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RESPONSABILIDADE CIVIL
DOLO
INTERESSE CONTRATUAL NEGATIVO
DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA
ABUSO DO DIREITO
Sumário
I - Integra o conceito de dolo, enquanto facto ilícito, (artigo 254º do C.Civil), a atuação concertada do funcionário da autora, da sua irmã e cunhado, os quais, atuando sob a veste de sociedades comerciais que criaram e geriram para o efeito, convenceram a autora de que destinavam os produtos que aquela lhes vendia ao abrigo de contratos de distribuição, à revenda dos mesmos no mercado africano, onde a autora queria implementar os negócios, enganando-a, pois que nenhum produto aí venderam. II - Esse artifício assim criado, permitiu-lhes a obtenção dos produtos comercializados pela autora a um preço muito inferior ao que habitualmente a autora praticava, e pelo qual aquela nunca lhos teria vendido não fosse o engano, situação que permitiu àquelas sociedades a obtenção duma margem de lucro na revenda dos mesmos no mercado europeu que doutra forma não obteriam, causando à autora prejuízos. III - A obrigação de indemnizar a Autora ocorre por efeito do dolo e é autónoma relativamente à anulabilidade dos contratos celebrados. IV - Destina-se a indemnização, a reparar o interesse contratual negativo, ou seja, o prejuízo que a autora teve com o facto de se ter realizado os contratos, ou por outras palavras, o prejuízo que ela não teria sofrido se os contratos não tivessem sido celebrados. V - A figura da desconsideração da personalidade jurídica, assente no abuso de direito (art. 334º do C.Civil) que ocorre quando a personalidade coletiva é usada de modo ilícito ou abusivo, para prejudicar terceiros, consistindo numa utilização da mesma contrária a normas ou princípios gerais, incluindo a ética dos negócios, permite que a obrigação de indemnização devida à autora em consequência da atuação ilícita dolosa, seja estendida a todas as pessoas singulares (os sócios e terceiro), que em conluio, atuaram sob a veste societária. VI - Inexistindo dúvidas que as regras de Direito Europeu aplicáveis não podiam proibir a autora de impedir a livre exportação dos seus produtos entre Estados-Membros, mostra-se desnecessário lançar mão do mecanismo do reenvio prejudicial previsto no artigo 267.º do TFUE.
Texto Integral
7262/21.8T8VNG.P1
Tribunal de origem: Tribunal Judicial da Comarca do Porto Juízo Central Cível de Vila Nova de Gaia - Juiz 2
A..., SOCIEDADE UNIPESSOAL, LDA, com sede na Estrada ..., ... ..., intentou ação de condenação, sob a forma comum, contra AA, residente na Quinta ..., ..., ... ..., BB, residente na Rua ..., ... ..., CC, residente na Rua ..., ... ..., B..., S.A., com sede na Rua ..., ... ... - ..., e C..., UNIPESSOAL, LDA, com sede na Rua ..., ... ... - ..., pedindo:
a) A condenação solidária dos Réus B..., AA, CC e BB no pagamento da quantia de €5.147.793,00, acrescida de juros de mora desde a data de citação até integral pagamento, relativa à margem perdida pela Autora e pelas suas congéneres europeias, fruto das vendas de Accu-Chek Aviva 50T, pela Ré B... na Europa, durante a vigência do Contrato de Distribuição Exclusiva;
b) A condenação solidária dos Réus B..., AA, CC e BB no pagamento da quantia ainda a liquidar nos autos ou em sede incidental, relativa à margem perdida pela Autora e pelas suas congéneres europeias, fruto das vendas de Accu-Chek Aviva 50T, pela Ré B... na Europa, previamente à vigência do Contrato de Distribuição Exclusiva;
c) A condenação solidária dos Réus C..., AA, CC e BB no pagamento da quantia ainda a liquidar nos autos ou em sede incidental, relativa à margem perdida pela Autora e pelas suas congéneres europeias, fruto das vendas de Accu-Chek Aviva 50T, pela Ré C... na Europa, no período em que esta adquiriu e revendeu produtos da Autora.
Para tanto alega, em síntese, que é uma sociedade de direito português, cujo objeto social é o comércio, a importação e a venda de reagentes, equipamentos e testes de diagnóstico médico e produtos para investigação, sendo titular do seu capital social a sociedade D..., Lda, igualmente de direito português, que tem por objeto social a importação e comércio de produtos farmacêuticos, químicos, biológicos de higiene, vitamínicos, veterinários, dietéticos, aromáticos, de diagnóstico e de aparelhos bioelectrónicos, sendo o capital social desta maioritariamente detido diretamente pela E... (67,5%), sociedade de direito suíço, que, no mercado global e por intermédio de mais de uma centena de subsidiárias, desenvolve a sua atividade nos setores farmacêutico e de diagnóstico, sendo o remanescente do capital detido pela mesma holding, por intermédio da DD (...).
Mais alega que uma das áreas de negócio a que as subsidiárias da E... se dedicam é o setor do “diabetes care”, nas vertentes de pesquisa, desenvolvimento e comercialização de produtos destinados à monitorização da glicémia dos pacientes.
Entre esses produtos encontra-se o aparelho “Accu-Chek Aviva”, que tem por função medir a glicémia analisando, por intermédio de infravermelhos, uma pequena quantidade de sangue do paciente, colocada numa “tira de teste, sendo que essas tiras são vendidas em embalagens de 50 unidades, com designação comercial de “Accu-Chek Aviva 50T”.
A E..., por motivos, essencialmente, ligados ao adequado fornecimento e monitorização de cada país, privilegia o fornecimento de cada mercado nacional pela sua subsidiária a atuar localmente.
Mais alega que o Réu AA foi funcionário da Autora entre 1.05.2002 e 16.12.2016, desempenhando várias funções, entre as quais, para o período que releva para a presente ação, o cargo, cumulado de Head of Market Access, função que inclui a introdução do produto da Autora nos seus vários mercados e canais de venda, e de Key Account Manager, função que compreende a gestão dos principais clientes da Autora.
A Ré B... é uma sociedade anónima, constituída pelo Réu AA em 30.01.2014, cujo capital social a este pertenceu diretamente (sendo titular de 99,6% do capital social) até 04.10.2018, data a partir da qual passou a pertencer-lhe indiretamente (sendo titular daqueles 99,6% do capital social por intermédio da F... SGPS, cujo capital social pertence ao Réu AA à razão de 99,9 %.
A Ré BB é irmã do Réu AA, sendo casada com o Réu CC.
A referida BB, em 30.01.2014, constitui a Ré B... juntamente com o Réu AA, sendo então titular de 0,1% do capital social daquela, tendo sido sua administradora única até 12.12.2014.
Tal Ré, em 09.04.2014 constituiu a Ré C..., sendo titular da sua única quota e gerente da mesma, cargo que exerceu até 25.06.21, data em que renunciou à gerência, que passou a caber ao Réu AA.
Quanto ao Réu CC, foi o mesmo administrador único da B... entre 12.12.2014 e 22.05.2017, tendo em 9.10.2017 sido designado vogal do conselho de administração da Ré B..., cargo que mantém na data de propositura da presente ação.
Mais alega que embora não tendo exercido cargos de gerência na Ré C..., foi este que representou tal sociedade nos contactos com a Autora que relevam nos presentes autos.
Alega que o Réu AA, ao arrepio do estabelecido no código de conduta aplicável aos funcionários da Autora quanto a conflito de interesses, estabeleceu relações comerciais com a Autora e geriu-as enquanto Head of Market Access & Key Account Manager desta, o mesmo sucedendo com os demais Réus pessoas singulares, sendo que todos tinham conhecimento dessas restrições e por essa razão ocultaram, nos contactos mantidos com os superiores hierárquicos do primeiro, o relacionamento familiar que os unia.
Descreve a forma como tais relações comerciais se estabeleceram, envolvendo os segundo e terceiro Réus, as Rés pessoas coletivas, e foram geridas pelo Réu AA.
Alega que a B..., no período que decorreu entre 24.02.2014 e 31.12.2017, essa gestão permitiu-lhe beneficiar de uma margem que ascendeu a €6.359.243,78.
Alegou que entre fevereiro de 2014 e fevereiro de 2018, a Autora vendeu a clientes não finais, isto é, que procederiam à revenda do Accu-Chek Aviva 50T, um total de 3.356.503 embalagens, sendo 2.039.939 embalagens vendidas ao preço de €16,34 e 1.316.564 a €9,00 e €10,00 e que estas últimas foram vendidas às Rés B... e C....
Para tanto, alegou que os Réus, concertados entre si, e servindo-se as pessoas singulares das sociedades, levaram a cabo um plano em que lograram adquirir, enganando a Autora, mais de duas centenas de milhar de embalagens de Accu-Chek Aviva 50T ao preço de, inicialmente, €10,00, e posteriormente de €9,00, fazendo-lhe crer que as destinavam aos mercados africanos e que esse era o preço possível de praticar em tais mercados (preço de mercado africano), quando, na verdade, as revenderam integralmente na Europa, sensivelmente ao mesmo preço que a Autora vendeu o mesmo produto a todas as outras suas clientes (preço de mercado europeu), entre os €15,50 e os €17,00, o que tendo em conta o preço e as quantidades obtidas lhes proporcionou margens de lucros elevadas.
Mais alega que dessa conduta lhe resultaram danos, no mercado europeu, que enumera, correspondentes às margens auferidas pelos Réus.
Regularmente citados, contestaram os Réus em 7.12.2021.
Defenderam-se por impugnação para, no essencial, alegarem que as relações comerciais entre as Rés sociedades e a Autora se iniciaram em 2014, sem que houvesse qualquer tipo de restrição quanto ao mercado de destino dos produtos adquiridos, imposição que igualmente se não poderia verificar por força do princípio da livre circulação de pessoas e bens que vigora no espaço comunitário, que foi a Autora que livremente fixou o preço, o qual era aplicado a outras suas clientes, que apenas a Ré B... celebrou o contrato de distribuição exclusiva, que foi a liderança da Autora que fomentou, para melhorar o seu desempenho e evitar o encerramento, a exportação paralela dos produtos e que os clientes para os quais a B... vendeu os produtos adquiridos à Autora não eram previamente clientes desta, motivo pelo qual caso a B... não os tivesse angariado o grupo E... não teria concretizado essas vendas,
Mais alegou que o grupo E... não permite que as suas subsidiárias locais exportem diretamente para os mercados de outros Estados-Membros, o que determina que a Autora apenas possa vender os seus produtos no mercado português.
Alegou que o Réu AA não geria os grandes clientes nem poderia, sozinho, numa multinacional como aquela em que a Autora se integra, tomar as decisões que lhe são imputadas, já que está dependente de uma pluralidade de departamentos que verificam os pressupostos quer para a abertura de clientes, quer para a fixação de preço, quer para a gestão comercial.
Mais alega que a Autora alude indistintamente às pessoas singulares e coletivas, desprezando a autonomia da personalidade jurídica de que gozam umas e outros.
Alegam ainda que as Rés pessoas coletivas, até por imperativo das interpretações que ao Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia vêm a ser feitas pelo TJUE quanto à matéria de concorrência, não podem ser coartadas pela Autora, no desenvolvimento da sua atividade, quanto aos mercados de destino dos produtos que a esta adquirem, gozando de total liberdade.
Mais alegam que o preço por unidade do produto às Rés sociedades era um preço habitualmente praticado pela Autora a clientes seus, inexistindo qualquer situação de favor em relação a estas.
Invocam ainda que a Autora, perante a iminência do seu encerramento por falta de volume de faturação que cumprisse os objetivos de um novo plano que ira ser implementado forjou os negócios com os Palop’s, que sabia não terem capacidade para absorver as quantidades de produtos que às Rés pessoas coletivas eram vendidas, bem sabendo que estes se destinavam à exportação paralela, prática que fomentava, apenas e tão só para elevar o valor da faturação e evitar o seu encerramento, tudo não passando de uma ficção para enganar a casa-mãe.
Impugna que à Autora tenham sido causados quaisquer prejuízos, tanto mais que esta lucrou com a atividade do Ré AA e das Rés pessoas coletivas.
Em 16.02.2022 e na sequência do despacho proferido, exerceu a Autora o direito ao contraditório.
A Autora formulou pedido de ampliação do pedido, que foi indeferido, por despacho de 30.9.2022 transitado em julgado.
Realizou-se a audiência prévia e frustrada que ficou a tentativa de conciliação das partes foi proferido despacho a fixar o valor da ação, sendo de seguida o processo tabelarmente saneado, fixado o objeto do litígio e enunciados os temas de prova, que não foi objeto de qualquer reclamação.
Realizou-se a audiência final e no final, foi proferida sentença com o seguinte dispositivo[2]: “Pelo exposto, e ao abrigo das disposições legais citadas, julgo a presente ação provada e procedente e, em consequência, decido: a) Condenar solidariamente os Réus B..., AA, CC e BB no pagamento à Autora a quantia de €5.147.793, acrescida de juros de mora, à taxa legal de 4%, contados desde a data da citação e até efetivo e integral pagamento, relativa à margem perdida pela Autora, fruto das vendas de Accu-Chek Aviva 50T, pela Ré B... na Europa, durante a vigência do Contrato de Distribuição Exclusiva; b) Condenar solidariamente os Réus B..., AA, CC e BB no pagamento à Autora da quantia, ainda a liquidar em sede incidental, relativa à margem perdida pela Autora, fruto das vendas de Accu-Chek Aviva 50T, pela Ré B... na Europa, previamente à vigência do Contrato de Distribuição Exclusiva; “Condenar solidariamente os Réus C... AA, CC e BB no pagamento à Autora da quantia, ainda a liquidar em sede incidental, relativa à margem perdida pela Autora, fruto das vendas de Accu-Chek Aviva 50T, pela Ré C... na Europa, no período em que esta adquiriu e revendeu produtos da Autora. Custas a cargo dos Réus (art. 527º n.º 1 do C.P.C.).”
Inconformados os Réus AA, BB, CC,B..., S.A. e C..., UNIPESSOAL, LDA. vieram interpor o presente recurso de APELAÇÃO, tendo apresentado as seguintes conclusões: A) INTRODUÇÃO 1. O tribunal a quo andou mal ao julgar a presente ação procedente, uma vez que considerou provados factos que, face à prova produzida ou por serem completa ou parcialmente conclusivos, não o deveriam ter sido, e considerou não provados factos que, face à prova produzida, o deveriam ter sido. Além disso, não considerou outros factos que, tendo resultado da instrução da causa, deveriam ter sido considerados provados. 2. Acresce que a sentença recorrida violou as regras do ónus da prova: d) Ora considerou provados determinados factos sobre os quais a A. não fez qualquer prova, pelo que deveriam, evidentemente, ter sido considerados não provados; e) Ora considerou provados determinados factos relativamente aos quais os Réus conseguiram fazer prova do contrário, pelo que deveriam, evidentemente, ter sido considerados não provados; f) Ora considerou provados determinados factos relativamente aos quais os Réus, mediante contraprova, criaram legítima e fundada dúvida ou incerteza acerca da verdade dos mesmos, pelo que deveriam ter sido decididos contra a parte onerada com a prova, a A. (cf. artigo 346.º do Código Civil). B) EXCEÇÃO DILATÓRIA DE DEDUÇÃO DE PEDIDO GENÉRICO FORA DO CONDICIONALISMO LEGAL 3. No segmento decisório b) da sentença recorrida, o Tribunal a quo condenou solidariamente os Réus B..., AA, CC e BB no pagamento à Autora da quantia, ainda a liquidar em sede incidental, relativa à margem perdida pelo Autora, fruto das vendas de Accu-Chek Aviva 50T, pela Ré B... na Europa, previamente à vigência do Contrato de Distribuição Exclusiva. Tal condenação vem na sequência do pedido (iv) formulado na petição inicial. 4. Sucede que, quanto a este pedido, a A. estava em condições de o liquidar quando apresentou a petição inicial uma vez que dispunha dos elementos necessários para o efeito, mas optou por não o fazer e aguardar por momento posterior, sendo que o artigo 556.º do CPC não permite que se relegue para momento posterior a liquidação dos danos alegadamente sofridos pela parte que, estando em condições de determinar as consequências do facto supostamente ilícito quando apresentou a petição inicial, não o fez por opção própria. 5. A dedução de pedido genérico fora do condicionalismo legal reconduz-se a uma exceção dilatória inominada, de conhecimento oficioso (cf. artigos 578.º e 608.º, n.º 3 do CPC), que implica a absolvição dos Réus instância, o que se requer, ao menos quanto ao pedido formulado em (iv) da petição inicial o que aqui se requer seja declarado (cf. artigos 576.º, n.º 2, 577.º, 278.º, n.º 1, alínea d), 573.º, n.º 2 e 578.º do CPC). C) IMPUGNAÇÃO DA DECISÃO RELATIVA À MATÉRIA DE FACTO 6. Em face da prova produzida nos autos e pelas razões e com base nos meios probatórios expostos e identificados na alegação / motivação, impugna-se a decisão proferida sobre os factos 7, 8, 9, 29, 30, 31, 32, 33, 35, 35, 53, 54, 61, 62, 64, 69, 70, 75, 76, 77, 78, 79, 81, 85, 86, 87, 88, 90, 91, 92, 95, 106, 107, 108, 109, 110, 111, 112, 113, 114, 115, 116, 117, 120, 123, 124, 125, 126, 127, 138, 139, 141, 142, 144, 146, 148, 153, 154, 156, 161, 166, 168, 172, 178, 179, 180, 181, 182, 183, 185, 186, 187, 188, 190, 191, 192, 193, 194, 195, 196, 199, 200, 201, 202, 203, 204, 205, 206, 209, 210 e 211, devendo, em consequência, ser proferida decisão que os julgue não provados. 7. Em face da prova produzida nos autos e pelas razões e com base nos meios probatórios expostos e identificados na alegação / motivação, a decisão proferida sobre o facto 28) é impugnada, por conter expressões conclusivas e a redação não ser clara, devendo ser proferida decisão que o julgue provado mas com a seguinte redação: 28) Embora não tenha formalmente exercido cargos de gerência da Ré C..., o Réu CC foi o interlocutor da C... com a A. na correspondência trocada entre ambas que consta dos autos. 8. Em face da prova produzida nos autos e pelas razões e com base nos meios probatórios expostos e identificados na alegação / motivação, a decisão proferida sobre o facto 35 é impugnada, devendo ser proferida decisão que elimine a expressão “afirmando representar uma sociedade denominada “G...””. 9. Em face da prova produzida nos autos e pelas razões e com base nos meios probatórios expostos e identificados na alegação / motivação, a decisão proferida sobre o facto 40 é impugnada, devendo ser proferida decisão que o julgue provado mas com a seguinte redação: 40) O preço indicado pelo Réu AA para o Accu-Chek Aviva 50T ser vendido ao Réu CC era um preço habitual e recorrente praticado pela Autora para o tipo de clientes referidos na alínea b) do facto 212). Sem prescindir, não sendo julgada procedente a impugnação da matéria provada no facto 212 (no que não se concede), impugna-se igualmente a decisão proferida sobre o facto 40, devendo, nesse caso, ser proferida decisão que julgue provado o facto 40 mas com a seguinte redação: 40) O preço indicado pelo Réu AA para o Accu-Chek Aviva 50T ser vendido ao CC era um preço habitual e recorrente praticado pela Autora. 10. Em face da prova produzida nos autos e pelas razões e com base nos meios probatórios expostos e identificados na alegação / motivação, a decisão proferida sobre o facto 46 é impugnada, devendo ser proferida decisão que julgue o mesmo provado mas com a seguinte redação (em termos semelhantes aos alegados pelos Réus nos artigos 91.º e 92.º da contestação): 46) Em termos práticos, a área de negócios Diabetes Care Portugal recorre aos serviços dos departamentos comercial, encomendas, qualidade, concursos, financeiro e logística da Autora para o desenvolvimento da sua atividade, sendo que, na abertura de um novo cliente, o departamento financeiro tinha a função de analisar e verificar o perfil do cliente que estava a ser proposto com recurso à base de dados da Dun & Bradstreet (designadamente para verificar se tinha credibilidade suficiente para negociar o prazo de pagamento), e o departamento de qualidade tinha a função de verificar o cumprimento dos processos internos. 11. Em face da prova produzida nos autos e pelas razões e com base nos meios probatórios expostos e identificados na alegação / motivação, a decisão proferida sobre o facto 64 é impugnada, devendo proferida decisão que julgue tal facto provado mas com a seguinte redação (cf. documento n.º 18 junto com a petição inicial): 64) A 11 de abril de 2014, dois dias após a constituição da Ré C..., o Réu CC, em representação da Ré C..., remeteu um e-mail para o endereço eletrónico pertencente ao departamento de encomendas da Autora, com o seguinte teor: “Exmºs Senhores; Gostaríamos de obter preços para aquisição de produtos Accu Check Aviva, Accu Check Performa, Accu Check Sensor e também para Lancetas. Quantidade média de compra mensal – 3000 Embalagens Destino – África (…) – cfr. documento 18, anexo à petição inicial, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido. 12. Em face da prova produzida nos autos e pelas razões e com base nos meios probatórios expostos e identificados na alegação / motivação, a decisão proferida sobre o facto provado 82), na parte em que refere “Esta nova tese contrariava toda a correspondência trocada entre fevereiro de 2014 e dezembro de 2016 e determinou que”, é impugnada, devendo, em resultado da impugnação que acima se fez sobre factos de que estes dependiam (designadamente a impugnação do facto 40 e o pedido de inclusão dos factos 363 a 372), ser proferida decisão que o julgue (ao menos no que diz respeito àquela expressão) não provado. Como consequência lógica, a fórmula verbal “suspendesse” constante desse facto deve ser substituída por “suspendeu”, requerendo-se que seja proferida decisão nesse sentido. 13. Em face da prova produzida nos autos e pelas razões e com base nos meios probatórios expostos e identificados na alegação / motivação, a decisão proferida sobre o facto 93 é impugnada, devendo ser proferida decisão que faça corresponder a sua redação ao alegado pela A. no artigo 99.º (que constitui uma confissão), aditando-se ao facto 93 a referida expressão, nos seguintes termos: 93) A Autora, na sequência da crise que assolou Portugal a partir de 2011, sentiu a necessidade de se expandir para outros mercados, tendo o mercado angolano surgido como alvo apetecível. 14. Em face da prova produzida nos autos e pelas razões e com base nos meios probatórios expostos e identificados na alegação / motivação, a decisão proferida sobre o facto 95 é impugnada, devendo ser proferida decisão que substitua “2013” por “2012”. 15. Em face da prova produzida nos autos e pelas razões e com base nos meios probatórios expostos e identificados na alegação / motivação, a decisão proferida sobre o facto 99 é impugnada, devendo ser proferida decisão que julgue o mesmo provado mas com seguinte redação: 99) Em 2013, o funcionário da Autora com maior conhecimento do mercado angolano era EE. Ou, em alternativa, deve ser proferida decisão que o julgue não provado (por não ter sido produzida prova sobre o mesmo) ou não escrito (por ser de natureza conclusiva). 16. Em face da prova produzida nos autos e pelas razões e com base nos meios probatórios expostos e identificados na alegação / motivação, a decisão proferida sobre os factos provados 101, 102 e 103 é impugnada, deve ser proferida decisão que julgue os mesmos provados mas com a seguinte redação e retirando deles as expressões conclusivas (em consonância, aliás, com o facto provado 229, e designadamente com fundamento no alegado nos artigos 167.º, alínea b), 216.º, e 262.º da contestação): 101) Em Setembro de 2013, o Réu AA apresentou à sua equipa na Autora um business plan para o mercado angolano (cf. documento n.º 24 anexo à petição inicial, cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido). 102) O business plan referido em 101) foi elaborado pelo Réu AA e por EE, tendo este último sido o autor (i) das páginas 5 e 6 (informação relativa ao número de diabéticos em Angola, em que se estimava que a população diabética em Angola, em 2012, fosse de cerca de 221.578 pessoas (das quais apenas 67.486 diagnosticadas), prevendo-se um crescimento para 431.579 pessoas (das quais apenas 172.632 diagnosticadas) em 2030) e (ii) das páginas 30 e 31 (capítulo D, referentes aos “Expected Outcomes”, i.e., Resultados Estimados, em que se previa o seguinte: estimavam-se vendas (“Sales”) de tiras de testes de diabetes (“Strips”) no valor de € 331.550 em 2013, € 495.425 em 2014, € 913.900 em 2015, € 1.265.400 em 2016, € 1.651.575 em 2016, e € 1.901.425 em 2018; estimava-se que o custo (“Cost of Goods”) de tiras de testes de diabetes (“Strips”) fosse de € 29.831 em 2013, € 38.482 em 2014, € 56.367 em 2015, € 70.502 em 2016, € 84.671 em 2017, e € 92.591 em 2018; e estimava-se um valor de lucro bruto (“Gross Profit (value)”), no que diz respeito às tiras de teste (“strips”) de € 301.719,00 em 2013, € 456.943 em 2014, € 857.533 em 2015, € 1.194.898 em 2016, € 1.566.904 em 2017, e € 1.808.834 em 2018, o que correspondem a uma percentagem de lucro bruto (“Gross Profit (%)”) nesses anos de, respetivamente, 82,47%, 80,45%, 82,46%, 85,30%, 87,74% e 88,88%) - cf. documento n.º 24 anexo à petição inicial, cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido. 103) Os parceiros para a distribuição de produtos no mercado angolano que surgem identificados no business plan referido em 101) – H... e I... – foram aí introduzidos pelo Réu AA com base nas informações que sobre os mesmos lhe foram disponibilizadas por FF e por EE. 17. Em face da prova produzida nos autos e pelas razões e com base nos meios probatórios expostos e identificados na alegação / motivação, a decisão proferida sobre o facto 104 é impugnada, devendo ser proferida decisão que julgue o mesmo provado mas com seguinte redação: 104) As parcerias com a H... e a I... não deram resultado por estarem a ter um desempenho inexistente, pelo que a A., em finais de 2013, procurou novos parceiros para o mercado angolano. 18. Em face da prova produzida nos autos e pelas razões e com base nos meios probatórios expostos e identificados na alegação / motivação, a decisão proferida sobre o facto 105 é impugnada, devendo ser proferida decisão que o julgue provado mas com a seguinte redação (em termos semelhantes ao alegado na parte final do artigo 176.º da contestação): 105) Em fevereiro de 2014, FF apresentou ao seu superior um plano revisto para aumentar as vendas da A. em várias áreas, entre as quais Angola (cf. documento n.º 26, anexo à petição inicial, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido). 19. Em face da prova produzida nos autos e pelas razões e com base nos meios probatórios expostos e identificados na alegação / motivação, a decisão proferida sobre o facto 118 é impugnada, devendo ser proferida decisão que julgue provado esse facto mas com a seguinte redação: 118) Em 02.11.2015, a Ré BB enviou um email dirigido ao departamento de encomendas da A., copiando o Réu AA e GG, referindo, na introdução, o seguinte: “Conforme nossas reuniões desenvolvidas em Angola com vista ao desenvolvimento estratégico de incrementarmos a posição da E... Diabetes Care no mercado e posiciona-la como líder no mercado, junto envio o resultado em ações estratégicas para 2015 (Novembro e Dezembro) da nossa reunião e os valores associados para as implementar.” (cf. documento n.º 27 da petição inicial) 20. Em face da prova produzida nos autos e pelas razões e com base nos meios probatórios expostos e identificados na alegação / motivação, a decisão proferida sobre o facto 119 é impugnada, devendo ser proferida decisão que julgue provado esse facto mas com a seguinte redação: 119) Em 04.11.2015, o Réu AA reencaminhou o email referido em 118) para o seu superior hierárquico, FF, solicitando autorização para a A. pagar o congresso e iniciar o desenvolvimento de todos os materiais para a sua implementação, num montante que então ascendia a € 53.222,10 21. Em face da prova produzida nos autos e pelas razões e com base nos meios probatórios expostos e identificados na alegação / motivação, a decisão proferida sobre o facto 121 é impugnada, devendo ser proferida decisão que julgue provado esse facto mas com a seguinte redação (conforme decorre também do alegado no artigo 284.º da contestação): 121) Algures entre março e abril de 2016, FF (superior hierárquico do Réu AA) anunciou a partida para uma nova função na sede da E..., em ..., tendo exercido funções na A. até setembro de 2016, data em que foi sucedido por HH. 22. Em face da prova produzida nos autos e pelas razões e com base nos meios probatórios expostos e identificados na alegação / motivação, a decisão proferida sobre o facto 128 é impugnada, devendo ser proferida decisão que julgue esse provado mas com a seguinte redação: 128) No dia 21.03.2016, a Autora, como primeira contraente (tendo sido representada nas negociações por FF e AA e na outorga por FF e II), celebrou com a Ré B..., como segunda contraente (tendo esta sido representada nas negociações pelo Réu CC e por JJ e na outorga pelo Réu CC) um contrato intitulado “Contrato de Distribuição”. Sem prescindir, em qualquer caso impugna-se a decisão proferida sobre o facto provado 128, devendo ser proferida decisão que elimine ou julgue não escrita a parte inicial do mesmo (“Perante o apelativo quadro descrito pelo Réu AA”), bem como elimine ou julgue não escritas as expressões “acordando baixar o preço unitário do Accu-Chek Aviva 50T de €10,00 para €9,00” e “garantir um fluxo de produto à Ré B... de €5.000.000,00” ou, no caso destas, as substitua por “acordando um preço unitário do Accu-Chek Aviva 50T de €10,00 e estabelecendo um objetivo anual de vendas de € 5.000.000.00” 23. Em face da prova produzida nos autos e pelas razões e com base nos meios probatórios expostos e identificados na alegação / motivação, a decisão proferida sobre o facto provado 140) é impugnada, devendo ser proferida decisão que o julgue provado mas com a seguinte redação: 140) Era a FF, líder da área comercial da área de diabetes care da A., a quem cabia fiscalizar o cumprimento do acordado com os clientes da A., sendo que, no que às Rés diz respeito, a relação comercial foi acompanhada e gerida pelo Réu AA e por GG. Sem prescindir, o facto 140 tem natureza conclusiva, e, por essa razão, impugna-se a decisão que sobre ele incidiu também por esse motivo, devendo, caso não se aceite a alteração da sua redação nos termos acima requeridos, ser proferida decisão que o considere não escrito. 24. Em face da prova produzida nos autos e pelas razões e com base nos meios probatórios expostos e identificados na alegação / motivação, a decisão proferida sobre o facto 143), referente ao documento n.º 32 junto com a petição inicial, é impugnada, devendo ser proferida decisão que o julgue provado mas com a seguinte redação: 143) Em 29/05/2015, o Réu AA enviou um email a FF com o seguinte teor: “Caro FF, Conforme conversado hoje, reuni com a C... e a B... para avaliar as vendas de ambas, o seu desempenho em África e eventual exportação paralela para a Europa. Ambas as reuniões correram bem, explicaram-me o que estão a fazer em termos gerais e mostraram-me todos os documentos que comprovam a chegada dos produtos a Angola (eu vi documentos de janeiro a abril) Notas importantes: *Eles vendem os produtos diretamente para Angola e Moçambique, para instituições e Px *Ambos têm a documentação (DU) que nos permite confirmar que os produtos deram entrada naqueles países *Ambos têm os documentos aduaneiros relativos aos impostos aduaneiros *A B... também tem contratos em vigor para África com a J... e a K... e também vi os DU. (só a J... exportou no último mês 12.000 frascos e 2.000 medidores para Luanda!!!!) No decorrer da reunião apercebi-me que ambas têm uma posição idêntica relativamente à questão da exportação, sendo ambas da opinião que os principais armazenistas em Portugal são responsáveis pelo comércio paralelo para a EU. É fácil para eles, uma vez que têm as suas próprias * O preço de transporte é mais ou menos € 2 por frasco * Os Impostos Aduaneiros aplicáveis a dispositivos médicos em Angola são 25% Isto significa que, no total, o produto pronto para vender em Angola fica em €17 por frasco!! Se ainda considerarmos a Margem, o transporte e os Impostos Aduaneiros na UE, é impossível vender aqui na UE ou em qualquer outro país! Temos de verificar se o produto encontrado no Reino Unido tem ou não o nosso autocolante, e se somos os únicos com este lote. Depois será mais fácil identificar a origem das exportações paralelas. Assim, agendei a minha viagem de negócios a Angola para julho, para poder avaliar in loco todas estas informações e implementar o plano de ação para o segundo semestre. Seguirei de perto este importante assunto.” 25. Em face da prova produzida nos autos e pelas razões e com base nos meios probatórios expostos e identificados na alegação / motivação, a decisão proferida sobre o facto 145, referente ao documento n.º 33 junto com a petição inicial, é impugnada, devendo ser proferida decisão que o julgue provado mas com a seguinte redação: 145) Em 09/11/2015, KK, da L..., enviou um email ao Réu AA com o seguinte teor: “Analisando o ficheiro de vendas internas que nos enviaram, gostaríamos apenas de esclarecer se os armazenistas C..., B... e M... têm atividade no território nacional, ou se são destinados à distribuição noutros territórios.”, tendo o Réu AA empresas neste país. Sabemos que assim é... Temos de verificar se também continuam a fazer o mesmo com os nossos produtos... Já no que diz respeito às reimportações de Angola para UE, parece que isso seria muito difícil, como a B... explicou: * Eles compram em Portugal a € 10,6 (com IVA) 2 * Eles vendem a Angola e Moçambique a € 11,6 AA respondido em 09/11/2015, da seguinte forma: “Esses são os nossos parceiros de exportação (Palops). Temos toda a documentação de exportação desses players.” 26. Em face da prova produzida nos autos e pelas razões e com base nos meios probatórios expostos e identificados na alegação / motivação, a decisão proferida sobre o facto 147, referente ao documento n.º 2892 junto com a petição inicial, é impugnada, devendo ser proferida decisão que o julgue provado mas com a seguinte redação: 147) Em 08/02/2016 o Réu AA enviou um email a FF com o seguinte conteúdo: “Conforme discutimos no meu JF, vê abaixo as principais conclusões da minha visita a Angola: O principal objetivo da minha visita foi a participação no mais importantes congresso científico em .... Estivemos presentes com um espago de 19m2 em parceria com a B... (foto em anexo), com 4 comerciais da B... e 2 da E.... O Congresso contou com mais de 1000 profissionais de saúde presentes e vindos de toda Angola e as administrações do hospital privado mais importante de Angola (foto em anexo). O nível de promoção do Accu Chek foi extremamente importante a nossa estratégia porque somos a única empresa de referência na área de diabetes com promoção ativa em BGM. Realizamos um simpósio intitulado "Uma nova era na gestão da diabetes em Angola", e tivemos como palestrante a medica mais influente em Diabetes em Angola, Dra. LL, que é a Coordenadora Nacional de Diabetes, Diretora da Associação de Diabetes de Angola, Diretora da Associação de Diabetes Clinica em Luanda, e Diretora do Hospital ... (foto em anexo). Compareceram no nosso simpósio mais de 120 médicos, onde a Dra. LL fez uma apresentação fantástica sobre a importância do diabetes BGM, bem como explicou por que os sistemas Accu Chek são os mais confiáveis no mercado, alem de ser a única empresa sem stock out no mercado de Angola atualmente. Os tempos são desafiantes, mas há uma oportunidade única de um ponto vista da concorrência, uma vez que a J... deixou o mercado angolano e temos a oportunidade de canibalizar esses sistemas para o Accu Chek e aumentar significativamente a nossa posição de mercado. Tive a oportunidade, no congresso, de conversar cinco minutos com o Ministro da Saúde (através do Diretor da B... - foto em anexo) mostrando que a E... está a investir fortemente no mercado angolano e transmiti-lhe que gostaríamos de ter uma reunião para avaliar o que pensam sobre diagnostico no tratamento do diabetes para juntos desenvolvermos um programa para o tratamento do diabetes. Ele considerou este tema muito interessante, que o diabetes em Africa esta a crescer a uma velocidade assustadora, e disse que no futuro próximo falaria connosco sobre este tema. Lançámos também no dia 18 de Janeiro uma nova campanha nas farmácias para a mudança dos dispositivos concorrentes para o Accu Chek (foto em anexo). Desde que a J... esta fora do mercado e havendo grandes ruturas de stock, e um momento crucial para agarrar estes pacientes, e por isso fizemos essa campanha com a Accu Chek Performa, que consiste na venda de 2 frascos + Medidor por um preço mais baixo. A campanha está a correr bem, já tendo sido implementado em mais de 100 farmácias em Luanda (de 321), e todos os dias recebo indicações de que muitos mais. *Principais dificuldades que podem afetar o nosso negocio em 2016:* Falta de moeda (dólar americano e euro) - Neste momento o mercado está sob pressão por falta de dinheiro para pagamentos no exterior, com uma media pagamento a 4 meses para os bancos permitirem a saída de dinheiro (dólar ou euros) para outros países. Este problema afeta gravemente a economia local, totalmente dependente das importações (95%). Como eles não podem pagar para o exterior a falta de produtos nas empresas e muito grande. O mesmo e verdade ao nível dos produtos farmacêuticos: o Por exemplo, a J... e a N... deixaram o mercado angolano este ano de 2016. Eram as principais empresas que atuavam no mercado. E nós pensamos que mais empresas podem deixar o mercado se a crise durar mais tempo, o os preços dos produtos em Kwanza estão a disparar visto a moeda Kwanza esta seriamente desvalorizada em relação ao euro: o Ano 2015: 1 Euro = 126 kwanzas o Ano 2016: 1 Euro = 178,2 Kwanzas (no banco de Angola - taxa fev2016) ...como vê e um aumento de +40% em* comparação com 2015!!!!! o Redução Constante do Prego do Petróleo - Fala-se mundialmente esta importante questão macroeconómica. Angola tem um enorme efeito multiplicador em todas as áreas de negocio porque 85% do PIB vem do petróleo... o Crise Presidencial - Sabe-se que o presidente está com graves problemas de saúde (cancro) e em caso de morte os partidos da oposição tentarão um assalto ao poder. Existe um risco real de nova guerra civil ou momentos muito tensos no future próximo, o Do ponto de vista financeiro estamos seguros porque a B... paga-nos em Portugal, e assegura-nos que temos cash flow suficiente para manter o negocio este ano, mesmo que não receba os pagamentos vindos de Angola. E claro para mim que isto é um risco real a médio prazo, mas vamos avaliando mensalmente. o Temos risco efetivo J... fechar contrato de exclusividade com B... para abastecer o mercado angolano. Eu sei que eles foram abordados para esse fim, mas não sei os possíveis detalhes do negocio. Estou a acompanhar esta e a trabalhar numa solução, como discutimos. *Próximos passos 2016:* o Continuação da implementação da campanha de troca de dispositivos nacionalmente (todas as províncias de Angola) o Participação no 1° Congresso de Diabetes em Angola. Nós vamos ser patrocinador principal e ter um simpósio o Press release 3x este ano no Journal of Health, com dados científicos sobre diabetes e publicidade Accu Chek o Vídeo tutorial de como se autocontrolar para estar rodando em todos Hospitais Privados (Tv's) e Farmácias (TV's) o Publicidade Accu Chek nas principais farmácias de Luanda o Reunião com o Ministro da Saúde para alavancar o processo de melhorar o acesso a sistemas de diagnostico para a população Anexo algumas fotos que mostram algumas das atividades que eu partilhei acima.” 27. Em face da prova produzida nos autos e pelas razões e com base nos meios probatórios expostos e identificados na alegação / motivação, a decisão proferida sobre o facto provado 149) é impugnada, devendo ser proferida decisão que o julgue provado mas com a seguinte redação: 149) Do teor do documento junto como documento n.º 29 da petição inicial resulta que se trata de uma apresentação feita a MM em 25/04/2016, e encontra-se assinada, na página 1, por “AA & FF”. Na apresentação refere-se, entre o mais, o seguinte: (i) Desempenho – Visão Geral: 275k acima da meta devido ao desempenho positivo dos PALOP, a estimativa PT ascende a 711k (pág. 21) (ii) PALOPS - Potencial ...são um mercado desafiante, com elevado potencial por explorar por parte do negócio DC (pág. 35) (iii) Na página 24 consta um gráfico intitulado “Evolução Vendas 2013/2016”, com o subtítulo “Vendas Palops (€)”, estando 2013 próximo da linha dos € 0, 2014 entre a linha dos € 1.000.000 e dos € 1.500.000 e um crescimento, por comparação a 2013, de 1570%, 2015 entre a linha dos € 2.500.000 e dos € 3.000.000 e um crescimento, por comparação a 2014, de 210%, e 2016 na linha dos € 4.000.000 e um crescimento, por comparação a 2015, de 147%. 28. Em face da prova produzida nos autos e pelas razões e com base nos meios probatórios expostos e identificados na alegação / motivação, a decisão proferida sobre o facto 155), referente ao documento n.º 3493 junto com a petição inicial, é impugnada, devendo ser proferida decisão que o julgue provado mas com a seguinte redação: 155) Em 21/06/2016 o Réu AA enviou um email a FF a informar que “Com base nos novos rácios e assumindo o histórico de vendas no acumulado do ano, estaremos ligeiramente acima do objetivo no ano de 2016”, seguindo-se uma tabela com valores acumulados até junho de 2016, relativos aos Palops, de € 3.146.011, e com uma previsão para o período de julho a dezembro de 2016, também por referência aos Palops, de € 2.330.431,00, num total para o ano de 2016 de € 5.476.442; a tabela incluía valores acumulados até junho de 2016, relativos a exportação paralela, de € 922.183, e com uma previsão para o período de julho a dezembro de 2016, também por referência à exportação paralela, de € 907.000, num total para o ano de 2016 de € 1.899.183. 29. Em face da prova produzida nos autos e pelas razões e com base nos meios probatórios expostos e identificados na alegação / motivação, a decisão proferida sobre o facto 163) é impugnada, devendo ser proferida decisão que o julgue provado mas com a seguinte redação: 163) A Autora veio, bastante mais tarde, a ter elementos que confirmam que os dois documentos referidos no facto anterior não representavam qualquer venda real feita pela Ré B... em Angola, motivo pelo qual (entre outras questões) apresentou denúncia criminal contra os seus autores (cfr. documento n.º 38, anexo à petição inicial), sendo que essa denúncia foi arquivada pelo Ministério Público por ausência de relevo criminal da conduta dos Réus (v. artigo 195.º da petição inicial e documento n.º 64 junto com tal articulado), objeto de abertura de instrução por parte da A. (cf. documento n.º 65 da petição inicial), no âmbito da qual foi proferido despacho de não pronúncia (cf. documento n.º 26 da contestação), sendo que, após recurso da A., o despacho de não pronúncia foi confirmado por decisão do Tribunal da Relação de Lisboa, o qual julgou “totalmente não provido o recurso interposto pela assistente “A..., Soc.Unipessoal Lda”, da decisão instrutória de não pronúncia dos arguidos AA, CC, BB, NN, B..., F... SGPS, O..., P... G..., Q... Açores e F... Unip, nos termos e pelos fundamentos supra expostos, mantendo-se essa decisão instrutória proferida a 26.11.2021, nos seus precisos termos.” (cf. documento junto aos autos pelos Réus em 14/11/2022) 30. Em face da prova produzida nos autos e pelas razões e com base nos meios probatórios expostos e identificados na alegação / motivação, a decisão sobre a parte inicial do facto provado 164 é impugnada (até para assim coincidir com o referido no facto provado 80, além de ter natureza conclusiva), devendo ser proferida decisão que julgue esse facto provado mas com a seguinte redação (exatamente correspondente à cláusula primeira do documento n.º 39 da petição inicial): 164) Em 16.12.2016, a A. e o Réu AA acordaram em revogar o contrato de trabalho que entre os mesmos vigorava desde 01.02.2002, cessando todos os seus efeitos a partir de 31.12.2016 (cfr. documento n.º 39, anexo à petição inicial, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido). 31. Em face da prova produzida nos autos e pelas razões e com base nos meios probatórios expostos e identificados na alegação / motivação, a decisão proferida sobre o facto 171 é impugnada, devendo ser proferida decisão que julgue esse facto, in totum, não provado, ou, em alternativa, que o julgue provado mas com a seguinte redação: 171) Em 19.04.2017, a A. remeteu à Ré B... a carta junta aos autos como documento n.º 41 da petição inicial. Sem prescindir, a decisão sobre a parte inicial do facto provado 171 – “Apesar desta mudança inesperada” – é impugnada, devendo ser proferida decisão que a expurgue e considere não escrita. Ainda sem prescindir, a decisão sobre a expressão “e numa altura em que a Autora desconhecia que o Réu AA era o titular de mais de 99% do capital social da Ré B...”) constante do facto provado 171 é impugnada, devendo ser proferida decisão que a expurgue e considere não escrita. 32. Em face da prova produzida nos autos e pelas razões e com base nos meios probatórios expostos e identificados na alegação / motivação, a decisão proferida sobre o facto 180 é impugnada, na parte em que refere que “Foi ainda na sequência da propositura dessa ação e em data não concretamente apurada que a Autora percebeu que”, devendo ser proferida decisão que o julgue (ao menos no que diz respeito a tal expressão) não provado. 33. Em face da prova produzida nos autos e pelas razões e com base nos meios probatórios expostos e identificados na alegação / motivação, a decisão proferida sobre os factos 192 e 193 é impugnada, no que diz respeito às expressões “perdeu (…) parte da margem” deles constantes, bem como a decisão proferida sobre o facto 200, no que diz respeito à expressão “Estava ao alcance de uma multinacional europeia e centenária” dele constante, e ainda a decisão proferida sobre o facto 206, no que diz respeito à expressão “perdeu a margem” dele constante, por serem expressões manifestamente conclusivas, pelo que sempre deveria ser proferida decisão a expurgar / considerar não escritas tais expressões, o que subsidiariamente se requer. 34. Em face da prova produzida nos autos e pelas razões e com base nos meios probatórios expostos e identificados na alegação / motivação, a decisão proferida sobre o facto 212 é impugnada, devendo ser proferida decisão que julgue o mesmo provado mas com a seguinte redação (em sentido semelhante ao alegado pelos Réus no artigo 58.º da sua contestação): 212) A Autora comercializava os seus produtos (designadamente o Accu Chek Aviva 50T) com 3 códigos/etiquetas e preços diferentes, consoante o canal de venda: a) O produto destinado ao canal farmácia, com códigos / etiquetas “SNS” ou “PVP”. Neste canal, os preços para o Accu-Chek Aviva 50T encontravam-se fixados na tabela de preços da Autora intitulada “Lista de Preços E... -Armazenistas 2016”, da seguinte forma: SNS €16,44 e PVP €21,81 b) O produto destinado aos outros canais, sem qualquer etiqueta “SNS” ou “PVP”, que tinha um preço mínimo de € 7,50. 35. Em face da prova produzida nos autos e pelas razões e com base nos meios probatórios expostos e identificados na alegação / motivação, a decisão proferida sobre o facto 213 é impugnada, devendo ser proferida decisão que o julgue não provado, por redundante, ou que julgue o mesmo provado mas com a seguinte redação: 213) O preço mínimo do produto Accu-Chek Aviva praticado no canal referido na alínea b) do facto 212) era de € 7,50. 36. Em face da prova produzida nos autos e pelas razões e com base nos meios probatórios expostos e identificados na alegação / motivação, a decisão proferida sobre o facto provado 231) é impugnada, devendo ser proferida decisão que julgue tal facto provado mas com a seguinte redação (em termos semelhantes ao alegado pelos Réus entre os artigos 156.º e 162.º da contestação): 231) Em 2013, a área de Diabetes Care do grupo E... entrou num processo de restruturação (Projeto A&S – Autonomy & Speed), que tinha como objetivo avaliar a estrutura das subsidiárias estrangeiras do Grupo E..., designadamente em que países é que deveriam ou não ter presença, em que países é que deveriam ter menos presença, em que países deveriam ter mais presença, e no âmbito do qual houve discussões sobre a necessidade de encerrar ou não alguns países, tendo existido, ao menos inicialmente, um critério de vendas mínimas que era superior à faturação que a área de Diabetes Care da A. tinha nessa altura. 37. Em face da prova produzida nos autos e pelas razões e com base nos meios probatórios expostos e identificados na alegação / motivação, a decisão proferida sobre o facto 240 é impugnada, devendo ser proferida decisão que o julgue provado mas com a seguinte redação: 240) Num documento elaborado pelo grupo E... em 2012, foi fixado um preço mínimo de venda, para o ano de 2013, do Accu-Chek Aviva 50T de € 15 para o canal referido na alínea a) do facto 212) e de € 7,50 para o canal referido na alínea b) do facto 212) (cf. documento n.º 28, anexo à contestação); 38. Em face da prova produzida nos autos e pelas razões e com base nos meios probatórios expostos e identificados na alegação / motivação, a decisão sobre o facto 280 é impugnada, devendo ser proferida decisão que considere tal facto provado com a seguinte redação: 280) Quando se abre um novo cliente no sistema da E..., a Autora tem acesso, através da plataforma Dun & Bradstreet a um conjunto de informação sobre o cliente. 39. Em face da prova produzida nos autos e pelas razões e com base nos meios probatórios expostos e identificados na alegação / motivação, a decisão proferida sobre os factos 292, 294 e 295 (julgados não provados) é impugnada, devendo ser proferida decisão que julgue tais factos provados com a seguinte redação (em termos semelhantes ao alegado pelos Réus entre os artigos 156.º e 163.º da contestação): 292) Durante o Projeto Autonomy & Speed referido no facto 231), a área de diabetes care da A. tinha dificuldade em atingir os seus objetivos de faturação, poderia existir o risco de serem despedidas pessoas se não fossem atingidos os objetivos, e havia uma maior pressão para os objetivos serem atingidos; (…) 294) Foi no contexto referido nos factos 231) e 292) que surgiu o plano revisto para aumentar as vendas da A. mencionado no facto 105 (cf. documento n.º 26 anexo à petição inicial); 295) Foi igualmente no contexto referido nos factos 231) e 292) que a direção da área de diabetes care da A. em Portugal assumiu a possibilidade de recorrer à exportação paralela como solução mais rápida e fácil para se atingir os objetivos; 40. Em face da prova produzida nos autos e pelas razões e com base nos meios probatórios expostos e identificados na alegação / motivação, a decisão proferida sobres os factos 247, 248, 259, 261, 262, 265, 266, 273, 278, 279, 285, 286, 311, 319, 328, 354, 351, 352 e 353 360 (todos não provados) é impugnada, devendo ser proferida decisão que julgue esses factos provados. 41. Em face da prova produzida nos autos e pelas razões e com base nos meios probatórios expostos e identificados na alegação / motivação, a decisão sobre a matéria de facto é impugnada, devendo ser proferida decisão que julgue provado o seguinte facto (alegado pelos Réus na alínea b) do artigo 58.º da contestação): 361) As Rés B... e C... não adquiriam produtos com a etiqueta “SNS” e “PVP”.94 42. Em face da prova produzida nos autos e pelas razões e com base nos meios probatórios expostos e identificados na alegação / motivação, impugna-se a decisão sobre a matéria de facto, devendo ser proferida decisão que julgue provado o seguinte facto, que não só resultou da instrução da causa, como também sempre encontraria fundamento no alegado pelos Réus, designadamente, nos artigos 127.º, 242.º, 287.º, alínea a), e 350.º da contestação: 362) Para algum cliente da Autora ser favorecido no que diz respeito ao preço praticado, tinham de estar várias pessoas de acordo, de forma a permiti-lo. 43. Em face da prova produzida nos autos e pelas razões e com base nos meios probatórios expostos e identificados na alegação / motivação, impugna-se a decisão sobre a matéria de facto, devendo ser proferida decisão que julgue provados os seguintes factos, que não só resultaram da instrução da causa, como também sempre encontraria fundamento no alegado pelos Réus, designadamente, nos artigos 141.º, 143.º e 145.º da contestação:: 363) Na proposta referida nos factos 41) e 42), a A. não impôs ao R. CC que os produtos incluídos nessa proposta só pudessem ser vendidos no mercado dos PALOPs. 364) Na proposta referida nos factos 41) e 42), a A. não impôs ao R. CC qualquer limite quanto ao número de embalagens de produto que este poderia adquirir. 365) Os preços oferecidos pela A. ao Réu CC para o Accu-Chek Aviva 50T, na sequência do email referido no facto 35), foram fixados tendo como pressuposto a sua revenda do no mercado nacional. 44. Em face da prova produzida nos autos e pelas razões e com base nos meios probatórios expostos e identificados na alegação / motivação, impugna-se a decisão sobre a matéria de facto, devendo ser proferida decisão que julgue provados os seguintes factos, que não só resultaram da instrução da causa, como sempre encontrariam fundamento no alegado pelos Réus, designadamente, nos artigos 136.º a 145.º da contestação: 366) No email referido no facto 47), enviado pela Ré BB, em representação da Ré B..., à A., não é dito, direta ou indiretamente, que os produtos para os quais foram pedidas propostas comerciais se destinavam ao mercado dos PALOPs. 367) As condições comerciais oferecidas à Ré B... foram iguais às condições comerciais anteriormente oferecidas ao Réu CC. 368) Na proposta referida nos factos 51) e 52), a A. não impôs ao R. CC que os produtos incluídos nessa proposta só pudessem ser vendidos no mercado dos PALOPs. 369) Na proposta referida nos factos 51) e 52), a A. não impôs à Ré B... qualquer limite quanto ao número de embalagens de produto que este poderia adquirir. 370) Os preços oferecidos pela A. à R. B... para o Accu-Chek Aviva 50T, na sequência do email referido no facto 47), foram fixados tendo como pressuposto a sua revenda no mercado nacional. 45. Em face da prova produzida nos autos e pelas razões e com base nos meios probatórios expostos e identificados na alegação / motivação, impugna-se a decisão sobre a matéria de facto, devendo ser proferida decisão que julgue provado, como consequência lógica e dedutiva, o seguinte facto (“espelho” do facto 40, mas respeitante à Ré B...): 371) O preço indicado pelo Réu AA para o Accu-Chek Aviva 50T ser vendido à Ré B... era um preço habitual e recorrente praticado pela Autora para o tipo de clientes referidos na alínea b) do facto 212). Sem prescindir, não sendo julgada procedente a impugnação da matéria provada no facto 212, impugna-se igualmente a decisão sobre a matéria de facto, devendo, nesse caso, ser proferida decisão que julgue provado o referido facto 371 mas com a seguinte redação: 371) O preço indicado pelo AA para o Accu-Chek Aviva 50T ser vendido ao à Ré B... era um preço habitual e recorrente praticado pela Autora. 46. Em face da prova produzida nos autos e pelas razões e com base nos meios probatórios expostos e identificados na alegação / motivação, impugna-se a decisão sobre a matéria de facto, devendo ser proferida decisão que julgue provado o seguinte facto (“espelho” dos factos 40 e 371, mas desta feita respeitante à Ré C...): 372) O preço indicado pelo Réu AA para o Accu-Chek Aviva 50T ser vendido à Ré C... era um preço habitual e recorrente praticado pela Autora para o tipo de clientes referidos na alínea b) do facto 212). Sem prescindir, não sendo julgada procedente a impugnação da matéria provada no facto 212, impugna-se igualmente a decisão sobre a matéria de facto, devendo, nesse caso, ser proferida decisão que julgue provado o referido facto 372) mas com a seguinte redação: 372) O preço indicado pelo AA para o Accu-Chek Aviva 50T ser vendido ao à Ré C... era um preço habitual e recorrente praticado pela Autora. 47. Em face da prova produzida nos autos e pelas razões e com base nos meios probatórios expostos e identificados na alegação / motivação, impugna-se a decisão sobre a matéria de facto, devendo ser proferida decisão que julgue provados os seguintes factos (cf. documento n.º 18 junto com a petição inicial), que não só resultaram da instrução da causa, como sempre encontrariam fundamento no alegado pelos Réus, designadamente, no artigo 116.º da contestação:: 373) Por sua vez, o departamento de encomendas da Autora reencaminhou o email referido no facto 64) para o departamento de concursos da Autora e para GG (cf. documento n.º 18 anexo à petição inicial) 374) Só depois é que esse email foi remetido pelo departamento de concursos da Autora ao Réu AA (cf. documento n.º 18 anexo à petição inicial) 48. Em face da prova produzida nos autos e pelas razões e com base nos meios probatórios expostos e identificados na alegação / motivação, impugna-se a decisão da matéria de facto, devendo ser proferida decisão que julgue provado o seguinte facto, que resultou da instrução da causa (para além de encontrar fundamento no artigo 167.º, alínea b) da contestação): 375) EE foi o autor da análise PEST sobre o mercado angolano, datada de 2010, junta como documento n.º 23 da petição inicial, altura em que era colaborador da R.... 49. Em face da prova produzida nos autos e pelas razões e com base nos meios probatórios expostos e identificados na alegação / motivação, impugna-se a decisão da matéria de facto, devendo ser proferida decisão que julgue provado o seguinte facto (em termos semelhantes ao alegado pelos Réus no artigo 175.º da contestação): 376) O plano referido no facto 105) foi elaborado na sequência de um pedido que o superior hierárquico de FF lhe fez para rever o plano de negócios da A., após o que FF reuniu com a sua equipa de liderança para avaliar as áreas onde pudessem realizar mais vendas. 50. Em face da prova produzida nos autos e pelas razões e com base nos meios probatórios expostos e identificados na alegação / motivação, impugna-se a decisão proferida sobre a matéria de facto, devendo ser proferida decisão que julgue provado o seguinte facto (em termos semelhantes ao alegado pelos Réus na parte inicial do artigo 160.º da contestação): 377) A área de diabetes care da A. em Portugal faturava, em 2013/2014, cerca de 10 milhões de euros por ano. 51. Em face da prova produzida nos autos e pelas razões e com base nos meios probatórios expostos e identificados na alegação / motivação, impugna-se a decisão sobre a matéria de facto, devendo ser proferida decisão que julgue provado o seguinte facto (que resultou da instrução da causa): 378) A Ré B... investiu no mercado angolano para promover e comercializar os produtos da A., designadamente através da realização de congressos, da implementação de iniciativas promocionais e de formação de pessoas, mantendo em tal território um armazém e uma equipa dedicada ao exercício da respetiva atividade. 52. Em face da prova produzida nos autos e pelas razões e com base nos meios probatórios expostos e identificados na alegação / motivação, impugna-se a decisão sobre a matéria de facto, devendo ser proferida decisão que julgue provado o seguinte facto (que corresponde, mutatis mutandis, aos factos não provados 251 e 255): 379) Entre 17 de fevereiro de 2014 e fevereiro de 2018, a A. faturou à Ré B... e à Ré C... um valor entre € 11.849.076,00 e € 13.165.640,00, situando-se a média anual entre € 2.962.269,00 e € 3.291.410,00, sendo que este volume de faturação foi angariado pelo Réu AA, enquanto trabalhador da A. 53. Em face da prova produzida nos autos e pelas razões e com base nos meios probatórios expostos e identificados na alegação / motivação, impugna-se a decisão sobre a matéria de facto, devendo ser proferida decisão julgue provados os seguintes factos (uns porque decorrem do alegado pelos Réus nos artigos 215.º, alínea b), 246.º e 270.º, 274.