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REVELIA
EFEITO COMINATÓRIO
FUNDAMENTAÇÃO SUMÁRIA DA SENTENÇA
EXAME DO PROCESSO PELAS PARTES
Sumário
I - A consagração de um efeito cominatório semipleno na revelia operante não dispensa o juiz de elencar os factos alegados pelo autor que considera confessados (cf. artigo 607.º, nº 3 do CPCivil). II - Se o juiz não discriminou os factos provados por força da confissão tendo-se limitado a consignar: “consideram-se confessados os factos alegados pelo embargante”, a sentença é totalmente omissa quanto à fundamentação de facto e, consequentemente, é nula porque não especifica os fundamentos de facto que justificam a decisão [cf. artigo 615.º, nº 1 al. b) do CPCivil]. III - O uso da factie sepcies do citado nº 3 do artigo 567.º do CPCivil (fundamentação sumária) não pode ser automática, a causa há de revestir-se de manifesta simplicidade. IV - Não cumpre a fundamentação, ainda que sumária, uma sentença (proferida nos termos do art.º 567.º, nº 3) que se limite a considerar confessados/provados os factos alegados pelo autor/requerente e que, de seguida, sem mais, passe à parte decisória. V - A revelia operante, não afasta o réu da lide, o qual, nos termos do n.º 2, do artigo 567.º do CPCivil, pode apresentar alegações escritas. VI - Se o tribunal recorrido omitiu, por completo, a observância da primeira parte do nº 2 do artigo já citado 567.º, não tendo facultado às partes o exame do processo pelo prazo de 10 dias para alegaram por escrito cometeu nulidade suscetível de influir objetivamente no exame e decisão da causa (art.º 195.º, n.º 1 do CPCivil).
Texto Integral
Processo nº 1535/03.9TCLRS-E.P1
Origem: Tribunal Judicial da Comarca do Porto Este-Juízo de Família e Menores de Paredes-J3 Relator: Des. Dr.º Manuel Fernandes
1º- Adjunto: Des. Dr.ª Maria Fernanda de Almeida
2º- Adjunto: Des. Dr.ª Teresa Pinto da Silva Sumário
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I-RELATÓRIO
Por apenso à execução que lhe movem AA, e outras, residentes na Rua ..., n.º ..., 3º Esq. ..., Coimbra veio o executado BB, residente na Rua ..., 1 Esq. Lote ..., deduzir os presentes embargos, peticionando que seja declarada extinta a execução e que as requeridas sejam condenadas como litigantes de má fé em multa exemplar e numa indemnização a título de despesas e honorários de mandatário em quantia não inferior a 2.460,00€ (dois mil, quatrocentos e sessenta euros).
Como fundamento, e em síntese, alega que o documento apresentado pelas exequentes não configura título executivo, uma vez que o acordo das responsabilidades parentais, ora junto pelas Exequentes, e que consta da certidão da Conservatória do Registo Civil, não é o acordo atualmente em vigor, porquanto foi alterado, por posterior mútuo acordo homologado por sentença judicial a 16 de novembro de 2011; alega que a exequente CC não é parte legítima porque as exequentes AA e DD nasceram respetivamente a ../../2002 e ../../1999, pelo que atingiram a maioridade a 31 de maio de 2020 e 1 de dezembro de 2017 respetivamente, pelo que a exequente CC carece de legitimidade para reclamar as prestações alimentícias vencidas após essas datas. Alega ainda que os valores reclamados pelas exequentes não são devidos, uma vez que o executado não decidiu unilateralmente reduzir o valor mensal da pensão a pagar a cada uma das exequentes, mas antes tal redução resultou de um acordo celebrado no âmbito de um incidente de incumprimento, que correu termos sob o n.º 1535/03.9TCLRS-B no extinto 1.º Juízo de Família e Menores de Loures. Alega ainda que as pensões alimentícias reclamadas (mas não devidas) encontram-se prescritas, nos termos do disposto no artigo 310.º, alínea f) do Código Civil.
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Recebidos liminarmente, foram as embargadas regularmente notificadas para, querendo, os contestarem, o que não fizeram.
