ACÇÃO PARA RESTITUIÇÃO E SEPARAÇÃO DE BENS
MASSA INSOLVENTE
CADUCIDADE
CITAÇÃO
NOTIFICAÇÃO
Sumário

1. Se não existe dúvida, por decorrência da previsão do art.º 146º, n.º1 do CIRE, aplicável por força do art.º 141º, n.º1, al. c) do mesmo diploma, que a ação de restituição e separação de bens da massa insolvente tem que ser instaurada contra os credores da insolvente, a citação destes é efetuada por meio de edital eletrónico publicado no portal Citius, pelo que, quer estejamos perante credores com mandatário constituído, quer perante credores sem mandatário constituído, a sua citação é, invariavelmente, efetuada por meio de edital eletrónico, não sendo o conhecimento da sua morada (que, naturalmente, existe, tendo em conta que estão em causa “credores” já identificados, que reclamaram os seus créditos no processo de insolvência) fator relevante para determinar a sua autónoma citação para os termos da ação.
2. Seria contraditório considerar que, onde a lei não reclama que os intervenientes, globalmente conhecidos, sejam pessoalmente citados/notificados para a ação, reclamasse, incoerentemente, que, apesar de não intervirem na lide, fossem notificados das decisões nela proferidas, gerando-se entorpecimento e dilação num processo que, até esse momento, seguiu uma tramitação célere.
3. Considerar que a decisão final proferida e notificada exclusivamente às partes diretamente intervenientes na ação, deveria igualmente ser notificada a todos os credores – já que todos têm “residência ou sede conhecida no processo”, conforme estipula o art.º 249º, n.º 5 do Código de Processo Civil – corresponde a uma interpretação que contraria as disposições do CIRE e que, por esse motivo, conforme impõe o art.º 17º, n.º 1, parte final, vê vedada a sua aplicação subsidiária ao processo de insolvência.
4. À ação de restituição e separação de bens são aplicáveis as disposições relativas à reclamação e verificação de créditos (art.º 141º do CIRE), resultando do disposto no art.º 140º a ausência de menção à publicação da sentença, notificada apenas nos moldes gerais previstos pelo art.º 220º, n.º1 do Código de Processo Civil – àqueles a quem possa causar prejuízo que, no caso concreto, serão as partes que diretamente intervieram no processo e que são afetadas pelo decidido, pelo que apenas às partes que defenderam posições na lide se impõe operar a notificação da decisão final.
5. Dado que a sentença foi proferida em ata, em diligência a que as partes intervenientes optaram por não comparecer apesar de convocadas para o efeito (art.º 638º, n.º 3 do Código de Processo Civil), será a data de realização dessa diligência a data de notificação relevante para efeitos de definição do termo inicial de contagem do prazo de recurso ordinário, ocorrendo o trânsito em julgado decorridos 15 dias sobre a data de notificação (atenta a natureza urgente do processo), iniciando-se, findo esse prazo, o termo inicial de contagem do prazo de 5 anos para interposição do recurso de revisão.

Texto Integral

Acordam na 1ª secção do Tribunal da Relação de Lisboa
I.
Por sentença datada de 19.07.2016, v…, ldª, foi declarada insolvente, tendo sido ordenada a imediata apreensão dos bens da insolvente para entrega ao administrador da insolvência.
Por apenso ao processo de insolvência, correu termos ação para restituição e separação de bens, nos termos do artigo 141º e seguintes do CIRE, instaurada por C, MS e LT contra a massa insolvente, a insolvente e todos os seus credores, tendo por objeto a fração A, do prédio sito na rua …, descrita na Conservatória do Registo Predial da Calheta sob o número …/20080417-A, pedindo as demandantes que:
- se reconheça que as autoras são donas e legítimas proprietárias da fração A melhor identificada na petição inicial;
- sejam os demandados condenados na separação e restituição da indicada fração às autoras, livre de ónus e encargos, ordenando o levantamento das hipotecas e das penhoras que incidem sobre a fração;
- seja suspensa a liquidação de bens.

