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PRESCRIÇÃO DE CRÉDITOS
PROPOSITURA DA ACÇÃO
CITAÇÃO
Sumário
I- O regime legal previsto no n.º 2 do artigo 323.º do Código Civil pressupõe a verificação de três requisitos cumulativos: (i) que o prazo prescricional ainda esteja a decorrer e assim se mantenha nos cinco dias posteriores à propositura da ação; (ii) que a citação não tenha sido realizada nesse prazo de cinco dias; (iii) que o retardamento na efetivação desse ato não seja imputável ao autor. II- Tendo a petição inicial sido apresentada antes de cinco dias do decurso do prazo prescricional e não tendo a autora praticado ou omitido qualquer ato que tivesse como efeito atrasar o andamento normal do processo, não se lhe pode imputar a circunstância da citação da ré não ter sido realizada no prazo de cinco dias desde a propositura da ação, pelo que a mesma beneficia do regime previsto no n.º 2 do artigo 323.º do Código Civil. (Sumário elaborado pela relatora)
I. Relatório AA (autora) intentou ação declarativa emergente de contrato individual de trabalho, sob a forma de processo comum, contra EMP01..., Lda. (ré), pedindo que a ré seja condenada a pagar-lhe a quantia total de € 28.130,87 resultante das seguintes quantias parcelares:
- € 1.481,82 referente a férias não gozadas de 2022 e vencidas em 1 de janeiro de 2023;
- € 148,17 referente a dias férias não gozadas em 2021 e referentes a 2020;
- € 2.469,70 referente a subsídio de férias e de Natal relativos ao ano de cessação do contrato de trabalho;
- € 1.481,82 de subsídio de férias relativo a 2022 e que se venceu em 1 de janeiro de 2023;
- € 1.185,46 referente a vinte e quatro dias de outubro de 2023, mês da cessação do contrato de trabalho, e € 95,00 respeitantes aos respetivos subsídios de refeição;
- € 178,04 referente ao pagamento das deslocações efetuadas no mês de cessação do contrato de trabalho;
- € 1.172,40 referente a formação profissional não prestada nos últimos três anos;
- € 9.024,40 referente a dias de trabalho realizado em dias de descanso suplementar e dias de descanso obrigatório, não tendo nunca gozado o devido descanso;
- € 10.989,00 relativa a uma hora e meia de trabalho suplementar prestado nos últimos dois anos de trabalho até ao dia 24 de outubro de 2024.
Alegou, em breve resumo, e para o que ora releva, que celebrou com a ré um contrato de trabalho para o exercício de funções de professora, que se iniciou em 1 de setembro de 2010 e terminou em 24 de outubro de 2022, por sua iniciativa. Porém, a ré ficou a dever-lhe os créditos laborais peticionados.
Na sequência de não sido possível alcançar acordo na audiência de partes, a ré apresentou a sua contestação, defendendo-se por exceção e por impugnação. Em matéria de exceção invocou a exceção perentória da prescrição dos créditos reclamados, porquanto foi citada para os termos da ação decorrido mais de um ano sobre o dia seguinte àquele em que cessou o contrato de trabalho, sendo certo que a autora, ao interpor a ação, não requereu a citação urgente da parte contrária. Também deduziu pedido reconvencional.
A autora respondeu.
Em 29 de maio de 2024 foi proferido despacho saneador, no qual se conheceu da exceção da prescrição, que foi julgada procedente e, em consequência, a ré foi absolvida do pedido.
Foi admitido pedido reconvencional e determinado o prosseguimento dos autos para a apreciação deste pedido.
O valor da ação foi fixado em € 30.847,05.