º, alínea c) da contestação, outros porque resultaram da instrução da causa): 380) A E... estimava globalmente, em cada ano, para cada país, um valor de exportação paralela; 381) Mas se E... global tivesse conhecimento que os números de exportação paralela de determinado país tinham superado aquela estimativa, descontavam o excedente na faturação anual daquele país, com prejuízo no desempenho desse país e no cumprimento dos seus objetivos de vendas anuais; 382) Com isso, a E... global / casa-mãe pretendia, por um lado, desincentivar cada país de ultrapassar a estimativa de exportação paralela e, por outro lado, evitar que houvesse algum incentivo para os países realizarem exportação paralela; 54. Em face da prova produzida nos autos e pelas razões e com base nos meios probatórios expostos e identificados na alegação / motivação, impugna-se a decisão sobre a matéria de facto, devendo ser proferida decisão que julgue provados os seguintes factos que resultaram da instrução da causa (resultando, também, em parte, do alegado pelos Réus no artigo 222.º da contestação): 383) A A. realizava, com periodicidade semestral ou quadrimestral, reuniões de ciclo para as quais eram convocados todos os seus colaboradores, incluindo os diretores; 384) Nas reuniões de ciclo referidas em 383) eram mostrados os dados de faturação dos PALOPs e da exportação paralela; 385) Os dados de faturação relativos aos PALOPs eram interpretados por alguns dos colaboradores como sendo pouco credíveis, tendo em consideração as características daquele mercado, e, portanto, a dedução lógica que daí retiravam era que essa faturação dizia respeito a exportação paralela para a Europa, tema que era comentado no seio da empresa. 386) A A. tinha forma de saber, designadamente através dos relatórios extraídos da plataforma Dun & Bradstreet, qual o destino geográfico dos produtos da A. que estavam a ser revendidos pelas Rés. 55. Em face da prova produzida nos autos e pelas razões e com base nos meios probatórios expostos e identificados na alegação / motivação, impugna-se a decisão sobre a matéria de facto, devendo ser proferida decisão que julgue provado o seguinte facto (em termos semelhantes aos alegados no artigo 18.º da contestação): 387) Dentro da União Europeia, a A. só atua no mercado português, não comercializando produtos para fora do território português. D) DO DIREITO (i) Da inexistência de facto ou ato ilícito 56. O tribunal a quo, apesar de fazer referência aos dois tipos de responsabilidade civil, contratual ou extracontratual, acabou por não decidir qual delas entendia aplicar-se ao presente caso, o que dificulta a análise, contraditório e impugnação dos Réus. 57. E esta questão era fulcral pois que a A. se apresentou, nos presentes autos, “por razões de simplificação processual” como cessionária dos alegados direitos das “subsidiárias do Grupo E..., tendo por território preferencial de vendas um dos cinco países europeus (Alemanha, Espanha, Países Baixos, Lituânia e Reino Unido) para os quais a Ré B... – e também a Ré C... – exportou” a reclamar dos Réus a indemnização pelos prejuízos causados (cf. artigo 247.º da petição inicial e documento n.º 67 junto com tal articulado). 58. Desconhece-se, por isso, porque a A. nunca o esclareceu (e a sentença recorrida muito menos), se se apresenta nos presentes autos a reclamar danos sofridos apenas pelas referidas subsidiárias, que lhe cederam os créditos indemnizatórios, ou se se apresenta a reclamar danos sofridos por aquelas e também por si diretamente. 59. É que: c) Se tiver sido por via da primeira opção, não se percebe a referência ao regime legal da responsabilidade civil contratual feita na petição inicial, uma vez que é inequívoco (por não resultar dos factos provados, impugnados e não impugnados) que nenhuma relação contratual jamais existiu entre os Réus e qualquer das subsidiárias que cederam os créditos indemnizatórios à A. d) Se tiver sido por via da segunda opção, a A. não distinguiu que danos foram sofridos por si e que danos foram sofridos pelas suas subsidiárias, sendo certo que, tendo sido produzidos danos em cada um dos territórios em que essas subsidiárias atuam, cada uma delas teria apenas direito – se estivessem preenchidos os pressupostos da responsabilidade, mas não estão, como se verá – aos danos sofridos no respetivo território, sendo que a A., nesse caso, não teria sofrido qualquer dano, porque o facto que imputa aos Réus é a revenda, mediante exportação dos produtos adquiridos à A., para diversos países europeus, e não a revenda daqueles em território nacional. 60. Esta circunstância, levantada pelos Réus na contestação e decisiva para uma boa decisão do litígio, foi completamente ignorada pelo tribunal a quo na sentença proferida, o que dificulta o exercício de impugnação por parte dos Réus, já que não sabem a que título lhes foi imputada a responsabilidade na sentença recorrida, nem sequer quem é a sua contraparte nessa responsabilidade. 61. A única pista que o tribunal a quo deu a este propósito foi a condenação solidária dos Réus nos termos do disposto no artigo 497.º, n.º 1 do Código Civil (“CC”), o que indicia, tendo em consideração tal norma apenas se aplica ao regime da responsabilidade civil extracontratual, na modalidade de responsabilidade por factos ilícitos, que entendeu estar em causa este tipo de responsabilidade. 62. Foi, portanto, neste tipo de responsabilidade que os Réus, focaram a sua atenção, análise e impugnação, sem deixar de fazer, no entanto, referência à responsabilidade contratual, por questões de cautela de patrocínio. Isto posto, 63. O tribunal fundou a responsabilidade civil dos Réus no dolo, configurando-o como um ato ilícito gerador de responsabilidade civil para o deceptor. Sucede que nos presentes autos não se pede a anulação de qualquer contrato. Não poderá, portanto, a responsabilidade civil dos Réus ser fundada no dolo, conforme decidido pelo Tribunal a quo, que assim violou o artigo 253.º do Código Civil. 64. Sem prescindir, a verdade é que, no presente caso, não existe facto ilícito, nem dolo. 65. Com efeito e conforme resultou claro da impugnação da matéria de facto (e, em alguns aspetos, já resultava igualmente claro da sentença proferida), os Réus não recorreram a qualquer artifício ou embuste para obter o preço estabelecido para o Accu-Chek Aviva 50T de, primeiro, € 10, e, depois, € 9, nem para vender o Accu-Chek Aviva 50T no mercado europeu (sendo que a A., de acordo com as regras comunitárias a que abaixo se fará referência, não estava sequer legitimada a impor quaisquer restrições a esse nível). 66. A A. também não estava em erro, pois que o preço fixado era habitual e recorrente noutros clientes do mercado nacional, o preço mínimo fixado para o Accu-Chek Aviva era inferior ao preço fixado às Rés pessoas coletivas, e o preço de venda do Accu-Chek Aviva 50T pela E... na Europa oscilava muito consoante o país, existindo países em que o preço médio desse produto era inferior ao preço fixado às Rés pessoas coletivas, além de que esse erro, a ter existido (no que não se concede), não foi provocado pelos Réus. 67. Por outro lado, nos presentes autos não está em causa a violação de qualquer direito subjetivo da A. (o lucro não é um direito), nem a violação de qualquer disposição legal destinada a proteger interesses alheios (que a A. nem sequer alegou), que constituem, como é consabido, as únicas duas modalidades de que se pode revestir a ilicitude (cf. artigo 483.º do CC). 68. Tais argumentos bastariam – e bastarão – para todos os pedidos formulados pela A.na presente ação serem julgados procedentes, por faltar o segundo pressuposto, a seguir ao facto, da responsabilidade civil: a ilicitude. 69. Por fim, não resultou demonstrado que as embalagens que a Ré B... adquiriu à A. e posteriormente revendeu à Ré B... foram posteriormente por esta revendidas na europa, razão pela qual a C... jamais poderia ser responsabilizada, seja a que título for. Acresce que: 70. Sem prejuízo do que acima se disse e sem prejuízo da decisão que este Venerando Tribunal venha a tomar sobre a impugnação da matéria de facto, a verdade é que a presente ação sempre deveria ser julgada improcedente porque existe uma questão de base prejudicial que a condena à improcedência: a existência de regras comunitárias que proíbem a A. de impedir os seus clientes – o que se aplica evidentemente aos Réus – de exportarem livremente os seus produtos entre os Estados membros da União Europeia. 71. Sucede que o tribunal, a este respeito, (i) não só errou na determinação da norma aplicável, pois que aplicou os artigos 101.º e 102.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (“TFUE”), inseridas no capítulo atinente às regras da concorrência, quando deveria ter evidentemente aplicado, tal como aliás é referido na contestação (artigo 179.º), o artigo 28.º do TFUE, atinente à livre circulação de mercadorias, (ii) como concluiu, muito erradamente, que o direito da União Europeia não se aplica por não subsistirem “dúvidas de que o mercado das sucessivas vendas eram os países dos Palop’s que as partes identificaram, ainda que tratando-se de sociedades com sede na União Europeia, não lhe são aplicáveis as regras europeias relativas à concorrência, tanto mais que se não vislumbra qualquer efeito anti concorrencial, direto ou indireto, que pudesse desses acordos resultar no espaço europeu.” Quanto ao erro na determinação da norma aplicável: 72. Como se referiu, a norma aplicável ao caso sub iudice é o artigo 28.º do TFUE, integrado no título atinente à livre circulação de mercadorias, sendo certo que, ao abrigo de tal norma, o ato de exportação, pela Ré B..., para outros Estados-Membros, produtos que lhe haviam sido fornecidos pela A., não constitui qualquer ato ilícito, uma vez que a exportação paralela é uma forma lícita de comércio de mercadorias entre os Estados-Membros da União Europeia e estão impedidas restrições de circulação de mercadorias no mercado interno. Quanto à não aplicação das regras europeias ao caso sub iudice, 73. Todas as relações contratuais mantidas entre as Partes da presente ação (em 2013, entre a A. e o Réu CC; em 2014, entre a A. e a Ré B... – com a celebração do contrato escrito em 2016 –; e em 2014, entre a A. e a Ré C...) foram celebradas entre empresas portuguesas e executadas, única e exclusivamente, em Portugal. 74. Não existe, pois, nenhuma conexão entre essas relações contratuais e qualquer território africano, a não ser, na tese da A., uma obrigação de revenda dos produtos nesse território (e, ainda que existisse essa obrigação, sempre seria uma obrigação lateral ou acessória – que, aliás, apenas encontra registo escrito, mas não com a interpretação que lhe deu o tribunal a quo, no contrato celebrado em 2016 – a jusante das obrigações principais, ou seja, fornecimento dos produtos e pagamento do preço – cf. artigo 874.º do CC). 75. Acresce que num contrato de compra e venda – ou, num contrato de distribuição, como o qualificou o tribunal a quo, que mais não é do que um contrato quadro que regula a celebração de sucessivos contratos de compra e venda – a prestação característica do contrato é a entrega dos bens e, nos termos dos artigos 772.º e 774.º do CC, na falta de estipulação ou disposição especial da lei, a prestação (neste caso, de entrega do bem) deve ser efetuada no lugar do domicílio do devedor e a prestação pecuniária (neste caso, o pagamento do preço) deve ser efetuada no domicílio do credor. 76. Conclui-se, assim, sem margem para quaisquer dúvidas que os efeitos das relações contratuais entre as Partes na presente ação se produziram em Portugal: era em Portugal que os Réus faziam as encomendas à A. e era em Portugal que a A. lhes entregava os produtos, como era em Portugal que os Réus pagavam com o preço. 77. Acresce que o efeito anti concorrencial e violador das regras comunitárias da A. –traduzido na proibição da revenda dos produtos no mercado europeu – também se produziu na União Europeia, justamente porque a A. não queria, não autorizava, segundo decorre da petição inicial, a revenda dos produtos no mercado da UE. 78. Face ao exposto, é inegável que o direito da União Europeia se aplicava às relações contratuais estabelecidas entre a A. e as Rés pessoas coletivas, pelo que mal andou o tribunal a quo ao não o aplicar à resolução do litígio sub iudice, sendo certo que, como acima se disse, se o tivesse aplicado, outra solução não lhe restaria do que julgar a presente ação totalmente improcedente. Finalmente, quanto ao contrato de distribuição celebrado em 2016: 79. O contrato de distribuição celebrado entre a A. e a Ré B... em 21/03/2016 foi mal interpretado pelo tribunal a quo, designadamente no que diz respeito à cláusula segunda, onde se estabelece que a Ré B... será o distribuidor exclusivo da gama de produtos Accu-Chek para o território angolano e moçambicano (n.º 1), que a Ré B... não poderá, durante a vigência do contrato, distribuir naqueles territórios produtos que não pertença àquela gama (n.º 2), e que a A. não poderá comercializar naqueles territórios a quaisquer outros distribuidores produtos daquela gama (n.º 3). 80. Com efeito, não só não decorre do contrato qualquer impedimento de a Ré B... revender os produtos Accu-Chek fora do território angolano e moçambicano (em nenhuma cláusula as partes acordaram que a Ré B... não venderia ou distribuiria os produtos noutros territórios que não o angolano e moçambicano), como interpretação distinta violaria as regras comunitárias acima referidas, como, finalmente, se deve ter em consideração que a relação entre a Ré B... e a A. para comercialização daqueles produtos vinha sendo executada desde 2014, sem que, durante esse período, nenhuma restrição existisse (ou pudesse existir) na comercialização desses produtos fora dos territórios que constituem objeto do contrato. 81. Por via da celebração do contrato, a A. conferiu à Ré B... o direito de ser esta a única entidade a distribuir os produtos em Angola e Moçambique, não podendo, em contrapartida (de resto, muito usual nestes contratos), comercializar em tais mercados quaisquer outros produtos concorrentes com aqueles. 82. É exatamente isto que significa um direito de exclusividade, e não o seu contrário (ou seja, que a Ré B... só poderia vender os produtos em Angola e Moçambique). É um direito, não uma obrigação. 83. Em conclusão: nos termos do contrato, só a Ré podia distribuir os produtos em Angola e Moçambique, mas não estava impedida de distribuir esses produtos noutros territórios (nunca o esteve, aliás). Face ao exposto e pelas razões apontadas, 84. Também após a celebração do contrato não se verificou a prática de qualquer facto ou ato ilícito por parte da Ré B..., pelo que jamais poderia esta ser considerada civilmente responsável e condenada a pagar uma indemnização à A., pois que, sem facto ilícito, inexiste responsabilidade. 85. Quanto aos demais Réus, os mesmos jamais poderiam ser considerados civilmente responsáveis e condenados a pagar uma indemnização à A. pois que, ainda que procedesse a interpretação da A. (no que não se concede), nunca estiveram, direta ou indiretamente, vinculados a tal contrato, e, portanto, das suas cláusulas não decorriam quaisquer obrigações para os mesmos. Sem prescindir, (ii) Da inexistência de nexo de causalidade 86. Como se o exposto não bastasse, também não se verifica in casu o necessário nexo de causalidade entre o facto e o dano, ou seja, o alegado facto ilícito – vendas que a Ré B... fez em território europeu – não constitui, em concreto, causa do suposto prejuízo sofrido pela A. e suas congéneres – perdas de margem –, uma vez que, como se disse, não resultou demonstrado que elas teriam obtido essa margem caso a Ré B... não tivesse vendido o produto para o mercado europeu. Sempre sem prescindir, (iii) Da inexistência de dano 87. Tanto a A. como o tribunal a quo enquadraram o alegado dano sofrido pela A. e pelas suas congéneres europeias na figura dos lucros cessantes, ou seja, os benefícios que aquelas supostamente terão deixado de obter por causa do facto ilícito. 88. Sucede que a A., na petição inicial, não distingue que responsabilidade imputa a cada um dos Réus, bem como a respetiva medida, não podendo os Réus ser responsabilizados por factos que não praticaram. 89. A sentença recorrida também não o esclarece (nem o poderia ter feito, já que tal não foi alegado). Tal facto, por si só, inviabilizaria qualquer pretensão indemnizatória. 90. Acresce que a A., em resultado da impugnação da matéria de facto, não resultou sequer provado qualquer dano sofrido pela A. ou pelas suas congéneres europeias. 91. Mas ainda que assim não fosse, a A. não alegou qualquer facto, e muito menos produziu qualquer prova de que, se os produtos não tivessem sido vendidos pelas Rés B... e C..., tê-lo-iam sido por si ou pelas suas congéneres. 92. Mais: os danos económicos sofridos por terceiros (neste caso, as congéneres europeias) jamais poderiam ser tutelados por força da suposta violação de contratos celebrados com a A., uma vez que a responsabilidade civil obrigacional, que resulta da violação de posições jurídicas creditícias, só é eficaz em relação ao devedor. 95 93. Jamais, poderia, portanto, existir qualquer obrigação de indemnizar por parte dos Réus, quer à A., quer às suas congéneres europeias. Acresce que: 94. A quem alega, como faz a A., a título próprio e enquanto cessionária das congéneres europeias, a frustração da realização de negócios jurídicos com terceiros por facto imputável à contraparte, cabe o ónus de delinear, com rigor e consistência, o exato processo causal que impediu a celebração dos negócios e gerou os danos que se pretendem ver ressarcidos, o que manifestamente não foi cumprido pela A. na petição inicial. 95. E ainda que se concluísse existir obrigação de indemnizar lucros cessantes das congéneres europeias da A., no que não se concede, a verdade é que, pelos motivos acima expostos, a A. não alegou qual a margem praticada pelas suas congéneres europeias no mesmo produto, nem sequer demonstrou se, caso as Rés B... e C... não tivessem vendido o produto no mercado europeu, as congéneres europeias tê-lo-iam vendido na mesma exata medida, aos mesmos clientes. 96. Ora, conforme é entendimento unânime da Jurisprudência dos Tribunais Superiores e da melhor doutrina, a indemnização do lucro cessante só se verifica “se o lesado, no momento da lesão, for titular de uma expectativa jurídica que lhe permitisse a aquisição de um benefício, tendo deixado essa aquisição de se verificar em consequência da lesão”, não se bastando com “uma mera hipótese de aquisição desse ganho, tendo que existir uma probabilidade quase em termos de certeza de que essa aquisição ocorreria”. 97. A A. não alegou, nem muito menos demonstrou, que as congéneres europeias fossem titulares, em termos de certeza, de uma expectativa jurídica que lhes permitisse a aquisição de um benefício, através da venda dos produtos que foram vendidos pelas Rés B... e C..., tendo deixado essa aquisição de se verificar em consequência da conduta das Rés B... e C.... 98. Tal constituía um facto constitutivo do direito da A. à indemnização, pelo que lhe cabia alegar e demonstrar a factualidade relevante (artigo 342.º CC), o que não fez. 99. Além disso, não houve, nem poderia haver, qualquer prejuízo para as congéneres europeias da A. (muito menos indemnizável), seja pelo exposto, seja pelo facto de os clientes destinatários das vendas realizadas pela R. B... no mercado europeu não serem, com anterioridade, clientes do grupo E.... 100. Motivo pelo qual a indemnização peticionada sempre teria de ser negada. Sempre sem prescindir, 101. Ainda que se admitisse que existia obrigação de indemnizar – no que de forma alguma se concede e apenas se concebe por mera cautela de patrocínio –, a verdade é que, tendo sido peticionados lucros cessantes (margens de lucro perdidas pela A. e suas congéneres), esses lucros teriam necessariamente de corresponder ao ganho ou margem líquida que para a A. e suas congéneres teriam resultado se tivessem sido elas a vender o produto que foi revendido pela Ré B... em território europeu. 102. A A. não alegou, nem muito menos calculou quais as margens que teriam ela ou as suas congéneres obtido se tivessem sido elas a vender o produto que foi revendido pela A. 103. O valor do ganho líquido / margem é um facto constitutivo do direito da A. à indemnização, pelo que lhe cabia alegar e demonstrar a factualidade relevante (artigo 342.º CC), o que não fez. 104. Ao não o ter feito, não poderão os Réus ser condenados a pagar qualquer indemnização à A., uma vez que a factualidade relevante indispensável para a sua fixação não foi alegada, nem muito menos demonstrada. 105. É certo que o tribunal, erradamente, fez coincidir o valor da indemnização à margem – bruta – auferida pelas Rés pessoas coletivas com a revenda dos produtos. No entanto, essa margem – auferida pelas Rés pessoas coletivas – nunca poderia ser considerada para efeitos de atribuição de uma indemnização à A., uma vez que não corresponde ao eventual dano por ela sofrido, e só este é indemnizável. Ainda sem prescindir, 106. Ainda que se considerasse que a A. poderia ser indemnizada pelo valor correspondente à margem auferida pelas Rés pessoas coletivas, no que não se concede e apenas se concebe por mera cautela de patrocínio, a verdade é que, uma vez mais, essa margem deveria ser a margem líquida e não, contrariamente ao que decidiu o tribunal a quo, a margem bruta. 107. E nem faria sentido que fosse de outra forma: é que, se no entender do tribunal a quo, a A. pode ser indemnizada em valor equivalente ao que as Rés pessoas coletivas auferiram em virtude da ilicitude da sua conduta, ou seja, em valor equivalente ao seu enriquecimento ilícito, então sempre deveria ser apurado o real valor desse enriquecimento, que corresponde à margem líquida e não à margem bruta97. 108. Ora, a margem líquida é apurada a dedução de todas as despesas que lhe dão origem (nomeadamente, devoluções, abatimentos, descontos, impostos, transportes, seguros, instalações, trabalhadores, etc.) indemnização, pelo que lhe cabia alegar a factualidade relevante (artigo 342.º CC), o que não fez. 109. Esse valor, como acima se disse, era um facto constitutivo do direito da A. à indemnização, pelo que lhe cabia alegar a factualidade relevante (artigo 342.º CC), o que não fez. 110. Ao não o ter feito, não poderiam os Réus ser condenados a pagar qualquer indemnização à A., uma vez que a factualidade relevante indispensável para a sua fixação não foi alegada, nem muito menos demonstrada. Também sem prescindir: (iv) Da aplicação indevida do mecanismo da desconsideração da personalidade jurídica 111. O tribunal a quo chegou à responsabilidade civil dos Réus pessoas singulares através da desconsideração da personalidade jurídica das Rés pessoas coletivas, dando-lhe, aliás, uma definição vaga e não fundamentada. No entanto, não foram carreados para o processo os elementos de prova que permitissem decidir nesse sentido. 112. Em primeiro lugar, não existiu por parte de nenhum dos Réus uma fraude à lei, ou seja, não se demonstrou que os Réus, por meios lícitos, obtiveram fins proibidos por lei que permitissem e fundamentassem o recurso ao mecanismo da desconsideração da personalidade jurídica, sendo certo que tal ónus cabia à A., por ser facto constitutivo do seu direito, atento o disposto no artigo 342.º do CC. 113. Sem prescindir, e conforme resultou da impugnação da matéria de facto, não se verificaram quaisquer ardis, sugestões ou artifícios usados ou criados pelos Réus pessoas singulares, e muito menos resultou demonstrado que tais ardis, sugestões ou artifícios inquinaram ou foram responsáveis pela decisão da A. contratar. 114. Por fim, ainda que se tivesse verificado – e é certo que não se verificou –, tal comportamento jamais poderia ser enquadrado como um caso de abuso da autonomia, pessoal e patrimonial, inerente à personalidade jurídica das Rés para a obtenção de interesses estranhos ao fim social das mesmas, uma vez que: a) Não resultou provado (nem sequer foi alegado) que as Rés B... e C... foram constituídas pelos respetivos sócios com o único propósito de defraudar a A. e para através delas praticarem atos abusivos. b) Não existiu qualquer confusão ou promiscuidade entre as esferas jurídicas da Rés B... e C... e os respetivos sócios, que nem sequer foi alegada. c) Não está em causa qualquer descapitalização ou subcapitalização, originária ou superveniente, das Rés sociedades, por insuficiência de recursos patrimoniais necessários para concretizar o objeto social e prosseguir a sua atividade, que nem sequer foi alegada. d) As Rés pessoas coletivas não foram utilizadas seus sócios para contornar qualquer obrigação legal ou contratual que eles (sócios), individualmente, assumiram, ou para encobrir um negócio contrário à lei, funcionando como interposta pessoa. 115. Não houve, enfim, qualquer abuso da personalidade coletiva das Rés B... e C... com prejuízo para a A. e, não estando verificadas as condições para o levantamento da personalidade jurídica das Rés pessoas coletivas, jamais os Réus pessoas singulares poderiam ser responsabilizados. Sem prescindir, 116. Ainda que o comportamento ardiloso identificado – erradamente – pelo tribunal a quo se tivesse verificado – e certo é que não se verificou –, ele só seria apto a inquinar a decisão da A. celebrar o contrato de distribuição escrito, o que apenas sucedeu em março de 2016, uma vez que desde 2014 até essa data, nenhum comportamento ardiloso poderia ter existido, uma vez que a decisão de contratar, que tinha ocorrido em fevereiro de 2014, não poderia ter sido, de acordo com os factos dados como provados pelo tribunal, suscetível de constituir qualquer comportamento ardiloso (foi informado à A. que os produtos se destinavam a revenda no mercado nacional e o preço fixado pela A. foi considerado habitual e recorrente pelo tribunal a quo). 117. Ou seja, mesmo adotando a tese do tribunal a quo, no que não se concede, a indemnização ter-se-ia de circunscrever ao período pós celebração do contrato de distribuição e, portanto, ao pedido (iii) formulado pela A. na petição inicial, pelo que, em consequência, deveriam ter sido julgados improcedentes os pedidos (iv) e (v). Sempre sem prescindir, 118. Ainda que o comportamento ardiloso identificado – erradamente – pelo tribunal a quo se tivesse verificado – e certo é que não se verificou –, a desconsideração da personalidade jurídica das Rés B... e C... apenas poderia atingir os respetivos sócios (esta figura apenas rompe o véu entre as sociedades e os seus sócios) 119. Ora, o Réu CC nunca foi acionista da B..., nem sócio da C..., pelo que jamais poderia ser responsabilizado por qualquer dos pedidos formulados pela A. 120. E o Réu AA só foi acionista da Ré B..., nunca tendo sido sócio da C..., pelo que jamais poderia ser responsabilizado pelo pedido formulado contra a C... (pedido v da petição inicial). Por fim, (v) Pedido de reenvio prejudicial para o TJUE 121. O direito da União Europeia é aplicável às relações contratuais estabelecidas entre a A. e as Rés pessoas coletivas. 122. Sem prejuízo, caso este Venerando Tribunal tenha dúvidas sobre a aplicação do direito da União Europeia às relações contratuais estabelecidas entre a A. e as Rés pessoas coletivas, creem os Réus que esta questão deve ser suscitada ao TJUE através do reenvio prejudicial, não só por ser pertinente e útil, mas por ser necessária para a solução do presente litígio. 123. Em consequência, os Réus requerem a este Venerando Tribunal que, proferindo o competente despacho de reenvio prejudicial, submeta ao TJUE as seguintes questões (ou outra(s), ou com outra redação, que este Venerando Tribunal considere mais conveniente(s)): Das normas europeias em causa: No âmbito dos presentes autos, as normas dos Tratados Europeus que importa interpretar são as constantes dos artigos 28.º e 355.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (“TFUE”) e o artigo 52.º do Tratado da União Europeia (“TUE”). Questões prejudiciais: 1)Numa relação contratual estabelecida entre duas sociedades comerciais, ambas com sede em Portugal, nos termos da qual uma sociedade vende produtos à outra sociedade para posterior revenda (através de exportação) dos referidos produtos nos territórios angolano e moçambicano, mas em que os produtos são entregues pela vendedora em território português e pagos pela compradora em território português, e só depois revendidos (através de exportação) nos territórios angolano e moçambicano, aplica-se a esta relação contratual estabelecida entre as duas sociedades de Direito português o direito da União Europeia, designadamente o artigo 28.º do TFUE? 2) Se a resposta à questão 1) for negativa, a resposta seria a mesma se os produtos que se destinavam à revenda no mercado angolano e moçambicano forem revendidos pela compradora (através de exportação) em territórios pertencentes à União Europeia (sem nunca saírem tais produtos, quer na venda, quer na revenda, do território da União Europeia)? Face ao exposto, (vi) Normas jurídicas violadas 124. A sentença recorrida violou, por errónea interpretação e aplicação, o disposto, nomeadamente, nos artigos 227.º, 236.º, 253.º, 254.º, 342.º, 346.º, 352.º, 483.º, 487.º, 497.º, 562.º, 563.º, 564.º, 566.º, 798.º e 799.º do Código Civil, nos artigos 28.º, 101.º, 102.º e 355.º do Tratado sobre o Funcionamento a União Europeia, o artigo 52.º do Tratado da União Europeia, e nos artigos 278.º, 556.º, 573.º, 576.º, 577.º, 578.º, 608.º do Código de Processo Civil, sendo que tais normas deveriam ter sido interpretadas e aplicadas no sentido propugnado pelos Réus/Recorrentes na alegação / motivação e respetivas conclusões supra. Nestes termos e nos melhores de Direito que V. Exas. muito doutamente suprirão, deve o presente recurso de apelação ser recebido e conhecido, e, subsequentemente, ser julgado totalmente procedente no sentido das conclusões supra e, em consequência de tal provimento: a) Ser julgada procedente, por provada, a exceção dilatória de formulação de pedido genérico fora do condicionalismo legal, com a consequentemente absolvição dos Réus da instância, nos termos supra requeridos; Sem prescindir, b) Ser parcialmente modificada a matéria de facto provada nos autos, nos termos supra requeridos; e (ii) ser revogada a sentença recorrida e substituída por outra que julgue a ação totalmente improcedente, com a consequente absolvição dos Réus dos pedidos e a condenação da A. em custas, igualmente nos termos supra requeridos; Com o que V. Exas. farão, como sempre, inteira e sã JUSTIÇA!”
Contra-alegou a Autora, A..., SOCIEDADE UNIPESSOAL, LDA pugnando pela total improcedência do recurso, concluindo da seguinte forma:
“Enquadramento A. Na alegação a que se responde os Apelantes – como em toda a tramitação processual que a antecedeu – procuram desviar a atenção do Tribunal da Relação do Porto da indagação óbvia: por que motivo a Apelada, uma multinacional europeia e centenária, com presença em toda a Europa, teria permitido a um dos membros da sua equipa de liderança da unidade portuguesa obter vários milhões de euros de proveitos revendendo produtos da própria Apelada? B. A resposta, razoavelmente óbvia à luz de toda a prova produzida nos autos, é que o Apelante AA, colaborador da Apelada durante mais de uma década e meia, nela desempenhando funções de liderança, atuou de forma continuada, em conflito de interesses (interesse próprio vs. interesse da Apelada), para montar um esquema de desvio da margem da Apelada, o que fez em conluio com os restantes Apelantes pessoas singulares e ocultado pela intromissão das Apelantes pessoas coletivas. C. Foi precisamente o que a Sentença recorrida declarou e contra o que os Apelantes se insurgem, sem razão. O recurso da matéria de facto Conclusões gerais D. Os Apelantes apresentaram-se perante este Tribunal da Relação do Porto com uma extensa impugnação da matéria de facto que tem um objetivo cimeiro: fazer crer a este Alto Tribunal que estão em disputa duas versões verosímeis: a da Apelada e a dos Apelantes. E. Não há, porém, duas versões verosímeis de uma mesma realidade. Contrariamente à tese da Apelada, a versão dos Apelantes não só não tem qualquer suporte documental, como assenta numa insanável e ostensivamente evidente contradição: o que os Apelantes ora sustentam é o exato oposto do que, todos, sustentaram – como transparece abundantemente da prova documental – enquanto o Apelante AA exerceu funções na Apelada e, dentro da sua estrutura, poderia determinar os termos de uma relação comercial que era abundantemente proveitosa para os Apelantes. F. Isto é, os Apelantes – todos eles – afirmavam à liderança da Apelada, sucessivamente FF e HH, até ao momento em que o Apelante AA cessou funções na Apelada, que todo o Accu-Chek Aviva 50T, adquirido a € 10 e, depois, € 9, se encontrava a ser vendido, pelas Apelantes C... e B..., no mercado PALOP e com amplo sucesso. Exato oposto do que, após o Apelante AA ter cessado funções na Apelada, passaram a defender: não apenas negando-se a comprovar as vendas em África, como afirmando que nada tinham de vender nesses territórios, estando contratualmente habilitados a vender para onde quisessem e a Apelada obrigada a manter os preços do Accu-Chek Aviva 50T nos € 9 por embalagem. (…) O Direito Questão prévia - a exceção dilatória que os Apelantes deduziram após a prolação da Sentença QQQQQQ. O artigo 556.º, n.º 1, alínea b), do CPC determina que “[é] permitido formular pedidos genéricos nos casos seguintes: (…) b) Quando não seja ainda possível determinar, de modo definitivo, as consequências do facto ilícito, ou o lesado pretenda usar da faculdade que lhe concede o artigo 569.º do Código Civil”. RRRRRR. Assim, contrariamente ao que os Apelantes parecem assumir, a alínea b) do n.º 1 do artigo 556.º do CPC contém duas partes e não apenas uma primeira (mais conveniente à tese que aqueles pretendem sustentar), apresentando, por isso, duas situações distintas e alternativas, conforme claramente resulta da utilização da conjunção alternativa “ou”. SSSSSS. O mesmo é dizer que o recurso ao artigo 569.º do CC não exige que a quantificação do dano não seja possível no momento da propositura da ação. TTTTTT. Nem tal exigência resulta do referido artigo, segundo o qual “[quem] exigir a indemnização não necessita de indicar a importância exata em que avalia os danos, nem o facto de ter pedido determinado quantitativo o impede, no decurso da ação, de reclamar quantia mais elevada, se o processo vier a revelar danos superiores aos que foram inicialmente previstos”. UUUUUU. Da concatenação destas normas resulta claro que a Apelada tinha direito a formular o pedido nos termos genéricos em que o fez, sem necessidade de indicação do montante exato em que entende ter sido lesada, porque, ao abrigo do artigo 569.º do CC (ex vi artigo 556.º, n.º 1, alínea b), do CPC), o lesado não está vinculado a indicar o valor em que avalia os danos, podendo fazê-lo mais tarde no decurso da ação. VVVVVV. A este respeito diga-se, ainda, que os Apelantes intencionalmente representam de modo erróneo o que a Apelada sustentou nos autos, pois ao contrário do que sugerem as Apelantes, a Apelada não se limitou a não liquidar a totalidade dos danos alegados na Petição Inicial por mero capricho. WWWWWW. Ao invés, visando seguir a mesma metodologia de quantificação dos danos enunciados no pedido (iii) – relativo à margem perdida pela Apelada e pelas suas congéneres europeias, fruto das vendas de Accu-Chek Aviva 50T, pela Ré B... na Europa, durante a vigência do Contrato de Distribuição Exclusiva –, a Apelada solicitou à R... a elaboração de um relatório de quantificação global dos danos referentes (a) à margem perdida pela Autora e pelas suas congéneres europeias, fruto das vendas de Accu-Chek Aviva 50T, pela Ré B... na Europa, previamente à vigência do Contrato de Distribuição Exclusiva (cf. pedido (iv)) e (b) à margem perdida pela Autora e pelas suas congéneres europeias, fruto das vendas de Accu-Chek Aviva 50T, pela Ré C... na Europa, no período em que esta adquiriu e revendeu produtos da Autora (cf. pedido (v)). XXXXXX. No entanto, para esse efeito e para que o relatório abrangesse a quantificação de ambos os pedidos genéricos formulados sob as alíneas (iv) e (v), a Apelada teve de aguardar pela junção aos autos das faturas relativas às revendas das embalagens de Accu-Chek Aviva 50T efetuadas pela C... e que haviam sido adquiridas à Requerente desde 17.04.2014 em diante. Relatório esse que, tendo sido concluído em setembro de 2022, foi junto aos autos pela Apelada por requerimento de 15.09.2022, com a ref.ª Citius 33264420. YYYYYY. Ao que acresce que a Apelada requereu a citação urgente dos Apelantes, por perigo de prescrição do seu direito, pelo que lhe era absolutamente inexigível que aguardasse pela quantificação global dos danos para propor a ação. ZZZZZZ. Assim, face ao exposto, não assiste razão aos Apelantes e deve improceder o recurso neste segmento, admitindo-se na íntegra os pedidos genéricos apresentados na Petição Inicial. As putativas incongruências AAAAAAA. Por um lado, ficou claramente estabelecido na Sentença o regime de responsabilidade civil a que o Tribunal a quo subsumiu os factos provados. BBBBBBB. O Tribunal a quo entendeu que os Apelantes pessoas singulares comungaram uma estratégia que visou enganar a Apelada e levá-la a estabelecer relações comerciais que se revelaram danosas. Por isso mesmo, o Tribunal a quo subsumiu a responsabilidade de todos os Apelantes à solidariedade que resulta do artigo 497.º do CC, que expressamente indicou, como clara indicação de que subsumia tal responsabilidade no domínio da responsabilidade extracontratual. CCCCCCC. O Tribunal a quo não deixou ainda de considerar que a utilização das duas Apelantes pessoas coletivas no estabelecimento de reações comerciais com a Apelada não foi mais do que uma instrumentalização para o fim visado pelos Apelantes pessoas singulares. É dessa instrumentalização para uma finalidade ilícita que na Sentença recorrida se extrai a utilidade da figura da desconsideração da personalidade coletiva. DDDDDDD. O Tribunal a quo não deixou também de aludir ao fundamento do ilícito, isto é, à norma destinada a proteger interesses de terceiro que foi violada, dando azo ao dano e à responsabilidade civil. A estes respeito entendeu o Tribunal a quo estar-se numa situação de dolo (“sugestão ou artifício que alguém empregue com a intenção ou consciência de induzir ou manter em erro o autor da declaração, bem como a dissimulação, pelo declaratário ou terceiro, do erro do declarante”). EEEEEEE. Por outro lado, também não subsistem dúvidas de que a Apelada enquadrou e explicou devidamente os danos que sofreu e aqueles pelos quais pretende ser ressarcida nos presentes autos. FFFFFFF. Conforme resulta dos artigos 203.º a 255.º da Petição Inicial, a Apelada deixou claro nestes autos que a conduta concertada (e dolosa) dos Apelantes causou prejuízos a si própria, bem como às suas congéneres europeias e peticionou o pagamento dos montantes correspondentes à margem de lucro que a Autora e as suas congéneres europeias deixaram de auferir devido ao logro montado pelos Apelantes. GGGGGGG. Tal clareza contribuiu, aliás, para a dissipação de quaisquer dúvidas e cabal compreensão do presente litígio por parte do Tribunal a quo, que concluiu que, podendo a própria Apelada ter vendido as embalagens de Accu-Chek Aviva 50T revendidas pelas Apelantes B... e C..., os danos correspondentes à perda das margens de lucro referentes a tais vendas produziram-se na sua esfera jurídica. O facto ilícito HHHHHHH. Como se disse, o Tribunal a quo entendeu que os Apelantes pessoas singulares comungaram uma estratégia que visou enganar a Apelada e levá-la a estabelecer relações comerciais que se revelaram danosas. Por isso mesmo, o Tribunal a quo subsumiu a responsabilidade de todos os Apelantes à solidariedade que resulta do artigo 497.º do CC, que expressamente indicou, como clara indicação de que subsumia tal responsabilidade no domínio da responsabilidade extracontratual. IIIIIII. O Tribunal a quo não deixou ainda de considerar que a utilização das duas Apelantes pessoas coletivas no estabelecimento de reações comerciais com a Apelada não foi mais do que uma instrumentalização para o fim visado pelos Apelantes pessoas singulares. É dessa instrumentalização para uma finalidade ilícita que na Sentença recorrida se extrai a utilidade da figura da desconsideração da personalidade coletiva. JJJJJJJ. O Tribunal a quo não deixou também de aludir ao fundamento do ilícito, isto é, à norma destinada a proteger interesses de terceiro que foi violada, dando azo ao dano e à responsabilidade civil. A estes respeito entendeu o Tribunal a quo estar-se numa situação de dolo (enquanto “sugestão ou artifício que alguém empregue com a intenção ou consciência de induzir ou manter em erro o autor da declaração, bem como a dissimulação, pelo declaratário ou terceiro, do erro do declarante”). KKKKKKK. Ora, é reconhecido pela doutrina nacional que o dolo pode gerar responsabilidade civil com base na “violação de um direito de outrem” (cf. Artigo 483.º, n.º 1, do CC), visto que a liberdade de decisão jurídica do deceptus é afetada pela atuação com dolo do deceptor. Verifica-se, portanto, uma violação do direito à liberdade que fundamenta a imputação de responsabilidade civil extracontratual ao deceptor. LLLLLLL. Ultrapassada que está esta questão, cumpre ainda demonstrar por que motivo também não assiste razão aos Apelantes quando sustentam que não se encontram verificados os requisitos de que depende o dolo, à luz do disposto no artigo 253.º do CC. MMMMMMM. A existência de dolo por parte dos Apelantes estava dependente da demonstração pela Apelada de que (i) se encontrava em erro, (ii) esse erro foi provocado ou dissimulado pelos Apelantes e (iii) os Apelantes se serviram de algum artifício, sugestão ou embuste para o efeito. NNNNNNN. Não pode haver, nesta altura, qualquer dúvida séria quanto a tal ter sido demonstrado, pois, conforme resulta da matéria de facto provada, dúvidas não existem de que a Apelada se encontrava em erro quando vendeu às Apelantes B... e C... as embalagens de Accu-Chek Aviva 50T ao preço de € 10 e, posteriormente, de € 9. O erro é evidente: cria a Apelada que tais embalagens seriam destinadas aos mercados dos PALOP, sem nenhuma possibilidade real de reimportação para a Europa, por tal ser economicamente inviável (atendendo aos custos aduaneiros e logísticos envolvidos). OOOOOOO. O estado de erro da Apelada foi propositadamente criado e mantido, de forma ardilosa, pelos Apelantes e fundamentou a decisão da Apelada de vender as embalagens de Accu-Chek Aviva 50T às Apelantes B... e C.... Tal atuação concertada dos Apelantes contribuiu, consequentemente, de forma direta, para a venda de Accu-Chek Aviva 50T às Apelantes B... e C..., ao preço de € 10 e, posteriormente, de € 9. PPPPPPP. Concretamente, servindo-se das Apelantes B... e C..., os Apelantes AA, BB e CC: a. Omitiram à Apelada as suas ligações familiares; b. Omitiram que o Apelante AA era titular de 99,6% do capital social da Apelante B... e que a Apelante C... fora constituída pela irmã do Apelante AA; c. Omitiram que a Apelante C... revendia à Apelante B... tudo o que adquiria à Apelada; d. Em especial, o Apelante AA, enquanto Head of Market Access & Key Account Manager da Apelada, serviu-se da sua influência e posição privilegiada no seio da organização da Apelada e da confiança que os restantes membros da liderança desta em si depositavam para os convencer do potencial do mercado africano e da importância inerente ao estabelecimento de uma parceria comercial com a Apelante B.... Para tal, os Apelantes pessoas singulares construíram uma narrativa baseada na (suposta) presença e relevante posicionamento das Apelantes pessoas coletivas nos mercados africanos; e. Em especial, o Apelante AA, criou na Apelada a convicção enganosa de que o sucesso da aposta no mercado africano pressupunha a aplicação de um preço inferior ao praticado no mercado europeu; f. Os Apelantes pessoas singulares asseguraram consistentemente que o Accu-Chek Aviva 50T estava a ser exportado para Angola e Moçambique, asseverando igualmente o Apelante AA ter visto e analisado documentos comprovativos da exportação do produto para Angola e Moçambique (sabendo-se hoje que nenhuma embalagem de Accu-Chek Aviva 50T foi vendida pelas Apelantes B... e C... no mercado africano); e g. Os Apelantes pessoas singulares garantiram que a reimportação de Accu-Chek Aviva 50T para a Europa não só não estava a ocorrer, como não seria economicamente viável. QQQQQQQ. Não restam, portanto, dúvidas de que a vontade de contratar da Apelada foi totalmente condicionada pela atuação dos Apelantes e, bem assim, que caso a Apelada conhecesse a veracidade dos factos omitidos e deturpados pelos Apelantes, nunca teria decidido contratar com as Apelantes B... e C.... RRRRRRR. Nestes termos, resulta claríssimo que estão preenchidos os pressupostos legais de aplicação do regime da responsabilidade civil, pelo que andou bem o Tribunal a quo ao concluir nesse sentido. As regras comunitárias SSSSSSS. Consideram os Apelantes que o Tribunal a quo (i) aplicou erradamente os artigos 101.º e 102.º do TFUE, porquanto deveria ter aplicado o artigo 28.º do TFUE e (ii) concluiu erradamente pela não aplicação do direito da União Europeia. TTTTTTT. No seu entendimento, as regras comunitárias aplicáveis proíbem a Apelada de impedir a livre exportação dos seus produtos entre Estados-Membros, pelo que, sendo a exportação paralela permitida, as Apelantes B... e C... não estavam proibidas de vender na Europa os produtos que haviam adquirido à Apelada e, como tal, não praticaram qualquer ato ilícito. UUUUUUU. No entanto, o raciocínio dos Apelantes não é mais do que uma manobra de diversão. VVVVVVV. A licitude, em abstrato, do fenómeno da exportação paralela não é sequer posta em causa pela Apelada, reconhecendo-se evidentemente a exportação paralela dentro do mercado europeu como um fenómeno lícito e cuja proibição não pode sequer ser imposta. No entanto, este fenómeno não assume qualquer relevância para a boa decisão da causa, constituindo, outrossim, um tema manifestamente exógeno à discussão do presente litígio. WWWWWWW. Compreendendo-se muito facilmente porque é que assim é: pois embora, em abstrato, nenhum entrave existisse para que as Apelantes B... e C... revendessem no mercado europeu os produtos adquiridos à Apelada, a verdade é que existia, sim, um entrave para que o fizesse nos termos em que o fez, porquanto tal revenda nunca poderia ser feita ao preço descontado de € 10 e € 9, uma vez que esse preço se aplicava exclusivamente a produtos destinados a Angola e Moçambique. XXXXXXX. Pretendendo as Apelantes B... e C... revender o Accu-Check Aviva 50T adquirido à Apelada no mercado europeu, é certo que o poderiam fazer, desde que o fizessem ao abrigo do preço de venda habitualmente praticado pela Apelada e não, pelo contrário, ao abrigo de um preço manifestamente descontado concedido única e exclusivamente porque os Apelantes ludibriaram a Apelada, fazendo-a crer que os produtos seriam exportados para Angola e Moçambique. YYYYYYY. Precisamente por assim ser, a Apelada comunicou à Apelante B..., por carta datada de 13.12.2017 e junta aos presentes autos como documento n.º 58 da Petição Inicial, que caso a mesma pretendesse ser fornecida de Accu-Chek Aviva 50T para fins distintos da sua exportação para Angola e Moçambique, deveria “colocar a respetiva encomenda como qualquer outro distribuidor para receber as correspondentes indicações sobre disponibilidade e preços”. ZZZZZZZ. Resulta, portanto, evidente que também por este motivo a questão da exportação paralela não tem qualquer relevância para a justa composição do litígio e que, por isso, deve este douto Tribunal – tal como fez o Tribunal a quo – desconsiderá-la, concluindo, por conseguinte, pela ilicitude da conduta dos Apelantes O dano e o nexo de causalidade AAAAAAAA. Os argumentos invocados pelos Apelantes podem sintetizar-se na ideia (errada) de que, por um lado, não resulta da prova produzida que a Apelada ou as suas congéneres conseguiriam realizar as vendas que foram feitas pelas Apelantes B... e C... e, por outro, mesmo que tal tivesse ficado provado, os danos correspondentes a lucros cessantes nunca corresponderiam aos montantes peticionados pela Apelada. BBBBBBBB. Ora, por um lado, ao contrário do que sustentam os Apelantes, ficou suficientemente provado nestes autos que as vendas realizadas pelas Apelantes B... e C... no mercado europeu poderiam ter sido feitas pela Apelada ou pelas suas congéneres europeias. CCCCCCCC. Ora, a Apelada demonstrou que (i) faz parte de um grupo internacional centenário, com uma forte implementação no mercado europeu; (ii) tal grupo está presente, com subsidiárias a atuar localmente, nos mercados para os quais a Apelante B... vendeu; (iii) as Apelantes limitaram-se a vender para onze distribuidores europeus a operar em cinco países comunitários; (iv) o mercado para o produto Accu-Chek Aviva 50T é um mercado de procura pouco elástica e com uma base de clientela estável; (v) esse produto é essencial para a monitorização dos níveis de glicémia dos doentes que o utilizam; e (vi) consequentemente, as vendas feitas pela Apelante B... foram, simplesmente, inseridas numa cadeia de distribuição do produto E..., respondendo a uma procura criada, ao longo dos anos, pelas várias sucursais do Grupo E... e, em suma, parasitada pelos Apelantes. DDDDDDDD. Por conseguinte, a combinação destes fatores evidencia que é perfeitamente razoável concluir, como fez, e bem, o Tribunal a quo, que se os Apelantes não tivessem atuado ilicitamente, a Apelada ou as suas congéneres europeias poderiam ter vendido o produto Accu-Chek Aviva 50T ao mesmo preço a que o fizeram as Apelantes B... e C.... Isto é, teriam com toda a probabilidade colhido o lucro da base de clientela que o produto E... e o trabalho de promoção da Apelada e das suas congéneres europeias angariaram ao longo de vários anos. EEEEEEEE. Por outro lado, se é claro que existe um dano indemnizável, é também claro que esse dano corresponde ao valor que a Apelada deixou de auferir devido à conduta ilícita dos Apelantes, pois só essa realidade corresponde à situação que existiria se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação – cf. Artigo 562.º do CC. FFFFFFFF. Os Apelantes alegam que o dano ressarcível sempre deveria corresponder ao proveito que os Apelantes retiraram do ato ilícito que praticaram, deduzidas as despesas que tiveram de realizar para poder consumar o ato ilícito. GGGGGGGG. A tese dos Apelantes, porém, não encontra qualquer fundamento nas normas aplicáveis à quantificação do montante indemnizatório. HHHHHHHH. Determina o artigo 562.º do CC que “[quem] estiver obrigado a reparar um dano deve reconstituir a situação que existiria, se não tivesse sido provocado o evento que obriga à reparação”, o que significa que, no ordenamento jurídico português, o lesado deve ser ressarcido por todos os prejuízos que tiverem sido causados devido à atuação ilícita e culposa do lesante. IIIIIIII. Como é bom de ver, o artigo 566.º, n.º 2 do CC, não impõe que, para efeitos de quantificação do montante indemnizatório, se tenham em consideração outros fatores além da situação patrimonial do lesado, atribuindo total irrelevância às despesas que o lesante suportou para a realização e concretização do ilícito. De outro modo, o lesado não seria ressarcido dos prejuízos que efetivamente sofreu. JJJJJJJJ. O valor peticionado pela Apelada corresponde efetivamente aos danos sofridos e, como tal, às margens de lucro que esta e/ou as suas congéneres europeias aufeririam se tivessem realizado as vendas que foram ilicitamente realizadas pelas Apelantes B... e C... nos mercados em que estas venderam. KKKKKKKK. Só assim se permite colocar a Apelada e as suas congéneres europeias no estado patrimonial em que estariam se o facto ilícito nunca tivesse sido praticado pelos Apelantes, nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 562.º e 566. º, n.º 2, ambos do CC. LLLLLLLL. Portanto, o Tribunal a quo aplicou corretamente as regras aplicáveis à obrigação de indemnizar e prolatou uma decisão totalmente coerente. A desconsideração da personalidade jurídica das Apelantes B... e C... MMMMMMMM. Para que opere a desconsideração da personalidade jurídica, é essencial a constatação de que as pessoas singulares que lhe servem de substrato se estão a aproveitar da autonomia pessoal e patrimonial da pessoa coletiva para, contrariamente à boa-fé e a outras normais legais, alcançar resultados ilícitos. NNNNNNNN. No caso subjudice, ficou demonstrado que, por via da detenção do capital social e do exercício de cargos de administração das Apelantes B... e C..., os Apelantes AA, BB e CC, respetivamente, tiveram poder para, unilateralmente, definir a atuação dessas pessoas coletivas (que serviram como verdadeiro instrumento do engano da Apelada), sendo forçoso concluir que as referidas pessoas coletivas foram meras extensões patrimoniais dos Apelantes e que os seus patrimónios acabaram por, materialmente, se confundir. OOOOOOOO. No que diz respeito ao atentado a terceiros, este verifica-se “sempre que a personalidade coletiva seja usada, de modo ilícito ou abusivo, para os prejudicar” e, para o efeito, “não basta uma ocorrência de prejuízo, causada a terceiros da pessoa coletiva: para haver levantamento será antes necessário que se assista a uma utilização contrária a normas ou princípios gerais, incluindo a ética dos negócios”. PPPPPPPP. No caso subjudice resultou também claro da prova produzida que os Apelantes engendraram um esquema destinado a promover o seu enriquecimento, esquema esse que os Apelantes sabiam e pretendiam que causasse danos à Apelada, e que só foi possível devido à sua atuação contrária aos ditames da boa-fé. QQQQQQQQ. Portanto, bem andou o Tribunal a quo ao reconhecer que, desde o início das relações comerciais estabelecidas com as Apelantes B... e C..., os Apelantes AA, BB e CC instrumentalizaram, de modo abusivo e ilícito, a personalidade jurídica das Apelantes B... e C... para, através delas, adquirirem elevados proventos em detrimento da Apelada e das suas congéneres europeias e ao, consequentemente, imputar-lhes a título pessoal a responsabilidade civil pelo ilícito. RRRRRRRR. Nestes termos, a decisão prolatada pelo Tribunal a quo não padece de qualquer erro na aplicação do Direito e corresponde, isso sim, a uma decisão que se encontra devidamente fundamentada e apoiada no ordenamento jurídico português e nos seus valores basilares, devendo ser integralmente mantida. O reenvio SSSSSSSS. Como se referiu acima, alegam os Apelantes que o Tribunal a quo (i) deveria ter aplicado o artigo 28º do TFUE e não os artigos 101º e 102º do TFUE; e (ii) errou ao não aplicar o direito da União Europeia, visto não vislumbrar qualquer efeito anti concorrencial, direto ou indireto, da conduta da E... no “espaço europeu”. TTTTTTTT. Não assiste, porém, qualquer razão aos Apelantes, porquanto tais questões não assumem qualquer relevância para a resolução do presente litígio, pelas razões expostas nos parágrafos 467 a 481 da presente alegação, para onde se remete e aqui se dá por integralmente reproduzido. UUUUUUUU. Não têm também as Apelantes qualquer razão por um motivo bem simples de lapidar: o artigo 28º do TFUE impõe deveres aos Estados-Membros no quadro da união aduaneira e da realização do chamado “mercado interno”. O artigo 28º do TFUE não tem como destinatários as empresas. Ao invés, são os artigos 101º e 102º do TFUE que se aplicam às empresas, como decorre expressa e literalmente da Secção 1, do Capítulo 1 do Título VII do TFUE. VVVVVVVV. Por outro lado, diversamente do que sustentam as Apelantes, a Apelada não discute a liberdade de comércio paralelo no seio da União Europeia, nem funda a sua pretensão na ilegitimidade ou ilegalidade de tal comércio. A Apelada limita-se a notar que combinou com as Apelantes B... e C... as condições de venda especiais para a colocação dos seus produtos no mercado dos PALOP e que estas, tendo-os adquirido em tais condições, não só não os comercializaram nos referidos mercados, como nem sequer os exportaram para tais destinos, limitando-se a revendê-los diretamente na União Europeia (no caso da Apelante C..., através da Apelante B...). WWWWWWWW. Dito isto, o Tribunal a quo não concluiu que o direito da União Europeia fosse inaplicável ao caso sub judice. XXXXXXXX. O Tribunal a quo limitou-se a observar, e bem, que: (i) o direito da União Europeia apenas é aplicável às práticas que tenham incidência “no território da União Europeia”; (ii) não é de excluir que acordos que visem mercados fora da União não possam ter efeitos anti concorrenciais indiretos que convoquem a aplicação do direito da União Europeia; (iii) todavia, no caso concreto, não se “vislumbra qualquer efeito concorrencial, direito ou indireto, que pudesse desses acordos resultar no espaço europeu” [diga-se, acordos de fornecimento de produtos a preços mais favoráveis para colocação nos PALOP]. YYYYYYYY. Esta linha de interpretação dos artigos 101º e 102º do TFUE está em total concordância com o requisito de suscetibilidade e sensibilidade de afetação do comércio entre Estados-Membros de que depende a aplicação de qualquer das disposições. ZZZZZZZZ. Com efeito, a violação de uma e de outra supõe um risco apreciável de afetação do comércio intracomunitário. Ora, por norma, os acordos verticais entre fornecedor e distribuidor com vista à exportação para países terceiros não preenchem este requisito (cf. Frank Wijckmans, Filip Tuytschaver, Vertical Agreements in EU Competition Law, 2018, p. 92). AAAAAAAAA. De modo que é correto concluir que um acordo sobre as condições de preço praticadas nas vendas com destino aos PALOP não é abrangido pela proibição dos artigos 101º ou 102º do TFUE, em especial quando de tal acordo não resulta uma proibição de exportar a partir desses territórios, mas sim uma obrigação de vender no território produtos que lhe são fornecidos a determinado preço. BBBBBBBBB. Ora, foi justamente esta última obrigação que não foi cumprida, com efeitos tanto mais graves quanto a Apelante B... se arroga uma exclusividade que precludiria o direito de a Apelada distribuir ela própria ou nomear outro distribuidor para Angola e Moçambique quando confrontada com o facto de as Apelantes B... e C... não venderem nesses países os produtos que lhe foram fornecidos em condições vantajosas para o efeito. CCCCCCCCC. Dito isto, tendo os Apelantes requerido que o Tribunal ad quem faça uso do mecanismo de reenvio prejudicial previsto no artigo 267.º do TFUE com vista a esclarecer os termos de aplicação do artigo 28.º do TFUE, julga a Apelada conveniente lembrar o seguinte: como nota a Mma. Juiz Maria Eugénia Martins Ribeiro no comentário ao artigo 267.º do TFUE no Tratado de Lisboa, Anotado e Comentado (cf. Almedina, 2012, p.962 e s.), os tribunais dos Estados-Membros devem fazer uso do reenvio prejudicial para garantir a interpretação uniforme do direito da União Europeia quando as suas decisões não sejam suscetíveis de recurso judicial. Todavia, mesmo nesses casos, o reenvio não se justifica quando “a correta aplicação do direito da União se impõe com tal evidência que não dá lugar a qualquer dúvida razoável” (cf. ob. cit. p.964). DDDDDDDDD. Ora, neste contexto, há que concluir que o reenvio prejudicial é desnecessário, uma vez que, nas hipóteses descritas pelos Apelantes, não é manifestamente aplicável o regime do artigo 28.º do TFUE que estabelece as regras que os Estados-Membros devem observar relativamente à implementação da União Aduaneira e nada prescreve quanto à conduta exigível das empresas. EEEEEEEEE. Por outro lado, os termos em que se encontra formulada pelos Apelantes a questão prejudicial é também inadmissível, posto que pedem genericamente ao TJUE que indique que disposições do direito da União Europeia são aplicáveis ao caso concreto, matéria essa que o próprio TJUE tem considerado ser da competência do tribunal nacional. FFFFFFFFF. Assim, por todas as questões expostas, resulta claríssimo não existir o mínimo fundamento para submeter ao TJUE através de reenvio prejudicial as questões indicadas pelos Apelantes, devendo, como tal, a sua pretensão ser indeferida. Nestes termos e nos restantes de Direito aplicáveis, deve a apelação improceder, o que se requer.”