Foi proferido despacho liminar a ordenar que fosse lavrado termo no processo de insolvência, bem como que fossem citados a massa insolvente, na pessoa do senhor Administrador de Insolvência, os credores por meio de edital eletrónico e a devedora insolvente para, querendo, contestarem a ação.
Com data certificada de 31.03.2017, foi publicado no portal Citius o edital de citação dos credores da massa insolvente (ref.ª citius 43852386), publicitando que correm éditos de cinco dias, contados da publicação do edital, citando os credores da massa insolvente, para no prazo de dez dias, findos os dos éditos, contestarem, querendo a presente acção (art.ºs 146.º e 148.º do CIRE), e na qual pretende o autor(a) que seja reconhecido(a) como dono e legítimo(a) possuidor(a) dos bens identificados na petição inicial, bem como ser ordenada a restituição dos mesmos, encontrando-se os duplicados neste Tribunal à disposição de quem o queira consultar dentro das horas normais de expediente.

Foram apresentadas contestações pela insolvente, pela credora reclamante Caixa Geral de Depósitos, S.A. e pela Massa Insolvente de V…, Ldª, em cujos articulados as demandadas concluíram por pedir a improcedência da ação, excecionando ainda a insolvente a caducidade do direito exercido pelas demandantes.

No contexto da ação para restituição e separação de bens foi proferido despacho julgando tempestivo o exercício do direito, foi ordenado o aperfeiçoamento do articulado inicial (despacho de 02.10.2017) e foi tramitado incidente de habilitação de herdeiros por óbito da autora C e proferida sentença a julgar habilitadas as suas sucessoras MS e LT. Foi ainda realizada audiência prévia em 12.12.2018 e agendada audiência de julgamento, que se iniciou em 21.02.2019, com nova sessão em 06.05.2019, ambas realizadas na presença dos mandatários das autoras, da insolvente, da massa insolvente e do presidente da comissão de credores Caixa Geral de Depósitos, após cuja conclusão foi designada data para leitura da sentença – 28.05.2019, pelas 15h00 – de que foram todos os presentes notificados (referências citius 46483790, 46785075 e 47117045).

Em 28.05.2019 realizou-se a leitura da sentença, de que foi lavrada ata (referência citius 47227068), não se encontrando ninguém presente após chamada, tendo sido proferida sentença, com o seguinte dispositivo:
“(…) VI – DECISÃO
Termos em que, o Tribunal decide julgar os pedidos deduzidos pelas AA. C, MS e LT parcialmente procedentes e, por conseguinte:
1. Declarar que C, MS e LT são proprietárias da fracção autónoma designada pela letra “A” e descrita na Conservatória do Registo Predial da Calheta sob o n.º …./20080417-A, desde o dia 05 de Novembro de 2011;
2. Ordenar a separação da MASSA e, consequentemente, restituição às AA. MS e LT, por si, e em representação da HERANÇA INDIVISA DE CT, da fracção autónoma designada pela letra “A” e descrita na Conservatória do Registo Predial da Calheta sob o n.º …/20080417-A;
3. Ordenar o levantamento das penhoras constituídas sobre a fracção autónoma referida em 1. e, consequentemente, o cancelamento dos registos datados de 12 de Março de 2012 (AP. 1696), de 22 de Março de 2012 (AP. 607), de 16 de Abril de 2012 (AP. 2716);
 4. Ordenar o levantamento da hipoteca voluntária constituída sobre a fracção autónoma referida em 1. a favor da sociedade A… – UNIPESSOAL, LDA. e, consequentemente, o cancelamento do registo datado de 21 de Outubro de 2013;
5. Não ordenar o levantamento das hipotecas voluntárias constituídas sobre a fracção autónoma referida em 1. a favor da CAIXA GERAL DE DEPÓSITOS, S.A. e, consequentemente, não ordenar o cancelamento dos registos datados 31 de Julho de 2006 (AP. 3), 26 de Fevereiro de 2008 (AP. 1) e 23 de Junho de 2009 (AP. 2177), por as mesmas (hipotecas) serem válidas e eficazes;
6. Absolver as AA. C, MS e LT como litigantes de má-fé; e
7. Ordenar a suspensão da liquidação relativamente à fracção autónoma referida em 1.
Custas pela R. MASSA INSOLVENTE (cfr. artigo 527.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil, aplicável ex vi do artigo 17.º, n.º 1, do CIRE).
Registe e notifique.”