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Conclusos os autos foi proferida decisão do seguinte teor: “O Tribunal é absolutamente competente, em razão da nacionalidade, da hierarquia e da matéria. Não existem nulidades que afetem todo o processado. As partes têm personalidade e capacidade judiciária e encontram-se devidamente patrocinadas. Não existem outras exceções dilatórias ou nulidades processuais, nem questões prévias que importe conhecer.
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Nos termos do disposto no artigo 567.º, n.º 1, ex vi, artigos 348.º, n.º 1 e 549.º, n.º 1 do Código de Processo Civil, que consagra um sistema cominatório semi-pleno, consideram-se confessados os factos articulados pela embargante – neste sentido, vide Lebre de Freitas, in Introdução ao Processo Civil – Conceito e Princípios Gerais à Luz do Código Revisto, 1996, pág. 89, e Miguel Teixeira de Sousa, in Estudos Sobre o Novo Processo Civil, 1996, pág. 321. Os autos estão dotados de todos os elementos que nos permitam conhecer do mérito sobre a pretensão formulada pelo embargante, o que se passa a fazer de seguida. Assim, considerando o supra exposto, os factos ora considerados confessados, aderindo aos fundamentos de facto alegados na petição inicial de embargos, decide-se, atento o preceituado no artigo 567.º do Código de Processo Civil, ex vi, artigos 348.º, n.º 1 e 549.º, n.º 1 do mesmo diploma legal, julgar totalmente procedentes, por provados, os presentes embargos e oposição à execução e, em consequência, declara-se extinta a execução, ordenando-se o levantamento da penhora efetuada sobre as contas bancárias identificadas na execução de que estes autos são apenso. Mais se julga ainda procedente, por provado, o pedido de condenação como litigantes de má fé, e em consequência, condenam-se as exequentes em multa como litigantes de má fé no valor de 2.460,00€ (dois mil, quatrocentos e sessenta euros). Custas pelas embargadas, nos termos do disposto no artigo 527.º, n.º 2 do Código de Processo Civil”.
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Não se conformando com o assim decidido veio a embargada/exequente AA, interpor o presente recurso formulando as seguintes conclusões: B1. O Executado, BB, instaurou embargos de executado e oposição à penhora, peticionando que seja declarada extinta a execução, por procedência das exceções alegadas e, no mais, que as Requeridas fossem condenadas como litigantes de má fé em multa exemplar e numa indemnização a título de despesas e honorários de mandatário em quantia não inferior a € 2.460,00 (dois mil quatrocentos e sessenta euros). B2. O Tribunal a quo julgou totalmente procedentes, por provados, os embargos de executado e oposição à execução, bem como o pedido de condenação das Exequentes em multa como litigantes de má-fé no valor de € 2.460,00 (dois mil quatrocentos e sessenta euros). B3. Não se concede tal decisão. B4. Entende a Exequente que a sentença padece de nulidade, porquanto não foi cumprido o dever de fundamentação. Mais a mais, a sentença é violadora do princípio da proibição das decisões-surpresa (artigo 3.º/3, 2.ª parte do CPC) e do disposto no artigo 567.º/2 do CPC. B5. Em face da dedução de embargos de executado, a Exequente foi notificada para contestar e não o fez. Como consequência, consideraram-se confessados os factos articulados pelo Executado, nos termos do disposto no artigo 567.º/1 do CPC. B6. Porém, a confissão dos factos não é sinónimo da procedência da ação, na medida em que tais factos têm de ser julgados conforme o direito. B7. Ora, salvo o devido respeito (que é muito), o Tribunal a quo considerou que a confissão dos factos é condição suficiente para a procedência dos factos, não sendo necessário o julgamento dos factos conforme o direito. No mais, não procedeu à especificação de quaisquer fundamentos de facto e / ou de direito para fundamentar a procedência da ação. B8. O Tribunal a quo aderiu tão-só à oposição deduzida pelo Executado, inclusive quanto à condenação das Exequentes como litigantes de má-fé, e não procedeu a um juízo crítico, valorativo e fundamentado, conforme era o seu dever, quer em sede de julgamento de matéria de facto, quer de direito. B9. Decorre do artigo 567.º/3 do CPC que “revestindo a causa manifesta simplicidade, a decisão pode assentar em fundamentação sumária” e, portanto, consubstancia uma exceção em face do regime geral, preceituado no n.