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A autora interpôs recurso da decisão que apreciou a exceção da prescrição, extraindo das suas alegações as seguintes conclusões: «a. Vem o presente recurso interposto do despacho saneador que decidiu julgar totalmente improcedente a presenta ação e consequentemente absolver a R. do pedido formulado pela A. considerando o meritíssimo juiz para tal decisão que “verifica-se a prescrição do crédito invocado pela A., o qual constitui exceção perentória impeditiva daquele direito, e que importa a absolvição total da Ré do pedido por aquela formulado.” b. Prazo de prescrição este que segundo o despacho em causa ocorreria em 24/10/2023, considerando o despacho em causa que tendo a ação dado entrada em tribunal em 19/10/2023, e sendo o prazo para a A. reclamar os seus créditos laborais de um ano, á data de 24/10/2023 o prazo de prescrição não se encontrava em curso, uma vez que estava prescrito. c. Considera o despacho saneador em causa que está provado que a A. se despediu em 24/10/2022, e que a A. deu entrada da presente ação em 19/10/2023. d. Entendemos que houve uma errada interpretação da contagem do prazo estipulado no artigo 337º nº. 1 do Cód. do Trabalho, o prazo não terminava a 24/10/2023, mas sim a 25/10/2023, ou seja, no 6º dia posterior ao da entrada da ação em tribunal. e. E que a sentença de que aqui se recorre padece de nulidades, por violação da alínea c) do nº 1 do artigo 615 do Cód. Processo Civil o qual estatui que 1.É nula a sentença quando: “c) Os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível”; ...” f. Atentos os fundamentos invocados nunca poderia a decisão ser a de absolvição da R. por se verificar a prescrição do crédito invocado pela A., por o prazo de um ano já estava prescrito á data da entrada da ação. g. Sucede que contrariamente ao que consta no despacho o prazo de um ano não terminava a 24/10/2023, mas sim a 25/10/2023, ou seja, no 6º dia posterior ao da entrada da ação em tribunal, dia a partir do qual se considera interrompido o prazo prescricional, (artg. 323º nº 2 do Cód. Civil). h. Errou assim a sentença ao decidir como decidiu, quando face aos factos em que fundamenta a decisão conclui pela prescrição do direito face ao decurso do prazo de um ano previsto no artg. 337º nº. 1 do C.T. Nestes termos, nos melhores de direito aplicável e sempre com o mui douto Suprimento de V.Exas., deverá ser dado integral provimento ao presente recurso de apelação e em consonância, revogada a decisão recorrida, com as demais consequências legais, Como é, aliás, de inteira, JUSTIÇA !».
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Não foram apresentadas contra-alegações.
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A 1.ª instância admitiu o recurso como de apelação, com subida imediata, nos próprios autos.
Apesar de no despacho de admissão ter ficado escrito que o recurso tem efeito suspensivo, afigura-se-nos que se trata de um manifesto lapso material, dado que mais adiante, no mesmo despacho, ficou escrito: «Não obstante o recurso interposto pela Autora não ter efeito suspensivo da decisão proferida, afigura-se-nos que a realização da audiência de julgamento se encontra prejudicada pela decisão que venha a ser proferida pelo Venerando Tribunal da Relação de Évora, uma vez que, sendo dada razão à recorrente, se imporia, no limite, a repetição da audiência de julgamento, o que configura, consequentemente, causa de suspensão da instância (art.º 272.º, n.º 1, in fine, do Código de Processo Civil, ex vi art.º 1.º, n.º 2, alínea a), do Código de Processo do Trabalho). (…)»[2].
Destarte, entendemos que se pretendia atribuir efeito meramente devolutivo ao recurso.
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O processo subiu à Relação.
A Exma. Procuradora-Geral Adjunta emitiu parecer, no qual propugnou pela procedência do recurso.
Não foi oferecida resposta.
O recurso foi mantido nos seus precisos termos, foi elaborado o projeto de acórdão e foram colhidos os visto legais.
Cumpre, em conferência, apreciar e decidir.
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II. Objeto do Recurso
É consabido que o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação da recorrente, com a ressalva da matéria de conhecimento oficioso (artigos 635.º n.º 4 e 639.º n.º 1 do Código de Processo Civil, aplicáveis por remissão do artigo 87.º n.º 1 do Código de Processo do Trabalho).
Em função destas premissas, eis as questões que importa analisar e decidir: (i) nulidade da sentença; (ii) errada apreciação da exceção da prescrição.