Foi lavrado termo de registo da sentença com data de 29.05.2019, que foi notificada ao Ministério Público na mesma data.

Por despacho datado de 30.01.2023, foi declarado encerrado o processo de insolvência, após realização do rateio final.

Por requerimento que deu entrada em juízo em 09.09.2024, MS veio instaurar recurso de revisão, nos termos da alínea e) do art.º 696º e dos artigos 698º e segs. do Código de Processo Civil, por apenso à ação declarativa de restituição e separação de bens, pedindo que notificados os recorridos para responder, no prazo legal, seguindo-se a ulterior e normal tramitação, vindo, a final, a ser julgado procedente e decidido no sentido de manter-se o reconhecimento da propriedade da fracção “A” em causa por parte das AA., alterando-se o decidido quanto à subsistência do ónus hipotecário sobre a fracção em questão, atenta a nulidade das escrituras de constituição da hipoteca e documentos com elas conexos.

Foi proferido despacho liminar em 16.09.2024 que, considerando que o prazo legal de caducidade de cinco anos terminou em 15.06.2024 e que o recurso de revisão foi instaurado em 09.09.2024, decidiu indeferir liminarmente o requerimento inicial do recurso extraordinário de revisão, por o prazo para recorrer se encontrar extinto por caducidade (cfr. artigo 697.º, n.º 2, alínea c), do Código de Processo Civil).

Deste despacho veio o requerente/apelante interpor o presente recurso, pedindo a revogação da decisão recorrida e o prosseguimento do recurso de revisão, apresentando alegações que sintetiza nas seguintes conclusões:
1. Atenta a prova que os autos (processo principal) confirmam, no sentido da não notificação de dezenas de demandados, citados editalmente, da sentença final, apesar de conhecidas as suas residências, tal ilegalidade, que subsiste até que tão grave omissão seja suprida, tem como consequência que a sentença objecto do recurso de revisão em causa não tenha transitado em julgado.
2. Desta sorte, não se iniciou ainda a contagem do prazo de cinco (5) anos a que se refere o nº 2., do art.º 697º do CPCivil, uma vez que não foi observado, nem cumprido o nº 5, do art.º 249º do CPCivil, nem publicada a sentença sob recurso, por edital eletrónico, ou outro, disposições estas que a douta decisão sob recurso violou, enfermando, assim, de manifesta ilegalidade.

O recurso foi admitido como de apelação, com subida imediata nos próprios autos e efeito suspensivo.

Foram colhidos os vistos legais.

II.
Dado que o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, sem prejuízo das questões passíveis de conhecimento oficioso (artigos 608º, n.º 2, parte final, ex vi do art.º 663º, n.º 2, ambos do Código de Processo Civil), identifica-se, como questão a decidir, apreciar se a decisão objeto de recurso de revisão transitou em julgado, aferindo, em consequência, da tempestividade do recurso.

III.
Os factos relevantes para a decisão a proferir correspondem aos sintetizados no ponto I (relatório) que, por razões de economia processual, aqui se têm por reproduzidos.

