimento comercial de diversão noturna, interveio em defesa daquele, conseguindo, por momentos, cessar a contenda física. d. Para além do referido em 6., que o arguido BB deslocou-se imediatamente ao exterior do bar, proferindo, simultaneamente e repetidas vezes, em tom de voz alto e sério, a expressão aí referida. e. E, para além do referido em 7., o arguido BB já no exterior, solicitou aos arguidos FF, EE, CC e DD ajuda para todos juntos e sem interferência dos outros clientes, matarem JJ, pedido ao qual todos anuíram prontamente. f. Para além do referido em 8. os arguidos FF, EE, CC, DD e BB juntaram-se ao arguido AA, e, em comunhão de esforços e intentos, aproximaram-se de JJ, arremessaram-lhe bancos, cadeiras, copos e garrafas de vidro, não só com o propósito de molestá-lo fisicamente, mas também de afastar todos os clientes e empregados do bar que decidissem intervir e os impedissem de concretizar os seus intentos. g. Com os referidos arremessos, os arguidos BB, FF, EE, CC, DD e AA para além de destruírem e danificarem objetos e mobiliário existentes no interior do estabelecimento, conseguiam atingir o corpo de várias pessoas ali presentes, particularmente e conforme previamente planeado, o de JJ conseguindo que este, juntamente com algumas pessoas se refugiassem, primeiro, atrás do balcão e, posteriormente, na zona da cozinha. h. No encalço de JJ, para além do referido em 10. os arguidos FF, CC, EE e DD ocorreram para esta divisão. i. Para além, do mencionado em 11. o arguido CC conseguiu entrar na cozinha. j. Que o arguido AA atuou da foram descrita em 13. juntamente com os arguidos BB e CC. l. Fazendo uso de sua força muscular e de forma concertada, os arguidos BB, AA e CC desferiram diversos pontapés, murros e golpes com garrafas e copos de vidro que se partiam no corpo de JJ. m. O arguido AA actuou da forma descrita em 14. com a anuência e ajuda dos arguidos BB e CC, pois estes continuaram a agredir a vítima não a deixando defender-se. n. Enquanto os arguidos BB, AA e CC permaneceram no interior da cozinha com JJ, os restantes arguidos mantiveram-se na sala de convívio do bar a arremessar objetos e a afastar as restantes pessoas que lá se encontravam daquela divisão (cozinha), com vista a não permitirem que estas defendessem o ofendido e, consequentemente, interferissem nos atos levados a cabo pelos os arguidos BB, AA e CC concretizando o propósito de todos os arguidos que era o de tirar a vida a JJ. o. Só depois de verem JJ a esvair-se em sangue devido aos ferimentos pelos próprios provocados, os arguidos BB, AA e CC saíram da cozinha e, acompanhados dos restantes arguidos, que se encontravam também no interior do bar a afastar e intimidar os restantes clientes e empregados, abandonaram o local, colocando-se todos em fuga. p. Por conhecer há vários anos o arguido BB, a gerente do bar, KK, sem se aperceber do estado grave de saúde de JJ, seguiu aquele até ao exterior, dizendo-lhe em tom de voz alto: “Aqui não”. q. Por sua vez, o arguido BB retorquiu-lhe dizendo: “KK, sabes que não faço as coisas só por acaso”. r. Também no encalço dos arguidos foi MM, sendo que, quando o viram no exterior, o arguido CC, em representação dos seis arguidos, em tom de voz alto e exaltado, proferiu na direção deste a seguinte expressão: “se tu e os teus amigos não se acalmam, voltamos ao bar com uma pistola”. s. MM não transmitiu aos seus amigos, familiares, restantes clientes e funcionários, que se encontravam no bar, que o arguido CC lhe disse a expressão referida em r.. t. Que o arguido BB proferiu a expressão referida em 19., em tom de voz ameaçador. u. Que as lesões referidas em 20. foram consequência directa e necessária, também, da conduta dos arguidos BB, FF, DD, CC e EE. v. Os arguidos referidos em u. sabiam que, agindo de forma concertada, devido à superioridade numérica e às condutas de agressividade, conseguiriam, matar JJ, como efetivamente ocorreu. x. Sabiam ainda os arguidos que o motivo que os levou a agir como agiram era completamente insignificante, não sendo minimamente atendível ou justificativo. z. Os arguidos sabiam perfeitamente que a expressão proferida na direção de MM era adequada a provocar-lhe medo e inquietação, o que efetivamente aconteceu. aa. Assim, os referidos arguidos agiram de forma deliberada, livre e consciente, em comunhão de esforços e intentos, em concretização de um plano ao qual momentaneamente todos aderiram, com o propósito concretizado de matar JJ, por motivo fútil, isto é, relacionado com o tempo de espera no serviço de bebidas. bb. Os arguidos agiram, ainda, de forma deliberada livre e consciente, em comunhão de esforços e intentos, com o propósito alcançado de ameaçar MM com a prática de crime contra a sua vida, concretamente o crime de homicídio cometido com arma de fogo, punido com pena de prisão muito superior a três anos. cc. Em data não concretamente apurada, mas seguramente entre os dias 11 e 27/09/2022, NN, elemento da banda da qual também fazia parte JJ, ouviu dizer a alguém que “os que mataram este, disseram que os elementos da banda seriam os próximos, pois teria de ser feita justiça”. dd. Nas circunstâncias de tempo e lugar descritas em 23. NN deslocou-se ao referido estabelecimento comercial “Café S....”, comprou uma cerveja e sentou-se na esplanada, local onde já se encontravam sentados, sem que tivesse dado por isso, os arguidos CC e BB ee. Volvidos poucos segundos, NN reparou nos dois arguidos por ambos estarem a olhar para si fixamente e a sussurrar, dizendo: “Olha a espiga, olha a espiga, estamos a ser perseguidos”. ff. Os arguidos BB e CC agiram de forma deliberada, livre e consciente, em comunhão de esforços e intentos, com o propósito concretizado de ameaçar NN com a prática de crime contra a vida, concretamente o crime de homicídio, punido com pena de prisão muito superior a três anos, bem sabendo que as suas condutas eram adequadas a provocar medo e inquietação neste, bem como prejudicar a sua liberdade de determinação, adensando-se o medo daquele por saber o que os arguidos tinham feito, dias antes, ao seu amigo JJ. gg. Os referidos arguidos, com excepção do referido em 24., sabiam que todas as suas condutas eram proibidas e puníveis por lei penal.
Motivação Da Decisão De Facto
A matéria de facto dada como provada, teve por base a análise concatenada e crítica da prova produzida em audiência de julgamento, ligando-se a mesma entre si, segundo as regras da experiência comum e a livre convicção e apreciação do Tribunal a que alude o art.º 127 do CPP, designadamente: Pericial - Relatório de autopsia médico-legal e exame toxicológico de fls. 874 a 881 onde consta, nomeadamente que (e que prova desde logo o ponto 20): “Exame do hábito interno” Tórax (…) Esterno:-Perfuração transfixiva linear e sensivelmente horizontal do corpo do esterno, pelo terceiro espaço intercostal, rodeada de infiltração sanguínea,(…)” esta em relação com a solução A descrita no hábito externo, ou seja, “com a ferida inciso-perfurante no terço da região paraesternal à direita, com extremidades angulosas, ligeiramente oblíqua, de baixo para, da esquerda para a direita, medindo vinte e quatro milímetros de comprimento por sete milímetros de máximo de afastamento dos bordos, cujo ponto médio distava oito centímetros do mamilo direito. (…) Clavícula, Cartilagens e Costelas esquerdas: Perfuração transfixiva linear da cartilagem da sétima costela, sensivelmente horizontal, rodeada de infiltração sanguínea, em relação sanguínea,” (…) esta em relação com a solução de continuidade B descrita no hábito externo, “ferida inciso-perfurante no terço inferior da face anterior e do Tórax, a nível da linha hemiclavicular esquerda, com extremidades angulosas, sensivelmente horizontal, medindo dezoito milímetros de comprimento por seis milímetros de máximo de afastamento dos bordos, cujo ponto médio distava quinze centímetros do mamilo, oito centímetros do mamilo esquerdo. Pericárdio e cavidade pericárdica: Perfuração do saco pericárdico na zona em correspondência com o terço superior da face anterior do ventrículo direito, rodeada de infiltração sanguínea em relação com a solução de continuidade A descrita no exame do hábito externo”, ou seja, com a ferida inciso-perfurante no terço da região paraesternal à direita, com extremidades angulosas, ligeiramente oblíqua; e perfuração do saco pericárdico na zona em correspondência com o ápice cardíaco, rodeada de infiltração sanguínea, em relação com a solução de continuidade B descrita no hábito externo”, supra descrita. E, a “cavidade pericárdica cotinha aproximadamente cinquenta centímetros cúbicos de sangue e duzentas gramas de coágulos sanguíneos.” Conclui o referido relatório, que a morte de JJ foi devida às lesões traumáticas torácicas descritas e que tais lesões constituem causa adequada de morte. E que, as “lesões traumáticas designadas no exame de hábito externo pelas letras A e B denotam haver sido produzidas por instrumento de natureza coto-perfurante ou actuando como tal, podendo do ponto de vista médico-legal, ter sido devidas a arma branca. As feridas incisivas descritas no exame do hábito externo denotam haver sido produzidas por instrumento de natureza cortante ou actuando como tal podendo, do ponto de vista médico-legal, ter sido devidas a arma branca. Uma nota relevante que consta do resumo é a referente à descrição dos trajectos das feridas, que abaixo se descreverão, e que foi efectuada por referência ao corpo da vítima em posição anatómica – “indivíduo de pé, olhando em frente e com as palmas das mãos orientadas para a frente” - posição que o falecido teria no momento em que lhe forma desferidos os golpes com a faca, de acordo com a demais prova e tal como resultou da prova testemunhal produzida e pelas declarações dos próprios arguidos, BB e AA que Processo: 1261/22.0... afirmaram quando abandonaram o bar a vítima permanecia de pé (cfr. fls. 881 do supra mencionado relatório). Aliás, da posição da vítima após a queda se depreende a posição da mesma de pé virado de frente para o interior da cozinha. - Relatório de exame pericial dos vestígios biológicos e análise de ADN, de ... de ... de 2023 (cfr. de fls. 1069, 1070 e respetivos versos), cuja análise também relevou, em conjugação com a demais prova, relativamente à convicção do tribunal quanto ao envolvimento físico, nomeadamente, entre o arguido BB e JJ. Salienta-se que, como consta do mesmo relatório, aquando da sua elaboração estavam recolhidas amostras da vítima JJ e de todos os arguidos, com excepção do arguido AA. A análise de tal relatório tem de ser realizada, naturalmente, em conjunto com o relatório do exame pericial da Polícia Judiciária de fls. 142 a 158 onde foram recolhidos os vestígios. Nesse relatório temos os itens recolhidos com as seguintes descrições (cfr. fls. 151): -Vestígio n.º 1-V......72 (caneca em vidro transparente partida/ em cima de uma mesa na sala bar) –correspondendo a fotos de 17 e 18 de fls. 152 localizada na mesa frente ao balcão; -Vestígio n.º 2 – V......75 (copo pequeno em vidro, em cima do balcão de atendimento do bar – correspondente à foto n.º 19 de fls. 153; -Vestígio n.º 3 - V......80 – copo em vidro partido no chão da cozinha junto ao cadáver (esfregaço de zaragatoa de algodão) – correspondendo à foto n.º 20 de fls. 153; -Vestígio n.º 3 A -C......40 – zaragatoa em algodão com vestígios hemáticos do copo de vidro vestígio n.º 3; -Vestígio n. º 4 – V......85- zaragatoa col algodão com vestígios hemáticos no chão da esplanada que corresponde à foto n.º 22 de fls. 154; -Vestígio n.º 5 -V......89- zaragatoa com vestígio hemáticos no chão da esplanada corresponde à foto n.º 23 de fls. 155; -Vestígio n.º 6 – V......91- faca de cozinha com cabo de plástico encontrada no exterior frente ao bar, numa sarjeta na Av. ..., correspondendo às fotografias n.ºs 24, 25 e 26 de fls. 155 e 156 e n.ºs 27 e 28 de fls. 157; Do material para exame, de fls. 1069 e 1070 com relevo para os autos por ter sido apurado perfil, resulta: 1. Uma zaragatoa. referenciada como “3 A”. 