CONTRATO DE MEDIAÇÃO IMOBILIÁRIA
OFERTA DE PARTE DA PRESTAÇÃO DEBITÓRIA
MORA DO CREDOR
Sumário


I - O contrato de mediação imobiliária é o contrato pelo qual uma das partes se obriga a conseguir interessado para certo negócio e a aproximar esse interessado da outra parte, contra o pagamento de uma remuneração.
II - Quando o devedor oferece uma parte da prestação e o credor não a aceita, não se verifica a mora accipiendi em relação à parte recusada, mas a mora solvendi em relação a toda a prestação.

Texto Integral


ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES

I - RELATÓRIO

AA, veio interpor contra os réus EMP01... LDA (1ª RÉ), BB (2ª RÉ), CC (3º RÉU), ação de processo comum, pedindo que seja reconhecido o direito de crédito de DD e que sejam Autor e Réus declarados partes legítimas. Mais pede que sejam a 1ª Ré, a 2ª Ré e o 3º Réu condenados a pagar, solidariamente, ao Autor a quantia de € 29.583,56 (vinte e nove mil quinhentos e oitenta e três euros e cinquenta e seis cêntimos) acrescida de juros de mora, à taxa legal em vigor, até efetivo e integral pagamento, e, sejam o 2º Réu e a 3ª Ré declarados responsáveis solidários pelas dividas da 1ª Ré e respondam solidariamente com esta no pagamento da quantia peticionada pelo Autor; caso assim não se proceda, subsidiariamente, seja a 1ª Ré condenada a pagar ao Autor a quantia de € 29.583,56 (vinte e nove mil quinhentos e oitenta e três euros e cinquenta e seis cêntimos) acrescida de juros de mora, à taxa legal em vigor, até efetivo e integral pagamento, e, sejam o 2º Réu e a 3ª Ré declarados responsáveis solidários pelas dividas da 1ª Ré e respondam solidariamente com esta no pagamento da quantia peticionada pelo Autor; caso assim não proceda, subsidiariamente, seja a 2ª Ré condenada a pagar ao Autor a quantia de € 29.583,56 (vinte e nove mil quinhentos e oitenta e três euros e cinquenta e seis cêntimos) acrescida de juros de mora, à taxa legal em vigor, até efetivo e integral pagamento; e, caso assim não proceda, subsidiariamente, seja o 3ª Réu condenado a pagar ao Autor a quantia de € 29.583,56 (vinte e nove mil quinhentos e oitenta e três euros e cinquenta e seis cêntimos) acrescida de juros de mora, à taxa legal em vigor, até efetivo e integral pagamento.
Para tanto alega, em síntese, que é filho de DD, já falecido, e que este, nos últimos anos de vida, por razões de saúde tinha como tutor legal uma instituição francesa. Ainda em vida e sendo comproprietário com a esposa e com EE e FF, decidiram vender o imóvel melhor identificado no ponto 15. da petição, tendo o EE em seu nome e no dos demais comproprietários, contratado os serviços de mediação da sociedade comercial EMP01..., Lda., 1.ª ré. Tendo a venda sido autorizada pelo tribunal competente, tal contrato foi celebrado e foi entregue a EE e FF €50.000,00, a GG (esposa de DD), a quantia de €25.000,00 e os outros €25.000,00 foram pagos por cheque bancário emitido à ordem do 3.º réu (sócio da 1.ª ré), sendo que o DD foi representado naquele ato de compra e venda pela 2.ª ré, através de procuração outorgada para o efeito. Mais alega o autor que só teve conhecimento de que o pagamento fora feito ao 3.º réu, após o falecimento de DD, sendo que aquele não entregou o que recebeu ao seu titular e só após diversas insistências por parte de DD/... é que foi remetido a esta um cheque no valor de €18.850,00, bem como uma fatura de €6.150,00 com indicação de comissão de serviços de mediação. Alega, ainda, que não tendo sido discutida qualquer comissão e tendo sido solicitado à 2.ª ré novo cheque com data válida, à ordem de DD e com o montante de €25.000,00, a 1.ª ré informou de iria proceder ao envio nos termos solicitados, o que não veio a suceder.
Fundamenta, assim, a responsabilidade pelo referido pagamento, relativamente à 1.ª ré no contrato de mediação, em relação à 2.ª ré no contrato de mandato e em relação ao 3.º réu na responsabilidade extracontratual pela prática de um ato ilícito.

