I - O incidente de oposição à penhora cinge-se à impugnação do acto de penhora e tem de ter por base os fundamentos enunciados no n.º 1 do artigo 784º do Código de Processo Civil.
II - A alínea a) do n.º 1 do referido artigo 784º abrange os casos em que tenham sido penhorados bens ou direitos cujo valor exceda o da quantia exequenda e demais custas da execução, em violação do princípio da proporcionalidade, previsto nos artigos 735º, n.º 3 e 751º nº3, ambos do Código de Processo Civil.
III - Querendo-se, com a oposição à penhora, pedir a substituição do bem ou direito penhorado, tem o executado de fazer requerimento autónomo nesse sentido, dirigido ao Sr. agente de execução, o qual, remete-o conjuntamente com aquela oposição ao juiz para decisão – art.751.º, n.º5, al.a) e 6º do CPC.
Recorrentes - AA.
Recorrido - BB, CC, DD, EE, FF, GG, HH, II e JJ
Acordam no Tribunal da Relação do Porto:
I – Relatório
Nos presentes autos em que são exequentes BB, CC, DD, EE, FF, GG, HH, II e JJ e executado AA foi indicado à penhora 1/10 da propriedade no imóvel melhor descrito no anexo com indicação de bens à penhora propriedade do executado.
Concretizada a penhora e perante ela insurgiu-se o executado por meio de incidente à oposição à penhora, pedindo a final o seu levantamento e com substituição por outra que incida sobre a sua quota-parte na conta bancária no Banco 1... que, com outros, é titular, conta essa de natureza mista e cujo saldo, à data de 4 de julho de 2024, era € 693.143,15.
Alega para o efeito que:
- a penhora da sua quota parte no imóvel referido, de que é, com os exequentes, comproprietário em partes iguais, na proporção de 1/10 (um décimo), ocorreu em incumprimento do disposto no art. 751º, nº 1, do Código de Processo Civil;
- detém, em co-titularidade com os exequente, contas bancárias cuja quota parte que lhe cabe se mostra suficiente pata liquidação da quantia exequenda.
Desta decisão recorreu o executado, pedindo:
Nestes termos, e nos demais de direito que V. Exas. doutamente suprirão, deve o presente recurso ser julgado procedente e, em consequência, ser a Sentença recorrida revogada e substituída por outra que decida nos termos supra apontados. Assim se fazendo a costumada JUSTIÇA!
Conclui nos seguintes termos:
A. No âmbito do processo principal de execução de sentença para pagamento de quantia certa (Processo n.º 1380/24.8T8MAI), foi o Opoente notificado da penhora de 1/10 (um décimo) do imóvel descrito na Conservatória do Registo Predial de Vila do Conde com o número ...50, inscrito na matriz sob o artigo ...27 da freguesia e concelho ..., constituído por prédio de habitação, composto de R/CH e 1.º andar com anexos, com o valor patrimonial de €484.063,65 (quatrocentos e oitenta e quatro mil e sessenta e três euros e sessenta e cinco cêntimos).
B. O Opoente apresentou, perante o Tribunal a quo, oposição à referida penhora, requerendo o levantamento da penhora ordenada e a sua substituição pela penhora da sua quota-parte na conta no Banco 1... com o n.º ...63, co-titulada pelas partes processuais (irmãos entre si) e pela herança do Pai, KK, na proporção de 1/11 (um onze avos) para cada um dos respetivos titulares.
C. A referida conta bancária continha, à data de 4 de julho de 2024, um saldo disponível de €192.508,68 e uma carteira de títulos no valor de €493.602,72, totalizando €693.143,15, correspondendo a quota-parte do Opoente a 1/11 do respetivo saldo (€ 63.013,01), acrescida dos direitos sucessórios de 1/11 pertencente à referida herança do Pai (portanto, 1/10 de 1/11).