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III. Matéria de Facto A matéria de facto a atender é a seguinte: 1. A petição inicial foi apresentada em 19-10-2023, pelas 19h30m14s. 2. O contrato de trabalho que vigorou entre as partes processuais cessou em 24-10-2022. 3. Por despacho prolatado em 27-11-2023 foi designada data para a realização da audiência de partes e foi ordenada a citação da ré. 4. A carta para citação foi remetida à ré em 27-11-2023. 5. A ré foi citada em 29-11-2023.
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Os pontos 1 e 3 a 5 resultam demonstrados pelos elementos constantes do autos e o ponto 2 por acordo das partes.
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IV. Nulidade da sentença
A recorrente arguiu a nulidade da sentença, ao abrigo do disposto no artigo 615.º, n.º 1, alínea c), do Código de Processo Civil.
Apreciemos.
Prescreve o mencionado artigo, aplicável ao processo laboral por força da remissão prevista no artigo 1.º, n.º 2, alínea a), do Código de Processo do Trabalho, que a sentença é nula quando os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível.
No caso que se aprecia, se bem compreendemos, a recorrente entende que a sentença é nula porque houve uma errada interpretação da contagem do prazo estipulado no artigo 337.º, n.º 1, do Código do Trabalho, pois, sustentou, o prazo não terminava em 24-10-2023, mas sim em 25-10-2023, pelo que a decisão nunca poderia ser de absolvição da ré.
Ora, parece-nos que as razões expostas se reconduzem a erro de julgamento e não propriamente à invocação da causa de nulidade prevista na alínea c) do n.º 1 do artigo 615.º do Código de Processo Civil.
Assim sendo, passaremos, de seguida, a apreciar o invocado erro de julgamento que foi mal qualificado pela recorrente como nulidade da sentença.
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V. Sobre a decidida prescrição dos créditos peticionados
Conforme já referimos, importa analisar e decidir se a decisão que julgou improcedente a exceção da prescrição deve ser revogada, por desconforme ao Direito.
Para melhor compreensão, transcreve-se a decisão recorrida (sem as notas de rodapé): «III.i – Prescrição dos créditos da Autora A Autora AA instaurou em 2023/10/19 a presente ação declarativa com forma de processo comum contra a Ré EMP01..., Lda., ambas melhor id. nos autos, peticionando, em suma, a condenação desta a pagar-lhe créditos laborais no valor total de € decorrentes de contrato de trabalho sem termo entre si celebrado e cessado em 2022/10/24, data em que ela própria se despediu.
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Citada em 2023/11/29, contestou a Ré invocando, em suma, e no que ao caso releva, a exceção perentória impeditiva de prescrição dos créditos alegados pela Autora, entendendo que a ação apenas se deve considerar apresentada em juízo em 2023/10/20, por ter sido apresentada fora do horário de funcionamento do tribunal, encontrando-se já decorrido o prazo de 1 ano à data da sua citação e, bem assim, decorridos 5 dias após a instauração da presente ação, enquanto causa interruptiva da prescrição.
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Respondeu a Autora à referida exceção (em sede de resposta à reconvenção), defendendo que a carta por si remetida à Ré e por esta recebida em 2023/09/27 (junta como doc. n.º 3 com a petição inicial), e à qual a mesma respondeu por mensagem de correio eletrónico datada de 2023/10/18 (junta como doc. n.º 1 com o aquele requerimento de resposta), carta a qual é demonstrativa da sua intenção inequívoca de recorrer ao tribunal para reclamar os créditos e que tem efeito interruptivo do prazo de prescrição respetivo, defendendo assim implicitamente a improcedência da exceção de prescrição.