2.Uma zaragatoa, referenciada como “4”. 3. Uma zaragatoa, referenciada como “5”. 4. Uma faca, referenciada como “6” (foto pág. 4) – fls. 1070 v. 5. Uma zaragatoa referenciada como “1 Mão Direita” recolhido a fls. 623 (zaragatoa de algodão humedecido em água destilada contendo eventuais vestígios biológicos da mão direita do arguido BB). 6. Uma zaragatoa referenciada como “Mão esquerda” recolhido no relatório de fls. 620 a 623 e concretamente a fls. 623 (zaragatoa de algodão humedecido em água destilada contendo eventuais vestígios biológicos da mão direita do arguido BB). 12. Uma amostra referência de JJ. 13. Uma amostra referência de BB recolhida como consta de fls. 572/573. 14. Uma amostra referência de DD, recolhida (cfr. fls. 578/579). 15. Uma amostra referência de CC, recolhida em conformidade como consta de fls. 570/571. 16. Uma amostra referência de EE recolhida (cfr. fls. 574/575). 17. Uma amostra referência de FF recolhida, conforme fls. 576/577 E, da conclusão do relatório de fls. 1069 v. e 1070, com especial relevância, consta que: -Item 1 a 3 detetaram-se vestígios de sangue. De acordo com a análise de ADN, para o conjunto de loci de STRs atutossómicos estudados: - Nos itens 1 e 6, obteve-se um perfil único ou de maior contribuidor como sendo idêntico ao perfil da vítima JJ. -Nos itens 2 e 3 um perfil masculino que não tem identidade com nenhuma das amostras, ou seja, da vítima e dos arguidos BB, CC, EE, FF e DD. - No item 5 (mão direita), obteve-se um perfil de mistura de mais um indivíduo, da qual não podem ser excluídos a vítima JJ e o arguido BB. -No item 10 obteve-se um perfil de mistura de mais de um indivíduo do qual devem ser excluídos todas as amostras referência, ou seja, as da vítima e dos supra referidos arguidos. -Nos restantes itens não se obtiveram resultados ou estes não foram concludentes, pelo que não é possível proceder a qualquer tipo de estudo comparativo. Ora, item 1 refere-se ao vestígio hemático recolhido no copo de vidro partido encontrado ao lado do cadáver. E, o item 5 refere-se à mão esquerda o que reforça a versão apresentada pelo arguido BB, como se verá, de que se envolveu fisicamente com JJ chegando a ter as mãos entrelaçadas. De tal relatório resulta que não se obtiveram resultados, ou estes não foram concludentes quanto aos demais itens, neles se incluindo o item relativo à faca apreendida. De todo o modo, tal falta de resultados não abalou a convicção do tribunal quanto ao autor dos factos, nem quanto à utilização da faca de cozinha (com cabo de plástico cinzento) apreendida, encontrada na sarjeta junto ao número 182 da Av. ª ... (cfr. recolha de vestígios fls. 155 e 156 - foto n.º 24 a 26 e inspecção judiciária de fls. 83). Na verdade, desse relatório verifica-se que apenas foram recolhidas as amostras da vítima JJ, e dos arguidos BB, DD, CC, EE e FF, sendo que daqui resulta com clareza que não foi identificado o perfil de cada um desses arguidos na faca, o que credibiliza a versão apresentada por estes de que tinham visto a referida faca na mão do arguido e descredibiliza a do arguido AA, de que o arguido BB tivesse, em algum momento, estado com a faca. Ademais, quanto à inexistência do perfil, nomeadamente, na lâmina da faca da vítima, não se estranha a mesma, já que a faca foi colocada na sarjeta, tendo entrado, com grande probabilidade, em contacto com a água e/ou com outros elementos e resíduos que poderão justificar essa falta. E, naturalmente, a possibilidade de esta ter sido limpa pelo arguido AA que a utilizou, o que não se apurou. - Relatório pericial aos telemóveis, onde se extraíram as fotografias dos arguidos na noite de .../.../2022, momentos antes da chegada ao bar B......, de fls. 1100 e que correspondem às de fls. 97 a 99; fotografias cujo confronto foi efectuado aos arguidos em audiência (fls. 1072 a 1080 e 1082 a 1106). Também pela referida análise é possível verificar que nessa madrugada foi efectuada uma chamada para o Bar B...... através do telemóvel do arguido BB, que corresponderá à chamada que o mesmo confirma ter realizado, e em que todos os arguidos que estavam na sua companhia, com excepção do arguido AA, tiveram conhecimento da morte da vítima JJ (foto n.º 9 – fls. 99). - Relatório de exame pericial, recolha de vestígios no veículo Renault Clio de matrícula ..-..-NS e das palmas das mãos do arguido BB (fls. 611 a 623). Documental -Auto de notícia do dia .../.../2022, onde consta como data da ocorrência 01/45m e a comunicação via rádio pelas 01/50m, sendo daí possível extrair a baliza temporal dos factos (fls. 2 e 3 e respetivos versos). No referido auto está descrito que quando chegaram ao local estavam ainda a ser realizadas manobra de reanimação à vítima por parte de MM, II e PP, bem como a identificação das pessoas que aí se encontravam, da vítima e descrevendo o que havia sucedido, o que comprova a factualidade dos pontos 17 e 21. -Verificação do óbito pelo médico de serviço do Instituto Nacional de emergência Médica, no local (fls. 4); -Aditamentos n.ºs 2 onde é identificada a viatura com a matrícula ..-..-NS que se terá posto em fuga, recolhida a informação das testemunhas que se encontravam junto à vítima e de que os suspeitos residiriam no “bairro dos .... A viatura foi, nessa mesma madrugada, cerca daas 4.00h, localizada estacionada na rua dos ..., correspondendo ao Renault Clio cujo exame pericial foi realizado e que acima se alude (fls. 6). A utilização do veículo, referida na factualidade, propriedade de QQ e cujo tomador do seguro é o arguido DD, em conformidade com a ficha de registo automóvel e de tomador de seguro de fls. 17 e 18, foi confirmada pelos próprios arguidos. -Comunicação de notícia de crime, onde consta a informação que entre a 01h30 e a 01h e 50 m o barman do bar bigodes, JJ terá sido esfaqueado, por um indivíduo, tendo acabado por morrer no local e que segundo informação o eventual suspeito terá fugido no Renault supra identificado (fls. 15 e 16); e - Autos de diligência fls. 22, relativa à localização e intercepção dos ora arguidos, com excepção do arguido AA que, nesse momento, não foi localizado; -Auto de diligência da Polícia Judiciária, de fls. 52 localização de uma faca de cozinha, encontrada suspensa na sarjeta instalada na Avenida ..., do lado direito da mesma, em frente ao n.º 182. -Autos de diligência de fls. 122 e 588 relativos às tentativas de localização do arguido AA, que resultaram infrutíferas, realizadas, respectivamente, nos dias .../.../2022 e .../.../2022. - Auto de diligência da Polícia Judiciária realizado a .../.../2023, dia em que foi localizado o arguido AA, o qual foi encontrado em casa, no quarto, escondido debaixo da cama (cfr. fls. 1183 e 1184); -Autos de apreensão: da viatura Renault, fls. 36, da faca (fls. 37) aí estando descritas as caraterísticas da faca como sendo uma faca de cozinha com cabo de plástico de cor cinzenta, com o cumprimento total de 21,5 cm, sendo 11,5cm de lâmina cerrada, com cerrilha, e da caneca, em vidro transparente, copo pequeno em vidro e um copo em vidro partido; - Auto de inspeção judiciária, onde é possível verificar a localização do Bar, as características do seu interior com os diversos espaços, nomeadamente, quanto à configuração do balcão e do espaço da cozinha, de frente para o interior do balcão (fls. 67 a 83). Muito relevante para a formação da convicção quanto ao local onde ocorreram os factos, que vieram a causar a morte da vítima JJ, em conjugação com o depoimento das testemunhas e dos próprios arguidos e com o relatório de autópsia e os demais exames periciais foram as fotografias do cadáver e da posição em que o mesmo se encontrava. Da descrição se extrai que o corpo estava na posição de “decúbito dorsal, estando o membro esquerdo fletido na região do cotovelo sobre o abdómen e o direito concordante com a posição do cadáver. Quanto aos membros inferiores, ambas as pernas se encontravam distendidas no solo, ligeiramente afastadas entre si e ambos os pés se encontravam em posição concordante, com as penas (cfr. fls. 76). Com efeito, a posição do corpo da vítima localiza-se entre a cozinha e a zona que medeia entre o balção do bar e a cozinha só ficando de fora da cozinha a cabeça. E que estava deitado de barriga para cima, no chão estando a partir dos ombros no interior do espaço da cozinha, tendo a parte lateral esquerda do tronco e abdómem junto ao frigorífico, as pernas na direcção do fogão e bancada e a cabeça no já no exterior desse espaço. Ora, de tal posição só se pode concluir que os golpes foram desferido no interior da cozinha, estando o arguido de pé virado em direcção da bancada, pela trajectória das feridas, e da frente para trás, acabando por cair de costas por ainda ter sido amparado de frente pela testemunha II que estava no interior da cozinha ainda dizendo a expressão que a mesma referiu. A vítima tinha uma t-shirt preta, com letras avermelhadas e desenhos estampados com cor na parte frontal, o que justifica a versão dos arguidos BB, AA e da testemunha KK, de que não era visível sangue (fls. 77). Mais são visíveis as duas feridas corto perfurantes na região peitoral à direita e na região do hipocôndrio (fls. 79), e no antebraço uma outra ferida com características também corto perfurantes, compatíveis com gestos de defesa da vítima (fls. 80). Salienta-se também que as medidas das feridas são compatíveis com as dimensões da faca cuja lâmina era estreita. Nas costas da vítima, e como se veio a confirmar da autópsia, não há quaisquer lesões, assim como não há nas penas, pés ou nas palmas da mão. Ora, toda a posição e sinais de lesões traumáticas do exame do hábito externo, são compatíveis com as agressões por parte de quem estava de frente para o mesmo como se concluirá, o que convenceu o tribunal da factualidade descrita nos pontos 14. - Autos de revista e apreensão e respetivos consentimentos dos arguidos relativamente aos equipamentos telefónicos, tendo facultado os códigos de segurança (fls. 88 a 96 e respetivos versos); -Auto de leitura da memória de telemóvel pertença do arguido BB, onde constam as fotografias, datadas de .../.../2022 pelas 00.40m tiradas no S..... ...”, e o registo de chamada a que acima já se fez referência (fls. 97 a 100) e a cota de fls. 101. Na mesma cota constam as pesquisas efectuadas relativamente ao único arguido não localizado como sendo o arguido AA. - Relatórios de exame pericial da Polícia Judiciária (de fls. 142 e seg.), cuja análise das fotografias foi muito relevante, por mais próximas, permitindo-se uma melhor visualização da configuração exacta da cozinha e mais uma vez, a posição do falecido e da sarjeta onde foi colocada e encontrada a faca com a lâmina no interior daquele e parte do cabo de fora – fls. 156 (fls. 142 a 158 e 788 a 790); - Auto de visionamento de registo de imagens de videovigilância do Novo Banco, da madrugada referida na factualidade entre a 01h e 30 m e as 02h e 15m, sito na Rua ..., fls. 631, 632 (fls. 448 cópia de fls. 632), de nada adiantou à formação da convicção do tribunal porquanto nas mesmas não são vistos os arguidos; - Auto de denúncia de fls. 4 a 7 processo n.