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Citados os réus, a ré EMP01..., Lda., defende-se por exceção de ineptidão da petição inicial, falta de personalidade judiciária, ilegitimidade por preterição de litisconsórcio necessário e, também, por impugnação. Assim, defende esta ré que o imóvel em causa apesar de ser sem propriedade horizontal, o rés do chão era independente do andar, ocupando um casal exclusivamente cada um dos andares. Mais alegou que ficou acordado entre a sociedade ré, a ré BB, a GG e a ... que o EE e a mulher FF pagariam à ré sociedade €5.000,00, acrescida de IVA e a ... e GG pagariam, também, a importância de €5.0000,00, acrescida de IVA, sendo que estes valores além dos serviços de mediação também serviam para pagar as obras de beneficiação que eram necessárias executar no imóvel. Segundo a ré a obras foram executadas, angariou um comprador para o imóvel e durante meses trocou documentação e informação com a ... para obter a dita autorização do Tribunal. Posteriormente, a ..., na qualidade de tutora de DD, constituiu procuradora a ré BB para vender o imóvel e no dia ../../2017, esta ré outorgou o contrato de compra e venda, sendo que aquela havia autorizado que os réus recebessem a parte do preço que cabia à instituição para, posteriormente, lhes entregar a diferença (descontando a comissão que assumia integralmente), como o vieram a fazer, mas o cheque não foi descontado.
Por fim, pede a procedência das alegadas exceções e a improcedência da ação.
A ré BB, defende que o autor o que pretende é uma prestação forçada de contas, sendo inexistente a causa de pedir alegada na petição. Pugna, pela ilegitimidade passiva da 2.ª ré e pela ilegitimidade ativa, bem como falta de personalidade judiciária do autor.
Mais alegou que as partes combinaram que o EE e a FF pagariam à ré sociedade os €5.000,00 acrescido de IVA e a ... pagaria a importância de €5.000,00 acrescida de IVA pelos serviços de mediação, pela realização de algumas obras, pelo tempo despendido e pela complexidade de comunicação com a entidade francesa, aceitando esta que lhe fosse restituída o montante da diferença, €18.850,00.
Pugna, por fim, pela procedência das alegadas exceções e pela improcedência da ação.
Por último, contestou o 3.º réu CC, também pugnando pela ineptidão da petição inicial e alegando que a comissão devida à ré sociedade, no valor de €5.000,00, acrescida de IVA, havia sido assumida pela ..., tendo os outros €5.000,00, acrescidos de IVA sido liquidados por EE e FF. Mais alega que a ... autorizou que o preço que cabia a DD fosse recebido pela sociedade mediadora, mas não sendo possível do ponto de vista contabilístico, o cheque veio a ser depositado na conta deste 3.º réu. Tendo o referido montante ficado na disponibilidade da ré sociedade foi esta quem emitiu o cheque a favor da ....
Igualmente, pugna, o 3.º réu pela procedência das exceções e pela improcedência da ação.
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Convidado o autor a sanar o litisconsórcio necessário, o mesmo respondeu ao convite e deduziu incidente de intervenção principal da irmã HH e da sobrinha II.
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Por despacho de 08.09.2022, foi deferido o requerido incidente de intervenção e citadas as chamadas, as mesmas vieram aceitar os articulados deduzidos pelo autor.
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A final foi proferida sentença que condenou a ré EMP01..., Lda. a pagar aos autores/chamados a AA, HH e II, o montante de €25.000,00 (vinte e cinco mil euros), acrescido de juros de mora desde a interpelação (05.04.2019) até integral pagamento, absolvendo os réus BB e CC dos pedidos contra si formulados.
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Inconformada com a sentença veio a ré EMP01..., Lda. recorrer, formulando as seguintes conclusões:
(…)
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Não resulta dos autos a apresentação de contra alegações pelos recorridos.
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Foram colhidos os vistos legais.
Cumpre apreciar e decidir.
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II - DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO

A única questão a apreciar, delimitada pelas conclusões do recurso, é a de saber se a ré está ou não obrigada contratualmente a proceder à entrega da quantia de 25.000,00 € aos autores.
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III – FUNDAMENTAÇÃO