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Apreciando. Dispõe o art.º 337.º, n.º 1, do Código do Trabalho que “[o] crédito de empregador ou de trabalhador emergente de contrato de trabalho, da sua violação ou cessação prescreve decorrido um ano a partir do dia seguinte àquele em que cessou o contrato de trabalho.”. O Código Civil não acolhe uma noção de prescrição. A prescrição é um instituto que se funda num facto jurídico involuntário: o decurso do tempo. Invocada com êxito, a prescrição determina a paralisação de direitos, sempre que os mesmos não sejam exercidos, sem uma justificação legítima, durante um certo lapso de tempo fixado por lei. Confere-se, assim, ao beneficiário da prescrição, o poder ou faculdade de recusar, de modo lícito, a realização da prestação devida1. Não obstante, o prazo de prescrição pode suspender-se ou interromper-se, contanto que sejam observadas as causas respetivas. Assim, estatui o art.º 323.º, n.º 1, do Código Civil que “[a] prescrição interrompe-se pela citação ou notificação judicial de qualquer ato que exprima, direta ou indiretamente, a intenção de exercer o direito, seja qual for o processo a que o ato pertence e ainda que o tribunal seja incompetente”, prevendo ainda o seu n.º 4 que “[é] equiparado à citação ou notificação, para efeitos deste artigo, qualquer outro meio judicial pelo qual se dê conhecimento do ato àquele contra quem o direito pode ser exercido.”. Nos termos do disposto no art.º 325.º, n.º 1, do Código Civil “[a] prescrição é ainda interrompida pelo reconhecimento do direito, efetuado perante o respetivo titular por aquele contra quem o direito pode ser exercido.”. Sendo que a interrupção da prescrição implica a inutilização para a prescrição do tempo decorrido anteriormente, começando a correr novo prazo a partir do ato interruptivo (art.º 326.º, n.º 1, do Código Civil). Com efeito, a interrupção da prescrição desencadeada por ato do credor pressupõe um ato judicial que, direta ou indiretamente, dê a conhecer ao devedor a intenção do credor exercer a sua pretensão, sendo que nem todo o ato do credor tem o efeito de interromper a prescrição, exigindo-se, assim, que o mesmo assuma determinada forma, para ser relevante2. O credor tem assim de dar conhecimento ao devedor da intenção de exercício do seu direito através de citação do Réu – na sequência da propositura de uma ação –, de notificação judicial ou de outro meio judicial3. Isto mesmo vem sendo sublinhado pela jurisprudência dos nosso Supremo Tribunal de Justiça, a qual vem decidindo que “[n]ão basta o exercício extrajudicial do direito para interromper a prescrição: é necessária a prática de atos judiciais que, direta ou indiretamente, dêem a conhecer ao devedor a intenção de o credor exercer a sua pretensão”, pelo que “[o] envio de comunicações extrajudiciais não é, pois, meio idóneo para operar a interrupção da prescrição.”4. Proposta que seja a ação, dispõe ainda o art.º 323.º, n.º 2, do Código Civil que “[s]e a citação ou notificação se não fizer dentro de cinco dias depois de ter sido requerida, por causa não imputável ao requerente, tem-se a prescrição por interrompida logo que decorram os cinco dias.”. Este normativo veio estabelecer um mecanismo de acautelamento da posição do titular do direito, a hipótese de a citação ou a notificação não se realizar no prazo de cinco dias depois de ter sido requerida, por causa não imputável ao requerente, eventualidade em que opera logo que decorram os cinco dias5. Como limpidamente se explica na nossa jurisprudência de referência sobre o tema in krisis6, para que o Autor possa beneficiar do efeito interruptivo da prescrição, previsto no n.º 2 do artigo 323.º do Código Civil, é necessário que: i. O prazo de prescrição ainda esteja a decorrer e assim se mantenha nos cinco dias posteriores à propositura da ação; ii. A citação não tenha ainda sido realizada nesse prazo de cinco dias; e iii. O retardamento na efetivação desse ato não seja imputável ao Autor. Ora, no caso dos autos (e por acordo das partes) temos que o contrato de trabalho celebrado entre si cessou em 2022/10/24. Pelo que o prazo de prescrição dos créditos laborais dali emergentes ocorreria em 2023/10/24. A Autora apresentou judicialmente a petição inicial em 2023/10/19 (e não em 2023/10/20, como alega a Ré, uma vez que, tendo a petição inicial sido remetida por via eletrónica – meio processualmente obrigatório, nos termos do disposto no art.