ARGUIÇÃO DE NULIDADES
NULIDADE DE ACÓRDÃO
RECURSO DE REVISTA
INADMISSIBILIDADE DE RECURSO
Sumário

I - A arguição de nulidades de acórdão da Relação, ao abrigo dos arts. 615.º, n.º 1, als. b) a e), e 666.º, n.º 1, do CPC, só é dedutível por via recurso de revista - quando o primeiro admita recurso ordinário, nos termos conjugados dos arts. 615.º, n.º 4, 2.ª parte, e 674.º, n.º 1, al. c), do diploma .
II - Se o acórdão da Relação não admitir recurso ordinário, as nulidades só são arguíveis mediante reclamação perante o próprio tribunal que proferiu tal decisão, nos termos dos arts. 615.º, n.º 4, 1.ª parte, e 617.º, n.º 6, do CPC.
III – Todavia, o regime do nº 6 do artigo 617º do CPC é de aplicar aos casos em que, tendo sido arguida nulidade no recurso na pressuposição de que o processo o admitia, o tribunal superior acaba por decidir que não pode ser apreciado o objeto do recurso, com a inerente baixa dos autos .
IV – Assim, por maioria de razão, também cumpre efectuar tal apreciação quando o recurso é rejeitado por decisão transitada pelo Tribunal recorrido.

Texto Integral

Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa:

AA intentou1 acção com processo especial emergente de acidente de trabalho , contra a COMPANHIA DE SEGUROS ALLIANZ PORTUGAL, S.A.
Em 8 de Março de 2024, foi proferida sentença que logrou o seguinte dispositivo:2
«
Pelo exposto e nos termos das disposições legais citadas, julgo parcialmente procedente a presente acção e, em consequência:
a) - Condeno a ré, “COMPANHIA DE SEGUROS ALLIANZ PORTUGAL, S.A.”, a pagar à autora o capital de remição da pensão anual de € 711,09, devida desde 01/03/2013, acrescido de juros de mora, à taxa legal, sobre o montante do dito capital, desde aquela data e até efectivo pagamento, abatendo-se a tal montante as quantias pagas pela ré à autora a título de pensão provisória, fixada por despacho de fls. 386, proferido em
25/06/2015;
b) - Condeno a ré, “COMPANHIA DE SEGUROS ALLIANZ PORTUGAL, S.A.”, a pagar à autora a quantia de € 1.100,51, a título de diferenças de indemnização por incapacidades temporárias, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a data do respectivo vencimento e até efectivo pagamento;
c) – Absolvo a ré, “COMPANHIA DE SEGUROS ALLIANZ PORTUGAL, S.A.” do demais peticionado.
Custas e despesas pela ré.
Valor da acção: € 12.688,43 - art. 120º do CPT.
Registe e notifique.
D.N. » - fim de transcrição.
Em 4 de Abril de 2024 , a Autora recorreu.3
Formulou conclusões.
A Seguradora contra alegou.
Em 25 de Setembro de 2024, foi proferido acórdão nesta Relação4, que , por unanimidade, logrou o seguinte dispositivo:
«
Em face do exposto, acorda-se em conferir a seguinte resposta ao quesito nº 52:
52 – Provado apenas que todos os tratamentos efectuados pela sinistrada após a alta da seguradora foram efectuados à revelia da mesma.
Mais acorda-se em confirmar a sentença recorrida.
Custas pela recorrente.
Notifique.» - fim de transcrição.
As notificações do acórdão foram levadas a cabo por cartas expedidas em 25 de Setembro de 2024, sendo que o MºPº foi notificado nessa data.5
Em 15 de Outubro de 2024, a Autora recorreu de revista.6
O recurso , em sede alegatória , foi dividido da seguinte forma:
«
I
DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO
II
DOS VÍCIOS DO ACÓRDÃO RECORRIDO REFERENTES À IMPUGNAÇÃO DA DECISÃO DE FIXAÇÃO DE INCAPACIDADE INCORPORADA NA SENTENÇA DE PRIMEIRA INSTÂNCIA
II-i)
DA PROVA PERICIAL QUE PRECEDEU A SENTENÇA DE PRIMEIRA INSTÂNCIA
II-ii)
DA VIOLAÇÃO, PELO ACÓRDÃO RECORRIDO, DO DISPOSTO NO ART.º 59º, N.º 1, AL. F), DA CRP, POR ERRO DE INTERPRETAÇÃO DO DISPOSTO NOS ARTS. 2º, N.º 1, 607º, N.º 3, 615º, N.º 1, AL. B), DO CPC
III
ERRO NA INTERPRETAÇÃO DO DIREITO APLICÁVEL, À LUZ DA PROVA PRODUZIDA
- IV
DA OMISSÃO DE PRONÚNCIA SOBRE/E ERRO NA INTERPRETAÇÃO DO DIREITO APLICÁVEL, À LUZ DOS FACTOS ASSENTES ».
Formulou as seguintes conclusões:
«
1. A A. não se conformou com a decisão de fixação de incapacidade, que desconsiderou as sequelas na anca (síndrome do piramidal), amplamente documentadas nos autos, e, inclusivamente, admitidas por junta médico-legal de 8.2.2017.
2. A sentença de primeira instância, no que respeitava à fixação de incapacidade, foi proferida sem que, em sede de prova pericial, fossem esclarecidas as dúvidas apontadas no douto despacho de 24.10.2019, quanto à existência de uma malformação congénita anterior ao acidente e, na afirmativa, se o trauma decorrente do acidente foi apto a agravar tal malformação e a desencadear a “síndrome do piramidal”.
3. De facto, a junta de ortopedia, de 2.6.2021 (na resposta a alínea h)), entendeu que tal determinação cabia a uma junta de neurocirurgia e esta, em 7.12.2022, entendeu que era àquela que cabia enquadra a patologia que a A. apresentava.
