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CONTRATO DE MEDIAÇÃO IMOBILIÁRIA
DENÚNCIA DO CONTRATO
OPOSIÇÃO À RENOVAÇÃO
PRÉ-AVISO CONTRATUAL
CONTRATO DE AGÊNCIA
INDEMNIZAÇÃO
CLÁUSULA PENAL
OBRIGAÇÃO DE NÃO CONCORRÊNCIA
Sumário
Sumário: (art.º 663.º n.º 7 do CPC) 1. Inexistindo fundamento para a resolução do contrato, a declaração da parte de pôr-lhe fim quando está prevista a possibilidade de oposição à renovação, em contrato renovável automaticamente no termo do prazo, pode ser integrada no regime da denúncia, ainda que não tenha sido exercida em tempo, em face dos prazos de pré aviso estabelecidos na lei ou por acordo das partes, podendo nesta circunstância determinar a obrigação de indemnizar os danos causados. 2. No âmbito de um contrato de agência, o principal não tem o direito de fazer funcionar a seu favor o n.º 2 do art.º 29.º do DL 178/86 de 3 de julho, aplicando o critério aí previsto para calcular a indemnização a que tem direito em caso de denúncia do contrato sem observância do prazo do pré aviso, correspondente a “uma quantia calculada com base na remuneração média mensal auferida no decurso do ano precedente, multiplicada pelo tempo em falta, para dele beneficiar, de modo a eximir-se de alegar e provar o dano que efetivamente sofreu, por ser uma regulação que o legislador expressamente reservou para o agente. 3. O art.º 29.º n.º 2 da Lei do Contato de Agência consagra a possibilidade do agente, e apenas este, pedir uma indemnização a forfait, calculada nos termos ali definidos, em lugar da indemnização apurada de acordo com as regras gerais a que alude o n.º 1, em proteção da sua situação de contraente mais fraco no contrato. 4. O direito indemnizatório do principal por alegados danos sofridos pela cessação do contrato feita pelo agente, sem observância do prazo do pré aviso, tem de passar pelo regime geral da obrigação de indemnizar previsto nos art.º 562.º do C.Civil, exigindo-se em consequência a prova da verificação dos seus requisitos, nos termos do art.º 342.º n.º 1 do C.Civil, entre os quais a existência dos danos cujo ressarcimento é peticionado. 5. O art.º 812.º do C.Civil vem prever que a cláusula penal contratualmente estabelecida possa ser equitativamente reduzida de acordo com a equidade, quando for manifestamente excessiva, ainda que por causa superveniente, contemplando a possibilidade de uma sindicância da cláusula penal pelo juiz, quando se constate que da sua aplicação, sem mais, resulta uma situação de manifesto desequilíbrio e injusta, que justifica a sua redução. 6. O art.º 13.º n.º 1 al. g) do DL 178/86 de 3 de julho, estipula a obrigatoriedade do principal compensar o agente pela não concorrência após a cessação do contrato, o que traduz uma forma de proteção do agente, na medida em que o cumprimento da obrigação de não concorrência em benefício do principal, o priva de exercer a sua atividade profissional durante o período estabelecido. 7. A cláusula penal no valor de três vezes o capital social da A. – € 60.000,00 - fixada para o incumprimento da obrigação de não concorrência do agente nos 24 meses a contar do fim do contrato, impondo que este não exerça a sua atividade profissional de agente imobiliário nesse período de tempo, sempre determinaria a obrigação da A. o compensar, nos termos previsto no art.º 13.º n.º 1 al. g), por valor que teria de se aproximar daquilo que ele deixaria de receber por dois anos de não concorrência que, de forma adequada e equitativa no equilíbrio das obrigações, fixando-se perto de pelo menos € 90.000,00 em face da remuneração auferida pelo agente na vigência do contrato. 8. Apresentando-se este valor como substancialmente superior ao valor da cláusula penal fixada, a mesma é manifestamente excessiva à luz do art.º 13.º n.º 1 al. g) do DL 176/86 e deve ser reduzida pelo tribunal, de acordo com o disposto no art.º 812.º n.º 1 do C.Civil, não se impondo a alteração da decisão que a reduziu para o valor de € 20.000,00.
Texto Integral
Acordam na 2ª secção do Tribunal da Relação de Lisboa
I. Relatório
Vem a A …, Ld.ª propor a presente ação com a forma de processo comum contra B …, pedindo a condenação do R a pagar-lhe: por violação do número dois da cláusula terceira do contrato de prestação de serviços celebrado com a A., a título de cláusula penal, o montante de €60.000,00 acrescido de juros de mora desde a citação até integral pagamento; por violação do número dois da cláusula oitava do contrato de prestação de serviços celebrado com a A., a título de cláusula penal, o montante de €60.000,00 (sessenta mil euros), acrescido de juros de mora desde a citação até integral pagamento; e a quantia global de €137.232,08 a título de danos patrimoniais sob a vertente de lucros cessantes, acrescida de juros de mora à taxa legal, desde a citação e até integral pagamento.
Alega, em síntese, para fundamentar o seu pedido, que celebrou um contrato de prestação de serviços com o R., em regime de exclusividade e por prazo determinado, no sentido de o ter como seu colaborador, obrigando-se ele para com a A. a prestar-lhe serviços de angariador e técnico de mediação imobiliária, mediante o pagamento duma remuneração variável. O R. fez cessar tal contrato, de forma unilateral e sem cumprir com o aviso prévio a que estava obrigado e desrespeitando o pacto de não concorrência que fixaram, daí resultando para si prejuízos de que quer ressarcir-se.
O R., devidamente citado, veio contestar suscitando exceções e impugnando os factos alegados pela A., bem como deduzir pedido reconvencional pedindo que a A. lhe pague as verbas relativas a angariações que nela deixou pendentes, pugnando pela improcedência da ação e procedência da reconvenção.
A A. veio responder, impugnando os factos alegados e concluindo no sentido da improcedência da reconvenção.
Foi dispensada a audiência prévia, tendo sido proferido despacho saneador que afirmou a regularidade da lide, fixou o valor à causa, delimitou o objeto do litígio, enunciou os temas da prova, admitiu os meios de prova e designou data para a audiência de julgamento.
Procedeu-se a julgamento nos termos legais como decorre da respetiva ata e foi proferida sentença que a final julgou nos seguintes termos: “Face ao exposto, julgo a presente ação parcialmente procedente, e, consequentemente, condeno B … a pagar à A …, Lda. a quantia de €20.000,00 (vinte mil euros), montante acrescido dos respetivos juros de mora, à taxa de 4%, desde a presente data e até integral pagamento, absolvendo-o do demais peticionado. No mais absolvo o B … do que contra ele vinha pedido pela A …, Lda. Absolvo a A. A …, Lda. do pedido reconvencional que contra ela formulou o R. B …. Custas pelas partes na proporção de 4/5 para a A. e 1/5 para o R.” É com esta decisão que a A. não se conforma e dela vem interpor recurso pedindo a sua revogação e substituição por outra que condene o R. no pagamento do valor de € 137.232,08 pela cessação ilícita do contrato, acrescido de juros de mora até integral pagamento; caso assim não se entenda, deverá o R. ser condenado no pagamento de pelo menos € 52.110,03, equivalente ao aviso prévio em falta que o R. não concedeu, acrescido de juros de mora até integral pagamento; em todo o caso o R. deve ser condenado no pagamento da totalidade da cláusula penal pela violação do pacto de não concorrência, no montante de 60.000,00€, acrescido de juros de mora até integral pagamento.
Apresenta para o efeito as seguintes conclusões, que se reproduzem:
1.Vem o presente recurso interposto da douta Sentença que julgou a presente ação parcialmente procedente, condenando o aqui recorrido no pagamento à autora da quantia de apenas 20.000,00 €, absolvendo-o do demais peticionado e com o que a aqui recorrente não se pode conformar;
2. O contrato aqui em causa é um contrato de agência, submetido a regime próprio constante do Decreto-Lei n.º 178/86;
3. A resolução do contrato pelo réu foi ilícita porque, para além de não ser fundamentada, a justa causa da resolução de um contrato de agência tem fundamentos próprios e o réu não invocou sequer nenhum deles;
4. No que diz respeito à indemnização pela resolução ilícita do contrato de agência, o Tribunal ignorou o disposto no artigo 29.º n.º 1 do Decreto-Lei n.º 178/86
a aplicar subsidiariamente à resolução quando ilícita;
5. Ora, não tivesse o contrato sido ilicitamente resolvido, teria se renovado por mais 7 meses e 27 dias, como resulta da Sentença e foi precisamente com base nisso que a autora peticionou a média mensal de rendimento que auferia com o réu, multiplicada pelo tempo ainda por cumprir naquele contrato: a quantia de 137.232,08€;
6. Note-se que, neste aspeto, entendeu o Tribunal a quo que o réu deixou angariações pendentes, pelo que, seria um abuso de direito atribuir-se à autora uma indemnização fundada na resolução ilícita do contrato de prestação de serviços operada pelo réu.
7. Contudo, não resultou sequer provado nestes autos quais foram essas angariações, quais os imóveis, seus preços de venda, etc.;
8. Aliás, nem sequer poderia ter considerado esse suposto potencial de comissionamento porquanto tal pressuposto é incerto, nunca se sabendo se essas angariações iriam resultar em alguma venda;
9. Seja como for, se é abuso de direito no entendimento do Tribunal então é porque se reconhece que o direito existe;
10. Acontece que, o Tribunal não pode recusar um direito indemnizatório à autora – que reconhece existir – por um nada (não se tendo provado factos), nem muito menos com base numa eventualidade pois, mesmo que se tivesse provado que o réu deixou imóveis para vender, nunca saberia a autora se alguma vez iriam ser vendidos esses imóveis, sendo certo que aqueles clientes podiam a qualquer momento – por mil e uma razões – denunciar os contratos de mediação imobiliária;
11. Pelo que, não se podendo aplicar o instituto do abuso de direito, deveria o Tribunal ter condenado o réu a pagar à autora o montante peticionado.
12. Ora, mesmo que se entenda que a autora não tem direito à indemnização equivalente à duração expectável do contrato, então de todo o modo deve a autora ser indemnizada pelo aviso prévio de 90 dias que o réu não concedeu, o que equivale ao montante de 52.110,03 €;
13. Por outro lado, andou bem o Tribunal à quo quando julgou válida a cláusula penal fixada entre as partes de exclusividade e não concorrência, contudo, andou mal quando reduziu o pedido de 60.000,00 € contratualmente fixado para 20.000,00 €;
14. De facto, o réu cessou o contrato para ir de imediato prestar idênticos serviços para uma sociedade concorrente, que era precisamente aquilo que a cláusula de não concorrência permitia acautelar;
15. O réu, bem sabendo as consequências da violação daquela cláusula – que conhecia – conformou-se com esse resultado e foi prestar serviços para uma concorrente direta da autora, sendo por isso intensa a ilicitude da sua conduta e justificando-se perfeitamente a condenação no pagamento da totalidade da clausula penal que as partes fixaram;
16. Assim, não é de todo excessiva a cláusula penal indemnizatória que foi acordada, que não deve por isso ser reduzida.
O R. não veio responder ao recurso.