º 144.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, ex vi art.º 1.º, n.º 2, alínea a), do Código de Processo do Trabalho – podê-lo-ia ter sido até às 23h59m59s do mesmo dia, tendo-o sido às 19h30m14s). Tendo a Ré sido citada apenas em 2023/11/29, poderia a Autora beneficiar da interrupção ocorrida por decurso do prazo de cinco dias após a apresentação da petição inicial em juízo. Sucede que no 5.º dia posterior à entrada da petição inicial em juízo (2023/10/24) o prazo de prescrição não se encontrava em curso, uma vez que estava já prescrito. Ou seja, o decurso dos 5 dias posteriores à entrada em juízo da petição inicial (equivalente ao pedido de citação da Ré) não teve a virtude de interromper o prazo de prescrição em apreço porque, à luz dos ensinamentos da jurisprudência supra citada, o mesmo já não se encontrava em curso. No mesmo sentido, não se extrai da mensagem de correio eletrónica datada de 2023/10/18 enviada pela Ré ao Il. Mandatário da Autora qualquer reconhecimento – expresso ou tácito – do crédito por esta aqui invocado (muito pelo contrário, daquela missiva resulta mesmo uma negação implícita do mesmo), pelo que não opera também a causa interruptiva ocorrida por ato da Ré, nos termos do disposto no art.º 325.º, n.ºs 1 e 2, do Código Civil. Verifica-se, assim, a prescrição do crédito invocado pela Autora, a qual constitui exceção perentória impeditiva daquele direito, e que importa a absolvição total da Ré do pedido por aquela formulado (artigos 576.º, n.ºs 1 e 3, e 579.º do Código de Processo Civil e 303.º do Código Civil), o que se decidirá infra, em conformidade.
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Pelo exposto, decido julgar a ação totalmente improcedente e, consequentemente, absolver a Ré EMP01..., Lda. do pedido formulado pela Autora AA.».
Adianta-se que não sufragamos a decisão recorrida.
Expliquemos porquê.
Dispõe o normativo inserto no n.º 1 do artigo 337.º do Código do Trabalho que o crédito de empregador ou de trabalhador emergente de contrato de trabalho, da sua violação ou cessação prescreve decorrido um ano a partir do dia seguinte àquele em que cessou o contrato de trabalho.
A prescrição, como é consabido, constitui uma forma extintiva de direitos pelo seu não exercício por um dado lapso de tempo fixado na lei.
Nos contratos de trabalho todos os créditos resultantes da sua execução, violação ou cessação se não forem reclamados no prazo de um ano contado a partir do dia seguinte àquele em que cessou o vínculo contratual, os mesmos extinguem-se por efeito da prescrição.
Por sua vez, estipula o n.º 1 do artigo 323.º do Código Civil que a prescrição se interrompe pela citação ou notificação judicial de qualquer de qualquer ato que exprima, direta ou indiretamente, a intenção de exercer o direito, seja qual for o processo a que o ato pertence e ainda que o tribunal seja incompetente.
E o n.º 2 do normativo prescreve que se a citação ou notificação não se fizer dentro de cinco dias depois de ter sido requerida, por causa não imputável ao requerente, tem-se a prescrição por interrompida logo que decorram os cinco dias.
Sobre o regime previsto nesta última norma, pode ler-se no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 19-12-2012 (Proc. n.º 3134/07.7TTLSB.L1.S1), acessível em www.dgsi.pt: «Como vem sendo a jurisprudência deste Supremo Tribunal de Justiça, «O efeito interruptivo da prescrição, estabelecido no n.º 2, do art. 323.º do CC, pressupõe a concorrência de três requisitos: (i) que o prazo prescricional ainda esteja a decorrer e assim se mantenha nos cinco dias posteriores à propositura da ação; (ii) que a citação não tenha sido realizada nesse prazo de cinco dias; (iii) que o retardamento na efetivação desse ato não seja imputável ao autor. Este último requisito deve ser interpretado em termos de causalidade objetiva, ou seja, a conduta do requerente só exclui a interrupção da prescrição quando tenha infringido objetivamente a lei, em qualquer termo processual, até à verificação da citação». (cf. acórdão de 03-10-2007, (Proc. n.º 07S359), relatado pelo Conselheiro Sousa Grandão).»