º 3519/22.9... apensado aos presentes autos, em que é denunciante NN, que referiu ser amigo do falecido JJ e padrinho da filha, referente à descrição da factualidade ocorrida no dia .../.../2022. Contudo, tal descrição não foi corroborada em sede de audiência, nomeadamente, pelo ali denunciante, quando inquirido, como se verá. - Certidão do assento de nascimento de GG de fls. 1725, documento autêntico que faz prova plena do ponto 28. da matéria apurada. Declarações dos arguidos Os arguidos foram ouvidos em separado, tendo os mesmos apresentados em suma as seguintes versões: AA, também conhecido por “fanita” O arguido descreveu os acontecimentos daquela noite, relatando a sequência dos acontecimentos e o modo como ocorreram os factos, da forma infra referida. Assim, explicou que nessa noite, tinham estado todos os arguidos a beber um café no “...” e que aí estiveram, também, a beber álcool (cervejas). Após, foram ao “Sport café” jogar setas. Só no final da noite foram ao bar “...”, tendo ido no carro do arguido BB, marca Citroen que ficou estacionado mesmo em frente ao Bar. Mais esclareceu que o Clio estava estacionado mais à frente a uma distância de cerca de 60 m. Esclareceu que estavam todos alcoolizados, os amigos que os acompanharam, que confirmou serem os demais arguidos. Que quando entrou no bar, com o arguido BB, estavam no balcão duas raparigas e a vítima JJ. O arguido afirmou que deu um murro na mesa e exigiu umas imperiais tendo a vítima JJ dito o “agente resolve lá fora” ao que o arguido BB respondeu “resolvia já aqui”, tendo dado uma chapada ao JJ. Foi o arguido que veio chamar os outros arguidos ao exterior do bar, para acalmar a situação. Que viu que a pessoa mais pequena estava a empurrar o BB para fora do balcão e que o mesmo na mão tinha a faca empunhada para frente. Iam todos embora. E quando deu conta o BB entrou no balcão e na cozinha e viu-o com uma faca. Mais adiantou que tirou a faca da mão do BB e arremessou-a na direcção da sargeta, referindo que “Jogou a faca fora e entrou pelo esgoto”. Mais afirmou que ouviu o arguido BB a dizer “sabes que não faço as coisas por acaso”. Quando saíram do bar viu que o JJ estava em pé. Após saíram do bar, foram a casa do BB. Foram todos embora no Renault Clio, com excepção do FF que foi no seu carro um Audi A6 que ficou estacionada junto ao banco. Esclarece que na casa do arguido BB foi para a casa de banho porque estava maldisposto. A justificação apresentada pelo arguido para ter tido a faca na mão não colhe sendo, completamente, avessa às regras da experiência comum e à normalidade da vida neste tipo de situações, como se explicitará. Acresce, que tal versão está desacompanhada de qualquer outro meio de prova que o confirma existindo, ao invés, provas e factos circunstanciais que abalam essa versão e convenceram o tribunal que a faca esteve na sua mão porque a usou para agredir a vítima da prova descrita, causando a sua morte. Igualmente não colhe a versão apresentada pelo mesmo de que o arguido esteva na noite dos factos na casa do arguido, pois que com excepção do arguido FF, ninguém mais a confirmou. E, tanto assim é que o arguido só foi localizado em ... de 2023. Mais afirmou que o arguido BB tinha a camisola rasgada. Que não viu o FF fazer nada. Que disse ao arguido não te metas nas coisas que não são tuas. Foi confrontado com as fotografias de fls. 97 a 100, 69 70 157e com o auto de inspecção judiciária. Mais afirmou que os demais arguidos foram todos detidos na rua e que depois fugiu para a casa do pai. O arguido negou que tivesse desferido os golpes que determinaram a morte da vítima. No entanto da análise de toda a prova resultou o inverso. O arguido prestou declarações denotando distanciamento relativamente às consequências da vítima e demonstrando preocupação com a versão que apresentou, não denotando espontaneidade. BB, também conhecido por “Zé marinheiro”. À semelhança do arguido AA o arguido contextualizou os factos no tempo e no espaço, relatando a sequência e dinâmica dos acontecimentos da noite a que se refere a factualidade descrita na matéria provada. No entanto, fê-lo de modo espontâneo, denotando constrangimento sentido pelas consequências daquela noite. Assim, o arguido começou por lamentar o falecimento da vítima JJ. Confirmou que na noite de quinta feira, ... de ... de 2022, estava a trabalhar na U.... Quando viu os arguidos EE, AA, FF, CC e o DD no café “o....” parou e começaram a “beber copos”. Depois foram todos para o “Sp...” jogar setas e só posteriormente foram para o Bar b...... porque conhecia a dona do Bar, à data, a KK e o JJ, sendo já cliente do bar, realçando que sempre foi bem tratado. Concretizou que foi para o bar no seu carro, a Citroen Picasso, e que com ele foi o arguido AA. Esclareceu que, quando entrou no bar foi à casa de banho e ficou no sítio do acesso aos empregados, foi então que o JJ disse num tom mais alto que não podia estar naquela zona e começam os dois a falar alto. No, entretanto, vem o AA e dá uma chapada ao JJ. Os clientes separam os dois, admitindo que tentou agredir o JJ e o JJ a ele e que sentiu um objecto na sua direcção. Mais adiantou que viu copos em cima das mesas e que começou a atirar copos e garrafas, ficando sozinho no bar (sem nenhum dos amigos que o acompanharam). No entretanto, chegaram os amigos e lembra-se do arguido EE lhe tirar um banco de madeira da mão, não tendo tido percepção do que os amigos estavam a fazer no momento. Mais referiu que sentiu um copo a bater no corpo recordando que estava encostado a uma parede e que a certa altura fica de costas para o bar e que vai na direcção do JJ quando uma rapariga fica entre ele e a cozinha. Frisou ter sido tudo muito rápido, esclareceu que ficou “entre portas” na cozinha e é aí que tem a percepção do AA no seu lado direito a tentar chegar ao JJ, quando sente que o AA o puxa e a KK começa a chamá-lo. Confirmou que teve um momento com as mãos entrelaçadas com o JJ e que o JJ estava no interior da cozinha e que esteve sempre entre portas. Afirmou que tem 1.80 m de altura. Clarificou que a cozinha não deve ter mais do que 5 metros 2. Mais concretizou que depois da “confusão” primeiro saiu do bar o arguido AA e só depois saiu, recordando que o AA disse: “Já fiz merda piquei”. Mais adiantou que soube, posteriormente, da existência de uma faca, mas que nada sabe quanto à mesma, nada tendo visto. Que após o sucedido abandonaram o local, tendo o mesmo ido na companhia dos arguidos DD, CC, EE, FF no carro do arguido DD, o Renault, para a sua casa. Foi depois que lhe contaram que tinha havido uma faca e que o AA tinha saído como uma faca do Bar e que a tinha posto na sarjeta. Já em casa fizeram o telefonema para o bar sendo que primeiro foi a sua esposa a falar e que acabou por falar com a KK, que lhe disse que tinha falecido o JJ. Esclareceu que só depois de ter visto a polícia de intervenção à porta é que pensou que tivesse acontecido alguma coisa grave no bar. Que durante o telefonema começou a dizer que “quando vir o JJ vou-lhe bater” e que ficou em choque assim que se apercebeu da carrinha de intervenção e que ficou surpreendido com a notícia da morte do JJ. Pensou que o JJ estivesse ferido. Não o tendo visto caído. Tal surpresa, traduziu-se nas declarações que o arguido prestou em audiência pela expressão que utilizou a esse propósito “Só caiu na real às 6 da manhã quando viu a notícia na televisão”. Questionado a tal, esclareceu que já tinha bebido muito, assim como os demais arguidos que desde as 22h que estavam a beber, referindo-se a bebidas alcoólicas. Negou que tivesse desferidos as facadas no JJ, Negou, igualmente, que tivesse proferido a expressão “Rafa sabes que não faço as coisas por acaso”, descrita na matéria não provada. Tal versão negatória não foi afastada por qualquer meio de prova. Negou também os factos ocorridos a .../.../2022 pois que nessa data já estava preso. CC, O arguido confirmou que estiveram todos juntos na noite em que ocorreram os factos tendo esclarecido que foi para o bar o ... no carro com o arguido DD, o Renault Clio, a que já acima nos referimos. Explicitou que quando estacionaram ficaram no exterior a fumar e que foram ao bar com o intuito de se divertirem. Que, entretanto, o arguido BB veio cá fora dizer “entrem”. Que quando entrou viu o arguido AA a dar socos à vítima que se tentou defender e viu uma rapariga que conseguiu puxar o JJ para trás do balcão (só o viu nesse momento, tendo sido a última vez que o viu). Esclareceu a sua posição, referindo que estava à distância do balcão, que seria uma distância semelhante à que existe entre o local onde prestou declarações e a bancada do colectivo, por tanto a mais de 6 metros. Recordou que viu o arguido AA e o BB a mandar cadeiras, garrafas, copos e tudo o que havia, em direcção ao JJ à parede do bar. Esclareceu, ainda, que viu o arguido BB e o AA irem para a cozinha e o AA foi atrás dele. À semelhança do arguido BB afirmou que foi o arguido AA que saiu primeiro do bar e que disse “Vamos embora eu já fiz merda”. Mais presenciou o AA a colocar a faca na sarjeta. Mais adiantou que, logo a seguir foram os cinco, todos os arguidos, com excepção do arguido AA, para casa do BB. Esclareceram que foram no Renault Clio que era do arguido DD. AA foi sozinho e não foi a casa do BB. Mais recordou e relatou que foi feito o telefonema para o bar. Quando chegou a polícia saíram porque já sabiam que tinha falecido o JJ e que foram detidos nessa noite no exterior junto à casa do arguido BB. Foi confrontado com as fls. 97/98, 69 e 70 e 156 e 157 tendo identificado todos os arguidos (polo castanho creme e azul castanho – AA, o de polo verde o CC, o que tinha o braço no ar o arguido FF, EE o que estava ao lado do FF o arguido DD e tinha uma camisa às riscas a e o arguido BB um polo preto foto n.º 3). Mais esclareceu que estavam mais clientes no bar, para além dos seis arguidos referindo que julga que seriam cerca de 15. Quanto à factualidade ocorrida no dia .../.../22 negou a mesma mencionando que o arguido BB já estava preso. DD, também conhecido por DD” (cunhado do augusto e amigo próximo do CC) Tal como os demais arguidos contextualizou a factualidade referindo que saíram todos juntos e que foram primeiro ao café oásis e decidiram ir até ao Sport, tendo sempre continuado a beber (cervejas/minis). Posteriormente, foram para o bar ..., tendo ido a conduzir o carro tendo-o acompanhado o arguido CC. Esclareceu que o carro ficou estacionado junto ao Novo Banco (a que acima se referiu a propósito do auto de visionamento). Corroborando as declarações prestadas pelo arguido CC, referiu que estava a fumar um cigarro com este a cerca de 30 m do Br. Adiantou que, quando ouviu os gritos e viu o CC a correr, correu também em direcção ao bar, clarificando que foi o último a entrar no mesmo. Mais adiantou que, já no interior, viu atiraram cadeiradas, copos e garrafas, uns aos outros, concretamente, que viu o arguido BB a atirar garrafadas e cadeiras. Mais esclareceu que viu um senhor ficar zonzo, que descreveu como sendo um homem com cabelo cumprido, características em tudo semelhantes ao identificado na foto de fls. 42 a testemunha PP (o qual foi em momento prévio objeto de despacho de arquivamento por falta de legitimidade). Do que recordou esclareceu que terá entrado primeiro o AA e logo a seguir o arguido BB, na cozinha. Depois de saírem confirmou que o arguido AA vinha com algo junto à perna e que depois de sair apercebeu-se que o mesmo atirou algo para a sarjeta e disse “já fiz merda ou “já houve merda”. Mais confirmou que foram todos no Clio para a casa do BB. E que foi feita a ligação telefónica para uma pessoa do bar. Foram reproduzidas as declarações prestadas pelo mesmo do interrogatório do dia .../.../22 (entre o minuto 00:02:47 e o minuto 00:03:52), recordando então que viu o AA sair como a faca e que a atirou para o esgoto. EE, conhecido por “EE” O arguido prestou apenas declarações quanto às condições socio económicas. Não obstante foram dadas como reproduzidas as declarações prestadas em primeiro interrogatório. Nas declarações reproduzidas o arguido confirma que é o arguido AA que volta atrás e chama os outros arguidos para o interior do bar e que “houve confusão” e de ter visto aquele com a faca na mão a siar do bar, colocou-a no esgoto e disse “eh pá, fiz merda”. FF, irmão do arguido AA e primo dos demais arguidos (EE). O arguido, tal como os demais arguidos, que prestaram declarações, confirmou que na noite dos factos (dia .../.../2022) começaram a beber umas minis no café “O....”, depois combinaram ir ao “Sp...” para irem jogar às setas e que tiveram lá cerca da 1 da manhã. Depois foram para o Bar b....... Concretizou