O recurso foi admitido na forma própria.
II. Questões a decidir
São as seguintes as questões a decidir tendo em conta o objeto do recurso delimitado pela Recorrente nas suas conclusões- art.º 635.º n.º 4 e 639.º n.º 1 do CPC- salvo questões de conhecimento oficioso- art.º 608.º n.º 2 in fine:
- do direito da A. a ser indemnizada pelo R. a título de lucros cessantes, no valor que resulta da aplicação do critério do art.º 29.º n.º 2 do DL 178/86, sem que tenha de fazer prova do dano;
- da (indevida) redução da cláusula penal fixada pelas partes para a violação da exclusividade ou não concorrência.
III. Fundamentos de Facto
Não tendo sido impugnada a matéria de facto e não havendo qualquer alteração a introduzir à mesma, remete-se para os termos da sentença do tribunal de 1ª instância que decidiu tal matéria, de acordo com o disposto no art.º 663.º n.º 6 do CPC, reproduzindo-se os factos aí tidos como provados:
1. A A. é uma sociedade comercial por quotas, com o capital social de €20.000,00, que se dedica à atividade de mediação imobiliária, a atividades intermediárias na compra e venda e arrendamento, à avaliação com vista ao arrendamento e compra e venda por conta de terceiros, à administração e gestão de imóveis por conta de outrem e condomínios, à atividade de compra e venda de imóveis e revenda dos adquiridos para esse fim, à emissão de certificados energéticos e presença ou ausência de térmitas, a atividades desenvolvidas em nome de proprietários necessárias ao funcionamento dos imóveis e edifícios, incluindo a cobrança de rendas, à prestação de serviços nas áreas da consultoria jurídica, fiscal, comercial, económica e bancária nos limites impostos na Lei e a mediação de seguros, à prestação de serviços de caráter administrativo, orientação e assistência operacional a pessoas singulares e coletivas em matérias diversas com vista à aquisição de imóveis;
2. No dia 12 de junho de 2020, o R. celebrou com a A., por escrito, um documento particular que as partes denominaram por "CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS", com o seguinte teor:
"CLÁUSULA 1.ª OBJETO A Primeira Outorgante contrata o Segundo Outorgante, e este aceita, para prestação de serviços de angariador e técnico de mediação imobiliária, cujas funções compreendem o desenvolvimento das ações necessárias à preparação e execução de Contratos de Mediação Imobiliária, a celebrar entre os Clientes e a Primeira Outorgante, nomeadamente: a) Procura de destinatários para a realização de negócios com a Primeira Outorgante, que visem a constituição ou aquisição de direitos reais sobre bens imóveis, bem como a permuta, o trespasse ou o arrendamento dos mesmos ou a cessão de posições em contratos que tenham por objeto bens imóveis; b) Ações de prospeção e recolha de informações que visem encontrar o bem imóvel pretendido pelos Clientes da Primeira Outorgante; c) Ações de promoção dos bens imóveis sobre os quais os Clientes da Primeira Outorgante pretendam realizar negócios jurídicos, designadamente através da sua divulgação, publicitação ou da realização de leilões; d) Obtenção de documentação e de informações necessárias à concretização dos negócios objeto dos Contratos de Mediação Imobiliária a celebrar entre os Clientes e a Primeira Outorgante; e) Aferição, no momento da celebração dos Contratos de Mediação Imobiliária, da capacidade e legitimidade para contratar das pessoas intervenientes nos negócios que irão promover; e f) Aferição, no momento da celebração dos Contratos de Mediação Imobiliária, por todos os meios ao seu alcance, da correspondência entre as caraterísticas do imóvel objeto do contrato de mediação e as fornecidas pelos interessados contratantes, bem como se sobre o mesmo recaem quaisquer ónus ou encargos. CLÁUSULA 2.ª AUTONOMIA O Segundo Outorgante prestará os serviços que são objeto do presente contrato, descritos na Cláusula 1.ª, em regime de plena autonomia não estando sujeito a qualquer período ou horário de trabalho. CLÁUSULA 3.ª EXCLUSIVIDADE 1. O Segundo Outorgante prestará os serviços que são objeto do presente contrato, descritos na Cláusula 1.ª, em regime de exclusividade, para a Primeira Outorgante. 2. O Segundo Outorgante obriga-se a não prestar serviços de técnico de angariação imobiliária ou de angariador imobiliária para qualquer outra Sociedade de Mediação Imobiliária no prazo de 24 (vinte e quatro) meses, contados a partir do termo do presente Contrato de Prestação de Serviços e independentemente da causa da sua cessação, sob pena de indemnizar a Primeira Outorgante de todas as despesas em que incorreu com a formação e transmissão continuada de conhecimentos, gerais e específicos, os quais foram essenciais e fundamentais para sua prestação de serviços e para os resultados e exercício da atividade do Segundo Outorgante, nomeadamente porquanto muitos deles advieram dos contactos e conhecimentos pessoais e profissionais dos sócios e gerentes da Primeira Outorgante e, outros, tendo origem em contatos gerados na loja de atendimento ao público, sede da Primeira Outorgante. Tanto mais que, confessa, o Segundo Outorgante, não tinha qualquer experiência nesta área profissional de angariação e mediação imobiliária, os quais foram, na íntegra, transmitidos pela Primeira Outorgante, de acordo com o seu próprio método de trabalho e conhecimento do mercado local e técnicas específicas de angariação e venda criadas e desenvolvidas pela Primeira Outorgante segundo o seu próprio método pessoal de trabalho e experiência pessoal e profissional da sua gerência, essências para a otimização dos resultados obtidos. 3. Nestes termos, em caso de incumprimento pelo Segundo Outorgante, do disposto no número anterior, deverá o mesmo de pagar uma indemnização à Primeira Outorgante, no montante correspondente a 3 (três) vezes o capital social desta à data de assinatura do presente contrato, quantia da qual o Segundo Outorgante se considera devedor e aceita sem qualquer possibilidade de redução judicial ou extrajudicial. CLÁUSULA 4.ª IMPEDIMENTOS E OBRIGAÇÕES DO SEGUNDO OUTORGANTE 1. Ao Segundo Outorgante, na prestação dos serviços que são objeto do presente contrato, descritos na Cláusula 1.ª , não lhe é permitido: a) Celebrar Contratos de Mediação Imobiliária em nome próprio, mas apenas em nome e por conta da Primeira Outorgante; b) Cobrar e/ou receber dos intervenientes do negócio visado com o Contrato de Mediação Imobiliária quaisquer quantias a título de retribuição. 2. O Segundo Outorgante, na prestação dos serviços que são objeto do presente contrato, descritos na Cláusula 1.ª , obriga-se a: a) Entregar à Primeira Outorgante todos os montantes recebidos, no âmbito da celebração dos Contratos de Mediação Imobiliária, que lhe tenham sido confiados pelos Clientes da Primeira Outorgante; b) Aferir, no momento da celebração dos Contratos de Mediação Imobiliária, da capacidade e legitimidade para contratar das pessoas intervenientes nos negócios que irão promover; c) Aferir, no momento da celebração dos Contratos de Mediação Imobiliária, por todos os meios ao seu alcance, da correspondência entre as caraterísticas do imóvel objeto do Contrato de Mediação Imobiliária e as fornecidas pelos interessados contratantes, bem como se sobre o mesmo recaem quaisquer ónus ou encargos; d) Fornecer aos Clientes da Primeira Outorgante, de forma clara, objetiva e adequada, informações, nomeadamente sobre as caraterísticas, composição, preço e condições de pagamento do bem em causa; e) Propor, com exatidão e clareza, os negócios de que for encarregada, procedendo de modo a não induzir em erro os Clientes da Primeira Outorgante. CLÁUSULA 5.ª PREÇO 1. Pelos serviços prestados, a Primeira Outorgante pagará ao Segundo Outorgante, a percentagem mínima de 25% da Transação de Angariação do Imóvel que tenha sido angariado pelo Segundo Outorgante, ou seja, em que este tenha intervindo como angariador do imóvel, sendo que a transação imobiliária de angariação apenas corresponde a metade do valor da comissão imobiliária total recebida pela Primeira Outorgante, ou seja, os supra referidos 25% (vinte e cinco por cento) da transação de angariação do imóvel, corresponde a 12,5% do valor total da comissão imobiliária recebida pela Primeira Outorgante. 2. Da mesma forma, a Primeira Outorgante pagará ao Segundo Outorgante, a percentagem mínima de 25% da Transação de Venda do Imóvel, caso o Segundo Outorgante tenha intervido, naquele negócio em concreto, como vendedor do imóvel, sendo que a transação imobiliária de venda apenas corresponde a metade do valor da comissão imobiliária total recebida pela Primeira Outorgante, ou seja, os supra referidos 25% (vinte e cinco por cento) da transação de venda do imóvel, corresponde a 12,5% do valor total da comissão imobiliária recebida pela Primeira Outorgante. 3. Os valores supra referidos, não incluem a taxa legal de IVA liquidada pelos clientes do Segundo Outorgante, e por cada transação de angariação ou venda, a esta sim acrescerá o IVA à taxa legal aplicável. 4. O pagamento das quantias previstas nos números anteriores será efetuado pela Primeira Outorgante ao Segundo Outorgante até ao final do mês do recebimento. 5. Por cada pagamento dos serviços prestados, o Segundo Outorgante emitirá o correspondente recibo. CLÁUSULA 6.ª PRAZO 1. O presente Contrato de Prestação de Serviços é celebrado por um período de 12 meses, com início em 02.06.2020 e termo em 01.06.2021. 2. Findo o prazo estabelecido no número anterior, o presente Contrato de Prestação de Serviços renovar-se-á automaticamente por período iguais de 12 (doze) meses, exceto se algum dos Outorgantes o denunciar, por meio de Carta Registada, com a antecedência mínima de 90 (noventa) dias em relação ao termo de cada período contratual. 3. No caso de renovação do presente Contrato de Prestação de Serviços nos termos do número anterior, o Primeiro Outorgante, em função dos critérios que considerar pertinentes, poderá ajustar o regime da prestação de serviços, nomeadamente no que concerne à retribuição. CLAUSULA 7.ª RESOLUÇÃO O incumprimento, pelo Segundo Outorgante, de qualquer das disposições do presente Contrato de Prestação de Serviços, conferirá, à Primeira Outorgante, mediante envio de Carta Registada, o direito de resolvê-lo, sem prejuízo de poder exigir uma indemnização pelos danos sofridos, e sem prejuízo do apuramento da eventual responsabilidade civil e criminal decorrente desse incumprimento. CLÁUSULA 8.ª DEVERES DE CONFIDENCIALIDADE 1. O presente contrato é confidencial, pelo que os signatários se obrigam a manter completo sigilo relativamente ao mesmo e a não divulgar a terceiros o seu conteúdo sem prévio consentimento expresso da Primeira Outorgante, salvo na estrita medida do necessário à sua execução por qualquer das partes. 2. O Segundo Outorgante obriga-se a não usar ou comunicar a qualquer pessoa, firma, organização ou entidade, exceto quando no desempenho normal dos seus serviços e com o consentimento expresso da Primeira Outorgante ou, também, quando requerido por um Tribunal ou Autoridade competente, quaisquer segredos ou outras informações confidenciais da Primeira Outorgante ou de entidades em que preste serviços por decorrência do presente contrato, relativas ao negócio, organização, transações, contas, finanças ou assuntos da mesma, incluindo nomes dos clientes e fornecedores, relatórios, documentos, dados informáticos e quaisquer outras informações preparadas para a Primeira Outorgante, e que obtenha enquanto ao serviço da Primeira Outorgante. 3. Em caso de cessação por qualquer motivo do presente contrato, o Segundo Outorgante deverá devolver imediatamente à Primeira Outorgante todos os originais, e/ou cópias dos dossiers, correspondência, arquivos, memorandos e outros documentos e informações que se encontrem em seu poder. 4. Esta restrição de confidencialidade manter-se-á aplicável após o termo do presente contrato, seja qual for a causa, sem qualquer limite temporal, fazendo incorrer o Segundo Outorgante em responsabilidade indemnizatória para com a Primeira Outorgante em caso de inobservância, no montante mínimo de 3 (três) vezes o capital social desta à data de assinatura do presente contrato ou, se superiores forem os danos, o que for quantificado, bem como em eventual responsabilidade criminal. CLÁUSULA 9.ª ALTERAÇÕES Quaisquer alterações ou aditamentos ao presente Contrato de Prestação de Serviços, só serão válidos se constarem de documento escrito assinado pelos Outorgantes, do qual conste expressamente a indicação das cláusulas modificadas ou aditadas. CLÁUSULA 10.ª COMISSÕES APÓS A CESSAÇÃO DO PRESENTE CONTRATO Acordam as partes em que, após a cessação do presente contrato, não será devida pela primeira ao segundo outorgante, qualquer quantia a título de comissão em que este tenha participado em termos de mediação, angariação ou venda, ou a qualquer outro título. CLÁUSULA 11. ª FORO É competente para dirimir qualquer litígio relativo ao cumprimento, interpretação ou validade do presente contrato de prestação de serviços a competente Instância de Ponta Delgada do Tribunal Judicial de 1.ª Instância da Comarca dos Açores, com expressa renúncia a qualquer outro. CLÁUSULA 12.ª AUTENTICAÇÃO DO CONTRATO Nos termos e para os efeitos do disposto na alínea b) do n.° 1 do artigo 703.° do Código do Processo Civil, o presente contrato será objeto de autenticação de acordo com o preceituado no n.° 2 do artigo 38.° do Decreto-Lei n.° 76-A/2006, de 29 de março."