Com interesse para a apreciação do caso que nos ocupa, transcreve-se, igualmente, um pequeno segmento do acórdão proferido por esta Secção Social de Évora em 18-09-2007 (Proc. n.º 1785/07-2), publicado na base de dados supramencionada: «A lei, no já citado art. 323º nº2 Código Civil, exige apenas duas coisas para que a ocorra a interrupção da prescrição: - Que a citação seja requerida cinco dias antes do decurso do prazo prescricional; - A inexistência de qualquer causa imputável ao requerente que obste à citação. Como se refere no Acórdão da Relação de Lisboa de 6/12/2001 [3] a nossa jurisprudência tem entendido que o credor, no exercício do seu direito, não tem de prevenir as dificuldades que podem advir da orgânica judiciária, da regulamentação legal vigente quanto ao processamento das ações e das realidades práticas, para o bom andamento do seu pedido de citação do devedor. Acrescenta-se ainda que se trata de dificuldades que, mesmo pressupondo um bom funcionamento da máquina judiciária, levam a que nunca ou quase nunca uma citação seja feita até ao quinto dia posterior à dedução do respetivo requerimento, considerados os prazos de que dispõem as secretarias para a prática dos atos necessários. Face a esta realidade bem conhecida do legislador temos de entender que a não efetivação da citação no prazo de cinco dias só se pode considerar imputável ao requerente se este infringir alguma obrigação legalmente imposta para a formulação do respetivo pedido. A lei, não exige ao requerente, uma diligência excecional exigindo-lhe apenas que requeira a citação cinco dias antes do decurso do prazo prescricional e que cumpra as obrigações legalmente impostas para a formulação do respetivo pedido. Assim, parece-nos não ser exigível que o requerente, nestas situações, utilize o mecanismo da citação urgente prevista no art. 478º do Código de Processo Civil. A citação urgente deve sim ser utilizada, nos casos em que o Autor requeira a citação sem respeitar o prazo de cinco dias a que se refere o art. 323º nº2 do Código Civil». . No vertente caso, o contrato de trabalho que vigorou entre as partes processuais cessou em 24 de outubro de 2022, pelo que o prazo prescricional previsto no n.º 1 do artigo 337.º do Código do Trabalho terminaria às 24 horas do dia 25 de outubro de 2023.
Dado que a petição inicial foi apresentada em 19 de outubro de 2023, conclui-se que a ação foi intentada antes de cinco dias do final do prazo prescricional.
A recorrente não praticou ou omitiu qualquer ato que tivesse como efeito atrasar o andamento normal do processo, razão pela qual não pode se lhe pode imputar a circunstância da citação da recorrida não ter sido realizada no prazo de cinco dias desde a propositura da ação.
Pelo exposto, considerando-se verificados em concreto os requisitos previstos no n.º 2 do artigo 323.º do Código Civil, não obstante a ré apenas tenha sido citada em 29 de novembro de 2023, a prescrição interrompeu-se antes de decorrido o prazo prescricional.
Concluindo, o recurso mostra-se procedente, pelo que o despacho recorrido terá de ser revogado.
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VI. Decisão
Nestes termos, acordam os juízes da Secção Social do Tribunal da Relação de Évora em julgar o recurso procedente, e, em consequência, revogam a decisão recorrida, julgando-se improcedente a exceção perentória da prescrição, devendo os autos seguir os seus normais termos.
Custas pela parte vencida a final.
Notifique.
Évora, 16 de dezembro de 2024 Paula do Paço João Luís Nunes Mário Branco Coelho
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[1] Relatora: Paula do Paço; 1.º Adjunto: João Luís Nunes; 2.º Adjunto: Mário Branco Coelho
[2] Sublinhado da nossa responsabilidade.