O recurso foi admitido como APELAÇÃO, com subida imediata, nos próprios autos e com efeito devolutivo.
Colhidos os vistos, cumpre decidir.
II-OBJETO DO RECURSO:
Resulta do disposto no art.º 608.º, n.º 2, do Código de Processo Civil, aqui aplicável ex vi do art.º 663.º, n.º 2, e 639.º, n.º 1 a 3, do mesmo Código que, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso, o Tribunal só pode conhecer das questões que constem nas conclusões que, assim, definem e delimitam o objeto do recurso.
As questões decidendas são as seguintes:
-Modificabilidade da decisão de facto por reapreciação das provas produzidas e eventual alteração da decisão de direito em consequência de tal modificação;
-Erro na aplicação do direito relativamente às seguintes questões:
-Exceção dilatória inominada de conhecimento oficioso;
-Falta de verificação dos pressupostos da responsabilidade civil dos Réus;
-Aplicação indevida do mecanismo da desconsideração da personalidade jurídica e,
-Pedido de reenvio prejudicial para o TJUE.
III-DA EXCEÇÃO DILATÓRIA INOMINADA
Dedução de pedido genérico fora do condicionalismo legal
Sendo as exceções dilatórias de conhecimento oficioso, apesar da mesma não ter sido objeto de apreciação na sentença sob recurso, dela conheceremos.
Defendem as Rés que no segmento decisório b) da sentença recorrida, o Tribunal a quo condenou solidariamente os Réus B..., AA, CC e BB no pagamento à Autora da quantia, ainda a liquidar em sede incidental, relativa à margem perdida pelo Autora, fruto das vendas de Accu-Chek Aviva 50T, pela Ré B... na Europa, previamente à vigência do Contrato de Distribuição Exclusiva. Tal condenação vem na sequência do pedido (iv) formulado na petição inicial.
Sucede que, quanto a este pedido, a A. estava em condições de o liquidar quando apresentou a petição inicial uma vez que dispunha dos elementos necessários para o efeito, mas optou por não o fazer e aguardar por momento posterior, sendo que o artigo 556.º do CPC não permite que se relegue para momento posterior a liquidação dos danos alegadamente sofridos pela parte que, estando em condições de determinar as consequências do facto supostamente ilícito quando apresentou a petição inicial, não o fez por opção própria.
Assim sendo, porque a dedução de pedido genérico fora do condicionalismo legal reconduz-se a uma exceção dilatória inominada de conhecimento oficioso (cf. artigos 578.º e 608.º, n.º 3 do CPC), deverão os réus ser absolvidos da instância, quanto ao pedido formulado em (iv) da nos termos dos artigos 576.º, n.º 2, 577.º, 278.º, n.º 1, alínea d), 573.º, n.º 2 e 578.º do CPC.
A Apelada, na resposta defendeu que, referindo-se a primeira parte da alínea b) do n.º 1 do artigo 556.º do CPC a situações em que não seja possível determinar as consequências do facto ilícito aquando da propositura da ação, a segunda parte não pressupõe que assim seja.
Pelo que o recurso ao artigo 569.º do Código Civil (“CC”) não exige que a quantificação do dano não seja possível no momento da propositura da ação. Nem tal exigência resulta do referido artigo, segundo o qual “[quem] exigir a indemnização não necessita de indicar a importância exata em que avalia os danos, nem o facto de ter pedido determinado quantitativo o impede, no decurso da ação, de reclamar quantia mais elevada, se o processo vier a revelar danos superiores aos que foram inicialmente previstos”.
Destas normas resulta claro que a Apelada tinha direito a formular o pedido nos termos genéricos em que o fez, sem necessidade de indicação do montante exato em que entende ter sido lesada, porque, ao abrigo do artigo 569.º do CC (ex vi artigo 556.º, n.º 1, alínea b), do CPC), o lesado não está vinculado a indicar o valor em que avalia os danos, podendo fazê-lo mais tarde no decurso da ação.
E a dedução do pedido genérico, mostra-se ademais justificada uma vez que, em ordem a apurar o valor da margem perdida pela Apelada e pelas suas congéneres europeias, fruto das vendas de Accu-Chek Aviva 50T, pela Ré B... na Europa, durante a vigência do Contrato de Distribuição Exclusiva –a Apelada solicitou à R... a elaboração de um relatório de quantificação global dos danos, tendo de aguardar pela junção aos autos das faturas relativas às revendas das embalagens de Accu-Chek Aviva 50T efetuadas pela C... e que haviam sido adquiridas à Requerente desde 17.04.2014 em diante, relatório esse que só ficou concluído na pendência da ação, em setembro de 2022, (foi junto aos autos pela Apelada por requerimento de 15.09.2022), sendo que a Autora não poderia ter aguardado pelo mesmo, por perigo de prescrição.
Decidindo:
Nos termos do disposto na alínea b) do nº 1 do art. 556º do CPC, é permitido ao demandante formular pedidos genéricos, “Quando não seja ainda possível determinar, de modo definitivo, as consequências do facto ilícito, ou o lesado pretenda usar da faculdade que lhe confere o artigo 569.º do Código Civil”.
O 569º do Código Civil, por sua vez, determina que “Quem exigir a indemnização não necessita de indicar a importância exata em que avalia os danos, nem o facto de ter pedido determinado quantitativo o impede, no decurso da ação, de reclamar quantia mais elevada, se o processo vier a revelar danos superiores aos que foram inicialmente previstos”
Em face destas normas, em face dum pedido indemnizatório, que no caso se apresenta inegavelmente complexo, a parte não necessita de indicar a importância exata em que avalia os danos, sendo que nesse caso, “o pedido é concretizado através de liquidação, nos termos do disposto no artigo 358.º ” - cfrº art.º 356.º, nº 1, alínea b) e nº 2, do CPC .
A este propósito, António Santos Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe de Sousa,[3] referem os seguinte: “[o] preceito também prevê a formulação de pedido genérico nesses termos quando o lesado pretenda fazer uso da previsão do art. 569.º do CC (preceito com maior amplitude do que a que decorre da 1.ª parte da al. B) do n.º 1 do art. 556.º do CPC), com o que pode designadamente evitar o decurso do prazo de prescrição previsto no artigo 498.º do CC e os correspondentes efeitos extintivos do direito de indemnização”
Desta forma, não se verifica a ocorrência da exceção dilatória de dedução de pedido genérico fora do condicionalismo legal.
IV-MODIFICABILIDADE DA MATÉRIA DE FACTO POR REAPRECIAÇÃO DA PROVA PRODUZIDA:
Nos termos do disposto no art. 662.º, n.º 1 do CPCivil, “a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos dados como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa”.
À luz deste preceito, “fica claro que a Relação tem autonomia decisória, competindo-lhe formar e formular a sua própria convicção, mediante a reapreciação dos meios de prova indicados pelas partes ou daqueles que se mostrem acessíveis e com observância do princípio do dispositivo no que concerne à identificação dos pontos de discórdia”.
O Tribunal da Relação usa do princípio da livre apreciação da prova com a mesma amplitude de poderes da 1.ª instância, nos termos consagrados pelo art. 607.º, n.º 5, do CPCivil, sem olvidar, porém, os princípios da oralidade e da imediação.
Com efeito, há que ponderar que o tribunal de recurso não possui uma perceção tão próxima como a do tribunal de 1ª instância ao nível da oralidade e sobretudo da imediação com a prova produzida na audiência de julgamento. Na verdade, a atividade do julgador na valoração da prova pessoal deve atender a vários fatores, alguns dos quais – como a espontaneidade, a seriedade, as hesitações, a postura, a atitude, o à-vontade, a linguagem gestual dos depoentes – não são facilmente ou de todo apreensíveis pelo tribunal de recurso, mormente quando este está limitado a gravações meramente sonoras relativamente aos depoimentos prestados.
Como refere Miguel Teixeira de Sousa,[4] o que está em causa não é determinar se ocorreu ou não um concreto facto, ou seja, “sindicar a convicção formada pelo tribunal com base nas provas produzidas e de livre apreciação, mas avaliar se matéria considerada como um facto provado reflete, indevidamente, uma apreciação de direito por envolver uma “qualquer valoração segundo a interpretação ou aplicação da lei, ou qualquer juízo, indução ou conclusão jurídica”.
Na reapreciação da matéria de facto a proceder por este Tribunal de recurso, pondera-se que foram trazidas aos autos duas versões quanto aos factos ocorridos relativamente ao relacionamento comercial desenrolado entre a autora, a sociedade A..., SOCIEDADE UNIPESSOAL, LDA, (que também defende os interesses das suas congéneres europeias, integradas no grupo, E..., que lhe cederam ente os créditos a que tenham direito em consequência da atuação “ilícita” dos Réus, em discussão nesta ação) e as sociedades B..., SA e C..., UNIPESSOAL, LDA, relacionamento comercial esse que se desenrolou no período temporal de Fevereiro de 2014 a Fevereiro de 2018, no que respeita a B... e de Abril de 2014 a Fevereiro de 2018, quanto à C..., relacionada com o produto comercializado pela autora denominado ACCU-CHEK AVIVA, 50T, produto destinado à monitorização da glicémia de pacientes diabéticos.
Na versão trazida a juízo pela Autora, em suma, o então seu funcionário e aqui réu, AA que exerceu os cargos de “Head of Market Access” e de “Key Account Manager”, aproveitando-se do poder decisório que detinha na área da gestão de clientes e bem assim dos conhecimentos técnicos que adquiriu quanto à comercialização daquele produto, margens e funcionamento dos mercados, ao arrepio do estabelecido no código de conduta aplicável aos funcionários da Autora quanto a conflito de interesses, estabeleceu relações comerciais com a Autora, através duma sociedade por si criada, para esse efeito, a Ré B... e relativamente à qual detinha 99,6% do capital social, a qual era administrada pelo seu cunhado, o réu CC, factos que sempre ocultou da autora, tendo logrado levar a cabo um plano através do qual, enganado a autora, logrou adquirir, mais de duas centenas de milhar de embalagens de Accu-Chek Aviva 50T ao preço de, inicialmente, €10,00, e posteriormente de €9,00, fazendo-lhe crer que aquela sociedade as destinavam aos mercados africanos e que esse era o preço possível de praticar em tais mercados, quando, na verdade, as revendeu integralmente na Europa, sensivelmente ao mesmo preço que a Autora vendeu o mesmo produto a todas as outras suas clientes (preço de mercado europeu), entre os €15,50 e os €17,00, o que lhe proporcionou margens de lucros elevadas.
Chegou mesmo a celebrar com a B..., por escrito, um contrato de distribuição exclusiva, para o mercado africano em 2016, sendo que, a autora apenas descobriu que fora enganada, no âmbito dum processo judicial instaurado por aquele seu funcionário respeitante ao incumprimento deste contrato, quando foram aí juntas as faturas respeitantes à venda desse produto
Neste seu plano, foram ainda incluídos os Réus BB, sua irmã e o marido desta CC, cuja relação familiar ocultou da autora, os quais, usando a mesma estratégia, atuaram de forma idêntica através da sociedade C..., a qual fornecida pela Autora nos mesmos moldes que a B..., revendia a esta aqueles produtos, assim aumentando significativamente a quantidade de produtos que a A vendida com “desconto”.
Desta forma, os Réus, concertados entre si, servindo-se as pessoas singulares das sociedades comerciais, atuando sobre a capa destas, lograram obter margens de lucro que ascenderam a €6.359.243,78, conduta que lhe causou danos, assim como nas suas congéneres europeias.
Na versão dos factos trazida a juízo pelos Réus, em suma, não existiam restrições quanto ao mercado de destino daquele produto, (o que apenas ocorreu com o contrato de distribuição exclusiva celebrado em 2016 pela B...), o que aliás não podia existir na Europa, por força do princípio da livre circulação de pessoas e bens que vigora no espaço comunitário, sendo que o preço pelo qual as identificadas sociedade adquiriam o produto à autora era o preço habitualmente praticado por esta, inexistindo qualquer situação de favor em relação à Rés.
O funcionário AA não decidia sozinho, pois não poderia, numa multinacional como aquela em que a Autora se integra, tomar as decisões que lhe são imputadas, já que está dependente de uma pluralidade de departamentos que verificam os pressupostos quer para a abertura de clientes, quer para a fixação de preço, quer para a gestão comercial.
Aliás, foi a autora quem, com o fim de evitar o seu encerramento, por falta de volume de faturação que cumprisse os objetivos traçados, fomentou daquela forma, a exportação paralela do identificado produto, dessa forma elevando a sua faturação, tudo não passando de uma ficção para enganar a casa-mãe.
A autora não teve prejuízos como alega, antes beneficiou da atividade levada a cabo pelos Réus, vendendo os produtos adquiridos à Autora a clientes que não eram previamente clientes desta, motivo pelo qual caso a B... não os tivesse angariado o grupo E... não teria concretizado essas vendas.
Mais alegam que o preço por unidade do produto às Rés sociedades era um preço habitualmente praticado pela Autora a clientes seus, inexistindo qualquer situação de favor em relação a estas.
Estas duas versões trazidas a juízo por ambas as partes vieram, em face da prova produzida, a ser refletidas no elenco dos factos provados e não provados, de acordo a análise crítica da prova feita pelo tribunal do julgamento, o qual de forma fundamentada, com indicação precisa dos meios probatórios em formou a sua convicção, veio genericamente a acolher a versão dos factos trazida a juízo pela Autora na p.i.
Na tarefa da reapreciação da prova, em que os Réus pretendem ver acolhida a sua versão dos factos que pautaram o relacionamento comercial entre as partes, não podemos esquecer que, se é desejável, em prol da realização máxima da ideia de justiça, que a verdade processual corresponda à realidade material dos acontecimentos (verdade ontológica), é certo e sabido que nem sempre é possível alcançar semelhante patamar ideal de criação da convicção do juiz no processo de formação do seu juízo probatório.
Daí que não seja exigível que a convicção do julgador sobre a validade dos factos alegados pelas partes equivalha a uma certeza absoluta raramente atingível pelo conhecimento humano. Basta-lhe assentar num juízo de suficiente probabilidade ou verosimilhança.
Como refere CC de Andrade,[5] a prova não é certeza lógica, mas tão só um alto grau de probabilidade suficiente para as necessidades práticas da vida”.
Tal como o tribunal de primeira instancia, o tribunal da Relação reaprecia as provas livremente segundo a sua prudente convicção.
Com efeito, nos termos do preceituado no art. 607.º, n.º 5, do CPCivil, “o juiz aprecia livremente as provas segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto; a livre apreciação não abrange os factos para cuja prova a lei exija formalidade especial, nem aqueles que só possam ser provados por documentos ou que estejam plenamente provados, quer por documentos, quer por acordo ou confissão das partes”.
Não obstante, a livre apreciação da prova tem de se traduzir numa valoração racional e crítica, de acordo com as regras comuns da lógica, da razão, das máximas da experiência e dos conhecimentos científicos, que permita objetivar a apreciação, requisito necessário para uma real motivação da decisão.
A convicção do julgador há-de ser sempre uma convicção pessoal, mas há-de ser sempre uma convicção objetivável e motivável, portanto capaz de impor-se aos outros em termos de racionalidade e percetibilidade e tem necessariamente de provir da análise global do conjunto de toda a prova produzida.
Daí que a jurisprudência[6] acentue que a “verdade processual, na reconstrução possível, não é nem pode ser uma verdade ontológica”, não podendo sequer ser distinta ou diversa “da reconstituição possível do passado, na base da avaliação e do julgamento sobre factos, de acordo com procedimentos e princípios e regras estabelecidos”, os quais são muitas vezes encontrados nas chamadas “regras da experiência”.
Assim é que, para Luís Filipe de Sousa, [7] “pese embora a existência de algumas flutuações terminológicas, o standard que opera no processo civil é, assim, o da probabilidade prevalecente ou “mais provável que não”. Este standard consubstancia-se em duas regras fundamentais:
i.Entre as várias hipóteses de facto deve preferir-se e considerar-se como verdadeira aquela que conte com um grau de confirmação relativamente maior face às demais;
ii.Deve preferir-se aquela hipótese que seja “mais provável que não”, ou seja, aquela hipótese que é mais provável que seja verdadeira do que seja falsa.
Em primeiro lugar, este critério da probabilidade lógica prevalecente – insiste-se – não se reporta à probabilidade como frequência estatística mas sim como grau de confirmação lógica que um enunciado obtém a partir das provas disponíveis.
Em segundo lugar, o que o standard preconiza é que, quando sobre um facto existam provas contraditórias, o julgador deve sopesar as probabilidades das diferentes versões para eleger o enunciado que pareça ser relativamente “mais provável”, tendo em conta os meios de prova disponíveis. Dito de outra forma, deve escolher-se a hipótese que receba apoio relativamente maior dos elementos de prova conjuntamente disponíveis”.
Importará, por isso, aquilatar se as conclusões que foram retiradas a partir da prova que foi produzida e credibilizada pelo tribunal, não contende com as regras da experiência comum e da lógica.
Dito isto, e tendo presente estes elementos, cumpre conhecer, em termos autónomos e numa perspetiva crítica, à luz das regras da experiência e da lógica, da factualidade impugnada e, em particular, se a convicção firmada no tribunal recorrido merece ser por nós secundada por se mostrar conforme às ditas regras de avaliação crítica da prova, caso em que improcede a impugnação deduzida pelos Apelantes, ou não o merece, caso em que, ao abrigo dos poderes que lhe estão cometidos ao nível da reapreciação da decisão de facto e enquanto tribunal de instância, se impõe que este tribunal introduza as alterações que julgue devidas a tal factualidade, sendo certo que, na reapreciação da prova a Relação goza, como dissemos da mesma amplitude de poderes da 1.ª instância e, tendo como desiderato garantir um segundo grau de jurisdição relativamente à matéria de facto impugnada, deve formar a sua própria convicção.
Considerando quer a extensão da factualidade provada e não provada que resultou do julgamento, quer a extensão da impugnação da factualidade feita neste recurso, que abrange uma multiplicidade de factos essenciais é certo, mas também factos concretizadores daqueles e factos meramente instrumentais, teremos em consideração na apreciação que deles faremos, que, tal como vem sendo reiteradamente afirmado pela jurisprudência, não se deverá proceder à reapreciação da matéria de facto quando os factos objeto de impugnação não forem suscetíveis, face às circunstâncias próprias do caso em apreciação, de ter relevância jurídica, sob pena de se levar a cabo uma atividade processual que se sabe ser inútil, o que contraria os princípios da celeridade e da economia processuais (arts. 2.º, nº 1, 137.º e 138.º, todos do C.P.C.).
Finalmente ainda, tendo em consideração os ónus decorrentes para aquele que impugna a matéria de facto do disposto no art. 640º do CPC, entendemos que os Apelantes cumpriram tais ónus, sendo que, não obstante não terem indicado os meios probatórios nas respetivas conclusões de recurso, porque a indicação desses meios probatórios é feita nas alegações de recurso, onde também é indicado o início e o termo de cada um dos depoimentos das testemunhas, indicado o ficheiro em que os mesmos se encontram gravados no suporte técnico, complementado estas indicações com a transcrição, no corpo das alegações, dos excertos dos depoimentos relevantes para o julgamento do objeto do recurso, entende-se que tanto basta para se concluir que os recorrentes cumpriram o núcleo essencial do ónus de indicação das passagens da gravação tidas por relevantes, nos termos prescritos no artigo 640º, nº 2, al. a) do CPC, nada obstando a que o Tribunal da Relação tome conhecimento dos fundamentos do recurso de impugnação da decisão sobre a matéria de facto.
Feitas estas considerações prévias, considerando uma vez mais a extensão dos factos cuja reapreciação é requerida, iremos adotar na apreciação da impugnação da matéria de facto, no essencial, a metodologia escolhida e utilizada pelos Apelantes nas suas Alegações de Recurso, através da qual procederam à compartimentação dos factos impugnados, por conjuntos de factos ou por “blocos”, tendo em consideração a interligação / estreia conexão existente entre os mesmos, até porque essa metodologia se mostra igualmente seguida na resposta ao recurso da parte contrária.
4.1.Comecemos então pela análise do “bloco de factos” que os Apelantes denominaram de “FACTOS RELACIONADOS COM O CONFLITO DE INTERESSES”:
Os Apelantes impugnam os factos 29 a 34, do elenco dos factos provados, que pretendem ver julgados não provados, tendo indicado, nas respetivas alegações de recurso, os concretos meios probatórios em que fundamentam a sua pretensão.
São os seguintes, os factos impugnados:
“29) O código de conduta que se aplicava aos funcionários da Autora no período compreendido entre os anos de 2013 e de 2016 dispõe o seguinte: “Conflito de interesses Os interesses pessoais não devem influenciar indevidamente o nosso discernimento profissional Como colaboradores da E..., devemos evitar situações onde os interesses pessoais entrem em conflito, ou possam parecer estar em conflito, com os interesses da E.... Existe um conflito de interesses quando os interesses pessoais de um colaborador são incompatíveis com os da E... e criam conflitos de lealdade. Atividades de familiares e pessoas próximas podem originar conflitos de interesses. Não devemos participar, parecer que estamos a participar ou exercer influência em qualquer decisão que possa colocar os nossos próprios interesses em conflito com os melhores interesses da E.... Não devemos usar indevidamente a nossa função na E... para benefício pessoal ou para benefício de familiares ou pessoas próximas. (…) Muitos conflitos de interesses, reais ou potenciais, podem ser resolvidos de uma forma aceitável tanto para o indivíduo como para a empresa. No caso de um conflito de interesses, o colaborador em questão deve informar imediatamente a sua chefia, de forma a encontrar uma solução adequada. Todos nós devemos: - Evitar situações nas quais os nossos interesses pessoais entrem em conflito com os da E.... - Não utilizar indevidamente a nossa posição na E... para benefício pessoal, benefício de familiares ou de pessoas próximas. - Informar imediatamente a nossa chefia se considerarmos a possibilidade de participar no conselho de outra empresa, entidade comercial ou conselho consultivo científico. - Informar imediatamente a nossa chefia acerca de qualquer conflito de interesses, real ou potencial, de forma a encontrar uma solução adequada” (cfr. documento n.º 10, cujo teor se dá aqui por integralmente por reproduzido, citação da página 23);
30) No mesmo Código de Conduta acrescenta-se inclusivamente o seguinte exemplo: “Pergunta: A minha mulher trabalha como diretora num fornecedor que está a tentar obter um contrato com a E.... Eu posso influenciar o processo de seleção. O que devo fazer? Resposta: Há um conflito de interesses óbvio, devido ao cargo da sua mulher. Tem de revelar este conflito de interesses à sua chefia e recusar-se a participar na decisão. A chefia decidirá se o fornecedor para quem a sua mulher trabalha representa o melhor interesse para a E.... Se o fornecedor representar o melhor interesse para a E..., a sua chefia poderá escolher o fornecedor, apesar de os seus interesses estarem ligados” (cfr. documento n.º 10, cujo teor se dá aqui por integralmente por reproduzido, citação da página 23).
31) Nos termos do referido código de conduta, o Réu AA, enquanto Head of Market Access & Key Account Manager da Autora, não podia manter relações comerciais com a Autora, nem gerir essas relações comerciais;
32) Nos termos do referido código de conduta, o Réu AA, enquanto Head of Market Access & Key Account Manager da Autora não podia gerir as relações comerciais mantidas entre a Autora e os Réus CC e BB;
33) O Réu AA tinha conhecimento do código de conduta que se aplicava aos funcionários da Autora e sabia que o mesmo se lhe aplicava;
34) Os Réus BB e CC tinham conhecimento das restrições que eram aplicáveis ao Réu AA e comportaram-se, nos contactos com os superiores hierárquicos do Réu AA na Autora, de modo a que o seu relacionamento familiar permanecesse oculto, o que lograram (e este assim permaneceu até à saída do Réu AA da Autora)”.
Dizem os Apelantes em suma, que a Autora não fez prova de que a versão do “código de conduta” da Autora, em vigor entre 2013 e 2016, fosse aquela que a Autora juntou como documento n.º 10 e que não foi produzida qualquer prova pela Autora de que o documento n.º 10 da petição inicial corresponde à versão que esteve ininterruptamente em vigor entre 2013 e 2016 e que, a existir apenas se aplicaria ao Réu AA, uma vez que era o único réu que, entre 2013 e 2016, tinha uma relação laboral com a Autora e que o facto 32 extravasou a matéria de facto que o tribunal podia conhecer.
Também defendem que não foi produzida qualquer prova que demonstrasse que os Réus CC ou BB tivessem conhecimento do código da conduta ou das supostas regras dele constantes, sendo que aqueles não tinham que revelar à Autora as relações familiares com o Réu AA.
Não assiste razão aos apelantes. Com efeito, o “código de conduta do grupo E...” que se mostra parcialmente reproduzido nos factos 29 e 30, encontra-se junto aos autos como documento 10 junto com a petição e nele são abordadas uma multiplicidade de outras situações a nível de comportamento profissional exigível pela E... aos seus colaboradores, que vão muito para além, dos referentes ao “conflito de interesses”, os únicos que interessam à presente ação.
Aquele concreto código de conduta, encontra-se datado de Janeiro de 2015. Essa situação, porém, não invalida a existência das mesmas ou idênticas regras em período anterior, nomeadamente relativas à questão de “conflito de interesses” entre os interesses pessoais dos colaboradores e os interesses da empresa, tal como foi referido pelas testemunhas FF (responsável máximo da unidade de diabetes care da Apelada, em Portugal, até setembro de 2016); HH (responsável máximo da unidade de diabetes care da Apelada, em Portugal, após setembro de 2016); e OO (Diretor do departamento jurídico do Grupo E..., a nível europeu).
O diretor do Departamento jurídico da Diabetes Care para o Nordeste da Europa e Canadá, OO, explicou que todos os colaboradores da E... recebem formação sobre potenciais “conflitos de interesses”, dizendo que ele próprio dá formação nessa área e apresentou como exemplo paradigmático duma situação de conflito de interesses, a situação de um colaborador constituir uma empresa e vender produtos E... a essa empresa.
Também o próprio Réu AA referiu no seu depoimento a existência de pelo menos um código de conduta anterior a essa data, não tendo sido feita contraprova que em data anterior houvesse uma diferente política do Grupo E... relativo à regras relacionadas com os potenciais “conflitos de interesses aplicáveis aos funcionários da Autora”.
E nenhuma dúvida se nos apresenta quanto ao efetivo e real conhecimento do colaborador da Autora, AA da política de proibição de interesses pessoais se imiscuírem nas decisões dos colaboradores da E..., e da obrigação de os reportarem às chefias, doutra forma não se compreendendo que durante os quatro anos em que a Autora se relacionou comercialmente com a sociedade B..., no decurso dos quais foi inclusivamente celebrado por escrito o contrato de distribuição, junto aos autos como documento 30 da p.i, em que esta empresa se comprometeu a adquirir à Autora produtos no valor de € 5.000.000,00 euros, tenha sempre ocultado da sua chefia, a quem reportava diretamente, o facto de ter constituído esta empresa cerca de um mês antes do início do relacionamento comercial entre as partes e ser ele o detentor do capital social dessa sociedade B..., por si controlada em 99,6% e ser a mesma administrada pelo seu cunhado e do facto da empresa C... ser uma sociedade constituída e detida na sua totalidade pela sua irmã.
O facto 32, por seu lado, contem factos oportunamente alegados alegada nos artigos 42.º a 45.º da Petição.
Os factos 31, 33 e 33, referem-se diretamente ao funcionário da autora AA e não às demais pessoas aí mencionadas (seus parentes), encontrando-se tal matéria devidamente enquadrada na alegação factual feita pelas partes (ver artigos 42 a 45 da pi).
Carece de qualquer razão a impugnação do facto 34, baseando-se a sua prova nas regras da experiência, sendo que subscrevemos integralmente a análise crítica feita na sentença a este respeito: “A prova dos factos 31º a 34º resultou do teor do próprio código de conduta, da menção ao mesmo que foi feito pelas testemunhas FF, o HH, OO e demais testemunhas que sobre tal depuseram, com total unanimidade de que a detenção do capital social da B... pelo AA e as relações de parentesco, impediam que este gerisse as relações contratuais em causa. Acresce que essas circunstâncias e na medida em que não foram reveladas à Autora, pelo contrário, existiu um nítido esforço de ocultação (nomeadamente, o tratamento do AA do seu cunhado por doutor, como resulta dos emails e foi referido pela testemunha FF, o desconhecimento generalizado dessas relações familiares –mencionado as testemunhas meros boatos, de origem não comprovada - e da detenção do capital social da B...)seriam, por si só, eticamente impeditivas de resultarem em negociações justas, até para os demais parceiros comerciais da Autora, e eram, acima de tudo, face às regras da experiência comum, tendentes a salvaguardar os interesses pessoais e familiares do referido Réu (como afirmou uma testemunha, em relação à B..., o AA fazia negócio consigo próprio – ao que acrescentamos, só não sendo visível porque os demais Réus pessoas singulares lhe serviam de aparente interlocutor). A não revelação e encobrimento das relações familiares, da detenção do capital social da B... por parte dos Réus pessoas singulares e a sua própria interposição como interlocutores, sobretudo da B..., denota, de forma manifesta, que quer o CC quer a BB tinham perfeita consciência das regras que sobre o AA recaíam. O desconhecimento da relação familiar e da detenção do capital social da B... junto da Autora, como se disse, era generalizado, sobretudo ao nível dos superiores hierárquicos do Réu AA, o que tudo conjugado permitiu a prova dos factos 39º, 53º, 54º, 61º, 62º, 66º e 67º. Porém, o código de conduta não impedia que o CC e esposa, BB, não pudessem estabelecer relações comerciais com a Autora, por não lhes ser aplicável (daí a não prova do facto 242º).”
E mais á frente: “Havia um total secretismo sobre as relações familiares e sobre a detenção do capital social da B..., ou seja, era algo que só os três Réus pessoas singulares sabiam e dominavam”.
Desta forma, tudo visto e ponderado, o juízo probatório que formulamos em nada diverge do que se apresenta como essencial à convicção alcançada pela 1.ª instância, que consideramos solidamente motivada.
Improcede pois a impugnação da totalidade dos factos que foram incluídos neste “bloco”.
4.2. Porque relacionado com este conjunto de factos, analisaremos de seguida[8] o “bloco de factos” que os Apelantes denominaram de “DA SUPOSTA OCULTAÇÃO DOS LAÇOS FAMILIARES E RELAÇÕES SOCIETÁRIAS EXISTENTES ENTRE OS RÉUS”.
Os Apelantes impugnam os factos 28, 53, 54, 62, 113, 171 e 180, que pretendem ver julgados não provados, ou provados com diversa redação, (na redação que se encontra reproduzida supra nas conclusões de recurso, que aqui se dá por reproduzida) e os não provados 354 e 360, que pretendem ver julgados provados, tendo indicado, nas respetivas alegações de recurso, os concretos meios probatórios em que fundamentam a sua pretensão.
São os seguintes, os factos impugnados do elenco dos factos provados:
28) Embora não tenha formalmente exercido cargos de gerência na Ré C..., foi o Réu CC quem representou aquela nos mais relevantes contactos com a Autora, nos termos que infra se descreverão;
53) O Réu AA não informou a sua chefia de que constituíra a Ré B... menos de um mês antes de esta passar a ser cliente da Autora e de que era titular de 99,6 % do respetivo capital social;
54) O Réu AA também não pediu escusa das funções de gestão do relacionamento comercial entre a Autora e a Ré B...;
62) Sem revelar à Autora que era titular de mais de 99% do capital da B..., nem se escusar a gerir a relação desta com aquela;
113) A Autora nunca teria iniciado relações comerciais com Ré B... se o Réu AA tivesse sido transparente no que concerne às suas relações familiares com os restantes Réus e à sua posição acionista na Ré B...;
171) Apesar desta mudança inesperada – e numa altura em que a Autora desconhecia que o Réu AA era o titular de mais de 99% do capital social da Ré B... –, a posição da Autora manteve-se: queria que a Ré B... lhe mostrasse evidências de que o Accu-Chek Aviva 50T estava efetivamente a entrar nos mercados angolano e moçambicano (cfr. documento n.º 41, anexo à petição inicial);
180) Foi ainda na sequência da propositura dessa ação e em data não concretamente apurada, que a Autora percebeu que o Réu AA foi o acionista maioritário da Ré B... desde a sua constituição em 30.01.2014 até 04.10.2018, data em que transferiu a sua participação social na Ré B... para a F... SGPS, cujo capital social pertence ao Réu AA à razão de 99,9 % (cfr. documentos n.ºs 2 a 6, anexos à petição inicial);
E dos não provados:
354) A informação sobre a estrutura acionista da Ré B... era, desde há muito, falada no seio da E..., entre alguns dos seus colaboradores;
360) À data da saída do Réu AA, a Autora sabia, desde há muito, da relação existente entre este e a Ré B...;
Alegam os apelantes em suma que, os relacionamentos familiares descritos nunca foram propositadamente escondidos ou ocultados da A. com o propósito de a prejudicar e/ou de beneficiar os Réus, para além de que, essa informação era publicamente acessível a qualquer interessado (através de certidões de registo civil e da análise dos documentos constitutivos das sociedades) e a Autora antes de contratar com alguém escrutinava sempre os futuros clientes.
Vejamos.
Nestes factos o tribunal deu como provado que o Réu AA não informou a sua chefia que era acionista maioritário da Ré B... (facto provado 53), não informou que o Réu CC, o administrador da B... era seu cunhado, nem que a totalidade do capital social da Ré C... pertencia à sua irmã (facto provado 54).
Não colhe manifestamente, a argumentação dos Apelantes na impugnação que fazem, nomeadamente alegando que era possível à Autora descobrir aquela relação familiar, e de quem eram as empresas com quem contratou, consultando documentação, uma vez que o que decorre desta factualidade e o que releva para a decisão de mérito a proferir é o ato de ocultação, ou a omissão voluntária da não revelação destes factos por parte do colaborador da Autora AA aos seus superiores hierárquicos, sendo que dos mesmos decorre que a Autora estava a negociar, através deste seu colaborador com uma empresa que ele próprio constituiu para esse efeito (visto ter sido constituída um mês antes) e que era o detentor do seu capital social, sendo a mesma administrada pelo seu cunhado, o Réu CC e que, por essa razão o seu interesse pessoal na obtenção do maior lucro possível, através desta “sua” empresa (assim como a empresa dos seus familiares próximos, a C...), não podia deixar de ser conflituante com os interesses da E....
E repare-se que a ocultação dessa situação, que se verificou no início do relacionamento comercial entre as empresas, manteve-se até ao final da colaboração de AA na Autora.
Aliás, não terá sido inocente a opção por um sociedade anónima, por ser mais difícil identificar “o dono do capital”, nem mais nem menos o funcionário da Autora responsável pelo mercado angolano…
Na sentença, fez-se a seguinte apreciação crítica da prova: “Acresce que essas circunstâncias e na medida em que não foram reveladas à Autora, pelo contrário, existiu um nítido esforço de ocultação (nomeadamente, o tratamento do AA do seu cunhado por doutor, como resulta dos emails e foi referido pela testemunha FF, o desconhecimento generalizado dessas relações familiares –mencionado as testemunhas meros boatos, de origem não comprovada - e da detenção do capital social da B...)seriam, por si só, eticamente impeditivas de resultarem em negociações justas, até para os demais parceiros comerciais da Autora, e eram, acima de tudo, face às regras da experiência comum, tendentes a salvaguardar os interesses pessoais e familiares do referido Réu (como afirmou uma testemunha, em relação à B..., o AA fazia negócio consigo próprio – ao que acrescentamos, só não sendo visível porque os demais Réus pessoas singulares lhe serviam de aparente interlocutor). A não revelação e encobrimento das relações familiares, da detenção do capital social da B... por parte dos Réus pessoas singulares e a sua própria interposição como interlocutores, sobretudo da B..., denota, de forma manifesta, que quer o CC quer a BB tinham perfeita consciência das regras que sobre o AA recaíam. O desconhecimento da relação familiar e da detenção do capital social da B... junto da Autora, como se disse, era generalizado, sobretudo ao nível dos superiores hierárquicos do Réu AA, o que tudo conjugado permitiu a prova dos factos 39º, 53º, 54º, 61º, 62º, 66º e 67º.”
Relevante é ainda o documento n.º 1, junto com o requerimento da Apelada de 31.10.2022.
Nesta cadeia de mensagens de “WhatsApp”, o Apelante AA, já depois de ter deixado a Apelada é que dá conta ao seu antigo superior hierárquico FF das suas relações familiares com os restantes Apelantes pessoas singulares.
Por fim, não concordamos que o facto 28 encerre qualquer juízo conclusivo.
Desta forma, pra além do que supra ficou dito a propósito do conflito de interesses, tudo visto e ponderado, o juízo probatório que formulamos em nada diverge do que se apresenta como essencial à convicção alcançada pela 1.ª instância, que consideramos suficientemente motivada.
Improcede pois a impugnação da totalidade dos factos que foram incluídos neste “bloco”.
4.3. Seguindo agora a ordem dos Apelantes, analisemos a impugnação feita ao “bloco de factos” que os Apelantes denominaram “DOS FACTOS ATINENTES AO INICIO DAS RELAÇÕES COMERCIAIS ENTRE AS PARTES”, onde se inclui matéria de facto respeitante aos “CÓDIGOS / ETIQUETAS DOS PRODUTOS COMERCIALIZADOS PELA AUTORA EM FUNÇÃO DO CANAL DE VENDA.”
Nesta matéria, os Apelantes impugnam do elenco dos factos provados, que pretendem ver julgados não provados, ou julgados provados com diversa redação, os factos 111, 112, 212, 213 e 240 (na redação que se encontra reproduzida supra nas conclusões de recurso, que aqui se dá pro reproduzida) e dos factos não provados, que pretendem ver provados, os factos 261, 262, 265, 266 e 273, tendo indicado, nas respetivas alegações de recurso, os concretos meios probatórios em que baseiam a sua pretensão.
Pretendem ainda ver aditado um facto assim numerado:
361) As Rés B... e C... não adquiriam produtos com a etiqueta “SNS” e “PVP”.
São os seguintes, os factos impugnados:
212) A Autora comercializava – e comercializa – os seus produtos – designadamente o Accu-Chek Aviva 50T– com diferentes códigos e diferentes preços, consoante o destino de venda e o tipo de cliente:
a) O produto destinado ao canal farmácia, chamado “SNS” e “PVP”, produto este destinado ao mercado da prescrição médica e controlado pelo protocolo da diabetes, onde os preços máximos estão implementados e regulados pelo Serviço Nacional de Saúde, pelo facto de estarem em causa produtos (códigos) de prescrição médica.
Estes produtos são vendidos para venda exclusiva nas farmácias em Portugal.
Os preços para o Accu-Chek Aviva 50T encontravam-se fixados na tabela de preços da Autora intitulada “Lista de Preços E... - Armazenistas 2016”, da seguinte forma: SNS €16,44 e PVP €21,81
b) O produto destinado aos concursos públicos e ao canal de venda direta ou consumidor final, sem qualquer etiqueta “SNS” ou “PVP”, que não se destinava ao mercado da prescrição médica, mas sim a consumidores finais, porque as utilizam nos seus próprios pacientes, como hospitais, clinicas, entre as quais as de hemodiálise e de cuidados continuados, lares, bombeiros, etc;
c) O produto destinado a revenda, fora dos canais a que se alude nas alíneas anteriores, que tinha o preço de tabela de €16,44;
d) O produto destinado a canais específicos, fora das situações anteriores, que era definido caso a caso;
213) Em 2012, o preço mínimo do produto Accu-Chek Aviva 50T que era praticado no canal de venda direta identificado na alínea b) era de €7,50;
240) Num documento elaborado pelo grupo E... em 2012, foi fixado um preço mínimo de venda, para o ano de 2013, do Accu-Chek Aviva de €7,50, para concursos públicos, e de €15,00, para o retalho (cfr. documento n.º 28, anexo à contestação);
E pretendem que sejam julgados não provados os seguintes factos:
111) O Réu AA logrou – através da interposição da Ré B... entre o próprio e a Autora e com a colaboração dos Réus CC e BB – garantir o Accu-Chek Aviva 50T a um preço e numas quantidades que lhe permitiam auferir um provento elevado;
112) A Ré BB, à data simultaneamente administradora única da Ré B... e titular da totalidade do capital social da Ré C..., também conseguiu garantir o Accu-Chek Aviva 50T a um preço e numas quantidades que lhe permitiam auferir um provento elevado;
E os seguintes factos não provados, que pretendem ver provados:
261) Os “armazenistas” são intermediários que compram à Autora os produtos “SNS” e “PVP”, com os códigos ANF (Associação Nacional de Farmácias) e RD (A...);
262) Os distribuidores são intermediários que compram o produto designado de “venda livre”;
265) As Rés B... e C... eram distribuidoras do canal de venda direta/venda livre;
266) A sociedade S... comprava (i) os mesmíssimos produtos que o Réu CC pretendia vir a adquirir à Autora, (ii) com a mesmíssima descrição, (iii) a um preço inferior àquele que o Réu AA sugeriu internamente que fosse proposto,
273) O preço concedido pela Autora à Ré B..., era por aquela praticado junto de vários outros clientes, do mesmo canal de vendas, que adquiriam quantidades de produto significativamente inferiores àquelas que eram adquiridas pela Ré B...;
Com a impugnação destes factos, pretendem os apelantes ver afastada a convicção do tribunal expressa nos factos:
111) O Réu AA logrou – através da interposição da Ré B... entre o próprio e a Autora e com a colaboração dos Réus CC e BB – garantir o Accu-Chek Aviva 50T a um preço e numas quantidades que lhe permitiam auferir um provento elevado;
112) A Ré BB, à data simultaneamente administradora única da Ré B... e titular da totalidade do capital social da Ré C..., também conseguiu garantir o Accu-Chek Aviva 50T a um preço e numas quantidades que lhe permitiam auferir um provento elevado;
Para tanto, pretendem ver reconhecida a existência de diferentes preços entre armazenistas e distribuidores tal como explanaram na sua contestação, (não tendo sido essa a diferenciação de preços existente na Autora que veio a ter acolhimento na sentença, de acordo com a prova produzida),defendendo que foi feita prova no sentido de que o preço a que lhes foi vendido o produto ACCU-CHEK AVIVA 50T, foi o preço habitualmente praticado pela autora em certos canais, pelo que nunca beneficiaram de qualquer preço de venda reduzido.
É a nosso ver manifesta, a falta de razão os Apelantes, em face da prova globalmente produzida, desde logo porque, defender, como fazem aqueles, que o preço mínimo para as vendas era de 7,50€ preço que constava do documento intitulado “Proposal Analysis Tool” é desde logo contrariada pela prova produzida no seu conjunto, já que tornaria incompreensível os artifícios criados pelo réu AA (com a colaboração dos demais réus), para conseguir obter os preços de 9€ e 10€ do ACCU-CHEK AVIVA 50T junto da Autora, tendo para tanto de criar um empresa, para, sob a veste de uma pessoa coletiva – a Ré B... - ficcionar a realização de vendas daquele produto, durante 4 anos para o mercado Angolano (usado como desculpa para obter da Autora produto a preços mais baixos), para o qual, como se descobriu mais tarde, não vendeu um único produto durante todos aqueles anos!