3. Mediante aquele contrato, e muito sinteticamente, o réu obrigou-se para com a autora a prestar-lhe, mediante o pagamento duma remuneração variável, serviços de angariador e técnico de mediação imobiliária.
4. Acontece que, no dia 5 de outubro de 2022 o R. comunicou a cessação do contrato de prestação de serviços;
5. Tendo, o réu, por escrito, no grupo de WhatsApp da A., dito o seguinte: "Bom dia, queria avisar que a partir de hoje deixo de fazer parte da equipa comprarcasa por motivos pessoais, que irá ser explicado pessoalmente ao Dr Antônio mal seja oportuno, desejo a todos sucesso e continuação de bons negócios".
6. Como é notório, a comunicação acima referida encontra-se desprovida de qualquer formalidade e sem apontar qualquer justificação objetiva para tal para lá das razões pessoais invocadas;
7. O R. após ter rescindido o contrato de prestação de serviços com a A., foi trabalhar para outra sociedade de mediação imobiliária concorrente da A., denominada por “C …, Lda.", tendo anunciado esse facto nas plataformas das redes sociais no dia 26 de outubro de 2022;
8. O R. desde Outubro de 2022 até à presente data presta serviços de angariador e técnico de mediação imobiliária para a sociedade de mediação imobiliária concorrente da autora C …, Lda.
9. Conforme decorre do contrato de prestação de serviços, mais precisamente no número um da cláusula sexta, o mesmo tinha a duração de 12 meses, com início em 2.6.2020 e termo em 1.6.2021, estipulando, ainda, o número dois da mesma cláusula que: "2. Findo o prazo estabelecido no número anterior, o presente Contrato de Prestação de Serviços renovar-se-á automaticamente por período iguais de 12 (doze) meses, exceto se algum dos Outorgantes o denunciar, por meio de Carta Registada, com a antecedência mínima de 90 (noventa) dias em relação ao termo de cada período contratual."
10. Assim, de modo a impedir a renovação do prazo daquele contrato, qualquer umas das partes teria de o denunciar, por meio de carta registada, com a antecedência mínima de 90 (noventa) dias em relação ao termo de cada período contratual, ou seja, e no caso em concreto, até ao dia 3.3.2022;
11. Sucede que, a comunicação referida acima em 5., ocorreu em 5 de outubro de 2022, ou seja, quando o prazo do contrato de prestação de serviços já se tinha renovado para 1.6.2023;
12. Desde 5 de outubro de 2022, altura em que o R. denunciou o contrato, faltavam 7 meses e 27 dias para o termo do contrato em vigor;
13. O R. quando iniciou o contrato de prestação de serviços com a A. não tinha qualquer conhecimento na área da mediação imobiliária, nem tinha exercido qualquer actividade relacionada com essa área de comércio, o que, de resto, o réu reconheceu no contrato assinado com a autora, designadamente, no número dois da cláusula terceira, quando aí declarou que: "não tinha qualquer experiência nesta área profissional de angariação e mediação imobiliária, os quais foram, na íntegra, transmitidos pela Primeira Outorgante, de acordo com o seu próprio método de trabalho e conhecimento do mercado local e técnicas específicas de angariação e venda criadas e desenvolvidas pela Primeira Outorgante segundo o seu próprio método pessoal de trabalho e experiência pessoal e profissional da sua gerência, essências para a otimização dos resultados obtidos".
14. Pelo que, desde o dia 2 de junho de 2020 e até ao dia 5 de outubro de 2022, a A. "ensinou" o R. a ser angariador e técnico de mediação imobiliária, com efeito, durante a relação contratual entre a A. e o R., aquela dotou este de diversos conhecimentos de modo a que pudesse desenvolver a actividade de angariador e técnico de mediação imobiliária;
15. Neste contexto, a A. deu diversas acções de formação ao réu, explicando-lhe procedimentos a adoptar; forneceu-lhe diversas minutas e formulários;
16. Entre outros conhecimentos passados pela A. ao R., destacam-se os seguintes:
. como efetuar a abordagem pessoal para imóveis que estão atualmente na concorrência - a apresentação de serviços;
. as objeções contratuais - o que são, como devem ser trabalhadas e ultrapassadas e as várias objeções e quais os argumentos que devem ser utilizados;
. como fazer o seguimento inicial ao cliente da angariação;
. como efetuar o seguimento de um imóvel de um outro colega que tenha saído;
. minutas dos contratos de mediação imobiliária (o Contrato Prioritário e o Imóvel de Luxo);
. minutas para apresentação dos Estudos de Mercado (Apartamentos, Moradias e Lotes);
. a correta forma de apresentação de um Estudo de Mercado - O procedimento para Seguimento da Angariação (Cada 30 dias);
. a apresentação da avaliação do Imóvel;
. a apresentação do seguimento da visita ao cliente Vendedor - Os documentos bancários necessários dos Compradores;
. a qualificação financeira dos Compradores minuta correta do atendimento;
. minuta do email a enviar para os clientes para obtenção dos documentos bancários;
. o registo e tabela de seguimento das angariações na zona de prospeção - minuta do telefonema no dia de atendimento à loja (argumentos que devem ser utilizados);
. os telefonemas para os imóveis na Concorrência;
. os telefonemas para os Imóveis que estão em Estado Inativo;
. os particulares com os imóveis à Venda - O telefonema correto;
. as listagens dos Comprados;
. as rescisões Contratatuais com outras imobiliárias;
. o quadro da equipa - Registo de Contatos de Vendedores e Compradores;
. as várias zonas de prospeção na Ilha de São Miguel (divisão em 84 zonas de trabalho, todas elas identificadas, limitadas e atribuídas aos vários colegas e equipas);
. o mapa de agendamento de escrituras - O qualificador financeiro - Instrumento para Qualificação Financeira dos Compradores;
17. O R. recebeu da A. formação contínua na sua área de actuação, fazendo com que este se tornasse num excelente prestador se serviços como angariador e técnico de mediação imobiliária, tornando-se este num elemento importante e valioso na estrutura da A.