4. Pelo que o tribunal de primeira instância ignorou que a prova pericial não esclareceu as dúvidas identificadas no douto despacho de 24.10.2019, e muito menos respondeu aos quesitos que as partes indicaram na sequência de tal despacho (requerimentos de fls. 1202 a 1204 (Refª 33842625) e de fls. 1205 a 1207 (Refª 33907453)).
5. Contrariamente ao teor do douto despacho de 8.2.2022, os peritos também não se pronunciaram sobre o teor dos relatórios médicos juntos com os requerimentos de fls. 1344 a 1347 (Refª 39482952), de fls. 1351 a 1356 (Refª 39875885) e de fls. 1357 a 1359 (Refª 40034234).
6. Ora, no douto despacho de 24.10.2019, foi o próprio tribunal a identificar as deficiências e obscuridades da prova pericial levada a cabo no apenso para fixação de incapacidade.
7. Tais deficiências, como se extrai do que antecede, não foram minimamente supridas, ficando por responder os quesitos formulados pelas partes na sequência de tal despacho de 24.10.2019 (requerimentos de fls. 1202 a 1204 (Refª 33842625) e de fls. 1205 a 1207 (Refª 33907453)).
8. Perante esta evidência, impunha-se uma pronúncia fundamentada sobre os motivos pelos quais se mantinha o sentido da decisão de fixação de incapacidade.
9. Na sentença recorrida, é totalmente inexistente a fundamentação quanto ao esclarecimento das dúvidas elencadas no despacho de 24.10.2019, e quanto ao teor dos relatórios médicos juntos com os requerimentos de fls. 1344 a 1347 (Refª
39482952), de fls. 1351 a 1356 (Refª 39875885) e de fls. 1357 a 1359 (Refª 40034234).
10. Ora, a pronúncia fundamentada sobre os motivos pelos quais se mantinha o teor da decisão de fixação de incapacidade, impunha-se à luz do direito à reparação, e da garantia da tutela jurisdicional efetiva, previstos no art.º 59º, n.º 1, al. h), e 20º da CRP, e, naturalmente, do dever de fundamentação estatuído no art.º 607º, n.º 4, do CPC.
11. A total ausência de uma tal pronúncia gerava a nulidade da sentença, nos termos do disposto no art.º 615º, n.º 1, als. b), c) e d), do CPC.
12. No acórdão recorrido, entendeu-se não existir tal nulidade, para tanto sendo avançada a seguinte fundamentação:
“Em rigor, o juiz não deixou de se pronunciar sobre a questão da fixação do grau de incapacidade de que devia conhecer, pois no facto AO manteve à sinistrada o grau de incapacidade (de O,2) anteriormente fixado (…) como tal, mais que não seja de forma implícita, existiu pronúncia sobre essa questão, a qual não se confunde com a obrigatoriedade de pronúncia sobre todos os argumentos invocados pelas partes (…)
In casu, embora a fundamentação atinente à fixação do grau de incapacidade que afeta a sinistrada, quer em sede da proferida em 7.9.2017, quer na sentença proferida de 8.3.024, seja exígua, também não pode reputar-se como inexistente”.
13. Com este trecho, o acórdão recorrido eliminou, na prática, o dever de pronúncia e fundamentação de qualquer decisão judicial.
14. Ora, uma correta interpretação do disposto nos arts. 2º, n.º 1, 607º, n.º 3, e 615º, n.º 1, al. d), do CPC, levaria, forçosamente, às seguintes considerações:
15. A primeira é a de que a exigência de pronúncia e fundamentação não é meramente formal.
16. Significa isto que existe um dever, material, substantivo, de pronúncia e fundamentação CIRCUNSTANCIADA, por parte do juiz.
17. No caso concreto, não bastava ao juiz de primeira instância remeter para as juntas médicas e concluir que como nenhuma se pronunciou sobre o nexo causal entre a lesão em causa com o acidente dos autos, tal nexo não resulta provado.
18. Pelo contrário, impunha-se uma análise crítica da restante prova, considerando que as juntas não se pronunciaram sobre aquela matéria (como o próprio tribunal de primeira instância reconheceu repetidas vezes) e que o Ac. da Relação de Lisboa de 14.12.2023 determinou que tal análise tornava desnecessária a realização de nova junta pericial.
19. Isto, naturalmente, sem esquecer que a prova pericial não vincula o juiz. O que, por maioria de razão, é especialmente relevante quando a prova pericial é omissa sobre determinado facto essencial à boa decisão da causa.
20. Ora, essa análise é TOTALMENTE inexistente na sentença de primeira instância e no acórdão recorrido.
21. E, a referência “da praxe” à inexistência de um dever do decisor de analisar todos os argumentos, é totalmente vazia de substrato e desconexa do caso concreto: não existiam mil e um argumentos, mas um: A necessidade de análise da DOCUMENTAÇÃO CLÍNICA para aferição do grau de incapacidade da recorrente.
22. Não havia mais nada para analisar e, como é evidente, tal pretensão da recorrente é absolutamente legítima e não pode ser desconsiderada como se de um simples capricho processual se tratasse.
23. E, apesar da simplicidade da argumentação da recorrente, nada, em ambas as instâncias, é dito sobre NENHUMA da prova documental, de natureza clínica, que a recorrente juntou, para apoio à concretização das juntas médicas e que, repete-se, o Ac. da Relação de Lisboa, de 14.12.2023, entendeu ser essencial para a descoberta da verdade material.
24. Se quisermos consagrar uma justiça “a jato” ou, em modo “fast food”, fará todo o sentido admitir “pronúncias implícitas”, inclusivamente, sobre a única pretensão formulada pelo recorrente, e, até, quando está em causa um direito constitucionalmente garantido e um dos pilares de uma sociedade que tende para eliminação das desigualdades, para a proteção das liberdades individuais e para o equilíbrio nas relações no mundo do trabalho.