3.1. Os factos
3.2.1. Factos Provados
Na 1ª instância foi dada como provada a seguinte factualidade:
1. DD, nascido a ../../1941, casou com GG e deste matrimónio nasceram três filhos, AA, HH e JJ.
2. DD faleceu em ../../2021, já no estado de viúvo, deixando como herdeiros os filhos AA e HH assim como a sua neta II que sucede no lugar do seu pai JJ já falecido em data anterior à do seu pai.
3. DD, emigrou para ..., país onde residiu e onde também veio a falecer.
4. Nos últimos anos de vida, DD, em razão de diversos problemas de saúde, mormente questões do foro neurológico e psíquico, residiu no ..., ..., ..., e tinha como representante legal a ... (...).
5. Não obstante a maior parte da sua vida pessoal e patrimonial ter tido como palco aquele país, DD tinha, até maio de 2017, registada a seu favor, a par com outros, o prédio urbano, destinado a habitação, sito no lugar de ... da união de freguesias ... e ..., na cidade ..., composto por rés do chão, primeiro andar e logradouro, descrito na conservatória de registo predial ... sob o número ...24 e inscrito na matriz predial urbana com o artigo ...21.
6. A par de DD, também detinham o registo a seu favor do referido imóvel, a sua esposa GG e ainda EE e FF, todos em partes iguais.
7. Em meados de 2017, EE e FF, casados entre si, decidiram vender o dito imóvel, tendo o identificado DD e GG concordado com a venda.
8. Neste sentido, EE e FF, em seu nome e no dos demais comproprietários, contrataram os serviços de mediação da sociedade comercial por quotas EMP01... Lda., que surge como 1ª Ré nos autos.
9. DD/..., tinha conhecimento e aprovava a intervenção da 1ª Ré, na qualidade de mediadora, no dito negócio.
10. Assim como a 1ª Ré sabia que prestava tal serviço aos quatro comproprietários.
11. A referida empresa dedica-se com escopo lucrativo, entre outros, à mediação imobiliária, sendo titular da licença AMI- ...55.
12. Figuram como sócios da EMP01... Lda., BB, 2ª Ré, e CC, 3º Réu.
13. Todos os quatro comproprietários decidiram vender o referido imóvel, à sociedade comercial EMP02..., S.A, pelo preço de € 100 000,00 (cem mil euros), compradora angariada pela ré sociedade.
14. A celebração de tal negócio foi autorizada pelo legal representante de DD, a ..., que por sua vez foi autorizado pelo tribunal competente.
15. O contrato de compra e venda foi celebrado através de documento particular autenticado, nas instalações da 1ª Ré, nos termos exarados, no dia ../../2017, tendo o legal representante de KK, outorgado procuração a favor de BB (2ª Ré), a fim de esta representar aquele no ato da compra e venda.
16. Tal representação ocorreu, exclusivamente, por uma questão logística, a fim de evitar que o legal representante de DD, se deslocasse de ... a Portugal para outorgar a compra e venda.
17. Outorgada a compra e venda, o preço global de €100.000,00 (cem mil euros) foi pago pela sociedade compradora da seguinte forma:
a) Um cheque bancário no montante de €50.000,00 (cinquenta mil euros) entregue a EE e FF;
b) Um cheque bancário, no montante de €25.000,00 (vinte e cinco mil euros), à ordem de GG entregue a LL, que representava a sua tia naquele ato.
c) Um terceiro cheque bancário, no montante de €25.000,00 (vinte e cinco mil euros), emitido à ordem de CC (3º Réu).
18. Certo é que o 3º Réu recebeu €25.000,00 (vinte e cinco mil euros) e não entregou a DD ou ao seu representante legal tal montante.
19. Após diversas insistências por parte de DD/... junto da primeira Ré, para que lhe fosse entregue o valor correspondente à sua parte no negócio (€25.000,00), conforme o combinado entre as partes, só a 26/03/2018, é que a ... recebeu o cheque nº ...31, do Banco 1..., datado de 15/05/2017, no valor de € 18.850,00 (dezoito mil oitocentos e cinquenta euros), emitido à sua ordem, que não foi descontado.
20. A acompanhar o referido cheque foi também recebida a fatura nº ...07, emitida a ../../2018, no valor de €6.150,00 (seis mil cento e cinquenta euros), em cuja descrição se pode ler “comissão de prestação de serviços referente a imóvel, pertencente a DD”.
21. A ... interpelou a 1.º ré, por carta de 05.04.2019, tendo-lhe solicitado que fosse enviado um cheque válido, emitido à ordem de DD, no valor de €25.000,00 (vinte e cinco mil euros), acrescido dos juros.
22. Apesar do imóvel identificado em 5. não ter propriedade horizontal, o rés do chão era independente do andar e um casal ocupava exclusivamente o rés do chão e outro o primeiro andar.
23. Durante meses, os legais representantes da ré trocaram documentação e informação com a ... para esta instituição poder instruir um pedido de autorização ao Tribunal para venda do imóvel.
24. Resulta da decisão francesa que a parte do preço que cabia ao DD, os €25.000,00, deveria ser entregue diretamente à ....
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3.1.2. Factos Não Provados