18. A A. ao longo dos anos tem tido um excelente desempenho na sua área de actividade, o que, de resto, tem sido reconhecido por diversos prémios nacionais na área da mediação imobiliária e na rede de lojas ibérica da ComprarCasa, nomeadamente:
. o prémio Cinco Estrelas de Melhor Imobiliária Açores em 2021;
. o prémio Cinco Estrelas de Melhor Imobiliária Açores em 2022;
. o prémio do banco CGD de melhor agência;
. o prémio do banco BPI de melhor Agência;
. o prémio do banco Santander Totta de melhor agência;
. o prémio banco BIC de melhor agência;
. o prémio de melhor agência do site Imovirtual;
. o prémio melhor agência do site Idealista;
. prémio melhor agência imobiliária pelo site Imorvirtual 2023, na categoria de ilhas (Açores e Madeira);
. prémio nacional Cinco Estrelas 2023, pelo terceiro ano consecutivo;
19. Na rede Comprar Casa Ponta Delgada, e nos últimos 5 anos, a autora recebeu os prémios de melhor agência em angariação, faturação, volume de vendas, tendo sido a melhor agência da Península Ibérica no ano de 2022;
20. A A. é a primeira e única rede de mediação imobiliária nacional em que os Serviços Centrais detêm a certificação de Qualidade ISSO 9001:2015, através da qual é reconhecida a sua qualidade diferenciadora;
21. A A. tinha e sempre teve uma base de dados dos seus clientes, a qual é composta pelo nome do cliente, morada, contactos telefónicos e endereço electrónico;
22. O R. acedia a esta base de dados confidencial através de uma senha e password pessoal que, apesar de alegadamente ser pessoal e intransmissível, era conhecida da administradora do sistema e do gente da A., e que lhe foi cedida especificamente, e isto em qualquer local e computador, porque se encontrava numa base de dados em "cloud";
23. A palavra passe fornecida pela A. ao R. permitia-lhe aceder ao sistema e informação interna da A. nomeadamente à identificação de todos os clientes desta e os respetivos imóveis a serem comercializados, não só os angariados pelo R. mas a todos os clientes da autora em virtude duma autorização especial que lhe foi concedida, permitindo que este pudesse consultar todos os restantes clientes e imóveis angariados por todos os outros colegas, nomeadamente com acesso aos contactos diretos (telemóvel e emails) a compradores e vendedores, base de dados que o R. visitou até deixar de colaborar com a A., altura em que o acesso lhe foi vedados pela administradora so sistema;
24. Foram clientes da A., e como tal constam da sua base de dados, L … e P …, com os quais o R., já como colaborador da C …, Lda, celebrou, por solicitação daqueles, contrato de mediação imobiliária;
25. Uma base de dados de clientes de uma sociedade de mediação imobiliária leva anos a fazer-se e com enormes custos, sendo essa base de dados fulcral para o desenvolvimento da actividade da autora ou de qualquer outra sociedade de mediação imobiliária;
26. O contrato de prestação de serviços celebrado pelo R. com a A., tinha-se renovado em 2 de junho de 2022 tendo o seu termo a 1 de junho de 2023, porque o R., em 5 de outubro de 2022, resolveu/denunciou o referido contrato, tal contrato ainda tinha 7 meses e 27 dias de vigência;
27. O R. desde o mês de agosto de 2021 a setembro de 2022, com a venda de imóveis que intermediou no exercício da actividade para que fora contratado, gerou para a A. comissões no montante total €244.608,50, a saber:
. agosto de 2021 - €23.750,00;
. setembro de 2021 - €10.720,00;
. outubro de 2021 - €17.495,00;
. novembro de 2021 -€ 6.497,50;
. dezembro de 2021 - €28.687,50;
. janeiro de 2022 - €16.547,50;
. fevereiro de 2022 - €12.600,00;
. março de 2022 - €6.000,00;
. abril de 2022 - €22.247,50;
. maio de 2022 - €17.066,00;
. junho de 2022 - €20.747,50;
. julho de 2022 - 26.650,00;
. agosto de 2022 - €25.350,00; e
. setembro de 2022 - €10.250,00;
28. Das comissões apontadas em 27., o R. recebeu da A., ainda que parte delas por intermédio da esposa dele, a título de renumeração pelos serviços que prestou o montante total de €53.538,37, gerando, assim, um ganho à A. de €191.070,13, o que, para o período que vai de Agosto de 2021 a setembro de 2022, corresponde ao valor médio mensal de €17.370,01;
29. O contrato acima apontado em 2., foi apresentado pela A. ao R., em formato pré-impresso, correspondendo a instrumento com um conteúdo análogo aos demais subscritos pela A. com os demais colaboradores;
30. No dia 6 de outubro de 2022, o R. entregou todos os contatos, listas de recebimento dos contatos de loja das diversas plataformas online e presenciais, agendas e chaves à A., sendo que, a partir dessa data todo o trabalho de prospeção e angariação que lhe estava acometido foi transferido para os restantes colaboradores da A.;
31. A conversa que na mensagem do dia 5 de outubro de 2022 referiu que iria ter com o gerente da A., nunca se concretizou porque entendeu não a ter na sequência de uma mensagem da A., que lhe foi enviada no mesmo dia, cerca das 11h25m, e que referia “Bom dia: novamente: Independente das alegadas “razões pessoais”, estas decisões a curto prazo, em total desrespeito do acordado, são sempre graves e incorretas. Por isso, vão ser responsabilizadas do ponto de vista pessoal e financeiro. No entanto, como a justiça é como é, vamos ter aguardar. Obrigado.”, ficando nessa sequência receoso;
32. Até porque a A. já havia cessado outros contratos com colaboradores sem o cumprimento de qualquer aviso prévio, a título de exemplo, o colaborador, Emanuel Cordeiro, invocando “comportamentos incorretos e incumprimento reiterado dos procedimentos e normas de qualidade a que a ComprarCasa está obrigada para com os seus clientes foi terminada a relação contratual (...)”;
33. O R., na execução do contrato, tinha de se apresentar todos os dias, na agência da A., sita na Rua …, nº…., freguesia de São Pedro, concelho de Ponta Delgada, às 8h30 e às 15h30m, para participar em reuniões, não obrigatórias, tal como tinha estava de escala um dia por semana na sede da A., durante um período de 10 (dez) horas, sendo que este dia era disputado pelos colaboradores no sentido de laborarem naquele que se apontava como o mais movimentado e com maiores oportunidades de angariar clientes de forma direta;
34. O R., no que toca a “férias” apontava à gerência da A. os dias que mais lhe convinham, coisa que era ou não sancionada pelo gerente;
35. O email utilizado pelo R. era uma conta com domínio (gmail) e não institucional, e, apesar de dever ser pessoal e intransmissível, era acessível ao gerente, J … e à coordenadora de Loja, O …, que conheciam e criavam a respetiva password;
36. No dia 5 de outubro de 2022 , a A. alterou a palavra-passe do email profissional do R.;
37. O R. sentia pressão para a venda de imóveis, coisa que fez com que evidenciasse níveis elevados de ansiedade, dificuldades significativas ao nível de sono, perda de interesse por atividades rotineiras, desânimo, períodos de emoções muito fortes, culminado num estado de esgotamento geral;
38. O R., após ter cessado a colaboração com a A., procurou novas oportunidades de trabalho e nessa sequência estabeleceu contatos com a D …, Lda., E …, Lda. – C …, Lda. e F …, Lda. – G …, tendo celebrado contrato com a E …, Lda., ao serviço da qual teve formações certificadas;
39. Antes da celebração do contrato com a A., e durante cerca de 8 (oito) anos, o R. já tinha trabalhado como vendedor, na H …, Lda. , vulgarmente designada como Expert, tendo tomado conhecimento através de um cliente assíduo do seu local de trabalho e amigo, I …, que a A. se encontrava a recrutar consultores imobiliários;
40. Nessa sequência decidiu prestar serviços junto da A., integrando a equipa do I …;
41. No mês de junho de 2020, o R. teve uma formação não certificada, sob o tema de angariações que teve uma componente teórica apresentada em “Powerpoint” pelo sócio-gerente da A., I …, e uma componente prática, prestada pelo J …;
42. Já no mês de setembro de 2020, o R. teve nova formação não certificada, sob o tema de vendas, numa vertente teórica, com a apresentação de uns “Powerpoint”, pelo sócio da A., I …;
43. A formalização dos contratos promessa de compra e venda, das escrituras de compra e venda e o acesso aos serviços de bancos era feito por outros membros da equipa da A.;
44. O R. despendeu a sua gasolina com as deslocações que fez na tentativa de prospeção e angariação de clientes;
45. O R. não levou para a E …, Lda. qualquer informação referente à atividade da A., nem dos seus clientes, nem tão pouco dos imóveis que esta tinha angariado, nunca tendo feito uso dessa informação, após a cessação do seu contrato com a A.;
46. Quanto ao imóvel do L …, o R. nunca teve qualquer contato com o referido imóvel, enquanto se encontrava a ser promovida a sua venda com a A., nem nunca teve qualquer intervenção a isso atinente enquanto esteve a prestar serviços com a A.;
47. O cliente Herdeiros Sr. M …, no concelho de Povoação, resolveu o contrato com a A. porque o seu angariador à data, o R., deixou de colaborar com a A;
48. Mais tarde, o colaborador da A. N … conseguiu recuperar esse cliente, que foi por ele angariado, e esse imóvel acabou por ser vendido por €74.950,00;
49. Já no que diz respeito prédio do cliente J …, terreno na Bretanha, é verdade que a comissão cobrada pela autora foi de €5.000,00;
50. Acontece que a A. recebe tal comissão, contudo, paga 12,5 % ao agente vendedor e 12,5 % ao agente angariador e, neste caso, a A. teve de pagar ao agente angariador que substituiu o R. na intermediação em causa, pelo que, a A, só recebeu €3.750,00 da comissão paga pela venda desse imóvel;
51. Já o cliente Q …, moradia nas Feteiras resolveu o contrato de mediação imobiliária com a A. porque o R. deixou de colaborar com a A.;
52. Esse cliente foi, mais tarde, novamente angariado pela angariadora da A. R … que acabou por ser vendido por €200.000,00, tendo a A. recebido a comissão de €10.000,00;
53. Não existe nenhum imóvel que tenha sido angariado pelo R. na Fajã de Baixo com o valor de venda de €109.950,00;
54. O contrato com o S … foi por ele resolvido e o seu preço de venda era verdadeiramente, no melhor cenário, de €372.594,36 e não €1.200.000,00, pois é esse o valor de mercado real de mercado, tendo o R. colocado o preço de €1.200,000,00 no contrato de mediação imobiliária bem sabendo que tal preço é, simplesmente, irrealista e que esse imóvel nunca seria vendido nem por metade desse valor;
55. Também o cliente T … resolveu o contrato com a A.;
56. O prédio do M …, terreno para venda em Rua …, Ribeira Chã não foi ainda vendido, e, se alguma vez for, também a A. só irá receber a quantia de €3.500,00 depois de pagar as comissões ao angariador e vendedor;
57. O único imóvel angariado pelo R. e vendido pela A. é o acima mencionado em 49., pela qual o R. teria direito a receber, se não tivesse resolvido o contrato, a quantia de €750,00;
IV. Razões de Direito - do direito da A. a ser indemnizada pelo R. a título de lucros cessantes, no valor que resulta da aplicação do critério do art.º 29.º n.º 2 do DL 178/86, sem que tenha de fazer prova do dano
Alega a Recorrente que deve ser aplicado à resolução ilícita do contrato de agência pelo R. o regime da denuncia previsto nos art.º 28.º e 29.º do DL 178/86, dele reclamando o pagamento da quantia de €137.232,08 a título de danos patrimoniais, sob a vertente de lucros cessantes, correspondente ao que o R. lhe daria a ganhar no período de duração do contrato não cumprido, calculado com base no que lhe deu a ganhar anteriormente, não existindo qualquer abuso de direito em tal pedido indemnizatório.
A sentença sob recurso, após considerar que o contrato foi indevidamente resolvido pelo R., por não existir justa causa para o efeito, excluiu a aplicação do art.º 29.º do DL 178/86 relativo à denúncia, integrando o pedido indemnizatório da A. no âmbito do art.º 32.º que se reporta à resolução, concluindo que o valor indemnizatório nos termos calculados pela A. é abusivo, revelador de que pretende enriquecer à custa do R.
É pacífico o entendimento seguido na sentença proferida, também ele subscrito pelas partes, de que entre a A. e o R. foi celebrado um contrato de agência, qualificação que encontra acolhimento nos factos que resultaram provados, não sendo também controvertido que o R. enquanto agente resolveu tal contrato sem justa causa, como ali foi decidido.