25. Acontece, porém, que tal eliminação do dever de pronúncia fundamentada não foi a intenção do legislador.
26. Cabe a esse Supremo Tribunal, à luz do disposto nos arts. 59º, n.º 1, al. f) da CRP e 2º, n.º 1, 607º, n.º 3, 615º, n.º 1, al. b), do CPC, repor a correta interpretação do dever de pronúncia e fundamentação, e evitar que com outra interpretação (a do acórdão recorrido), se abra a “caixa de Pandora” para uma regressão na aplicação do direito, e um recuo no tempo, para uma era que já tivemos a infelicidade de conhecer.
27. O que acarreta a revogação do acórdão recorrido e a baixa dos autos ao Tribunal da Relação de Lisboa para pronúncia circunstanciada sobre os meios de prova que impunham, segundo a recorrente, alteração da decisão de fixação do grau de incapacidade.
Por outro lado,
28. Nas suas alegações de recurso de apelação (capítulo II – iii) – a) e II – iii) – b), sintetizado nos pontos 14º e a 33º das conclusões), a ora recorrente, indicou um vasto elenco de prova documental e bem assim transcreveu uma série de depoimentos prestados em audiência de discussão e julgamento.
29. No entender da recorrente, de tal prova resultava, de forma inequívoca, que:
1. A A. não apresentava qualquer limitação ou sintomatologia associada a patologia pré-existente na anca.
2. A lesão no músculo do piramidal é de natureza traumática e distinta de qualquer patologia pré-existente da anca, não obstante a intensidade da sintomatologia poder resultar de um concurso entre a lesão traumática e patologia pré-existente da anca.
3. Existe proximidade temporal imediata entre a queda e o início das queixas e, também, adequação da queda sofrida pela A. para provocar
as lesões e sequelas descritas na anca.
4. A R. não levou a cabo qualquer esforço de diagnóstico das queixas da A. reportadas à anca, tendo tal diagnóstico resultado, exclusivamente, da iniciativa da A..
5. Tais sequelas e queixas originaram os períodos de ITA referidos na alínea JJ) dos factos assentes.
30. A sentença de primeira instância, omitiu toda e qual pronúncia sobre tais meios de prova (pois, como vimos, cingiu-se à – assumidamente insuficiente – prova pericial).
31. Já o acórdão recorrido veio a emitir pronúncia sobre tal matéria, mas no sentido de que uma pronúncia sobre tal matéria não é admissível, porque:
“no tocante à matéria que se pretende seja dada como provada, analisada a base instrutória, não se vislumbra que a mesma ali conste, sendo que também não foi expressamente articulada em sede de petição ou contestação (…) atente-se que os quesitos formulados para serem respondidos pelos Exmos. Peritos nas Juntas Médicas não se confundem com os elaborados na Base Instrutória.”
32. Também se entendeu, no acórdão recorrido, que, analisadas as atas de julgamento, não se deteta Tribunal que o Tribunal tenha feito uso do disposto no art.º 72º, n.º 1, do CPT.
33. Ora, tal apenas pode decorrer de um manifesto lapso na análise de tais atas, pois, como vimos supra, após a prolação da decisão mencionada na alínea AO) da matéria assente, nos autos principais, na sessão de julgamento que teve lugar em 23/10/2019, na sequência da inquirição da primeira testemunha da autora, foi ditado para a ata um despacho com o seguinte teor:
«Pese embora a decisão proferida no apenso de Fixação da Incapacidade para o Trabalho, atendendo a que, salvo melhor opinião, tal decisão não transitou em julgado – vide art.º 140, n.º 2, parte final, do CPT – CONSIDERO NECESSÁRIA A SUBMISSÃO DA AUTORA A NOVO EXAME POR JUNTA MÉDICA, A FIM DE DISSIPAR AS DÚVIDAS QUE ME SURGIRAM ATRAVÉS DA PROVA TESTEMUNHAL PRODUZIDA.
A realização de tal exame por junta médica destina-se, primordialmente, a apurar da existência de uma malformação congénita anterior ao acidente e, na afirmativa, se o trauma decorrente do acidente foi apto a agravar tal malformação e a desencadear o “síndrome do piramidal”, de modo a que possa proceder-se à avaliação da incapacidade nos termos previstos do art.º 11º, n.º 2, da LAT. Para esse efeito, vai concedido às partes o prazo de 10 dias para formularem, querendo, quesitos a serem respondidos pela Junta Médica, dentro do objecto acima delimitado. Notifique».
34. Na sequência de tal despacho, foi determinada, em 28.11.2019, a submissão da A. a nova junta médica, a fim de ser dada resposta aos quesitos formulados nos requerimentos de fls. 1202 a 1204 (Refª 33842625) e de fls. 1205 a 1207 (Refª 33907453) e, sendo caso disso, a proceder-se à avaliação da incapacidade nos termos previstos no art. 11º, nº 2, da LAT (Lei nº 98/2009 de 04/09).
35. Como resulta do referido requerimento com a REFª: 33907453, foram os seguintes os quesitos indicados pela ora recorrente:
1. De acordo com a descrição da forma como ocorreu o acidente de trabalho que já consta na perícia médica realizada em 08.02.2017, e da qual resultou de imediato uma (rutura completa aparente do componente peroneo-astragalino anterior do ligamento colateral externo), é possível sobrevir uma lesão no piramidal?
2. Em caso afirmativo qual a IPP da sinistrada?
3. A lesão do labrum e acetabular e tendinopatia dos isquiotibiais são decorrentes do acidente?
4. A sinistrada padecia de alguma malformação ao nível da morfologia da anca?
Em caso afirmativo qual?
5. Antes do acidente a sinistrada padecia de alguma lesão do piramidal?
6. A existir alguma malformação ao nível da morfologia da anca, a mesma provocou a lesão no piramidal? Ou foi um factor de agravamento conjugado com a queda?
7. Os tratamentos efectuados pela sinistrada contribuíram para aliviar a sua sintomatologia?
8. A sinistrada tem necessidade de manter os tratamentos? Com que regularidade?
9. Existem técnicos para efectuar os tratamentos em ...?
10.Considerando que a sinistrada nas funções que tinha à data do acidente, a nível nacional e internacional efectuava longas e constantes deslocações, conduzindo o respectivo automóvel, a mesma com as lesões que a passaram a afectar podia continuar a conduzir?