que o arguido BB foi numa carrinha Picasso. Esclareceu que foi para o bar no carro com o arguido EE. Quando chegaram ao bar o BB e o AA já tinham entrado. Entretanto estavam cá fora e veio o AA dizer para entrarem. Quando entrou viu o arguido BB a dar socos ao JJ e o JJ também estava a dar socos àquele, agarrados um ao outro. Entrou com o EE e o CC. Agarraram o AA e o BB. Quase à saída o BB sai e volta a entrar no bar e o AA entra a seguir. Passado pouco tempo saem os dois do bar e não viu nenhum deles com nada na mão. Depois decidiu passar um pouco à casa do BB e teve 5 minutos a falar com eles junto à casa daquele e foi para casa. Afirmou que o AA e o BB foram juntos no carro do DD. Após o BB ligou-lhe e disse “venha cá”. E ligou ao CC que disse para perguntar o que se passava e acabou por voltar à casa do BB e foi quando lhe disseram que o JJ tinha morrido, nem acreditou. Viu BB a atirar a cadeira para o interior do Bar. O EE agarrou a cadeira e colocou-a no chão. Também viu uma rapariga a atirar o copo ou uma garrafa a alguém (tinha tranças uma rapariga de cor). Esclareceu que o seu carro era e é um Audi A6. Vinham todos dentro do mesmo carro quando saíram do bar em direcção à casa do BB, num Renault Clio. Eram mais clientes do que do grupo dos (AA/EE/FF) e dele. O CC e o DD foram os últimos a entrar no bar. Do que se recorda o arguido foi para o lado esquerdo do bar. O arguido prestou declarações de forma muito confusa e demonstrando-se muito cauteloso quanto à versão dos factos que apresentou, tal como o arguido AA, o que de alguma forma se percecionou, associando-se tal cautela à relação de parentesco que tem com o arguido AA. Testemunhal Depoimentos das testemunhas de acusação inquiririas PP; KK; II; MM; TT; UU; NN e VV. Depoimento das testemunhas de defesa inquiridas em audiência, WW, XX, YY (arguido BB); ZZ, AAA e BBB (arguido CC); CCC, DDD (arguido DD); EEE, FFF, GGG (arguido EE); HHH (arguido DD); III e JJJ (o arguido FF). Concretizando PP, empregado de bar de profissão e que justificou a sua razão de ciência por à data dos factos trabalhar no Bar “O .......”, estando de serviço nessa noite. A testemunha referiu que conhecia os arguidos de vista, mas afirmou não se lembrar de quem lá esteva. Contudo, confrontado com a fotografia de fls. 98 só identificou o arguido que vestia o polo escuro, ou seja, o BB. Esclareceu que, para além dele próprio, só estava a KK e o JJ a servir bebidas. Recordou, relatando, que seria por volta da 1h da manhã do dia .../.../2022. Lembra-se de chegar um senhor de camisa branca. Que estava a atender um cliente, quando se apercebeu do início de uma “confusão”, uns “burburinhos” e que começaram a levantar a voz. A testemunha afirmou que chegou perto deles e disse “já chega” e abre os braços, logo de seguida, quando se vira acerta-lhe uma garrafa na cabeça, que veio da zona onde está a máquina das setas e, que a partir desse momento, já não se lembra de mais nada. Esclareceu que estavam cerca de 3 ou 4 pessoas a tentar entrar na zona do balcão. Questionado a tal não recordou quantos clientes estavam no bar, para além do grupo, adiantando que pensa que estavam 4/5 clientes. Pensa que estavam a falar uns com os outros, mas já não se recorda. Afirmou que, quando acordou viu o JJ no chão com sangue e o MM fazer manobras de reanimação. Concretizou que MM era cliente do bar e a rapariga das tranças estava a passar música. O depoimento da testemunha de pouco adiantou à formação da convicção do tribunal pois que teve uma perceção muito limitada dos acontecimentos, na sequência da agressão que lhe foi infligida. KK, À data dos factos explorava o bar, estando no mesmo na noite referida na matéria apurada, motivo pelo qual denotou conhecimento directo dos factos a que respondeu. Corroborando as declarações prestadas pelo arguido BB, afirmou que apenas conhecia o mesmo e o arguido CC, esclarecendo que só conheceu os demais arguidos na altura dos factos. Contextualizando os factos no tempo, esclareceu que os mesmos aconteceram na noite de 8 para ... de ... de 2022. Apresentando versão consentânea com a testemunha PP, confirmou que a trabalhar no bar naquela noite, para além deste, estava o JJ e a própria testemunha e que a II estava a passar música no bar. Afirmou que no bar nessa noite estariam, pelo menos, entre 20 a 30 pessoas. Descrevendo a dinâmica dos acontecimentos referiu que estava a trabalhar e entraram os dois arguidos o AA e o BB, tendo-se virado para o “BB” e disse que já os atendia. Apercebeu-se de uma discussão e que no início da mesma os arguidos AA e BB estavam na zona de passagem para a entrada do balcão e a testemunha estava a servir um cliente, o que vai ao encontro das declarações prestadas pelo arguido BB. Mais referiu que o JJ lhe foi dizer que o AA lhe tinha dado uma chapada. Nessa altura a testemunha e o JJ foram ter com o arguido AA e com o arguido BB. Não recordando com precisão como, afirmou que começaram a tentar bater no JJ. Pensa que o BB dá mais uma chapada ao JJ. O arguido BB disse que ia ao carro buscar uma arma e a testemunha disse “não vais nada”. Entretanto o BB sai do bar e o AA ficou a tentar bater ao JJ. A testemunha foi atrás do arguido BB nem se apercebeu bem se ele saiu, mas apercebeu-se que entraram a todos para dentro do bar. Começaram a atiraram copos, garrafas e bancos. Esclareceu que viu a II puxar o JJ para a cozinha esclarecendo que AA ficou na cozinha e que a II ficou, a partir desse momento, sempre na cozinha. A testemunha, confrontada com a fotografia n.º 15 de fls. 150 (sendo ainda visíveis as marcas dos círculos efectuados pela mesma em julgamento) descreveu, por referência a essa fotografia, a posição em que estavam as cinco pessoas que estiveram no espaço da cozinha, sendo as únicas que aí entraram, onde veio a ocorrer a morte da vítima JJ. Quando confrontada com a fotografia, onde estava o cadáver da vítima, foi notória a consternação da testemunha ao reviver os acontecimentos. Assim, de forma muita clara, esclarecedora e isenta afirmou que a II estava de costas para o fogão, o arguido AA estava junto à bacia e ao balde verde junto ao escorredor de frente para o JJ e que junto ao extintor estava o arguido BB, estando a testemunha ao seu lado, mas virada para o mesmo. Com relevo esclareceu que enquanto estava na cozinha esteve, quase sempre, a agarrar os braços do arguido BB, para evitar que o mesmo atingisse o JJ esclarecendo que, num dado momento, o arguido BB se conseguiu libertar e a empurrou contra o frigorífico mas que a testemunha voltou a agarrar nos braços do mesmo evitando que atingisse o JJ. Esclareceu que estavam todos muito próximo uns dos outros chegando a usar a expressão “em cima uns dos outros”. A testemunha esclareceu ainda que a II não terá estado entre o BB e o JJ nem entre ele e o AA. Referiu ser tudo muito rápido Mais adiantou quando os arguidos saíram, foi atrás do arguido BB e que voltou a acorrer para trás e vê o JJ a cair. Mais confirmou que JJ estava de pé e tinha roupa escura pelo que não se recorda se tinha sangue, o que vai ao encontro das declarações prestadas pelos arguidos BB e AA. A testemunha adiantou que não tinha conhecimento de existir qualquer hostilidade entre a vítima JJ e os arguidos, designadamente, entre aquele e o arguido BB esclarecendo que o mesmo já tinha ido ao bar mais que uma vez e que nunca tinha havido qualquer problema. Confirmou que o arguido BB, nessa mesma noite, ligou-lhe e falou com ele e que este lhe disse que “o JJ não ia voltar a trabalhar” ao que a aí testemunha disse que “o JJ estava morto”. Ficando este muito surpreso “Como assim morreu”? Foi determinada a reprodução das declarações das testemunhas em sede de inquérito – fls. 1270 Relativamente ao arguido CC esclareceu ainda que o mesmo teria frequentado uma ou outra vez o bar em momento anterior ao da noite dos factos. Mais esclareceu que o mesmo estava perto da máquina das setas a pedir para se irem embora. Portanto a acalmar a situação o que reforça o depoimento do mesmo. II A testemunha demostrou ter conhecimento directo dos factos a que respondeu por, na noite em que os mesmos tiveram lugar estava a passar música no bar, no interior do balcão, virada para a televisão, portanto, de costas para a entrada do bar. Esclareceu que estariam nessa noite cerca de 20 pessoas no bar e que começou a ouvir barulho de gritos e de coisas a partir, adiantando que estava muita “confusão” na zona junto às setas do bar. Corroborando o depoimento das testemunhas PP e KK referiu que esta também estava na zona do balcão. Mais esclareceu que a testemunha quando se virou viu que em frente ao JJ estava o PP e que se baixou para não levar com coisas na cabeça. Confirmou que da zona das setas para a entrada do bar é que havia o arremesso dos objectos. Esclareceu que se baixou e foi até ao JJ, agachada e quando se levantou viu o arguido BB que tinha um banco na mão e que o arremessou chegando a bater-lhe na cabeça. Mais esclareceu que agarrou no JJ e o empurrou para entrar na cozinha para ver se acabava a “confusão”. Esclareceu que JJ ficou de frente para a porta e a testemunha ficou de costas. Ficaram ambos frente a frente e que lhe disse para ficarem na cozinha para não continuar a confusão e o JJ disse que queria proteger o pessoal. Mais esclareceu que sentiu um movimento e levou com algo na cabeça da parte lateral da cabeça e que ficou dobrada junto ao fogão ficando com a visão turva que não conseguiu perceber o que era, perdendo a exacta percepção dos acontecimentos. Quando entraram mais pessoas na cozinha referiam que deviam estar cerca de 5 pessoas, concretizando que segundo recorda o arguido AA estava focado no JJ. Referiu que quando voltou a ter visão só estava a testemunha e a vítima JJ na cozinha e que quando se levantou o JJ lhe disse “Tás a ver II eu protegi-te”, referindo que o JJ a tentou agarrar, mas que acabou por cair. E que ficou de costas para a entrada. A testemunha foi confrontada com as fotografias de fls. 149 e 150 e com as fotografias da faca (fls. 157) tendo reconhecido a mesma como sendo as facas do bar. Mais referiu, com relevo, que viu que junto ao lava louça estava louça e talheres, designadamente, as facas iguais à apreendida nos autos. VV A testemunha afirmou ser tio da vítima, não tendo uma relação próxima com o sobrinho. O depoimento da testemunha de nada adiantou à formação d convicção o tribunal porquanto o mesmo não denotou ter qualquer conhecimento sobre a factualidade. MM A testemunha denotou ter conhecimento directo dos factos a que respondeu por ter estado no bar na noite dos factos. Assim, a testemunha esclareceu que havia chegado ao Bar B......, cerca da meia noite, uma hora antes dos acontecimentos. A testemunha descreveu as características do bar, fazendo o formato de um “L “, esclarecendo que estava sentado na primeira mesa e que foi o seu irmão que lhe chamou a atenção para “uma confusão”. Detalhou que viu as pessoas a ficar exaltadas, ouviu vozes altas, a palavra “calma” e o irmão a dizer que já estava a “haver confusão”. Mais referiu que conhecia o JJ, que era empregado do bar e que se ouvia as vozes da KK e do JJ como estando envolvidos na discussão. Duas pessoas foram para fora do bar. Após levou o irmão para a esplanada do bar .... Conseguiu ver a parte do balcão lado contrário à parte em que os empregados do bar. Havia uma mesa junto ao balcão. Viu dois indivíduos a saírem do bar. A preocupação foi tirar o irmão do bar e foi pô-lo na esplanada. Reentrou no bar e viu entrar um grupo de pessoas e ficou frente a frente. Descrevendoos referiu que tinham barba. O mais novinho era mais pacífico e foi tentar acalmar (sendo o mais novo o arguido DD). Esclareceu que levou com um copo na cara e que o copo que lhe acertou foi arremessado pela KK, quanto retorquiu aos arremessos que haviam ocorrido por parte do grupo. Mais se esclareceu que ouviu a KK a dizer “não é necessário pistolas”. Confirmou aqueles que ficaram de