D. Para ficar claro (porque cremos, salvo o devido respeito, que o Tribunal a quo laborou em equívoco a este respeito), o Opoente requereu a substituição da penhora de 1/10 do imóvel pela penhora de 1/11 da referida conta bancária, que lhe pertencem a título individual (isto é, não pertence ao património hereditário, sendo um direito autónomo deste, não se encontrando em comum e sem determinação de parte ou direito como se de um bem da herança se tratasse).
E. O presente recurso tem por objeto a proferida a 3 de outubro de 2024, por via da qual o Tribunal a quo indeferiu liminarmente a oposição à penhora apresentada pelo Opoente, considerando, em síntese, que este não logrou invocar fundamentos legais adequados, conforme previsto no n.º 1 do artigo 784.º do Código de Processo Civil, e que a Sra. Agente de Execução atuou corretamente ao penhorar o direito do Opoente sobre a quota-parte do imóvel, conforme indicado pelos Exequentes, acrescentando que a conta bancária indicada pelo Opoente como alternativa àquele não seria idónea por se tratar de um direito sucessório ainda não consolidado
F. O que, salvo o devido respeito, não se poderá conceber, atendendo ao facto de a situação da conta bancária ser equivalente à do imóvel penhorado, na medida em que, em ambos os casos, o Opoente detém um direito de propriedade pleno sobre uma quota-parte, seja no saldo bancário, seja no imóvel.
G. A decisão recorrida incorreu, assim, em erro de julgamento ao desconsiderar o princípio da proporcionalidade e adequação, conforme previstos nos n.os 1 e 2 do artigo 751.º do Código do Processo Civil, e, consequentemente, ao não ponderar meios menos gravosos e igualmente eficazes para a satisfação do crédito dos Exequentes.
H. Incorreu igualmente em erro ao interpretar de forma restritiva o n.º 2 do artigo 751.º do referido Diploma, tendo considerado, sem razão para tanto, que a indicação pelos Exequentes do bem a penhorar estaria isenta das exceções previstas na segunda parte do dispositivo legal em questão.
I. Interpretou também erradamente a natureza da quota-parte do Opoente na referida conta bancária, qualificando-a como um direito sucessório, o que não corresponde à realidade.
J. Ora, resulta dos n.os 1 e 3 do artigo 751.º do Código do Processo Civil que a penhora deve iniciar-se por bens de mais fácil realização e só recair sobre imóveis quando se presume que outros bens não permitirão satisfazer integralmente o crédito no prazo estipulado.
K. Neste sentido, a quota-parte do saldo bancário do Opoente – sendo um bem móvel e de valor efetivo – apresenta-se como uma opção preferível para a satisfação do crédito dos Exequentes, justamente por constituir um meio de realização mais célere e menos lesivo para o património do Executado, em plena consonância com o princípio da proporcionalidade e da adequação.
L. Acresce que o Tribunal a quo interpretou erradamente a natureza da quota-parte do Opoente na referida conta bancária, atribuindo a mesma natureza jurídica ao 1/11 que lhe pertence e ao 1/11 que, no mesmo bem, pertence à herança do seu Pai, equivocando-se ao afirmar na Decisão recorrida que que o direito sobre a conta bancária em questão representaria apenas “uma expectativa de aquisição de um direito sucessório” ou uma mera “expectativa de aquisição”.
M. Por outro lado, é evidente que competia à Sra. Agente de Execução, antes de satisfazer a pretensão dos Exequentes, realizar as diligências necessárias para identificar e avaliar outros bens do Opoente suscetíveis de serem penhorados e de satisfazer o crédito exequendo de forma mais expedida e menos onerosa, nomeadamente a referida conta bancária no Banco 1..., sendo a quota-parte do Opoente, no valor de €63.013,01, manifestamente suficiente para a satisfação da quantia exequenda de €22.101,19 e despesas prováveis no valor de €2.210,12, pelo que também incorreu o Tribunal a quo em erro de julgamento ao concluir que a atuação da Sra. Agente de Execução foi conforme às normas legais aplicáveis.