11. A lesão no piramidal implicava a impossibilidade da sinistrada estar sentada durante quanto tempo? E exigia assentos especiais?
12.Quais os períodos de incapacidades temporárias?
13.Com os tratamentos a sinistrada pode retomar a condução de veículos automóveis da forma que fazia? Se sim por quanto tempo em cada viagem?
36. Dando a mão à palmatória, admite-se que a matéria ínsita no ponto 4) supra mencionado (“a R. não levou a cabo qualquer esforço de
diagnóstico das queixas da A. reportadas à anca, tendo tal diagnóstico resultado, exclusivamente, da iniciativa da A.”) para além de não ser
essencial para a boa decisão da causa não constava do elenco dos factos cujo apuramento foi determinado pelo referido despacho de 23.10.2019.
37. Uma coisa, porém, é certa, tal despacho procedeu a uma ampliação dos temas de prova, nos termos do disposto no art.º 72º, n.º 1, do CPT, e foi precisamente por tal motivo que se realizaram as duas juntas médicas de ortopedia e neurocirurgia, sobre as quais tanto já se disse.
38. E, sendo evidente que o objeto do litígio consistia na fixação de incapacidade e determinação do nexo de causalidade entre tal
incapacidade e o acidente de trabalho, teria que existir pronúncia sobre toda a referida prova elencada pela recorrente nas suas alegações de
recurso, à luz do disposto nos arts. 72º, n.º 1, do CPT e 596º, do CPC.
39. Isto, naturalmente, sem esquecer alguns princípios basilares, totalmente ausentes do acórdão recorrido, como é o caso da tutela jurisdicional efetiva, a descoberta da verdade material e, diga-se, o próprio direito constitucional à reparação em caso de acidente de trabalho.
40. De quanto antecede decorre a necessária revogação do acórdão recorrido com a consequente baixa do processo à primeira instância, para prolação de decisão a oficiar o INML para enquadrar a lesão no músculo piramidal à luz da TNI, discriminando os respetivos períodos de ITA, previamente à prolação da sentença, ou, em alternativa, a condenação da R. nas prestações previstas no art.º 48º, da LAT, a fixar após enquadramento, pelo INML, das sequelas em causa, e dos respetivos
períodos de incapacidade temporária e tratamentos necessários no futuro.
41. Finalmente, deu-se como provado que:
KK.Na primeira semana, quando se sentava no sofá da sua sala, começou a queixar-se de dores na anca (resposta ao quesito 9º).
LL. Nesse mesmo dia - 26/11/2012 - a sinistrada pediu ao fisioterapeuta BB que se deslocasse a sua casa devido a dores intensas, tendo este vindo a realizar um relatório de fls. 512-513 (resposta ao quesito 10º).
MM. Em 26/12/2012, a sinistrada não se conseguia movimentar, estando sentada numa cadeira com a perna estendida (resposta ao quesito 11º).
NN.A sinistrada começou a sentir dores intensas na anca, tendo grande dificuldade em sentar-se no sofá, pelo que começou a tomar analgésicos (resposta ao quesito 13º).
OO. Na consulta de 26/12, foi-lhe marcada nova consulta para daí a 4 semanas (resposta ao quesito 15º).
PP.Como as dores na anca eram intensas e insuportáveis a sinistrada antecipou a consulta para a data referida em F) (resposta ao quesito 17º).
QQ. Nessa consulta foi-lhe prescrita a toma de analgésicos (...) (resposta ao quesito 19º).
RR. Foi marcada consulta para dia 24/01/2013 e no dia 21/01/2013 a sinistrada deslocou-se à urgência do Hospital XX, tendo-lhe sido prescrita medicação e proposta consulta de Ortopedia (resposta ao quesito 20º).
SS. No dia 25/01/2013, a sinistrada realizou RNM à anca, onde foi diagnosticado peritrocanterite bilateral, bursite e eventual bursite na inserção do Psoas Ilíaco
(resposta ao quesito 23º).
TT. No fim de julho de 2013, como já não andava sem ajuda, começou a ser acompanhada pelo fisioterapeuta CC que a colocou a andar em poucas semanas (resposta ao quesito 29º).
UU. Em 2014, o Dr. CC encaminhou a sinistrada para o Dr. DD do Hospital ZZ (resposta ao quesito 31º).
VV.Em 04/03/2014 fez RNM (resposta ao quesito 32º). (Como vimos, a RMN referida em DD) permitiu a identificação de rutura do médio glúteo).
WW. Em setembro de 2014, a sinistrada foi examinada pelo Dr. EE, em ..., por indicação do Dr. DD (resposta ao quesito 34º).
XX. Após consulta, análise de exames realizados e infiltração realizada, foi submetida, em 21/11/2014, a intervenção cirúrgica pelo Dr. EE, para estabilização da anca, na qual é efectuada infiltração do espaço interglúteo (resposta ao quesito 35º).
YY. Em 19/12/2014 a sinistrada é consultada pelo Dr. EE que prescreve os tratamentos de reabilitação da cirurgia com fisioterapia (resposta ao quesito 36º).
ZZ. Em março de 2015, a sinistrada voltou a ... para consulta de controlo, onde mantinha dores no músculo piramidal, tendo-lhe sido proposto realizar fisioterapia e relaxantes musculares e sendo-lhe sugerida uma 2a
intervenção cirúrgica, se não melhorasse (resposta ao quesito 37º).
AAA. Entretanto, fez fisioterapia com FF (resposta ao quesito 38º).
BBB. Entre 17/05/2013 e 26/08/2013, entre 11/09/2013 e 21/11/2013, entre 03/02/2014 e 22/10/2014 e entre 21/04/2015 e 02/07/2016, a autora esteve em situação de incapacidade temporária para o trabalho (resposta ao quesito 44º).