Está apenas em discussão no presente recurso, as consequências indemnizatórias de tal comportamento, defendendo a Recorrente a aplicação do disposto no art.º 29.º n.º 1 e 2 do DL 178/86 de 3 de julho, pretendendo estar desobrigada de fazer prova efetiva dos danos que sofreu a título de lucros cessantes.
O contrato de agência vem regulado no DL 178/86 de 3 de julho, com as alterações introduzidas pelo DL 118/93 de 13 de abril, pelo que, depois de se atender às cláusulas livremente contratualizadas pelas partes, ao abrigo do princípio da liberdade contratual previsto no art.º 405.º n.º 1 do C.Civil, é daquele regime legal que temos de nos socorrer e, em última análise, das normas gerais.
Dispõe o art.º 1.º da Lei do Contrato de Agência: “Agência é o contrato mediante o qual uma das partes se obriga a promover por conta da outra a celebração de contratos em certa zona ou determinado círculo de clientes, de modo autónomo e estável e mediante retribuição.”
O art.º 24.º estabelece as formas de cessação do contrato de agência: por acordo das partes; caducidade; denuncia e resolução.
Com interesse para a questão que cumpre aqui resolver, convoca-se as normas relevantes da Lei do Contrato de Agência que regem a respeito da denúncia e da resolução do contrato e respetivas consequências.
É o art.º 28.º que sobre a denúncia, dispõe: “1 - A denúncia só é permitida nos contratos celebrados por tempo indeterminado e desde que comunicada ao outro contraente, por escrito, com a antecedência mínima seguinte: a) 30 dias, se o contrato durar há menos de seis meses; b) 60 dias, se o contrato durar há menos de um ano; c) De três a doze meses, se o contrato durar há mais de um ano, conforme a sua importância, as expectativas das partes e as demais circunstâncias do caso. 2 - O prazo a que se refere o número anterior termina no fim do mês civil.”
O art.º 29.º vem estabelecer as consequências da falta de pré aviso, nos seguintes termos: “1 - Quem denunciar o contrato sem respeitar os prazos referidos no artigo anterior é obrigado a indemnizar o outro contraente pelos danos causados pela falta de pré-aviso. 2 - O agente poderá exigir, em vez desta indemnização, uma quantia calculada com base na remuneração média mensal auferida no decurso do ano precedente, multiplicada pelo tempo em falta; se o contrato durar há menos de um ano, atender-se-á à remuneração média mensal auferida na vigência do contrato.”
A respeito da resolução do contrato, vem o art.º 30.º enunciar as situações em que qualquer uma das partes contratantes o pode resolver, aludindo o art.º 31.º à forma e prazo da declaração de resolução.
Sobre a indemnização devida em caso de resolução do contrato, rege o art.º 32.º que nos diz:
“1 - Independentemente do direito de resolver o contrato, qualquer das partes tem o direito de ser indemnizada, nos termos gerais, pelos danos resultantes do não cumprimento das obrigações da outra. 2 - A resolução do contrato com base na alínea b) do artigo 30.º confere o direito a uma indemnização segundo a equidade.”
A propósito das causas de extinção do negócio jurídico, diz-nos Luís Menezes Leitão, in Direito das Obrigações, Vol. II, pág. 101: “Quando as obrigações resultam da autonomia privada, a sua extinção verifica-se sempre que o negócio que lhe serve de fonte vem a ser posteriormente destruído, ou por um outro negócio jurídico posterior (a revogação, a resolução ou a denúncia) ou através de um facto jurídico stricto sensu (a caducidade) ou ainda por um efeito conjugado dos dois (a oposição à renovação). Infelizmente, no entanto, o nosso legislador não foi muitas vezes preciso no emprego que faz destes termos, cabendo por isso ao intérprete distinguir claramente estas situações (…).”
A resolução do contrato, prevista no art.º 432.º do C.Civil, por corresponder a uma decisão unilateral de uma das partes que assim lhe põe fim, só é admitida com fundamento na lei ou no próprio contrato, como estipula o n.º 1 deste artigo. A parte não é livre de resolver o contrato, só surgindo o direito a resolvê-lo quando se verifica uma ocorrência que, de acordo com o previsto na lei ou no próprio contrato, admite que a parte lhe ponha fim unilateralmente – trata-se de um direito de exercício vinculado, que tem de ser fundamentado, sendo uma das situações mais comum que lhe pode dar origem o incumprimento contratual previsto no art.º 801.º n.º 2 do C.Civil.
Tal como a resolução do contrato, também a denúncia - que encontra o seu âmbito de aplicação nos contratos de execução duradoura sem prazo - corresponde a uma manifestação de vontade unilateral de um contraente no sentido de pôr fim ao contrato, mas ao contrário daquela não tem de ser fundamentada, não se exigindo para o efeito a invocação de qualquer motivo.
A denuncia visa pôr fim a uma vinculação indefinida dos contraentes, surgindo na conciliação de dois princípios: por um lado, o princípio da confiança da parte na manutenção de um contrato que se apresenta como continuado e duradouro e por outro lado, o princípio da autonomia da vontade que impõe que ninguém tenha de permanecer vinculado indefinidamente a obrigações que assumiu.
A respeito da denúncia ensina Luís Menezes Leitão, in ob. cit. pág. 105: “O seu campo de aplicação é limitado aos contratos de duração continuada ou duradoura (fornecimento, sociedade ou mandato), em que as partes não estipulam um prazo fixo de vigência. Como a vigência do contrato ilimitada no tempo seria contrária à liberdade económica das pessoas, não se compadece com a criação de vínculos perpétuos ou de duração indefinida, admite-se neste caso a sua denúncia a todo o tempo.”
Não obstante a figura da denuncia propriamente dita, seja restrita aos contratos sem prazo, de duração indeterminada, quer a jurisprudência, quer a doutrina têm vindo a admitir a aplicação do seu regime aos casos em que estamos perante um contrato com prazo, quando é prevista na lei ou no contrato a renovação automática no seu termo.
Sobre a denúncia no âmbito do contrato de agência, refere de forma clara o Acórdão do TRL 07.01.2020 no proc. 1294/17.8T8AMD.L1-7 inwww.dgsi.pt : “A LCA trata da denúncia em sentido próprio nos arts. 28 e 29, e da caducidade no art. 26. Não prevê de forma expressa o contrato celebrado por prazo automaticamente renovável (ou prorrogável), embora tal cláusula seja habitual em contratos de distribuição comercial. Em tal caso, o contrato poderá terminar no termo do prazo, inicial ou prorrogado, por uma declaração (unilateral e discricionária) de oposição à renovação (ou à prorrogação), que também se costuma designar por denúncia em sentido impróprio, ainda que a sua licitude possa depender, nos termos que as partes tenham acordado, de aviso com dada antecedência relativamente ao fim do prazo em curso. O contrato dos autos foi celebrado por prazo três anos, automaticamente prorrogável, na falta de prévia declaração de oposição à renovação. A natureza jurídica da declaração de oposição à renovação (ou à prorrogação), que conduz à dissolução do contrato tem sido discutida: para uns trata-se de «uma declaração de denúncia, já que a cessação decorre de um direito potestativo extintivo, de exercício livre e incondicionado, que produz efeitos ex nunc»; para outros, trata-se de uma hipótese atípica de caducidade; para outros, ainda, trata-se de figura autónoma, inconfundível com as demais. Ao abrigo do disposto no art. 406 do CC a que já aludimos, entendemos que a estipulação de renovação automática do prazo inicial é válida e eficaz. Se não o fosse, o contrato ter-se-ia transformado em contrato por tempo indeterminado no final do prazo inicial de três anos, nos termos do disposto no art. 27, n.º 2, da LCA («Considera-se transformado em contrato de agência por tempo indeterminado o contrato por prazo determinado cujo conteúdo continue a ser executado pelas partes, não obstante o decurso do respetivo prazo»). Em tal caso, seria possível a denúncia (cessação unilateral e discricionária) com pré-aviso de três meses, sob pena de indemnizar pelos danos causados pela falta de pré-aviso (arts. 28 e 29 da LCA).”
Como refere expressamente o art.º 28.º da Lei do Contrato de Agência, a denúncia só é permitida nos contratos celebrados por tempo indeterminado, o que não corresponde ao contrato dos autos, em que as partes fixaram um prazo de vigência de 12 meses, como consta expressamente do n.º 1 da cláusula 6ª, renovando-se automaticamente por períodos iguais de 12 meses, exceto se for denunciado por alguma delas com a antecedência mínima de 90 dias, em relação ao termo de cada período contratual, de acordo com o n.º 2 da mesma cláusula, o que corresponde à fixação de um prazo de pré aviso para a oposição à renovação do contrato pelas partes, cuja renovação automática foi por elas prevista, podendo equipara-se à figura da denúncia, enquanto declaração unilateral e não motivada de pôr fim ao contrato.
Neste sentido pronunciou-se, entre outros, o Acórdão do STJ de 19-02-2015 no proc. 320/08.6TCGMR.G1.S1 inwww.dgsi.pt que nos diz: “(…) como observa António Pinto Monteiro, tendo as partes assumido a rutura contratual, a ilicitude de uma resolução infundada poderá equiparar-se “a uma denúncia sem observância do pré-aviso exigível, o que implicará a correspondente obrigação de indemnização, sem que isso evite a extinção do contrato”. Assim sendo, a dita denúncia operada pela A., como agente, traduz-se, ao fim e ao cabo, numa resolução infundada, equiparável portanto a denúncia sem observância de pré-aviso, a qual, no caso, só seria admissível para efeitos de caducidade em relação ao termo do prazo contratual então em curso.”
Inexistindo fundamento para a resolução do contrato pela parte, a sua declaração de pôr-lhe fim quando está prevista a possibilidade de oposição à renovação, pode ser integrada na figura da denúncia, quando aquela é admissível como forma unilateral de pôr fim ao contrato, ainda que não tenha sido exercida em tempo, em face dos prazos estabelecidos na lei ou por acordo das partes, podendo nessa circunstância determinar a obrigação de indemnizar os prejuízos causados por não ter sido exercida no tempo devido.
Este entendimento tem vindo a ser acolhido pela jurisprudência, do que é ainda exemplo o Acórdão do TRL de 10-10-2024 no proc. 4389/22.2T8LSB.L1 inwww.dgsi.pt, relatado pela aqui 1ª adjunta e em que a aqui relatora foi adjunta, para o qual se remete para maior aprofundamento da questão, onde se conclui: “Efetivamente, no contrato em apreço, as partes estipularam que a duração do contrato era pelo prazo de 5 anos – não se tratava, pois, de um contrato de duração indeterminada, passível de denúncia no sentido técnico-jurídico do termo. No entanto, a lei confere ao locatário, no contrato de locação de estabelecimento com prazo certo, o direito potestativo de o denunciar, muito embora não se trate de uma denúncia propriamente dita, com o significado técnico-jurídico de que essa figura se reveste. Ou seja, é legalmente admissível a desvinculação discricionária, mas com um prazo de pré-aviso que as partes podem fixar dada a liberdade negocial que lhes é conferida (não sendo ilimitada, em face dos limites impostos pela boa fé e pelo equilíbrio dos interesses em presença). (…) Portanto, muito embora sendo ilícita a resolução que foi comunicada pela Ré, entendemos que não deixou de produzir os seus efeitos de cessação do contrato (nisto reconhecendo que assiste razão à Apelante), mas sem prejuízo do direito à indemnização que assiste à Autora, porque não deixa a atuação daquela de configurar um incumprimento definitivo do contrato.”