Inversamente, foram dados como não provadas os seguintes factos:
a) Que a representante legal de DD tivesse também solicitado à sócia da 1.º Ré, um novo cheque com data válida, emitido à ordem de DD, no valor de €25.000,00 e o envio das faturas relativas à comissão cobrada aos demais vendedores.
b) Que a 1ª Ré, na pessoa da 2ª Ré, tenha informado a ... de que iria proceder ao envio de um novo cheque nos termos solicitados ou, em alternativa, realizaria uma transferência bancária.
c) Que o prédio referido em 5. estivesse bastante degradado e fosse necessário, para o colocar em condições de comercialização, executar pequenas obras.
d) Que o processo de venda era complexo, e a ré BB não dominava a língua francesa e, por isso, frequentemente, tinha de pagar a quem lhe traduzisse documentos ou servisse de interprete nas conversações.
e) Que tivesse ficado acordado entre os representantes da ré sociedade, a BB, a GG e a ... que o EE e a mulher FF pagariam à ré sociedade a quantia de €5.000,00 (cinco mil euros), acrescida de IVA e a ... e GG pagariam, também, a importância de €5.000,00 (cinco mil euros), acrescida de IVA.
f) Que estes valores serviam para pagar não apenas os serviços de mediação, mas também as obras de beneficiação executadas no imóvel e as perdas de tempo e despesas acrescidas com facto se ter de lidar com uma instituição estrangeira.
g) Que a ré sociedade tenha executado pequenas obras no prédio supra identificado como, retirou as alcatifas e retificou os soalhos e realizou algumas pinturas em zonas mais degradadas.
h) Que a ... tenha concordado em pagar, sozinha, a comissão devida pelo seu representado e pela esposa GG.
i) Que a ... tenha autorizado os só entregarem a diferença, ou seja, €18.850,00 (o preço recebido deduzido da comissão).
j) Que o EE tenha pago a comissão de €5.000,00, mais IVA.
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3.2. O Direito
3.2.1. Da responsabilidade contratual da ré.
Estão as partes de acordo que a ré EMP01..., Lda atuou a coberto do contrato de mediação imobiliária celebrado com DD (pai e avô dos autores), à datada representado por um tutor (...).
O exercício da atividade de mediação imobiliária encontra-se regulado pela Lei n.º 15/2013 de 08 de fevereiro, que o define como a atividade que consiste na procura, por parte das empresas, em nome dos seus clientes, de destinatários para a realização de negócios que visem a constituição ou aquisição de direitos reais sobre bens imóveis, bem como a permuta, o trespasse ou o arrendamento dos mesmos ou a cessão de posições em contratos que tenham por objeto bens imóveis (artigo 2.º, n.º 1), consubstanciando-se também no desenvolvimento des ações de prospeção e recolha de informações que visem encontrar os bens imóveis pretendidos pelos clientes; promoção dos bens imóveis sobre os quais os clientes pretendam realizar negócios jurídicos, designadamente através da sua divulgação ou publicitação, ou da realização de leilões (artigo 2.º, n.º 2)
Na feliz síntese de VAZ SERRA trata-se de um contrato pelo qual uma das partes se obriga a conseguir interessado para certo negócio e a aproximar esse interessado da outra parte (RLJ, Ano 100º, página 347, 103º, página 222 e 104º, página 155).
Deste contrato, de natureza bilateral e sinalagmático, decorre para o mediador a obrigação de procurar interessado e a aproximá-lo do comitente para a realização do negócio no setor do imobiliário, e para o comitente a obrigação de pagar o preço pelo serviço prestado (remuneração).