N. Perante todo o exposto, resulta claro que o Tribunal a quo incorreu em erro ao concluir que o Opoente não alegou “qualquer facto susceptível de integrar qualquer dos fundamentos a que alude o nº 1, do art. 784º, do Código de Processo Civil”, uma vez que todo o contexto factual e de direito invocado consubstancia, sem margem para dúvidas, o fundamento de oposição à penhora previsto na segunda parte da alínea a), do n.º 1 do artigo 784.º do Código do Processo Civil.
O. Termos em que, deverá a Sentença recorrida ser revogada e substituída por outra que julgue totalmente procedente a oposição à penhora deduzida pelo Opoente e, consequentemente, determine o levantamento da penhora que recaiu sobre o imóvel.
Deste requerimento releva o facto de não ser colocado em causa que o executado é co-titular da conta referida, nada se referindo que aponte que a mesma corresponda a bem da herança indivisa do pai das partes como se afirmou na decisão recorrida.
II.- Das questões a decidir
O âmbito dos recursos, tal como resulta das disposições conjugadas dos arts. 635.º, n.º 4, 639.º, n.ºs 1 e 2 e 641.º, n.º 2, al. b) do Código de Processo Civil (doravante, CPC), é delimitado pelas conclusões das alegações do recorrente[1].
Isto, com ressalva das questões de conhecimento oficioso que ainda não tenham sido conhecidas com trânsito em julgado ou das que se prendem com a qualificação jurídica dos factos (cfr., a este propósito, o disposto nos arts. 608.º, n.º 2, 663.º, n.º 2 e 5.º, n.º 3 do CPC).
Neste pressuposto, a questão que, neste recurso, importa apreciar e decidir é a seguinte:
- estava o Sr. Juiz do tribunal a quo em condições de, liminarmente, indeferir o requerimento de oposição à penhora, requerendo o levantamento da penhora sobre a quota-parte de imóvel de que é o executado, com os exequentes, comproprietário, e ante a alegação da existencia de conta bancária de que o executado é co-titular, também com aqueles?
III. Da fundamentação
III.I. FACTUALIDADE JULGADA
O tribunal a quo julgou apoiou-se na seguinte factualidade:
a) A execução de sentença para pagamento de quantia certa de que a presente oposição à penhora é apenso, deu entrada no dia 27 de Fevereiro de 2024, para cobrança da quantia exequenda no valor de € 22.101,19 (vinte e dois mil e cento e um euros e dezanove cêntimos), a que acrescem juros de mora vincendos e juros compulsórios (cfr. requerimento executivo);
b) Os exequentes, no anexo de indicação de bens à penhora, indicaram à penhora o direito a 1/10 indiviso do prédio composto por casa de rés-do-chão e andar, com a área coberta de 260 m2, dependência com 180 m2 e logradouro, descrito na Conservatória do Registo Predial de Vila do Conde sob o nº ...50, inscrito na matriz sob o artigo ...27 (cfr. anexo)
c) Nos autos principais, a Sr.ª Agente de Execução lavrou o auto de penhora datado de 8 de Maio de 2024, referente a “1/10 de imóvel descrito na CRP de Vila do Conde com o nº ...50, com o artigo matricial nº ...27 da freguesia ..., Concelho .... prédio de habitação composto de r/CH e 1º andar com anexos com o VP atual (CIMI) 484.063,65Euros”, pertencente ao executado oponente, para garantia da quantia exequenda no valor de € 22.101,19 (vinte e dois mil e cento e um euros e dezanove cêntimos) e despesas prováveis no valor de € 2.210,12 (dois mil e duzentos e dez euros e doze cêntimos) (cfr. auto de penhora)
III.II.- Do objeto do recurso.