Resulta ainda de forma clara do Documento n.º 2, junto ao Requerimento da Apelada de 02.09.2022 (relatório da R... em que se quantificam as vendas da Apelada a todos os revendedores de Accu-Chek Aviva 50T e o seu preço médio, entre fevereiro de 2014 e março de 2016, quando foi assinado o Contrato de Distribuição Exclusiva, de onde resulta que a Apelante B... beneficiou do preço médio de € 9,99, para 293.799 embalagens, a Apelante C... do preço médio de € 10, para 146.259 embalagens, e todos os outros revendedores do preço médio de € 16,94, para 1.049.916 embalagens); e ainda o Documento n.º 19, junto à Petição Inicial (relatório da R... em que se quantificam as vendas da Apelada a todos os revendedores de Accu-Chek Aviva 50T e o seu preço médio, na vigência do Contrato de Distribuição Exclusiva, de onde resulta que a Apelante B... beneficiou do preço médio de € 9,01, para 789.882 embalagens, a Apelante C... do preço médio de € 9,22, para 86.624 embalagens e todos os outros revendedores do preço médio de € 16,34, para 990.023 embalagens; e que inclui ainda as quantidades de Aviva 50T vendidas a € 9, entre 2014 e 2018, pela Apelada a duas clínicas de diálise – i.e., consumidoras e não revendedoras do Accu-Chek Aviva 50T –: a T..., com cerca de 11.000 embalagens, e a S..., com cerca de 1.200 embalagens), o qual foi confirmado pela testemunha PP, autor da análise da referida consultora), que nenhum revendedor de Accu-Chek Aviva 50T beneficiou dos preços de que as Apelantes B... e C... beneficiaram.
Também não colhem as críticas feitas aos depoimentos das testemunhas FF, HH, nos quais o tribunal fundamentou a sua convicção, no sentido em “depuseram sempre – como seria de esperar – de forma interessada, alinhada e comprometida, e deu pouca ou nenhuma credibilidade às demais testemunhas, algumas das quais com (longa) ligação laboral à Autora (passada ou presente), com grande conhecimento dos factos e que depuseram de forma espontânea e descomprometida.”
Ora desde logo quanto a esta crítica, não vislumbramos qualquer razão para não considerar, tal como foi considerado pelo tribunal recorrido, relativamente a estas duas testemunhas, que se trataram de “dois depoimentos que, no geral, se destacaram pelo conhecimento direto dos factos aqui em discussão, pela sua coerência, até na análise de documentos basilares que dos autos constam, interpretando-os de forma consentânea com o seu teor literal, que não foram contrariados por outros elementos probatórios e que mereceram o acolhimento do tribunal.”
Acresce que a versão trazida pelas testemunhas FF e HH que afirmaram que o preço fixado para a B... e C..., a €10,00 e €9,00 teve por base o critério do seu destino, os Palop’s, o business case, constituindo um canal especifico, sem paralelo com os demais, se apresenta sob o signo da probabilidade lógica – de evidence and inference, isto é, segundo um critério de probabilidade lógica prevalecente.
Na sentença fundamentou-se assim esta factualidade: “Quanto aos factos 40º e 212º alíneas a) a c) (este reunindo a versão da Autora e dos Réus) há que assinalar que as testemunhas FF, HH e as demais testemunhas que a tal se referiram não aludiram à distinção entre armazenistas e distribuidores tal como explanada pelos Réus na sua contestação, sendo aliás as duas expressões usadas por aqueles de forma indistinta e aleatória (no seu depoimento de parte, a representante legal da Autora teve inclusivamente dificuldade em compreender as perguntas que nesse sentido lhe foram colocadas). Foram muito claros em explicar que existia o canal Serviço Nacional de Saúde e Preço de Venda ao Público, como etiqueta própria e com preço tabelado a nível governamental. Depois, existia o canal de venda direta, onde se incluíam os concursos públicos (public tender) e para outros consumidores finais, como hospitais e clínicas privadas, nomeadamente de hemodiálise, bombeiros, lares de terceira idade, bombeiros, etc, canal para o qual existe uma tabela com preços mínimos, na ordem dos €7,50 (são as testemunhas QQ e RR, que exercem a sua atividade neste canal, que melhor o descrevem, pese embora a total liberdade afirmada na fixação do preço para apresentação de propostas não resultasse credível, até porque o contrariou a testemunha NN, ao afirmar que existia uma folha de Excell que permitia efetuar esse cálculo, de acordo com as quantidades, e a aprovação pela própria Autora). Tal permitiu a prova do facto 213º. Neste canal, o preço era fixado de acordo com o tipo de investimento necessário (nomeadamente em aparelhos), as quantidades e outros fatores que, analisados, permitiam apresentar um preço por forma a tornar o negócio rentável, dentro dos preços mínimos e máximos. Fora daquelas duas situações, há ainda aquelas em que o preço fixado de acordo com o business case ou com aprovação superior, como o afirmou e explicou a testemunha FF na sessão de 4.11.2022, aqui enquadrando a situação da B... e C..., sendo que o preço da B... foi posto no business case de Angola, tal como foi proposto à testemunha pelo AA, e que foi aprovado (daí a prova da alínea d) do facto 212º), Por fim, e de acordo com o depoimento das testemunhas FF e HH havia um outro canal, a de venda a revendedores sem finalidade especifica, cujo preço era na ordem dos €16,00/€17,00, preço esse que se cruza com a questão da tão propalada exportação paralela, que sendo conhecida da E... Global e não podendo ser proibida, não deixava de ser monitorizada e desincentivada, pelas razões referidas pelas testemunhas SS e OO, cujo depoimento não pode deixar de se acolher pela sua isenção, sendo por isso que o preço fixado a estes clientes era mais elevado, por forma a tornar pouco rentável a sua exportação para outros países europeus. Face a tais elementos probatórios e ainda por falta de prova que o comprovasse, resultaram não provados os factos 261º, 262º (estes no sentido de que existem estas duas categorias de clientes da Autora com tal diferenciação). Por causa da falta de rigor na matéria de facto em causa, nos termos expostos, deu-se por não provado o facto 272º (que inclusivamente, mesmo na lógica dos Réus, é contraditório por aludir aos armazenistas). Também a distinção do canal “venda livre” não resultou clara. Com efeito, conjugados os depoimentos das testemunhas, o que resultou foi que tirando o produto SNS e PVP, todo o demais produto vendido tinha a mesma etiqueta. Porém, o que não resultou é que a distinção entre o produto com etiqueta ou sem etiqueta fosse o único critério para a existência de preços diferenciados. O que as testemunhas FF e HH afirmaram é que o preço fixado para a B... e C..., a €10,00 e €9,00 teve por base o critério do seu destino, os Palop’s, o business case, constituindo um canal especifico, sem paralelo com os demais (sem prejuízo do que infra se referirá quanto a esta questão). Mais nenhum depoimento contrariou esta explicação de forma credível e que a abalasse, que se cruza com a questão do desincentivo à exportação paralela, sendo, sobretudo o primeiro, perentório em afirmar que apenas concordou com a fixação do preço de €10,00 à B... porque o AA o convenceu de que era o preço possível em Angola, tendo em conta os custos associados à exportação. Como tal, e porque essa prova não foi feita, teve que se dar por não provada a factualidade constante dos factos 265º, 266º (na interpretação de que se tratava do mesmo canal de vendas), 271º (com o mesmo fundamento interpretativo) e 273º (com o mesmo exato fundamento). Neste circunspecto cabe assinalar que as relações entre a Autora e a B..., como transpareceu do depoimento de várias das testemunhas ouvidas e que se transcreveu, sobretudo da testemunha GG, QQ, RR, entre outras, era mais vasto do que aquelas que nestes autos estão a ser discutidas, sendo certo que nenhuma dúvida se suscitou quanto a alguma eventual confusão entre quantidades e tipo de produtos objeto de outros contratos e os que nestes autos se discutem.”
Do exposto resulta que a matéria de facto julgada provada e não provada em apreço, coaduna-se inteiramente, a nosso ver, com o juízo probatório sobre o conjunto dos meios de prova produzidos que foi produzido na sentença, sendo pois de manter.
Assim sendo, resta indeferir a impugnação da totalidade dos factos integrantes deste “bloco”, ficando consequentemente prejudicada a prova do facto “361”, que os apelantes pretendem ver incluído na factualidade provada.
4.4. Ainda no âmbito dos factos atinentes ao início do relacionamento comercial entre as partes, analisemos agora a impugnação feita ao “bloco de factos” que os Apelantes denominaram de “OS DIVERSOS DEPARTAMENTOS EXISTENTES NA A. E DAS REGRAS DE ABERTURA DE NOVOS CLIENTES.”
Os Apelantes impugnam do elenco dos factos provados, que pretendem ver julgados não provados, os factos 43 e 46 e 279 e 280, dos factos não provados, que pretendem ver julgados provados, sendo o facto 28º com uma diferente redação (na redação que se encontra reproduzida supra nas conclusões de recurso, que aqui se dá pro reproduzida),tendo indicado, nas alegações de recurso, os concretos meios probatórios em que baseiam a sua pretensão.
Pretendem ainda ver aditado o facto assim numerado:
362) Para algum cliente da Autora ser favorecido no que diz respeito ao preço praticado, tinham de estar várias pessoas de acordo, de forma a permiti-lo.
São estes os factos provados impugnados:
43) A área de negócios Diabetes Care Portugal tinha no Réu AA o responsável pela gestão dos principais clientes, entre os quais se incluíam as Rés B... e C...;
46) Em termos práticos, a área de negócios Diabetes Care Portugal recorre aos serviços dos departamentos comercial, encomendas, qualidade, concursos, financeiro e logística da Autora para o desenvolvimento da sua atividade, mas sem que estes departamentos tenham qualquer competência ou poder para condicionar o que a área de negócios Diabetes Care Portugal, na sua autonomia, decidir;
E são os seguintes os factos não provados:
279) A abertura de um novo cliente podia nem sequer passar pelo Réu AA, passando sempre, isso sim, pelo GG, Key Account Manager da Autora, e pelo Head of Diabetes Care em Portugal, que era então o FF, bem como por variadíssimos departamentos internos da A., num processo burocrático, minucioso e moroso, como é próprio das sociedades multinacionais, como é o caso da Autora;
280) Quando se abre um novo cliente no sistema da E..., a Autora tem acesso, através da plataforma “Informa D&B” a um conjunto alargado de informação sobre o cliente, designadamente no que diz respeito à sua estrutura acionista e de gestão;
A sentença, quanto a esta matéria considerou a prova produzida no seu conjunto, tendo resultado da conjugação do depoimento das testemunhas TT, EE, UU e FF e da testemunha HH.
O que as testemunhas afirmaram (FF, HH EE e GG), foi que o réu AA era um alto quadro da Autora da área da Diabetes Care, estrutura que não reportava internamente, com elevados poderes decisórios, a seguir ao seu superior hierárquico, a cujo cargo aspirava aliás, suceder.
E não se pode descartar a importância e o papel desempenhado pelo funcionário AA, na aceitação das sociedades B..., por si detida e pela C..., detida pelos seus familiares, como clientes da Autora, porquanto aquelas foram apresentadas por aquele (especialista no mercado africano), como essenciais para desenvolvimento do negócio no continente africano, como desde logo se pode retirar da correspondência trocada pela partes, que se encontra junta aos autos e se mostra devidamente analisada pelo tribunal recorrido e devidamente conjugada com os demais meios probatórios.
Do exposto resulta que secundamos, uma vez mais, a análise crítica da prova feita na sentença, já que não vemos razões válidas para censurar a decisão da matéria de facto em qualquer dos segmentos impugnados identificados ficando ainda e consequentemente prejudicado a necessidade de aditamento do facto “362”, que os apelantes pretendem ver incluído na factualidade provada.
4.5. Ainda atinente ao início das relações comerciais, os apelantes impugnam os factos referentes ao “bloco de factos” que denominaram de “DA FORMA COMO OS RÉUS SE TORNARAM CLIENTES DA AUTORA”.
Os Apelantes impugnam do elenco dos factos provados, que pretendem ver julgados não provados, ou julgados provados com diversa redação, (na redação que se encontra reproduzida supra nas conclusões de recurso, que aqui se dá por reproduzida), os factos 35, 40, 64, 78, 79, 85, 86, 87, 88, 90, 91, 92 e 113, e dos factos não provados, 257, 258, 259, 259, 278, 285 e 286, que pretendem ver provados, tendo indicado, nas alegações de recurso, os concretos meios probatórios em que baseiam a sua pretensão.
Pretendem ainda ver aditados os factos assim numerados:
363) Na proposta referida nos factos 41) e 42), a. não impôs ao R. CC que os produtos incluídos nessa proposta só pudessem ser vendidos no mercado dos PALOPs.
364) Na proposta referida nos factos 41) e 42), a. não impôs ao R. CC qualquer limite quanto ao número de embalagens de produto que este poderia adquirir.
365) Os preços oferecidos pela A. ao Réu CC para o Accu-Chek Aviva 50T, na sequência do email referido no facto 35), foram fixados tendo como pressuposto a sua revenda do no mercado nacional.
366) No email referido no facto 47), enviado pela Ré BB, em representação da Ré B..., à A., não é dito, direta ou indiretamente, que os produtos para os quais foram pedidas propostas comerciais se destinavam ao mercado dos PALOPs.
367) As condições comerciais oferecidas à Ré B... foram iguais às condições comerciais anteriormente oferecidas ao Réu CC.
368) Na proposta referida nos factos 51) e 52), a. não impôs ao R. CC que os produtos incluídos nessa proposta só pudessem ser vendidos no mercado dos PALOPs.
369) Na proposta referida nos factos 51) e 52), a. não impôs à Ré B... qualquer limite quanto ao número de embalagens de produto que este poderia adquirir.
370) Os preços oferecidos pela A. à R. B... para o Accu-Chek Aviva 50T, na sequência do email referido no facto 47), foram fixados tendo como pressuposto a sua revenda no mercado nacional.
371) O preço indicado pelo Réu AA para o Accu-Chek Aviva 50T ser vendido à Ré B... era um preço habitual e recorrente praticado pela Autora para o tipo de clientes referidos na alínea b) do facto 212), ou
371) O preço indicado pelo AA para o Accu-Chek Aviva 50T ser vendido ao à Ré B... era um preço habitual e recorrente praticado pela Autora.
372) O preço indicado pelo Réu AA para o Accu-Chek Avia 50T ser vendido à Ré C... era um preço habitual e recorrente praticado pela Autora para o tipo de clientes referidos na alínea b) do facto 212)., ou
372) O preço indicado pelo AA para o Accu-Chek Aviva 50T ser vendido ao à Ré C... era um preço habitual e recorrente praticado pela Autora.
373) Por sua vez, o departamento de encomendas da Autora reencaminhou o email referido no facto 64) para o departamento de concursos da Autora e para GG (cf. documento n.º 18 anexo à petição inicial);
374) Só depois é que esse email foi remetido pelo departamento de concursos da Autora ao Réu AA (cf. documento n.º 18 anexo à petição inicial).
Mostram-se impugnados os seguintes factos provados:
35) Em 25.07.2013, o Réu CC – afirmando representar uma sociedade denominada “G...” – encomendou produtos à Autora através de email remetido para o endereço eletrónico pertencente ao departamento de encomendas da Autora, com o seguinte teor: “Somos uma empresa que opera no mercado nacional, fornecendo dispositivos e consumíveis a uma larga abrangência de clientes na área dos Lares de Repouso, Clínicas de Hemodiálise e Medicina no trabalho. Neste momento estamos a trabalhar com a K... no que se refere aos equipamentos de determinação de glicémia, mas estamos a procurar novas parcerias neste segmento. Gostaria de pedir uma proposta dos vossos produtos Accu Check Aviva 50T e respetivo Aparelho de diagnóstico, para promoção e venda direta aos nossos clientes. (…) A quantidade adquirida à K... no ano de 2012 foram 3.000 Embalagens (…)
40) O preço indicado pelo AA para o Accu-Chek Aviva 50T ser vendido ao CC era um preço habitual e recorrente praticado pela Autora para o tipo de clientes em que este afirmou incluir-se;
64) A 11 de abril de 2014, dois dias após a constituição da Ré C..., o Réu CC, em representação da Ré C..., remeteu à Autora um e-mail com o seguinte teor:
“Exmºs Senhores; Gostaríamos de obter preços para aquisição de produtos Accu Check Aviva, Accu Check Performa, Accu Check Sensor e também para Lancetas. Quantidade média de compra mensal – 3000 Embalagens Destino – África (…) – cfr. documento 18, anexo à petição inicial, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido
78) A Autora apenas concedeu à Ré B... e à Ré C... aquele preço porque o Réu AA, com o contributo dos Réus CC e BB, a manteve convencida de que as embalagens de Accu-Chek Aviva 50T, vendidas a €10,00 numa primeira fase e a €9,00 numa segunda fase, se destinavam exclusivamente aos mercados africanos e que era aquele preço o possível de praticar em tais mercados;
79) Foi sempre assim que o Réu AA, enquanto desempenhou funções de Head of Market Access & Key Account Manager da Autora e em inúmeras comunicações trocadas, também com os Réus CC e BB, descreveu a finalidade das vendas do Accu-Chek Aviva 50T à Ré B... e à Ré C...;
85) No início, as Rés B... e C... começaram a adquirir Accu-Chek Aviva 50T à E... de uma forma incipiente;
86) E assim, embora ainda em reduzidas quantidades, os Réus AA, CC e BB, através da B... e C..., lograram superar o primeiro desafio: começar a comprar à Autora Accu-Chek Aviva 50T e fazê-lo a um preço que lhes conferia uma elevada margem de lucro;
87) O nível de incipiência de tais aquisições, apesar de ter funcionado daquela vez, dificilmente poderia replicar-se muitas vezes e seguramente não poderia ser escalada para quantidades relevantes de produto;
88) No primeiro contacto, o Réu CC alegou representar uma sociedade denominada “G...”, que nunca existiu;
90) Depois dessa primeira aquisição, o desafio que se colocava aos Réus AA, CC e BB, através das sociedades Rés, passava por replicar os fornecimentos e, em segundo lugar, aumentar as quantidades;
91) Para isso o Réu AA constituiu a Ré B... e, com o auxílio dos Réus BB e CC, levou a que aquela iniciasse relações comerciais com a Autora;
92) Para isso, também a Ré BB constitui a Ré C... e, com o auxílio dos Réus AA e CC, levou a que aquela iniciasse relações comerciais com a Autora;
113) A Autora nunca teria iniciado relações comerciais com Ré B... se o Réu AA tivesse sido transparente no que concerne às suas relações familiares com os restantes Réus e à sua posição acionista na Ré B...;
E foram impugnados os seguintes factos não provados:
257) O Réu CC era uma pessoa com experiência no mercado de diabetes care, tendo, inclusivamente, representado produtos da área da saúde da multinacional U...;
258) Em 2013, o Réu CC exercia a sua atividade como empresário em nome individual, utilizando, para o efeito, a denominação comercial “G...”;
259) Os produtos adquiridos pelo Réu CC eram, depois, comercializados diretamente, em território português, junto de lares e clínicas de hemodiálise;
278) No email de 17.02.2014, a Ré BB limita-se a informar que, a partir daquele momento, as compras que antes eram efetuadas pelo Réu CC, enquanto empresário em nome individual passariam a ser efetuadas pela B..., que havia sido constituída recentemente;
285) Desde 2014 (ou 2013, se se tiver em linha de conta a relação comercial entre a Autora e o Réu CC), a Autora e as sociedades Rés iniciaram e fomentaram uma relação comercial por via da qual as segundas distribuíam, a clientes por si angariados, produtos adquiridos à Autora não tendo, nesse período, sido colocado qualquer entrave ou referido qualquer impedimento, por parte da Autora, relativamente à possibilidade de distribuição dos produtos em mercados que não o mercado angolano e moçambicano;
286) Muito antes de ter sido celebrado o contrato de distribuição, já as Rés pessoas coletivas adquiriam tais produtos à Autora para revenda a quem e onde bem entendessem;
Pretendem os apelantes afastar a prova dos factos demonstrativos da versão da Autora, segundo a qual, desde o início da relação contratual estabelecida entre as partes, impôs e pressupôs que os bens que vendia à Ré B... se destinavam a ser revendidos nos PALOPs e que só ofereceu um preço de € 10 e posteriormente de 9€ para o Accu-Chek Aviva 50T, porque o produto tinha esse destino geográfico e que os Réus arranjaram um esquema para começar a comprar produtos de forma incipiente para depois aumentarem a escala, alegando que os mesmos constituem “uma pura ficção, sem qualquer apoio na prova documental junta aos autos.”
Sem razão, porém, se considerarmos a prova globalmente produzida nesta matéria.
Quanto à questão suscitada relativamente à “G...”, que aparece mencionada no endereço de e-mail de 25.07.2013, (“CC..........@.....”.) dirigido subscrito pelo Réu CC dirigido à autora, é o próprio que afirma no texto do e-mail, em que se apresenta “Somos uma empresa que opera no mercado nacional” pelo que é de manter a redação desse facto, já que aquele não se apresentou à Autora como pessoa singular, mas sim como uma empresa.
Aquele cunhado de AA, no primeiro contacto com a Autora, apresenta-se como “uma empresa” e não em nome individual, associando-se o nome da mesma, posteriormente no e-mail que constitui o doc 12 da p.i, a BB, administradora da B... e irmã de AA que remeteu para a autora um e-mail onde anuncia que que a “empresa anterior G..., Ldª”, passava a ser a nova empresa “B... MEDICAL, SA”.
Acresce que não resulta do conjunto da prova produzida o cabal esclarecimento do que era a “G...”, que iniciou o contacto com a Autora e que depois deu lugar à B..., SA, no relacionamento comercial com aquela.
A primeira abordagem feita pelos réus à Autora, foi feita através do Réu CC, através do e-mail, reproduzido no facto 35, em que diz ser “uma empresa que opera no mercado nacional”, solicitando preços para revenda no mercado nacional - em lares e clinicas de hemodiálise e medicina do trabalho.
Não interessa à decisão desta ação, saber se efetivamente CC em nome próprio ou através da G..., comercializou ou não e a quem vendeu o produto Accu – Check Aviva 50T, (facto não provado 259) até porque esse relacionamento comercial que terá ocorrido em 2013, está fora do âmbito temporal que se discute nesta ação, que é iniciado com as Rés B..., SA e C..., sociedades constituídas respetivamente, apenas em 30.1.2014 e em 9.4.2014.
A primeira abordagem feita pelo cunhado do réu AA, vai dar origem ao relacionamento comercial com a sociedade entretanto constituída por aquele AA, a B..., SA, através da comunicação feita pelo e-mail, referido no facto 47, em Fevereiro de 2014, data em que se iniciam as relações comerciais com esta empresa, que se encontram em discussão nesta ação e que se mantiveram até Fevereiro de 2018. E é já com estas duas sociedades B... e C... que o relacionamento comercial passa a ter como escopo o mercado africano.
Já releva o facto 40, pois provou-se que o preço que lhe foi indicado era, não o preço feito pela autora a qualquer cliente, mas sim o preço que era praticado pela autora sim, mas no segmento de mercado residual, que CC declarou vender – “lares, clinicas de hemodialise” - onde o preço de venda era inferior aqueloutro.
A alteração do facto 40, no sentido que os produtos vendidos ao CC era feito a um preço habitual e recorrente praticado pela Autora, carece de suporte probatório, pelas razões já supra adiantadas.
Pretendem ainda os apelantes ver reconhecido, na impugnação que fazem deste bloco de factos, que antes da celebração, por escrito, do contrato de distribuição exclusiva em 21.3.2016, entre a Autora e a B..., os produtos vendidos a esta empresa destinavam-se ao mercado nacional e não aos PALOP.S.
Dizem em suma que, ao contrário da correspondência trocada com a C..., não existem registos na correspondência trocada entre a B... e a autora no sentido que as vendas se destinavam ao mercado angolano.
Esta afirmação não tem correspondência na realidade, sendo desmentida pela prova documental junta aos autos, que se encontra devidamente individualizada e apreciada criticamente na sentença, para a qual remetemos.
Na verdade, basta consultar os documentos 27, 28, 32 e 33 juntos com a pi, que constituem correspondência trocada entre as partes, para ver que não é assim.
Com efeito, comos e lê na sentença e se constata pela leitura e análise daquela documentação, “Afastado esse conhecimento e o conluio invocado, há que atentar que ainda antes da celebração do contrato de distribuição exclusiva (que é de 21.03.2016) já a Autora estava a patrocinar ações da B... em Angola (cfr. documento n.º 27 anexo à petição inicial de 2 e 4.11.2015), o Réu AA assegurava a forte presença desta em Angola (documento n.º 28 anexo à petição inicial de 8.02.2016) e, mais importante, o mesmo AA afirmava serem a B... e a C... os parceiros para Angola e que havia visto a respetiva documentação de exportação (documento n.º 33 anexo à petição inicial de 9.11.2015) e, por fim, que havia visto toda a documentação da B... e C... relativa à exportação para Angola, justifica porque razão o produto não poderia ser reimportado, por razões financeiras, afastando que fossem estas que estavam na origem da exportação paralela (documento n.º 32 anexo à petição inicial, datado de 29 de maio de 2015, mais de um ano antes da celebração do contrato de distribuição).”
Em 29/05/2015, (data anterior à celebração do contrato escrito de distribuição), o Réu AA enviou um email a FF com o seguinte teor: “Caro FF, Conforme conversado hoje, reuni com a C... e a B... para avaliar as vendas de ambas, o seu desempenho em África e eventual exportação paralela para a Europa.(,,,)”
Acresce, que de acordo com os depoimentos prestados pelas testemunhas FF e HH, o preço fixado para a B... e C..., a €10,00 e €9,00 teve por base o critério do seu destino, os Palop’s, o business case, constituindo um canal especifico, sem paralelo com os demais, tendo o primeiro sido perentório em afirmar que apenas concordou com a fixação do preço de €10,00 à B... porque o AA o convenceu de que era o preço possível em Angola, tendo em conta os custos associados à exportação.
De referir ainda que, de acordo com o “Angola Business Plan 2023” junto à petição inicial como documento n.º 24 no capítulo da autoria do AA, na página 40 desse documento indica que em 2014 as vendas para tal destino tinham crescido, o que corrobora que nesse ano se iniciaram as vendas para a B... tendo por destino “aparente” Angola (face ao fracasso, perante o que eram as expectativas da equipa, dos parceiros anteriormente escolhidos).
Daí que nesta matéria inexistem fundamentos para nos afastarmos da análise crítica feita na sentença quanto ao relacionamento comercial entre as partes: “Com fundamento no depoimento da testemunha FF, que foi acolhido, corroborado por outros elementos probatórios que se descreverão há que considerar que: Em inícios de 2012 surge o interesse do FF pelo mercado dos Palop’s como o próprio afirmou e resulta do teor do documento n.º 21 (não resultando do mesmo a matéria constante do facto 289º, daí a sua não prova), sendo essa data anterior àquela em que os Réus afirmam, no art. 153º da contestação, ter surgido o projeto Autonomy & Speed, pelo que não podia ser este a alavancar a ideia dos mercados dos Palop’s (o que desde logo motivou a não prova dos factos 295º e 317º). Daí a prova dos factos 93º, 94º, 97º e 98º. Em inicio de 2013, o referido FF encarrega a sua equipa, liderada pelo AA, de elaborar um estudo consistente sobre os Palop’s/Angola, estando já consolidada a decisão de avançar para tal mercado - daí a prova dos factos 95º e 96º. Também em início de 2013 houve uma reestruturação da equipa, o que foi confirmado pelo EE, da qual resultou que o AA, porque nele depositava confiança e havia proximidade entre ambos, passasse a assumir as funções a que alude o facto 100º, que constituíram uma promoção. Como resultou do depoimento da testemunha EE a sua participação na elaboração do estudo sobre os Palop’s/Angola foi residual, apenas fornecendo números globais, tendo sido o AA a calcular as estimativas de vendas (daí a prova dos factos 102º e 229º e a não prova dos factos 296º a 298º). A mesma testemunha afirmou não certezas sobre a sua intervenção na elaboração do plano de vendas revisto para Angola mas foi perentório em afirmar que os cálculos do volume de vendas e projeções que a tal respeitasse fossem por si elaboradas, por não ter know-how para isso. Daí a não prova do facto 357º. Afirmou a testemunha FF que a partir de 2013 o AA se deslocou a Angola (daí a prova do facto 99º), o que juntamente com o estudo que realizou para a elaboração do documento “Angola - Business Plan 2013” (documento n.º 24 anexo à petição inicial que, aliás, ostenta o seu nome) o tornou a pessoa com mais conhecimentos sobre Angola. Afirmou que o plano, datado de setembro de 2013, foi elaborado e apresentado pelo AA (prova dos factos 101º e 103º). Da falta de desempenho dos parceiros indicados no plano foi referida pelo FF (nada se tendo provado quanto à factualidade contida nos factos 299º a 301º), surge e necessidade, em finais de 2013, de os substituir, tendo o próprio AA efetuado contactos. Note-se que era este o funcionário que estava encarregue de acompanhar o desenvolvimento dos negócios em Angola. Daí a prova do facto 104º. Em fevereiro de 2014 é apresentado o plano revisto para Angola, totalmente da autoria do AA, como o confirmaram as testemunhas EE e FF. Daí a prova dos factos 105º, 106º e 107º (por referência ao documento n.º 26 anexo à petição inicial) e a não prova dos factos 303º e 304º (este porque a própria testemunha o negou e mais ninguém de forma credível o afirmou). Ainda que a proposta revista surgisse no âmbito de uma reunião, como o mencionou o FF, certo é que não deixou de assinalar que havia várias hipóteses de expansão, sendo que não estava em causa o encerramento da Autora, como o referiram as testemunhas que mereceram a credibilidade do tribunal (sendo certo que a Autora ainda se mantém atualmente como subsidiária). Daí a não prova do facto 302º. Isto posto, em fevereiro de 2014 é apresentado o plano de vendas para Angola, com revisão em alta das estimativas de venda (documento n.º 26 anexo à petição inicial) e não existem parceiros, estando indicado que deveria ser escolhido um parceiro com base portuguesa mas presença em Angola. Como resulta do documento n.º 12 anexo à petição inicial, em 24 de fevereiro, surge o email da Ré BB onde indica que a G..., Lda, devido a uma reestruturação, alterou a sua denominação e objeto social para B..., S.A., A B... havia sido constituída no fim de janeiro de 2014. A BB, o CC, seu marido, e aparentemente detentor da “G...”, transformada em G..., Lda no email da B..., que não existia, e sobretudo o AA sabiam que esse email, onde nem se indica qual a finalidade das vendas, não era verdadeiro. No entanto, o Réu AA não alertou o departamento de concursos de tal falsidade e fixou o preço a praticar, quando não dispunha de indicação da finalidade das vendas, fixando o preço do canal venda direta, como o assinalou a testemunha FF. Esta coincidência temporal entre a procura de parceiro em Angola, a constituição da B... e a “transformação” da G... em B... revela o primeiro passo visível dado no sentido de enganar a Autora e agarrar a oportunidade. Apesar do preço já fixado em €10,00 para a B..., o Réu AA avança no sentido de convencer o FF que era esse o preço possível de realizar e convence-o de que a B... era o parceiro ideal para Angola, afirmações da testemunha que mereceram credibilidade e fundaram a prova dos factos 108º a 110º. Porém, sendo o destino Angola, já não estavam em causa as 3.000 embalagens anuais como referido pelo CC aquando do envio do email da G..., mas sim, outros mais elevados, tendo em conta os números do plano revisto para Angola. Sendo o objetivo dos Réus a exportação para países onde o preço do produto era mais elevado, os Réus pessoas singulares conseguiram aqui uma enorme vantagem, quer em preço, quer em quantidades. Se dúvidas houvesse sobre a existência de um plano calculado e delineado que se manifesta e materializa com a constituição da B... e no email de 24 de fevereiro de 2014, basta atentar no primeiro contacto da C..., de 17 de abril de 2014 (documento n.º 18, anexo à petição inicial) que igualmente aludindo à aquisição de 3.000 embalagens, desta feita mensais, solicita preços para Angola, quando todos os Réus pessoas singulares, familiares entre si, sabiam do contexto em que atuavam e que a via estava aberta para as aquisições naquelas quantidades e àqueles preços para aquela finalidade. É por isso que já em maio de 2015 estava consolidada a imagem de que a B... e a C... eram os parceiros para Angola. Daqui extraiu o tribunal que após pequenas aquisições pela B..., com a aprovação pela testemunha FF, quer da B..., quer do preço de €10,00, que branqueou a decisão do AA no momento da falsa transformação da G... em B..., tendo havido um elevado e sério investimento na implementação nos Palop’s por parte da Autora, para cuja credibilidade contribuiu o AA, teve que ocorrer ainda no ano de 2014. Acolhendo o depoimento da testemunha FF, no sentido de que pretendia ajudar o AA a ser o seu sucessor (sendo que a saída do primeiro tinha ver com prazos de permanência num território) e de que era este a pessoa que mais dominava a área de negócios dos Palop’s, deu-se por provado que a apresentação que constitui o documento n.º 29 anexo à petição inicial foi feita e apresentada, nos capítulos correspondentes a esses territórios pelo AA (o que fundou a prova dos factos 148º a 153º e a não prova dos factos 308º, 309º e 310º - este porque a apresentação, sendo da área da Diabetes Care, não precisava de lhe fazer expressa referência -333º e 334º, sem prejuízo do que infra se referirá quanto à assinatura do contrato de distribuição).”
Desta forma, improcede a impugnação da totalidade dos factos impugnados neste “bloco de factos”, em nada divergindo a nossa apreciação crítica do que se apresenta como essencial à convicção alcançada pela 1.ª instância, que consideramos uma vez mais, solidamente motivada, ficando ainda prejudicada a prova dos factos que os apelantes pretendem ver ser adicionados aos julgados provados, uma vez que não teve acolhimento a versão dos mesmos, em face da análise critica da prova feita.
Vejamos agora a impugnação feita aos factos integrantes do denominado “bloco de factos”, “FACTOS ATINENTES AO RELACIONAMENTO COMERCIAL ENTRE AS PARTES.”
Alegam os Apelantes que nesta matéria o tribunal “aderiu à tese infundada da autora”, de acordo com a qual, “os Réus, concertados entre si, e servindo-se as pessoas singulares das sociedades, levaram a cabo um plano em que lograram adquirir, enganando a Autora, mais de um milhão de embalagens de Accu-Chek Aviva 50T ao preço de, inicialmente, €10,00, e posteriormente de € 9,00, fazendo-lhe crer que as destinavam aos mercados africanos e que esse era o preço possível de praticar em tais mercados (preço de mercado africano), quando, na verdade, as revenderam integralmente na Europa, sensivelmente ao mesmo preço que a Autora vendeu o mesmo produto a todas as outras suas clientes (preço de mercado europeu), entre os € 15,50 e os € 17,00, impedindo, assim, a E... e suas congéneres de auferir a margem que aufeririam caso tais revendas na Europa tivessem sido feitas diretamente por si e não por intermédio da B... e C..., que, beneficiando de um preço descontado de € 10,00 ou € 9,00 por embalagem Accu-Chek Aviva 50T, se apropriaram de tal margem”.
4.6. Este “bloco” integra um primeiro “bloco de factos” denominado “FACTOS ATINENTES AO SURGIMENTO DO NECESSIDADE DA A. SE EXPANDIR PARA O MERCADO AFRICANO / PALOPS E DOS FACTOS CONEXOS ATÉ À CELEBRAÇÃO DO CONTRATO DE DISTRIBUIÇÃO EXCLUSIVA.
Os Apelantes impugnam do elenco dos factos provados, que pretendem ver julgados não provados, ou julgados provados com diversa redação, (na redação que se encontra reproduzida supra nas conclusões de recurso, que aqui se dá por reproduzida), os factos 93, 95, 99, 101, 102, 103, 104, 105, 106, 107, 108, 109, 110, 114, 115, 116, 117, 118, 119, 120 e 231, e dos factos não provados, 292, 294 e 295, que pretendem ver provados, tendo indicado, nas alegações de recurso, os concretos meios probatórios em que baseiam a sua pretensão.
Pretendem ainda ver aditados os factos assim numerados:
292) Durante o Projeto Autonomy & Speed referido no facto 231), a área de diabetes care da A. tinha dificuldade em atingir os seus objetivos de faturação, poderia existir o risco de serem despedidas pessoas se não fossem atingidos os objetivos, e havia uma maior pressão para os objetivos serem atingidos;
(…)
294) Foi no contexto referido nos factos 231) e 292) que surgiu o plano revisto para aumentar as vendas da A. mencionado no facto 105 (cf. documento n.º 26 anexo à petição inicial);
295) Foi igualmente no contexto referido nos factos 231) e 292) que a direção da área de diabetes care da A. em Portugal assumiu a possibilidade de recorrer à exportação paralela como solução mais rápida e fácil para se atingir os objetivos;
Impugnam os seguintes factos provados:
93) A Autora sentiu a necessidade de se expandir para outros mercados, tendo o mercado angolano surgido como alvo apetecível;
95) Em inícios de 2013, FF, superior hierárquico do Réu AA, pediu à sua equipa na Autora, – na qual se integrava o Réu AA – que desenvolvesse uma abordagem para a implantação bem-sucedida do produto E... no mercado angolano;
99) O Réu AA tornou-se, a partir de 2013, após viagens realizadas ao território e vários contactos com potenciais parceiros, o funcionário da Autora com maior conhecimento do mercado angolano;
101) Ainda em 2013 e já no exercício das suas novas funções como Head of Market Access & Key Account Manager, o Réu AA apresentou à sua equipa na Autora uma análise do mercado angolano, que elaborou, em que descrevia como tendo “grande potencial” e uma “alta rentabilidade” (cfr. documento n.º 24, anexo à petição inicial, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido);
102) Na elaboração dessa análise colaborou o EE, que havia sido funcionário da R..., o qual recorreu a dados de um estudo feito pela R... sobre o mercado angolano,
103) Indicando então o AA, na análise a que se alude no facto 101º, como potenciais parceiros na abordagem a tal mercado a H... e a I..., que acabaram por ser os escolhidos (cfr. pág. 27 do documento n.º 24, anexo à petição inicial);
104) Como aquelas parcerias não deram resultado, o Réu AA acabaria por transmitir ao seu superior hierárquico na Autora, FF, no final de 2013, que havia necessidade de serem encontrados outros parceiros, tendo efetuado contactos para tal;
105) Em fevereiro de 2014, o Réu AA apresentou à Autora um plano revisto para aumentar as vendas desta em Angola (cfr. documento n.º 26, anexo à petição inicial, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido);
106) Afirmava então o Réu AA que a faturação da Autora poderia aumentar em mais de um milhão de francos suíços (ou seja, efetuando o câmbio, €883.988,02), em três anos, em Angola;
107) O que, segundo o Réu AA, só poderia ser feito contratando parceiros com base portuguesa, mas presença local em Angola (cfr. documento n.º 26, anexo à petição inicial,);
108) O Réu AA acabaria por conseguir convencer o seu superior hierárquico – FF – de que, não só o preço de €10,00 por embalagem de Accu-Chek Aviva 50T era o preço possível de praticar numa exportação para tal mercado;
109) Como que a Ré B... era o parceiro ideal da Autora para o mercado angolano;
110) FF aceitou que a Ré B... tivesse acesso a Accu-Chek Aviva 50T, para revenda, ao preço de €10,00, por embalagem na condição de que o mesmo fosse destinado ao mercado angolano;
114) Sabedor de que a Autora apenas aprovara à Ré B... o preço de €10,00 por embalagem de Accu-Chek Aviva 50T para venda no mercado angolano, o Réu CC expressamente declarou, no referido email de 11.04.2014, que o destino de tal produto seria África;
115) Com base nos pressupostos (venda em Angola) que determinaram que a Ré B... tivesse acesso a Accu-Chek Aviva 50T, para revenda, ao preço de €10,00 por embalagem, o Réu AA, atuando enquanto Head of Market Access & Key Account Manager da Autora, acedeu a que a Ré C... começasse igualmente a adquirir tal produto à Autora, àquele preço, para aquele território;
116) Deste modo, a Ré BB logrou, por intermédio da Ré C..., garantir o Accu-Chek Aviva 50T a um preço e numas quantidades que também lhe permitiam auferir um provento elevado, sobretudo tendo em conta que era ao Réu AA, enquanto Head of Market Access & Key Account Manager da Autora, que cabia gerir a relação desta com a Ré C...;
117) Num contexto muito especial, só percetível por quem – como os Réus AA, BB e CC – conhecia (e podia condicionar) a estratégia da Autora, o Réu AA conseguiu aumentar ainda mais as quantidades de Accu-Chek Aviva 50T que já adquiria à Autora por intermédio da Ré B... e, ainda, reduzir o preço a que o adquiria;
118) Em 4.11.2015, a Ré BB e o Réu AA trocaram e-mails relativos à participação da Autora, juntamente com a Ré B..., num congresso sobre diabetes que se realizaria no início do ano seguinte em Luanda, tudo com o objetivo de “incrementar” a posição da Autora no mercado e “posicioná-la como líder no mercado” (cfr. documento n.º 27, anexo à petição inicial, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido);
119) Nesses e-mails, o Réu AA solicita ao seu superior hierárquico autorização para que a Autora financiasse as iniciativas da Ré B... em Angola para promoção do produto da Autora, num montante que então ascendia a €53.222,10;
120) Apesar da Autora ter marcado presença no congresso da Ordem dos Médicos de Angola referido no email, através da Dra. LL (endocrinologista), que foi palestrante da E..., a Ré BB e o Réu AA conjugaram esforços para enganar a Autora, uma vez que ambos sabiam que a Ré B... não estava a comportar-se de modo a “incrementar” a posição da Autora no mercado e “posicioná-la como líder no mercado”;
231) Em 2013, a área de Diabetes Care do grupo E... entrou num processo de reestruturação (Projeto A&S – Autonomy & Speed), que tinha como objetivo reconfigurar esta área a nível internacional.
E os seguintes factos não provados:
292) Isto porque a faturação nacional da Autora, à data, ascendia apenas a 9 milhões de euros anuais, estando, portanto, muito longe de cumprir os limiares internamente fixados pela unidade E... Diabetes Care, que rondavam os tais 15 milhões de euros anuais, pelo que o referido Projeto A&S previa, em Portugal, a extinção de vários postos de trabalho (o que, ainda que em menor medida do que se esperava, graças à Ré B..., chegou a suceder), assim como a externalização da referida atividade para um distribuidor local, deixando a E... de estar estabelecida diretamente no território nacional neste setor;
294) Estas informações foram transmitidas pelo FF à sua equipa, que lhes veiculou a necessidade de ser criado um plano extraordinário de vendas, para garantir que a sustentabilidade da Autora. se manteria dentro dos padrões definidos pela casa-mãe (15 milhões de euros anuais de faturação) e que o setor de negócio dedicado à diabetes se manteria na estrutura local sedeada em Portugal;
295) Foi nesse contexto que a direção da Autora, procurando evitar as catastróficas consequências associadas à implementação do Projeto A&S, assumiu a possibilidade de exportação de produtos para os mercados dos Palop’s como uma prioridade, pois esta poderia constituir um contributo relevante para ajudar a atividade da Autora em Portugal;
E pedem o aditamento dos factos que numeraram 375, 376, 377 e 378.
Pretendem os apelantes, no essencial, com a impugnação destes factos, demonstrar que não foi nenhum dos Réus que criou a necessidade da A. de se expandir para os mercados africanos; também não foi nenhum dos Réus que propôs que a B... começasse a vender produtos da A. em Angola ou que a Ré B..., no ano de 2014, fosse o parceiro ideal para esse efeito, pois que, afirmam, nenhuma prova documental ou testemunhal foi produzida que o confirme. Foi, apenas a necessidade de aumentar as vendas e ausência de outros parceiros que levou a A. a recorrer à Ré B....
E desde logo, pretendem que se reconheça que o autor do “Angola / Business Plan 2013” é afinal, EE, que foi ouvido como testemunha e não o Réu AA.
Esse plano, mostra-se junto aos autos, na p.i, sob o nº 24.
Da primeira página do mesmo constam, os seguintes dizeres: “Angola / Business Plan 2013 AA, E..., september 2013”. E ainda aos dizeres “2013 Shape the future Accu-chek.”
Não há dúvidas em face desse documento, que esse plano de negócios foi apresentado à Autora pelo seu funcionário AA, enquanto autor do mesmo estudo.
E tendo, na verdade sido provado que na sua elaboração colaborou EE, (colaborador do grupo E...), que confirmou isso mesmo em juízo, o tribunal julgou provados os factos 105 onde se afirma que o relatório foi apresentado à Autora pelo réu AA, e onde constam as afirmações reproduzidas nos artigos 106 e 107 e simultaneamente o facto 102, onde se afirma que na elaboração dessa análise colaborou o EE, que havia sido funcionário da R..., o qual recorreu a dados de um estudo feito pela R... sobre o mercado angolano.
A nosso ver, constitui até alguma desfaçatez do Réu AA que apresentou à sua então entidade patronal aquele estudo, como sendo da sua autoria, com o seu nome em destaque na primeira página do mesmo, estudo que contribuiu para granjear da fama na empresa de ser o maior conhecedor do mercado angolano, vir agora imputar a autoria do mesmo a outrem…
Retratando a factualidade provada, o que consta do aludido documento, conjugado com o depoimento a testemunha EE, improcede a impugnação feita.
E a verdade é que é o Apelante AA quem sinaliza uma “impressionante dinâmica de crescimento” do mercado angolano, “prone to a strong and fast implemanation” e “highly interesting business in terms of profitability”.
E depois da apresentação que fez perante a autora do referido plano de negócios para Angola, em setembro de 2013, foi o Apelante AA quem fez prospeção do mercado angolano, deslocando-se ao mesmo, como decorre do documento 25 junto com a p.i.
A oportunidade negocial que o mercado angolano apresentava, surgiu assim, no interior da própria autora, onde o seu funcionário AA teve um papel fundamental, permitindo-lhe dessa forma, inserir as RR, B... e depois a C..., no universo de revendedores da Apelada e, “progressivamente, mascará-las de putativas parceiras de desenvolvimento do mercado angolano.”
Relativamente à demais factualidade impugnada, para além da análise crítica feita a propósito do preço de venda dos produtos lograda conseguir pelas Réus B... e C..., já supra analisada e para a qual se remete, tendo em vista o mercado angolano, não podemos deixar de acompanhar a sentença na fundamentação feita, no sentido em que o depoimento da testemunha FF, que foi acolhido, “corroborado por outros elementos probatórios que se descreverão há que considerar que: Em inícios de 2012 surge o interesse do FF pelo mercado dos Palop’s como o próprio afirmou e resulta do teor do documento n.º 21 (não resultando do mesmo a matéria constante do facto 289º, daí a sua não prova), sendo essa data anterior àquela em que os Réus afirmam, no art. 153º da contestação, ter surgido o projeto Autonomy & Speed, pelo que não podia ser este a alavancar a ideia dos mercados dos Palop’s (o que desde logo motivou a não prova dos factos 295º e 317º). Daí a prova dos factos 93º, 94º, 97º e 98º. Em inicio de 2013, o referido FF encarrega a sua equipa, liderada pelo AA, de elaborar um estudo consistente sobre os Palop’s/Angola, estando já consolidada a decisão de avançar para tal mercado - daí a prova dos factos 95º e 96º. Também em início de 2013 houve uma reestruturação da equipa, o que foi confirmado pelo EE, da qual resultou que o AA, porque nele depositava confiança e havia proximidade entre ambos, passasse a assumir as funções a que alude o facto 100º, que constituíram uma promoção. Como resultou do depoimento da testemunha EE a sua participação na elaboração do estudo sobre os Palop’s/Angola foi residual, apenas fornecendo números globais, tendo sido o AA a calcular as estimativas de vendas (daí a prova dos factos 102º e 229º e a não prova dos factos 296º a 298º). A mesma testemunha afirmou não certezas sobre a sua intervenção na elaboração do plano de vendas revisto para Angola mas foi perentório em afirmar que os cálculos do volume de vendas e projeções que a tal respeitasse fossem por si elaboradas, por não ter know-how para isso. Daí a não prova do facto 357º. Afirmou a testemunha FF que a partir de 2013 o AA se deslocou a Angola (daí a prova do facto 99º), o que juntamente com o estudo que realizou para a elaboração do documento “Angola - Business Plan 2013” (documento n.º 24 anexo à petição inicial que, aliás, ostenta o seu nome) o tornou a pessoa com mais conhecimentos sobre Angola. Afirmou que o plano, datado de setembro de 2013, foi elaborado e apresentado pelo AA (prova dos factos 101º e 103º). Da falta de desempenho dos parceiros indicados no plano foi referida pelo FF (nada se tendo provado quanto à factualidade contida nos factos 299º a 301º), surge e necessidade, em finais de 2013, de os substituir, tendo o próprio AA efetuado contactos. Note-se que era este o funcionário que estava encarregue de acompanhar o desenvolvimento dos negócios em Angola. Daí a prova do facto 104º. Em fevereiro de 2014 é apresentado o plano revisto para Angola, totalmente da autoria do AA, como o confirmaram as testemunhas EE e FF. Daí a prova dos factos 105º, 106º e 107º (por referência ao documento n.º 26 anexo à petição inicial) e a não prova dos factos 303º e 304º (este porque a própria testemunha o negou e mais ninguém de forma credível o afirmou). Ainda que a proposta revista surgisse no âmbito de uma reunião, como o mencionou o FF, certo é que não deixou de assinalar que havia várias hipóteses de expansão, sendo que não estava em causa o encerramento da Autora, como o referiram as testemunhas que mereceram a credibilidade do tribunal (sendo certo que a Autora ainda se mantém atualmente como subsidiária). Daí a não prova do facto 302º. Isto posto, em fevereiro de 2014 é apresentado o plano de vendas para Angola, com revisão em alta das estimativas de venda (documento n.º 26 anexo à petição inicial) e não existem parceiros, estando indicado que deveria ser escolhido um parceiro com base portuguesa mas presença em Angola. Como resulta do documento n.º 12 anexo à petição inicial, em 24 de fevereiro, surge o email da Ré BB onde indica que a G..., Lda, devido a uma reestruturação, alterou a sua denominação e objeto social para B..., S.A., A B... havia sido constituída no fim de janeiro de 2014. A BB, o CC, seu marido, e aparentemente detentor da “G...”, transformada em G..., Lda no email da B..., que não existia, e sobretudo o AA sabiam que esse email, onde nem se indica qual a finalidade das vendas, não era verdadeiro. No entanto, o Réu AA não alertou o departamento de concursos de tal falsidade e fixou o preço a praticar, quando não dispunha de indicação da finalidade das vendas, fixando o preço do canal venda direta, como o assinalou a testemunha FF. Esta coincidência temporal entre a procura de parceiro em Angola, a constituição da B... e a “transformação” da G... em B... revela o primeiro passo visível dado no sentido de enganar a Autora e agarrar a oportunidade. Apesar do preço já fixado em €10,00 para a B..., o Réu AA avança no sentido de convencer o FF que era esse o preço possível de realizar e convence-o de que a B... era o parceiro ideal para Angola, afirmações da testemunha que mereceram credibilidade e fundaram a prova dos factos 108º a 110º.”
Desta forma, o juízo probatório que formulamos em nada diverge do que se apresenta como essencial à convicção alcançada pela 1.ª instância, que consideramos também aqui, solidamente motivada.
Improcede em consequência a impugnação feita, abrangendo a factualidade que os apelantes pretendiam ver aditada, que ficou prejudicada, tão pouco se mostrando indispensável ou necessária, em face do exposto, à boa decisão da causa.
4.7. Dentro dos factos atinentes ao relacionamento comercial entre as partes, os apelantes impugnam o “bloco de factos” que denominaram de “DA CELEBRAÇÃO DO CONTRATO DE DISTRIBUIÇÃO EXCLUSIVA ATÉ À CESSAÇÃO DAS RELAÇÕES CONTRATUAIS ENTRE AS PARTES.
Os Apelantes impugnam do elenco dos factos provados, que pretendem ver julgados não provados, ou julgados provados com diversa redação, (na redação que se encontra reproduzida supra nas conclusões de recurso, que aqui se dá por reproduzida), os factos 76, 77, 81, 82, 121, 123, 124, 125, 126, 127, 128, 135, 138, 139, 140, 141, 142, 143, 144, 145, 146, 147, 148, 149, 153, 154, 155, 156, 161, 163, 164, 166, 168, 171, 178, 179, 181, 182, 183, 190, 191, 199, 201 e 210 e dos factos não provados, os factos 246, 306, 307, 311, 319 e 328, que pretendem ver provados, tendo indicado, nas alegações de recurso, os concretos meios probatórios em que baseiam a sua pretensão.
Pretendem ainda ver aditados os factos assim numerados:
379) Entre 17 de fevereiro de 2014 e fevereiro de 2018. a A. faturou à Ré B... e à Ré C... um valor entre €11.849.076,00 e €13.165.640,000. Situando-se a média anual entre €2.962.269,00 e € 3.291.410,00, sendo que este volume de faturação foi angariado pelo Réu AA, enquanto trabalhador da A.
380) A E... estimava globalmente, em cada ano, para cada país, um valor de exportação paralela;
381) Mas se E... global tivesse conhecimento que os números de exportação paralela de determinado país tinham superado aquela estimativa, descontavam o excedente na faturação anual daquele país, com prejuízo no desempenho desse país e no cumprimento dos seus objetivos de vendas anuais;
382) Com isso, a E... global / casa-mãe pretendia, por um lado, desincentivar cada país de ultrapassar a estimativa de exportação paralela e, por outro lado, evitar que houvesse algum incentivo para os países realizarem exportação paralela;
383) A A. realizava, com periodicidade semestral ou quadrimestral, reuniões de ciclo para as quais eram convocados todos os seus colaboradores, incluindo os diretores;
384) Nas reuniões de ciclo referidas em 383) eram mostrados os dados de faturação dos PALOPs e da exportação paralela;
385) Os dados de faturação relativos aos PALOPs eram interpretados por alguns dos colaboradores como sendo pouco credíveis, tendo em consideração as características daquele mercado, e, portanto, a dedução lógica que daí retiravam era que essa faturação dizia respeito a exportação paralela para a Europa, tema que era comentado no seio da empresa.