42. Destes factos, dados como provados, resulta que imediatamente após a queda sofrida
no final de 2012, a A. começou a sentir dores muito incapacitantes na anca, na sequência das quais levou a cabo, por sua conta, tratamentos e exames de diagnóstico, que permitiram identificar, em 25.1.2013, peri-trocanterite bilateral, bursite, e
eventual bursite na inserção do Psoas Ilíaco (alínea AA)) e, em 4.3.2014, rotura do tendão do médio glúteo (alínea DD) e documento n.º 16, com a p.i.).
43. Ou seja, tais factos bastavam para se concluir pelo surgimento de sintomatologia incapacitante, na anca, imediatamente após o acidente de trabalho sofrido pela A., existindo evidência clínica, obtida posteriormente ao acidente, de patologia pré-existente e lesão traumática.
44. Ora, a R. não demonstrou (e nem alegou) que tal sintomatologia incapacitante já existia previamente ao acidente.
45. Pelo que, em face de tal matéria assente, e à luz do disposto nos arts. 10º e 11º, n.º 2,
da LAT, impunha-se a condenação da R. no pagamento das prestações previstas no art.º 48º, da LAT, referentes a tais sequelas e limitações, a determinar, uma vez mais, pelo INML, à luz do enquadramento de tais sequelas na TNI.
46. Aliás, e no que respeita ao período de ITA, existe manifesta oposição entre a decisão
(Incapacidade Temporária Absoluta (ITA) de 21/11/2012 a 26/11/2012) e o facto dado como provado na alínea JJ): “entre 17/05/2013 e 26/08/2013, entre 11/09/2013 e 21/11/2013, entre 03/02/2014 e 22/10/2014 e entre 21/04/2015 e 02/07/2016, a autora esteve em situação de incapacidade temporária para o trabalho” (resposta ao quesito 44º).
47. Como é evidente, em face o que antecede, teria, em qualquer caso, que ser proferida decisão condenando a R. no pagamento das prestações devidas por ITA pelos períodos mencionados na alínea JJ) dos factos provados.
48. Não obstante integrar o capítulo II) – iii) – d), das alegações de recurso de apelação (que a recorrente sintetizou nos pontos 41º a 46º das suas conclusões), no acórdão recorrido não se vislumbra o mais ténue indício de pronúncia sobre tal matéria.
49. E, mesmo que, por hipótese, se admita que a Relação não está obrigada a pronunciar-se “sobre todos os argumentos” alinhados pelo recorrente, ou que ocorreu uma “pronúncia implícita” sobre tal matéria, a verdade é que sempre estaremos perante a repetição do mesmo vício em que incorreu a primeira instância, de violação do disposto nos arts. 10º e 11º, n.º 2, da LAT, face aos referidos factos dados como provados.
50. Motivo pelo qual, improcedendo todos os restantes fundamentos do presente recurso de revista (o que apenas por cautela se admite), sempre teria que ocorrer a revogação do acórdão recorrido, com as consequentes:
- Condenação da R. nos valores correspondentes à baixas por ITA entre 17/05/2013 e 26/08/2013, entre 11/09/2013 e 21/11/2013, entre
03/02/2014 e 22/10/2014 e entre 21/04/2015 e 02/07/2016,
- Baixa dos autos à primeira instância para condenação da R. no pagamento das prestações previstas no art.º 48º da LAT, em função do
concreto grau de incapacidade que o INML vier a fixar, à luz da TNI, considerando a existência da sequela desvalorizada pela primeira instância (síndrome do piramidal) e seu nexo com o acidente descrito nos autos.
Em face do exposto deverá ser concedido
provimento ao presente recurso. » - fim de transcrição.
A Ré Seguradora respondeu.7
Concluiu que:
«
1.ª O recurso ora em resposta é inamissível porque se verifica “dupla conforme”, inibição recursória prevista no artigo 671º, nº 3, do CPC que tem como pressuposto que a questão decidida foi apreciada de modo idêntico em duas instâncias;
2.ª Tal-qualmente é inadmissível porque a Autora interpôs o recurso de revista a título de revista normal e porque os fundamentos exclusivos do mesmo serem as alegadas nulidades do acórdão recorrido.
3.ª Ora, não sendo admissível recurso ordinário, em termos gerais, por virtude da ocorrência de “dupla conforme”, as nulidades previstas nas alíneas b) a e) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC só são arguíveis por via recursória, se a revista for interposta a título especial ou de
revista excepcional nos termos dos artigos 629.º, n.º 2, e 672.º, n.º 1, do CPC, o que não ocorreu.
4.ª Ainda que assim não se entenda, o que não se concede ou concebe mas o dever de patrocínio obriga a cogitar, considerando o primado do princípio da imediação e da livre apreciação da prova,
5.ª Bem como os resultados das várias juntas médicas levadas a cabo nos presentes autos ao longo destes também muitos longos anos, mas em especial as últimas, absolutamente complementares, além de idóneas e muito bem fundamentadas e considerando todo o manancial de documentação clínica junta aos autos, é por demais evidente que se encontra cabalmente esclarecida a situação da sinistrada, conclusão que se extrai da leitura concatenada dos mesmos;
6.ª Com o que nada mais pode ser exigido à ora exponente para além do fixado em 1.ª Instância e sufragado pela Relação, seja a que título for e que com o objecto dos presentes autos, directa ou indirectamente se relacione» - fim de transcrição.
Em 24 de Outubro de 2024,o recurso de revista foi rejeitado por despacho singular do relator [ vide fls. 1222 a 1224].8
As notificações dessa decisão singular foram levadas a cabo por cartas expedidas em 24 de Outubro de 2024 [ fls. 1225-1226] , sendo que o MºPº foi notificado nessa data.
Em 22 de Outubro de 2024, a Recorrente , para a hipótese de não se considerarem verificados os pressupostos de admissibilidade do recurso de revista , requereu a convolação das alegações em reclamação nos termos do disposto nos artigos 193º, nº 3 e 666, nº 2 do CPC [ vide fls. 1221].
A decisão singular de rejeição da revista transitou.