IV.
A divergência que o apelante manifesta em relação aos fundamentos da decisão recorrida assenta exclusivamente na verificação do trânsito em julgado da decisão cuja revisão é pretendida. O tribunal recorrido considerou que a sentença, proferida em ata em 28.05.2019, com prazo de recurso de 15 dias face à natureza urgente do processo, transitou em julgado em 15.06.2019, considerando esta data como termo inicial do prazo de cinco anos de que dispunha o apelante para interpor recurso de revisão, contrapondo o apelante a sua tese de que a referida decisão não transitou em julgado, por dela não terem sido notificados os credores que, tendo sido citados editalmente, tinham mandatário constituído e domicílio conhecido nos autos, concluindo que daí resulta a violação do disposto no art.º 249º, n.º5 do Código de Processo Civil, sendo aquela omissão de notificação impeditiva do trânsito em julgado da sentença. Em suma, o apelante aceita que as partes que constituíram mandatário e que foram notificadas do dia e hora de leitura da decisão se consideram notificadas da decisão no dia 28.05.2019, considerando, contudo, que a omissão de notificação da referida decisão aos assinalados credores obsta ao reconhecimento do seu trânsito em julgado.
Com relevância para apreciação da questão sob apreciação, dispõe o art.º 697º, n.º 1 e n.º 2, al. c) do Código de Processo Civil que o recurso de revisão é interposto no tribunal que proferiu a decisão a rever e “não pode ser interposto se tiverem decorrido mais de cinco anos sobre o trânsito em julgado da decisão, salvo se respeitar a direitos de personalidade e o prazo para interposição é de 60 dias contados: (…) c) nos outros casos [que incluem a alínea e) invocada pelo recorrente] desde que o recorrente obteve o documento ou teve conhecimento do facto que serve de base à revisão”.
De acordo com o disposto no art.º 146º, n.º 1 do CIRE, aplicável ex vi do art.º 141º, n.º 1, al. c) do mesmo diploma, o direito à separação ou restituição de bens pode ser exercido mediante ação proposta contra a massa insolvente, os credores e o devedor, efetuando-se a citação dos credores por meio de edital eletrónico publicado no portal Citius, considerando-se aqueles citados decorridos cinco dias após a data da sua publicação.
Da simples conjugação dos mencionados preceitos do CIRE resulta que a citação dos credores por meio de edital eletrónico não traduziu uma opção arbitrária do tribunal, como sugere o apelante, antes correspondendo ao cumprimento de procedimento processual imposto por previsão legal expressa.

Restará apreciar se ao tribunal se impunha notificar a decisão aos mandatários constituídos por alguns dos credores reconhecidos no processo de insolvência, ou fazer cumprir o disposto no art.º 249º, n.º 5 do Código de Processo Civil em relação aos credores sem mandatário constituído cuja sede ou domicílio fossem conhecidos, ou ainda publicar a sentença proferida na ação de restituição e separação de bens, decisão cuja revisão é pretendida pelo apelante.
De acordo com o disposto no art.º 17º, n.º 1 do CIRE, os processos regulados neste diploma regem-se pelo Código de Processo Civil em tudo o que não contrarie as disposições do presente código, ou seja, a margem de aplicação subsidiária é limitada aos casos em que as regras previstas no próprio CIRE não afastem, pelo seu conteúdo, a aplicabilidade do regime processual civil.
Em anotação ao referido preceito, Luís Carvalho Fernandes e João Labareda [CIRE Anotado, 3ª edição, Quid Juris, p. 136] referem que a parte final impõe ao intérprete uma cautela complementar de que o mesmo deve rodear-se, porquanto “(…) [P]ode realmente suceder que a solução encontrada na convocação das normas do Código de Processo Civil se configure contrária à que é consagrada ou determinada pelo próprio Código”.
É essa particular cautela que, no caso concreto, impõe que se afaste a aplicação do disposto no art.º 249º, n.º 5 do Código de Processo Civil na extensão que lhe pretende atribuir o apelante, isto é, assumindo que todos os credores contra quem é proposta a ação de restituição e separação de um bem da massa insolvente são tidos como “parte” quando em causa esteja a notificação da decisão final, impondo-se a sua notificação desde que a sede/domicílio sejam conhecidos no processo.
Se não existe dúvida, por decorrência da previsão do art.º 146º, n.º 1 do CIRE, aplicável por força do art.º 141º, n.º 1, al. c) do mesmo diploma, que a ação tem que ser instaurada contra os credores da insolvente, não é despicienda a circunstância de estes serem citados por meio de edital eletrónico publicado no portal Citius, considerando-se citados decorridos cinco dias após a data da sua publicação. Ou seja, quer estejamos perante credores com mandatário constituído, quer perante credores sem mandatário constituído, a sua citação é, invariavelmente, efetuada por meio de edital eletrónico, não sendo o conhecimento da sua morada (que, naturalmente, existe, tendo em conta que estão em causa “credores” já identificados, que reclamaram os seus créditos no processo de insolvência) fator relevante para determinar a sua autónoma citação para os termos da ação.
Face à evidente diretriz de celeridade que norteia a regulamentação das formalidades de citação para os termos da ação de restituição e separação de bens, tramitada por apenso, em que o legislador, para além dos éditos, nada mais prevê do que a atuação oficiosa da secretaria, a quem incumbe lavrar termo no processo principal de insolvência identificando a ação apensa, o demandante e o pedido (n.º 3 do art.º 146º do CIRE), opção que faz recair sobre todos os credores intervenientes no processo de insolvência o ónus de consultarem a ação para decidirem se pretendem deduzir oposição à mesma, seria contraditório considerar que, onde a lei não reclama que os intervenientes, globalmente conhecidos, sejam pessoalmente citados/notificados para a ação, reclamasse, incoerentemente, que, apesar de não intervirem na lide, fossem notificados das decisões nela proferidas, gerando-se entorpecimento e dilação num processo que, até esse momento, seguiu uma tramitação célere.
Nesta perspetiva, considerar que a decisão final proferida e notificada exclusivamente às partes diretamente intervenientes na ação, deveria igualmente ser notificada a todos os credores – já que todos têm “residência ou sede conhecida no processo”, conforme estipula o art.º 249º, n.º 5 do Código de Processo Civil – corresponde a uma interpretação que contraria as disposições do CIRE e que, por esse motivo, conforme impõe o art.º 17º, n.º1, parte final, vê vedada a sua aplicação subsidiária ao processo de insolvência.
Em idêntico sentido, caso existisse uma disciplina particular aplicável aos credores com mandatário constituído, impondo a sua notificação, tal ressalva teria necessariamente que constar do texto do art.º 146º, n.º 1 do CIRE, que regula, de forma especial, as regras de citação de credores nas ações em que é exercido o direito à restituição e separação de bens, como aquela em que foi proferida a decisão cuja revisão é pretendida pelo apelante. A existência de regulamentação especial incompatível com as regras gerais previstas na lei processual civil, impede a aplicação subsidiária destas.