Os termos em que é devida a remuneração das sociedades de mediação está especificamente regulamentada, prevendo o artigo 19.º que:
1 - A remuneração da empresa é devida com a conclusão e perfeição do negócio visado pelo exercício da mediação ou, se tiver sido celebrado contrato-promessa e no contrato de mediação imobiliária estiver prevista uma remuneração à empresa nessa fase, é a mesma devida logo que tal celebração ocorra.
2 - É igualmente devida à empresa a remuneração acordada nos casos em que o negócio visado no contrato de mediação tenha sido celebrado em regime de exclusividade e não se concretize por causa imputável ao cliente proprietário ou arrendatário trespassante do bem imóvel.
3 - Quando o cliente for um potencial comprador ou arrendatário, a empresa, desde que tal resulte expressamente do respetivo contrato de mediação imobiliária, pode cobrar quantias a título de adiantamento por conta da remuneração acordada, devendo as mesmas ser devolvidas ao cliente caso o negócio não se concretize.
4 - O direito da empresa à remuneração cujo pagamento caiba ao cliente proprietário de imóvel objeto de contrato de mediação não é afastado pelo exercício de direito legal de preferência sobre o dito imóvel.
5 - O disposto nos números anteriores aplica-se apenas a contratos sujeitos à lei portuguesa.
Não resulta do quadro fático apurado qual a comissão acordada e se o pagamento da remuneração cabia a todos os contraentes ou apenas àquele que recorreu aos seus serviços.
O que se demonstrou é que ré sociedade comprometeu-se a entregar a DD, representado pela ..., o valor correspondente à parte que cabia a este no negócio.
Os restantes comproprietários, no dia em que a compra e venda se realizou, receberam na íntegra o preço pago pelo comprador (25.000,00 €).
Ao DD a ré remeteu apenas um cheque no montante de €18.850,00.
Argumenta a ré que a tutora concordou que pagaria, sozinha, a comissão devida pelo seu tutelado e pela esposa no valor 5.000,00€, mais IVA, num total de 6.150,00€ e que autorizou que a ré recebesse a parte do preço que cabia à instituição para, posteriormente, lhe ser entregue a diferença, isto é, 18.850,00€– artigos 40 e 41 da contestação.
Ora, esta versão dos factos não resultou provada.
Ao invés, o credor não aceitou este pagamento parcial, exigindo a sua totalidade.
Assiste-lhe esse direito.
Decorre da lei que a prestação deve ser realizada integralmente e não por partes, exceto se outro for o regime convencionado ou imposto por lei ou pelos usos - artigo 763.º, nº 1 do Código Civil.
Quando o devedor oferece uma parte da prestação e o credor não a aceita, não se verifica a mora accipiendi em relação à parte recusada, mas a mora solvendi em relação a toda a prestação – neste sentido Galvão Telles, Direito das Obrigações, 3ª edição, pág. 255.
Apresenta-se, assim, legitima a recusa por parte da ..., que era quem à data representava DD, em receber apenas parte do valor devido.
Por último, falece o argumento da recorrente no sentido de que a sua obrigação é para com a ... e não para com os autores, pois que com o falecimento do representado extinguiu-se a tutela.
Donde, bem andou a sentença recorrida ao considerar que a ré EMP01..., Lda. é a responsável (como aliás resulta assumido ao ter sido tal sociedade a remeter o cheque para pagamento parcial do montante em dívida) pelo pagamento do montante devido a DD pela venda da sua parte no imóvel em causa, valor que não tendo sido entregue a este em vida é agora devido aos seus herdeiros.
Nestes termos, a apelação terá de improceder.
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IV - DECISÃO

Pelo exposto, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar improcedente o recurso, confirmando a sentença recorrida.
Custas pela Recorrente.
Guimarães, 9 de Janeiro de 2025

Assinado digitalmente por:
Rel. – Des. Conceição Sampaio
1º Adj. - Des. Anizabel Sousa Pereira
2º Adj. - Des. Elisabete Coelho de Moura Alves