Notificada para o efeito a requerente pagou multa [ artigo 139º , nº 5 alínea c) do CPC]9 .
Mostram-se colhidos os vistos.
****
Cumpre , pois, apreciar o requerimento de convolação apresentado pela recorrente assim como a admissibilidade de pronúncia em sede de conferência sobre as arguidas nulidades .
Segundo o artigo 615º do CPC , ex vi do artigo 77º do CPT:
Causas de nulidade da sentença
1 - É nula a sentença quando:
a) Não contenha a assinatura do juiz;
b) Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão;
c) Os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível;
d) O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento;
e) O juiz condene em quantidade superior ou em objeto diverso do pedido.
2 - A omissão prevista na alínea a) do número anterior é suprida oficiosamente, ou a requerimento de qualquer das partes, enquanto for possível colher a assinatura do juiz que proferiu a sentença, devendo este declarar no processo a data em que apôs a assinatura.
3 - Quando a assinatura seja aposta por meios eletrónicos, não há lugar à declaração prevista no número anterior.
4 - As nulidades mencionadas nas alíneas b) a e) do n.º 1 só podem ser arguidas perante o tribunal que proferiu a sentença se esta não admitir recurso ordinário, podendo o recurso, no caso contrário, ter como fundamento qualquer dessas nulidades.
Por outro lado, o artigo 674º do CPC, ex vi do nº 1 do artigo 87º do CPT, regula:
Fundamentos da revista
1 - A revista pode ter por fundamento:
a) A violação de lei substantiva, que pode consistir tanto no erro de interpretação ou de aplicação, como no erro de determinação da norma aplicável;
b) A violação ou errada aplicação da lei de processo;
c) As nulidades previstas nos artigos 615.º e 666.º.
2 - Para os efeitos do disposto na alínea a) do número anterior, consideram-se como lei substantiva as normas e os princípios de direito internacional geral ou comum e as disposições genéricas, de caráter substantivo, emanadas dos órgãos de soberania, nacionais ou estrangeiros, ou constantes de convenções ou tratados internacionais.
3 - O erro na apreciação das provas e na fixação dos factos materiais da causa não pode ser objeto de recurso de revista, salvo havendo ofensa de uma disposição expressa de lei que exija certa espécie de prova para a existência do facto ou que fixe a força de determinado meio de prova.
Temos , pois, que a arguição de nulidades da decisão final , nomeadamente de acórdão da Relação, ao abrigo dos artigos 615.º, n.º 1, alíneas b) a e), e 666.º, n.º 1, do CPC10 só é dedutível por via recursória quando aquela decisão admita recurso ordinário, nos termos conjugados dos artigos 615.º, n.º 4, 2.ª parte, e 674.º, n.º 1, alínea c), do mesmo Código, e portanto como fundamento acessório desse recurso.
Contudo, se aquela decisão não admitir recurso ordinário, as referidas nulidades só são arguíveis mediante reclamação perante o próprio tribunal que proferiu tal decisão, nos termos dos artigos 615.º, n.º 4, 1.ª parte, e 617.º, n.º 6, do CPC.
Nesse sentido aponta aresto do STJ , de 24-11-2016, Revista n.º 470/15.2T8MNC-A.G1.S1 - 2.ª Secção , Relator Conselheiro Tomé Gomes, acessível em www.dgsi.pt.
No caso concreto, a recorrente veio arguir nulidades do acórdão da Relação , de 25-9-2024, com fundamento do recurso de revista que apresentou o qual não era admissível e foi rejeitado.
Assim, as nulidades de acórdão só eram arguíveis mediante reclamação para a Relação.
Saliente-se que os nºs 1 a 5 do artigo 617º do CPC « dirigem-se aos casos em que tendo sido interposto recurso ordinário , a matéria da nulidade da sentença ou a sua reforma é suscitada no próprio recurso, como impõem os arts. 615º nº 4 e 616º, nº 2 .
O nº 6 regula as situações em que , não sendo admissível recurso da sentença , a questão da nulidade é colocada ao próprio juiz , cabendo a este a respectiva apreciação» 11.
Tanto basta para as nulidades não deverem ser alvo de apreciação ,ao abrigo dos nºs 1 e 2 do artigo 617º e artigo 666º ambos do CPC 12, visto que para tanto o recurso teria que ser admissível ; o que não é o caso.
Mas será que se deve operar a solicitada convocação e proceder à dilucidação em conferência das arguidas nulidades ao abrigo do nº 6º do supra referido artigo 617º ?
A requerente invoca o disposto no artigo 666º do CPC bem como o nº 3 do artigo 193º desse diploma.13
Ora, tal como refere António Santos Abrantes Geraldes14:
« O regime do nº 6 é igualmente aplicável nos casos em que , tendo sido arguida nulidade ou pedida reforma da sentença na pressuposição de que o processo admitia o recurso , o tribunal superior acaba por decidir que não pode ser apreciado o objeto do recurso , com a inerente baixa dos autos » - fim de transcrição.
Assim, até por maioria de razão , bem como por aplicação analógica do nº 6 do artigo 617º do CPC , afigura-se-nos que também se pode e deve levar a cabo tal apreciação quando o recurso é rejeitado por decisão transitada pelo Tribunal recorrido, tal como aqui sucede.
Por esse motivo, cumpre levar a cabo tal apreciação
***
Analisado o recurso constata-se que , em rigor, a Autora apenas invoca uma nulidade de acórdão por omissão de pronúncia.