Insurge-se o recorrente contra o facto de, na sua óptica, o tribunal a quo, ao ter indeferido liminarmente o seu requerimento inicial de oposição à penhora, incorreu em erro de julgamento.
Alega que foi desconsiderado o princípio da adequação e proporcionalidade previstos no art.751.º, nº1 e 2, do CPC, nomeadamente por se ter partido do errado pressuposto quanto à natureza do seu direito na conta bancária que indicou dever ser penhorada em substituição da sua quota na compropriedade do imóvel penhorado.
Vejamos, tendo presente que, efectivamente, o recorrente indicou, apenas na oposição à penhora, que era titular de quota-parte na conta no Banco 1... com o n.º ...63, conta co-titulada pelas partes processuais (irmãos entre si) e pela herança do Pai, KK, na proporção de 1/11 (um onze avos) para cada um dos respetivos titulares[2].
A regra basilar relativamente à garantia geral do cumprimento das obrigações é a de que por esse cumprimento responde o património do devedor, integrado pelos bens que sejam susceptíveis de penhora (artº 601º do CC).
Por isso, o art.º 735.º, nº1 do C.P.C. dispõe que estão sujeitos à execução todos os bens do devedor susceptíveis de penhora que, nos termos da lei substantiva, respondem pela dívida exequenda.
O meio de reação à penhora que se considera desproporcional por excessiva ante ao necessário para pagamento da quantia exequenda e custas é a oposição prevista no art.784.º e 785.º do CPC
Dispõe o art.784.º nº1 do CPC que sendo penhorados bens pertencentes ao executado, pode este opor-se à penhora com alguns dos seguintes fundamentos:
a) - Inadmissibilidade da penhora dos bens concretamente apreendidos ou da extensão com que ela foi realizada;
b) - Imediata penhora de bens que só subsidiariamente respondam pela dívida exequenda;
c) - Incidência da penhora sobre bens que, não respondendo, nos termos do direito substantivo, pela dívida exequenda, não deviam ter sido atingidos pela diligência.
A propósito deste normativo refere o Professor Lebre Freitas (e outros) que «… as alíneas a) e c) do n.º1 visam cobrir todos os casos de bens impenhoráveis por razões independentes da sua titularidade. Mas, enquanto a alínea c) se reporta às causas de impenhorabilidade, específica ou derivada dum regime de indisponibilidade objectiva, resultante do direito substantivo (…), a alínea a) visa as causas de impenhorabilidade absoluta e total, relativa ou parcial (artº736 a 739), bem como os casos de violação do princípio da proporcionalidade (ars. 735-3 e 751, n.ºs 1 e 3) ou das regras sobre o reforço ou substituição da penhora (art.751-5, als.b) a e).»[3]/[4]/[5]
É, pois, clara a idoneidade do incidente em causa para reagir a penhora de «bem», seu objecto, que se entenda violar o disposto nos arts. 735.º n.º3, 751.º nº1 e 3 do CPC, ou seja, o princípio da proporcionalidade[6], outrossim, no quadro da mesma, não como seu fundamento, mas a substanciar a pretensão do levantamento da penhora com base em fundamento tipificado no art.784.º n.º1[7] do CPC, a indicação do que, no lugar do que daquela foi objecto, deva ser penhorado[8].
De facto, a razão de ser da reacção do executado em ver levantada a penhora da quota parte da propriedade que lhe assiste no imóvel identificado nos autos tem que ver com a violação dos princípios da proporcionalidade[9] e adequação[10] previsto nos citados arts. 735.º nº3, 751.º nº1 e 3 do CPC (conclusão G, J e K), princípios estes entendidos por violados por existir, no acervo patrimonial do executado, bens susceptíveis de execução de mais fácil penhora – artº751.º, nº1, do CPC
É afirmado na decisão em crise «que, para além de o pedido de substituição de penhora a que alude o art. 751º, nº 5, a) e 6, do Código de Processo Civil, não constituir fundamento de oposição à penhora, o executado nem sequer indicou à penhora quaisquer bens de sua propriedade livres e desembaraçados, mas apenas uma expectativa de aquisição de um direito sucessório ainda não partilhado.»