º 4 do artigo 607.º do CPC. B10. Ora, se o Tribunal a quo pretendia recorrer ao modus operandi plasmado no artigo 567.º/3 do CPC devê-lo-ia ter referido expressamente e, no mais, indicado que a causa reveste manifesta simplicidade. Porém, não o fez, o que revela que estava a atuar ao abrigo da regra geral do dever de fundamentação. B11. Todavia, caso assim não se entenda, sempre se dirá que a causa não reveste manifesta simplicidade. Com efeito, as exceções deduzidas pelo Executado consubstanciam matéria de direito controvertida e complexa, carecendo de um enquadramento jurídico eficaz a ser efetuado pelo Tribunal a quo. B12. Designadamente quanto à questão da ilegitimidade da Exequente CC, constitui jurisprudência pacífica e reiterada que, estando a pensão de alimentos já fixada na menoridade da filha por decisão judicial e pretendendo-se a sua execução, relativamente ao período que abrange a menoridade e maioridade, a progenitora, com quem vive a beneficiária de alimentos, tem legitimidade para exigir ao Executado o seu pagamento. Dessarte, era dever do Tribunal a quo pronunciar-se uma vez que aderiu à posição sustentada pelo Executado e tal posição não é o entendimento maioritário da jurisprudência. B13. Ante o exposto, recaía sobre o Tribunal a quo o dever de fundamentação (consagrado no artigo 607.º/4 do CPC), mormente de especificar os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão. Uma vez que não o fez, a sentença deve ser julgada nula, segundo o disposto na alínea b) do artigo 615.º/1 do CPC. B14. Por outro lado, o Tribunal a quo condenou as Exequentes em multa como litigantes de má-fé no valor de € 2.460,00 (dois mil quatrocentos e sessenta euros) e, na medida em que não foi concedida à parte (Exequente) oportunidade para se pronunciar, configura uma decisão-surpresa. B15. Com efeito, a não apresentação de contestação por parte da Exequente não preclude o direito desta de se pronunciar sobre a litigância em má-fé. Dessarte, se o Tribunal a quo pretendia julgar procedente o pedido de condenação como litigantes de má-fé, devia ter concedido às partes a oportunidade para se pronunciarem, designadamente em relação ao montante da multa–o que não se sucedeu. B16. Nesta confluência, a violação do princípio da proibição das decisões-surpresa (previsto no artigo 3.º/3, 2.ª parte do CPC) tem como consequência a nulidade do procedimento (cf. artigo 195.º do CPC), na medida em que a irregularidade cometida influi na decisão da causa. Se o Tribunal a quo tivesse notificado a Exequente para se pronunciar sobre a sua condenação como litigante de má-fé, a decisão, muito provavelmente, teria sido outra. B17. Assim, deve a sentença ser julgada nula e ser revogada. No mais, deve o Tribunal a quo proceder à prática do ato omisso e o processo prosseguir os seus trâmites. B18. Por fim, a sentença padece de nulidade porquanto é violadora do disposto no artigo 567.º/2 do CPC. B19. Nos termos do artigo 567.º/2 do CPC, a revelia operante não “arreda” o réu da lide, podendo este apresentar alegações escritas. B20. Face ao exposto, o Tribunal a quo devia ter proferido despacho, a conceder o prazo de 10 dias, “primeiro ao mandatário do autor e depois ao mandatário do réu, para alegarem por escrito (…) e em seguida é proferida sentença”. B21. Dessarte, a omissão do cumprimento do disposto no artigo 567.º/2 do CPC culmina na nulidade do procedimento, na medida em que a irregularidade cometida influi na decisão da causa (cf. artigo 195.º do CPC). Com efeito, se as partes tivessem sido notificadas, a Exequente teria apresentado alegações escritas e, muito provavelmente, ter-se-ia formado a convicção subjetiva no Tribunal a quo da improcedência dos factos articulados pelo Executado. B22. Assim, deve a sentença ser julgada nula e ser revogada. No mais, deve o Tribunal a quo proceder à prática do ato omisso e o processo prosseguir os seus trâmites. B23. Em síntese, a sentença in casu deve ser julgada nula, segundo o disposto na alínea b) do artigo 615.º/1 do CPC. B24. Mais a mais: a sentença padece de nulidade na medida em que é violadora do princípio da proibição das decisões-surpresa (artigo 3.º/3, 2.ª parte do CPC) e do disposto no artigo 567.º/2 do CPC. Face ao exposto, deve o Tribunal a quo praticar os atos em omissão e o processo prosseguir os seus trâmites.