Na situação em presença, como se referiu e não é controvertido, estamos perante um caso em que o R. declarou pôr fim ao contrato que havia celebrado com a A., sem que se verificassem os pressupostos legais que o admitiam: por um lado por não estarem preenchidos os requisitos do art.º 30.º do DL 176/86 que lhe permitiam resolver o contrato; por outro lado, porque podendo opor-se à prorrogação automática do contrato no fim do prazo, sempre estava obrigado a observar o prazo contratual do pré aviso, o que não fez.
Atento o exposto, pode dar-se razão à Recorrente quando invoca o seu direito a ser indemnizada de acordo com o n.º 1 art.º 29.º do DL 178/86 de 3 de julho, norma que prevê que quem denunciar o contrato sem respeitar os prazos do pré aviso, é obrigado a indemnizar o outro contraente pelos danos resultantes da falta do aviso prévio, não se acompanhando nesta parte a fundamentação da sentença sob recurso que excluindo a aplicação do art.º 29.º no seu todo, avaliou o pedido indemnizatório da A. à luz do art.º 32.º daquele diploma que alude à indemnização devida em resultado da resolução do contrato infundada.
No que já não tem razão a Recorrente, é quando alega que não precisa de fazer prova dos danos que sofreu, pretendendo fazer funcionar a seu favor o n.º 2 do art.º 29.º daquele diploma, aplicando o critério ali previsto para o cálculo da indemnização em caso de denuncia, que a libertaria de fazer prova do dano efetivamente sofrido, aproveitando-se de uma regulação que o legislador expressamente reservou para o agente e que por isso não lhe é aplicável enquanto principal, dele não podendo beneficiar.
Regista-se que não pode acompanhar-se aqui o decidido pelo Acórdão do TRL de 18-04-2024 no proc. 486/23.5T8PDL.L1 inwww.dgsi.pt, que se pronuncia sobre situação semelhante, em processo no qual a Recorrente também foi A. e do qual a mesma se socorre numa grande parte da sua alegação de recurso sobre esta questão, pelo facto de se considerar que o cálculo da indemnização para a inobservância do prazo de pré aviso na denuncia, nos termos previstos no n.º 2 do art.º 29.º constitui uma prerrogativa do agente, atentas as especificidades da posição de cada uma das partes no contrato de agência, ao contrário do que ali foi decidido.
Relembra-se o teor do art.º 29.º n.º 2 do DL 178/86, que sobre as consequências da falta de observância do prazo do pré aviso na denuncia do contrato prevê: “O agente poderá exigir, em vez desta indemnização, uma quantia calculada com base na remuneração média mensal auferida no decurso do ano precedente, multiplicada pelo tempo em falta; se o contrato durar há menos de um ano, atender-se-á à remuneração média mensal auferida na vigência do contrato.”
O art.º 29.º n.º 2 da Lei do Contato de Agência consagra a possibilidade do agente pedir uma indemnização a forfait, calculada em determinados termos, em lugar da indemnização apurada de acordo com as regras gerais, a que alude o n.º 1.
Como ensina António Pinto Monteiro, in Contrato de Agência, pág. 54, em anotação ao art.º 29.º do DL 178/86: “Dadas as dificuldades de prova com que o agente se poderá deparar, ou porque a indemnização, apurada nos termos do n.º 1 pode não ser significativa, o n.º 2 oferece-lhe, em alternativa, a possibilidade de exigir uma quantia determinada segundo outro critério. Note-se que esta faculdade é restrita ao agente.”
Esta possibilidade representa uma proteção conferida pelo legislador ao agente enquanto contraente mais fraco no negócio, dispensando-o de fazer prova dos danos que efetivamente sofreu com a denuncia do contrato de agência pelo principal.
No mesmo sentido pronuncia-se Carlos Lacerda Barata, in Sobre o Contrato de Agência, pág. 88 ao referir: “O n.º 2 do art.º 29.º permite ao agente (e só a este) que exija, alternativamente, uma quantia calculada com base na remuneração média mensal auferida no ano precedente, multiplicada pelo tempo em falta, ou, se o contrato vigorar há menos de um ano, atendendo-se à remuneração média mensal auferida na sua vigência. Esta faculdade ilustra o pendor protecionista da lei perante o agente, protegê-lo-á contra a dificuldades de prova da existência de danos e seu montante.”
A Recorrente, defendendo a aplicação ao caso do regime previsto para a falta de observância do prazo do pré aviso previsto nos art.º 28.º e 29.º do DL 178/86, invoca ainda em seu abono o decidido pelo Acórdão do STJ de 19-12-2015 no proc. 320/08.6TCGMR.G1.S1 inwww.dgsi.pt, “esquecendo” que este acórdão, aplicando o art.º 29.º n.º 2 ao caso que decide, incide sobre um pedido indemnizatório feito por um agente, ao contrário do que acontece nos presentes autos, em que tal pedido é feito pelo principal.
A constatação de um direito indemnizatório da A. enquanto principal, por alegados danos sofridos pela cessação do contrato feita pelo agente, sem observância do prazo do pré aviso, conferido pelo n.º 1 do art.º 29.º da Lei do Contrato de Agência, tem de passar pelo regime geral da obrigação de indemnizar previsto nos art.º 562.º do C.Civil, exigindo-se em consequência a prova da verificação dos seus requisitos, cujo ónus é da A. nos termos do art.º 342.º n.º 1 do C.Civil, entre os quais a prova da existência dos danos que são reclamados.
Como resulta do princípio geral da obrigação de indemnizar previsto no art.º 562.º do C.Civil, o dano é pressuposto ou condição essencial do dever de indemnizar, sendo necessário que o facto ilícito culposo, no caso o incumprimento contratual, tenha causado prejuízo a alguém, podendo os danos reclamados ser de natureza patrimonial ou não patrimonial.
O dano patrimonial, repercute-se no património do lesado, seja a título de danos emergentes, seja de lucros cessantes, como prevê o art.º 564.º n.º 1 do C.Civil, compreendendo “não só o prejuízo causado, como os benefícios que o lesado deixou de obter em consequência da lesão”, reclamando aqui a A. a frustração de um ganho, em consequência do incumprimento do R.
A indemnização pedida pela A. ao R. no montante de € 137.233,08, parte do valor que o R. gerou de comissões para si, no âmbito da execução do contrato de agência, num total de € 244.608,05, de que retira a quantia de 53.538,37 relativa à remuneração que coube ao R., para concluir que teve um lucro de € 191.070,13, numa média mensal de € 17.370,01, referindo que aquele valor peticionado corresponde aos ganhos que deixou de obter com os serviços do R. nos 7 meses e 27 dias em falta até ao fim do prazo do contrato, o que ficciona por aplicação do critério que a lei no art.º 29.º n.º 2 do DL 178/86 prevê que só o agente possa beneficiar, pela sua específica posição contratual.
Na situação em presença a A. limitou-se a invocar o seu direito indemnizatório, calculando ou ficcionando os ganhos que deixou de obter com base no valor mensal médio que o R. lhe deu a ganhar enquanto trabalhou para si, aplicando o critério do art.º 29.º n.º 2 da Lei do Contrato de Agência de que, enquanto principal, não pode beneficiar, não alegando sequer os factos que, a provarem-se, poderiam vir a revelar o prejuízo que sofreu por ter deixado de beneficiar dos serviços do R. antes do termo do contrato e sem observância do prazo de pré aviso.
A exclusão da aplicação desta norma ao principal, que a sentença recorrida também decidiu, ao considerá-la apenas aplicável ao agente, é o que determina a improcedência do pedido indemnizatório de lucros cessantes, não se colocando a questão em termos de abuso de direito, já que para que assim fosse teria de ser reconhecido o direito da A. a usar o critério previsto no art.º 29.º n.º 2 da Lei do Contrato de Agência, em vez de recorrer às regras gerais, o que não acontece.
Verifica-se ainda, que os factos que resultaram provados não permitem sequer concluir pela existência de um prejuízo patrimonial real e efetivo sofrido pela A., correspondente a ganhos que deixou de auferir em razão do R. ter posto fim ao contrato antes do seu termo e sem observar o prazo do pré aviso, suscetível de determinar a obrigação de indemnizar na quantia reclamada ou noutro montante.
Nada aponta para a circunstância de que o facto do R. ter deixado de prestar os seus serviços para a A. - não sendo a obrigação contratual assumida de resultado – determinou que a mesma não tivesse auferido nesse período lucros que de outra forma obteria, salientando-se, por um lado, que como consta do ponto 30 dos factos provados, todo o trabalho que estava acometido ao R. foi transferido para os restantes colaboradores da A. e, por outro lado, não obstante ter deixar de trabalhar para a A. a carteira de clientes e imóveis angariados pelo R. permaneceram com a A. quando da sua saída, ficando esta com a possibilidade de fazer suas as comissões de futuras vendas, atento o disposto na cláusula 10ª do contrato, como aliás os factos provados mostram que veio a acontecer.
Em conclusão, não tendo a A. alegado e provado, como lhe competia de acordo com o disposto no art.º 342.º n.º 1 do C.Civil e nos termos gerais do regime da obrigação de indemnizar, que teria obtido ganhos que não obteve, pelo facto do R. ter posto termo ao contrato antes do seu termo e sem observar o prazo de pré aviso, improcede o pedido indemnizatório que apresenta a título de lucros cessantes. - da (indevida) redução da cláusula penal fixada pelas partes para a violação da exclusividade ou não concorrência
Insurge-se a Recorrente contra a decisão que reduziu o valor da cláusula penal fixada na cláusula 3ª do contrato para € 20.000,00 pugnando pela sua manutenção em € 60.000,00, alegando que o R. sabia bem que esse era o resultado da violação dos seus deveres contratuais de não concorrência.
O regime da cláusula penal vem previsto no art.º 810.º do C.Civil que, no seu n.º 1, deixa às partes a possibilidade de fixarem previamente o montante da indemnização por acordo, numa manifestação do princípio da liberdade contratual consagrado no art.º 405.º do C.Civil.
O principal objetivo da cláusula penal é o de evitar dúvidas futuras e litígios quanto à determinação da indemnização, mas ela é fixada muitas vezes com o carater de verdadeira penalidade- vd. neste sentido, Pires de Lima e Antunes Varela, in Código Civil anotado, Vol. II, pág. 57, assumindo essa função no caso concreto, no sentido de se apresentar como dissuasora do incumprimento.