E se tal se afirmou, no que na primeira parte se refere, afirmou-se, com rigor.
De facto, a substituição do que penhorado está, indicando-se «bem substituto» para o efeito, não é fundamento legal tipificado da oposição à penhora, como já se referiu.
Veja-se que da supra citação do extrato de lição de Lebre Freitas se encontra omitida, como fundamento da oposição à penhora, propositadamente, dizemos nós, a referência à al.a) do art.751-5, ou seja, que a oposição à penhora sirva para quando o executado requeira ao AE, no prazo daquela oposição, a substituição dos bens penhorados por outros que igualmente assegurem os fins da execução (…), apenas se referindo às als.b) a e).
Pode, não obstante, como também se referiu, surgir tal alegação a substanciar a pretensão do levantamento da penhora por violação da proporcionalidade e adequação no quadro da oposição à penhora: alegar-se-á então que existem outros bens mais adequados à penhora e que são proporcionalmente os necessários à liquidação da quantia exequenda e custas prováveis – art. 735.º, nº3 e 751.º nº1 do CPC.
Todavia, havendo oposição à penhora com o fundamento atrás referido, assim também se pretendendo a substituição do que penhorado se encontra, sem prejuízo da sua alegação no incidente em apreciação, que entendemos de boa prática, teria o executado de, necessariamente, em requerimento autónomo dirigido ao Sr. AE, requerer a substituição desejada, tudo como decorre do art. 751.º, nº5, al.a), do CPC.[11]
A substituição da penhora é, pois, e em princípio, matéria cuja decisão é da competência exclusiva do Sr. AE.
Contra a decisão do agente de execução que indeferisse a substituição dos bens penhorados por outros, por ter havido oposição do exequente, poderia o executado, então, reagir através de requerimento dirigido ao Juiz, em que impugnasse/reclamasse de tal decisão, nos termos previstos no art.723 nº 1, aI. c), do CPC.
Mas havendo fundamento para dedução de oposição à penhora, deduzida a mesma, tal requerimento teria de ser submetido, conjuntamente com a oposição à penhora ao Juiz, tudo como decorrer do nº6 do art. 751.º do CPC[12].
Esta disposição legal regula aquelas situações em que o executado, para além do referido pedido de substituição dos bens penhorados, também deduz oposição à penhora.
Nesse caso o AE limita-se a remeter ao Juiz o requerimento e a oposição à penhora, cabendo a este a decisão das duas questões[13].
Refere Lebre Freitas (e outros) que «[t]rata o n.º 5 dos casos em que, depois da penhora, é possível penhorar novos bens ou substituí-los. Constituem puros casos de substituição os da al.a) (substituição a requerimento do executado, no prazo da oposição à penhora (..)»
(…)
A alínea a), bem como o n.º6 (despacho pelo juiz, quando haja oposição à penhora), têm aplicação, quer quando, como é regra, o executado é citado antes da penhora (art.726-6), quer quando é dispensada a sua citação prévia (art.727). (…). Em qualquer dos casos, inicia-se (com a citação ou a notificação) o prazo para ele se opor à penhora (art.785-1 e 856-1). Nesse, prazo pode o executado requerer a substituição dos bens penhorados por outros que, pelos critérios do n.ºs 1, 2 e 3, igualmente assegurem os fins da execução; se o exequente, notificado do requerimento do executado, se opuser à substituição, esta não terá lugar; mas, havendo oposição à penhora. Nos termos do art.784, o processo é concluso ao juiz, a quem caberá decidir sobre a substituição dos bens penhorados por outros (…)»[14]/[15]
No caso em apreço o executado não conformou aquele requerimento dirigido ao Sr. AE, ao invés, fê-lo conjuntamente e no texto da oposição à execução[16].