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Não foram apresentadas contra-alegações.
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Foram dispensados os vistos.
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II- FUNDAMENTOS
O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso-cfr. artigos 635.º, nº 4, e 639.º, nºs 1 e 2, do C.P.Civil.
No seguimento destas é apenas uma a questão que importa apreciar e decidir: a)- saber se a decisão recorrida padece das nulidades que lhe vêm assacadas e concretamente: - falta de fundamentação de facto e de direito; -falta do não cumprimento do estatuído no artigo 567.º, nº 2 primeira parte do CPCivil; - falta de exercício do contraditório (decisão surpresa) relativamente à condenação da apelante como litigante de má fé.
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A)- FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
A dinâmica factual a ter em consideração para a resolução da questão supra enunciada é a que resulta do relatório supra e que aqui se dá integralmente por reproduzida.
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III. O DIREITO
Como se evidencia da decisão recorrida a mesma foi prolatada ao abrigo do disposto no artigo 567.º, nº 2 do CPCivil por se ter considerado que as embargadas estavam numa situação de revelia operante.
Nos termos desta disposição adjetiva, não tendo o réu contestado–e tendo sido ou devendo considerar-se regularmente citado–consideram-se confessados os factos articulados pelo autor e é logo proferida sentença a julgar a causa conforme for de direito.
Se a resolução da causa revestir manifesta simplicidade, a sentença pode limitar-se à parte decisória, precedida da necessária identificação das partes e da fundamentação sumária do julgado (cf. nº 3 do mesmo inciso).
Como referem Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe de Sousa[1], “Nos termos gerais, e sem prejuízo das exceções referidas no art.º 568.º, não tendo o réu contestado e considerando-se confessados os factos alegados pelo autor, restará apenas decidir a causa “conforme for de direito” (n.º 2, in fine). Com efeito, confessados que passam a ter-se os factos articulados na petição (não assim quanto aos que designadamente exijam prova documental), deixa de haver controvérsia nessa sede, limitando-se a questão à valoração jurídica desses mesmos factos. É de notar que o estado de revelia operante em que se encontra o réu, embora seja suscetível de potenciar tal desfecho, não conduz, sem mais, à procedência da ação” (negrito e sublinhados nossos).
Efetivamente, o processo declarativo é um processo cominatório semipleno, dado que a revelia operante nunca implica, por si mesma, a condenação do réu.
Com efeito, como salientam os referidos autores[2] apesar de os factos alegados pelo autor se considerarem confessados, sempre caberá ao juiz proceder ao respetivo enquadramento jurídico (cf. artigo 5º, n.º 3, do Código de Processo Civil), em termos de julgar a ação materialmente procedente, abster-se de conhecer do mérito da causa e absolver o réu da instância (com fundamento em questões processuais–artigo 608.º, n.º 1 do CPCivil), julgar a ação apenas parcialmente procedente, ou mesmo julgar a ação improcedente, sempre em função do resultado da aplicação das normas de direito material.
Acresce que, a revelia operante não afasta o Réu da lide, que nos termos do n.º 2, do artigo 567.º do CPCivil, pode apresentar alegações escritas, que se destinam a permitir que, face à circunstância de se registar assente a matéria de facto invocada pelo Autor, possa apresentar a sua argumentação de direito perante a referida factualidade, seja para concluir que os factos alegados e confessados não suficientes para suportar o efeito jurídico pretendido, ou apenas o suportam parcialmente.