Como diz o Acórdão do TRL de 22-06-2021 no proc. 6133/17.7T8FNC.L1-7 inwww.dgsi.pt : “Trata-se de convenção através da qual as partes fixam o montante da indemnização que deve ser satisfeita em caso de eventual incumprimento ou mora, prefixando o valor do dano, libertando o credor da prova do concreto dano sofrido. (…), pelo que não há que averiguar se a A. sofreu ou não prejuízos, como consequência da inexecução da obrigação, nem o seu valor, sendo-lhe lícito pedir o montante correspondente à cláusula penal fixada.”
O art.º 812.º vem prever que a cláusula penal contratualmente estabelecida possa ser equitativamente reduzida, ao dispor no seu n.º 1: “A cláusula penal pode ser reduzida pelo tribunal, de acordo com a equidade, quando for manifestamente excessiva, ainda que por causa superveniente; é nula qualquer estipulação em contrário.”
Esta norma vem contemplar a possibilidade de uma sindicância da cláusula penal contratualmente estabelecida, por parte do tribunal, quando se constata que da sua aplicação, sem mais, resultam situações de manifesto desequilíbrio e injustas, que justificam a sua redução.
Diz-nos Pinto Monteiro in Cláusula Penal e Indemnização, pág. 473: “o poder referido pelo artigo 812º, constitui uma forma de controlar o exercício do direito à pena, impedindo atuações abusivas do credor. Ainda que ela haja sido estipulada em termos razoáveis, será abusivo, porque contrário à boa fé, exigir o cumprimento integral de uma pena que as circunstâncias presentes mostram ser manifestamente excessiva, em termos de ofender a equidade.”
No mesmo sentido pronuncia-se, em anotação a este artigo 812.º, Ana Filipa Morais Antunes, in Comentário ao Código Civil, ed. Faculdade de Direito da Universidade Católica Portuguesa, Direito das Obrigações, Das obrigações em Geral, pág. 1172: “O preceito sob anot. contempla uma modalidade de controlo judicial da cláusula penal, ancorada na ideia de desequilíbrio grosseiro ou manifesto (na gíria internacional, releva o gross disparity), que evidencia uma assimetria relevante entre as prestações em referência, a saber, a prestação não realizada e a prestação objeto da cláusula penal.”
Relembra-se a cláusula 3ª do contrato celebrado entre as partes, que está aqui em causa e que rege nos seguintes termos: CLÁUSULA 3.ª EXCLUSIVIDADE 1. O Segundo Outorgante prestará os serviços que são objeto do presente contrato, descritos na Cláusula 1.ª, em regime de exclusividade, para a Primeira Outorgante. 2. O Segundo Outorgante obriga-se a não prestar serviços de técnico de angariação imobiliária ou de angariador imobiliária para qualquer outra Sociedade de Mediação Imobiliária no prazo de 24 (vinte e quatro) meses, contados a partir do termo do presente Contrato de Prestação de Serviços e independentemente da causa da sua cessação, sob pena de indemnizar a Primeira Outorgante de todas as despesas em que incorreu com a formação e transmissão continuada de conhecimentos, gerais e específicos, os quais foram essenciais e fundamentais para sua prestação de serviços e para os resultados e exercício da atividade do Segundo Outorgante, nomeadamente porquanto muitos deles advieram dos contactos e conhecimentos pessoais e profissionais dos sócios e gerentes da Primeira Outorgante e, outros, tendo origem em contatos gerados na loja de atendimento ao público, sede da Primeira Outorgante. Tanto mais que, confessa, o Segundo Outorgante, não tinha qualquer experiência nesta área profissional de angariação e mediação imobiliária, os quais foram, na íntegra, transmitidos pela Primeira Outorgante, de acordo com o seu próprio método de trabalho e conhecimento do mercado local e técnicas específicas de angariação e venda criadas e desenvolvidas pela Primeira Outorgante segundo o seu próprio método pessoal de trabalho e experiência pessoal e profissional da sua gerência, essências para a otimização dos resultados obtidos. 3. Nestes termos, em caso de incumprimento pelo Segundo Outorgante, do disposto no número anterior, deverá o mesmo de pagar uma indemnização à Primeira Outorgante, no montante correspondente a 3 (três) vezes o capital social desta à data de assinatura do presente contrato, quantia da qual o Segundo Outorgante se considera devedor e aceita sem qualquer possibilidade de redução judicial ou extrajudicial.
É estabelecida uma cláusula contratual que prevê o pagamento pelo agente de uma indemnização, correspondente a três vezes o capital social da A. – equivalente a € 60.000,00 - por violação da obrigação de exclusividade por parte do agente, que é fixada em 24 meses, se este vier a prestar serviços para outra sociedade imobiliária na sequência da cessação do contrato, o que assume a natureza de cláusula penal.
A sentença recorrida admitindo o funcionamento da cláusula penal acordada, julgou desproporcional o valor estabelecido, procedendo à sua redução para a quantia de € 20.000,00 nos termos previstos no art.º 812.º n.º 1 do C.Civil, justificando da seguinte forma a decisão: “Conforme se pode ver da simples leitura das cláusulas em disputa, as mesmas têm um âmbito de aplicação muito vasto: desde já, têm aplicação a todo o território nacional e não, tão só, à área territorial em que o R. exercia a sua atividade; por outro lado, o leque de atividades abrangidas é consideravelmente amplo, abarcando contratos para a prestação de serviços no âmbito da atividade de consultadoria financeira, contratos de mediação de seguros, mediação imobiliária, mediação de obras ou mediação de veículos, acordo ou protocolo com Instituições de Crédito ou Financeiras, Empresas de Seguros ou de Mediação de Seguros e Empresas de Mediação Imobiliária para o exercício das atividades objeto daquele mesmo contrato….etc.…durante um período de pelo menos 12 meses subsequentes aos da cessação do contrato…depois, em segundo lugar, a relação jurídica entre a A. e o R. enquadra-se no âmbito do designado contrato de agência comercial (artºs.1º e 5º do Decreto-Lei nº.178/86 de 3.7) - veja-se, no que toca ao regime geral deste tipo contratual, cfr Engrácia Antunes, J. (2019) Direito dos Contratos Comerciais, Almedina, fls 439-446…sendo certo que, apesar deste regime permitir a estipulação de pacto de não concorrência - artº.9º da Lei da agência - regulamenta-o nos seguintes termos: “1 - Deve constar de documento escrito o acordo pelo qual se estabelece a obrigação de o agente não exercer, após a cessação do contrato, atividades que estejam em concorrência com as da outra parte. 2 - A obrigação de não concorrência só pode ser convencionada por um período máximo de dois anos e circunscreve-se à zona ou ao círculo de clientes confiado ao agente.” Atente-se que o artº.9º acabado de referir deve ser lido em conjunto com o que decorre do artº.13º, nº.1, al.g) do mesmo diploma legal…sede onde se atribui ao agente o direito a uma compensação, pela obrigação de não concorrência após a cessação do contrato…devendo, também, ter-se em conta o que vem do artº.20º, nº.2, al.d) da Diretiva 86/653/CEE do Conselho de 18.12, onde se estabelece como pressuposto de validade da cláusula de não-concorrência esta dizer respeito ao sector geográfico ou ao grupo de pessoas e ao sector geográfico confiados ao agente comercial bem como ao tipo de mercadorias de que, nos termos do contrato, ele tinha a representação. Em termos nacionais…o Tribunal Constitucional já se pronunciou sobre esta norma, tendo concluído pela constitucionalidade da mesma e que esta não violava a liberdade de escolha e de exercício de profissão, na modalidade de proibição do excesso, nos termos de uma leitura combinada dos artºs.18º, nº.2 e 47º, nº.1 da CRP com as exigências da Diretiva 86/653/CEE do Conselho de 18/12 (cfr o Acórdão do Tribunal Constitucional nº.129/2020, de 3.3.2020, processo nº.502/2019). Também o TRL, por via do Ac. de 5.11.2020, proc. nº.2017/19.2T8PDL.L1-2, nos esclareceu que estas cláusulas consubstanciam o vulgarmente denominado pacto de não concorrência ou konkurrenzklausel no direito germânico, bem como o patto di non concorrrenza a que alude o arº.2125.º do Código Civil italiano, por via da qual uma das partes contratantes se compromete a não praticar ação que induza desvio de clientela da outra; com efeito, com o escopo de manter ou atrair clientela, as empresas procuram a proteção das técnicas de produção, know-how, dados comerciais, bem a preservação de empregados altamente qualificados, o que levou a adoção de estipulações deste tipo. Este tipo de cláusulas, comuns no âmbito laboral, destinam-se a precaver o empregador contra a designada concorrência diferencial, ou seja, o conhecimento privilegiado que algum antigo trabalhador subordinado possa ter da organização económica da empresa, em particular dos seus clientes, de forma a ter uma posição de vantagem perante o empregador, em face dos seus demais concorrentes. A lei sujeita a validade da cláusula em questão a apertados limites: (a) desde logo, deve constar de documento escrito; (b) por outro lado, deve ter o prazo máximo de 2 anos, contados a partir do momento da cessação do contrato de agência; (c) ainda, a sua eficácia é limitada à zona ou círculo de clientes que tenha sido confiado ao agente; todos estes pressupostos são estabelecidos sob pena de nulidade (artº.220º do CC). Quanto à obrigatoriedade da atribuição de uma compensação pelo período de inatividade, prevista no artº.13º, nº.1, al.g) do Decreto-Lei nº.178/86 de 3.7, a Jurisprudência dos Tribunais Superiores tem oscilado quanto às consequências da sua inobservância….assim: no Ac. do TRP de 7.12.2018, proferido no proc. nº.2521/16.4T8STS.P1, decidiu-se que a previsão de uma compensação pelo período de não-concorrência constitui uma condição de validade da cláusula, por força do disposto no artº.280º do CC e que, não tendo sido estipulado no contrato de agência em discussão naqueles autos qualquer contrapartida pecuniária pela obrigação de não concorrência, não assiste ao principal o direito, em caso de violação do pacto de não concorrência, de exigir do agente a indemnização previamente fixada no contrato, para hipótese de incumprimento dessa cláusula; nos Acs. do TRL de 26.2.2019, proferido no proc. nº.13603/16.2T8SNT.L1-1; de 7.1.2020, proferido no proc. nº.1294/17.8T8AMD.L1-7 e de 5.11.2020, proferido no proc. nº.2017/19.2T8PDL.L1-2, considerou-se que a não estipulação de uma compensação pelo período de inatividade não constitui condição de validade da cláusula, não sendo geradora da nulidade do negócio, por força do disposto no artº.280º do CC, na medida em que a mesma poderá ser enquadrada enquanto uma cláusula penal, afigura-se sempre possível ao Juiz proceder à sua redução, nos termos do disposto no artº.812º, nº.1 do CC, em montante equivalente ao que a autora teria que despender para compensar o R. pelo período de não-concorrência. Aqui chegados, olhando para as cláusulas que nos ocupam, a de não concorrência e penal, e perspetivadas à luz dos vícios que lhe estão apontados…logo vemos que as mesma sofrem de invalidades que, não as podendo ter como nulas, importam a sua redução, seja porque a sua abrangência vai para lá dos limites territoriais em que operava e opera o agente…seja porque o valor nela inscrito é excessivo face aos rendimentos presumivelmente a auferir pelo R, no período por que perdurasse a sua inatividade resultante do cumprimento da não concorrência…assim, impõe-se reduzi-las, lançando mão do disposto no nº.1 do artº.812º do CC, compatibilizando-a com o prescrito na al.g) do artº.13º do DL nº.178/86, de 3 de julho….coisa que mais abaixo se fará porque imposta, antes disso, perceber da licitude ou ilicitude da cessação do contrato preconizada pelo R. (…) Ora, ponderando as circunstâncias do caso concreto, reputamos, para o que aqui importa, a cláusula penal, fixada no valor de sessenta mil euros, manifestamente excessiva e desproporcionada. Repare-se que o R. esteve formalmente ao serviço da A. de 2 de junho de 2020 a 5 de outubro de 2022…sendo certo que no desempenho dessas funções auferiu o montante total de €53.538,37, ainda que parte desses réditos fossem pagos contra recibo emitido pela sua esposa. Para além disso, foi ainda convencionada uma obrigação de exclusividade de não concorrência a impender sobre o R. e que o proibia de exercer a mesma atividade nos 12 meses seguintes à cessação do vínculo com a A., sendo que o âmbito de tal cláusula abrangia todo o território nacional, não correspondente esta área geográfica ao limites onde o R. exercia a sua atividade, em clara violação do disposto no artº.9º, nº.2 do Regime Jurídico do Contrato de Agência, o qual dispõe que a obrigação de não concorrência circunscreve-se à zona ou ao círculo de clientes confiado ao agente. O para lá das comissões que recebeu o R. beneficiou de formação que lhe foi ministrada a expensas da A., contudo, não teve esta a capacidade de apontar o valor dessa formação. A equidade aferir-se-á naturalmente com referência ao valor do contrato celebrado entre as partes, sendo que teremos de ter em conta o desequilíbrio contratual, a favor da A., bem como a circunstância de não ter sido fixada qualquer compensação pela obrigação de não concorrência. Aqui chegados, sopesando a posição de cada uma das partes e o benefício que cada uma obteve da relação estabelecida entre ambas, temos como seguro, não se tendo apurado qualquer prejuízo para a A., que a redução pela equidade impõe que o valor da cláusula penal se encolha, tendo também presente a redução da área geográfica da cláusula de não concorrência limitando-a ao território insular açoriano, para €20.000,00. Valor este que se aponta como justo e substancialmente coerente com os princípios da boa fé e equidade, radicando no direito indemnizatório estabelecido no contrato e, por isso, muito longe do instituto do enriquecimento sem causa que não é, aqui, chamado à colação em razão disso.”