Não o tendo feito nos termos formais exigidos não o pode fazer na oposição à penhora.
Se não o pode fazer neste incidente, ficou o tribunal a quo sem base para, a constatar-se efectivamente como gravosa a penhora por ultrapassar àquilo que se mostra necessário para à satisfação do crédito exequendo e das custas, determinar a consequente substituição, facto que por si só legitimaria a manutenção do que penhorado foi.
Eliminando-se a benefício do executado uma penhora «gravosa», ficaria os exequentes sem garantia concretizada do respectivo crédito.
Dizer ainda o seguinte porque, de todo o modo, não se considera violado o princípio da proporcionalidade.
O Sr. AE está, em regra, vinculado às indicações do exequente, a menos que estas violem norma legal imperativa, ofendam o referido princípio da proporcionalidade da penhora ou infrinjam manifestamente o princípio da adequação – art.751.º nº2 do CPC[17].
Dizer também que deve o Sr. AE no critério dos bens a penhorar seguir o critério definido pelo nº 1 do citado artº751.º do CPC, ou seja, penhorar bens cujo valor pecuniário seja de mais fácil realização, coisa que em regra ocorre com os depósitos bancários – princípio da economia. [18]
Não obstante pode penhorar-se imóvel que não habitação própria e permanente do executado ou estabelecimento comercial ainda que não se adequem por excesso ao montante do crédito exequendo nos termos previstos no nº 3 desse preceito, ou seja, desde que a penhora de outros bens presumivelmente não permita a satisfação integral do credor no prazo de seis meses.
No caso não está penhorado qualquer bem imóvel, mas sim um direito correspondente a 1/10 da propriedade do prédio identificado nos factos suportes da decisão recorrida, e que se avaliou 48.406,36 € – Cf. auto penhora
De todo o modo, ainda que estivesse, seria a penhora legal por observar o que dispõe o n.º3 do art.751.º do CPC.
É que pelo teor da contestação à oposição, já se percebe que haverá dissenso[19] quanto à titularidade pelo executado de quota parte de quantia depositada na conta bancaria no Banco 1... com o n.º ...63 (fala-se em 1/10) [20]/[21], o que, com toda a certeza, não permitiria aos exequentes a satisfação integral do respectivo crédito no prazo de seis meses, facto este que sempre justificaria a penhora de imóveis (o que de facto não ocorreu, apenas a quota parte do executado em imóvel em compropriedade).
O tribunal recorrido proferiu despacho de indeferimento liminar ao abrigo do disposto no art. 732º, nº 1 c) ex vi art. 785º nº 2 in fine, do CPC, por ter entendido que o pedido era manifestamente improcedente, decisão esta que corresponde a um julgamento antecipado do mérito da causa justificado por ser evidente a inutilidade de qualquer instrução ou discussão posterior[22].
Pelo exposto, entendendo-se que o fez correctamente, impõe-se na manutenção da decisão recorrida.
IV. Decisão
Pelo exposto, acorda-se neste Tribunal da Relação do Porto em julgar totalmente improcedente o recurso, assim se confirmando a decisão.
Custas pelo recorrente sem prejuízo do apoio judiciário que lhe assista.
Sumário:
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Porto, 9/1/2025.