frente para ele foram os últimos a entrar e sabe que passaram para ele pessoas e irem para a zona do balcão e iam em direcção à cozinha. A testemunha viu PP e a II no interior da cozinha, mas já depois de o JJ estar deitado no chão. Foi confrontado com as fotografias de fls. 97/98 não conseguindo identificar nenhum dos arguidos nem a roupa que usara. Com efeito, o depoimento desta testemunha foi vago e pouco preciso não tendo ademais denotado conhecimento dos factos que tiveram lugar na cozinha, sendo esses os factos que mais relevam, pelo que apenas auxiliou a convicção do tribunal quanto ao contexto envolvente. TT A testemunha referiu que era cliente habitual do B...... bar e que na noite dos factos estava na esplanada interior do Bar onde esta o KKK e o UU. Situou os acontecimentos cerca das 0h e 40 m quando ouviu um estrondo e gritos. Esclareceu que o estrondo parecia um murro na mesa ou alguém a atirar a mesa ou uma cadeira. Só viu o vulto de um dos arguidos a passar a sair para a rua, um rapaz que tinha um polo verde, com barba e pele escura, de estatura média. Não obstante a presença da testemunha no bar o seu depoimento de pouco adiantou à formação da convicção do tribunal na medida em que a mesma não presenciou as agressões á vítima. NN A testemunha afirmou conhecer os arguidos CC, AA e BB que eram clientes do Bar. A testemunha esclareceu que era membro da mesma banda a que o JJ pertencia e, que é padrinho da filha do JJ e que era como se fossem irmãos. Afirmou que no dia ... de ... de 2022 no café “S....”, dois indivíduos, parecendo-lhe ser o arguido BB e outro era o arguido CC, lhe queriam tirar a foto. Todavia o a testemunha não recordou com precisão o que aconteceu afirmando que um deles se levantou de rompante e lhe vieram pedir um cigarro e que andavam à procura dos elementos da banda. Que lhe estava a fazer peito. Assim, o depoimento da testemunha foi vago e pouco preciso. UU A testemunha afirmou que conhecia os arguidos de vista que conhecia muito bem o JJ e frequentava o Bar. A testemunha afirmou que apenas assistiu ao final dos factos esclarecendo que estava sentado na parte de fora do bar, na esplanada do lado de trás do bar quando começou a ouvir uma “grande confusão”, gritos, não conseguindo ouvir mais nada. Mais afirmou que estava com a TT e mais dois amigos e que ouviu copos a partir. Assim, esclareceu que só conseguiu ver para o interior do bar depois de se ter levantado, vendo o balcão. Viu que ao balcão no interior deste estava a dona do bar a KK, o JJ, a II e o PP. Quem estava ao balcão eram os arguidos. Posteriormente viu uma pessoa a sair com uma faca na mão, descrevendo a estatura, como sendo magro de cerca de 1,80m de altura (vulto). Assim, que viu a pessoa com a faca na mão, o brilho da faca, a sua preocupação foi proteger a namorada. Mais esclarecer que só posteriormente viu o PP com a cabeça ensanguentada. Testemunhas de Defesa Arguido BB WW Amigo e vizinho do arguido BB há cerca de 25 anos afirmando que nunca o viu ser quezilento. XX. Amigo do arguido BB há cerca de 7 anos. Tem o café o.... tendo confirmado que na noite dos factos os arguidos estavam bem bebidos. YY Vizinho desde a nascença do arguido e da família sendo uma boa vizinhança. Arguido ZZ. Avô do CC. Criou o neto. Neto sempre trabalhou. Trabalha numa empresa que trabalha para a A.......... Nunca foi conflituoso, sempre foi um rapaz educado e respeitador. AAA Amigo há 10 anos do arguido CC. Amigo do seu amigo e gosta de ajudar os outros. Não é pessoa de conflitos. Ele é o pilar da família porque a esposa não trabalha. É uma pessoa de bem. BBB, A testemunha foi ... de CC na Igreja que o mesmo frequentou. Jovem sempre fez o melhor para a igreja. Tinha uma participação activa no culto. Arguido DD CCC Conhece o arguido DD há cerca de 20 anos. É educado. Tem uma boa relação com toda a vizinhança. DDD Confirmou que o arguido é amigo da família dos arguidos. Especificamente do arguido DD. Conhece há cerca de 20 anos. Rapaz normal, reservado e educado. Atencioso. Pessoas humildes e que recebem bem. HHH Conhece o DD da Igreja. É ... na igreja frequentada pelo DD e pela sua família. O DD serve a comunidade, pessoa pacata que sabe lidar com o público. Arguido EE EEE É amiga do EE há cerca de 12 anos. EE e o DD são cunhados. EE é extremamente bem-educado e calmo. Tem uma companheira. FFF Tem um café Pa... que eles frequentam e também é vizinha, o café é próximo do café. Conhece a família desde que o EE é miúdo. Pessoas que sempre frequentaram os cafés, é um bairro social, mas as pessoas são muito educadas. Nunca ouviu que foram pessoas de fazer desacatos. Faz mercados no .... Muitas vezes veem a ... buscar material. GGG Vizinho do arguido EE e também do DD. Conhece ao EE há 24 anos. É uma pessoa calma e humilde. Não é pessoa de beber. Defesa do arguido FF III Conhece o FF e o irmão há mais de 20 anos. Rapaz calmo, trabalhador e tímido JJJ, Conhece todos os arguidos de vista. Amigo de FF. Homem de família, pessoa trabalhadora, calmo.
Da prova supra referida verifica-se em suma que: Temos, desde logo uma vítima mortal que veio a faleceu no local, concretamente, na cozinha do ..., onde foi atingida por um instrumento cor-perfurante, concluindo o perito médico legal, ser compatível com a utilização de arma branca. Sendo de especial relevância a análise do relatório da autópsia para a prova da causa da morte e do detalhe das lesões que a causaram. A existência de uma faca de cozinha apreendida, que foi reconhecida como sendo uma faca igual às utilizadas no bar, e que foi encontrada numa sarjeta, na noite dos factos após as diligências de buscas da polícia judiciária. A existência de copos e canecas partidas com vestígios hemáticos, um deles da própria vítima e o ADN da vítima, numa das mãos do arguido BB que reforça a credibilidade da versão apresentada pelo mesmo e que prova a contenda física entre ambos. A versão dos arguidos que os coloca a todos na madrugada do dia .../.../2022 no Bar B......, nas circunstâncias de tempo e lugar referidas na factualidade, mas já não na divisão da cozinha, aí só colocando os arguidos BB e AA e que confirmam a ”confusão” que aí se iniciou, bem como, o arremesso de objectos, como copos, garrafas, bancos e cadeiras. Mais confirmam, quatro dos arguidos, a posse da faca a que acima se alude por parte do arguido AA, sendo um, o próprio. A versão das testemunhas que se encontravam no bar nessa noite, PP, MM, TT e UU que confirmaram, igualmente, o arremesso de objectos, e a existência da referida “confusão”, mas não os factos que ocorreram na cozinha pois não entraram na mesma nem conseguiram visualizar o que lá se passou. A versão das testemunhas KK e II que, respectivamente, explorava o bar, estando a servir bebidas no momento, e que se encontrava a colocar música no interior do balcão, tendo ambas estado no interior da cozinha com os arguidos AA e BB, no momento em que a agressão teve lugar, e que foi essencial para a convicção do Tribunal, designadamente, quanto ao posicionamento de todos e o esclarecimento da dinâmica dos factos. Do confronto das declarações dos arguidos resulta que os mesmos tiveram algumas discordâncias e incongruências, próprias da situação ocorrida, mas que acabaram por coincidir em pontos que se entendem por fundamentais. Assim, e no essencial, os arguidos DD, FF, CC e EE apresentaram versão consentânea entre si quanto à sua intervenção nos factos, ou melhor, à sua não participação na dinâmica dos acontecimentos, negando ter arremessado cadeiras, bancos, copos e ou garrafas, apesar de confirmarem que estavam a ser arremessados esses objectos. Mais foram consentâneos e coincidentes quanto ao facto de nenhum desses arguidos ter estado no interior da cozinha, ao contrário dos arguidos BB e AA, o que acabou por ser, também, confirmado pelas testemunhas KK e II. Com maior relevância o depoimento da testemunha KK que presenciou os factos e os percepcionou de forma totalmente consciente, ao contrário da testemunha II que, em virtude da pancada que sofreu não percepcionou da mesma forma o sucedido (tendo ficado atordoada e segundo a mesma com a visão, momentaneamente, afetada), os percepcionou de um modo mais condicionado e limitado. Desta feita, os referidos arguidos negaram a sua participação e/ou a sua comparticipação nas agressões que provocaram as lesões à vítima e que foram a causa da sua morte. Mais se extrai da versão desses arguidos que tentaram apaziguar os ânimos e porem termo à contenda, versão que foi corroborado pelo próprio arguido BB e pelo depoimento da testemunha KK. Mais são concordantes as declarações dos arguidos CC, EE (este em sede de primeiro interrogatório judicial cuja declarações foram dadas por reproduzidas e parte foi reproduzida em audiência) e DD quanto a versão que apresentaram quanto ao facto de terem visto o arguido AA com uma faca, à saída do bar B...... e de este a ter arremessada/colocado numa sarjeta ali existente. Mais confluíram as versões dos referidos arguidos e do arguido BB que o arguido AA, depois do sucedido, saiu do bar, antes daquele, e que o mesmo proferiu a expressão “já fiz merda”, não os tendo acompanhado o resto da noite. E, que após o sucedido abandonaram o local e foram para casa do arguido BB onde vieram a ser detidos. Apenas o arguido FF não confirma esta versão, o que não abala a convicção do tribunal, pois que o mesmo é irmão do arguido AA, sendo natural e compreensível que o não queira incriminar. Ora, essa versão denota toda a credibilidade pois que aí veio a ser encontrada a faca pela Polícia Judiciária na madrugada em que aconteceram os factos, como já referido. Acresce que, o próprio arguido AA, apesar de negar a autoria dos factos, face à evidência das provas (nomeadamente à possibilidade de na faca serem encontrados os seus vestígios biológicos e/ou lofoscópicos), admitiu que colocou a faca na sarjeta, tendo justificado a sua posse e o ter sido visto a coloca-la no sítio onde veio a ser localizada, por a ter tirado da mão do arguido BB, que negou que tivesse visto ou usado qualquer faca. Ora, a versão do arguido AA não nos mereceu quanto a essa parte qualquer credibilidade já que é completamente ilógica e contrária às regras da experiência, neste tipo de situação. Na verdade, não é verosímil que alguém que não tenha utilizado uma faca para golpear alguém, num envolvimento físico num bar, que como referiram foi muito rápido, tenha a preocupação de retirar a faca a quem a usou, o que até permitiria uma maior visualização pelas testemunhas, para posteriormente, a ocultar, sujeitando-se a que nesse objecto fiquem as suas impressões e que, seguidamente, se coloque em fuga. Ademais, a experiência diz-nos que situações como estas demoram frações de segundos, sendo completamente improvável a transmissão de objectos em momento ulterior. Com efeito, o contrário nos dizem as regras da experiência comum, ou seja, o lógico e normal será que seja aquele que utiliza a faca, que a oculte e fuja, assim se furtando à acção da justiça o que aconteceu, precisamente, com o arguido AA, que esteve desaparecido, e que apenas foi encontrado (escondido) e detido mais de 5 meses depois da ocorrência dos factos e da detenção de todos os outros arguidos, que ocorreu no mesmo dia dos factos, convictos que nada teriam a temer. E, tal raciocínio lógico e convencimento do tribunal é reforçado pela demais prova produzida, desde logo, pela prova pericial e testemunhal, concretamente, o depoimento da testemunha KK, como acima consignado. A essencialidade do seu depoimento decorre, ab initio, da razão de ciência da testemunha. A referida testemunha demonstrou total isenção, revelando por um lado não ter qualquer hostilidade relativamente a nenhum dos arguidos e, por outro lado qualquer comprometimento por já conhecer o arguido BB, pretendendo ilibá-lo. Na verdade, a testemunha relatou os factos com espontaneidade e objectividade, não obstante a consternação e emoção que revelou, quando confrontada com as fotografias da vítima, perfeitamente natural ao vivenciar de novo o evento traumático de assistir à morte de um ser humano e, ainda mais, de um amigo. A testemunha foi assertiva e clara tendo sido esclarecedora quanto à forma como os diversos intervenientes acederam à cozinha, sendo a vítima JJ puxada/empurrada para a cozinha pela II, versões coincidentes com o depoimento de II, à localização onde foram praticados os factos que causaram a morte de JJ e à concreta posição em que se encontravam os arguidos BB e AA, por referência à vítima JJ, assim como, a testemunha II e a própria testemunha KK. Mais foi esclarecedor no detalhar de quem esteve na cozinha tendo afastado a presença dos arguidos CC, DD, EE e FF do local onde, sem quaisquer dúvidas, vieram a ser praticados os factos que causaram a morte de JJ. Acresce que, a análise de tal depoimento e a sua credibilidade, assim, como as declarações dos arguidos e da testemunha II (ainda que com uma perceção condicionada), saiu reforçada com a prova pericial supra analisada e com o teor do relatório da autópsia. O golpes que levaram à morte do JJ foram desferidos, sem qualquer dúvida no interior da cozinha do bar, cujas dimensões são exíguas, e cuja localização e configuração se afere das fotografias que constam do auto de inspecção judiciária de fls.70, 71 e do relatório de exame pericial de fls. 150 (fotos n.