386) A A. tinha forma de saber, designadamente através dos relatórios extraídos da plataforma Dun & Bradstreet, qual o destino geográfico dos produtos da A. que estavam a ser revendidos pelas Rés.
São estes os factos provados impugnados pelos Apelantes:
76) A C... replicou, de forma semelhante, o comportamento da Ré B... acima descrito;
77) Isto é, tendo adquirido mais de duas centenas de milhar de embalagens de Accu-Chek Aviva 50T a €10,00 ou €9,00, aqueles Réus, a C..., revendeu-as integralmente à B..., que as revendeu com destino à Europa por um preço próximo daquele a que a Autora vendeu o Accu-Chek Aviva 50T a todos as outras entidades que lhe adquiriam o referido produto para revenda;
81) Poucos meses depois (do dia 16.12.2016, em que cessou a sua colaboração na autora[9]), já a exercer funções na B..., passou a sustentar que, afinal, a Ré B... beneficiava de um preço de €9,00 para revenda do Accu-Chek Aviva 50T em qualquer mercado e que nunca estivera obrigada a exportar aquele produto para os mercados angolano e moçambicano;
82) Esta nova tese contrariava toda a correspondência trocada entre fevereiro de 2014 e dezembro de 2016 e determinou que a Autora suspendesse, ainda no primeiro semestre de 2017, as vendas de Accu-Chek Aviva 50T à Ré B... até que esta comprovasse que tal produto, então vendido a €9,00, estava a ser revendido nos mercados africanos;
121) No início de 2016, FF (superior hierárquico do Réu AA) anunciou a partida para uma nova função na sede da E..., em ..., tendo ocorrido nesse ano uma transição para uma nova liderança;
123) Neste ínterim, o Réu AA promoveu internamente na Autora que a Ré B... deveria beneficiar do exclusivo de distribuição de produtos E... nos mercados angolano e moçambicano e, além do mais, que o Accu-Chek Aviva 50T deveria passar a ser-lhe vendido ao preço de €9,00 (em vez de €10,00);
124) O primeiro argumento usado pelo Réu AA foi o de que a Ré B... estaria a distribuir produtos “diabetes care” da J..., concorrente da E..., em Angola (cfr. documento n.º 28, anexo à petição inicial, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido);
125) O segundo argumento usado pelo Réu AA foi o de que a J... iria deixar o mercado angolano (cfr. documento n.º 28, anexo à petição inicial);
126) O terceiro argumento usado pelo Réu AA foi o de que a J... deixaria uma quota de mercado de quatro milhões de euros (por referência ao ano de 2015);
127) O quarto e último argumento usado pelo Réu AA foi o de que a Ré B... estaria disponível para se vincular exclusivamente à Autora, para distribuição dos produtos desta em Angola, sem prejuízo de haver o risco de poder vincular-se a um concorrente da Autora, caso esta não atuasse rapidamente (cfr. documento n.º 28, anexo à petição inicial);
128) Perante o apelativo quadro descrito pelo Réu AA, no dia 21.03.2016, a Autora, como primeira contraente, celebrou com a Ré B..., como segunda contraente, tendo esta sido representada pelo Réu CC em todo o processo negocial e na própria outorga do mesmo – um contrato de distribuição acordando baixar o preço unitário do Accu-Chek Aviva 50T de €10,00 para €9,00 e garantir um fluxo de produto à Ré B... de €5.000.000,00 (cfr. documento n.º 30, anexo à petição inicial, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido);
135) Assim, a B... logrou garantir o Accu-Chek Aviva 50T à B... a um preço ainda mais reduzido e ainda em maiores quantidades;
138) Tudo para venda, exclusivamente, nos mercados angolano e moçambicano, como aliás resulta expressamente do clausulado do Contrato de Distribuição Exclusiva celebrado entre a Autora e a Ré B... e como decorre das comunicações trocadas entre a Autora e a Ré C...;
139) Território de exportação dos produtos que a Autora sempre procurou garantir;
140) Era ao Réu AA, enquanto Head of Market Access & Key Account Manager da Autora, a quem cabia a tarefa de fiscalizar o cumprimento do acordado com a Ré B... e com a Ré C...;
141) Mas este, com a colaboração dos Réus CC e BB, enganou a Autora, levando-a a crer que as Rés B... e C... estavam a cumprir o que fora acordado, quando faziam exatamente o oposto;
142) O Réu AA, entre 2014 e 2016, enquanto Head of Market Access & Key Account Manager da Autora, sempre garantiu que o Accu-Chek Aviva 50T vendido à Ré B... e à Ré C... estava a ser exportado para os mercados africanos, onde a Autora estaria a conseguir uma forte implementação, fruto do trabalho das referidas Rés;
143) Designadamente, em 29.05.2015, o Réu AA, num e-mail dirigido ao seu superior hierárquico na Autora, afirmou ter reunido com a Ré B... e com a Ré C..., visto todos os documentos que provariam que o produto E... vendido às referidas Rés (Accu-Chek Aviva 50T) chegara a Angola. Mais ainda, afirmou ter visto os documentos que provariam que a Ré B... se encontrava a vender grandes quantidades de produto J... em Angola (12.000 embalagens no mês anterior ao do e-mail). Afiançou, por fim, que tendo o produto chegado a Angola e Moçambique, seria economicamente inviável reexportá-lo para a Europa. Concluiu, pois, que a Ré B... e a Ré C... não se encontravam a exportar Accu-Chek Aviva 50T para a Europa (cfr. documento n.º 32, anexo à petição inicial, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido);
144) O Réu AA transmitiu informações falsas ao seu superior hierárquico na Autora, uma vez que nenhuma embalagem de Accu-Chek Aviva 50T foi vendida pelas Rés B... e C... para Angola e, consequentemente, aquele não vira qualquer documento que demonstrasse tal exportação
145) Em 09.11.2015, o Réu AA questionado se a Ré C... e a Ré B... tinham atividade no território nacional ou se eram destinados à distribuição noutros territórios”, num e-mail enviado a um consultor externo que procedia então a uma análise do canal de vendas da Autora, confirmou que a Ré B... e a Ré C... eram os parceiros de exportação daquela para os Palop’s e reafirmou ter toda a documentação relativa a tais exportações (cfr. documento n.º 33, anexo à petição inicial, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
146) O Réu AA, novamente, transmitiu informações falsas a um consultor externo da Autora, uma vez que nenhuma embalagem de Accu-Chek Aviva 50T foi vendida para Angola, tendo, pelo contrário, todas sido vendidas na Europa e, consequentemente, aquele não vira qualquer documento que demonstrasse a exportação para os Palop’s;
147) Em 8.02.2016, o Réu AA – regressado do congresso sobre diabetes realizado em Angola – transmitiu ao seu superior hierárquico na Autora, FF, que estivera juntamente com comerciais da Ré B... a promover o produto em Luanda, que o “feedback” fora muito bom, tendo o stand dos produtos E... recebido uma procura “massiva”. Mais acrescentou que a saída da J... do mercado daria à Autora a possibilidade de “canibalizar” a quota daquela concorrente, garantindo uma relação de exclusividade com a Ré B.... Referiu ainda ter reunido com o ministro da saúde angolano, que teria considerado a estratégia de investimento da Autora no país “muito interessante” (cfr. documento n.º 28, anexo à petição inicial, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido);
148) Novamente, o facto de a Ré B... não ter vendido uma única embalagem de Accu-Chek Aviva 50T em Angola demonstra que, mais uma vez, o Réu AA enganou a Autora para salvaguardar os proveitos auferidos por si e pelos Réus CC e BB;
149) Em 25.04.2016, o Réu AA, numa apresentação feita a MM, em Barcelona, afirmou que:
(i) “[A]s vendas da Autora estavam acima do objetivo devido às vendas nos Palop’s”;
(ii) Os Palop’s eram “um mercado desafiante, com um elevado e ainda por explorar potencial”;
(iii) Os objetivos de vendas em tais mercados seriam de €4 milhões em 2016 (com possibilidade de uma variação positiva de 25%), um crescimento de 147% face ao ano de 2015 (cerca de €2.750.000), que já representara um crescimento de 217% face ao ano de 2014 (cerca de €1.250.000).
O ano de 2013, anterior à relação Autora-Ré B.../Ré C..., foi descrito pelo Réu AA como tendo vendas marginais, bastante longe, sequer, dos €500.000,00; (cfr. documento n.º 29, pág. 40, anexo à petição inicial, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido);
153) O Réu AA, uma vez mais, transmitiu informações falsas, desta feita ao mais alto nível da estrutura do Grupo E..., uma vez que a Ré B... e a Ré C... não venderam qualquer embalagem de Accu-Chek Aviva 50T nos Palop’s;
154) O Réu AA, adicionalmente, continuou a transmitir à Autora que os mercados dos Palop’s tinham elevado potencial;
155) Em 14.06.2016, o Réu AA, num e-mail dirigido ao seu superior hierárquico na Autora, relativo aos objetivos de vendas para esse ano, asseverou que os mercados dos Palop’s aportariam €5.476.442 aos objetivos anuais de vendas da Autora (cfr. documento n.º 34, anexo à petição inicial, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido);
156) O Réu AA, novamente, procurou convencer a Autora do potencial dos mercados de Angola e Moçambique e da importância de continuar a fornecer à Ré B... e à Ré C... o Accu-Chek Aviva 50T ao preço de €9,00;
161) Antes de remeter o email, o Réu AA reiterou que sabia que o produto estava a ser exportado para Angola, tendo assim transmitido informações falsas ao seu superior hierárquico na Autora, uma vez que nenhuma embalagem de Accu-Chek Aviva 50T foi vendida para Angola;
163) A Autora veio, bastante mais tarde, a ter elementos que confirmam que os dois documentos referidos no facto anterior não representavam qualquer venda real feita pela Ré B... em Angola, motivo pelo qual (entre outras questões) apresentou denúncia criminal contra os seus autores (cfr. documento n.º 38, anexo à petição inicial);
164) Naquele contexto de pressão crescente para a disponibilização de documentos comprovativos das exportações para Angola e Moçambique, o Réu AA cessou voluntariamente a sua relação laboral com a Autora no dia 16.12.2016 (cfr. documento n.º 39, anexo à petição inicial, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido);
166) O Réu AA, uma última vez, procurou transmitir à Autora que os mercados dos Palop’s tinham elevado potencial e que a Ré B... estava a desenvolvê-los com os produtos que adquiria àquela;
168) O Réu CC, coordenado com o Réu AA, quis enganar a Autora e convencê-la de que em 2016 vendera produtos E... em Angola, nos nove meses precedentes, de aproximadamente 4,7 milhões de dólares, tudo enquanto sabiam que nem uma única embalagem de Accu-Chek Aviva 50T ali haviam vendido;
171) Apesar desta mudança inesperada – e numa altura em que a Autora desconhecia que o Réu AA era o titular de mais de 99% do capital social da Ré B... –, a posição da Autora manteve-se: queria que a Ré B... lhe mostrasse evidências de que o Accu-Chek Aviva 50T estava efetivamente a entrar nos mercados angolano e moçambicano (cfr. documento n.º 41, anexo à petição inicial);
178) Com a propositura da ação, a B..., chamou toda a atenção para a relação comercial da Ré B... com a Autora e, muito concretamente, para o papel que o AA teve na mesma;
179) A B... juntou, com a petição inicial, tamanho acervo contabilístico que a Autora pôde perceber que, contrariamente ao que os Réus CC e BB e o Réu AA afirmaram, este enquanto Head of Market Access & Key Account Manager da Autora, nenhuma embalagem de Accu-Chek Aviva 50T foi vendida nos Palop’s, tendo, ao invés, toda a quantidade adquirida sido revendida na Europa;
181) Nessa altura, tornou-se óbvio para a Autora que os Réus AA, CC e BB montaram uma operação de enriquecimento pessoal que se traduziu no seguinte: adquiriam, por intermédio das Rés B... e C..., à Autora Accu-Chek Aviva 50T a preço de mercado africano e revendiam-no, todo, na Europa ao preço –mais elevado – pago neste;
182) Tudo enquanto o Réu AA, no desempenho das suas funções de Head of Market Access & Key Account Manager da Autora, e os Réus BB e CC, sucessivamente representantes das Ré B... e C..., convenciam a Autora de que as Rés B... e C... se encontravam a vender, com elevado sucesso, em Angola e Moçambique;
183) A Autora foi mantida enganada por ação dos Réus AA, CC e BB e que estes instrumentalizaram as Rés B... e C... para conseguir tal engano;
190) Na Ação B..., a Ré B... também juntou prova de que todas as embalagens de Accu-Chek Aviva 50T que adquiriu à Autora foram revendidas na Europa;
191) Todas as embalagens de Accu-Chek Aviva 50T que a Ré C... adquiriu à Autora foram igualmente revendidas na Europa, através da B...;
199) O Réu AA (como beneficiário efetivo da Ré B...) fez assim sua, enganando o Grupo E... – nele incluindo a Autora, as congéneres desta, até ao mais alto representante do referido grupo –, por intermédio da Ré B... e com o auxílio dos Réus BB e CC, a diferença entre os €10,00 ou €9,00 a que a Ré B..., sucessivamente, adquiriu à Autora cada embalagem de Accu-Chek Aviva 50T e o montante entre os €15,50 e os €17,00 a que revendeu tal produto na Europa;
201) A Ré B... apenas fez estas vendas na Europa porque os Réus AA, BB e CC ludibriaram a Autora, convencendo-a que aquela estava a exportar para Angola e Moçambique;
210) Todas as embalagens de Accu-Chek Aviva 50T que a Ré C... adquiriu à Autora foram revendidas à B..., que igualmente as revendeu na Europa;
E impugnam os seguintes factos julgados não provados:
306) A Ré B... estava autorizada, sem exclusividade – a exportar, distribuir os produtos farmacêuticos da J... em todo o território dos Palop’s, por força de um contrato celebrado em 11 de julho de 2014 nos termos que constam do documento n.º 23 anexo à contestação;
307) A J..., tanto quanto é do conhecimento dos Réus, deixou efetivamente o mercado angolano em 2015, situação de que a Autora é conhecedora, tendo inclusivamente contratado uma ex-colaboradora daquela, a Sra. VV, já após a J... ter abandonado o mercado angolano;
311) No email junto como Documento n.º 28, o Réu AA limita-se a informar o seu superior hierárquico que a J... havia proposto à Ré B... a celebração de um acordo de exclusividade para a comercialização dos seus produtos no mercado angolano, mas que desconhecia os detalhes desta proposta;
319) No entanto, não o podia assumir internamente, porque a casa-mãe procurava combater esse fenómeno de exportação paralela, de forma a não existir competição comercial entre as diversas estruturas locais estabelecidas nos diferentes Estados-Membros;
328) Nos termos do Contrato de Distribuição Exclusiva, só a Ré B... podia distribuir os produtos da Autora em Angola e Moçambique, mas não estava impedida de distribuir esses produtos noutros territórios;
E pretende ver aditados os factos que numerou de 379 a 386.
Pretendem essencialmente os apelantes que fique demonstrado que a A. sabia – ou não podia ignorar – que os produtos que a Rés diziam estar a ser revendidos para os PALOPs estavam, na realidade, a ser objeto de exportação paralela para a Europa e (ii) que a A., apesar de beneficiar, nos seus resultados anuais, da exportação paralela, não tinha interesse em que a E... global / casa-mãe tivesse conhecimento dos números reais dessa exportação, porque isso teria impacto no cumprimento dos seus objetivos.
Resulta da factualidade provada que, tal como se lê na sentença recorrida, “com total encobrimento de titularidade de capital social da B... por um alto quadro da Autora, que conhecia os meandros e as entranhas desta e os do próprio grupo, e das relações familiares existentes, com o agravamento de que nenhuma embalagem de Accu-Check Aviva 50T foi exportada para os territórios dos Palop’s mas para países em que, por força da diferença de preço não faltariam clientes, sem qualquer investimento, nem possibilidade de obter margens de lucro mais elevada. Tendo a C..., de forma mais discreta, replicado aquele comportamento, apesar de assumir desde logo que pretendia comprar para África, sugerindo a sua denominação social essa finalidade, mas revendendo à própria B..., solicitando o mesmo preço, antes e depois da assinatura do contrato de distribuição, que lhe foi concedido por decisão do AA, como resulta dos emails trocados.”
E também concordamos com o que a seguir se escreveu: “Aqui chegados, ponderando o desincentivo da Autora à exportação, e sobretudo crescimento, para países da União Europeia era mais elevado, por razões relativas a desequilíbrios no mercado dos medicamentos e afins, o destino acordado para as vendas (Palop’s), o conhecimento do Réu AA que a intenção da Autora era a sua expansão para Angola e o preço baixo estabelecido terá que se concluir que não fazia parte da intenção daquela que as vendas tivessem o destino que as Rés pessoas coletivas entendessem por pertinente, muito menos a exportação paralela, motivo pelo qual se deram por não provados os factos 316º, 327º e 328º.”
AA e os seus familiares sabiam que nada estava a ser vendido para Angola e por isso, AA, o responsável, no organigrama da autora por aqueles mercados e ainda com funções de fiscalização, foi ao longo do tempo escamoteando a realidade dos factos, dando informações erróneas à Autora.
Assim, tal como se afirma na sentença, “O pleno convencimento da testemunha HH da seriedade das transações comerciais da B..., já no período da vigência do contrato de distribuição, até pelo cuidado que afirmou ter sido colocado pelo seu antecessor na passagem de testemunho (daí a prova do facto 158º), o seu afirmado melindre em dirigir-se sobretudo a esta sociedade com suspeitas relativas à prática de exportação paralela, as informações que lhe eram dadas pelo AA, quer verbalmente, afirmando sempre ter visto os documentos que comprovavam as exportações, quer por escrito, de que são exemplos os documentos n.ºs 34, 36 e 37, todos anexos à petição inicial, permitiram a prova dos factos 154º, 156º e 161º. Porém, porque o referiu expressamente no seu depoimento, o pedido de elementos comprovativos da exportação para Angola prendeu-se com a circunstância de haver uma enorme pressão superior da presença de produtos com provável origem portuguesa noutros países da Europa. Daí resultou a fixação da primeira parte do facto 159º.”
Assim como, “Sendo enorme a pressão feita sobre o AA para apresentar os documentos que havia afirmado ter visto sobre as exportações, convenceu-se o tribunal que terá sido esse o motivo que determinou a sua saída da Autora, dando-se assim por provada a primeira parte do facto 164º”.
Corolário do que se vem apreciando em termos de prova o depoimento das testemunhas FF e HH, que foram as pessoas que mais de perto lidaram com toda a situação.
Significativo, o depoimento de HH, quando após ter sucedido na direção da Autora a FF, se vê numa situação em que por um lado quer ver a documentação relativa ás exportações para os Palop.s, que não lhe era apresentada e por outro lado pondera poder estar a melindrar o maior cliente (o contrato de 5 milhões de euros celebrado com a B... representava uma parcela significativa do volume de negócios da Autora), por poder estar a desconfiar duma operação legítima.
Salienta-se ainda do conjunto mais abrangente da prova produzida e que é mencionada na sentença, os seguintes meios probatórios, que contrariam a versão factual das RR:
-Documento n.º 32, junto à Petição Inicial (e-mail do Apelante AA à sua chefia na Apelada, em maio de 2015, em que aquele sustenta ter visto todos os documentos, nomeadamente aduaneiros, que comprovavam que as Apelantes B... e C... se encontravam a exportar, abundantemente, o Accu-Chek Aviva 50T para Angola, sendo ainda um importante exportador da J... e da K...; o Apelante AA apresentou ainda um cálculo que visava demonstrar que o Accu-Chek Aviva 50T, tendo chegado a África – como o próprio asseverou ter acontecido –, não poderia ser revendido na Europa por tal reimportação não ser economicamente viável);
-Documento n.º 33, junto à Petição Inicial (e-mail do Apelante AA a um consultor externo da Apelada, em novembro de 2015, afiançando que as Apelantes B... e C... eram os parceiros da Apelada na exportação para os PALOP);
-Documento n.º 29, junto à Petição Inicial (apresentação do Apelante AA à sua chefia europeia do Grupo E..., em abril de 2016, em que este sustenta que o mercado dos PALOP tem um potencial de € 9M/ano – cf. pág. 6; que há potencial por explorar nos PALOP – cf. pág. 35; que a Apelante B... era o grande distribuidor da J... nos PALOP (€ 4M/ano) e que a J... propôs contrato de distribuição exclusiva à Apelante B... antes de sair do mercado – cf. pág. 39; que, não obstante, a E... conseguiu antecipar-se e assegurar a exclusividade com a Apelante B... – cf. pág. 39; que a Apelada podia atingir um objetivo de € 4M, logo em 2016, nos PALOP – cf. pág. 40; que, entre 2014 e 2015 as vendas da Apelada em Angola ascenderam, respetivamente, a cerca de € 1.250.000 e a cerca de € 2.750.000 – cf.pág. 40);
-Documento n.º 34, junto à Petição Inicial (e-mails trocados entre o Apelante AA e o seu superior hierárquico, FF, em junho de 2016, em que os objetivos para os PALOP surgem claramente indicados e em linha com o Contrato de Distribuição Exclusiva, bem como em linha com a narrativa que o Apelante AA vinha transmitindo na Apelada desde 2014, i.e., todo o Accu-Chek Aviva 50T se encontrava a ser exportado, pelas Apelantes B... e C..., para os mercados dos PALOP);
-Documento n.º 31, junto à Petição Inicial (e-mail do Apelante CC, de agosto de 2016, a afirmar expressamente que todos os produtos da Apelante C... se destinam a África, pedindo uma redução de preço para o Accu-Chek Aviva 50T de € 10 para € 9; que o Apelante AA lhe concede);
- Documento n.º 35, junto à Petição Inicial (e-mails trocados entre os Apelantes AA e CC – com conhecimento à liderança da Apelada, na pessoa de HH, recém-empossado na função –, em novembro de 2016, sobre a exportação das Apelantes C... e B... para Angola; ambos sustentando que tudo era, por estas, vendido em Angola);
-Documentos n.º 36 e 37, juntos à Petição Inicial (fatura junta aos e-mails trocados entre os Apelantes AA e CC – com conhecimento à liderança da Apelada, na pessoa de HH –, em novembro de 2016, de onde resultam mais de € 2M de vendas da Apelante B... em Angola, além de uma advertência do Apelante CC à Apelada para que confie na Apelante B... ou cesse relações, pois o Apelante AA teria “provas” de que tudo estava a ser exportado para os PALOP; tudo quando – como é hoje indisputado – nenhum Accu-Chek Aviva 50T fora vendido até então naqueles territórios; relativamente à tal fatura, de onde resultam mais de € 2M de vendas da Apelante B... em Angola, os Apelantes viriam a sustentar, já na pendência da presente ação, ter-se tratado de “um lapso”, não representando vendas reais – cf. artigo 301.º da Contestação); e
-Documento n.º 40, junto à Petição Inicial (e-mails trocados entre os Apelantes AA e CC – com conhecimento à liderança da Apelada, na pessoa de HH –, em dezembro de 2016, sobre os objetivos de vendas nos Palop em 2017; o Apelante CC refere ter a Apelante B... vendido, em Angola, nos nove meses precedentes, 4,7 milhões de dólares de produto E...; o Apelante AA aproveitou para confirmar as afirmações do Apelante CC; ambos discutiram um aumento de fornecimentos da Apelada à Apelante B... entre os 7% e os 10%, bem como uma dilação dos prazos de pagamento atendendo à dificuldade de extrair divisas daquele mercado angolano; tudo quando – como é hoje indisputado – nenhum Accu-Chek Aviva 50T fora vendido até então naquele território).
Estes documentos foram conjugados comos depoimentos de HH e de FF
Considerando que nenhuma embalagem de Accu-Chek Aviva 50T chegou a ser vendida em Angola pelas Rés em qualquer momento da relação comercial, o que constitui dado assente, duas teses poderiam justificar esta situação: uma o conluio de AA com o seu superior hierárquico, que foi adiantada na contestação, mas que ficou afastado na sentença, por falta de prova, tal como se analisou na sentença; outra, o encobrimento que foi feito, por AA, enquanto quadro superior da Autora e simultaneamente beneficiário das “transações fictícias” que importava manter, encobrimento esse refletido ad abundantia nos documentos acabados de mencionar.
Desta forma, fica prejudicada a totalidade da impugnação feita pois que, tudo ponderado, o juízo probatório que formulamos em nada diverge do que se apresenta como essencial à convicção alcançada pela 1.ª instância, que consideramos uma vez mais solidamente motivada, não sendo a contraprova efetuada suficiente para afastar aquele juízo probatório.
Improcede assim a pretensão dos apelantes, ficando prejudicada a necessidade do aditamento da matéria de facto, que não se mostra justificado.
4.8. Analisemos agora a impugnação feita pelos Recorrentes do “bloco de factos” relativo aos denominados “FACTOS ATINENTES AO GRUPO E... E ÀS CÓNGENERES EUROPEIAS DA A.”
Os Apelantes impugnam do elenco dos factos provados, que pretendem ver julgados não provados, ou julgados provados com diversa redação, (na redação indicada supra nas conclusões de recurso que aqui se dá por reproduzida), os factos 7, 8, 9, 187, 188, 185, 186, e 204, e dos factos não provados, 247, 248 e 249, que pretendem ver provados, tendo indicado, nas alegações de recurso, os concretos meios probatórios em que baseiam a sua pretensão.
Pretendem ainda ver aditado o facto assim numerado:
387) Dentro da União Europeia, a A. só atua no mercado português, não comercializando produtos para fora do território português.
São estes os factos impugnados:
7) A E..., por motivos, essencialmente, ligados ao adequado fornecimento e monitorização de cada país, privilegia o fornecimento de cada mercado nacional pela sua subsidiária a atuar localmente;
8) A Autora é a entidade que, integrada na pluralidade de subsidiárias direta ou indiretamente detidas pela E..., atua preferencialmente no mercado português na venda dos produtos “diabetes care”, incluindo o Accu-Chek Aviva 50T;
9) A E... Diabetes Care Deutschland GmbH é a entidade que atua preferencialmente na Alemanha, a E... Diabetes Care Limited no Reino Unido, a E... Diabetes Care Spain, S.L. em Espanha, a E... Diabetes Care Nederland B.V., nos Países Baixos e a UAB E... Lietuva na Lituânia
185) A natureza do produto vendido e em causa nos presentes autos (“tiras de teste”, utilizáveis num medidor eletrónico específico a cada marca) torna pouco flexível a procura do consumidor final;
186) Isto é, cada consumidor final comprará as “tiras de teste” específicas do seu aparelho, para uso diário, mudando de tipo e marca de aparelho de medição muito menos frequentemente do que adquire os consumíveis para o mesmo;
187) Em 2014 e 2016, nos mercados africanos de língua oficial portuguesa como Angola e Moçambique, o Grupo E... e, em particular, a Autora não tinham uma posição consolidada e estabilizada, havendo de praticar uma política de preço distinta para ali poder garantir uma parte do mercado;
188) Adicionalmente, era estrategicamente importante para a Autora, crescer nos mercados africanos de língua oficial portuguesa (especialmente, pela sua dimensão e, então, prosperidade, Angola), países com economias emergentes e que poderiam aportar um volume de faturação importante;
204) Ainda que o Grupo E... privilegie o fornecimento de cada mercado nacional pela sua subsidiária a atuar localmente – por motivos, essencialmente, ligados ao adequado fornecimento e monitorização de cada mercado –, nada impedia que, num cenário em que entidades localizadas na Alemanha, Inglaterra, Espanha, Países Baixos e Lituânia surgissem perante a Autora para lhe adquirirem produto, esta lhos vendesse;
Impugnam os seguintes factos não provados
247) A E... não permite que as suas subsidiárias locais, presentes em diversos Estados-Membros, exportem diretamente para os mercados de outros Estados-Membros;
248) A Autora não pode, na prática, vender os produtos da marca E... para outros mercados europeus que não o português;
249) Os clientes aos quais a Ré B... vendeu os produtos E... não eram, previamente, clientes da E...;
Pretendem ainda os apelantes que seja aditado o facto que numeraram de 387.
Vejamos.
O que os Apelantes pretendem com a impugnação feita aos factos 7, 8 e 9 e os não provados 247 e 248 é ver reconhecida a existência de uma proibição por parte da E... relativamente às suas subsidiárias locais presentes em diversos Estados membros da União Europeia, de venderem para os mercados de outros Estados Membros.
Desde logo ressalta que nenhum depoimento, foi feito de forma expressa nesse sentido, ou seja, de reconhecer a existência duma política interna da E... de proibição da exportação direta para outros Estados membro da União Europeia, o que bem se compreende, pois a existir tal proibição a mesma seria nula e de nenhum efeito, por violar de forma frontal as normas europeias relativas ao mercado comum e às regras de defesa da concorrência, decorrentes do Tratado da União Europeia.
Isso mesmo ressaltou de forma evidenciada do depoimento do diretor do Departamento jurídico da Diabetes Care para o Nordeste da Europa e Canadá, OO, o qual fez aliás uma distinção quanto às regras adotadas pela E... dentro e fora do espaço comunitário, demonstrando estar a E... bem ciente das regras da concorrência na União Europeia e do acompanhamento da jurisprudência do TJUE nesta matéria.
Nem a legal represente da E..., nem as demais testemunhas negaram porém, a existência de uma política restritiva da E..., relativamente à atuação das suas subsidiárias, por si detidas (direta ou indiretamente) e que atuam no mercado europeu, no sentido de que cada uma, atua preferencialmente no respetivo mercado da sua nacionalidade, não vendendo para os demais, situação essa logo justificada pela necessidade de fornecimento e monotorização de cada um desses mercados.
Uma política comercial de desincentivo (às exportações para os outros países europeus) não é a mesma coisa que uma política comercial proibitiva dessas exportações.
A proibição implicaria desde logo a existência de sanções pela E..., que não foram sequer aventadas.
Ora, as denominadas “exportações paralelas”, não podendo ser proibidas, por causa das normas europeias decorrentes do funcionamento do mercado comum, são desincentivadas, já que cada subsidiária da E... deverá atuar preferencialmente no seu país, não devendo por isso vender para os demais países europeus.
Não obstante, porque o mero desincentivo não é suficiente (nem poderia), para afastar tais exportações, as mesmas existem, como foi reconhecidos pelos responsáveis da E... ouvidos em tribunal e as exportações para a Europa, figuram até nas previsões de vendas, como resulta do documento 34 junto com a p.i., aliás com a indicação dos números do “paralell trade”, feita pelo próprio apelante AA, num e-mail remetido a FF.
Desta forma, concordamos com a análise crítica feita na sentença a este respeito, no sentido em que se afirmou: “A prova dos factos 1º a 7º (exceto quanto à expressão não permite, única que foi verdadeiramente impugnada), 8º (exceto quanto à expressão atua preferencialmente, única que foi verdadeiramente impugnada), 9º (exceto quanto à expressão atua preferencialmente, única que foi verdadeiramente impugnada), (…) fundou-se no acordo das partes.”
“Quanto ao facto 7º (privilegia),8º (atua preferencialmente) e 9º (atua preferencialmente) foram várias as testemunhas que sobre tal depuseram no sentido de que inexistindo obstáculo legal à importação entre congéneres de vários países sitos na União Europeia e que pese embora não tenha ocorrido não seria de todo inviável, com autorização superior, que tal ocorresse, o tribunal deu-o por provado. Consequentemente, deram-se por não provados os factos 247º e 248º”.
Quanto aos factos 185, 186, 187, 188 e não provado 249, assim como o facto que os apelantes pretendem ver aditado, relacionados com a natureza especifica do produto vendido (“tiras de teste”), por serem utilizáveis num medidor eletrónico específico a cada marca, que implicam que produto aqui em causa seja um consumível de um aparelho, ou seja apenas interessa aos doentes que tenham o referido aparelho, implicando por isso pouca elasticidade do mercado, também não vislumbramos razões para ser alterada a decisão proferida nesta matéria, que teve por base o depoimento da testemunha FF e o depoimento da testemunha HH, bastantes elucidativos quanto à pouca flexibilidade do consumidor final na procura das identificadas tiras e bem assim da necessidade de no mercado angolano, onde a E... não estava implantada, ser praticada uma politica de preços distinta para permitir a desejada implementação do comercio daquele produto, naqueles territórios.
Improcede assim a impugnação feita.
Também o facto 387) não emergiu provado, porquanto apesar da Autora atuar preferencialmente no mercado português, não comercializando produtos para fora do território português, inexiste nenhuma proibição para o fazer.
Da análise desde “bloco” de factos ressalta, porém, que se mostra omitido do elenco dos factos provados, o facto que se encontra provado, através do documento junto como documento nº 67 junto com a p.i., o qual tem relevância para a decisão a proferir.
Com efeito, foi oportunamente alegado pela autora na petição inicial (no artigo 247), que as subsidiárias do grupo E... europeias lhe cederam oportunamente os seus direitos a reclamar indemnização pelos prejuízos causados.
Com base no identificado documento, foi reconhecida legitimidade à autora para peticionar nesta ação indemnização pelos danos sofridos pelas suas congéneres europeias.
Desta forma, por ter interesse para a decisão da causa a proferir nesta ação, deverá ser aditado ao elenco dos factos provados, o seguinte facto: 10-A) As subsidiarias do grupo E... (da Alemanha, Espanha, Países Baixos, Lituânia e Reino Unido) cederam à autora os seus direitos a reclamar indemnização pelos prejuízos causados em consequência da atuação da B... no mercado europeu, conforme documento 67 junto à p.i..
4.9. Por fim, os Apelantes impugnam os factos contidos no “bloco de factos” que denominaram de “DOS FACTOS ATINENTES AOS SUPOSTOS DANOS SOFRIDOS PELA A. E/OU PELAS SUAS CÓNGENERES EUROPEIAS”.
Neste “bloco”, os Apelantes impugnam do elenco dos factos provados, que pretendem ver julgados não provados, ou julgados provados com diversa redação, (na redação indicada supra nas conclusões de recurso, que aqui se dá por reproduzida), os factos 61, 69, 70, 75, 192, 193, 195, 196, 200, 202, 203, 205, 206, 209, 211, tendo indicado, nas alegações de recurso, os concretos meios probatórios em que baseiam a sua pretensão.
São estes os factos impugnados:
61) O Réu AA geriu, enquanto simultaneamente Head of Market Access & Key Account Manager da Autora e titular de 99,6% do capital social da Ré B..., uma relação contratual entre esta e a Autora que lhe permitiu beneficiar de uma margem correspondente a 83% dos resultados líquidos da Ré B... entre 2014 e 2017, o que ascendeu a €6.359.243,78
69) Entre 17 de fevereiro de 2014 e fevereiro de 2018, a Autora vendeu a clientes não finais, i.e., que procederiam à revenda do Accu-Chek Aviva 50T, um total de 3.356.503 embalagens; 70) Do referido total, 2.039.939 embalagens de Accu-Chek Aviva 50T foram vendidas pela Autora ao preço médio de €16,34; 75) Tendo adquirido mais de um milhão de embalagens de Accu-Chek Aviva 50T a €10,00 ou €9,00, a Ré B..., revendeu-as integralmente na Europa por um preço próximo daquele a que a Autora vendeu o Accu-Chek Aviva 50T a todos as outras entidades que lhe adquiriam o referido produto para revenda;
192) O Grupo E... perdeu, indiretamente – no somatório materializado pela pluralidade das suas subsidiárias, entre as quais se contam a Autora e as subsidiárias de cada país para o qual os Réus exportaram as quantidades de produto destinado para África –, parte da margem que auferiria no mercado europeu, uma vez que as vendas que no mesmo aquele faria, por intermédio da Autora ou das outras subsidiárias a atuar preferencialmente nos países europeus em que a Ré B... e a Ré C... venderam o Accu-Chek Aviva 50T, foram parcialmente substituídas por produto revendido pelas Ré B... e C..., previamente adquirido à Autora a um preço significativamente mais reduzido (€10/€9) do que aquele que seria cobrado a qualquer outro revendedor a operar em tal mercado (€16,34);
193) Tendo a Autora e as subsidiárias do Grupo E... a atuar preferencialmente em cada país para o qual os Réus exportaram as quantidades de produto destinado para África perdido diretamente, devido à referida conduta dos Réus, parte da margem que aufeririam no mercado europeu; 195) A posição do Grupo E... no mercado europeu permite às respetivas subsidiárias a atuar em cada país para onde a B... exportou, praticar preços bastante mais elevados do que os que praticaria nos mercados angolano e moçambicano, onde não tem posição equiparável; 196) Estes preços de €10,00 e €9,00 por embalagem são muito inferiores àqueles que a Autora e as suas congéneres a atuar nos países para os quais a Ré B..., e através desta, a Ré C..., exportaram poderiam auferir;
200) Estava ao alcance de uma multinacional europeia e centenária, com subsidiárias em cada um dos países para os quais os Réus revenderam, fazer estas vendas entre os €15,50 e os €17,00 no mercado europeu sem ter de oferecer à Ré B... (e à Ré C...) a margem compreendida entre aqueles valores e os €9,00/€10,00 a que vendeu o produto à Ré B... (e também à Ré C...;
202) A própria Autora ou outra sua congénere a atuar preferencialmente em cada país para o qual os Réus exportaram o Accu-Chek Aviva 50T poderia ter feito as mesmas vendas que a Ré B... fez na Europa; 203) A Autora auferiu a margem libertada pelo preço de €10/€9,00, quando poderia libertar-lhe uma margem decorrente de uma venda feita, pelo menos, aos valores entre os €15,50 e os €17,00 que a Ré B... cobrou;
205) Teria ainda obviamente sido possível a outra congénere da Autora, tendo por território preferencial de vendas um dos cinco países europeus (Alemanha, Espanha, Países Baixos, Lituânia e Reino Unido) para os quais a Ré B... exportou, concluir as mesmas vendas que a Ré B... fez na Europa;
206) A Autora perdeu a margem correspondente à diferença entre o preço médio de venda praticado pela Ré B..., em 2016 e 2017, em cada um dos cinco países europeus e o preço que praticou com a Ré B... ao abrigo do Contrato de Distribuição Exclusiva (€9,00);
209) Tendo a Autora perdido a margem correspondente à diferença entre o preço médio de venda praticado pela Ré B..., no período anterior à celebração do contrato de distribuição exclusiva, em cada um dos cinco países europeus e o preço que praticou com esta mesma Ré, em montante ainda não concretamente apurado;
211) Tendo a Autora perdido a margem correspondente à diferença entre o preço médio de venda praticado pela Ré C..., de 2014 e 2017, à B... e o preço que praticou com esta mesma Ré, em montante ainda não concretamente apurado.
Discordam as Apelantes da prova destes factos, que pretendem ver julgados não provados, ou com resposta restritiva.
Na sentença, esta factualidade ficou assim fundamentada: “Relativamente aos factos 69º a 75º, 216º e 225º a 227º ponderou o tribunal o depoimento da testemunha WW, bem como os relatórios por este elaborados e juntos aos autos - como referido, documentos 19 e 20, anexos à petição inicial, e o documento n.º 1, anexo ao requerimento de 15.09.2022 (ponderando-se o método utilizado), este contendo informação relativa à documentação junta aos autos em 26.04.2022, relativa à Clinica T..., sendo que o último relatório não pode ser considerado na sua totalidade porquanto a Autora não deduziu o incidente de liquidação e não foi o valor aí obtido, quanto ao período anterior ao contrato de distribuição e ao da C..., submetido ao necessário contraditório, pese embora, juntamente com os documentos juntos aos autos pelos requerimentos de 1.06.2022 (Ref. Citius 32430764, 32430765 e 32430765) e o reconhecimento dos próprios Réus se desse por demonstrado o destino dado pela C... às embalagens dos produtos aqui em discussão (venda à B..., na sua totalidade), dando-se assim por provados os factos 77º e 191º Tal depoimento e relatórios elaborados, conjugados com os documentos juntos pela Autora nos requerimentos de 15.09.2022 (cópia de todas as faturas que a B... juntou à petição inicial do processo n.º 14636/18.0T8SNT – Ação B..., porque não abalados por outros elementos probatórios, e considerando a metodologia adotada, mereceram a credibilidade do tribunal, fundando a prova dos factos 189º e 190º (aqui com suporte nos documentos juntos em 15.09.2022), 197º, 198º, 207º, 208º a 211º (…) A prova dos factos 192º a 196º, 200º, 202º e 204º, resultou do depoimento das testemunhas FF, HH, XX e OO, que assinalaram o baixo preço em causa, sendo que as três primeiras testemunhas não afastaram que fosse impossível, em teoria, a venda para outro país comunitário, pela própria E... portuguesa, já que apenas está em causa uma mera questão de organização do grupo. Na mesma perspetiva, e atendendo-se como já se referiu, à pouca elasticidade do mercado, por estarem em causa consumíveis, seria possível cada uma das congéneres para onde a B... exportou os produtos que adquiriu à Autora e à C..., vender aos seus já clientes esses produtos. Daí a prova do facto 205º e a não prova do facto 249º. Desses depoimentos das testemunhas FF, HH e PP e dos relatórios por este elaborados, nos termos que acima melhor se descreveram, resultou a prova dos factos 203º e 206º, A prova desses factos determinou a não prova dos factos 250º e 251º, 255º e 256º”.
Relativamente aos factos 69, 70 e 75, os apelantes defendem que não foi feita prova bastante e suficiente para os demonstrar, isto porque os factos foram considerados provados com base nos documentos 19 e 20, anexos à petição inicial, e o documento n.º 1, anexo ao requerimento de 15.09.2022 – “Relatórios de quantificação dos danos”, realizados pela R... a pedido da Autora - tendo logrado demonstrar com base nas faturas juntas aos autos o preço unitário e o número de embalagens de accu-Chek Aviva 50T que vendeu à Ré B... e á Ré C... entre Fevereiro de 2014 e 2018 (factos provados 71 a 74).
Porém relativamente ao factos ora impugnados, dizem os Apelantes, relativos aos demais clientes a quem venderam o aludido produto, a autora limitou-se a juntar um “mero relatório elaborado por terceiro contratado por si própria a quem pagou”, prova insuficiente, já que deveria ter junto todas as faturas de venda do aludido produto, durante o mesmo período a todos os seus outros clientes.
Carecem de razão os apelantes, já que, aqueles factos mostram-se demonstrados, tendo em consideração o depoimento da testemunha PP, economista da R... que procedeu à quantificação dos preços e quantidades de produto E... vendido, bem como à quantificação dos danos.
De referir ainda que os Apelantes na contestação aceitaram e por isso, foram julgados provados, por acordo das partes os factos provados 55 a 59, onde, com relevância para o que estamos a tratar, consta a indicação da margem alcançada pela B... com a venda dos produtos exclusivamente da autora no período e apreço (24.2.2014 a 31.12.2017), e o peso de tal margem na venda no confronto da totalidade dos produtos vendidos por aquela ré.
Resulta da prova produzida, nomeadamente dos documentos n.º 2, junto ao Requerimento da Apelada de 02.09.2022 (relatório da R... em que se quantificam as vendas da Apelada a todos os revendedores de Accu-Chek Aviva 50T e o seu preço médio, entre fevereiro de 2014 e março de 2016, quando foi assinado o Contrato de Distribuição Exclusiva, de onde resulta que a Apelante B... beneficiou do preço médio de € 9,99, para 293.799 embalagens, a Apelante C... do preço médio de € 10, para 146.259 embalagens, e todos os outros revendedores do preço médio de € 16,94, para 1.049.916 embalagens); e do documento n.º 19, junto à Petição Inicial (relatório da R... em que se quantificam as vendas da Apelada a todos os revendedores de Accu-Chek Aviva 50T e o seu preço médio, na vigência do Contrato de Distribuição Exclusiva, de onde resulta que a Apelante B... beneficiou do preço médio de € 9,01, para 789.882 embalagens, a Apelante C... do preço médio de € 9,22, para 86.624 embalagens e todos os outros revendedores do preço médio de € 16,34, para 990.023 embalagens.
A prova bastante carateriza-se por ser suficiente a mera contraprova para a sua impugnação, ou seja, a colocação do julgador num estado de dúvida quanto à verdade do facto (art. 346.º do CCivil).
Assim se distingue prova em contrário de contraprova – aquela, mais do que criar um estado de dúvida, tem de demonstrar a não realidade do facto.
Ora, nenhuma contraprova foi produzida no sentido de contrariar estes volumes de vendas e os respetivos preços de venda e de revenda.
Mostra-se assim feita prova suficiente daqueles factos, não tendo os apelantes logrado fazer contraprova dos mesmos, daí que se imponha a manutenção da factualidade provada.
Tratando-se de um preço médio, também não exista qualquer contradição com o facto 239, que ademais se reporta a preço de 2013.
Dizem ainda os apelantes que a Autora não fez qualquer prova de que as vendas que foram realizadas pela B... no mercado europeu, se não fossem realizadas pela Ré B..., teriam sido feitas pelo grupo E... (por intermédio da A ou das suas subsidiárias que atuam em cada país).
Dizem que quanto a este facto não foi junto nenhum estudo e o mesmo não pode ser demonstrado pela mera prova testemunhal.
Assim e porque a Autora nunca poderia por si vender para os outros países europeus inexiste qualquer perda de margem.
Não tendo ficado demonstrada esta impossibilidade, apenas que as vendas eram feitas preferencialmente junto dos revendedores do país de cada subsidiária, há que ter em consideração as premissas que ficaram demonstradas suscetíveis de conduzir a tal prova.
Assim, constitui um dado de facto, suportado documentalmente, pela consultora independente R..., e pelo depoimento de PP, autor da análise da referida consultora, que nenhum revendedor de Accu-Chek Aviva 50T beneficiou dos preços de que as Apelantes B... e C... beneficiaram.
A Apelante B..., basicamente, como alega a Apelada, limitou-se a revender a onze distribuidores locais, a operar em Espanha, Inglaterra, Holanda, Alemanha e Lituânia, o produto que a Apelada lhe vendeu e fê-lo a um preço que variou entre os € 15 e os € 17 – que anda em torno do preço que se demonstrou que a Apelada praticava aos revendedores que operavam no mercado europeu.
Ou seja, a Apelada, ou as suas congéneres a operar em Espanha, Inglaterra, Holanda, Alemanha e Lituânia, poderiam vender – no mínimo – ao preço que a Apelante B... vendeu as mais de um milhão de embalagens de Accu-Chek Aviva 50T em causa nos presentes autos.
Tal como resultou dos depoimentos de FF, foi explicado em que consistiu o prejuízo para a Grupo E..., tendo no mesmo sentido prestado depoimento HH, que foram ainda relevantes, como já referimos supra quanto à pouca elasticidade do mercado deste produto, relacionada com os seus destinatários, já que se encontra limitado às pessoas que sofrem de “diabetes”, por um lado e por outro, por causa das caraterísticas do produto, que apenas pode ser utilizado por quem seja previamente portador do aparelho (também vendido pela E...), onde aquelas “tiras” podem ser utilizadas.
Sendo o mercado deste produto pouco elástico, pode concluir-se, como na sentença, que a Apelante B... ocupou parte do mercado de Espanha, Inglaterra, Holanda, Alemanha e Lituânia com um produto com rentabilidade mais baixa para o Grupo E..., realidade que se mostra refletida nos factos ora impugnados.
Dessa forma indefere-se a impugnação.
Não obstante, concordamos com os Apelantes quanto ao facto de não deverem ser utilizadas naqueles factos as expressões “perdeu” e “parte da margem”, assim como alguns termos que se podem considerar conclusivos, ou conterem expressões conclusivas, os quais deverão por isso ser substituídos por outros que melhor retratem a realidade de tais factos.
Com efeito, só se pode perder algo que anteriormente se tenha, pelo que a expressão usada (que foi reproduzida dos factos alegados na pi), não se nos afigura adequada à demonstração das consequências da atuação das Rés, reportada aos mercados.
Dada a relevância desta matéria, entendemos que na redação dos factos referentes à matéria dos danos, há que ter uma preocupação acrescida de a ver expurgada de juízos conclusivos ou de conceitos jurídicos, para se permitir que tal raciocínio seja feito no local próprio, da aplicação do direito aos factos.
É questão de facto tudo o que tende a apurar quaisquer ocorrências da vida real, quaisquer eventos materiais e concretos, quaisquer mudanças operadas no mundo exterior; e é questão de direito, tudo o que respeita à interpretação e aplicação da lei.
Não esquecer, ainda, que o que se espera ver vertido no elenco dos factos relevantes são apenas factos concretos, e não conceitos, proposições normativas ou juízos jurídico-conclusivos (art. 607.º, n.º 4, do CPCivil). Ou seja, factos enquanto premissas de um juízo conclusivo, num ou noutro dos sentidos defendidos pelas partes, ou até eventualmente num terceiro sentido afirmado pelo tribunal por via do princípio do inquisitório.
Isto posto, impõe-se apenas alterar a seguinte factualidade que foi impugnada, tendo em consideração o uso daquela indicada expressão (ou outras que consideramos conclusivas), passando os factos seguintes a ter a redação que segue:
Substituindo-se a expressão “perdeu internamente parte da margem que auferiria no mercado europeu”, por “deixou de poder auferir”: 192) O Grupo E...– no somatório materializado pela pluralidade das suas subsidiárias, entre as quais se contam a Autora e as subsidiárias de cada país para o qual os Réus exportaram as quantidades de produto destinado para África – deixou de poder auferir os correspondentes lucros referentes à parte da margem que auferiria no mercado europeu, uma vez que as vendas que no mesmo aquele faria, por intermédio da Autora ou das outras subsidiárias a atuar preferencialmente nos países europeus em que a Ré B... e a Ré C... venderam o Accu-Chek Aviva 50T, foram parcialmente substituídas por produto revendido pelas Ré B... e C..., previamente adquirido à Autora a um preço significativamente mais reduzido (€10/€9) do que aquele que seria cobrado a qualquer outro revendedor a operar em tal mercado (€16,34);
Substituindo-se a expressão “perdido diretamente parte da margem”, por “deixado de poder auferir.” 193) Tendo a Autora e as subsidiárias do Grupo E... a atuar preferencialmente em cada país para o qual os Réus exportaram as quantidades de produto destinado para África, deixado de poder auferir, devido à referida conduta dos Réus, parte da margem que aufeririam no mercado europeu;
Substituindo-se a expressão “muito inferiores”, por “inferiores: 196) Estes preços de €10,00 e €9,00 por embalagem são inferiores àqueles que a Autora e as suas congéneres a atuar nos países para os quais a Ré B..., e através desta, a Ré C..., exportaram poderiam auferir;
Substituindo-se a expressão “multinacional europeia e centenária”, por “E...”: 200) Estava ao alcance da E..., com subsidiárias em cada um dos países para os quais os Réus revenderam, fazer estas vendas entre os €15,50 e os €17,00 no mercado europeu sem ter de oferecer à Ré B... (e à Ré C...) a margem compreendida entre aqueles valores e os €9,00/€10,00 a que vendeu o produto à Ré B... (e também à Ré C...);
Eliminando-se o adverbio “obviamente”: 205) Teria sido possível a outra congénere da Autora, tendo por território preferencial de vendas um dos cinco países europeus (Alemanha, Espanha, Países Baixos, Lituânia e Reino Unido) para os quais a Ré B... exportou, concluir as mesmas vendas ao preço que a Ré B... fez na Europa;
Substituindo-se a expressão “perdeu a margem”, por “deixou de poder auferir”: 206) A Autora, deixou de poder auferir a margem correspondente à diferença entre o preço médio de venda praticado pela Ré B..., em 2016 e 2017, em cada um dos cinco países europeus e o preço que praticou com a Ré B... ao abrigo do Contrato de Distribuição Exclusiva (€9,00); 209) Tendo a Autora deixado de poder auferir a margem correspondente à diferença entre o preço médio de venda praticado pela Ré B..., no período anterior à celebração do contrato de distribuição exclusiva, em cada um dos cinco países europeus e o preço que praticou com esta mesma Ré, em montante ainda não concretamente apurado; 211) Tendo a Autora deixado de poder auferir a margem correspondente à diferença entre o preço médio de venda praticado pela Ré C..., de 2014 e 2017, à B... e o preço que praticou com esta mesma Ré, em montante ainda não concretamente apurado.
No demais mantem-se a factualidade provada.
4.10. Os apelantes organizaram ainda um outro “bloco de factos”, que denominaram de “FACTOS CONCLUSIVOS QUE DEVEM SER EXPURGADOS DA MATÉRIA DE FACTO PROVADA”.
Relativamente à matéria conclusiva, o que se espera ver vertido no elenco dos factos relevantes são apenas factos concretos, e não conceitos, proposições normativas ou juízos jurídico-conclusivos (art. 607.º, n.º 4, do CPCivil). Ou seja, factos enquanto premissas de um juízo conclusivo, num ou noutro dos sentidos defendidos pelas partes, ou até eventualmente num terceiro sentido afirmado pelo tribunal por via do princípio do inquisitório.
Acontece porém que os factos discriminados neste novo grupo, já foram por nós apreciados na impugnação feita aos mesmos supra, sendo que, com exceção das alterações a que procedemos já em consequência de reconhecermos a inclusão de alguns juízos de natureza conclusiva, tal não ocorre na demais factualidade por nós analisada e secundada, assim como não detetamos quaisquer contradições entre os mesmos.