Na parte restante [ ou seja:
I
DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO
II
DOS VÍCIOS DO ACÓRDÃO RECORRIDO REFERENTES À IMPUGNAÇÃO DA DECISÃO DE FIXAÇÃO DE INCAPACIDADE INCORPORADA NA SENTENÇA DE PRIMEIRA INSTÂNCIA
II-i)
DA PROVA PERICIAL QUE PRECEDEU A SENTENÇA DE PRIMEIRA INSTÂNCIA
II-ii)
DA VIOLAÇÃO, PELO ACÓRDÃO RECORRIDO, DO DISPOSTO NO ART.º 59º, N.º 1, AL. F), DA CRP, POR ERRO DE INTERPRETAÇÃO DO DISPOSTO NOS ARTS. 2º, N.º 1, 607º, N.º 3, 615º, N.º 1, AL. B), DO CPC;
III - ERRO NA INTERPRETAÇÃO DO DIREITO APLICÁVEL, À LUZ DA PROVA PRODUZIDA ] o que , a nosso ver, invoca não é um vício formal mas uma errada interpretação do direito , mesmo que em sede do regime adjectivo aplicável, o que constituiria matéria de apreciação em sede do recurso de revista que foi , oportunamente , rejeitado.
Anote-se que o nosso poder jurisdicional se mostra esgotado.
Em relação ao invocado sobre a epigrafe IV [
ou seja:
- IV
DA OMISSÃO DE PRONÚNCIA SOBRE/E ERRO NA INTERPRETAÇÃO DO DIREITO APLICÁVEL, À LUZ DOS FACTOS ASSENTES »] , dir-se-á que a matéria invocada pela arguente que versa sobre a impugnação da matéria de facto, a nosso ver, não consubstancia uma nulidade por omissão de pronúncia.
É sabido que só há nulidade por omissão de pronúncia quando o juiz deixe de se pronunciar sobre questões que devesse apreciar, sendo que cumpre distinguir as autênticas questões e os meros argumentos ou motivos invocados pelas partes.
Não é esse o caso.
Aliás, só ocorre nulidade por omissão de pronúncia nos casos em que a omissão de conhecimento, relativamente a cada questão, é absoluta e não quando seja meramente deficiente ou quando se tenham descurado as razões e argumentos invocados pelas partes.
Argumentar-se-á com uma nulidade por falta de fundamentação contemplada no artigo 615.º, n.º 1, alínea b), primeira parte, do CPC.
Todavia esta não se verifica .
Tal dever foi observado no verberado aresto, sendo certo que só a absoluta falta de fundamentação é susceptível de gerar tal nulidade.
Por outro lado, no que toca à hipotética inobservância pela Relação dos poderes-deveres que lhe são cometidos pelo art.º 662.º do CPC15, sendo certo que o exame crítico da prova que impende sobre a Relação não compreende o dever de rebater ponto por ponto todos os argumentos do impugnante, também não consubstancia qualquer das nulidades contempladas pelo artigo 615º do CPC.
Aliás, cabe nas competências do STJ, nos termos do art.º 674.º n.º 1 alínea b), aquilatar se a Relação os observou.
Cumpre, pois, indeferir a supra citada arguição de nulidades.
***
Em face do exposto, acorda-se em :
- conhecer da invocação de nulidades invocadas no rejeitado recurso de revista;
- indeferir a respectiva arguição.
Custas pela requerente/Autora.
Notifique.
DN (processado e revisto pelo relator).
Lisboa,
Leopoldo Soares
Manuela Fialho
Paula Doria C. Pott

1. A participação da Seguradora deu entrada em 11 de Março de 2013 – fls. 2.
O exame realizado em 8 de Agosto de 2014 [ fls. 209 a 211 – I Volume ] considerou a sinistrada afectada de IPP de 0,02 , desde 11-6-2014.
O Exame de 6 de Maio de 2016 considerou a sinistrada afectada de IPP de 0,02 desde 29.2.2013 , com ITA de 21.11.2012 a 26.11.2012 e ITP de 0,10 de 21-11-2012 a 28.2.2013 – fls. 460 a 462.
Anote-se que em 25.6.2015 foi fixada uma pensão provisória à sinistrada no montante de € 711.09 a suportar pela Seguradora – fls. 386.
Todavia não consta que tenha sido paga.
A tentativa de conciliação realizou-se em 31 de Maio de 2016 – fls. 478 a 481.
O processo deu entrada na fase contenciosa em 20.6.2016 – fls. 531 [II Volume].↩︎
2. Fls. 1277 a 1282.↩︎
3. Fls. 1283 a 1309 v..↩︎
4. Vide fls. 1141 a 1177 – V Volume.↩︎
5. Vide fls. 1179 a 1181.↩︎
6. Vide fls. 1182 a 1205 v.↩︎
7. Fls. 1206 a 1218.↩︎
8. A qual na parte que para aqui releva logrou o seguinte teor:
«
Antes de mais , cumpre admitir ou rejeitar o recurso.
Anote-se , desde logo , que não se vislumbra que a recorrente tenha interposto recurso de revista excepcional.
O valor conferido à causa [ € 12.688,43] - que a recorrente não impugnou expressamente no seu recurso - não admite recurso de revista, visto que a alçada da Relação é de € 30.000,00?.
Recorde-se o disposto no nº 1 do artigo 629º do CPC? ex vi do nº 1 do artigo 87º do CPT.
Assim, não excedendo o valor da causa o da alçada da Relação ( ou seja € 30.000,00 ) , sendo certo que não se vislumbra que no caso se verifique qualquer dos casos referidos nos nºs 2 e 3 da transcrita norma – nem que isso tenha sido invocado pela recorrente - o recurso de revista interposto pela Autora é inadmissível .
Por outro lado, afigura-se-nos que no caso se verifica dupla conforme.
Assim, atento o disposto no nº 3 do artigo 671º do CPC?, ex vi do nº 1 º do artigo 87º do CPT, ? o recurso também não é admissível sob esse prisma.
E nem se esgrima com a alteração levada a cabo no tocante à resposta do quesito nº 52, visto que a mesma não foi determinante para a decisão do recurso nem determinou fundamentação essencialmente diversa da sentença proferida em 1ª instância.
Tal como se refere em acórdão do STJ , de 28-5-2024, proferido no processo nº 4006/20.5T8PRT.P1.S2,Nº Convencional,2.ª Secção , Conselheiro Fernando Baptista , acessível em www.dgsi.pt:
«II. Não descaracterizam a dupla conforme, enquanto situação processual impeditiva do recurso de revista, nos termos gerais, as alterações factuais operadas pelo Tribunal da Relação sem reflexos na subsunção jurídica» - fim de transcrição.