Isto dito, importa, todavia, ter bem presente que a assumida tendência do legislador para a celeridade da solução, nas situações, como a dos autos, não pode confundir-se com aligeiramento ou maior facilitação relativamente ao cumprimento mínimo das devidas regras técnico-jurídicas.
Na verdade, a imediata cominação, para a revelia do Réu, traduz-se apenas e imediatamente ao nível da matéria de facto: consideram-se confessados os factos articulados pelo autor.
Mas quais são esses factos?
Independentemente de nem toda a matéria de facto alegada na p.i. assumir, de forma categórica e incondicional, essa natureza–o que impõe naturalmente uma prévia seleção, com vista à subsequente implementação do raciocínio subsuntivo e solução jurídica, no mínimo em termos do clássico silogismo judiciário–não pode ignorar-se a disciplina decorrente do art.º 607.º, nº 3 do CPCivil, que manda discriminar os factos que o juiz considera provados.
Ora, só depois de elencados os factos que se consideram assentes, dentre os articulados e ante a confissão ficta do réu, é que pode julgar-se a causa conforme for de direito e, como é evidente, este julgamento impõe a respetiva fundamentação de facto.
Acrescem, além disso, as razões determinantes de que só dessa forma é possível sindicar tal decisão, em sede de recurso, ainda que a matéria de facto não tenha sido impugnada, além de que, não deve negligenciar-se que o réu revel, como bem lembra Abílio Neto[3], continua a ser afinal o destinatário da decisão e deve saber quais os factos tidos por relevantes e que estiveram na base da sua condenação.
Como se evidencia da decisão recorrida, na sua parte propriamente dispositiva a M.ª juiz limitou-se a usar a facilidade consentida pelo n.º 3 do citado artigo 567.º do CPCivil.
E assim, depois de ter consignado a verificação da regularidade da notificação e a falta de contestação das embargadas, considerou confessados os factos articulados na petição inicial dos embargados deduzidos pelo embargante/executado e, sem mais, julgou os mesmos procedentes com a consequente extinção da execução.
Assim sendo, facilmente se conclui que o tribunal recorrido não discriminou os factos provados por força da confissão e impunha-se, que o fizesse, uma vez que, como já referimos, não existe qualquer fundamento legal que dispense o cumprimento do disposto no artigo 607.º, n.º 3, do CPCivil.
Destarte e sem margem para qualquer tergiversação que a decisão padece de nulidade por falta absoluta de fundamentação de facto estando, pois, preenchida a factie sepcies da al. b) do nº 1 do artigo 615.º do CPCivil.[4]
Trata-se de norma que se relaciona com o dever de fundamentar as decisões consagrado designadamente no art.º 205.º, n.º 1, da CRP, nos termos do qual “(A)s decisões dos tribunais que não sejam de mero expediente são fundamentadas na forma prevista na lei”. E também no art.º 154.º do CPCivil, que preceitua: “1 - As decisões proferidas sobre qualquer pedido controvertido ou sobre alguma dúvida suscitada no processo são sempre fundamentadas. 2 - A justificação não pode consistir na simples adesão aos fundamentos alegados no requerimento ou na oposição, salvo quando, tratando-se de despacho interlocutório, a contraparte não tenha apresentado oposição ao pedido e o caso seja de manifesta simplicidade”.
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Da mesma forma e salvo o devido respeito, também a sentença é nula por falta absoluta de fundamentação de direito.
Como já noutro passo se referiu o tribunal a quo aderindo aos fundamentos de facto constantes da petição inicial julgou, sem mais, aos embargos procedentes.
Ora, o uso da factie sepcies do citado nº 3 do artigo 567.º do CPCivil não pode ser automática.
A causa há de revestir-se de manifesta simplicidade.
É que o disposto no citado nº 3 do art.º 567.º não dispensa a fundamentação da sentença, ele apenas possibilita, perante a referida simplicidade da causa, uma “fundamentação sumária”.
Dito doutro modo, não cumprirá a fundamentação, ainda que sumária, uma sentença (proferida nos termos do art.º 567.º, nº 3) que se limite a considerar confessados/provados os factos alegados pelo autor/requerente e que de seguida, sem mais passe à parte decisória.