Desta forma, terminando a reapreciação da matéria de facto, e em jeito conclusivo, podemos afirmar que a matéria de facto julgada provada e não provada em apreço, relativa aos vários blocos de factos impugnados coaduna-se inteiramente, a nosso ver, com um juízo probatório sobre o conjunto dos meios de prova produzidos, “sob o signo da probabilidade lógica – de evidence and inference, i. e., segundo um critério de probabilidade lógica prevalecente, portanto, segundo o grau de confirmação lógica que os enunciados de facto obtêm a partir das provas disponíveis”.
É certo que a convicção formada pelo tribunal diverge radicalmente da tese que os Apelantes apresentam, mas é sem qualquer dúvida uma convicção objetiva, alicerçada numa perspetiva eminentemente “universalista” da prova produzida, ao invés da formada pelos Apelantes, compreensivelmente subjetiva, ancorada em fragmentos de prova convenientes e na vontade de fazer prevalecer a sua própria verdade.
Não vemos, pois, razões válidas para censurar a decisão da matéria de facto em qualquer dos segmentos impugnados, porque sustentada num juízo de maior probabilidade do acontecer formulado pela 1.ª instância, com base no princípio da livre apreciação do conjunto de provas produzido, e favorecido pela imediação, dotado de racionalidade, objetividade e inteligibilidade bastantes.
Após audição da prova afigura-se-nos, ainda, que a apreciação da Srª. juíza a quo - efetivada no contexto da imediação da prova -, surge-nos como claramente sufragável, com iniludível assento na prova produzida e em que declaradamente se alicerçou, nada justificando, por isso, a respetiva alteração.
Com efeito, a convicção expressa pelo tribunal a quo tem razoável suporte naquilo que a gravação das provas e os demais elementos dos autos lhe revela.
É ostensivo no caso em apreço que que a apreciação da prova feita pelo tribunal recorrido de mostra corretamente realizada, não evidenciando qualquer erro.
Aliás, não podemos deixar de louvar o trabalho desenvolvido pelo tribunal de primeira instância, que não obstante o longo julgamento (repartido em nove longas sessões, com dificuldade acrescida na imediação da aprova, por ter sido necessário recorrer a tradutores), a enorme extensão da factualidade sujeita a instrução e a complexidade manifesta das questões em apreço, logrou formular uma prudente, cuidada e fundamentada análise crítica da prova, (com o cuidado de identificação e concatenação dos diversos meios de prova, relativamente a cada facto individualmente considerado) assente numa apreciação racional e criticamente fundamentada das provas de acordo com as regras da experiência comum e com corroboração pelos dados objetivos existentes assente na convicção formada quanto à realidade dos diversos factos controvertidos, pelo que, pese embora a impugnação que foi feita que contemplou 678 artigos nas alegações de recurso e 124 conclusões, mereceu no essencial ser por nós secundado.
V- FACTOS PROVADOS E NÃO PROVADOS:
Com interesse para a decisão encontram-se provados os seguintes FACTOS:
1) A Autora é uma sociedade comercial de direito português, constituída em 12.11.1998, que tem por objeto social o comércio, a importação e a venda de reagentes, equipamentos e testes de diagnóstico médico e produtos para investigação (cfr. documento n.º 1, anexo à petição inicial, cujo teor se dá aqui por integramente reproduzido);
2) A integral titular do capital social da Autora é a D..., Lda, (“D...”), sociedade comercial de direito português, constituída em 01.08.1973, que tem por objeto social a importação e comércio de produtos farmacêuticos, químicos, biológicos de higiene, vitamínicos, veterinários, dietéticos, aromáticos, de diagnóstico e de aparelhos bioelectrónicos (cfr. documentos n.ºs 1 e 1-A, anexos à petição inicial, cujo teor se dá aqui por integramente reproduzidos);
3) A maioria do capital social (67,5 %) da D... cabe diretamente, desde a sua constituição, à E..., uma sociedade de direito suíço que, no mercado global e por intermédio de mais de uma centena de subsidiárias, desenvolve a sua atividade nos setores farmacêutico e de diagnóstico. O restante capital social (37,5%) da D... cabe indiretamente, desde a sua constituição, à E..., por intermédio da DD (...) - cfr. documento n.º 1, anexo à petição inicial, cujo teor se dá aqui por integramente reproduzido;
4) Uma das áreas de negócio a que as subsidiárias da E... se dedicam é o “diabetes care”, isto é, a pesquisa, o desenvolvimento e a comercialização de produtos destinados à monitorização da glicémia dos pacientes;
5) Entre tais produtos encontra-se o aparelho Accu-Chek Aviva, que mede a glicémia analisando, por intermédio de infravermelhos, uma pequena quantidade de sangue do paciente, colocada numa “tira de teste”;
6) As “tiras de teste” são vendidas em embalagens de 50 unidades, sob a designação “Accu-Chek Aviva 50T;
7) A E..., por motivos, essencialmente, ligados ao adequado fornecimento e monitorização de cada país, privilegia o fornecimento de cada mercado nacional pela sua subsidiária a atuar localmente;
8) A Autora é a entidade que, integrada na pluralidade de subsidiárias direta ou indiretamente detidas pela E..., atua preferencialmente no mercado português na venda dos produtos “diabetes care”, incluindo o Accu-Chek Aviva 50T;
9) A E... Diabetes Care Deutschland GmbH é a entidade que atua preferencialmente na Alemanha, a E... Diabetes Care Limited no Reino Unido, a E... Diabetes Care Spain, S.L. em Espanha, a E... Diabetes Care Nederland B.V., nos Países Baixos e a UAB E... Lietuva na Lituânia;
10) O conjunto de sociedades acima referido, compreendendo a E... e as suas múltiplas subsidiárias dedicadas à área de negócio “diabetes care”, incluindo a Autora, são adiante conjuntamente referidas como “Grupo E...”; 10-A) As subsidiarias do grupo E... (da Alemanha, Espanha, Países Baixos, Lituânia e Reino Unido) cederam à autora os seus direitos a reclamar indemnização pelos prejuízos causados em consequência da atuação da B... no mercado europeu, conforme documento 67 junto à p.i. (facto ora aditado)
11) O Réu AA foi funcionário da Autora entre 01.05.2002 e 16.12.2016;
12) Apesar de ter desempenhado mais do que uma função ao longo da sua relação laboral com a Autora, a partir do primeiro semestre de 2013 o Réu AA desempenhou funções de Head of Market Access & Key Account Manager da Autora;
13) A função de Head of Market Access inclui a introdução do produto da Autora nos seus vários mercados e canais de venda;
14) Já a função de Key Account Manager compreende a gestão dos clientes principais da Autora;
15) A Ré B... é uma sociedade anónima, constituída pelo Réu AA em 30.01.2014, cujo capital social a este pertenceu diretamente (sendo titular de 99,6% do capital social) até 04.10.2018, data a partir da qual passou a pertencer-lhe indiretamente (sendo titular daqueles 99,6% do capital social por intermédio da F... SGPS, cujo capital social pertence ao Réu AA à razão de 99,9 %) - cfr.. documentos n.ºs 2 a 6, anexos à petição inicial, cujo teor se dá aqui por integramente reproduzidos)
16) O Réu AA foi designado administrador único da Ré B... em 22.05.2017 e presidente do respetivo conselho de administração em 09.10.2017 (cfr. documento n.º 2, anexo à petição inicial, cujo teor se dá aqui por integramente reproduzido);
17) Por deliberação datada de 6.03.2020, o Réu AA cessou as suas funções de presidente do conselho de administração da Ré B... (cfr. documento n.º 2, anexo à petição inicial, cujo teor se dá aqui por integramente reproduzido);
18) À data de propositura da presente ação, o Réu AA permanece o beneficiário efetivo da Ré B..., controlando 99,6 % do seu capital social (cfr. documento n.º 6, anexo à petição inicial, cujo teor se dá aqui por integramente reproduzido);
19) A Ré BB é irmã do Réu AA (cfr. documentos n.ºs 7 e 8, anexos à petição inicial, cujo teor se dá aqui por integramente reproduzidos);
20) Em 30.01.2014, constitui a Ré B... juntamente com o Réu AA, sendo então titular de 0,1% do capital social daquela (cfr. documento n.º 3, anexo à petição inicial, cujo teor se dá aqui por integramente reproduzido);
21) Foi administradora única da Ré B... desde a sua constituição até 12.12.2014 (cfr. documento n.º 2, anexo à petição inicial, cujo teor se dá aqui por integramente reproduzido);
22) Em 09.10.2017 foi designada vogal do conselho de administração da Ré B..., cargo a que renunciou em 05.05.2021 (cfr. documento n.º 2, anexo à petição inicial, cujo teor se dá aqui por integramente reproduzido);
23) Em 09.04.2014 constituiu a Ré C..., sendo titular da sua única quota (cfr. documento n.º 9, anexo à petição inicial, cujo teor se dá aqui por integramente reproduzido);
24) Foi gerente da Ré C... até 5.05.2021, data em que renunciou à gerência, que passou a caber ao Réu AA (cfr. documento n.º 9, anexo à petição inicial, cujo teor se dá aqui por integramente reproduzido);
25) O Réu CC é cunhado do Réu AA e casado com a Ré BB (cfr. documentos n.ºs 7 e 8, anexos à petição inicial, cujo teor se dá aqui por integramente reproduzidos)
26) Foi administrador único da Ré B... entre 12.12.2014 e 22.05.2017, data em que renunciou ao cargo (cfr. documento n.º 2, anexo à petição inicial, cujo teor se dá aqui por integramente reproduzido);
27) Em 09.10.2017 foi designado vogal do conselho de administração da Ré B..., cargo que mantém na data de propositura da presente ação (cfr. documento n.º 2, anexo à petição inicial, cujo teor se dá aqui por integramente reproduzido);
28) Embora não tenha formalmente exercido cargos de gerência na Ré C..., foi o Réu CC quem representou aquela nos mais relevantes contactos com a Autora, nos termos que infra se descreverão;
29) O código de conduta que se aplicava aos funcionários da Autora no período compreendido entre os anos de 2013 e de 2016 dispõe o seguinte: “Conflito de interesses Os interesses pessoais não devem influenciar indevidamente o nosso discernimento profissional Como colaboradores da E..., devemos evitar situações onde os interesses pessoais entrem em conflito, ou possam parecer estar em conflito, com os interesses da E.... Existe um conflito de interesses quando os interesses pessoais de um colaborador são incompatíveis com os da E... e criam conflitos de lealdade. Atividades de familiares e pessoas próximas podem originar conflitos de interesses. Não devemos participar, parecer que estamos a participar ou exercer influência em qualquer decisão que possa colocar os nossos próprios interesses em conflito com os melhores interesses da E.... Não devemos usar indevidamente a nossa função na E... para benefício pessoal ou para benefício de familiares ou pessoas próximas. (…) Muitos conflitos de interesses, reais ou potenciais, podem ser resolvidos de uma forma aceitável tanto para o indivíduo como para a empresa. No caso de um conflito de interesses, o colaborador em questão deve informar imediatamente a sua chefia, de forma a encontrar uma solução adequada. Todos nós devemos: - Evitar situações nas quais os nossos interesses pessoais entrem em conflito com os da E.... - Não utilizar indevidamente a nossa posição na E... para benefício pessoal, benefício de familiares ou de pessoas próximas. - Informar imediatamente a nossa chefia se considerarmos a possibilidade de participar no conselho de outra empresa, entidade comercial ou conselho consultivo científico. - Informar imediatamente a nossa chefia acerca de qualquer conflito de interesses, real ou potencial, de forma a encontrar uma solução adequada” (cfr. documento n.º 10, cujo teor se dá aqui por integralmente por reproduzido, citação da página 23);
30) No mesmo Código de Conduta acrescenta-se inclusivamente o seguinte exemplo: “Pergunta: A minha mulher trabalha como diretora num fornecedor que está a tentar obter um contrato com a E.... Eu posso influenciar o processo de seleção. O que devo fazer? Resposta: Há um conflito de interesses óbvio, devido ao cargo da sua mulher. Tem de revelar este conflito de interesses à sua chefia e recusar-se a participar na decisão. A chefia decidirá se o fornecedor para quem a sua mulher trabalha representa o melhor interesse para a E.... Se o fornecedor representar o melhor interesse para a E..., a sua chefia poderá escolher o fornecedor, apesar de os seus interesses estarem ligados” (cfr. documento n.º 10, cujo teor se dá aqui por integralmente por reproduzido, citação da página 23).
31) Nos termos do referido código de conduta, o Réu AA, enquanto Head of Market Access & Key Account Manager da Autora, não podia manter relações comerciais com a Autora, nem gerir essas relações comerciais;
32) Nos termos do referido código de conduta, o Réu AA, enquanto Head of Market Access & Key Account Manager da Autora não podia gerir as relações comerciais mantidas entre a Autora e os Réus CC e BB;
33) O Réu AA tinha conhecimento do código de conduta que se aplicava aos funcionários da Autora e sabia que o mesmo se lhe aplicava;
34) Os Réus BB e CC tinham conhecimento das restrições que eram aplicáveis ao Réu AA e comportaram-se, nos contactos com os superiores hierárquicos do Réu AA na Autora, de modo a que o seu relacionamento familiar permanecesse oculto, o que lograram (e este assim permaneceu até à saída do Réu AA da Autora);
35) Em 25.07.2013, o Réu CC – afirmando representar uma sociedade denominada “G...” – encomendou produtos à Autora através de email remetido para o endereço eletrónico pertencente ao departamento de encomendas da Autora, com o seguinte teor: “Somos uma empresa que opera no mercado nacional, fornecendo dispositivos e consumíveis a uma larga abrangência de clientes na área dos Lares de Repouso, Clínicas de Hemodiálise e Medicina no trabalho. Neste momento estamos a trabalhar com a K... no que se refere aos equipamentos de determinação de glicémia, mas estamos a procurar novas parcerias neste segmento. Gostaria de pedir uma proposta dos vossos produtos Accu Check Aviva 50T e respetivo Aparelho de diagnóstico, para promoção e venda direta aos nossos clientes. (…) A quantidade adquirida à K... no ano de 2012 foram 3.000 Embalagens (…)
– cfr. documento n.º 11 anexo à petição inicial, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido;
36) Por sua vez, o departamento de encomendas reencaminhou tal email para o departamento de concursos (cfr. documento n.º 11 anexo à petição inicial);
37) Só depois é que esse email foi remetido, internamente, ao GG, que o reencaminhou para o Réu AA (cfr. documento n.º 11 anexo à petição inicial;
38) O Réu AA, no exercício das suas funções, deu ordem ao departamento de concursos, que fosse respondido que o preço era de €10,00 + IVA para o produto Accu-Chek Aviva e de €20,00 + IVA para o respetivo aparelho Aviva, com oferta de 40 aparelhos pela compra de 300 embalagens de 50T (cfr. documento n.º 11 anexo à petição inicial);
39) O Réu AA não informou a sua chefia da sua relação familiar com o Réu CC;
40) O preço indicado pelo AA para o Accu-Chek Aviva 50T ser vendido ao CC era um preço habitual e recorrente praticado pela Autora para o tipo de clientes em que este afirmou incluir-se;
41) Tendo o departamento de concursos, através da colaboradora YY, respondido ao Réu CC, em 25.07.2013, informando-o do preço, tal como indicado pelo Réu AA (cf. documento n.º 1, anexo à contestação, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido);
42) Email esse acompanhado de uma lista de preços assinada por TT, Finance Diretor da Autora, e por ZZ, Sales Diretor da Autora, válida no ano de 2013 (cf. documento n.º 1, anexo à contestação, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido);
43) A área de negócios Diabetes Care Portugal tinha no Réu AA o responsável pela gestão dos principais clientes, entre os quais se incluíam as Rés B... e C...;
44) As diversas áreas de negócio a que o Grupo E... se dedica não têm uma estrutura de reporte que coincida necessariamente com as sociedades comerciais autónomas em que se acham integradas;
45) E é também por isso que os responsáveis máximos da área de negócios Diabetes Care em Portugal não reportam diretamente à gerência da Autora em Portugal, mas à estrutura de reporte Diabetes Care do Grupo E...;
46) Em termos práticos, a área de negócios Diabetes Care Portugal recorre aos serviços dos departamentos comercial, encomendas, qualidade, concursos, financeiro e logística da Autora para o desenvolvimento da sua atividade, mas sem que estes departamentos tenham qualquer competência ou poder para condicionar o que a área de negócios Diabetes Care Portugal, na sua autonomia, decidir;
47) Em 17.02.2014, Ré BB remeteu para o endereço de correio eletrónico do departamento de concursos da Autora, com cópia para o GG, Key Account Manager daquela, um e-mail no qual transmitiu o seguinte: “Vimos por este meio informar que devido a uma reestruturação da nossa empresa, a nossa Denominação Social e Objeto Social alterou-se, para o qual solicitamos a retificação no vosso sistema: Empresa Anterior G..., Lda Rua .... ... Nif: ...49 Nova Empresa: B..., S.A. Capital Social: 50.000€ Praça ..., ... ... Porto
(…) – cfr. documento n.º 12, anexo à petição inicial, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido;
48) Nesse mesmo email, a Ré BB, em representação da Ré B..., solicita que lhe seja enviada uma tabela de preços de todos os produtos Accu-Chek, assim como as condições comerciais que deveriam doravante ser praticadas com a Ré B...;
49) Em 24.02.2014, o Réu AA, enquanto Head of Market Access & Key Account Manager da Autora, depois do departamento de concursos informar que iria abrir o novo cliente, deu a seguinte ordem ao seu inferior hierárquico: “Podemos abrir o cliente com as condições anteriores: Pagamentos: Pronto Pagamento Condições: as mesmas consoante proposta em anexo! Enviar nova proposta atualizada! Mais afirmando que “Devemos fazer uma visita para reforçar a nossa parceria e avaliar novo potencial” – cfr- documento n.º 12 anexo à petição inicial;
50) Após a ordem dada pelo Réu AA quanto às condições comerciais a aplicar à Ré B..., foi o GG, Key Account Manager da Autora, que remeteu um email para os departamentos de concursos e de encomendas da Autora, com cópia para o Réu AA e para AAA, colaboradora da Autora, solicitando a abertura de novo cliente e o envio da tabela de preços para todos os produtos Accu-Chek, pedindo adicionalmente que fossem enviadas a tabela de preços e condições comerciais dos produtos referentes à diagnóstica;
51) A proposta com novas condições comerciais a aplicar pela Autora ao novo cliente Ré B..., válida para o ano de 2014, foi remetida à B... pela colaboradora da Autora, YY, através de email de 25.02.2014 (cfr. documento n.º 15, anexo à contestação);
52) E essa proposta, foi assinada pelo Finance Diretor da Autora, TT, e pela Sales Diretor da Autora, ZZ;
53) O Réu AA não informou a sua chefia de que constituíra a Ré B... menos de um mês antes de esta passar a ser cliente da Autora e de que era titular de 99,6 % do respetivo capital social;
54) O Réu AA também não pediu escusa das funções de gestão do relacionamento comercial entre a Autora e a Ré B...;
55) A Ré B... manteve uma relação comercial com a Autora que vigorou entre fevereiro de 2014 e fevereiro de 2018;
56) Entre 24.02.2014 e 31.12.2017, a margem alcançada pela Ré B... com a venda de todo o seu portfólio de produtos (incluindo os produtos da Autora) foi a seguinte:
- 2014: €546.085,12;
- 2015: €395.005,10;
- 2016: €5.144.229,73 e
- 2017: €4.828.876,04;
Total (2014 a 2017): €10.914.195,19;
57) Entre 24.02.2014 e 31.12.2017, a margem alcançada pela Ré B... com a venda de produtos exclusivamente da Autora foi a seguinte:
- 2014: €413.379,00;
- 2015: €788.546,00;
- 2016: €3.250.465,00; e
- 2017: €4.547.942,00.
Total (2014 a 2017): €9.027.332;
58) Consequentemente, a margem alcançada pela Ré B... com a venda de produtos da Autora representou, entre 2014 e 2017, 83% de toda a margem alcançada com a venda de todo o seu portfólio de produtos;
59) Entre 24.02.2014 e 31.12.2017, a Ré B... apresentou os seguintes resultados líquidos:
- 2014: €358.318,50;
- 2015: €53.102,31;
- 2016: €3.311.317,85; e
- 2017: €3.936.000,83.
Total (2014 a 2017): €7.661.739,49
60) O Réu AA consta, no Registo Central do Beneficiário Efetivo, identificado como o beneficiário efetivo da Ré numa proporção superior a 99% (cf. documento n.º 6 anexo à contestação, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido);
61) O Réu AA geriu, enquanto simultaneamente Head of Market Access & Key Account Manager da Autora e titular de 99,6% do capital social da Ré B..., uma relação contratual entre esta e a Autora que lhe permitiu beneficiar de uma margem correspondente a 83% dos resultados líquidos da Ré B... entre 2014 e 2017, o que ascendeu a €6.359.243,78;
62) Sem revelar à Autora que era titular de mais de 99% do capital da B..., nem se escusar a gerir a relação desta com aquela;
63) Em 09.04.2014, três meses após a constituição da Ré B... e cerca de dois meses e meio após a relação comercial entre esta e a Autora se ter iniciado –, a Ré BB constituiu a Ré C..., detendo a totalidade do respetivo capital social (cfr. documento n.º 9 anexo à petição inicial, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido);
64) A 11 de abril de 2014, dois dias após a constituição da Ré C..., o Réu CC, em representação da Ré C..., remeteu à Autora um e-mail com o seguinte teor:
“Exmºs Senhores; Gostaríamos de obter preços para aquisição de produtos Accu Check Aviva, Accu Check Performa, Accu Check Sensor e também para Lancetas. Quantidade média de compra mensal – 3000 Embalagens Destino – África (…) – cfr. documento 18, anexo à petição inicial, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido;
65) A 17 de abril de 2014, o Réu AA, enquanto Head of Market Access & Key Account Manager da Autora, acedeu a que aquela passasse adquirir produtos à Autora, determinando o respetivo preço (cfr. documento 18, anexo à petição inicial);
66) O Réu AA não informou a sua chefia de que o Réu CC era seu cunhado, nem que a totalidade do capital social da Ré C... pertencia à sua irmã, Ré BB;
67) O Réu AA também não pediu escusa das funções de gestão do relacionamento comercial entre a Autora e a Ré C...;
68) A Ré C... manteve uma relação comercial com a Autora que vigorou entre abril de 2014 e fevereiro de 2018;
69) Entre 17 de fevereiro de 2014 e fevereiro de 2018, a Autora vendeu a clientes não finais, i.e., que procederiam à revenda do Accu-Chek Aviva 50T, um total de 3.356.503 embalagens;
70) Do referido total, 2.039.939 embalagens de Accu-Chek Aviva 50T foram vendidas pela Autora ao preço médio de €16,34;
71) E 1.316.564 embalagens de Accu-Chek Aviva 50T foram vendidas a €10,00 ou €9,00;
72) Estas 1.316.564 embalagens de Accu-Chek Aviva 50T foram vendidas à Ré B... e à Ré C...;
73) Das quais 1.083.681 embalagens de Accu-Chek Aviva 50T foram vendidas pela Autora à Ré B...;
74) E 232.883 embalagens de Accu-Chek Aviva 50T foram vendidas pela Autora à Ré C...;
75) Tendo adquirido mais de um milhão de embalagens de Accu-Chek Aviva 50T a €10,00 ou €9,00, a Ré B..., revendeu-as integralmente na Europa por um preço próximo daquele a que a Autora vendeu o Accu-Chek Aviva 50T a todos as outras entidades que lhe adquiriam o referido produto para revenda;
76) A C... replicou, de forma semelhante, o comportamento da Ré B... acima descrito;
77) Isto é, tendo adquirido mais de duas centenas de milhar de embalagens de Accu-Chek Aviva 50T a €10,00 ou €9,00, aqueles Réus, a C..., revendeu-as integralmente à B..., que as revendeu com destino à Europa por um preço próximo daquele a que a Autora vendeu o Accu-Chek Aviva 50T a todos as outras entidades que lhe adquiriam o referido produto para revenda;
78) A Autora apenas concedeu à Ré B... e à Ré C... aquele preço porque o Réu AA, com o contributo dos Réus CC e BB, a manteve convencida de que as embalagens de Accu-Chek Aviva 50T, vendidas a €10,00 numa primeira fase e a €9,00 numa segunda fase, se destinavam exclusivamente aos mercados africanos e que era aquele preço o possível de praticar em tais mercados;
79) Foi sempre assim que o Réu AA, enquanto desempenhou funções de Head of Market Access & Key Account Manager da Autora e em inúmeras comunicações trocadas, também com os Réus CC e BB, descreveu a finalidade das vendas do Accu-Chek Aviva 50T à Ré B... e à Ré C...;
80) Em 16.12.2016, o Réu AA cessou a sua colaboração na Autora;
81) Poucos meses depois, já a exercer funções na B..., passou a sustentar que, afinal, a Ré B... beneficiava de um preço de €9,00 para revenda do Accu-Chek Aviva 50T em qualquer mercado e que nunca estivera obrigada a exportar aquele produto para os mercados angolano e moçambicano;
82) Esta nova tese contrariava toda a correspondência trocada entre fevereiro de 2014 e dezembro de 2016 e determinou que a Autora suspendesse, ainda no primeiro semestre de 2017, as vendas de Accu-Chek Aviva 50T à Ré B... até que esta comprovasse que tal produto, então vendido a €9,00, estava a ser revendido nos mercados africanos;
83) Tal comprovação nunca chegou, a suspensão de fornecimentos não foi levantada e a própria Ré B... acabou por pôr termo à relação comercial, propondo de seguida uma ação judicial com um avultado pedido indemnizatório;
84) Simultaneamente, a Autora também suspendeu fornecimentos à Ré C..., que não tornaram a ser reatados;
85) No início, as Rés B... e C... começaram a adquirir Accu-Chek Aviva 50T à E... de uma forma incipiente;
86) E assim, embora ainda em reduzidas quantidades, os Réus AA, CC e BB, através da B... e C..., lograram superar o primeiro desafio: começar a comprar à Autora Accu-Chek Aviva 50T e fazê-lo a um preço que lhes conferia uma elevada margem de lucro;
87) O nível de incipiência de tais aquisições, apesar de ter funcionado daquela vez, dificilmente poderia replicar-se muitas vezes e seguramente não poderia ser escalada para quantidades relevantes de produto;
88) No primeiro contacto, o Réu CC alegou representar uma sociedade denominada “G...”, que nunca existiu;
89) Quando fez a compra indicou, para efeitos de faturação, o seu NIF pessoal e o seu domicílio pessoal;
90) Depois dessa primeira aquisição, o desafio que se colocava aos Réus AA, CC e BB, através das sociedades Rés, passava por replicar os fornecimentos e, em segundo lugar, aumentar as quantidades;
91) Para isso o Réu AA constituiu a Ré B... e, com o auxílio dos Réus BB e CC, levou a que aquela iniciasse relações comerciais com a Autora;
92) Para isso, também a Ré BB constitui a Ré C... e, com o auxílio dos Réus AA e CC, levou a que aquela iniciasse relações comerciais com a Autora;
93) A Autora sentiu a necessidade de se expandir para outros mercados, tendo o mercado angolano surgido como alvo apetecível;
94) O Réu AA tinha conhecimento da referida necessidade de expansão;
95) Em inícios de 2013, FF, superior hierárquico do Réu AA, pediu à sua equipa na Autora, – na qual se integrava o Réu AA – que desenvolvesse uma abordagem para a implantação bem-sucedida do produto E... no mercado angolano;
96) Esse estudo tinha por finalidade analisar o potencial desse mercado e a viabilidade de um investimento comercial mais significativo no mesmo;
97) O que veio na sequência de contactos exploratórios de tal mercado realizados pelo FF em 2012 (cfr. documento n.º 21, anexo à petição inicial);
98) Em resposta a um email de BBB, aludindo a uma prévia reunião, o FF refere que a Autora tinha muito interesse em explorar esse mercado, logo sugerindo datas para a realização da pretendida reunião, a qual, efetivamente, se veio a realizar no dia 28.03.2012 (cfr. documento n.º 21, anexo à petição inicial);
99) O Réu AA tornou-se, a partir de 2013, após viagens realizadas ao território e vários contactos com potenciais parceiros, o funcionário da Autora com maior conhecimento do mercado angolano;
100) A Autora, designadamente o seu então “Country Manager”, FF, via no Réu AA um funcionário promissor e, em 2013, promoveu-o a Head of Market Access & Key Account Manager, posição que incluía, precisamente, o acesso a novos mercados;
101) Ainda em 2013 e já no exercício das suas novas funções como Head of Market Access & Key Account Manager, o Réu AA apresentou à sua equipa na Autora uma análise do mercado angolano, que elaborou, em que descrevia como tendo “grande potencial” e uma “alta rentabilidade” (cfr. documento n.º 24, anexo à petição inicial, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido);
102) Na elaboração dessa análise colaborou o EE, que havia sido funcionário da R..., o qual recorreu a dados de um estudo feito pela R... sobre o mercado angolano,
103) Indicando então o AA, na análise a que se alude no facto 101º, como potenciais parceiros na abordagem a tal mercado a H... e a I..., que acabaram por ser os escolhidos (cfr. pág. 27 do documento n.º 24, anexo à petição inicial);
104) Como aquelas parcerias não deram resultado, o Réu AA acabaria por transmitir ao seu superior hierárquico na Autora, FF, no final de 2013, que havia necessidade de serem encontrados outros parceiros, tendo efetuado contactos para tal;
105) Em fevereiro de 2014, o Réu AA apresentou à Autora um plano revisto para aumentar as vendas desta em Angola (cfr. documento n.º 26, anexo à petição inicial, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido);
106) Afirmava então o Réu AA que a faturação da Autora poderia aumentar em mais de um milhão de francos suíços (ou seja, efetuando o câmbio, €883.988,02), em três anos, em Angola;
107) O que, segundo o Réu AA, só poderia ser feito contratando parceiros com base portuguesa, mas presença local em Angola (cfr. documento n.º 26, anexo à petição inicial,);
108) O Réu AA acabaria por conseguir convencer o seu superior hierárquico – FF – de que, não só o preço de €10,00 por embalagem de Accu-Chek Aviva 50T era o preço possível de praticar numa exportação para tal mercado;
109) Como que a Ré B... era o parceiro ideal da Autora para o mercado angolano;
110) FF aceitou que a Ré B... tivesse acesso a Accu-Chek Aviva 50T, para revenda, ao preço de €10,00, por embalagem na condição de que o mesmo fosse destinado ao mercado angolano;
111) O Réu AA logrou – através da interposição da Ré B... entre o próprio e a Autora e com a colaboração dos Réus CC e BB – garantir o Accu-Chek Aviva 50T a um preço e numas quantidades que lhe permitiam auferir um provento elevado;
112) A Ré BB, à data simultaneamente administradora única da Ré B... e titular da totalidade do capital social da Ré C..., também conseguiu garantir o Accu-Chek Aviva 50T a um preço e numas quantidades que lhe permitiam auferir um provento elevado;
113) A Autora nunca teria iniciado relações comerciais com Ré B... se o Réu AA tivesse sido transparente no que concerne às suas relações familiares com os restantes Réus e à sua posição acionista na Ré B...;
114) Sabedor de que a Autora apenas aprovara à Ré B... o preço de €10,00 por embalagem de Accu-Chek Aviva 50T para venda no mercado angolano, o Réu CC expressamente declarou, no referido email de 11.04.2014, que o destino de tal produto seria África;
115) Com base nos pressupostos (venda em Angola) que determinaram que a Ré B... tivesse acesso a Accu-Chek Aviva 50T, para revenda, ao preço de €10,00 por embalagem, o Réu AA, atuando enquanto Head of Market Access & Key Account Manager da Autora, acedeu a que a Ré C... começasse igualmente a adquirir tal produto à Autora, àquele preço, para aquele território;
116) Deste modo, a Ré BB logrou, por intermédio da Ré C..., garantir o Accu-Chek Aviva 50T a um preço e numas quantidades que também lhe permitiam auferir um provento elevado, sobretudo tendo em conta que era ao Réu AA, enquanto Head of Market Access & Key Account Manager da Autora, que cabia gerir a relação desta com a Ré C...;
117) Num contexto muito especial, só percetível por quem – como os Réus AA, BB e CC – conhecia (e podia condicionar) a estratégia da Autora, o Réu AA conseguiu aumentar ainda mais as quantidades de Accu-Chek Aviva 50T que já adquiria à Autora por intermédio da Ré B... e, ainda, reduzir o preço a que o adquiria;
118) Em 4.11.2015, a Ré BB e o Réu AA trocaram e-mails relativos à participação da Autora, juntamente com a Ré B..., num congresso sobre diabetes que se realizaria no início do ano seguinte em Luanda, tudo com o objetivo de “incrementar” a posição da Autora no mercado e “posicioná-la como líder no mercado” (cfr. documento n.º 27, anexo à petição inicial, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido);
119) Nesses e-mails, o Réu AA solicita ao seu superior hierárquico autorização para que a Autora financiasse as iniciativas da Ré B... em Angola para promoção do produto da Autora, num montante que então ascendia a €53.222,10;
120) Apesar da Autora ter marcado presença no congresso da Ordem dos Médicos de Angola referido no email, através da Dra. LL (endocrinologista), que foi palestrante da E..., a Ré BB e o Réu AA conjugaram esforços para enganar a Autora, uma vez que ambos sabiam que a Ré B... não estava a comportar-se de modo a “incrementar” a posição da Autora no mercado e “posicioná-la como líder no mercado”;
121) No início de 2016, FF (superior hierárquico do Réu AA) anunciou a partida para uma nova função na sede da E..., em ..., tendo ocorrido nesse ano uma transição para uma nova liderança;
122) O Réu AA alinhava-se como um sólido candidato ao lugar que iria ser deixado vago por aquele;
123) Neste ínterim, o Réu AA promoveu internamente na Autora que a Ré B... deveria beneficiar do exclusivo de distribuição de produtos E... nos mercados angolano e moçambicano e, além do mais, que o Accu-Chek Aviva 50T deveria passar a ser-lhe vendido ao preço de €9,00 (em vez de €10,00);
124) O primeiro argumento usado pelo Réu AA foi o de que a Ré B... estaria a distribuir produtos “diabetes care” da J..., concorrente da E..., em Angola (cfr. documento n.º 28, anexo à petição inicial, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido);
125) O segundo argumento usado pelo Réu AA foi o de que a J... iria deixar o mercado angolano (cfr. documento n.º 28, anexo à petição inicial);
126) O terceiro argumento usado pelo Réu AA foi o de que a J... deixaria uma quota de mercado de quatro milhões de euros (por referência ao ano de 2015);
127) O quarto e último argumento usado pelo Réu AA foi o de que a Ré B... estaria disponível para se vincular exclusivamente à Autora, para distribuição dos produtos desta em Angola, sem prejuízo de haver o risco de poder vincular-se a um concorrente da Autora, caso esta não atuasse rapidamente (cfr. documento n.º 28, anexo à petição inicial);
128) Perante o apelativo quadro descrito pelo Réu AA, no dia 21.03.2016, a Autora, como primeira contraente, celebrou com a Ré B..., como segunda contraente, tendo esta sido representada pelo Réu CC em todo o processo negocial e na própria outorga do mesmo – um contrato de distribuição acordando baixar o preço unitário do Accu-Chek Aviva 50T de €10,00 para €9,00 e garantir um fluxo de produto à Ré B... de €5.000.000,00 (cfr. documento n.º 30, anexo à petição inicial, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido);
129) Segundo a cláusula primeira “O presente contrato regula os termos e condições do fornecimento ao 2º contraente de produtos comercializados pela E... (doravante “Produtos”) em todo o território de Angola e Moçambique (doravante “Contrato”);
130) É o seguinte do teor da cláusula segunda desse Contrato de Distribuição: “1. O 2.º Contraente será o distribuidor exclusivo da gama de produtos Accu Chek para o território angolano e moçambicano, assegurando a sua venda às instituições de saúde, a grossistas/armazenistas ou quaisquer distribuidores, bem como às farmácias e instituições de saúde; 2. Durante a vigência do presente Contrato, o 2.º Contraente não poderá importar, promover, distribuir ou vender no território angolano e moçambicano, direta ou indiretamente, quaisquer outros medidores de glicemia, ou produtos equivalentes ou com o mesmo fim, que não pertençam à gama Accu Chek ou a outra que a 1.ª Contraente lhe indique. 3. Durante a vigência do presente Contrato, o 1º Contraente não poderá exportar, promover, distribuir ou vender no território angolano e moçambicano, direta ou indiretamente, a quaisquer outros distribuidores, armazenistas, farmácias ou instituições de saúde a gama Accu Check sem ser por intermédio do 2º contraente. 4. As partes reconhecem e aceitam que a exclusividade é um pressuposto essencial do presente Contrato e que a sua violação constituirá causa de resolução do mesmo, daí resultando para a parte faltosa o dever de assumir todas as responsabilidades e prejuízos que essa violação causar à parte penalizada.”
131) A cláusula vigésima do Contrato de Distribuição tem o seguinte teor: “1. O 2º Contraente fica obrigado no ano de 2016 a comprar ao 1º Contraente o valor total de cinco milhões de euros (5.000.000€) no total de referências Accu Check disponíveis neste contrato. 2. Nos anos seguintes o valor de o valor de objetivo mínimo de compra deverá ser sempre superior ao objetivo do ano anterior, tendo como base de incremento o valor de crescimento de marcado nos mercados negociados, assim como a taxa de inflação destes mesmos mercados. 3. Esta proposta de objetivos deve ser apresentada pelo 2º Contraente no mês de novembro de cada ano comercial, e aprovado nos 15 dias seguintes pelo 1º Contraente, sem prejuízo do cumprimento da alínea 2.”
132) Segundo a cláusula vigésima terceira o Contrato vigoraria pelo período de 4 anos, sendo automaticamente renovado por períodos de um ano, caso não fosse denunciado por qualquer das partes com a antecedência mínima de cento e vinte dias;
133) O anexo I a tal Contrato inclui a tabela de preços, os produtos e o preço, sem IVA, estando aí indicado que o Accu Check Aviva 50T tinha o preço de €9,00 e que na compra de 2000 embalagens seriam oferecidos 50 aparelhos Accu Check Aviva;
134) Por via da celebração do Contrato de Distribuição, a Autora conferiu à Ré B... o direito de ser esta a única entidade a distribuir os produtos em Angola e Moçambique, não podendo, em contrapartida, comercializar em tais mercados, sublinhe-se, quaisquer outros produtos concorrentes com aqueles;
135) Assim, a B... logrou garantir o Accu-Chek Aviva 50T à B... a um preço ainda mais reduzido e ainda em maiores quantidades;
136) O próprio Réu CC, agora representando a Ré C..., remeteu à Autora, em 8.08.2016, pelas 11h06m um e-mail com o seguinte teor: “Bom dia Caro Dr. AA, Espero que se encontre bem. Como sabe, todos os nossos produtos Accu-Check se destinam ao mercado Angolano. No entanto, temos sentido alguma dificuldade nos últimos tempos na colocação dos produtos Accu-Check Aviva, uma vez que os nossos clientes referem que há players a vender com preços mais baixos, nomeadamente tivemos conhecimento que a E... está a vender o produto a 9€/unidade a outros players! Há alguma coisa que possamos fazer, no sentido de renegociarmos o preço? Aguardamos o vosso feedback (…) –cfr. documento n.º 31, anexo à petição inicial, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido);
137) Algo a que o Réu AA, enquanto Head of Market Access & Key Account Manager da Autora, acedeu no próprio dia 8 de agosto, pelas 11h38m (cfr. documento n.º 31, anexo à petição inicial);
138) Tudo para venda, exclusivamente, nos mercados angolano e moçambicano, como aliás resulta expressamente do clausulado do Contrato de Distribuição Exclusiva celebrado entre a Autora e a Ré B... e como decorre das comunicações trocadas entre a Autora e a Ré C...;
139) Território de exportação dos produtos que a Autora sempre procurou garantir;
140) Era ao Réu AA, enquanto Head of Market Access & Key Account Manager da Autora, a quem cabia a tarefa de fiscalizar o cumprimento do acordado com a Ré B... e com a Ré C...;
141) Mas este, com a colaboração dos Réus CC e BB, enganou a Autora, levando-a a crer que as Rés B... e C... estavam a cumprir o que fora acordado, quando faziam exatamente o oposto;
142) O Réu AA, entre 2014 e 2016, enquanto Head of Market Access & Key Account Manager da Autora, sempre garantiu que o Accu-Chek Aviva 50T vendido à Ré B... e à Ré C... estava a ser exportado para os mercados africanos, onde a Autora estaria a conseguir uma forte implementação, fruto do trabalho das referidas Rés;
143) Designadamente, em 29.05.2015, o Réu AA, num e-mail dirigido ao seu superior hierárquico na Autora, afirmou ter reunido com a Ré B... e com a Ré C..., visto todos os documentos que provariam que o produto E... vendido às referidas Rés (Accu-Chek Aviva 50T) chegara a Angola. Mais ainda, afirmou ter visto os documentos que provariam que a Ré B... se encontrava a vender grandes quantidades de produto J... em Angola (12.000 embalagens no mês anterior ao do e-mail). Afiançou, por fim, que tendo o produto chegado a Angola e Moçambique, seria economicamente inviável reexportá-lo para a Europa. Concluiu, pois, que a Ré B... e a Ré C... não se encontravam a exportar Accu-Chek Aviva 50T para a Europa (cfr. documento n.º 32, anexo à petição inicial, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido);
144) O Réu AA transmitiu informações falsas ao seu superior hierárquico na Autora, uma vez que nenhuma embalagem de Accu-Chek Aviva 50T foi vendida pelas Rés B... e C... para Angola e, consequentemente, aquele não vira qualquer documento que demonstrasse tal exportação;
145) Em 09.11.2015, o Réu AA questionado se a Ré C... e a Ré B... tinham atividade no território nacional ou se eram destinados à distribuição noutros territórios”, num e-mail enviado a um consultor externo que procedia então a uma análise do canal de vendas da Autora, confirmou que a Ré B... e a Ré C... eram os parceiros de exportação daquela para os Palop’s e reafirmou ter toda a documentação relativa a tais exportações (cfr. documento n.º 33, anexo à petição inicial, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
146) O Réu AA, novamente, transmitiu informações falsas a um consultor externo da Autora, uma vez que nenhuma embalagem de Accu-Chek Aviva 50T foi vendida para Angola, tendo, pelo contrário, todas sido vendidas na Europa e, consequentemente, aquele não vira qualquer documento que demonstrasse a exportação para os Palop’s;
147) Em 8.02.2016, o Réu AA – regressado do congresso sobre diabetes realizado em Angola – transmitiu ao seu superior hierárquico na Autora, FF, que estivera juntamente com comerciais da Ré B... a promover o produto em Luanda, que o “feedback” fora muito bom, tendo o stand dos produtos E... recebido uma procura “massiva”. Mais acrescentou que a saída da J... do mercado daria à Autora a possibilidade de “canibalizar” a quota daquela concorrente, garantindo uma relação de exclusividade com a Ré B.... Referiu ainda ter reunido com o ministro da saúde angolano, que teria considerado a estratégia de investimento da Autora no país “muito interessante” (cfr. documento n.º 28, anexo à petição inicial, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido);
148) Novamente, o facto de a Ré B... não ter vendido uma única embalagem de Accu-Chek Aviva 50T em Angola demonstra que, mais uma vez, o Réu AA enganou a Autora para salvaguardar os proveitos auferidos por si e pelos Réus CC e BB;
149) Em 25.04.2016, o Réu AA, numa apresentação feita a MM, em Barcelona, afirmou que:
(i) “[A]s vendas da Autora estavam acima do objetivo devido às vendas nos Palop’s”;
(ii) Os Palop’s eram “um mercado desafiante, com um elevado e ainda por explorar potencial”;
(iii) Os objetivos de vendas em tais mercados seriam de €4 milhões em 2016 (com possibilidade de uma variação positiva de 25%), um crescimento de 147% face ao ano de 2015 (cerca de €2.750.000), que já representara um crescimento de 217% face ao ano de 2014 (cerca de €1.250.000).
O ano de 2013, anterior à relação Autora-Ré B.../Ré C..., foi descrito pelo Réu AA como tendo vendas marginais, bastante longe, sequer, dos €500.000,00; (cfr. documento n.º 29, pág. 40, anexo à petição inicial, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido);
150) Na página 6 dessa apresentação refere-se que o mercado dos Palop’s tinha um potencial de €9 milhões de euros;
151) Na página 21 dessa apresentação:
a) É feita referência ao objetivo de vendas da Autora que se encontrava previsto para aquela altura (abril de 2016) - €4.440.999;
b) Refere-se, assinalando com um asterisco, que esse objetivo incluía, no seu cálculo, uma previsão de faturação através de exportação paralela de 2,1 milhões de euros;
c) Ou seja, a previsão de faturação paralela equivalia quase a 50% do objetivo de vendas para essa altura, o que demonstra que tinha um grande peso nos números da Autora e que era dela bem conhecido;
d) Refere também que, naquela data, a exportação paralela estava €711.095,00 abaixo da previsão;
152) MM era, à data da referida apresentação, “Head of EMEA & LATAM Diabetes Care”, isto é, o responsável máximo do Grupo E... no setor de “diabetes care” para a Europa, Médio Oriente, África e América Latina;
153) O Réu AA, uma vez mais, transmitiu informações falsas, desta feita ao mais alto nível da estrutura do Grupo E..., uma vez que a Ré B... e a Ré C... não venderam qualquer embalagem de Accu-Chek Aviva 50T nos Palop’s;
154) O Réu AA, adicionalmente, continuou a transmitir à Autora que os mercados dos Palop’s tinham elevado potencial;
155) Em 14.06.2016, o Réu AA, num e-mail dirigido ao seu superior hierárquico na Autora, relativo aos objetivos de vendas para esse ano, asseverou que os mercados dos Palop’s aportariam €5.476.442 aos objetivos anuais de vendas da Autora (cfr. documento n.º 34, anexo à petição inicial, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido);
156) O Réu AA, novamente, procurou convencer a Autora do potencial dos mercados de Angola e Moçambique e da importância de continuar a fornecer à Ré B... e à Ré C... o Accu-Chek Aviva 50T ao preço de €9,00;
157) Na segunda metade de 2016 a sucessão de FF na Autora ocorreu efetivamente, mas o Réu AA foi preterido em favor de HH – natural do ... e previamente quadro da subsidiária do Grupo E... naquele país –, que foi colocado em Portugal pela primeira vez;
158) HH, no normal estudo de dossiers de um novo cargo, num novo país, interessou-se pela temática da relação Autora-Ré B... e pelas grandes quantidades de Accu-Chek Aviva 50T que estavam a ser vendidas ao preço de €9,00;
159) HH, porque pressionado superiormente, pediu ao Réu AA, em 24.11.2016, para que este obtivesse da Ré B... e lhe entregasse os documentos que comprovavam que estas estavam efetivamente a exportar o Accu-Chek Aviva 50T, adquirido a €9,00, para Angola e Moçambique (cfr. documento n.º 35, anexo à petição inicial);
160) Em 24.11.2016, o Réu AA remeteu um e-mail à Ré B..., copiando HH, com o seguinte teor: “Boa Tarde Dr. CC, Como vai? Gostaria de solicitar a sua ajuda na seguinte questão: Estamos mais uma vez a avaliar a questão da Exportação Paralela (produtos portugueses encontrados na europa), e gostaríamos de ter os documentos (DU’s) da exportação para os Palop’s dos produtos Accu Chek da B.... Precisamos desta informação com urgência, até amanhã ao final da tarde. Consegue-nos ajudar?”
(cfr. documento n.º 36, anexo à petição inicial, cujo teor se dá aqui por integramente reproduzido);
161) Antes de remeter o email, o Réu AA reiterou que sabia que o produto estava a ser exportado para Angola, tendo assim transmitido informações falsas ao seu superior hierárquico na Autora, uma vez que nenhuma embalagem de Accu-Chek Aviva 50T foi vendida para Angola;
162) A Ré B... forneceu à Autora, em 25.11.2016, dois documentos, um dos quais uma fatura representando centenas de milhares de euros de Accu-Chek Aviva 50T exportados para Angola (cfr. documentos nos 36 e 37, anexos à petição inicial),
163) A Autora veio, bastante mais tarde, a ter elementos que confirmam que os dois documentos referidos no facto anterior não representavam qualquer venda real feita pela Ré B... em Angola, motivo pelo qual (entre outras questões) apresentou denúncia criminal contra os seus autores (cfr. documento n.º 38, anexo à petição inicial);
164) Naquele contexto de pressão crescente para a disponibilização de documentos comprovativos das exportações para Angola e Moçambique, o Réu AA cessou voluntariamente a sua relação laboral com a Autora no dia 16.12.2016 (cfr. documento n.º 39, anexo à petição inicial, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido);
165) Não sem antes, em 5.12.2016, o Réu AA (ainda enquanto Head of Market Access & Key Account Manager da Autora) ter remetido um e-mail à Ré B... (então representada pelo seu cunhado, o Réu CC, que também representava a Ré C...), copiando HH, negociando um crescimento (entre 7 e 10 %) de quantidades vendidas para exportação para Angola e Moçambique (apesar de o objetivo de 2016 já se cifrar em €5.000.000,00) – cfr. documento n.º 40, anexo à petição inicial, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido;
166) O Réu AA, uma última vez, procurou transmitir à Autora que os mercados dos Palop’s tinham elevado potencial e que a Ré B... estava a desenvolvê-los com os produtos que adquiria àquela;
167) O Réu CC respondeu por e-mail de 6.12.2016, referindo que “um aumento de 7% no mercado atual Angolano já [era] muito desafiante. Contudo, a questão de equacionarmos um aumento para 10% estamos também a assumir um aumento de 10% nos nossos débitos, o que neste momento já está caótico do ponto de vista financeiro face à falta de divisas. A última fatura que recebemos de Angola é de Março 2016, e, temos um delay em cash flow de 9 meses neste momento, o que só no caso dos produtos E... são aproximadamente 4,7 milhões de dólares” (cfr. documento n.º 40, anexo à petição inicial, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido);
168) O Réu CC, coordenado com o Réu AA, quis enganar a Autora e convencê-la de que em 2016 vendera produtos E... em Angola, nos nove meses precedentes, de aproximadamente 4,7 milhões de dólares, tudo enquanto sabiam que nem uma única embalagem de Accu-Chek Aviva 50T ali haviam vendido;
169) Finda a relação profissional com a Autora, o Réu AA passou imediatamente a exercer funções na B...;
170) Tendo, posteriormente, sido designado presidente do conselho de administração a partir de 22.05.2017;
171) Apesar desta mudança inesperada – e numa altura em que a Autora desconhecia que o Réu AA era o titular de mais de 99% do capital social da Ré B... –, a posição da Autora manteve-se: queria que a Ré B... lhe mostrasse evidências de que o Accu-Chek Aviva 50T estava efetivamente a entrar nos mercados angolano e moçambicano (cfr. documento n.º 41, anexo à petição inicial);
172) Momento a partir do qual o Réu CC e o Réu AA passaram a afirmar – contrariando tudo o que outrora disseram enquanto administrador da Ré B... e representante da Ré C..., aquele, Head of Market Access & Key Account Manager da Autora, este – que a Ré B... teria direito a adquirir o Accu-Chek Aviva 50T, ao preço de €9,00 por embalagem, independentemente do mercado a que se destinasse;
173) A Autora, ainda no primeiro semestre de 2017, suspendeu os fornecimentos de Accu-Chek Aviva 50T, ao preço de €9,00 por embalagem, às Rés B... e C..., que não mais foram retomados;
174) Em 9.02.2018, a Ré B... resolveu o Contrato de Distribuição Exclusiva (cfr. documentos n.ºs 61 e 62, anexos à petição inicial);
175) A relação comercial entre a Autora e a C..., não formalizada em qualquer contrato escrito, foi simplesmente cessada, sem qualquer formalização, sensivelmente na mesma data;
176) Em 14.08.2018, a Ré B... propôs uma ação contra a Autora por incumprimento contratual, pedindo uma indemnização de mais de vinte milhões de euros (a “Ação B...”);
177) Tal ação corre termos no J15 do Juízo Central Cível de Lisboa, sob o n.º 14636/18.0T8SNT, com julgamento agendado;
178) Com a propositura da ação, a B..., chamou toda a atenção para a relação comercial da Ré B... com a Autora e, muito concretamente, para o papel que o AA teve na mesma;
179) A B... juntou, com a petição inicial, tamanho acervo contabilístico que a Autora pôde perceber que, contrariamente ao que os Réus CC e BB e o Réu AA afirmaram, este enquanto Head of Market Access & Key Account Manager da Autora, nenhuma embalagem de Accu-Chek Aviva 50T foi vendida nos Palop’s, tendo, ao invés, toda a quantidade adquirida sido revendida na Europa;
180) Foi ainda na sequência da propositura dessa ação e em data não concretamente apurada, que a Autora percebeu que o Réu AA foi o acionista maioritário da Ré B... desde a sua constituição em 30.01.2014 até 04.10.2018, data em que transferiu a sua participação social na Ré B... para a F... SGPS, cujo capital social pertence ao Réu AA à razão de 99,9 % (cfr. documentos n.ºs 2 a 6, anexos à petição inicial);
181) Nessa altura, tornou-se óbvio para a Autora que os Réus AA, CC e BB montaram uma operação de enriquecimento pessoal que se traduziu no seguinte: adquiriam, por intermédio das Rés B... e C..., à Autora Accu-Chek Aviva 50T a preço de mercado africano e revendiam-no, todo, na Europa ao preço –mais elevado – pago neste;
182) Tudo enquanto o Réu AA, no desempenho das suas funções de Head of Market Access & Key Account Manager da Autora, e os Réus BB e CC, sucessivamente representantes das Ré B... e C..., convenciam a Autora de que as Rés B... e C... se encontravam a vender, com elevado sucesso, em Angola e Moçambique;
183) A Autora foi mantida enganada por ação dos Réus AA, CC e BB e que estes instrumentalizaram as Rés B... e C... para conseguir tal engano;
184) O Grupo E... – materializado pela pluralidade das suas subsidiárias, entre as quais se conta a Autora – tem uma posição consolidada e estabilizada no mercado europeu no segmento “diabetes care”;
185) A natureza do produto vendido e em causa nos presentes autos (“tiras de teste”, utilizáveis num medidor eletrónico específico a cada marca) torna pouco flexível a procura do consumidor final;
186) Isto é, cada consumidor final comprará as “tiras de teste” específicas do seu aparelho, para uso diário, mudando de tipo e marca de aparelho de medição muito menos frequentemente do que adquire os consumíveis para o mesmo;
187) Em 2014 e 2016, nos mercados africanos de língua oficial portuguesa como Angola e Moçambique, o Grupo E... e, em particular, a Autora não tinham uma posição consolidada e estabilizada, havendo de praticar uma política de preço distinta para ali poder garantir uma parte do mercado;
188) Adicionalmente, era estrategicamente importante para a Autora, crescer nos mercados africanos de língua oficial portuguesa (especialmente, pela sua dimensão e, então, prosperidade, Angola), países com economias emergentes e que poderiam aportar um volume de faturação importante;
189) Na Ação B..., a Ré B... alegou e juntou prova de que as suas vendas para os mercados angolano e moçambicano foram sempre residuais e nunca se aproximaram do objetivo de vendas previsto na Cláusula Vigésima do Contrato de Distribuição Exclusiva;
190) Na Ação B..., a Ré B... também juntou prova de que todas as embalagens de Accu-Chek Aviva 50T que adquiriu à Autora foram revendidas na Europa;
191) Todas as embalagens de Accu-Chek Aviva 50T que a Ré C... adquiriu à Autora foram igualmente revendidas na Europa, através da B...;
192) O Grupo E...– no somatório materializado pela pluralidade das suas subsidiárias, entre as quais se contam a Autora e as subsidiárias de cada país para o qual os Réus exportaram as quantidades de produto destinado para África – deixou de poder auferir os correspondentes lucros referentes à parte da margem que auferiria no mercado europeu, uma vez que as vendas que no mesmo aquele faria, por intermédio da Autora ou das outras subsidiárias a atuar preferencialmente nos países europeus em que a Ré B... e a Ré C... venderam o Accu-Chek Aviva 50T, foram parcialmente substituídas por produto revendido pelas Ré B... e C..., previamente adquirido à Autora a um preço significativamente mais reduzido (€10/€9) do que aquele que seria cobrado a qualquer outro revendedor a operar em tal mercado (€16,34); (facto ora alterado)
193) Tendo a Autora e as subsidiárias do Grupo E... a atuar preferencialmente em cada país para o qual os Réus exportaram as quantidades de produto destinado para África, deixado de poder auferir, devido à referida conduta dos Réus, parte da margem que aufeririam no mercado europeu; (facto ora alterado).