É o que se passa no caso concreto.
Por estes motivos, decide-se rejeitar a revista interposta pela Autora.
Custas do incidente pela recorrente.
Notifique» .
***
Uma vez que no âmbito do recurso foram arguidas nulidades de acórdão vão os autos aos vistos para, oportunamente , se dar observância ao disposto no artigo 666º do CPC.» - fim de transcrição.↩︎
9. Fls. 1234 a 1236.↩︎
10. De acordo com o qual:
Vícios e reforma do acórdão
1 - É aplicável à 2.ª instância o que se acha disposto nos artigos 613.º a 617.º, mas o acórdão é ainda nulo quando for lavrado contra o vencido ou sem o necessário vencimento.
2 - A retificação ou reforma do acórdão, bem como a arguição de nulidade, são decididas em conferência.↩︎
11. CPC, Anotado , Volume I, Parte Geral e Processo de Declaração, artigos 1º a 702º, de António Santos Abrantes Geraldes, Paulo Almeida e Luís Filipe Pires de Sousa ,Almedina, 2ªedição,pág. 766 , anotação 1.↩︎
12. Segundo essa norma:
1 - Se a questão da nulidade da sentença ou da sua reforma for suscitada no âmbito de recurso dela interposto, compete ao juiz apreciá-la no próprio despacho em que se pronuncia sobre a admissibilidade do recurso, não cabendo recurso da decisão de indeferimento.
2 - Se o juiz suprir a nulidade ou reformar a sentença, considera-se o despacho proferido como complemento e parte integrante desta, ficando o recurso interposto a ter como objeto a nova decisão.
3 - No caso previsto no número anterior, pode o recorrente, no prazo de 10 dias, desistir do recurso interposto, alargar ou restringir o respetivo âmbito, em conformidade com a alteração sofrida pela sentença, podendo o recorrido responder a tal alteração, no mesmo prazo.
4 - Se o recorrente, por ter obtido o suprimento pretendido, desistir do recurso, pode o recorrido, no mesmo prazo, requerer a subida dos autos para decidir da admissibilidade da alteração introduzida na sentença, assumindo, a partir desse momento, a posição de recorrente.
5 - Omitindo o juiz o despacho previsto no n.º 1, pode o relator, se o entender indispensável, mandar baixar o processo para que seja proferido; se não puder ser apreciado o objeto do recurso e houver que conhecer da questão da nulidade ou da reforma, compete ao juiz, após a baixa dos autos, apreciar as nulidades invocadas ou o pedido de reforma formulado, aplicando-se, com as necessárias adaptações, o previsto no n.º 6.
6 - Arguida perante o juiz que proferiu a sentença alguma nulidade, nos termos da primeira parte do n.º 4 do artigo 615.º, ou deduzido pedido de reforma da sentença, por dela não caber recurso ordinário, o juiz profere decisão definitiva sobre a questão suscitada; porém, no caso a que se refere o n.º 2 do artigo anterior, a parte prejudicada com a alteração da decisão pode recorrer, mesmo que a causa esteja compreendida na alçada do tribunal, não suspendendo o recurso a exequibilidade da sentença.↩︎
13. Segundo essa norma:
Erro na forma do processo ou no meio processual
1 - O erro na forma do processo importa unicamente a anulação dos atos que não possam ser aproveitados, devendo praticar-se os que forem estritamente necessários para que o processo se aproxime, quanto possível, da forma estabelecida pela lei.
2 - Não devem, porém, aproveitar-se os atos já praticados, se do facto resultar uma diminuição de garantias do réu.
3 - O erro na qualificação do meio processual utilizado pela parte é corrigido oficiosamente pelo juiz, determinando que se sigam os termos processuais adequados.↩︎
14. Vide obra citada , pág. 766-767., anotação nº 6 ao artigo 617º do CPC↩︎
15. Segundo o qual:
Modificabilidade da decisão de facto
1 - A Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa.
2 - A Relação deve ainda, mesmo oficiosamente:
a) Ordenar a renovação da produção da prova quando houver dúvidas sérias sobre a credibilidade do depoente ou sobre o sentido do seu depoimento;
b) Ordenar, em caso de dúvida fundada sobre a prova realizada, a produção de novos meios de prova;
c) Anular a decisão proferida na 1.ª instância, quando, não constando do processo todos os elementos que, nos termos do número anterior, permitam a alteração da decisão proferida sobre a matéria de facto, repute deficiente, obscura ou contraditória a decisão sobre pontos determinados da matéria de facto, ou quando considere indispensável a ampliação desta;
d) Determinar que, não estando devidamente fundamentada a decisão proferida sobre algum facto essencial para o julgamento da causa, o tribunal de 1.ª instância a fundamente, tendo em conta os depoimentos gravados ou registados.
3 - Nas situações previstas no número anterior, procede-se da seguinte forma:
a) Se for ordenada a renovação ou a produção de nova prova, observa-se, com as necessárias adaptações, o preceituado quanto à instrução, discussão e julgamento na 1.ª instância;
b) Se a decisão for anulada e for inviável obter a sua fundamentação pelo mesmo juiz, procede-se à repetição da prova na parte que esteja viciada, sem prejuízo da apreciação de outros pontos da matéria de facto, com o fim de evitar contradições;
c) Se for determinada a ampliação da matéria de facto, a repetição do julgamento não abrange a parte da decisão que não esteja viciada, sem prejuízo da apreciação de outros pontos da matéria de facto, com o fim de evitar contradições;
d) Se não for possível obter a fundamentação pelo mesmo juiz ou repetir a produção de prova, o juiz da causa limitar-se-á a justificar a razão da impossibilidade.
4 - Das decisões da Relação previstas nos n.os 1 e 2 não cabe recurso para o Supremo Tribunal de Justiça.↩︎