Carlos Cunha Rodrigues Carvalho
João Venade
António Paulo Vasconcelos
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[1] Cfr. a citação da doutrina a propósito no Ac. do STJ de 6.6.2018 proc. 4691/16.2T8LSB.L1.S1: (a) António Santos Abrantes Geraldes - «[a]s conclusões exercem ainda a importante função de delimitação do objeto do recurso, como clara e inequivocamente resulta do artigo 635º, n.º 3, do CPC. Conforme ocorre com o pedido formulado na petição inicial, as conclusões do recurso devem corresponder à identificação clara e rigorosa daquilo que se pretende obter do tribunal Superior, em contraposição com aquilo que foi decidido pelo Tribunal a quo.» - in Recursos no Novo Código de Processo Civil, 2017 – 4ª edição, Almedina, página 147. / (b) Fenando Amâncio Ferreira - «[n]o momento de elaborar as conclusões da alegação pode o recorrente confrontar-se com a impossibilidade de atacar algumas das decisões desfavoráveis. Tal verificar-se-á em dois casos; por preclusão ocorrida aquando da apresentação do requerimento de interposição do recurso, ou por preclusão derivada da omissão de referência no corpo da alegação. Se o recorrente, ao explanar os fundamentos da sua alegação, defender que determinada decisão deve ser revogada ou alterada, mas nas conclusões omitir a referência a essa decisão, o objeto do recurso deve considerar-se restringido ao que estiver incluído nas conclusões.» - in Manual dos Recursos em Processo Civil, Almedina, 2000, página 108 / (c) José Augusto Pais do Amaral - «[o] recorrente que tenha restringido o âmbito do recurso no requerimento de interposição, pode ainda fazer maior restrição nas conclusões da alegação. Basta que não inclua nas conclusões da alegação do recurso alguma ou algumas questões, visto que o Tribunal ad quem só conhecerá das que constem dessas conclusões.» - Direito Processual Civil, 2013, 11ª edição, Almedina, páginas 417/41
[2] Alegou que a referida conta bancária continha, à data de 4 de julho de 2024, um saldo disponível de €192.508,68 e uma carteira de títulos no valor de €493.602,72, totalizando €693.143,15, correspondendo a quota-parte do Opoente a 1/11 do respetivo saldo (€ 63.013,01), acrescida dos direitos sucessórios de 1/11 pertencente à referida herança do Pai (portanto, 1/10 de 1/11).
[3] José Lebre Freitas, Armindo Ribeiro Mendes, Isabel Alexandre, CPC anotado, V.3, 3º Ed., pag.671.
[4] Assim também Rui Pinto, in A Acção Executiva, 2023, AAFDL, p.540 - «uma penhora desproporcional pode ser impugnada pelo executado em incidente de oposição à penhora (cfr. art. 784º nº1 al.a)»; 678 - «O primeiro fundamento (al.a)) é o da admissibilidade da penhora dos bens concretamente apreendidos ou da extensão com que ela é realizada. Está, por conseguinte, a alegar-se que a penhora foi consumada em violação das normas que fixam: a.(…); b. princípio da proporcionalidade, em geral, ou concretizado pelo gradus executionis do art.751ºnº3,»
[5] Vide igualmente Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Sousa, CPC anotado, V.II, 2º Ed., p.181: «Nos termos da parte final da al.a), também constitui fundamento de oposição à penhora o facto de terem sido penhorados bens ou direitos cujo valor exceda o da quantia exquenda e custas da execução, em violação do princípio d proporcionalidade.»
[6] O n.º 3 do artigo 751º é uma manifestação desse princípio da proporcionalidade ao prever uma “moratória provisória ou gradus executionis temporal na penhora de imóveis ou de estabelecimento comercial” – cf. Rui Pinto, Código de Processo Civil Anotado, Volume II, p. 584): “[A]inda que não se adeque, por excesso, ao montante do crédito exequendo, é admissível a penhora de bens imóveis que não sejam a habitação própria permanente do executado, ou de estabelecimento comercial, desde que a penhora de outros bens presumivelmente não permita a satisfação integral do credor no prazo de seis meses”.
[7] Concretamente na al.a) do artº784 do CPC.
[8] Já veremos infra em que termos entendemos dever ser operado.