º 15 e 16), pois que o cadáver da vítima aí ficou em momento ulterior à agressão, como consta da factualidade. De tais fotografias e da descrição realizada pelas mencionadas testemunhas é possível aferir que a cozinha está localizada mesmo em frente ao interior do balcão do bar, tendo apenas uma espécie de aduela em tijolo, mas sem porta, sendo de formato quadrado, encontrando-se o frigorífico junto à entrada do lado esquerdo, frente à entrada uma bancada de inox de pequenas dimensões, à esquerda desta o fogão, e à direita da bancada uma outra pequena bancada com lava louça. O referido relatório de autópsia conjugado com os depoimentos das testemunhas que presenciaram os factos, que determinaram a morte de JJ (KK e II), essencialmente, no que se refere ao mencionado depoimento da testemunha KK, e complementada pelas declarações dos arguidos já supra analisados foi indispensável para a formação da convicção do tribunal. Na verdade, a descrição dos trajectos das feridas, as lesões traumáticas causadas e a conclusão relativa ao resultado morte permitiu ao tribunal concluir factualmente nos termos supra escritos, conseguindo, inclusive, visualizar a dinâmica da agressão levada a cabo pelo arguido AA e que veio a causar a morte, em poucos minutos, da vítima JJ. Refere o perito médico-legal, concretamente no resumo das feridas inciso perfurantes (fls. 880/881), a existência, na vítima, de duas feridas inciso-perfurantes, a saber: - Uma “no terço médio da região paraesternal à direita, prolongando-se em trajecto orientado da frente para trás, de baixo para cima e ligeiramente da esquerda para a direita, determinando perfuração do esterno, do pericárdio e do coração, culminando no interior do ventrículo direito do mesmo”, que corresponde à solução A, a que acima se alude, do exame do hábito externo e; -Uma “ferida inciso-perfurante no terço interior da face anterior do tórax, a nível da linha hemiclavicular esquerda, prolongando-se por trajecto orientado da frente para trás, de baixo para cima e da esquerda para a direita, determinando perfuração do músculo retoabdominal, da porção cartilagínia da sétima costela, do pericárdio e do coração, culminando no interior do ventrículo esquerdo do mesmo”, que corresponde à solução B, a que acima se alude, do exame do hábito externo. Conforme concluiu o perito médico legal, as lesões traumáticas designadas pelas letras A e B, no exame do hábito externo “denotam haver sido produzidas” por instrumento de natureza corto-perfurante ou actuando como tal podendo, do ponto vista médico-legal, ter sido devidas a arma branca”. Com efeito, temos duas feridas que em comum têm o facto de terem sido produzidas por instrumento de natureza corto-perfurante, arma branca, compatível com as características da faca apreendida e encontrada na sarjeta frente ao bar, que os arguidos viram na mão do arguido AA e que, até o próprio admitiu, ter estado na sua posse “atirado para a sargeta” (não colhendo a versão apresentada pelo mesmo quando à justificação que apresentou de ter estado na sua mão, como se viu). Mais têm em comum, as referidas feridas, que ambas perfuraram o pericárdio e o coração culminando nos ventrículos de tal órgão a A no ventrículo direito e a B no ventrículo esquerdo. E, ambas as feridas tiveram a mesma trajectória – orientação da frente para trás, de baixo para cima e ligeiramente da esquerda para a direita. Ora, daqui só se pode extrair a conclusão que foram desferidos dois golpes, com o mesmo instrumento (a faca) e que foram, necessariamente, desferidos por quem estava de frente para a vítima, pois que de outro modo não podiam ter sido– de frente para trás – ; por quem estava de costas para bancada da cozinha, mas muito próximo da mesma e do lava loiças onde estaria a faca (como confirmado pela testemunhas II que reconheceu como sendo as facas usadas no bar e que estavam junto ao lava loiças); e pegando na mesma e num gesto, natural que se lhe seguiu, - de baixo para cima -, elevando o braço para golpear a vítima, já que a bancada é mais baixa que qualquer uma das pessoas, e dos arguidos e da vítima e, da esquerda para a direita já que o lavatório onde estaria a faca ficaria à esquerda da bancada de inox. Como resultou claro, do depoimento das testemunhas II e KK, essencialmente desta última, bem como do próprio arguido BB, que acabou por assumir estar “entre portas”, na cozinha, no momento em que ocorreram os factos, a posição das referidas testemunhas e dos arguidos BB e AA, era a seguinte: A testemunha II estava ao fundo da cozinha, junto ao fogão; a vítima JJ estava de costas para o arguido BB, que estava à entrada da cozinha e cujos braços a testemunha KK agarrava, a KK encontrava na lateral do arguido BB (do lado do frigorífico) mas virada de frente para o mesmo, e a vítima estava de frente para o AA, este localizado no fundo da cozinha de costas para a bancada junto do lava loiças/lavatório da cozinha onde estaria a faca. Com efeito, a vítima estaria posicionada entre os arguidos BB e AA, de costas para o primeiro e de frente para o segundo. Ora, pela posição dos arguidos e da vítima e pela trajectória das feridas as mesmas só poderiam ter sido causadas pelos golpes desferidos pela mão do arguido AA que estava de frente para a vítima, sem ninguém de permeio com a faca ( fls. 1070 vº ) que estaria no lavatório da cozinha e que o próprio veio a colocar na sarjeta, procurando ocultar a arma do crime que, porém, não conseguiu já que a mesma não entrou por completo na sarjeta, ficando suspensa com o cabo de fora. De referir ainda que, os golpes tem dimensões compatíveis com as dimensões, da faca. De resto, não se pode deixar de salientar, pelas perfurações que os golpes causaram e a trajectória de baixo para cima (considerando a altura da vítima e do agressor), a força e a violência com que os mesmos foram desferidos, bem reveladores do ímpeto com que o arguido o fez, demostrativo da sua clara intenção de matar. E, das lesões provocadas e das caraterísticas da faca, uma faca de cozinha, mas um talher, com serrilha, de lâmina estreita, e não uma faca de lâmina comprida e larga, a força e vigor com que o arguido golpeou a vítima, não uma, mas duas vezes, conseguindo perfurar, num dos golpes, o osso do esterno atingindo directamente o coração. Vale isto por dizer que, não poderia ser outra a intenção do arguido, senão a de matar, ao atingir a zona do tórax que aloja órgão vitais, como sejam o coração e os pulmões, tendo com cada um dos golpes atingiu os ventrículos do coração, o que justifica a rapidez com que a morte da vítima veio a ocorrer. E, o arguido não poderia deixar de saber que atingia a vítima numa zona vital, repetindo por mais que uma vez, já que a tal temos de recorrer ao homem médio sendo o arguido um adulto, sem quaisquer condicionantes apuradas que não permitissem ter essa consciência, o contrário se inferindo pela própria postura do arguido em audiência. Quanto à formação da convicção do tribunal há ainda evidenciar que, o tribunal se convenceu da factualidade apurada, não restando dúvidas quanto à mesma, pela análise, conjugada de toda a prova, ligando-se a mesma entre si tendo sido também e, naturalmente, relevante a imediação, quanto à credibilidade de cada um das versões apresentadas. No que concerne às suas condições pessoais dos arguidos AA; BB; CC; DD; EE; FF o tribunal atentou às declarações dos mesmos e aos relatórios sociais da DGRSP juntos, respectivamente, a fls. 1614 a 1616; 1683 a 1685; 1645 a 1647; 1623 a 1625 v.; 1627 a 1630 e 1632 a 1635. Mais se atendeu à inserção familiar e personalidade dos arguidos aos depoimentos das testemunhas de defesa a que acima se alude. Por fim, relevou o certificado de registo criminal juntos a fls. 1587v.; 1588 v. 1583 v.; 1582 v., fls. 1584 v. dos autos, de onde não constam qualquer inscrição, como se extrai da matéria de facto apurada, respectivamente, relativamente aos arguidos BB, CC, DD; EE e FF. E, o certificado de registo criminal de fls. 1585 v a 1586 v. referente ao arguido AA onde consta a inscrição descrita na matéria de facto apurada.
* Quanto a matéria de facto não apurada a mesmo deveu-se por um lado à de prova contrária produzida designadamente, quanto à não participação e comparticipação, desde logo, dos arguidos CC, DD, EE e FF nos factos que tiveram lugar na cozinha, e que levaram à morte de JJ, por que nunca aí chegaram, sequer, a entrar. Já quanto à não participação e comparticipação do arguido BB a mesma deveu-se à prova produzia relativa à autoria dos factos apenas pelo arguido AA, nos termos supra plasmado e à impossibilidade daquele os ter praticado, quer pelo facto de ter estado com os braços agarrados, quer por estar atrás da vítima, sendo impossível atingi-lo da forma como foi atingido. E, quanto à factualidade atinente à participação do arguido BB nos factos do dia .../.../2022 a mesma foi considerada como não provada pela sua real impossibilidade já que nessa data o arguido estava já sujeito à medida de coação de prisão preventiva (pontos cc. a gg. da matéria de facto não provada). Quanto ao que demais consta, quanto à factualidade do dia .../.../2022, relativamente ao arguido CC a mesma deveu-se às versões contraditórias entre este e a testemunha NN, pelo que Tribunal apenas logrou provar a factualidade em que houve convergência nas versões apresentada, ficando na dúvida quanto ao demais. Do mesmo modo o tribunal ficou cm dúvidas sobre o verdadeiro motivo da contenda, motivo pelo qual também não se deu o mesmo como provado. Igualmente, o tribunal ficou com uma dúvida séria e razoável quanto à factualidade descrita nos pontos p. a t., tendo-se, igualmente, apurado apenas o que resultou das versões concordantes quanto à mesma. Assim, não existindo qualquer outro meio de prova que dissipasse as dúvidas do tribunal acabou o mesmo, atento o princípio in dúbio pro reo constitucionalmente consagrado de que na dúvida sobre os factos a provar o tribunal decide em favor do arguido, dar como não provados os factos supra descritos Já quanto à demais prova não provada a mesma resulta da prova produzida nos termos supra analisados tendo-se o tribunal convencido de que os augidos não actuaram em conjugação de esforço, mas sim da formar descrita até porque tal concertação e delineamento do plano não era compatível com o estado em que todos os arguidos se encontravam, tendo antes a situação descrita tido lugar num contexto de envolvimentos físicos, no calor do momento, em muito potenciado pelo consumo excessivo de álcool por parte dos arguidos.”
