PRORROGAÇÃO DO PRAZO
PRAZO JUDICIAL
INCONSTITUCIONALIDADE
INDEFERIMENTO
Sumário


I - Conforme estipulado no art.º 141.º n.º 1 do CPC “o prazo processual marcado pela lei, é prorrogável nos casos nela previstos.” Tal quer dizer que, fora dos casos legalmente previstos, e o caso presente não é um deles, está vedado ao juiz alterar os prazos processuais, fixados pela lei.
II - Por isso, não é prorrogável pelo Tribunal o prazo de 10 dias, conferido pelo art.º 655.º do CPC.

Texto Integral

Acordam, em conferência, na 7.ª Secção do Supremo Tribunal de Justiça:


I - RELATÓRIO

JOSÉ MANUEL DA ENCARNAÇÃO NERY na qualidade de cabeça-de-casal da Herança, Recorrente nos presentes autos, tendo sido notificado, nos termos e para os efeitos do disposto no art.º 655.º do CPC, vem requerer a prorrogação de prazo, não inferior a 5 dias, para responder ao despacho.

Invoca, para tanto, a necessidade de “juntar a certidão da contestação da ação n.º 9297/23.7..., por parte da seguradora e da ata de tentativa de conciliação (…)”. Mais alega que “(…) existem outros embargos à mesma execução, neste STJ, do quais também se aguarda certidão e o julgamento de ambos foi conjunto em 1ª Instância, e portanto está em análise uma questão que pode ser útil aos autos, conforme foi assinalado pelo Acórdão da Secção de formação deste STJ”. Invoca ainda que “(…) também deverá ser prorrogado o prazo de 5 dias, pois a Recorrente está a reunir e a analisar Jurisprudência, em contradição com acórdão do Supremo Tribunal de Justiça”.

Foi proferido despacho que indeferiu a requerida prorrogação de prazo, por falta de fundamento legal para tanto.

Inconformado com tal despacho, o Recorrente veio do mesmo reclamar para a conferência concluindo, no essencial, o seguinte:

1 - Essa dimensão normativa artigos 141.º n.º 1, art.º 569.º n.º 5, 655.º e 660.º do CPC, deve ser interpretada em conformidade com o princípio da proporcionalidade imposto pela Constituição da República Portuguesa e não foi cumprido no despacho de 15-11-24, sob reclamação.

2 - Refira-se que tendo presente o disposto nos artigos 138.º n.º1 do Código de Processo Civil e 28.º da Lei n.º 62/2013, de 26/08, o prazo de 10 dias conferido no sobredito despacho de 29-10-24 terminava no dia 14-10-2024, precisamente a data em que foi formulado o pedido de prorrogação plasmado no requerimento com a ref.ª 220833.

3 - O pedido de prorrogação foi decidido em apenas 24 horas, sem o contraditório e sem que o processo, (entrado em juízo no ano de 2008), esteja qualificado como urgente.

4 - Dispõe o art.º 141.º do Código de Processo Civil que o prazo processual marcado pela lei é prorrogável nos casos nela previstos e havendo acordo das partes, o prazo é prorrogável por uma vez e por igual período.

5 - Ainda no mesmo sentido e ainda que a propósito do similar artigo 147.º do CPC na redação anterior à Lei 41/2013, de 26-06, já se havia pronunciado o Sr. Professor Lebre de Freitas ao esclarecer que se manteve “ a livre prorrogabilidade , pelo juiz, dos prazos por ele próprio fixados”.

6 - O despacho prolatado sob a ref.ª ......91 de 15-11-2024, por intermédio do qual foi indeferida a requerida prorrogação de prazo de 5 dias, foi proferido como se se tratasse de processo urgente, pois tem a data de 15-11 ou seja, foi proferido antes da conclusão aberta para 18-11-24, constituindo tal celeridade uma violação do princípio constitucional da proporcionalidade, pois os embargos remontam ao ano de 2008.

7 - As certidões protestadas juntar ainda nem sequer se mostram emitidas, não obstante o prazo legal previsto no CPC.

8 - Ademais, está em causa, como vimos, um processo não urgente com uma livre prorrogabilidade, ao abrigo da gestão processual pelo Supremo Tribunal de prazo fixado no despacho de 29-10-24, uma vez que nos termos do art.º 660.º do CPC, o provimento tem interesse para o recorrente.