No que respeita à publicação da sentença, aflorada na conclusão 2 do apelante, a mesma não tem previsão legal, sendo o conhecimento do teor da decisão acessível a todos os credores que não são parte interveniente apenas por consulta ao processo, como sucede com todos os demais atos processuais praticados até esse momento.
À ação de restituição e separação de bens são aplicáveis as disposições relativas à reclamação e verificação de créditos (art.º 141º do CIRE), resultando do disposto no art.º 140º a ausência de menção à publicação da sentença, notificada apenas nos moldes gerais previstos pelo art.º 220º, n.º 1 do Código de Processo Civil – àqueles a quem possa causar prejuízo que, no caso concreto, serão as partes que diretamente intervieram no processo e que são afetadas pelo decidido.
Como referem Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Pires de Sousa, [Código de Processo Civil Anotado, Vol. I, Parte Geral e Processo de Declaração, 2024, p. 281/282], subsumem-se à indicada previsão do n.º1 do art.º 220º, “designadamente os despachos que indefiram pretensões das partes ou privem as partes do exercício de poderes processuais de que se tenham previamente arrogado e aqueles que se pronunciem sobre pressupostos processuais ou sobre ónus ou direitos das partes”.
Nesta medida, apenas às partes que defenderam posições na lide se impunha operar a notificação da decisão final, sendo essas as únicas diretamente afetadas pelo decidido.
Dado que a sentença foi proferida em ata, em diligência a que as partes intervenientes optaram por não comparecer apesar de convocadas para o efeito (art.º 638º, n.º 3 do Código de Processo Civil), será a data de realização dessa diligência a data de notificação relevante para efeitos de definição do termo inicial de contagem do prazo de recurso ordinário, ocorrendo o trânsito em julgado decorridos 15 dias sobre a data da notificação (atenta a natureza urgente do processo).
Nos termos expostos, inexistindo dúvida quanto ao efetivo trânsito em julgado da decisão e à válida notificação considerada como elemento relevante para contagem do termo inicial do prazo de recurso ordinário, o prazo de 5 anos a que alude o art.º 697º, n.º2 do Código de Processo Civil encontrava-se findo à data de instauração do recurso de revisão, ferindo de caducidade o direito exercido, o que suporta o indeferimento liminar daquele recurso, nos termos previstos pelo art.º 699º, n.º 1 do Código de Processo Civil.
Deste modo, não podendo ser reconhecida razão ao apelante na afirmação de que, até à presente data, não existe uma decisão transitada em julgado, impõe-se, sem acrescidas considerações, concluir pela improcedência do recurso.