+
O recurso é delimitado pelas conclusões extraídas da motivação que constituem as questões suscitadas pelo recorrente e que o tribunal de recurso tem de apreciar (artºs 412º, nº1, e 424º, nº2 CPP Ac. do STJ de 19/6/1996, in BMJ n.º 458, pág. 98 e Prof. Germano Marques da Silva, in “Curso de Processo Penal” III, 2.ª Ed., pág. 335), sem prejuízo de ponderar os vícios da decisão e nulidades de conhecimento oficioso ainda que não invocados pelos sujeitos processuais – artºs, 410º, 412º1 e 403º1 CPP e Jurisprudência dos Acs STJ 1/94 de 2/12 e 7/95 de 19/10/ 95 este do seguinte teor:“ é oficioso, pelo tribunal de recurso, o conhecimento dos vícios indicados no artigo 410º, nº2 do CPP, mesmo que o recurso se encontre limitado à matéria de direito”) e do conhecimento dos mesmos vícios em face do artº 432º1 a) e c) CPP (redação da Lei 94/2021 de 21/12) mas que, terão de resultar “do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum” – artº 410º2 CPP, “não podendo o tribunal socorrer-se de quaisquer outros elementos constantes do processo”, sendo tais vícios apenas os intrínsecos da própria decisão, como peça autónoma, não sendo de considerar e ter em conta o que do processo conste em outros locais - cfr. Ac. STJ 29/01/92 CJ XVII, I, 20, Ac. TC 5/5/93 BMJ 427, 100, constituindo a “revista alargada”, pelo que são as seguintes as questões suscitadas e a apreciar:
- Violação dos princípios in dubio pro reo e livre apreciação da prova aliados à omissão de pronuncia e falta de fundamentação
- Qualificação jurídica dos factos: participação em rixa
- Medida da pena
Conhecendo.
Invoca o arguido o primeiro grupo de questões porque não existiu prova concreta sobre quem desferiu a facada, violando o princípio da livre apreciação e do in dubio pro reo e o tribunal não apreciou e pronunciou sobre os depoimentos das testemunhas dos factos que identificara e transcrevera, omitindo tal apreciação e fundamentação e omitiu prova abonatória a favor do arguido ( cls. VI, VII e VIII no essencial).
O ilustre PGA, junto deste Supremo Tribunal suscita a questão previa do não conhecimento de tais questões, em face dos poderes de cognição do Supremo Tribunal como tribunal de revista devendo o recurso ser rejeitado nessa parte, por inadmissibilidade legal.
Apreciando
O recurso para o STJ visa exclusivamente matéria de direito (artº 434ºº CPP), apenas podendo conhecer dos vícios (da matéria de facto) oficiosamente (artºs 410.º, n.º 2, 426.º e 434.º, CPP e Ac. FJ n.º 7/95 e 10/2005, e apenas podendo ser alegados pelo recorrente nas situações recursivas previstas no artº 432.º, n.º 1, a) e c), CPP (em que o STJ intervém como 2ª instância).
Para tanto dispõe o artº 434º CPP: “O recurso interposto para o Supremo Tribunal de Justiça visa exclusivamente o reexame de matéria de direito, sem prejuízo do disposto nas alíneas a) e c) do n.º 1 do artigo 432.º”
Por sua vez o artº 432º CPP diz-nos que:
“1 - Recorre-se para o Supremo Tribunal de Justiça:
a) De decisões das relações proferidas em 1.ª instância, visando exclusivamente o reexame da matéria de direito ou com os fundamentos previstos nos n.os 2 e 3 do artigo 410.º;
b) De decisões que não sejam irrecorríveis proferidas pelas relações, em recurso, nos termos do artigo 400.º;
c) De acórdãos finais proferidos pelo tribunal do júri ou pelo tribunal coletivo que apliquem pena de prisão superior a 5 anos, visando exclusivamente o reexame da matéria de direito ou com os fundamentos previstos nos n.os 2 e 3 do artigo 410.º;
d) De decisões interlocutórias que devam subir com os recursos referidos nas alíneas anteriores.
2 - Nos casos da alínea c) do número anterior não é admissível recurso prévio para a relação, sem prejuízo do disposto no n.º 8 do artigo 414.º”
Como decorre das normas supracitadas com a alteração promovida pela Lei 94/2021 de 21/12, a possibilidade de o STJ conhecer da matéria de facto emergente dos vícios e nulidades não sanadas do artº 410º 2 e 3 CPP, é restrita aos recursos referidos nas al. a) e c) do artº 432º CPP em que o STJ funciona como 2ª instância (funcionando a Relação como 1ª instancia, ou o Tribunal coletivo / ou de júri / recurso per saltum). Estas normas (artº 432º, 1 a) e c), 434º e 400º 1 e) CPP foram introduzidas pela mesma lei 94/2021, pelo que é inequívoca a intenção legislativa de admissão de recurso sobre a matéria de facto (no que respeita aos vícios da decisão e nulidades do artº 410º CPP) apenas aos casos das al. a) e c) do artº 432º CPP em que não se insere o presente recurso, sendo a impugnação ampla da matéria de facto restrita aos recursos para a Relação, como foi.
No sentido da não admissibilidade, com tais fundamentos, de recurso de acórdãos da Relação tirados em recurso, tem decidido o STJ entre outros (ac. 1/3/2023 Proc 589/15.0JABRG.G2.S1 www.dgsi.pt Cons. Ernesto Vaz Pereira; ac. 23/3/2022 Proc 4/17.4SFPRT.P1.S1 www.dgsi.pt Cons. Lopes da Mota).
Ora o recorrente pretende questionar a matéria de facto que já foi sindicada pela Relação e o modo como o foi, arguindo a não aplicação do principio in dubio pro reo (que implica conhecer da matéria de facto é constitui ela próprio matéria de facto - Ac. 23/11/2022 proc. 270/17.5GAPFR.P1.S1 Cons. Pedro Branquinho), o principio fundamental da livre apreciação da prova, através do qual se aprecia a prova, e as demais questões tem a ver com o modo e meio como a prova foi apreciada pela Relação, o que tudo tem a ver com a reapreciação da matéria de facto, ou seja se omitiu ou não fundamentou a apreciação que fez.
Como expressa no Ac. STJ 20/11/11 “A crítica ao julgamento da matéria de facto, a expressão de divergência do recorrente relativamente ao acervo fáctico que foi fixado e ao modo como o foi, ou seja, as considerações por si tecidas, quanto à análise, avaliação, ponderação e valoração das provas feitas pelo tribunal são, de todo, irrelevantes, pois ressalvada a hipótese de prova vinculada, o STJ não pode considerá-las, sob pena de estar a invadir o campo da apreciação da matéria de facto» - Proc. 36/06.8GAPSR.S1, www.dgsi.pt Cons. Raul Borges1.
Não cabendo o recurso do arguido nas alíneas a) e c) do artº 432º CPP, não podem ser reapreciadas questões que têm a ver com a matéria de facto, por não ser admissível recurso com tais fundamentos deve o mesmo ser rejeitado nessa parte, face à cindibilidade das questões recursivas (arts 400º, 403º, 414º, nº 2, e 420, nº 1, al. b), pelo que não é possível conhecer dos vícios relativos à matéria de facto assacados ao acórdão da Relação.2
Em face dessas normas e vista a sua justificação traduzida, no facto de inexistir, nem a CRP exigir, um duplo recurso sobre a matéria de facto e esta haver sido reapreciada no recurso da Relação – única exigência constitucional -, não ocorre limitação ao direito ao recurso, tal como a CRP o exige, por violação do artº 32º CRP.
Acresce que “constitui jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça que a irrecorribilidade de uma parte da decisão cobre todas as questões suscitadas que lhe digam respeito, ou seja, que respeitem à parte irrecorrível da decisão impugnada”, pelo que todas as questões ligadas à apreciação feita pelo recorrente quanto à matéria de facto apreciada pela Relação, não são passiveis de conhecimento pelo STJ, sendo abrangidas pela irrecorribilidade daquela.3
Ficam assim por apreciar, no âmbito deste recurso, a qualificação jurídica dos factos e a medida da pena.
No que à qualificação jurídica respeita, o arguido foi condenado pelo crime de homicídio, dizendo-se a Relação: “Pretende, contudo, que se convole a qualificação jurídica dos factos para um crime de participação em rixa, previsto no art.º 151.º, do Código Penal.
O seu n.º 1 tem o seguinte teor: “[Q]uem intervier ou tomar parte em rixa de duas ou mais pessoas, donde resulte a morte ou ofensa à integridade física grave”.
Mediante este crime tutela-se a vida ou a integridade física e indiretamente a ordem pública.
Assim, e mediante o crime de participação em rixa pretende-se prevenir situações de perigo e, quando este se concretize, punir os seus intervenientes, quando não é de todo possível determinar quem foram os autores do resultado que se pretendia acautelar.
A ação típica deste ilícito consiste na participação (“intervier ou tomar parte”) numa rixa, ou seja, em situações de contenda onde intervêm, pelo menos, duas pessoas, as quais protagonizam ações de violência, portadoras de certo risco.
Relembramos que a matéria de facto provada e não provada manteve-se incólume.
Nessa medida, e resultando provado que foi o recorrente quem, munido de uma faca de cozinha, encontrando-se de frente para a vítima, JJ, lhe desferiu dois golpes, concretamente, um no terço médio da região paraesternal à direita, e outro no terço inferior da face anterior do tórax, provocando-lhe a morte, não pode proceder a pretensão do recorrente”
Como se evidencía, a alteração da qualificação jurídica dependia da alteração da matéria de facto, a qual está definitivamente fixada, e consequentemente do desconhecimento de quem fosse o autor do facto danoso, in casu, quem espetara a faca no corpo da vítima (JJ) e lhe causara a morte. Como o agente de tal ação foi o arguido, estão preenchidos os elementos típicos do crime de homicídio que lhe é imputável e não os da participação em rixa, cujo elemento essencial é o saber quem participou nos factos mas desconhecer-se quem provocou o facto danoso causador da morte (circunstância em que tidos os participantes seriam punidos pelo artº 151º CP e não pelo de homicídio).
Improcede assim esta questão.
Questiona o arguido a medida da pena, por excessiva e pretende ver a sua redução para próximo do seu limite minino.
Alega para tanto que foram valorados em seu desfavor os seus antecedentes criminais quando não deviam por serem factos de 2014 e se referirem a outro tipo de ilícito, não se pronunciou sobre as perspetivas de reinserção social e factos relevantes do relatório social que omitiu, nem que tem consciência da gravidade e ilicitude dos factos.
Após transcrever os fundamentos da 1ª instância a Relação ponderou “…a finalidade essencial da aplicação da pena, para além da prevenção especial – encarada como a necessidade de socialização do agente, no sentido de o preparar para no futuro não cometer outros crimes – reside na prevenção geral, o que significa “que a pena deve ser medida basicamente de acordo com a necessidade de tutela de bens jurídicos que se exprime no caso concreto … alcançando-se mediante a estabilização das expectativas comunitárias na validade da norma jurídica violada...”. “É, pois, o próprio conceito de prevenção geral de que se parte que justifica que se fale aqui de uma “moldura” de pena. Esta terá certamente um limite definido pela medida de pena que a comunidade entende necessária à tutela das suas expectativas na validade das normas jurídicas: o limite máximo da pena. Que constituirá, do mesmo passo, o ponto óptimo de realização das necessidades preventivas da comunidade. Mas, abaixo desta medida de pena, outras haverá que a comunidade entende que são ainda suficientes para proteger as suas expectativas na validade das normas – até ao que considere que é o limite do necessário para assegurar a protecção dessas expectativas. Aqui residirá o limite mínimo da pena que visa assegurar a finalidade de prevenção geral; definido, pois, em concreto, pelo absolutamente imprescindível para se realizar essa finalidade de prevenção geral e que pode entender-se sob a forma de defesa da ordem jurídica” [Anabela Miranda Rodrigues, A Determinação da Medida da pena Privativa da Liberdade”, Coimbra Editora, p. 570 e ss.]. “Resta acrescentar que, também aqui, é chamada a intervir a culpa a desempenhar o papel de limite inultrapassável de todas e quaisquer considerações preventivas...» [Ibidem, p. 575]. “Sendo a pena efectivamente medida pela prevenção geral, ela deve respeitar o limite da culpa e, assim, preservar a dignidade humana do condenado” [Ibidem, p. 558].