9 - Como bem refere o Professor Paulo Pimenta e Desembargador Luis Filipe de Sousa (Código de processo Civil Anotado, Vol.I, Almedina 2019- Reimpressão, pag.167, «[é] prazo processual tanto o marcado pela lei como o fixado pelo juiz. O prazo fixado pelo juiz pode ser prorrogado quando tal se justifique, ao passo que o fixado na lei apenas pode sê-lo quando esta o permita, como sucede nos casos previstos nos artigos 569.º, n.º 4 e 5, 586.º e 942.º n.º 2»

10 - No mesmo sentido se pronuncia o Sr. Professor Marco Carvalho Gonçalves (…)

11 - Nesta medida e acompanhando o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 28-11-2017 (…)

12 - requerimento de prorrogação deu entrada dentro do prazo inicial, pelo que valem aqui os mesmos argumentos utilizados no que diz respeito à prorrogação voluntária do prazo, a respeito da qual voltamos à lição do Sr. Professor Marco Carvalho Gonçalves (ob. Cit. Pp 196-197)

13 - Do preceito enunciado e no caso de vir a ser julgado inconstitucional art.º 141.º n.º1, art.º 569.º n.º5, 655 e 660.º do CPC, o Tribunal pode apresentar na sua decisão em termos de, tanto os destinatários desta, como em geral, os operadores de direito ficarem a saber, sem margem para dúvidas, qual o sentido com que o preceito em causa não deve ser aplicado, por deste modo, violar a Constituição.

14 - Ora, a presente reclamação satisfaz minimamente este requisito pois suscita uma questão de inconstitucionalidade, ao aduzir que qualquer interpretação nos artigos 141.º n.º 1, art.º 569.º n.º 5, 655.º e 660.º do CPC, da qual resulte necessariamente indeferimento de pedido de prorrogação por 5 dias, viola materialmente o disposto nos artigos 13.º e 20.º da CRP.

15 - Pelo que a Herança reclamante, na qualidade de recorrente identificou positivamente o sentido da interpretação normativa que, na procedência do despacho e da reclamação, será julgada inconstitucional.

16 - Donde a Herança recorrente suscita adequadamente, em reclamação para a conferência, uma questão de inconstitucionalidade normativa usada para fundamentar o indeferimento da prorrogação.

II - O DIREITO

Cumpre apreciar:

Nos termos do disposto no art.º 655.º do CPC, o prazo conferido à parte para se pronunciar, é fixado em 10 dias.

Conforme estipulado no art.º 141.º n.º 1 do CPC “o prazo processual marcado pela lei, é prorrogável nos casos nela previstos.”

Tal quer dizer que, fora dos casos legalmente previstos, e o caso presente não é um deles, está vedado ao juiz alterar os prazos processuais, fixados pela lei.

Não é sequer possível equacionar qualquer analogia com o disposto no art.º 569.º n.º 5 do CPC, além do mais, porque faltaria, de todo, o motivo ponderoso que justificasse a prorrogação de prazo.

Com efeito, as razões invocadas não são susceptíveis de configurar esta necessidade.

Não tem, pois, fundamento legal a pretendida prorrogação de prazo.

Ao referir-se nas suas conclusões ao “prazo de 10 dias conferido no sobredito despacho de 29-10-24”, demonstra o equívoco em que incorre o Reclamante na sua argumentação: O prazo de dez dias não foi conferido no despacho, ora em reclamação. Nesse caso, seria um prazo judicial e por isso, prorrogável pelo juiz. O prazo de dez dias não foi fixado pelo Tribunal, é fixado legalmente no art.º 655.º do CPC. Trata-se de um prazo legal e por isso não prorrogável, tal como bem refere a Doutrina citada pelo próprio Reclamante.

É, pois, absolutamente certo que “[é] prazo processual tanto o marcado pela lei como o fixado pelo juiz. O prazo fixado pelo juiz pode ser prorrogado quando tal se justifique, ao passo que o fixado na lei apenas pode sê-lo quando esta o permita,1 como sucede nos casos previstos nos artigos 569.º, n.º 4 e 5, 586.º e 942.º n.º 2»2

Ora, estamos perante um prazo legal, fixado na lei e por isso não é prorrogável. E, por isso, não podia o Tribunal deixar de indeferir a peticionada prorrogação, por ilegal.

Em face do que se acaba de expor, de resto confirmado pelo próprio Reclamante, citando Doutrina em apoio da decisão reclamada, carece de suporte lógico e jurídico a invocação da inconstitucionalidade designadamente do art.º 141.º n.º 1 do CPC.

A existência de prazos processuais e o seu estrito cumprimento, longe de violar os preceitos constitucionais constantes dos artigos 13.º e 20.º da Constituição da República, antes constitui um pressuposto para a realização do preceito constitucional constante do n.º 4 do art.º 20.º da CRP.

Em face do exposto, improcede a reclamação devendo manter-se o despacho reclamado.

III - DECISÃO

Pelas razões expostas, acordamos na 7.ª secção do Supremo Tribunal de Justiça em julgar improcedente a reclamação, mantendo a decisão reclamada de indeferir a prorrogação do prazo previsto no art.º 655.º do CPC.

Custas pelo Reclamante.

Lisboa, 16 de janeiro de 2025

Maria de Deus Correia (relatora)

Oliveira Abreu

Nuno Pinto Oliveira

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1. Sublinhado nosso.

2. Paulo Pimenta e Luis Filipe de Sousa, Código de processo Civil Anotado, Vol.I, Almedina 2019- Reimpressão, pag.167.