194) O mercado europeu já era coberto pelas várias subsidiárias do Grupo E... a atuar em cada país, não carecendo do trabalho da Ré B... e, sobretudo, não carecendo do trabalho da Ré B...;
195) A posição do Grupo E... no mercado europeu permite às respetivas subsidiárias a atuar em cada país para onde a B... exportou, praticar preços bastante mais elevados do que os que praticaria nos mercados angolano e moçambicano, onde não tem posição equiparável;
196) Estes preços de €10,00 e €9,00 por embalagem são inferiores àqueles que a Autora e as suas congéneres a atuar nos países para os quais a Ré B..., e através desta, a Ré C..., exportaram poderiam auferir;
197) A Ré B... acabou por revender na Europa, por valores compreendidos entre os €15,50 e os €17,00, 743.291 embalagens de Accu-Chek Aviva 50T que adquirira à Autora na vigência do Contrato de Distribuição Exclusiva, por €9,00;
198) Entre 2014 e o início do período de vigência do Contrato de Distribuição Exclusiva (em que a embalagem de Accu-Chek Aviva 50T foi adquirida à Autora pelo preço de €10,00), a Ré B... adquiriu 1.083.681 embalagens de Accu-Chek Aviva 50T;
199) O Réu AA (como beneficiário efetivo da Ré B...) fez assim sua, enganando o Grupo E... – nele incluindo a Autora, as congéneres desta, até ao mais alto representante do referido grupo –, por intermédio da Ré B... e com o auxílio dos Réus BB e CC, a diferença entre os €10,00 ou €9,00 a que a Ré B..., sucessivamente, adquiriu à Autora cada embalagem de Accu-Chek Aviva 50T e o montante entre os €15,50 e os €17,00 a que revendeu tal produto na Europa;
200) Estava ao alcance da E..., com subsidiárias em cada um dos países para os quais os Réus revenderam, fazer estas vendas entre os €15,50 e os €17,00 no mercado europeu sem ter de oferecer à Ré B... (e à Ré C...) a margem compreendida entre aqueles valores e os €9,00/€10,00 a que vendeu o produto à Ré B... (e também à Ré C...); (facto ora alterado)
201) A Ré B... apenas fez estas vendas na Europa porque os Réus AA, BB e CC ludibriaram a Autora, convencendo-a que aquela estava a exportar para Angola e Moçambique;
202) A própria Autora ou outra sua congénere a atuar preferencialmente em cada país para o qual os Réus exportaram o Accu-Chek Aviva 50T poderia ter feito as mesmas vendas que a Ré B... fez na Europa;
203) A Autora auferiu a margem libertada pelo preço de €10/€9,00, quando poderia libertar-lhe uma margem decorrente de uma venda feita, pelo menos, aos valores entre os €15,50 e os €17,00 que a Ré B... cobrou;
204) Ainda que o Grupo E... privilegie o fornecimento de cada mercado nacional pela sua subsidiária a atuar localmente – por motivos, essencialmente, ligados ao adequado fornecimento e monitorização de cada mercado –, nada impedia que, num cenário em que entidades localizadas na Alemanha, Inglaterra, Espanha, Países Baixos e Lituânia surgissem perante a Autora para lhe adquirirem produto, esta lhos vendesse;
205) Teria sido possível a outra congénere da Autora, tendo por território preferencial de vendas um dos cinco países europeus (Alemanha, Espanha, Países Baixos, Lituânia e Reino Unido) para os quais a Ré B... exportou, concluir as mesmas vendas ao preço que a Ré B... fez na Europa; (facto ora alterado)
206) A Autora, deixou de poder auferir a margem correspondente à diferença entre o preço médio de venda praticado pela Ré B..., em 2016 e 2017, em cada um dos cinco países europeus e o preço que praticou com a Ré B... ao abrigo do Contrato de Distribuição Exclusiva (€9,00); (facto ora alterado).
207) Relativamente às vendas de Accu-Chek Aviva 50T realizadas pela Ré B... na Europa, a quantificação das mesmas resulta da análise das faturas que a Ré B... juntou com a petição inicial da Ação B... e resume-se ao seguinte no que concerne a número de unidades vendidas/total de vendas/preço unitário médio de venda:
208) Tendo em conta o preço de aquisição de cada embalagem de Accu-Chek Aviva 50T, a margem bruta da Ré B... nas vendas na Europa foi a seguinte:
209) Tendo a Autora deixado de poder auferir a margem correspondente à diferença entre o preço médio de venda praticado pela Ré B..., no período anterior à celebração do contrato de distribuição exclusiva, em cada um dos cinco países europeus e o preço que praticou com esta mesma Ré, em montante ainda não concretamente apurado; (facto ora alterado)
210) Todas as embalagens de Accu-Chek Aviva 50T que a Ré C... adquiriu à Autora foram revendidas à B..., que igualmente as revendeu na Europa;
211) Tendo a Autora deixado de poder auferir a margem correspondente à diferença entre o preço médio de venda praticado pela Ré C..., de 2014 e 2017, à B... e o preço que praticou com esta mesma Ré, em montante ainda não concretamente apurado. (facto ora alterado)
212) A Autora comercializava – e comercializa – os seus produtos – designadamente o Accu-Chek Aviva 50T– com diferentes códigos e diferentes preços, consoante o destino de venda e o tipo de cliente:
a) O produto destinado ao canal farmácia, chamado “SNS” e “PVP”, produto este destinado ao mercado da prescrição médica e controlado pelo protocolo da diabetes, onde os preços máximos estão implementados e regulados pelo Serviço Nacional de Saúde, pelo facto de estarem em causa produtos (códigos) de prescrição médica.
Estes produtos são vendidos para venda exclusiva nas farmácias em Portugal.
Os preços para o Accu-Chek Aviva 50T encontravam-se fixados na tabela de preços da Autora intitulada “Lista de Preços E... - Armazenistas 2016”, da seguinte forma: SNS €16,44 e PVP €21,81
b) O produto destinado aos concursos públicos e ao canal de venda direta ou consumidor final, sem qualquer etiqueta “SNS” ou “PVP”, que não se destinava ao mercado da prescrição médica, mas sim a consumidores finais, porque as utilizam nos seus próprios pacientes, como hospitais, clinicas, entre as quais as de hemodiálise e de cuidados continuados, lares, bombeiros, etc;
c) O produto destinado a revenda, fora dos canais a que se alude nas alíneas anteriores, que tinha o preço de tabela de €16,44;
d) O produto destinado a canais específicos, fora das situações anteriores, que era definido caso a caso;
213) Em 2012, o preço mínimo do produto Accu-Chek Aviva 50T que era praticado no canal de venda direta identificado na alínea b) era de €7,50;
214) Entre 2010 e 2015, a cliente da Autora S... –Clínica de Diálise, S.A., beneficiou de um preço de €9,00 por cada embalagem de Accu-Chek Aviva 50T, sem que adquirisse produto com as siglas “SNS” ou “PVP”;
215) O mesmo sucedia com o cliente da Autora T... – Investimentos e Serviços, Lda, que era uma clínica de diálise;
216) As duas clínicas de diálise somadas adquiriram menos de 1% daquilo que as Rés B... e C... adquiriram à Autora;
217) Na proposta n.º ...11 que a Autora apresentou, em data não concretamente determinada, ao Hospital ..., para uma quantidade de 4500 embalagens de 50 tiras de Accu-Chek Aviva, a Autora propôs um preço por embalagem de €18,00 (cfr. documento n.º 8, anexo à contestação);
218) Da mesma proposta, consta, para além do Accu-Chek Aviva, a menção ao produto “Accu-Chek Safe-T-Pro Plus”, a um preço por embalagem de €0,00;
219) De acordo com a tabela de preços da Autora, respeitante a 2015, o preço unitário das Lancetas Safe-T-Pro Plus para embalagens de 200 unidades, de €27,83 (cfr. documento n.º 9, anexo à petição inicial);
220) Como cada embalagem de Accu-Chek Aviva continha 50 unidades de tiras, e cada embalagem de Lancetas Safe-T-Pro Plus continha 200 unidades, concluiu-se que a Autora, por cada quatro embalagens de Accu-Chek Aviva, oferecia uma embalagem de Lancetas Safe-T-Pro Plus;
221) Da proposta n.º ...12 que a Autora apresentou ao Hospital ... em 8.11.2011, resulta que para uma quantidade de 5300 embalagens de 50 tiras de Accu-Chek Aviva, foi proposto um preço por embalagem de €9,50 (cfr. documento n.º 10, anexo à contestação);
222) Também neste caso, a Autora oferecia 50 Lancetas Safe-T-Pro Plus por cada embalagem de Accu-Chek Aviva com 50 unidades de tiras cada uma;
223) Como cada embalagem de Lancetas Safe-T-Pro Plus, continha duzentas unidades, chegamos à conclusão de que a Autora ofereceu 1325 embalagens de Lancetas Safe-T-Pro Plus;
224) A Autora participou nos seguintes concursos públicos com as seguintes propostas:
a) Proposta apresentada pela Autora num concurso público internacional, em data não concretamente apurada, propondo um preço de venda do Accu-Chek Aviva de €9,50 (cfr. documento n.º 11 anexo à contestação);
b) Proposta apresentada pela Autora num concurso público internacional, em data não concretamente apurada, propondo um preço de venda do Accu-Chek Aviva de €9,50 (cfr. documento n.º 12 anexo à contestação);
c) Proposta apresentada pela Autora num concurso público internacional, em 9 de maio de 2008, propondo um preço de venda do Accu-Chek Aviva de €9,50 (cfr. documento n.º 13 anexo à contestação);
d) Proposta apresentada pela Autora num concurso público, em 22 de agosto de 2013, propondo um preço de venda do Accu-Chek Aviva de €10,00 (cfr. documento n.º 14 anexo à contestação);
225) A Autora concedia aos revendedores um desconto financeiro de 3% de pronto pagamento;
226) Se o preço de tabela do Accu-Chek Aviva era de €16,44, conclui-se que o preço, com o desconto de pronto pagamento, ascendia a €15,95 (€16,44 –3%);
227) A Autora oferecia a alguns dos seus clientes, como estratégia comercial de potenciar as vendas, produtos;
228) Vejam-se os emails enviados pelo colaborador da Autora, GG, em 23.10.2015 a solicitar a autorização do Réu AA para oferecer embalagens de Accu-Chek Aviva a uma armazenista de Coimbra, e em 21.04.2016 a solicitar a autorização do Réu AA para oferecer 500 aparelhos Accu-Chek Aviva e 500 embalagens de Accu-Chek Aviva 10T a um armazenista da Madeira (cf. documentos n.ºs 21 e 22 anexos à contestação);
229) Aquando do referido no facto 95º, o EE, que tinha sido anteriormente funcionário da R..., era, à data, o responsável da Autora por toda a recolha de números e análise dos respetivos dados, com vista à elaboração de estudos de mercado e reportava diretamente ao FF;
230) Tendo o Réu AA, na sequência de reuniões que tinha tido em Angola, na época a que se alude no facto anterior, remetido emails, em 2.09.2013, a potenciais parceiros de negócio da Autora no mercado angolano, como sejam a H..., a I..., a V..., a W..., e a X... (cf. documentos n.ºs 25-A a 25-E juntos com a petição inicial);
231) Em 2013, a área de Diabetes Care do grupo E... entrou num processo de reestruturação (Projeto A&S – Autonomy & Speed), que tinha como objetivo reconfigurar esta área a nível internacional;
232) A ideia era, de uma forma transversal a nível internacional, colocar esta área o mais alinhada possível ao nível da estrutura (custos, faturação, etc.), tornando-a menos pesada e mais rentável;
233) A prática de um distribuidor exportar produtos adquiridos ao fabricante a um preço inferior para outros países europeus onde é vendido a um preço superior é vulgarmente conhecido como exportação paralela;
234) Esta exportação para a Europa somava-se a todo o restante volume de vendas da Autora (incluindo as vendas para Angola e Moçambique) para alcançar o total de vendas;
235) Elucida-o o documento n.º 34, junto à petição inicial, de onde decorre que o objetivo anual da Autora para 2016 (de €17.927.871) composto pelos resultados nos mercados africanos (€5.476.442), pelas vendas da Autora para a Europa (€1.899.183) e pelas vendas em Portugal (o restante);
236) No email enviado pelo Sr. FF ao Réu AA em 20.06.2016 – ou seja, nem dois meses após a apresentação que fez ao Sr. MM, junta como documento n.º 29 à petição inicial, refere o seguinte: “Please simulate the sales in the remaining 6 months of the year, (…). In total we need to deliver 8.7 Mio EUR in the next 6 months,1.464 per month. Please check that with the assumptions taken we will hit the target but not overshoot the parallel trade target of 1,9 MioEUR.” Por favor simula as vendas para os 6 meses restantes do ano, (…). No total, precisamos de faturar 8,7 milhões de euros nos próximos 6 meses,1.464 por mês. Por favor, verifica que com os pressupostos assumidos atingiremos o objetivo mas não ultrapassaremos o objetivo de exportação paralela de 1,9 milhões de euros] – cfr. documento n.º 34, anexo à petição inicial, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido;
237) Num outro email, remetido também pelo FF ao Réu AA em 29.08.2016, aquele reencaminha-lhe um email, de que lhe foi dado conhecimento por um analista de negócios da Diabetes Care, da estimativa de exportação paralela da Autora atualizada a julho de 2016 e que ascendia a €1.227.892 (cfr. documento n.º 24 anexo à contestação, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido);
238) O aparelho de medição em que os utentes inserem as tiras de teste em causa nos presentes autos (Accu-Chek Aviva 50T) é usualmente oferecido pela E..., seja aos seus clientes, seja ao consumidor final (sendo gratuitos nas instituições de saúde e farmácias por toda a Europa), em quantidades variáveis;
239) O preço de venda do Accu-Chek Aviva 50T pela E... oscilava – e oscila – imenso dentro do mercado europeu, sendo que, em 2013, variava entre os €8,72 e os €23,37, consoante o país;
240) Num documento elaborado pelo grupo E... em 2012, foi fixado um preço mínimo de venda, para o ano de 2013, do Accu-Chek Aviva de €7,50, para concursos públicos, e de €15,00, para o retalho (cfr. documento n.º 28, anexo à contestação);
241) O segmento “diabetes care” é um mercado com muita concorrência e altamente competitivo, dominado por multinacionais de grande dimensão;
E foram julgados não provados, os seguintes FACTOS:
242) Nos termos do código de conduta em vigor à data da prática dos factos, os Réus CC e BB não podiam manter relações comerciais com a Autora;
243) A Autora duvidou da veracidade dos documentos que pela Ré B... lhe foram remetidos em 25.11.2016 (email que constitui o documento n.º 36 e documento n.º 37, anexos à petição inicial);
244) O Grupo E... – materializado pela pluralidade das suas subsidiárias, entre as quais se conta a Autora – não tinha e não tem incentivos para implementar políticas agressivas de preços no mercado europeu, designadamente, de reduzir o preço cobrado por embalagem de Accu-Chek Aviva 50T a revendedores dos cerca de € 16 para os € 10 ou € 9 de que a Rés B... e C... gozaram, respetivamente, após fevereiro de 2014 e março de 2016;
245) É por causa da autonomia da área de negócios Diabetes Care em Portugal que nenhum dos responsáveis máximos, no período em causa nos presentes autos, sucessivamente FF e HH (e, atualmente, CCC), alguma vez integrou a gerência da Autora;
246) A Ré B... também não vendeu as embalagens de produto J... referidas no e-mail do Réu AA a que se alude no facto 143º;
247) A E... não permite que as suas subsidiárias locais, presentes em diversos Estados-Membros, exportem diretamente para os mercados de outros Estados-Membros;
248) A Autora não pode, na prática, vender os produtos da marca E... para outros mercados europeus que não o português;
249) Os clientes aos quais a Ré B... vendeu os produtos E... não eram, previamente, clientes da E...;
250) A Ré B... aumentou, com as suas vendas, as quotas de mercado da E... nos países para os quais exportou;
251) O grupo E..., como um todo, obteve lucros significativos (de milhões de euros) com o trabalho realizado pela Ré B...;
252) As exportações para os mercados africanos serviram para que a Autora pudesse aumentar (e camuflar) a exportação para os mercados europeus, assim elevando o seu volume de negócios e salvando postos de trabalho;
253) Toda a correspondência trocada – e redigida pelos próprios Réu AA, Réu CC e Ré BB – e o Contrato de Distribuição Exclusiva é uma “ficção” organizada localmente para salvaguarda dos postos de trabalho;
254) A gestão dos principais clientes da Autora estava atribuída diretamente ao GG cujo departamento respondia diretamente perante o responsável da Autora em território português (o Head of Diabetes Care Portugal);
255) Enquanto seu trabalhador, o Réu AA angariou para a Autora um relevante volume de negócios;
256) A Ré B... e a Ré C... adquiriram substanciais quantidades de produto à Autora, que não só a beneficiaram, como, a determinada altura, a salvaram do seu projetado encerramento;
257) O Réu CC era uma pessoa com experiência no mercado de diabetes care, tendo, inclusivamente, representado produtos da área da saúde da multinacional U...;
258) Em 2013, o Réu CC exercia a sua atividade como empresário em nome individual, utilizando, para o efeito, a denominação comercial “G...”;
259) Os produtos adquiridos pelo Réu CC eram, depois, comercializados diretamente, em território português, junto de lares e clínicas de hemodiálise;
260) O Réu CC, contactou a Autora, através do email 25.07.2013, para solicitar uma proposta para o fornecimento do Accu-Chek Aviva, em condições similares àquelas que já dispunha com uma concorrente da Autora, a multinacional K... (principal concorrente da Autora e líder do mercado português nesta área de negócio, cuja relação se mantém até hoje);
261) Os “armazenistas” são intermediários que compram à Autora os produtos “SNS” e “PVP”, com os códigos ANF (Associação Nacional de Farmácias) e RD (A...);
262) Os distribuidores são intermediários que compram o produto designado de “venda livre”;
263) O preço de referência do produto designado de “venda livre” era meramente teórico, servindo apenas para justificar um preço máximo para negociar com o Serviço Nacional de Saúde.
264) Nas propostas apresentadas nos concursos a que se alude nos factos 217º e seguintes, a Autora propunha um preço de venda com um investimento comercial muito maior, na medida em que, não só estava obrigada a, de acordo com os critérios do concurso, oferecer aparelhos, como estavam em causa quantidades de fornecimento bastante inferiores àquelas que as Rés B... e C... compravam e prazos de pagamento muito superiores (em alguns casos, previa-se um pagamento a 320 dias);
265) As Rés B... e C... eram distribuidoras do canal de venda direta/venda livre;
266) A sociedade S... comprava (i) os mesmíssimos produtos que o Réu CC pretendia vir a adquirir à Autora, (ii) com a mesmíssima descrição, (iii) a um preço inferior àquele que o Réu AA sugeriu internamente que fosse proposto,
267) Na proposta n.º ...11 que a Autora apresentou, em data não concretamente determinada, ao Hospital ..., sabendo-se que o preço de uma embalagem de 200 unidades de Lancetas Safe-T-Pro Plus tinha o valor unitário de €27,83, conclui-se que o preço, para 50 lancetas, seria de €6,96;
268) Na proposta n.º ...11, descontado o valor correspondente a uma oferta de 50 Lancetas Safe-T-Pro Plus ao valor unitário de cada embalagem de 50 tiras de Accu-Chek Aviva, resulta um preço efetivo, líquido e final de €11,04;
269) À data da apresentação da proposta n.º ...12 cada embalagem de Lancetas Safe-T-Pro Plus, com um preço unitário de €27,38,
270) Na proposta n.º ...12, com a oferta das lancetas, o preço final por embalagem de produto Accu-Chek Aviva era de €2,54;
271) Todos os produtos que constam de propostas/concursos eram exatamente os mesmos que a Autora vendia às Rés B... e C..., e que estão em causa nos presentes autos, ou seja, o mesmo tipo de produto (Accu-Chek Aviva) e não o produto com o código “SNS” ou “PVP”;
272) As ofertas de produtos a armazenistas faziam com que, na prática, existissem casos de armazenistas que compravam Accu-Chek Aviva, na prática, a um preço líquido inferior a €10,00;
273) O preço concedido pela Autora à Ré B..., era por aquela praticado junto de vários outros clientes, do mesmo canal de vendas, que adquiriam quantidades de produto significativamente inferiores àquelas que eram adquiridas pela Ré B...;
274) O portfólio de produtos da Autora em 2014 não era o mesmo que existia entre 2007 e 2012;
275) Até 2011/2012 a Autora apresentava-se nos concursos públicos com o Accu-Chek Aviva 50T (o seu produto de gama mais elevada à data) por não ter outro sucedâneo disponível e que lhe permitisse apresentar um preço mais competitivo (salvaguardando a respetiva margem);
276) Em 2014, porém, a Autora já se apresentava nos concursos públicos com o Accu-Chek Performa (um outro produto, de gama inferior ao Accu-Chek Aviva 50T, entretanto lançado em Portugal), que lhe permitia apresentar-se com um preço mais competitivo (salvaguardando a respetiva margem) e, ainda, reservar o Accu-Chek Aviva 50T ao mercado privado, onde a qualidade acrescida poderia ser remunerada a um preço mais elevado (no mercado europeu) ou permitir a abordagem competitiva a novos mercados (v.g., o dos Palop’s);
277) A Ré BB é leiga em relação a conceitos jurídicos;
278) No email de 17.02.2014, a Ré BB limita-se a informar que, a partir daquele momento, as compras que antes eram efetuadas pelo Réu CC, enquanto empresário em nome individual passariam a ser efetuadas pela B..., que havia sido constituída recentemente;
279) A abertura de um novo cliente podia nem sequer passar pelo Réu AA, passando sempre, isso sim, pelo GG, Key Account Manager da Autora, e pelo Head of Diabetes Care em Portugal, que era então o FF, bem como por variadíssimos departamentos internos da A., num processo burocrático, minucioso e moroso, como é próprio das sociedades multinacionais, como é o caso da Autora;
280) Quando se abre um novo cliente no sistema da E..., a Autora tem acesso, através da plataforma “Informa D&B” a um conjunto alargado de informação sobre o cliente, designadamente no que diz respeito à sua estrutura acionista e de gestão;
281) Na área da Diabetes Cares da Autora:
- Era o departamento comercial da Autora que facultava as condições comerciais a praticar com os clientes;
- Era o departamento de encomendas da Autora que validava as encomendas efetuadas pelos clientes;
- Era o departamento de qualidade da Autora que validava se o novo cliente estava legalmente habilitado a comprar aquele tipo de produtos;
- Era o departamento de concursos que validava os preços e condições sugeridas pelo departamento comercial;
- Era o departamento financeiro que avaliava se as condições comerciais deveriam incluir o pagamento a pronto ou a crédito, após pormenorizada análise de risco do novo cliente através da plataforma “Informa B&D”, através do qual se acede a um relatório com todas as informações institucionais, societárias (incluindo estrutura acionista e de administração) e financeiras das empresas;
- Era o departamento de logística que, por fim, tratava da entrega da mercadoria ao cliente.
282) O preço médio encontrado pela R... de €16,34, praticado pela Autora a algum dos seus clientes não levou em consideração os descontos diretos praticados por esta, que concedia um desconto financeiro de 3% de pronto pagamento;
283) A R..., na sua análise, não teve em conta os produtos que a Autora oferecia a alguns dos seus clientes como estratégia comercial de potenciar as vendas;
284) A ideia de Autora vender à Ré B... o Accu-Chek Aviva 50T a €9,00 e a conceder-lhe um direito de exclusividade de comercialização dos seus produtos no mercado angolano e moçambicano partiu da pessoa que então liderava a Autora em Portugal: o FF;
285) Desde 2014 (ou 2013, se se tiver em linha de conta a relação comercial entre a Autora e o Réu CC), a Autora e as sociedades Rés iniciaram e fomentaram uma relação comercial por via da qual as segundas distribuíam, a clientes por si angariados, produtos adquiridos à Autora não tendo, nesse período, sido colocado qualquer entrave ou referido qualquer impedimento, por parte da Autora, relativamente à possibilidade de distribuição dos produtos em mercados que não o mercado angolano e moçambicano;
286) Muito antes de ter sido celebrado o contrato de distribuição, já as Rés pessoas coletivas adquiriam tais produtos à Autora para revenda a quem e onde bem entendessem;
287) Pelo menos desde 2009, a Autora já trabalhava com o mercado angolano, com recurso a vários players nacionais, com os quais o Sr. DDD (Head of IDS da A.) contratava a venda de produtos da gama Accu-Chek para posterior revenda no referido mercado;
288) Aquando do referido nos factos 95º e ss., a Autora encetou contactos com todos os parceiros que já existiam desde 2009;
289) A solicitação do estudo sobre o potencial do mercado angolano adveio de um email que o Sr. BBB (administrador da Y..., S.A.) enviou, em 9.03.2012, ao FF, (junto à petição inicial como documento n.º 21), no qual refere que tinha estado reunido com dois colaboradores da E... (EEE e ZZ), e lhe solicita uma reunião para obter informações sobre produtos, com vista à sua comercialização no mercado angolano;
290) O Projeto A&S – Autonomy & Speed estabelecia que qualquer estrutura local que estivesse abaixo de 15 milhões euros de faturação anual era um mercado que poderia não interessar à E..., caso em que se equacionaria oferecer esse mercado a distribuidores ou agentes locais, e encerrar (ou reduzir substancialmente) a estrutura local, com isso diminuindo custos e aumentando proveitos;
291) Foi nesse contexto que, nessa mesma altura, a equipa da E... Diabetes Care em Portugal passou a estar sob o foco do referido Projeto A&S, do grupo E...;
292) Isto porque a faturação nacional da Autora, à data, ascendia apenas a 9 milhões de euros anuais, estando, portanto, muito longe de cumprir os limiares internamente fixados pela unidade E... Diabetes Care, que rondavam os tais 15 milhões de euros anuais, pelo que o referido Projeto A&S previa, em Portugal, a extinção de vários postos de trabalho (o que, ainda que em menor medida do que se esperava, graças à Ré B..., chegou a suceder), assim como a externalização da referida atividade para um distribuidor local, deixando a E... de estar estabelecida diretamente no território nacional neste setor;
293) Se esse projeto avançasse, a Autora deixaria de existir neste setor;
294) Estas informações foram transmitidas pelo FF à sua equipa, que lhes veiculou a necessidade de ser criado um plano extraordinário de vendas, para garantir que a sustentabilidade da Autora. se manteria dentro dos padrões definidos pela casa-mãe (15 milhões de euros anuais de faturação) e que o setor de negócio dedicado à diabetes se manteria na estrutura local sedeada em Portugal;
295) Foi nesse contexto que a direção da Autora, procurando evitar as catastróficas consequências associadas à implementação do Projeto A&S, assumiu a possibilidade de exportação de produtos para os mercados dos Palop’s como uma prioridade, pois esta poderia constituir um contributo relevante para ajudar a atividade da Autora em Portugal;
296) Conforme resulta dos documentos n.ºs 22 e 23 juntos com a petição inicial, quem ficou encarregue inicialmente da tarefa de analisar a expansão da Autora para o mercado angolano dessa foi o EE, Project Manager Market Access & Key Account Manager da Autora;
297) Com base no know-how que tinha, o referido EE iniciou, a pedido do FF, a análise do mercado angolano, passando, posteriormente, a fazer parte desta equipa o Réu AA e o DDD;
298) Foi neste contexto que o Sr. EE, em 6.09.2013, enviou um email ao Réu AA (documento n.º 23 anexo à petição inicial), acompanhado de dois anexos:
a) Um documento elaborado pela R... sobre o mercado angolano (que corresponde ao anexo ao documento n.º 23 junto com a p.i.);
b) Um estudo, elaborado pelo referido EE, intitulado “Angola –Business Plan 2013 (que corresponde ao documento n.º 24 junto com a p.i.), do qual se pode retirar o seguinte:
i) Estimava-se que, em 2012, a população diabética em Angola fosse de cerca de 220.000 pessoas, prevendo-se um crescimento para 431.000 pessoas em 2030 (cf. páginas 5 e 6);
ii) O mercado encontrava-se dominado pela J..., concorrente da Autora (cf. páginas 8 e 9);
iii) Foram idealizados dois parceiros para a distribuição, em território angolano, dos produtos comercializados pela Autora: a H... e a I... (cf. pág. 17);
iv) Com base nos dados de mercado recolhidos, previam-se as seguintes expectativas de vendas no mercado angolano, no setor dos produtos para diabéticos (medidores de glicemia, meters, e tiras de testes de diabetes, strips), entre 2013 e 2018: 2013 - €375.550; 2014 - €545.425; 2015 - €1.001.400; 2016 - € 1.360.400; 2017 - € 1.746.575; 2018 - €1.996.425 (cf. págs. 30 e 31);
v) Não é feita qualquer referência ao produto Accu-Chek Aviva, mas apenas ao Accu-Chek Performa, uma vez que a Autora entendia que só este produto era adequado ao mercado angolano (cf. pág. 15);
vi) São apontados como pontos fracos do investimento da Autora no mercado angolano a existência de exportação paralela de produtos E... com proveniência no Brasil, Espanha e Itália (cf. pág. 15).
299) Os contactos a que aludem os emails de em 2.09.2013 não deram os seus frutos, designadamente pelo facto de, segundo transmitiram à Autora, alguns dos parceiros contactados, a J... dominar o referido mercado, pelo que conseguiam colocar os produtos dessa farmacêutica com margens mais vantajosas do que aquelas que eram garantidas pela E...;
300) Além desses, foram ainda selecionados os seguintes potenciais parceiros:
a) A Y..., representada pelo Sr. BBB, que já era, na altura, a representante em Angola da E... Farmacêutica e que foi uma recomendação direta do Sr. FF; e
b) A H.../H..., que era um parceiro da E... Diagnósticos e Diabetes, com quem, aliás, partilhava umas instalações (armazéns e escritórios) no Porto, e que também foi uma recomendação direta do Sr. FF.
301) Também estes contactos não foram bem-sucedidos: a Y..., porque previa vendas anuais no mercado angolano de apenas €50.000,00, o que pareceu pouco à Autora; a H.../H... porque, depois de a Autora lhe apresentar propostas de preços, informou que a J... lhes assegurava melhores condições, pelo que seria mais rentável continuar a trabalhar com esta concorrente da Autora;
302) O plano que foi junto como documento n.º 26 anexo à petição inicial foi o resultado de uma reunião de trabalho em que o FF solicitou a ajuda da sua equipa, com o objetivo de, em conjunto com ele, ser criado um plano de crescimento acelerado, de forma a cumprir-se o objetivo da Autora de não ver o negócio da diabetes passar para um distribuidor local;
303) Os cálculos que constam deste plano foram, todos eles, elaborados pelo EE, e validados pelo FF, tendo sido, posteriormente, por este apresentado aos seus superiores hierárquicos;
304) Este plano está direta e intimamente relacionado com o pedido que o FF, atentas as circunstâncias em que, naquela altura, se encontrava a Autora, endereçou ao Réu AA para fazer exportação de produtos, através de um distribuidor, para outros países europeus, pois só assim se conseguiria salvar, a curto prazo, o negócio da diabetes da Autora em Portugal;
305) A contratação de parceiros com base portuguesa, mas presença local em Angola foi ideia da equipa do FF;
306) A Ré B... estava autorizada, sem exclusividade – a exportar, distribuir os produtos farmacêuticos da J... em todo o território dos Palop’s, por força de um contrato celebrado em 11 de julho de 2014 nos termos que constam do documento n.º 23 anexo à contestação;
307) A J..., tanto quanto é do conhecimento dos Réus, deixou efetivamente o mercado angolano em 2015, situação de que a Autora é conhecedora, tendo inclusivamente contratado uma ex-colaboradora daquela, a Sra. VV, já após a J... ter abandonado o mercado angolano;
308) A apresentação junta como documento n.º 29 anexo à petição inicial, datada de 25.04.2016, foi elaborada, na parte relativa aos Palop’s, em conjunto, pelo FF e pelo Réu AA;
309) A apresentação foi feita ao Sr. MM, na parte relativa aos Palop’s, pelo próprio FF;
310) Em lado nenhum da apresentação se refere que os 4 milhões de euros imputados à J... diziam respeito, unicamente, ao setor de “diabetes care”;
311) No email junto como Documento n.º 28, o Réu AA limita-se a informar o seu superior hierárquico que a J... havia proposto à Ré B... a celebração de um acordo de exclusividade para a comercialização dos seus produtos no mercado angolano, mas que desconhecia os detalhes desta proposta;
312) Em 2016, Autora confrontava-se com o fecho iminente do setor de negócio dedicado à diabetes, no âmbito do referido Projeto A&S;
313) Pelo que o plano gizado e encontrado pelo FF para aumentar o volume de faturação (assim garantindo que a sustentabilidade da Autora se manteria dentro dos padrões definidos pela casa-mãe e que o setor de negócio dedicado à diabetes se manteria na estrutura local sedeada em Portugal) passou por potenciar as vendas da exportação paralela, designadamente através da Ré B..., que já apresentava, então, volumes de aquisição de produtos à Autora muito significativos;
314) Foi nesse contexto de necessidade de aumento de volume de vendas, aliado ao excelente trabalho que vinha sendo desenvolvido pela Ré B... desde 2014 (no mercado nacional e europeu) – tendo-se tornado o cliente que mais produtos adquiria à Autora, com um volume de negócios a rondar os 3,5 milhões de euros –, que a Autora ofereceu à Ré B... uma redução do preço do Accu-Chek Aviva 50T e atribuiu-lhe, em março de 2016, o exclusivo da distribuição dos produtos do mercado de Angola e Moçambique;
315) Foi a Autora que ofereceu à Ré B... a redução de preço e o direito de exclusividade, e não a Ré B... que a pediu;
316) Com a celebração do Contrato de Distribuição Exclusiva, a Ré B... passou a acumular o duplo papel de distribuidor (não exclusivo) dos produtos no mercado europeu (que já vinha desde 2014) e de distribuidor (exclusivo) dos produtos nos mercados de Angola e Moçambique, passando, desde essa altura, e independentemente do destino da respetiva encomenda, a beneficiar da redução do preço do Accu-Chek Aviva 50T de €10,00 para €9,00;
317) O Contrato de Distribuição Exclusiva previa um objetivo de vendas no valor total de 5 milhões de euros, mas ambas as partes sabiam que esse objetivo era meramente teórico e impossível de alcançar, tendo sido estabelecido apenas com o intuito de justificar – internamente, no seio do grupo E... – o aumento da faturação da A. para níveis que lhe permitiam manter a sustentabilidade requerida pela casa-mãe e assim, manter a sua estrutura local em território português;
318) A Autora sabia que a única forma de manter os referidos níveis de sustentabilidade era utilizar o parceiro B... para incrementar o seu volume de faturação, bem sabendo, no entanto, que as vendas à Ré B... se destinavam, na sua grande maioria, à revenda para o mercado europeu, através de exportação paralela;
319) No entanto, não o podia assumir internamente, porque a casa-mãe procurava combater esse fenómeno de exportação paralela, de forma a não existir competição comercial entre as diversas estruturas locais estabelecidas nos diferentes Estados-Membros;
320) Foi com recurso a este expediente, que utilizou a Ré B... como veículo, que a Autora conseguiu que a sua estrutura local se mantivesse em atividade no território português;
321) Era para todos evidente que os mercados angolano e moçambicano tinham limitações de dimensão que impossibilitavam, desde logo e à partida, que os objetivos de vendas anuais previstos no Contrato de Distribuição Exclusiva fossem cumpridos;
322) Era do conhecimento da Autora que a capacidade dos mercados angolano e moçambicano para absorverem os produtos da Autora era extremamente reduzida, não sendo, de todo, previsível que pudesse aumentar de forma sensível nos anos imediatamente subsequentes;
323) Era do conhecimento da Autora que a situação que à data se verificava relativamente à dimensão do mercado só poderia ser alterada mediante uma melhoria muito significativa das condições de vida de ambos os países, isto porque a diabetes é, sobretudo, uma doença dos designados países ricos ou desenvolvidos;
324) Era do conhecimento da Autora que mesmo que houvesse população diabética suficiente seria sempre igualmente necessário, para aumentar a dimensão do mercado, que os respetivos governos passassem a subsidiar a aquisição de produtos para diabéticos ou o poder de compra dos cidadãos aumentasse exponencialmente de um momento para o outro, o que não era previsível que sucedesse;
325) Ambas as partes no Contrato de Distribuição Exclusiva sabiam perfeitamente que os objetivos de compras que foram contratualizados eram meramente programáticos, por serem originariamente impossíveis de alcançar: não havia, nem tão pouco há, na presente data, capacidade de absorção dos mercados de Angola e Moçambique que permitisse atingir um volume de compras anual, por parte da Ré B... à A., de 5 milhões de euros;
326) Ambas as partes sabiam, igualmente, e por isso os estabeleceram, que tais objetivos de compras anuais só poderiam vir a ser alcançados caso fossem computadas, para efeitos de alcance dos limiares contratualmente fixados, as vendas que a Ré B... viesse a efetuar no mercado europeu;
327) O direito de exclusividade que a Autora concedeu à Ré B..., por via do Contrato de Distribuição Exclusiva, nos mercados angolano e moçambicano, foi uma vantagem (um prémio) concedida à Ré B..., e não uma obrigação ou dever de esta se limitar a atuar e a comercializar nos mercados angolano e moçambicano;
328) Nos termos do Contrato de Distribuição Exclusiva, só a Ré B... podia distribuir os produtos da Autora em Angola e Moçambique, mas não estava impedida de distribuir esses produtos noutros territórios;
329) A redução do preço para €9,00 conceda pela Autora à C... foi feita de acordo com os procedimentos normais, alterado no sistema da Autora pelo seu departamento de concursos em 8.08.2016;
330) As condições comerciais oferecidas pela Autora à Ré B... e à Ré C... foram estabelecidas livremente entre as partes, são equivalentes às praticadas com outros clientes da Autora do mesmo tipo e enquadradas dentro dos padrões e limites internamente estabelecidos pela Autora;
331) A Autora precisava, urgentemente, de compor os seus números, no sentido de os apresentar à casa-mãe, assim demonstrando a sua sustentabilidade e a necessidade de se manter a presença direta no território português; e a Ré B... foi o veículo para a Autora atingir tal desiderato;
332) Porque a Autora não iria transmitir à casa-mãe que estava a potenciar a exportação paralela para compor os seus números, nas comunicações trocadas, foi deixado rasto visível – quer pela Autora, quer pela Ré B... – de um aparente volume relevante de vendas para os territórios de Angola e de Moçambique;
333) O valor de 9 milhões referido no documento n.º 29 anexo à petição inicial foi alocado pela Autora de forma intencional ao mercado dos Palop’s para conseguir justificar superiormente o valor das vendas naquele ano, que a Autora bem sabia não terem sido realizadas para o mercado africano, mas sim para o mercado europeu, através da exportação paralela;
334) Também o objetivo de vendas de 4 milhões em 2016 referido no documento n.º 29 anexo à petição inicial serviu exatamente o mesmo propósito de justificar superiormente o valor das vendas naquele ano;
335) O FF e a Autora bem sabiam que não havia em 2016, nem tão pouco há, na presente data, capacidade de absorção dos mercados dos Palop’s que permitisse atingir esse volume de vendas anual por parte da Autora através da B... e que esse objetivo só poderia vir a ser alcançado caso fossem computadas as vendas que a Ré B... viesse a efetuar no mercado europeu (o que sucedeu, aliás, nos cálculos constantes dessa apresentação referentes aos anos de 2014 e 2015);
336) Ambas as partes sabiam que esse objetivo era meramente teórico e impossível de alcançar, tendo sido referido na apresentação ao MM apenas com o intuito de justificar – internamente, no seio do grupo E... – o aumento da faturação da Autora para níveis que lhe permitiam continuar a manter a sustentabilidade requerida pela casa-mãe e assim, continuar a manter a sua estrutura local em território português;
337) A referência, na página 21 da apresentação que constitui o documento n.º 29, de que a exportação paralela estava em €711.095,00, e por isso abaixo da previsão, refletia-se, negativamente, no volume de negócios que a Autora apresentava à data (objetivo de €4.440.999,00);
338) A Autora incentivava a exportação paralela, sendo disso exemplo o email remetido pelo FF ao Réu AA em 20.06.2016, dando instruções expressas ao AA para assegurar um valor de exportação paralela de 1,9 milhões de euros, (documento n.º 34 anexo à petição inicial),
339) Se a exportação paralela não interessasse à Autora para compor os seus números e cumprir os seus objetivos, esta tinha todos os meios, tecnológicos e humanos, para a impedir e para apurar quais os seus clientes que a faziam;
340) Era a Autora que incentivava e promovia a exportação paralela, designadamente através do FF, o qual não se coibia de estimular a sua equipa a potenciar a exportação paralela, de forma a “compor” os números de faturação da Autora e, assim, cumprir os objetivos a que se tinha comprometido superiormente, com a casa-mãe;
341) Dos emails datados de 20.06.2016 e 29.08.2016 podem-se retirar as seguintes conclusões:
a) A Autora definia, no seu plano de negócios, objetivos de faturação, que tinham neles incluídos estimativas da exportação paralela: ou seja, a Autora sabia à partida que não conseguia
cumprir os objetivos de faturação sem o recurso à exportação paralela;
b) A Autora promovia, portanto, a exportação paralela de forma a que conseguisse cumprir os seus objetivos perante a casa-mãe;
342) O email enviado pelo HH ao Réu AA em 24.11.2016, junto como documento n.º 35 anexo à petição inicial, deve ser enquadrado, uma vez mais, na conduta habitual da chefia da Autora, que, por escrito, escrevia e pedia uma coisa, conhecendo e até incentivando, se necessário, a exportação paralela com o objetivo de compor os números e cumprir os objetivos da Autora;
343) O email que constitui o documento n.º 37 anexo à petição inicial surgiu como resposta à solicitação urgente que lhe havia sido endereçada pela Autora (enviada numa quinta-feira, dia 24.11.2016, às 21:46, pelo AA, por solicitação, igualmente urgente, do HH), no sentido de facultar os documentos da exportação para os Palop’s dos produtos Accu-Chek por parte da B....
344) Até serem confrontados com a eventualidade de existirem duas faturas, com o mesmo número, mas com valores diferentes (primeiro no processo cível referido no artigo 177.º da petição inicial, e depois no processo crime referido no artigo 162.º da petição inicial), nenhum dos Réus se apercebeu que:
a) A fatura que o CC enviou como anexo ao email de 25.11.2016 (fatura junta como documento n.º 37) não era, na verdade, uma fatura, mas antes uma mera fatura pró-forma e que
b) A fatura, com o mesmo número, que se encontra registada na contabilidade da Autora é aquela que a B..., motu próprio, juntou no processo cível referido no artigo 177.º da petição inicial da Autora;
345) A conclusão a que chegaram, após terem contactado a estrutura da B... em Angola, foi que a “fatura” a que a E... faz referência, datada de 25.09.2016, enviada pelo CC à E... em anexo ao email de 25.11.2016, tratava-se, afinal, de uma mera fatura pró-forma, que não foi registada na contabilidade da empresa e que terá sido emitida, em setembro de 2016, como orçamento destinado a dar resposta a múltiplos pedidos de cotação para o mercado angolano dos produtos aí descritos;
346) Não se conseguiu, no entanto, apurar por que razão o sistema de emissão de faturas da B... emitiu esta fatura sem a devida referência “pró-forma”;
347) O envio dessa fatura, pelo CC à E..., em 25.11.2016, tratou-se de um lapso a que aquele é alheio, pois que, confrontado com o pedido urgente da E..., transposto no email desta de 24.11.2016, logo tratou de pedir telefonicamente ao escritório da B... em Angola que lhe enviassem, por email, a última fatura de exportação de produtos Accu-Chek para este território e, por lapso, foi-lhe enviada a referida fatura pró-forma, que o Sr. CC se limitou a reencaminhar para a E..., no tal email de 25.11.2016.
348) Os documentos n.ºs 24 e 26 da petição inicial surgem na sequência de um pedido expresso do HH para aumentarem o volume de vendas da Autora, por forma a poder cumprir os objetivos e previsões delineados para 2017;
349) Na data em que aqueles emails foram remetidos, em que a sua saída (que estava a ser negociada desde setembro de 2016 com o HH) estava iminente, o AA, a pedido da Autora, já tinha feito a passagem dos dossiers relativos ao mercado dos Palop’s para o GG, que era quem iria ficar responsável por esse mercado após a sua saída;
350) Sabia o HH que se esse pedido fosse feito através do AA teria mais força, interessando-lhe, a todo o custo, ter a garantia de que iria cumprir com os objetivos de vendas em 2017;
351) Na data do documento n.º 41 – 19 de abril de 2017 –o HH e o GG estiveram presentes numa reunião com a Ré B..., realizada em 6 de abril de 2017, em que esta foi representada pelo AA e pela Dra. FFF;
352) Numa reunião realizada em 6 de abril de 2017, a Autora propôs à Ré B... reformular a relação contratual entre as duas empresas, propondo que se passasse a definir, de forma objetiva, que a B..., quanto ao produto Accu-Chek Aviva, apenas poderia atuar nos mercados de Angola e Moçambique, bem como os preços a que poderia vender esse produto em cada um desses mercados;
353) Nessa reunião, foi dito que a restrição que a Autora pretendia passar a impor aplicar-se-ia apenas ao produto Accu-Chek Aviva, por ser aquele que, na altura, estava sob o radar da casa-mãe no que à exportação paralela diz respeito, pelo que a Ré B... continuaria livre para revender, para qualquer mercado, outros produtos, como por ex. o Accu-Chek Performa;
354) A informação sobre a estrutura acionista da Ré B... era, desde há muito, falada no seio da E..., entre alguns dos seus colaboradores;
355) Os Réus limitaram-se expedir o produto E... para cerca de uma dúzia de revendedores;
356) O estudo levado a cabo pelos consultores externos a que respeita o documento n.º 33 anexo à petição inicial circunscrevia-se aos armazenistas, o que nem a Ré B..., nem a Ré C... eram;
357) O volume de vendas previsto para o ano de 2016, de cerca de € 1,3 milhões para Angola constante do documento intitulado “Angola – Business Plan 2013, foi calculado pelo EE, em 2013;
358) Os números relativos à exportação paralela decorriam de exportações diretamente feitas pela Autora dos seus produtos para a Europa;
359) O Réu AA sabe – porque o HH lho disse na reunião de 6 de abril de 2017 – que a Autora, em data anterior à reunião, havia solicitado um relatório da Ré B... à Dun & Bradstreet, do qual constava a estrutura acionista e de gestão da Ré B...;
360) À data da saída do Réu AA, a Autora sabia, desde há muito, da relação existente entre este e a Ré B...;
VI-APLICAÇÃO DO DIREITO AOS FACTOS:
Tendo ficada prejudicada a alteração da matéria de facto impugnada pelos apelantes, haverá apenas que analisar a discordância daqueles relativamente às questões suscitadas no recurso relativas subsunção dos factos ao direito, que não dependiam daquela alteração factual.
A discordância dos apelantes assenta em suma, no facto da sentença não ter distinguido se a responsabilidade assacada aos Réus assentou na responsabilidade contratual ou extracontratual, nomeadamente no que concerne à indemnização pedida pela autora em virtude da cedência dos créditos indemnizatórios pelas subsidiárias com quem os réus jamais contrataram e não ter sido feita distinção entre os danos sofridos pela autora e por aquelas subsidiárias.
Quanto à responsabilidade, defendem que a mesma não poderia ser fundada no dolo, pois nos autos não é pedida a anulação de qualquer contrato.
Afirmam ainda que o ato de exportação pela B... para os outros Estados membros, desde logo não constitui qualquer ato ilícito, uma vez que a “exportação paralela” é uma forma lícita de comércio de mercadorias entre os Estados membros da União Europeia, onde estão impedidas restrições de circulação de mercadorias no mercado interno; que a obrigação de revenda no mercado africano era quando muito uma obrigação lateral ou acessória.
Também, segundo os Apelantes nenhuma ilicitude decorre relativamente ao contrato de distribuição exclusiva celebrado em 2016, já que do mesmo não decorre qualquer impedimento da Ré vender ou distribuir aqueles produtos noutros territórios, que não o angolano e moçambicano.
Conclui pela inexistência dos pressupostos da responsabilidade civil, como o nexo de causalidade, o dano, sendo que, quanto a este, quando muito os lucros teriam de corresponder ao ganho líquido ou margem líquida que para a A ou suas congéneres teria resultado se fossem aquelas a vender em território europeu, sendo que tribunal erroneamente fez corresponder à margem bruta.
Também defendem que foi indevidamente usado o mecanismo da desconsideração da personalidade jurídica das pessoas coletivas, não se verificando os respetivos pressupostos; e finalmente defendem que o Réu CC que nunca foi acionista da B..., nem sócio da C..., nunca poderia ser responsabilizado por qualquer dos pedidos contra ele formulado e o réu AA também nunca tendo sido sócio da C... poderá ser responsabilizado pelo pedido formulado contra aquela sociedade.
A nosso ver, para conhecer das questões suscitadas no recurso, mostra-se necessário, tal como defendem os Apelantes, tratar separadamente duas situações, que não foram devidamente diferenciadas na sentença.
Por um lado haverá que a apreciar o direito próprio da Autora que contratou diretamente com as sociedades B... e C..., apreciando a sua pretensão indemnizatória, no confronto dos pressupostos da responsabilidade civil e no confronto da atuação dos demais Réus, (pessoas singulares), por terem atuado “sob a capa” daquelas sociedades comerciais, calculando-se os prejuízos diretamente sofridos pela Autora e só depois haverá que aferir os direitos das sucursais europeias (dando-se resposta à questão suscitada da eventual necessidade de Reenvio Prejudicial para o Tribunal de Justiça da União Europeia), tendo-se em consideração que o eventual direito à indemnização destas subsidiárias é um direito próprio daquelas sociedades, que se mostra cedido à autora mediante contrato junto aos autos (documento 67 da p.i).
Feita esta distinção, analisemos a primeira situação.
6.1 DO DIREITO DA AUTORA À INDEMNIZAÇÃO:
Qualquer que seja a responsabilidade civil que impende sobre o lesante, podendo concorrer para tanto a responsabilidade contratual e responsabilidade extracontratual, aquela traduz-se numa obrigação de indemnizar, ou seja de reparar os danos sofridos pelo lesado.
Na sentença reconheceu-se a obrigação de indemnizar à autora por parte da totalidade dos réus, que foram solidariamente condenados no seu pagamento, tendo-se concluído pela responsabilidade daqueles, por se reconhecer que atuaram de forma concertada para enganar a Autora, provocando-lhe erro na forma de dolo quanto às circunstâncias do negócio – quanto aos sujeitos reais com quem contratou e quanto às reais finalidades dos contratos – sendo que a Autora se delas tivesse conhecimento, não teria contratado com aquelas sociedades comerciais nos moldes em que o fez, o que lhe causou prejuízo, correspondente à margem de lucro perdida por aquela nos mercados europeus.