*
SUMÁRIO (art.º 663º, n.º 7 do Código de Processo Civil)
1. Se não existe dúvida, por decorrência da previsão do art.º 146º, n.º 1 do CIRE, aplicável por força do art.º 141º, n.º 1, al. c) do mesmo diploma, que a ação de restituição e separação de bens da massa insolvente tem que ser instaurada contra os credores da insolvente, a citação destes é efetuada por meio de edital eletrónico publicado no portal Citius, pelo que, quer estejamos perante credores com mandatário constituído, quer perante credores sem mandatário constituído, a sua citação é, invariavelmente, efetuada por meio de edital eletrónico, não sendo o conhecimento da sua morada (que, naturalmente, existe, tendo em conta que estão em causa “credores” já identificados, que reclamaram os seus créditos no processo de insolvência) fator relevante para determinar a sua autónoma citação para os termos da ação.
2. Seria contraditório considerar que, onde a lei não reclama que os intervenientes, globalmente conhecidos, sejam pessoalmente citados/notificados para a ação, reclamasse, incoerentemente, que, apesar de não intervirem na lide, fossem notificados das decisões nela proferidas, gerando-se entorpecimento e dilação num processo que, até esse momento, seguiu uma tramitação célere.
3. Considerar que a decisão final proferida e notificada exclusivamente às partes diretamente intervenientes na ação, deveria igualmente ser notificada a todos os credores – já que todos têm “residência ou sede conhecida no processo”, conforme estipula o art.º 249º, n.º 5 do Código de Processo Civil – corresponde a uma interpretação que contraria as disposições do CIRE e que, por esse motivo, conforme impõe o art.º 17º, n.º 1, parte final, vê vedada a sua aplicação subsidiária ao processo de insolvência.
4. À ação de restituição e separação de bens são aplicáveis as disposições relativas à reclamação e verificação de créditos (art.º 141º do CIRE), resultando do disposto no art.º 140º a ausência de menção à publicação da sentença, notificada apenas nos moldes gerais previstos pelo art.º 220º, n.º 1 do Código de Processo Civil – àqueles a quem possa causar prejuízo que, no caso concreto, serão as partes que diretamente intervieram no processo e que são afetadas pelo decidido, pelo que apenas às partes que defenderam posições na lide se impõe operar a notificação da decisão final.
5. Dado que a sentença foi proferida em ata, em diligência a que as partes intervenientes optaram por não comparecer apesar de convocadas para o efeito (art.º 638º, n.º3 do Código de Processo Civil), será a data de realização dessa diligência a data de notificação relevante para efeitos de definição do termo inicial de contagem do prazo de recurso ordinário, ocorrendo o trânsito em julgado decorridos 15 dias sobre a data de notificação (atenta a natureza urgente do processo), iniciando-se, findo esse prazo, o termo inicial de contagem do prazo de 5 anos para interposição do recurso de revisão.

V.
Nos termos e fundamentos expostos, acordam as juízas desta secção do Tribunal da Relação de Lisboa em negar provimento ao recurso, confirmando a decisão recorrida.

Custas a cargo do apelante (art.º 527º, n.º 1 do Código de Processo Civil)
****
Lisboa, 10-12-2024
Ana Rute Costa Pereira
Paula Cardoso
Manuela Espadaneira Lopes