E, no caso, esse pressuposto (manifesta simplicidade) não só não se invocou nem caracterizou, como, na nossa perspetiva, não se verifica.
Com efeito, bastará atentar, que embargante/executado deduziu oposição por embargos e oposição à penhora e, no que concerne à oposição por embargos, além de proceder à defesa por impugnação, procedeu à defesa por exceção, invocando a falta de título executivo, a falta de mandato forense, a ilegitimidade da exequente CC, a inexistência da obrigação e a prescrição, o que está, aliás, patente na extensão da peça respetiva peça composta de 150 artigos.
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Para além disso, como decorre dos autos o tribunal recorrido omitiu, por completo, a observância da primeira parte do nº 2 do artigo já citado 567.º, não tendo facultado às partes o exame do processo pelo prazo de 10 dias para alegaram por escrito.
Como já supra se referiu a revelia operante não afasta o Réu da lide, que pode apresentar alegações escritas, que se destinam a permitir que, face à circunstância de se registar assente a matéria de facto invocada pelo Autor, possa apresentar a sua argumentação de direito perante a referida factualidade.
Omissão de ato que a lei prescreve que, sem margem para qualquer dúvida, configura uma nulidade, suscetível de influir objetivamente no exame e decisão da causa (art.º 195.º, n.º 1do CPCivil).
Com efeito, a ablação desse direito da apelante, implica que esta não tenha tido a oportunidade de exibir a sua posição sobre a factualidade dada como provada, e que se destinaria a permitir uma decisão final (sentença) enformada com todas as posições jurídicas que as partes lhe transmitiriam.
Aceitar-se que essa fase processual não influiria no exame e decisão da causa seria reconhecer que a lei teria criado uma fase processual sem qualquer utilidade, o que ela própria não permite (art.º 130.º do CPCivil).
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Desta forma a procedência das invocadas nulidades, implicará a anulação da sentença bem como dos demais termos subsequentes do processo, atento o disposto no art.º 195.º, n.º 2, do CPCivil, ficando também, dessa forma, prejudicada a apreciação da questão da nulidade referente à decisão surpresa da condenação da apelante como litigante de má fé.
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IV-DECISÃO Pelos fundamentos acima expostos, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar a apelação procedente e, consequentemente, anulam a decisão recorrido, devendo o processo ser facultado às partes para alegarem por escrito nos termos estatuídos no artigo 567.º, nº 2 do CPCivil, alegação que abrangerá relativamente à apelante, querendo, o seu pronunciamento quanto ao pedido formulado pelo embargante/executado da sua condenação como litigante de má fé, devendo de seguida ser proferida sentença que elenque os factos provados e proceda à sua subsunção jurídica com a apreciação simultânea do citado pedido de litigância de má fé.
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Custas da apelação pela apelante que do recurso tirou proveito (cf. artigo 527.º, nº 1 do CPCivil).
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Porto, 13/1/2025
Manuel Domingos Fernandes
Fernanda Almeida
Teresa Pinto da Silva
__________________ [1] In Código de Processo Civil Anotado, Vol. I, 2ª edição, pág. 654. [2] Ob. cit., pág. 655. [3] In C.P.T. Anotado, 5ª Edição, 2002, pág. 152. [4] E no caso tal fundamentação inexiste mesmo que se adira ao entendimento plasmado no Ac. do STJ de 19/10/2021 Processo nº 2189/20.3T8FNC-A.L1-A.S1 de que “A sentença a proferir nos termos do art.º 567.º, n.º 3, do CPC-em que o réu, regularmente citado na sua pessoa, não contestou-não tem que cumprir rigorosamente os n.º 3 e 4 do art.º 607.º do CPC e que segmentar/autonomizar a fundamentação de facto e a fundamentação de direito, podendo proceder às duas fundamentações em simultâneo, aludindo aos concretos factos (globalmente considerados como confessados, nos termos do art.º 567.º, n.º 1, do CPC) a propósito do seu enquadramento jurídico”, pois que, no caso concreto, a falta de fundamentação factual é absoluta.