Concluiu-se aí pela existência da obrigação de indemnizar, com base na responsabilidade civil, assim justificada: resulta com “evidência que a decisão de contratar da Autora foi inquinada por todo o ardil, sugestões e artifícios criado pelos Réus pessoas singulares, um deles seu funcionário, pessoa de confiança do diretor da área de Diabetes Care em Portugal, que entreajudando-se e coordenando-se entre si e servindo-se das sociedades determinaram a existência de relações comerciais que, perdurando no tempo e trazendo-lhes elevados proventos, jamais seriam mantidas caso as circunstâncias de que se revestiam fossem daquela conhecidas.”
E, “Sendo o dolo um ato ilícito, a obrigação de indemnizar surge como decorrência do art. 227º n.º 1 do C.C. Há que ter como ponto de partida o art. 566º nº 2 do C.C. “A indemnização em dinheiro tem como medida a diferença entre a situação patrimonial do lesado, na data mais recente que puder ser atendida pelo tribunal, e a que teria nessa data se não existissem danos”.
A responsabilidade civil comporta a responsabilidade contratual (obrigacional) fundada em violação do contrato (falta de cumprimento das obrigações emergentes dos contratos, estando em causa a violação de direitos de crédito ou de obrigações em sentido técnico, nelas se incluindo não só os deveres primários de prestação, mas também deveres secundários e pode resultar do não cumprimento de deveres principais/essenciais ou de deveres acessórios/secundários).
Já a responsabilidade delitual ou aquiliana emerge, não de violação de contratos mas sim da violação de normas que impõem deveres de ordem geral e correlativamente de direitos absolutos do lesado (violação de normas gerais que tutelam interesses alheios, de deveres genéricos de respeito).
Nos contratos, embora o princípio geral seja a liberdade dos contraentes (art. 405º do C.Civil), essa liberdade tem limites impostos pela lei, sendo um deles o do artigo 227º n.º 1 do Código Civil, ou seja, a boa fé nas negociações preliminares contratuais (cfr. artigo 405º CC).
A autonomia privada é, assim, “conferida às pessoas dentro de certos limites e sob as valorações próprias do Direito; em consequência, são ilegítimos os comportamentos que, desviando-se duma procura honesta e correta dum eventual consenso contratual, venham a causar danos a outrem. Da mesma forma, são vedados os comportamentos pré – contratuais que inculquem, na contraparte, uma ideia distorcida sobre a realidade contratual”.[10]
Donde, no decurso das negociações preliminares de um contrato, devem as partes atuar de boa fé, isto é, devem agir segundo um comportamento de lealdade e correção que visa contribuir para a realização dos interesses legítimos que as partes pretendem obter com a celebração do contrato.
E, se as partes assim não procederem, terá a que faltar a essa conduta, de arcar com a responsabilidade pelos danos ocasionados à contraparte, nisto consistindo a chamada responsabilidade da “culpa in contrahendo” que se acha estabelecida na norma do artigo 227º CC.
“O simples início das negociações cria entre as partes deveres de lealdade, de informação e de esclarecimento, dignos de tutela jurídica” e como refere Antunes Varela,[11] “a lei consagra a tese da responsabilidade civil pré – contratual pelos danos culposamente causados à contraparte tanto no período das negociações (dos preliminares, como lhes chama a disposição), como no momento decisivo da conclusão do contrato, abrangendo, por conseguinte, a fase crucial da redação final das cláusulas contrato celebrado”.
Decorre, por sua vez do nº 2 do art. 762º do Código Civil que “no cumprimento da obrigação, assim como no exercício do direito correspondente, devem as partes proceder de boa-fé.”
Na situação em apreço, mostram-se celebrados pelas sociedades B... e C..., contratos, atípicos integrados no âmbito dos contratos de distribuição, com caraterísticas comuns aos contratos de concessão comercial.
Assim, o relacionamento comercial com a B... foi iniciado em fevereiro de 2014 e desenrolou-se até fevereiro de 2018 (altura em o Réu AA resolveu o contrato de distribuição celebrado com Autora).
Consistiu na venda feita pela autora do produto ACCU-CHEK AVIVA 50T – constituído por tiras para medição da glicémia, sendo um produto destinado a diabéticos, que para o usar necessitam de ter o respetivo aparelho de medição - àquela sociedade, num primeiro momento pelo preço de 10€, para revenda, na condição de aquele produto ser destinado ao mercado Angolano, onde a Autora pretendia implementar a venda daquele produto.
Durante o ano de 2014, passou assim a B... a beneficiar do acesso àquele produto para revenda, no mercado dos Palop’s, pelo preço de €10,00, tendo em conta esse específico destino.
Assim, foi estabelecido entre as partes um contrato quadro de distribuição, na medida em que continha dos precisos parâmetros, o preço e o destino dos produtos adquiridos para revenda, atípico, que não continha obrigações de aquisição de quantias mínimas ou máximas, ao abrigo do qual se foram desenvolvendo concretas compras e vendas entre as partes.
Essas relações comerciais acabaram por ser formalizadas, no contrato de distribuição exclusiva celebrado em 21.03.2016, fixando-se agora o preço para de €9,00 tendo em consideração aquele destino da mercadoria, o que constitui tipicamente um contrato de concessão comercial, com cláusula de exclusividade quanto às compras e quanto ao território.
Ou seja, o acordo verbal, que se manteve em vigor desde até 2016, (com preço de venda por unidade de produto de €10,00 euros) veio a culminar na celebração do contrato escrito em 21.3.2016, que as partes denominaram de “contrato de distribuição) mediante o qual, acordaram baixar ainda o preço daquele produto para 9€, tendo ficado acordado na cláusula segunda desse Contrato de Distribuição que a B... seria o “distribuidor exclusivo da gama de produtos Accu Chek para o território angolano e moçambicano, assegurando a sua venda às instituições de saúde, a grossistas/armazenistas ou quaisquer distribuidores, bem como às farmácias e instituições de saúde”.
De idêntica forma se desenrolou o relacionamento comercial da Autora com a C..., com a diferenças que com esta sociedade não foi celebrado qualquer contrato por escrito.
Outra diferença a assinalar reside no facto da revenda que esta sociedade fez do produto ACCU CHEK AVIVA 50T para o mercado europeu ter sido feita através da sociedade B..., a quem a C... revendia os produtos que lhe eram fornecidos pela Autora, que não deixa de ser significativa, como veremos, no âmbito do reconhecimento duma atuação concertada entre os Réus.
Com efeito, provou-se relativamente a esta sociedade que, todas as embalagens de Accu-Chek Aviva 50T que a Ré C... adquiriu à Autora foram revendidas à B..., que igualmente as revendeu na Europa.
Esse relacionamento comercial vigorou entre Abril de 2014 e fevereiro de 2018 (terminou quando terminou o contrato da B... que foi resolvido por esta sociedade), e concretizou-se através da venda feita pela autora do produto ACCU-CHEK AVIVA 50T, àquela sociedade, inicialmente pelo preço de 10€, porque direcionado para a revenda, em “África”, mercado onde a Autora pretendia implantar a venda daquele produto.
O acordo verbal, que se manteve em vigor até 2018 implicou o fornecimento pela Autora de várias quantidades do produto ACCU CHEK AVIVA 50T, destinado a África, vendido pela Autora inicialmente ao preço” de 10€, tendo mais tarde, (quando a B... passou a usufruir do preço de 9€, no âmbito do contrato escrito de distribuição, passado a usufruir de igual preço, (por decisão do Réu AA – ver documento 31, e- mail de 8.8.2016 onde aquele manda aos seus colaboradores “pf alterem o preço do accu chek aviva para 9€ a embalagem para o cliente C..., Ldª”.(facto 137).
Do exposto resulta que relativamente aos primitivos contratos celebrados entre a Autora e a Ré B... (contratos de compra venda celebrados ao abrigo dum acordo comercial de distribuição, que não se encontra reduzido a escrito), assim como os contratos de idêntica forma celebrados com a Ré C..., também não reduzidos a escrito, a qualificação jurídica do negócio há-de resultar, em larga medida, do que tiver sido pretendido pelos contraentes e bem assim dos comportamentos concludentes no decurso do cumprimento do contrato, demonstrativa das regras que o regem, que foram reciprocamente aceites pelas partes.
E na sua qualificação releva ainda o facto desse relacionamento comercial ter vindo a ser continuado, em 2016, relativamente à B..., através dum contrato escrito, que as partes denominaram de “contrato de distribuição”, onde se encontram expressas as regras que o passaram a reger, as quais foram reciprocamente aceites pelas partes.
Este relacionamento comercial é assim enquadrável, (quer antes, quer depois da celebração do contrato escrito), no âmbito dos contratos de distribuição comercial, típicos ou atípicos, que disciplinam as relações jurídicas entre o produtor e o distribuidor lato sensu com vista à comercialização dos bens e serviços do primeiro, constituindo instrumentos jurídicos fundamentais de criação e organização da distribuição comercial.[12]
A expressão “contrato de distribuição” tem sido, com efeito, usada para designar o conjunto de tipos contratuais destinados a implementar sistemas de distribuição indireta integrada de bens ou de serviços, o que também se tem chamado de contratos de intermediação ou contratos de colaboração, sendo os mais correntes o contrato de agência, o contrato de concessão comercial e o contrato de franquia. O primeiro é a “figura-matriz” dos contratos de distribuição.[13]
São modalidades dos contratos de distribuição comercial o contrato de agência, de concessão comercial, de franquia, de mediação, comissão, de distribuição autorizada e de distribuição seletiva.
O contrato de concessão comercial é um contrato atípico e inominado, integrando-se naquele conceito mais amplo de contrato de distribuição.
Não obstante a sua maior ou menor autonomia, os contratos de distribuição constituem instrumentos que permitem a integração dos distribuidores em redes mais ou menos organizadas e dirigidas pelos fornecedores, obrigando-se aqueles a prosseguir interesses comerciais destes últimos. O seu conteúdo concreto há de revelar a integração do agente, do concessionário ou do franquiado na rede de distribuição do principal com tudo o que isso implica e pressupõe em termos de colaboração entre as partes e de promoção dos bens distribuídos.
Apesar da atuação de cada um dos distribuidores neste quadro contratual ser juridicamente autónoma, há uma integração vertical estável numa rede de distribuição que varia conforme a modalidade contratual.
Nas palavras de Pinto Monteiro, [14] “O contrato de concessão comercial não é na ordem jurídica portuguesa, um contrato legalmente tipificado, mas pode considerar-se um contrato socialmente típico: é revelado pela prática dos negócios e tem sido difundido nas relações comerciais, sobretudo nos últimos anos; desempenha uma função económico-social própria – organização da distribuição dos produtos, com carácter duradouro, por forma tal que permita ao produtor concedente controlar a distribuição e pôr em prática a sua política comercial, transferindo para o distribuidor-concessionário os riscos da comercialização (...).
É em síntese o contrato pelo qual uma das partes (o concessionário) se obriga a comprar a outra (o concedente), para revender numa zona determinada, bens produzidos ou distribuídos pelo concedente.
Por este contrato é instituída uma relação duradoura; o concessionário obriga-se a promover a revenda dos produtos numa zona determinada, beneficiando normalmente da exclusividade de revenda nessa zona (...) No contrato de concessão comercial o concessionário atua por conta própria e em nome próprio; é proprietário dos bens que distribui, comprando ao concedente os produtos para os revender, e por isso, suporta pessoalmente os riscos da sua atividade. (...)”
Para Maria Helena Brito,[15] por tal figura entende-se, em síntese, o contrato pelo qual uma das partes (o concessionário) se obriga a comprar à outra (o concedente), para revender numa zona determinada, bens produzidos ou distribuídos pelo concedente.
O concessionário atua por conta própria e em nome próprio, comprando ao concedente os produtos para revender e, por isso, suporta pessoalmente os riscos da sua atividade.
A atividade do concessionário tem como contrapartida um lucro, que consiste na diferença entre o preço de compra e o preço de revenda dos produtos.
Ou, agora nas palavras de Pinto Monteiro,[16] por tal contrato atribui-se a outrem o "privilégio" de comercializar bens "pré-vendidos", seja pela notoriedade da marca, seja pela integração numa rede de distribuição, seja pela publicidade de que beneficiam esses produtos, seja, enfim, pela vantagem concorrencial e as oportunidades de ganho em face dos demais comerciantes.
Deste modo o produtor afasta de si os riscos da comercialização, ao mesmo tempo que assegura o escoamento dos seus produtos sem perder o controlo da distribuição e sem arcar com os custos de organização e outros que teria de suportar se acaso fosse ele a encarregar-se da distribuição.
A concessão revela-se num contrato-quadro, que faz surgir entre as partes uma relação obrigacional complexa, por força da qual uma das partes se obriga a vender à outra e esta se obriga a comprar para revenda determinada quota de bens, aceitando o concessionário certas obrigações e sujeitando-se a um certo controlo e fiscalização por parte do concedente.
Como contrato-quadro, a concessão comercial funda uma relação de colaboração estável, duradoura, de conteúdo múltiplo, cuja execução implica, designadamente, a celebração de futuros contratos entre as partes, pelos quais o concedente vende ao concessionário, para revenda, nos termos previamente estabelecidos, os bens que este se obrigou a distribuir. O concessionário atua em seu nome e por conta própria, adquire a propriedade da mercadoria (em princípio, pelo menos), compra para revenda e assume os riscos da comercialização.
Resulta porém da matéria de facto que estes contratos de distribuição celebrados entre a Autora e as sociedades comerciais B... e C... (aparentemente válidos), que estiveram na base do relacionamento comercial desenvolvido ao longo de 4 anos, foram celebrados com base em erro, na forma de DOLO, provocado intencionalmente pelas pessoas singulares que se encontravam a gerir os destinos daquelas sociedades comerciais e a coberto da personalidade jurídica das mesmas.
Provou-se, com efeito, que destinando-se aquele preço especial de 10€ e de 9€ à venda do produto no mercado angolano (porque nesse mercado havia que contar com despesas de transporte, despesas alfandegárias, despesas com a publicidade do produto, etc) as sociedades B... e C... nenhum produto venderam durante aqueles quatro anos no mercado angolano e moçambicano, tendo ao invés procedido à revenda dos mesmos no mercado europeu, beneficiado de uma margem de lucro significativa, pois que, tal como se provou, se a Autora soubesse que os mesmos se destinavam ao mercado nacional ou europeu, nunca os teria vendido àquelas sociedades àquele preço, mas sim ao preço habitual de venda, significativamente superior. (de €16,34 – ver facto 70).
Essa situação permitiu àquela Ré B... (e consequentemente ao Réu AA, praticamente o único sócio acionista daquela) e à Ré C... (e consequentemente á sua socia única BB), obterem uma margem de lucro muito superior àquela que obteriam se a autora lhe tivesse fornecido aqueles produtos ao preço que habitualmente praticava.
Resulta da factualidade provada ad abundantia, tal como se reconhece na sentença, que os lucros obtidos por estas duas sociedades comerciais só foram possíveis à custa do engano da autora, que lhes forneceu o ACCU CHEK AVIVA 50 T, a um preço muito inferior ao por si habitualmente comercializado, permitindo-lhes obter margens de lucro que doutra forma não obteriam, engano esse que foi levado a cabo pelas pessoas singulares que criaram aquelas sociedades como “capa”, para esconderem os interesses pessoais por si prosseguidos e atuaram de forma concertada de molde a esconderem essa realidade da Autora.
A Autora foi assim enganada, propositadamente induzida em erro, que só foi possível pelo conluio dos três Réus pessoas singulares, os quais atuando de forma concertada, tal como se entendeu na sentença, lograram convencer a autora que contratava com empresas sérias que revendiam o produto por si comercializado no mercado africano, quando contratava afinal com o seu funcionário AA (acionista em 99,6% da B...) e com irmã deste, (BB, sócia única da C...) e com o marido desta CC, o administrador da B..., que se relacionava também com a autora em representação da C..., os quais montaram entre si um “esquema”, mediante o qual, aproveitando-se do facto daquele AA ser o responsável pelas vendas da Autora para o mercado africano e o “fiscalizador” do sucesso ou insucesso das mesmas vendas, lhes permitiu obter da Autora o ACCU CHEK AVIVA 50T a preços que a Autora nunca lhos venderia se soubesse, primeiro que estava a vender a um seu funcionário e familiares destes, segundo que os produtos iam ser vendidos por aqueles no mercado europeu, o que lhe causou prejuízos.
Os factos revelam sem margem para dúvidas que o engano resultou duma atuação conjunta dos três Réus, pessoas singulares, o titular do capital social da B..., simultaneamente colaborador da Autora, AA, da sua irmã, a Ré BB, sócia única da sociedade C... e do seu marido, CC, que era o administrador da B... e se apresentava também perante a autora a representar a sociedade da mulher.
Tratou-se duma atuação conjunta, em que cada um desempenhou o seu papel, de molde a criar a convicção na autora de que contratava com empresas que nada tinham a ver com o seu funcionário de confiança e responsável pelos novos clientes e pelo mercado africando, AA e a esconder essa situação, bem como a criar a convicção de que as vendas em África estavam a ser um sucesso comercial, sendo que a criação da C... serviu ainda para aumentar o lucro, possibilitando mais vendas (sendo que esta sociedade revendida á B... o que comprava á autora) e para credibilizar o sucesso de tal mercado.
Ora como bem sintetizou a Apelada, na resposta ao recurso, a factualidade provada é bem demonstrativa de que:
“Servindo-se das Apelantes B... e C..., os Apelantes AA, BB e CC:
a. Omitiram à Apelada as suas ligações familiares;
b. Omitiram que o Apelante AA era titular de 99,6% do capital social da Apelante B... e que a Apelante C... fora constituída pela irmã do Apelante AA;
c. Omitiram que a Apelante C... revendia à Apelante B... tudo o que adquiria à Apelada;
d. Em especial, o Apelante AA, enquanto Head of Market Access & Key Account Manager da Apelada, serviu-se da sua influência e posição privilegiada no seio da organização da Apelada e da confiança que os restantes membros da liderança desta em si depositavam para os convencer do potencial do mercado africano e da importância inerente ao estabelecimento de uma parceria comercial com a Apelante B.... Para tal, os Apelantes pessoas singulares construíram uma narrativa baseada na (suposta) presença e relevante posicionamento das Apelantes pessoas coletivas nos mercados africanos;
e. Em especial, o Apelante AA, criou na Apelada a convicção enganosa de que o sucesso da aposta no mercado africano pressupunha a aplicação de um preço inferior ao praticado no mercado europeu;
f. Os Apelantes pessoas singulares asseguraram consistentemente que o Accu-Chek Aviva 50T estava a ser exportado para Angola e Moçambique, asseverando igualmente o Apelante AA ter visto e analisado documentos comprovativos da exportação do produto para Angola e Moçambique (sabendo-se hoje que nenhuma embalagem de Accu-Chek Aviva 50T foi vendida pelas Apelantes B... e C... no mercado africano); e
g. Os Apelantes pessoas singulares garantiram que a reimportação de Accu-Chek Aviva 50T para a Europa não só não estava a ocorrer, como não seria economicamente viável.”
Do exposto resulta que dúvidas não há de que a vontade de contratar da Apelada foi totalmente condicionada pela atuação dos Apelantes e, bem assim, que caso a Apelada conhecesse a veracidade dos factos omitidos e deturpados pelos Apelantes, nunca teria decidido contratar com as Apelantes B... e C..., tal como se provou.
É certo que, se se atender à personalidade jurídica das sociedades comerciais e à sua individualidade jurídica decorrente do art. 5º do C.Soc. Comerciais, não podem estas sociedades (que contrataram com a autora omitindo informação relevante e induzindo-a em erro quanto ao destino das mercadorias vendidas) ser confundidas com os seus sócios (os Réus AA, quanto à B... e BB quanto à C...), os quais beneficiam ademais do princípio da separação de patrimónios.
Porém, tal como reconhecem a doutrina e a jurisprudência, a personalidade coletiva não tem um valor absoluto[17] e “todas as instituições de criação humana estão sujeitas a abusos”.
A “peça-chave” no erro em que a autora foi induzida, sem o qual estes negócios não teriam sido possíveis de concretizar, foi o funcionário da própria Autora, o Réu AA, que na área de negócios Diabetes Care Portugal da Autora era o responsável pela gestão dos principais clientes, entre os quais se incluíam as rés pessoas coletivas.
Para a responsabilização pessoal destes sócios e do terceiro, CC, que era o administrador da B... e também se apresentava perante a Autora como representante da C..., cuja atuação foi igualmente necessária para o artificio criado necessário para enganar a autora, é necessário convocarmos o instituto da desconsideração da personalidade jurídica das pessoas coletivas.
Este instituto surge precisamente para fazer face a comportamentos abusivos e para resolver problemas reais postos pela personalidade coletiva.
Admite-se assim, excecionalmente, a responsabilidade dos sócios, ou de terceiros, quando aqueles tenham um comportamento ainda que formalmente correto que se traduza na utilização da pessoa coletiva para um fim contrário ao direito.
Fala-se em desconsideração da personalidade jurídica, “quando a personalidade coletiva seja usada de modo ilícito ou abusivo, para prejudicar terceiros, existindo uma utilização contrária a normas ou princípios gerais, incluindo a ética dos negócios, é possível proceder ao levantamento da personalidade coletiva: é o que a doutrina designa pela desconsideração ou superação da personalidade jurídica coletiva”.[18]
Nos casos de desconsideração, a própria sociedade (pessoa coletiva) desvia-se da rota traçada pelo ordenamento jurídico, optando por um comportamento abusivo e fraudulento que não pode ser tolerado na utilização funcional da sociedade ou de que aquela conduta não é substancialmente da sociedade mas do ou dos seus sócios (ou ao invés). A sociedade é, assim, utilizada para mascarar uma situação; ela serve de véu para encobrir uma realidade.[19]
Baseando-se, nomeadamente, no princípio da boa fé, o direito deve abdicar, em alguns casos de exceção, da autonomia da personalidade jurídica coletiva, em ordem a tutelar uma situação sem a violentar face à realidade prática. Aproximando-se, no fundo, da vida tal como ela é.
Tal responsabilidade pode fundamentar-se no art. 334º do C.C sobre o abuso de direito, entendendo-se que a generalidade das pessoas tem o direito de constituir pessoas coletivas e de exercerem atividades por intermédio delas, mas esse direito tem limites impostos pela boa-fé, pelos bons costumes ou pelo fim económico ou social desse direito.
Com efeito, no artigo 334º do Código Civil, a lei expressa ser ilegítimo o exercício de um direito quando o seu titular exceda manifestamente os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito (artigo 334º do Código Civil).
Reporta-se, pois, este artigo à existência de um direito substantivo exercido com manifesto excesso em relação aos limites decorrentes do seu fim social ou económico, em contrário da boa fé ou dos bons costumes, proibindo essencialmente a utilização do poder contido na estrutura do direito para a prossecução de interesses exorbitantes do fim que lhe inere.
A desconsideração tem de envolver sempre um juízo de reprovação sobre a conduta do agente, ou seja, envolve sempre a formulação de um juízo de censura e deve revelar-se ilícita, havendo que verificar se ocorre uma postura de fraude à lei ou de abuso de direito.».
O atentado a terceiros verifica-se sempre que a personalidade coletiva seja usada de modo ilícito ou abusivo para os prejudicar. Esta utilização deve ser contrária às normas ou princípios gerais. O abuso do instituto da personalidade coletiva, por seu lado, é uma situação de abuso do direito ou de exercício inadmissível de posições jurídicas. O comportamento que desencadeia o levantamento ou a desconsideração vai caracterizar-se por atentar contra a confiança legítima ou por defrontar a regra da primazia da materialidade subjacente.
No caso do Réu AA, a constituição da B..., (criada com a finalidade de intervir neste negócio, gizado pelos Réus) não estamos sequer perante um comportamento “formalmente correto”, já que aquele, enquanto colaborador da autora, ademais com poder de decisão quantos aos novos clientes, atuou em violação manifesta das regras de conduta da autora, concretamente das normas reguladoras do conflito de interesses da Autora, que ele bem conhecia.
Já os Réus BB e CC, apesar do seu comportamento na constituição da C... e representação daquelas sociedades se apresentar como formalmente “correto”, não o é, porque aquela sociedade só foi constituída para esconder a relação familiar sob a veste societária, permitindo ampliar os lucros que podiam ser obtidos da forma supra descrita, isto é visando atingir um fim ilegítimo visível num resultado danoso.
O ponto de partida da desconsideração é a constatação de que a pessoa coletiva foi abusivamente utilizada pelos seus membros.
Da factualidade provada resulta que no percurso comportamental, foi evidenciada a grave violação pelos três RR da boa fé e da ética dos negócios, em que sobressai a utilização abusiva, em seu proveito, do fim social ou económico próprio da separação patrimonial das sociedades B... e C....
Avultam a confusão ou promiscuidade entre as esferas jurídicas de duas ou mais pessoas, normalmente entre a sociedade e os seus sócios.
Em todas estas situações verifica-se que a personalidade coletiva é usada de modo ilícito ou abusivo para prejudicar terceiros, existindo uma utilização contrária a normas ou princípios gerais, incluindo a ética dos negócios.
Segundo Pedro Cordeiro,[20] deve entender-se por desconsideração “o desrespeito pelo princípio da separação entre a pessoa coletiva e os seus membros ou, dito de outro modo, desconsiderar significa derrogar o princípio da separação entre a pessoa coletiva e aqueles que por detrás dela atuam”.
Na jurisprudência ver por todos, o acórdão do STJ 7.11.2017[21]em cujo sumário pode ler-se:”I - O princípio da atribuição da personalidade jurídica às sociedades e da separação de patrimónios, ficção jurídica que é, não pode ser encarado, em si, como um valor absoluto e não pode ter a natureza de um manto ou véu de proteção de práticas ilícitas ou abusivas – contrárias à ordem jurídica –, censuráveis e com prejuízo de terceiros.
II - Assim, quando exista uma utilização da personalidade coletiva que seja, ou passe a ser, instrumento de abusiva obtenção de interesses estranhos ao fim social desta, contrária a normas ou princípios gerais, como os da boa fé e do abuso de direito, relacionados com a instrumentalização da referida personalidade jurídica, deve atuar a desconsideração desta, depois de se ponderarem os verdadeiros interesses em causa, para poder responsabilizar os que estão por detrás da autonomia (ficcionada) da sociedade e a controlam.”[22]
O atentado a terceiros verifica-se sempre que a personalidade coletiva seja usada de modo ilícito ou abusivo para os prejudicar. Esta utilização deve ser contrária às normas ou princípios gerais. O abuso do instituto da personalidade coletiva, por seu lado, é uma situação de abuso do direito ou de exercício inadmissível de posições jurídicas. O comportamento que desencadeia o levantamento ou a desconsideração vai caraterizar-se por atentar contra a confiança legítima ou por defrontar a regra da primazia da materialidade subjacente.
Quanto ás consequências jurídicas da desconsideração da personalidade coletiva, entende-se que podendo os tipos de abuso ser da mais variada índole, as consequências variam na mesma razão direta, pelo que, “consoante o tipo de abuso em concreto, assim será a consequência jurídica dele proveniente”.[23]
A desconsideração tem de envolver sempre um juízo de reprovação sobre a conduta do agente, ou seja, envolve sempre a formulação de um juízo de censura e deve revelar-se ilícita, havendo que verificar se ocorre uma postura de fraude à lei ou de abuso de direito.
Considerando a necessária concertação da atuação destas pessoas, ligadas entre si por laços familiares, e à finalidade por todos prosseguida – obter o maior número possível de ACCU CHEK AVIVA 50T ao “preço de desconto” – todos os Réus, pessoas singulares deverão ser pessoalmente responsabilizadas de igual forma, que aquelas sociedades, em regime de solidariedade.
Desta forma, entendemos que deva manter-se a responsabilização daqueles sócios, pelos prejuízos causados á Autora, tal como decidida na sentença.
Isto posto, esclarece-se que a responsabilidade decorre, tal como foi decidido na sentença do DOLO.
Os contratos a que se reportam os autos foram celebrados no âmbito da autonomia da vontade das partes – art. 405º do C.Civil. Tratam-se de contratos formalmente válidos.
Se é certo que, na nossa ordem jurídica, não existe uma norma que conceda expressamente proteção aos interesses das partes nas negociações, o certo é que o princípio da autonomia privada é um dos seus princípios basilares e não pode ser visto formalmente.
Assim, a materialização da liberdade contratual consiste na instituição das condições necessárias para o exercício de uma liberdade contratual efetiva. Ora, na prática, as partes só poderão exercer de forma verdadeiramente livre a sua faculdade de celebrar os contratos que bem entenderem, de acordo com os seus interesses, se se encontrarem informados corretamente.
Nos termos do artigo 253º nº 1 do C.C., “entende-se por dolo qualquer sugestão ou artifício que alguém empregue com a intenção ou consciência de induzir ou manter em erro o autor da declaração, bem como a dissimulação, pelo declaratário ou terceiro, do erro do declarante”.
Com vem sendo entendido, a relevância do dolo depende de três fatores:
-que o declarante esteja em erro;
-que o erro tenha sido causado ou dissimulado pelo declaratário;
-que o declaratário haja recorrido a qualquer artifício, sugestão ou embuste, o que ocorre na situação em apreço.
O artificio consistiu na criação duma ideia distorcida sobre a realidade contratual, quer quanto aos reais contratantes, (que eram na realidade o colaborador da autora e os seus familiares), quer quanto à finalidade do negócio, que mais não era que a de colocar no mercado europeu, através das “exportações paralelas” o ACCU CHEK AVIVA 50T, a um preço mais baixo que garantia, por um lado o escoamento do produto, por outro a obtenção de margem de lucro doutra forma não atingíveis.
Como é sabido, o dolo é uma espécie agravada de erro, é um erro provocado, de tal modo que, como salientou o Prof. Menezes Cordeiro, citando Castro Mendes, “a relevância do dolo depende duma dupla causalidade: é preciso que o dolo seja determinante do erro e o erro determinante do negócio”.[24]
É um erro que se situa na formação do negócio jurídico, portanto em momento pelo menos logicamente anterior a este, existindo assim uma estreita relação entre o instituto da responsabilidade pré-contratual e o regime do erro-vício.
Ora, ao contrário do preconizado pelos Apelantes neste recurso, o dolo não releva apenas enquanto erro vício da vontade, suscetível de anular o negócio jurídico, já que a indemnização, como efeito do dolo é conferida autonomamente, como é reconhecido pela doutrina.
O dolo, como comportamento antijurídico (o nº 2 do art. 253º refere-se a “dolo ilícito”) é suscetível de fundamentar a responsabilidade civil do deceptor.
Como refere Mota Pinto, “A reparação do prejuízo causado é visada com a responsabilidade civil que impende sobre o deceptor e não com a anulabilidade.
A obrigação de indemnizar é assim um efeito do dolo, autónomo relativamente à anulabilidade, surgindo mesmo quando não se verifiquem todos os requisitos do exercício do direito de anular ou este já tenha caducado.[25]
Há dolo relevante quando o declarante haja caído em erro por efeito da conduta artificiosa de outrem, ou, tal como diz a lei (artº254°,nº1), quando a vontade do declarante «tenha sido determinada por dolo».
A lei portuguesa «não estabelece um regime específico para a responsabilidade pré-contratual. Limita-se a determinar, nos termos do art.º 227º do C.C que quem violar culposamente os deveres nascidos da regra da boa-fé, no processo de formação de um contrato, responde pelos danos causados à outra parte. A forma como deve responder não está determinada em especial, pelo que temos de recorrer ao regime geral dos arts. 562º e seguintes. O princípio geral é precisamente o desta norma: “Quem estiver obrigado a reparar um dano deve reconstituir a situação que existiria, se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação”.
A nossa lei não distingue entre a obrigação de indemnização proveniente da responsabilidade extracontratual e a obrigação de indemnização proveniente da responsabilidade contratual, aplicando aquele preceito a ambos os tipos de responsabilidades.
Desta forma, apurada a obrigação de indemnizar por todos os Réus, com fundamento em dolo, importará agora apurar o valor da mesma.
Para tanto, há que considerar que a responsabilidade em que incorre o faltoso com fundamento no dolo, obrigá-lo-á a indemnizar o interesse negativo ou de confiança da outra parte, de modo a colocar esta na situação em que se encontraria se o contrato não tivesse sido celebrado.
Destina-se a indemnização, a reparar os interesses contratuais negativos, ou seja, o prejuízo que a parte teve com o facto de se ter realizado o contrato, ou ainda, por outras palavras, o prejuízo que ela não teria sofrido se o contrato não tivesse sido celebrado.
Não interessa pois aqui apurar os eventuais danos decorrentes da frustração do negócio no mercado africano,[26]
Interessa sim apurar o prejuízo sofrido pela autora pelo facto de ter celebrado aqueles contratos com a B... e C....
No “relatório de quantificação dos danos” elaborado pela R... que constitui o doc. 20 junto com a p.i., que incidiu apenas nos prejuízos sofridos no âmbito do contrato de distribuição celebrado em por escrito em 2016, deixando de fora, o relacionamento anterior da Autora com a B... e todo o relacionamento da Autora com a C..., por não existir ainda acesso à faturas das vendas, tendo esse grupo de danos ficado por liquidar na sentença, foi calculado a titulo de lucro cessante da autora no mercado europeu (reportando-se ao preço de venda das Rés naquele mercado), a quantia de € 5.147.793 euros, valor que foi acolhido na sentença.
Assim, quanto á B..., provou-se que no período abrangido pelo contrato de distribuição que vigorou a partir de 21.2.2016, tal valor ascende a €5.147.793,00 euros, de acordo com os cálculos efetuados naquele relatório.
Tal como se provou, a Autora (integrada na E...) atua referencialmente no mercado nacional – sendo este o mercado para o qual dirige a venda daquele produto.
Daí que seja nosso entendimento que rigorosamente, o valor do prejuízo deveria ser calculado, pela margem de lucro que deixou de auferir reportada ao valor da venda no mercado nacional.
Porém, nada a impedia de o vender para o mercado europeu (onde preferencialmente atuam as demais subsidiárias da E..., com implantação nos outros países europeus.
Na sentença foi apresentada a seguinte justificação para o cálculo adotado: “No caso, os danos reconduzem-se às perdas das margens de lucro perdidas pela Autora, já determinadas no período de vigência do contrato escrito outorgado com a B... e que se reconduzem ao valor que esta auferiria se vendesse ela própria, como se provou poder vender, pelo menos ao preço que aquela vendeu os produtos em causa.
Ou seja, a Autora não pretende, nem mais, nem menos do que aquilo que a B... auferiu com a ilicitude da sua conduta, valor que se apurou ascender a €5.147.793, tanto mais que a Ré, por opção própria, nem sequer alegou que custos suportou com essas vendas que a própria Autora teria igualmente suportado, se é que os suportou (bastaria que o transporte, que se nos afigura ser a parcela que eventualmente pudesse ser mais pesada, fosse suportada pelo comprador, situação comum em transações internacionais).”
Não afastamos tal cálculo pelas seguintes razões.
Não destinando a Autora aquele produto, preferencialmente à venda no mercado europeu (que lhe permitiria ter auferido aquela margem de lucro de € 5.147.793 euros (efetivamente percebida pelos Réus), o certo é que não estava impedida de o fazer.
O segundo argumento é o de que, visando a indemnização reparar o prejuízo causado pelo ato ilícito, tem ínsito um caráter sancionatório, sendo que doutra forma, estar-se-ia a premiar os lesantes, pois o lucro destes, é constituído pela contrapartida económica traduzida na diferença entre o preço por que comprou os produtos à autora e o preço por que os revendeu.
Daí que entendamos ser de manter o valor fixado na sentença.
Discordam os apelantes que se recorra ao valor bruto a que foi atendido no cálculo dos danos, - a margem bruta – dizendo que, quando muito deveria ter sido calculada, ao invés a margem líquida que é apurada após a dedução de todas as despesas que lhe dão origem (nomeadamente, devoluções, abatimentos, descontos, impostos, transportes, seguros, instalações, trabalhadores, etc.).
De acordo com o “relatório de quantificação de danos” elaborado pela R..., junto aos autos, os cálculos foram efetuados tendo por pressuposto que, “As margens brutas (ou “lucros brutos”) referidas ao longo presente Capítulo e do Capítulo 7, independentemente da entidade a que se refiram, têm sempre por base o apuramento do valor das vendas realizadas a terceiros, subtraído dos custos incorridos com a compra do Produto Aviva 50T vendido. Por conseguinte, a margem bruta representa o resultado obtido por uma empresa através da venda de produtos após deduzidos os custos diretos associados.”
Acontece que o que estamos a calcular é o que a autora deixou de auferir, não fora o contrato celebrado, pelo que, tal como alega a Apelada, “a diferença entre o preço de € 9 e o valor a que a Apelante B... vendeu na Europa é margem líquida da Apelada, uma vez que o preço de € 9 já absorveu todos os custos da Apelada na produção e distribuição.”
Em conclusão, entendemos ser de manter a indemnização fixada pelo valor de €5.147.793,00 euros, relativa aos prejuízos sofridos no período temporal em que vigorou o contrato de distribuição celebrado em 21.2.2016 até ao seu termo.
6.2 DOS DIREITOS DAS CONGÉNERES EUROPEIAS:
A Autora, peticionou na ação indemnização, relativa à margem perdida pelas suas congéneres europeias, fruto das vendas de Accu-Chek Aviva 50T, pelas Rés B... e C... na Europa.
A Autora para além dos danos por si sofridos, apresenta-se nesta ação a reclamar uma indemnização, pelos danos sofridos pelas suas congéneres europeias, integradas na pluralidade de subsidiárias direta ou indiretamente detidas pela E...:
- a E... Diabetes Care Deutschland GmbH (entidade que atua preferencialmente na Alemanha)
-a E... Diabetes Care Limited (entidade que atua preferencialmente no Reino Unido,
-a E... Diabetes Care Spain, S.L. (entidade que atua preferencialmente em Espanha,
-a E... Diabetes Care Nederland B.V., (entidade que atua preferencialmente nos Países Baixos e
-a UAB E... Lietuva (entidade que atua preferencialmente na Lituânia.
As subsidiarias do grupo E... (da Alemanha, Espanha, Países Baixos, Lituânia e Reino Unido) cederam à autora os seus direitos a reclamar indemnização pelos prejuízos causados em consequência da atuação da B... no mercado europeu, conforme documento 67 junto à p.i..
Decorre do documento junto que apenas foram cedidos à autora os direitos à indemnização que venham a ser reconhecido àquelas subsidiárias, decorrentes dos eventuais prejuízos decorrentes da atuação da B... temporalmente delimitados, pois apenas referidos aos anos de 2016 e 2017, ou seja, sofridos na vigência do contrato de distribuição celebrado pela autora em 2016.
A cessão de créditos, atento o disposto no art. 577º do C.Civil, pode ser definida como o contrato pelo qual o credor transmite a terceiro, independentemente do consentimento do devedor, a totalidade ou parte do seu crédito, destacando-se no seu regime legal o facto da mudança de credor prescindir do consentimento do devedor.
Mostra-se assim necessário para o reconhecimento do direito da Autora na qualidade de cessionárias dos créditos das suas congéneres europeias, a demonstração de que as mesmas são titulares de créditos indemnizatórios sobre os ora Réus, pelos prejuízos que alegam lhes ter sido causados, com a atuação ilícita dos Réus.
Baseia-se a pretensão da Autora, quanto a estas suas congéneres, na constatação de que houve a ocupação duma quota de mercado existente nos mercados europeus, onde aqueles subsidiárias atuam, decorrente dos produtos vendidos pela B... terem sido adquiridos a um preço “descontado” substituindo assim as vendas que aquelas subsidiárias ali fariam.
No documento de cedência de créditos, consta uma previsão em forma de mapa das Exportações feitas pela Ré B... na Alemanha, Espanha, Países Baixos, Reino Unido e Lituânia, declarando que em consequência da atuação da B... com a Autora, sofreram “lost profits”, ou perda de lucros, no valor de €5.147,793 (ou outro que seja demonstrado perante os tribunais portugueses), resultante da diferença entre o preço de €9 euros que foi pago pela B... à Autora e o preço de venda daquele produto pela B... nos identificados países.
Isto posto, insurgem-se os Apelantes, quanto à condenação na indemnização que seria devida às congéneres europeias da Autora, desde logo afirmando que “a A. não distinguiu que danos foram sofridos por si e que danos foram sofridos pelas suas subsidiárias, sendo certo que, tendo sido produzidos danos em cada um dos territórios em que essas subsidiárias atuam, cada uma delas teria apenas direito – se estivessem preenchidos os pressupostos da responsabilidade, mas não estão, como se verá – aos danos sofridos no respetivo território, sendo que a A., nesse caso, não teria sofrido qualquer dano, porque o facto que imputa aos Réus é a revenda, mediante exportação dos produtos adquiridos à A., para diversos países europeus, e não a revenda daqueles em território nacional.” E que “Esta circunstância, levantada pelos Réus na contestação e decisiva para uma boa decisão do litígio, foi completamente ignorada pelo tribunal a quo na sentença proferida, o que dificulta o exercício de impugnação por parte dos Réus, já que não sabem a que título lhes foi imputada a responsabilidade na sentença recorrida, nem sequer quem é a sua contraparte nessa responsabilidade.”
E chama a atenção, a respeito desta matéria para a “existência de regras comunitárias que proíbem a A. de impedir os seus clientes – o que se aplica evidentemente aos Réus – de exportarem livremente os seus produtos entre os Estados membros da União Europeia.”
E acrescenta que o tribunal, a este respeito, (i) não só errou na determinação da norma aplicável, pois que aplicou os artigos 101.º e 102.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (“TFUE”), inseridas no capítulo atinente às regras da concorrência, quando deveria ter evidentemente aplicado, tal como aliás é referido na contestação (artigo 179.º), o artigo 28.º do TFUE, atinente à livre circulação de mercadorias, (ii) como concluiu, muito erradamente, que o direito da União Europeia não se aplica por não subsistirem “dúvidas de que o mercado das sucessivas vendas eram os países dos Palop’s que as partes identificaram, ainda que tratando-se de sociedades com sede na União Europeia, não lhe são aplicáveis as regras europeias relativas à concorrência, tanto mais que se não vislumbra qualquer efeito anti concorrencial, direto ou indireto, que pudesse desses acordos resultar no espaço europeu.”
Vejamos.
Concordamos com os Apelantes no sentido de que tem de ser feita uma separação precisa destas situações, como já deixamos antever: por um lado a apreciação do direito indemnizatório da autora, baseado no facto ilícito dolo e, por outro, o eventual direito de cada uma das congéneres europeias da autora, pertencentes ao mesmo grupo empresarial, a E..., que note-se não é parte nesta ação e que foram por aquelas cedidos à Autora.
Com efeito, não tendo aquelas empresas contratado de alguma forma com a ré B..., a pretensão indemnizatória terá que ser assentar noutra fonte obrigacional, que não a da responsabilidade contratual.
Pretende a Autora ver reconhecido que as mesmas sofreram danos decorrentes da B... ter introduzido no mercado europeu e concretamente no mercado onde cada uma daquelas sociedades atua preferencialmente o produto ACCU CHEK AVIVA 50T, a preços mais baixos, assim desviando os consumidores que adquiririam direta ou indiretamente os produtos comercializados por aquelas, deixando dessa forma de obter as margens de lucro que doutra forma esperariam.
O mercado em causa é um mercado inelástico, na medida em que está diretamente relacionado com o numero de aparelhos de medição de glicémia onde aquelas tiras podem ser aplicadas, (comercializados pela E...) sendo que não se provou que a B... tivesse colocado simultaneamente no mercado mais aparelhos medidores, o que significa que os consumidores (doentes diabéticos) do ACCU CHEK AVIVA 50 T, já eram consumidores desse produto.
Alega a Autora que, considerando que o que permitiu a comercialização daquele produto a preços mais baixos pela B... no mercado europeu, foi o engano da subsidiária portuguesa, que forneceu aqueles produtos a esse preço, por ter sido “erroneamente” convencida que os mesmos se destinavam ao mercado africano, então, segundo a Autora, a infratora deverá ser também condenada no prejuízos que causou àquelas empresas.
Resulta da matéria de facto que efetivamente a atuação da B..., teve algum impacto no mercado europeu, pois implicou a ocupação duma quota de mercado existente nos mercados europeus por parte do Produto Aviva 50T que a B... aí destinou, adquirido a um preço” descontado”, substituindo vendas da E... nestes mercados, feitas pelas suas subsidiárias.
Por um lado, a perda de rendimento de cada uma dessas subsidiárias teria de corresponder ao ganho ou margem líquida que as mesmas teriam auferido se tivessem sido elas a vender o produto que foi revendido pela Ré B... em território europeu.
Efetivamente, destinando a Autora preferencialmente os produtos que comercializa ao seu mercado nacional, apesar de os poder comercializar no mercado europeu onde funcionam as suas congéneres, pelo facto da B... ter revendido o ACCU CHEK AVIVA 50T naqueles outros países europeus, ademais a preços competitivos, parece incontestável que a atuação da B... levou a uma ocupação da quota de mercado existente nos mercados europeus por parte do Produto Aviva 50T que a B... que, doutra forma, não seria ocupada, com aqueles produtos comercializados pela Autora, que os destinaria preferencialmente ao mercado nacional.
A prática de um distribuidor exportar produtos adquiridos ao fabricante a um preço inferior para outros países europeus onde é vendido a um preço superior é vulgarmente conhecido como de “exportação paralela”.
Acontece que, não se cuida aqui se aferir eventuais perdas sofridas pela E..., que não é parte na ação, mas de cada uma das suas subsidiarias individualmente consideradas, as quais, individualmente cederam os seus direitos à Autora, pelo que haverá que relativamente a cada uma delas, apurar se verificam os pressupostos da responsabilidade civil, necessários para o reconhecimento da sua pretensão indemnizatória.
Ora, o que ocorreu, relativamente às subsidiárias, em consequência da atuação da B..., ao revender os produtos que adquiriu à autora naqueles países europeus, todos eles pertencentes à União Europeia, foi o fenómeno das “exportações paralelas”, que não sendo um fenómeno acarinhado ou incentivadas pela E..., ao atuar no mercado europeu através daquelas sociedades, também não é proibido.
Inexiste tal proibição, pelo facto de, nas relações comerciais entre as empresas dos países dos Estados Membros da União Europeia, como são a autora e as suas congéneres, as mesmas se encontrarem obrigadas a respeitar desde logo os princípios fundamentais e regras aplicáveis nos países da União Europeia, em que avulta o direito à livre circulação de mercadorias originárias dos Estados-Membros e de produtos provenientes de países terceiros que se encontrem em livre prática nos Estados-Membro (cf. artigos 26.º e 28.º a 37.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia).
Aliás, como decorre da matéria de facto provada, o fenómeno das “exportações paralelas” é um fenómeno que ocorre com frequência no âmbito do Grupo E..., e consta mesmo das previsões que anualmente faz.
Ora, tratando-se duma pretensão indemnizatória, terá a mesma que fundar-se num ato ilícito.
Porém, relativamente às subsidiárias da Autora, o que aconteceu é que estas viram um distribuidor português – a B... – revender nos respetivos mercados onde atuam preferencialmente, assistindo dessa forma à exportação paralela do produto em causa nos respetivos mercados onde atuam preferencialmente.
Sem se pretender dar cobertura à fraude, porquanto a fraude por dolo é sancionada no âmbito do relacionamento pessoal entre o deceptor e a enganada, onde a mesma ocorreu, os eventuais “danos colaterais” sofridos pelas subsidiárias, que viram aqueles produtos ser objeto de exportações paralelas, que provavelmente não teria ocorrido doutro forma, pelo menos com a mesma intensidade, não podem ser considerados danos, porquanto no âmbito do mercado de livre concorrência, as exportações paralelas não podem ser proibidas, a não ser num quadro de infração às regras europeias, através de práticas proibidas, como acordos comerciais horizontais ou verticais “suscetíveis de afetar o comércio entre os Estados membros”, nos termos dos artigos 81º e 82º do Tratado, o que não foi sequer discutido nesta ação.
Os danos económicos sofridos por terceiros (neste caso, as congéneres europeias) jamais poderiam ser tutelados por força da suposta violação de contratos celebrados com a A., uma vez que a responsabilidade civil obrigacional, que resulta da violação de posições jurídicas creditícias, só é eficaz em relação ao devedor.
As congéneres europeias teriam, quando muito a expetativa, atenta a estrutura organizacional da E... na Europa, que a Autora vendesse preferencialmente no seu mercado.
Porém, não têm forma de impedir as “exportações paralelas”, tal como a que ocorreu na situação em apreço, que veio a ocorrer enquanto “dano colateral” do dolo dos réus para com a autora.
Assim, não ocorre, perante as congéneres europeias por força “das exportações paralelas” geradas com a atividade comercial da B..., ilicitude, pois a tanto impedem as regras de funcionamento do mercado comum europeu.
Desta forma, por força das regras de funcionamento do mercado europeu, não existe ilicitude na atuação da B..., no mercado europeu suscetível de fundamentar a pretensão indemnizatórias destas sociedades europeias, congéneres da Autora.
Finalmente quanto à questão da necessidade do REENVIO PREJUDICIAL, os Apelantes requereram que este Tribunal faça uso do mecanismo de reenvio prejudicial previsto no artigo 267.º do TFUE com vista a esclarecer os termos de aplicação do artigo 28.º do TFUE.
Na situação em apreço, não se oferecem dúvidas, (não tendo o contrário sido defendido por nenhuma das partes), que as regras de Direito Europeu aplicáveis não podiam proibir a Autora de impedir a livre exportação dos seus produtos entre Estados-Membros, pelo que, sendo a exportação paralela permitida, as Apelantes B... e C... não estavam proibidas de vender na Europa os produtos que haviam adquirido à Apelada e, como tal, não praticaram qualquer ato ilícito.
Os tribunais dos Estados-Membros devem fazer uso do reenvio prejudicial para garantir a interpretação uniforme do direito da União Europeia quando as suas decisões não sejam suscetíveis de recurso judicial. Todavia, mesmo nesses casos, o reenvio não se justifica quando “a correta aplicação do direito da União se impõe com tal evidência que não dá lugar a qualquer dúvida razoável”.[27]
Desta forma, julga-se improcedente o pedido de reenvio.
V I- DECISÃO:
Pelo exposto e em conclusão acordam os Juízes que compõem este Tribunal da Relação do Porto, em julgar parcialmente procedente o recurso revogando parcialmente a sentença recorrida, apenas quanto ao pedido indemnizatório formulado pela Autora, na qualidade de cessionária dos créditos de E... Diabetes Care Deutschland GmbH; de E... Diabetes Care Limited, de E... Diabetes Care Spain, S.L.; de E... Diabetes Care Nederland B.V., e de UAB E... Lietuva, dele absolvendo os Réus, confirmando-se a sentença no demais.
Custas desde recurso a contar a final, na proporção do decaimento.
Porto, 11 de dezembro de 2024
Alexandra Pelayo
Artur Dionísio Oliveira
Márcia Portela
________________________________ [1] Seguimos o relatório feito na sentença por se mostrar correto e bem sintetizado. [2] Com a retificação introduzida por despacho de 9.2.2024. [3] In Código de Processo Civil Anotado, Vol. I, 2018, p. 617. [4] In “Estudos sobre o Novo Código de Processo Civil”, pág. 312) [5] Noções Elementares de Processo Civil, pág. 191. [6] Cf. Ac. do STJ de 06.10.2010, relatado por Henriques Gaspar no processo 936/08.JAPRT, acessível em www.dgsi.pt [7] Cf. Luís Filipe de Sousa in “O Standard de Prova no Processo Civil e no Processo Penal” janeiro de 2017, acessível em http://www.trl.mj.pt/PDF/O%20standard%20de%20prova%202017.pdf [8] E não na ordem em que os Apelantes o apresentaram nas alegações de recurso. [9] Entre parêntesis o facto 80, para se tornar compreensível o teor do facto impugnado. [10] Menezes Cordeiro, in Direito Bancário, pg. 400. [11] Antunes Varela, in Das Obrigações em Geral, Vol. I, 10ª edição, pgs 268 e 269. [12] Ver José Engrácia Antunes, in “Direito dos Contratos Comerciais”, Almedina, 6ª Reimpressão, pág. 435 e ss.). [13] Ver A. Menezes Cordeiro, Manual de Direito Comercial, I, 2001, págs. 494 e 496. [14] Pinto Monteiro, Contrato de Agência-Anotação. 3.ª ed., pg. 115, e RLJ, ano 130, pg.92. [15] In Novas Perspetivas do Direito Comercial, pág 124 e 125. [16] In Contratos de Distribuição Comercial, pág 107 e ss. [17] Ver Pedro Cordeiro, in “A desconsideração da Personalidade Jurídica das Sociedades Comerciais, pg. 72 e Menezes Cordeio, in Manual do Direito das Sociedades, I, 2004, pg. 335. [18] Cf. Menezes Cordeiro, in O Levantamento da Personalidade Coletiva no Direito Civil e Comercial, Almedina, 2000, p. 122 e ss e Pedro Cordeiro, in A Desconsideração da Personalidade Jurídica das Sociedades Comerciais, p. 77. [19] Cf. Pedro Cordeiro, ob. cit., p. 73, nota 75. [20] Ob. cit., pág. 19. [21] Disponível in www.dgsi.pt. [22] Também significativo nesta matéria, o acórdão do STJ de 26.6.2007, relatado por Tomé Gomes, disponível no mesmo sítio. [23] Ver Pedro Cordeiro, ob cit pg 166. [24] Tratado de Direito Civil Português I, Parte Geral, Tomo I, pág. 550. [25] Mota Pinto, Teoria geral do Direito Civil , 3ª edição, pg. 524. [26] No relatório de quantificação de danos elaborado pela R..., e que constitui o documento 20 junto com a p.i. foi feita uma “estimativa de perdas incorridas nos mercados africanos”. [27] Ver Maria Eugénia Martins Ribeiro no comentário ao artigo 267.º do TFUE no Tratado de Lisboa, Anotado e Comentado, Almedina, 2012, pg.964.