[9] «Este princípio, também designado por princípio da suficiência, tem natureza constitucional no direito da propriedade privada (cf. Artigo 62º CRP) que torna excecional qualquer oneração ou perda forçada das situações jurídicas ativas privadas. Na jurisprudência, tem-se defendido que a «natureza gravosa da penhora limita-se àquilo que seja necessário para a satisfação do crédito exequente e das custas» - Rui Pito, op. cit., p.536
[10] «É dentro do teto dado pela proporcionalidade que o agente de execução deverá procurar penhorar os bens que apresentam maior probabilidade de realizarem uma quantia pecuniária em menor tempo, cumprindo um princípio de adequação do objeto da penhora à realização do direito à execução.»- Rui Pito, op. cit., p.538
[11] «A penhora pode ser reforçada ou substituída pelo agente de execução nos seguintes casos: a)Quando o executado requeira ao agente de execução, no prazo da oposição à penhora, a substituição dos bens penhorados por outros que igualmente assegurem os fins da execução, desde que a isso não se oponha o exequente.»
[12] «Nos casos previstos na al.a) do número anterior em que se verifique oposição à penhora, o agente de execução remete o requerimento e a oposição aos juiz, para decisão».
[13] Virgínio da Costa Ribeiro e Sérgio Rebelo, in " A Acção Executiva Anotada e Comentada, 2ªed., p. 317.
[14] Op. cit., pag.563
[15] Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Sousa, CPC anotado, V.II, 2º Ed., p.137: «No prazo da oposição à penhora (art.785.º, n.º1) o executado pode requerer ao agente de execução a substituição dos bens penhorados por outros que igualmente assegurem os fins da execução, desde que seja obtido o acordo do exequente (ala)). Se o executado cumular tal pedido coma própria oposição à penhora, o requerimento é remetido ao juiz para decisão nº6).»
[16] Violando o que de harmonia com o disposto no art. 751.º, n.º5, a) do CPC deveria ter sido respeitado, tal procedimento sempre corresponderia a irregularidade que, afectando o exame da causa, nos termos do art.195.º nº1 do CPC assumiria foros de nulidade.
[17] Vide Rui Pinto, in op. cit. p.539, considerando que a indicação a que se refere o nº2 do art.751.º é uma verdadeira nomeação de bens à penhora, e que (sem prejuízo do que se refere na 2ª parte desse nº) será nula a penhora feita em desrespeito a ela nos termos do artº195.º nº1 e por ofensa do principio dos dispositivo.
[18] As indicações do exequente devem, em princípio, ser respeitada, «(…) excepto se as mesmas violarem norma legal imperativa (cf., por exemplo art. 752.º, nº1; cf. art.697.º, 665.º, 678.º e 753.º CC), ofenderem o princípio da proporcionalidade (artº753.º nº3) ou infringirem manifestamente o princípio da economia a penhora (art.751.º, nº1)» - João Castro Mendes / Miguel Teixeira Sousa, Manual Processo Civil, VII, AAFDL Editora, pag.713
[19] O que, por os co-titulares da conta bancária serem os exequentes e executado, já seria desde logo expectável.
[20] Vide ar. 780.º n.º5 do CPC.
A lei apenas faz presumir, quer a conta bancaria seja plural solidária, que seja plural conjunta, a comparticipação no crédito (perante o banco) em iguais montantes – cfr. J.P. Remédio Marques, A Penhora e a Reforma do Processo Civil. Em especial a penhora de depósitos bancários e do estabelecimento. Lex.2000, p.87.
[21] O tribunal a quo equivocou-se ao considerar que se tratava de património de herança do pais das partes – KK. O que será da herança naquela conta é apenas 1/11. Todavia isto só surge claro nas alegações de recurso, assim se confirmando na contestação à oposição – cfr. art.14º
[22] O indeferimento só é possível, nas palavras do Ac. do S.T.J. de 05/03/1987, in B.M.J. 365°, p. 562, "quando a pretensão não tiver quem a defenda, nos tribunais, ou na doutrina, isto é, quando for evidente que a tese do autor não tem condições para vingar nos tribunais.