Em suma, a pena concreta será limitada, no seu máximo, pela culpa do arguido. O princípio da culpa dispõe que «não há pena sem culpa e a medida da pena não pode, em caso algum, ultrapassar a medida da culpa» (cfr. art.º 40.º, n.º 2, do Código Penal).
Resulta, ainda, da matéria de facto que não só o recorrente revela uma personalidade com propensão para a prática de ilícitos, que atentam contra bens jurídicos eminentemente pessoais, tendo já sofrido uma condenação pela prática de crime de violência doméstica, no âmbito do processo comum singular n.º 54/14.2..., do juízo local criminal de ..., como ainda que cometeu os factos objeto destes autos cerca de um ano depois da pena ter sido extinta naquele processo.
Por outro lado, o arguido não se coibiu de se ausentar do local, imediatamente após os factos, sem se ter certificado se a vítima estava ou não morta, e tentou esconder a arma do crime.
Ora, sopesando todos os enunciados factos apurados, entendemos ser de manter a pena de 15 anos aplicada ao recorrente”
Vistas as razões da pena aplicada, vejamos se ocorre motivo para alterar a pena e se a mesma é excessiva e desproporcionada.
À determinação da medida da pena, para Figueiredo Dias “há-de subjazer um juízo de censura global pelo crime praticado, pelo que se impõe aqui, também para a determinação da sua necessidade e medida concreta o recurso aos critérios estabelecidos nos artigos 40º e 71.º do Código Penal.” e assim “grosso modo” a determinação da medida da pena concreta a aplicar ao arguido e a cada crime envolve diversos tipos de operações mentais e materiais, ponderando-se que em face do artº 40ºCP, as finalidades das penas reconduzem-se à protecção de bens jurídicos (prevenção geral) e à reintegração do agente na sociedade (prevenção especial) e, dentro da moldura legal, estabelece o artº71º nº 1 CP, que a pena concreta é achada “em função da culpa do agente e das exigências de prevenção” – sendo a culpa o suporte axiológico de toda a pena, pois “A culpa é o pressuposto e fundamento da responsabilidade penal. A responsabilidade é a consequência ou efeito que recai sobre o culpado. (...) Sendo pressuposto e fundamento da responsabilidade deve ser também a sua medida, (...). O domínio do facto pelo agente é o domínio da sua vontade racional e livre, e é esta que constitui o substrato da culpa”4, tendo presente que o princípio da culpa é a “consequência da exigência incondicional da defesa da dignidade da pessoa humana que ressalta dos artigos 1º, 13º, n.º 1 e 25º, n.º 1 da Constituição da Republica Portuguesa”5– sendo as exigências de prevenção quer gerais quer especiais, e que (e assim Figueiredo Dias, As Consequências Jurídicas do Crime, Aequitas, Editorial Notícias, 1993, págs. 227 e sgt.s) as finalidades da aplicação de uma pena residem primordialmente na tutela dos bens jurídicos e, na medida do possível, na reinserção do agente na comunidade. Neste quadro conceptual, o processo de determinação da pena concreta seguirá a seguinte metodologia: a partir da moldura penal abstrata procurar-se-á encontrar uma sub-moldura para o caso concreto, que terá como limite superior a medida ótima de tutela de bens jurídicos e das expectativas comunitárias e, como limite inferior, o quantum abaixo do qual já não é comunitariamente suportável a fixação da pena sem pôr irremediavelmente em causa a sua função tutelar. Dentro dessa moldura de prevenção atuarão, de seguida, as considerações extraídas das exigências de prevenção especial de socialização. Quanto à culpa, compete-lhe estabelecer o limite inultrapassável da medida da pena a estabelecer;
Por outro lado há ter em atenção que o recurso sobre a medida da pena versa sobre a inobservância dos critérios previstos no artº 71º CP por se ter considerado factos que não ocorreram, ter-se omitido a ponderação de factos que devia considerar, ou existir uma inadequada valoração da culpa e das exigências de prevenção, que revelem quantificação desproporcionada da pena, pelo que se o facto invocado como não ponderado na determinação da medida da pena, foi, na realidade, ponderado, e se é invocada a desproporção da pena sem qualquer esforço de demonstração do alegado, a questão suscitada não pode produzir o efeito pretendido pelo recorrente na sequência da doutrina de Figueiredo Dias, As Consequências Jurídicas do Crime, Coimbra edit, 2005 pág. 197, de que em caso de recurso é possível quanto à medida da pena proceder “ à correcção do procedimento ou das operações de determinação, o desconhecimento pelo tribunal ou a errónea aplicação dos princípios gerais de determinação, a falta de indicação de factores relevantes para aquela, ou, pelo contrário a indicação de factores que devam considerar-se irrelevantes ou inadmissíveis. (…) a questão do limite ou da moldura da culpa estaria plenamente sujeita a revista, assim como a forma de atuação dos fins das penas no quadro da prevenção, mas já não a determinação, dentro daqueles parâmetros, do quantum exacto da pena, para controlo do qual o recurso de revista seria inadequado. Esta última posição é a mais correcta (…). Mas já assim não será, e aquela tradução será controlável (….) se v.g. tiverem sido violadas regra das experiencia ou se a quantificação se revelar de todo desproporcionada” (sublinhado nosso), no que é seguido pelo STJ (ac. 12/4/2007 proc 07P1228 Cons. Carmona da Mota in www.dgsi.pt/jstj) que se expressou do seguinte modo: “Daí que, depois de controladas e julgadas correctas todas as operações de determinação da pena, não reste ao tribunal ad quem, num recurso limitado às correspondentes questões de direito, senão verificar se a quantificação operada nas instâncias, respeitando as respectivas «regras de experiência», se não mostra «de todo desproporcionada».
Como que fazendo uma síntese de tais regras expressas na doutrina e na jurisprudência, o STJ no seu ac. de 16/6/2010 proc. 7/09.2GAADV.E1.S1 Cons. Raul Borges, www.dgsi.pt/jstj decidiu: “VII - Para o efeito de determinação da medida concreta ou fixação do quantum da pena que vai constar da decisão, o juiz serve-se do critério global contido no art. 71.º do CP – preceito que a alteração introduzida pela Lei 59/2007, de 04-09, deixou intocado, como de resto aconteceu com o referido art. 40.º –, estando vinculado aos módulos-critérios da escolha da pena previstos do preceito.
VIII - Observados estes critérios de dosimetria concreta da pena, há uma margem de atuação do julgador dificilmente sindicável, se não mesmo impossível de sindicar.”
Neste âmbito apenas há que ponderar e extrair ilações, que se repercutam na determinação da pena, dos factos provados e não quaisquer outros avançados pelo recorrente, daí que importa assinalar que o que consta do relatório social não constitui facto provado, pois aquele é apenas meio de prova auxiliar do juiz, e por isso sujeito como a demais prova à apreciação do tribunal, e o juízo ou apreciação, que nele se expressa não se sobrepõe à que o tribunal tem de fazer, coligidas todas as provas. Sendo por isso irrelevante que dele consta que “o arguido tem consciência da gravidade e ilicitude dos alegados factos, tendo denotado, em entrevista, habilidade para avaliar a censurabilidade social dos mesmos…”, se para o tribunal fez a sua apreciação “O arguido prestou declarações denotando distanciamento relativamente às consequências da vítima e demonstrando preocupação com a versão que apresentou, não denotando espontaneidade.” e se a 1ª instancia considerou que “teve postura em audiência que «denotou um distanciamento e alheamento quanto à gravidade das consequências da sua conduta, bem como, demonstrou a sua desresponsabilização”. Por outro lado, não deixa de ter antecedentes criminais se os factos porque respondeu (de violência doméstica – nº 44 dos factos provados) ocorreram 10 anos antes de ser julgado, e tem de ser ponderado como critério expresso no artº 71º CP (conduta anterior) e não pode ser cancelado o ato no Registo Criminal por não haver decorrido o prazo legal após o cumprimento da pena.
Todavia, ponderando as razões da pena aplicada ao arguido expressa na 1ª instância e que a Relação parcialmente assumiu, há a constatar que ali foram ponderadas circunstancias que não o podem ser, e deixaram de ser ponderados outras que o deveriam ser.
Na verdade, o ter-se furtado à ação da justiça sendo capturado 5 meses depois, se revela a sua personalidade, não pode em si mesmo ser factor a ponderar negativamente, pois não é imposto ao arguido que se deixe prender seria, apenas, positivo e poderia valorizar-se se o tivesse feito; do mesmo modo o não assumir a sua conduta (vg. confessar o ato) também não pode ser valorado negativamente nessa perspetiva, pois o arguido pode remeter-se ao silêncio sem que isso o desfavoreça, tal como pode prestando declarações faltar à verdade; do mesmo efeito o facto de não mostrar arrependimento; no contexto dos factos a ausência do local da ocorrência, não assume relevo especial face ao estado da vítima e enquadra-se na personalidade do arguido e a ponderar nessa sede.
Estas circunstancias que foram negativamente ponderadas, embora no contexto não assumam relevo especial também não podem ser omitidas pelo que no conjunto dos factos e modo da sua ocorrência, e em face das finalidades da pena e ponderando na sua fixação ainda o modo de vida do arguido no seu contexto social, familiar e laboral e suas implicações, e tendo a pena sido fixada próximo do seu limite máximo, mostra-se mais justa, adequada e proporcional aos factos e à personalidade do arguido que aqueles revelam a sua fixação num valor inferior, em face do que ainda dentro dos parâmetros imposto pela sua culpa e sem por em causa as exigências da prevenção que se fazem sentir, se fixa em treze anos de prisão
Procede por isso o recurso, nesta parte.
- Rejeitar o recurso quanto às questões suscitadas pelo arguido relativas à violação dos princípios in dubio pro reo e livre apreciação da prova e às nulidades relativas à omissão de pronuncia e falta de fundamentação;
- Julgar procedente o recurso quanto às demais questões suscitadas, e em consequência condena o arguido AA, na pena de treze anos de prisão
Sem custas
Registe e notifique
Dn
José A. Vaz Carreto (relator)
Carlos Campos Lobo
Jorge Raposo
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1. No mesmo sentido, o ac.STJ 21/10/2020 no proc. 1551/19.9T9PRT.P1.S1 cons. Manuel Augusto de Matos) e o recente e actualizado ac. STJ 28.02.2024, proc.1044/18.1T9EVR.E1.S1 Cons. Ana Barata de Brito, onde se escreve: “…o recurso de acórdão da Relação que decide em recurso, continua a poder visar apenas o reexame em matéria (exclusivamente) de direito. E os poderes de cognição do Supremo Tribunal de Justiça encontram-se circunscritos a este conhecimento. A alteração legislativa surge, aliás, na linha da jurisprudência do Tribunal Constitucional, tendo ido, até, além dela. Circunscreveu o direito ao recurso a matéria exclusivamente de direito, mas este pode ter como fundamento qualquer questão exclusivamente de direito, que não apenas a da determinação da sanção. Como seja a tipicidade, a ilicitude, a culpa, a escolha e a medida da pena, a indemnização… Do exposto resulta que todas as questões suscitadas no recurso interposto pelo arguido relativas à decisão da matéria de facto excedem os poderes de cognição do Supremo. Supremo que conhece aqui apenas em matéria exclusivamente de direito, sendo o recurso de rejeitar na parte restante. A impossibilidade de conhecimento abrange assim (a) a impugnação da matéria de facto provada respeitante aos factos que realizam o tipo subjectivo, (b) os vícios do art. 410.º, n.º 2, do CPP, (c) a violação do princípio do in dubio pro reo, problematizados sempre por referência à decisão sobre a matéria de facto.”
2. Ac. STJ 15/2/2023 7528/13.0TDLSB.L3.S1www.dgsi.pt Cons. Ana Barata Brito
3. Assim ac. STJ de 28/2/24 cit. e o acórdão do STJ de 11.03.2020 Cons. Nuno Gonçalves
4. - Prof. Cavaleiro Ferreira, Lições de Dto. Penal, I, págs. 184 e 185)
5. ”- Prof. Figueiredo Dias, As Consequências Jurídicas do Crime, 1993, pág. 84,