Salienta-se que, não tendo o R. recorrido da decisão e em razão do princípio da proibição da reformatio in pejus contemplado no art.º 635.º n.º 5 do CPC, a única coisa que importa avaliar a respeito desta questão é a de saber se a cláusula penal de € 60.000,00 não deve ser reduzida para € 20.000,00, como entendeu a sentença recorrida.
Desde já se adianta que não pode dar-se razão à Recorrente nesta questão.
Tal como se refere na sentença, verifica-se que a cláusula em questão estabelece uma obrigação de não concorrência pelo R. durante um determinado período de tempo, constatando-se que, no caso, o contrato não alude a qualquer compensação a prestar pela A., em contrapartida da obrigação de não concorrência.
Importa não esquecer o disposto no art.º 13.º n.º 1 al. g) do DL 178/86 de 3 de julho, norma que vem conferir ao agente o direito a haver uma compensação do principal, em contrapartida do cumprimento da obrigação de não concorrência, após a cessação do contrato.
Esta compensação imposta ao principal pela lei, traduz-se numa forma de proteção do agente, na medida em que o cumprimento da obrigação de não concorrência em benefício do principal, o priva de exercer a sua atividade profissional durante o período estabelecido.
Não se discute aqui a validade da cláusula de não concorrência nos termos em que foi estabelecida no contrato, na medida em que a sentença sob recurso, avaliando a controvérsia que existe sobre a questão da validade de uma cláusula contratual desta natureza, sem que seja atribuída uma compensação ao agente pelo período de inatividade, nos termos do mencionado art.º 13.º n.º 1 al. g), não foi alheia ao facto da jurisprudência dos tribunais superiores se dividir quanto às consequências da sua não observância, citando acórdãos num sentido e noutro e concluindo que não sendo nula tal cláusula de não concorrência, impunha-se a redução da cláusula penal estabelecida para o incumprimento de tal obrigação do agente.
Sobre esta questão e merecendo a nossa inteira concordância, diz-nos com toda a clareza o Acórdão do TRL de 07-01-2020 no proc. 1294/17.8T8AMD.L1-7 inwww.dgsi.pt: “A celebração de pactos de não concorrência para vigorarem após o termo da relação contratual, se, por um lado, é compreensível e habitual na economia de contratos de distribuição integrada, por outro lado, contende com interesses legal e constitucionalmente protegidos, nomeadamente de liberdade de escolha da profissão e de liberdade de iniciativa económica provada (arts. 47, n.º 1, e 61, n.º 1, da CRP). Por essa razão, a LCA sujeita a sua convenção a requisitos apertados. Nos termos do disposto no art. 9.º, a obrigação de o agente não exercer, após a cessação do contrato, atividades que estejam em concorrência com as da outra parte:(…) Existe, ainda, uma outra norma importante no regime de um pacto de não concorrência: de acordo com o disposto na al. g) do art. 13 da LCA, o agente tem direito a uma compensação, pela obrigação de não concorrência após a cessação do contrato. O acordo de não concorrência exige sempre uma contrapartida, é necessariamente oneroso, ex vi lege. A compensação não carece de ser estipulada, não se trata de um pressuposto de validade do pacto de não concorrência; trata-se de uma imposição legal que terá de ser atendida, ainda que não acordada. Escreve a propósito Ferreira Pinto: «o pagamento da referida compensação («Karenzentschädigung» a denominam, de forma sugestiva, os autores alemães) não carece de expressa previsão contratual, muito embora seja, evidentemente, desejável que os próprios interessados acordem nos parâmetros da sua fixação. Ou seja, e por outras palavras, o dever de compensar o agente é uma mera consequência ou um efeito legal que se associa à celebração de um acordo desse tipo e não um pressuposto da respetiva validade ou eficácia. A solução adotada pela lei portuguesa revela-se sensata e equilibrada, podendo mesmo dizer-se que ela seria, em qualquer caso, preceituada pelo princípio da proporcionalidade no estabelecimento de restrições ao exercício de direitos fundamentais. Mas salta à vista a insuficiência da disciplina que a LCA consagra à aludida compensação, pois nada se dispõe, nomeadamente, quanto ao momento em que deve ser paga e aos critérios que devem presidir ao respetiva cálculo. O que constitui, naturalmente, uma fonte de potenciais litígios judiciais entre os interessados, para além de lançar sobre os tribunais o ónus de, em última análise, colmatar o vazio legal mediante recurso a critérios de pura equidade. De novo sem qualquer pretensão de aprofundar o assunto, dir-se-á apenas que a compensação deve, em princípio, ajustar-se às perdas que o agente previsivelmente sofrerá em função da inibição de atividade induzida pelo pacto, durante todo o período por que a mesma vigorar».”
No sentido da compensação a atribuir ao agente não constituir um pressuposto de validade do pacto de não concorrência, pelo facto de que, não obstante tenha que ser atendida e atribuída, pode não ser contratualmente estabelecida, mas fixada posteriormente pronuncia-se, entre outros, o Acórdão do STJ de 18-03-2021 no proc. 2017/19.2T8PDL.L1.S1 inwww.dgsi.pt quando refere: “A compensação do agente tanto pode ser convencionada, com a vantagem de ficar, desde logo, determinada num valor certo, como vir a ser objeto de fixação posterior, designadamente através de decisão judicial, no caso de subsistir desacordo insanável entre as partes. No sentido de que a compensação não está dependente de acordo prévio, desde há muito, se tem expressado a doutrina (JANUÁRIO GOMES, Apontamentos sobre o Contrato de Agência, in Tribuna da Justiça, 1990, 3, pág. 28, e F. FERREIRA PINTO, Contratos de Distribuição, 2013, pág. 456). Na verdade, no caso da convenção da obrigação de não concorrência, a compensação é um efeito legal inerente à mesma convenção, não interferindo sequer na sua validade (F. FERREIRA PINTO, ibidem).”
No caso, o que é certo é que a A. está a querer que o R. a indemnize pelo incumprimento da obrigação de não concorrência a que se obrigou, sem que se tenha disposto a compensá-lo pelo facto dele ficar sem a possibilidade de exercer a sua atividade profissional durante aquele período de tempo de 24 meses, o que manifestamente carece de correspectividade, como reconheceu o legislador no mencionado art.º 13.º n.º 1 al. g) do DL 178/86 e não pode deixar de influenciar o valor indemnizatório estabelecido para o incumprimento daquela obrigação.
A cláusula penal no valor de três vezes o capital social da A. foi fixada para o incumprimento da obrigação de não concorrência do agente nos 24 meses a contar do fim do contrato. A observância dessa obrigação pelo R., determinaria que o mesmo não exercesse a sua atividade profissional de agente imobiliário nesse período de tempo, o que a A. sempre estaria obrigada a compensar, nos termos previsto no art.º 13.º n.º 1 al. g), por valor que teria de se aproximar daquilo que ele deixaria de receber por dois anos de não concorrência em benefício da A.
Tendo o R. durante 14 meses, desde agosto de 2021 a setembro de 2022, período em que trabalhou para a A. auferido € 53.538,37, como resulta dos factos provados nos pontos 26 e 27, pode presumir-se que em 24 meses de atividade pudesse receber cerca de € 90.000,00, pelo que uma compensação adequada e equitativa pelo não exercício da sua atividade de agente imobiliário por aquele período de tempo, teria de aproximar-se desse valor, o que se apresenta como substancialmente superior ao montante da cláusula penal fixada.
Assim sendo, tal como entendeu a sentença recorrida, tal cláusula penal apresenta-se como manifestamente excessiva à luz do art.º 13.º n.º 1 al. g) do DL 178/86 de 3 de julho e deve ser reduzida pelo tribunal, de acordo com o disposto no art.º 812.º n.º 1 do C.Civil, não se apresentado o valor de € 20.000,00 como reduzido, antes pelo contrário.
É certo que na cláusula contratual em questão, também se contempla o facto da A. prestar formação ao R., o que a matéria de facto mostra que efetivamente aconteceu, com o que a A. terá incorrido em despesas, ainda que não tenha invocado o seu valor, nem se tenha apurado qualquer prejuízo em concreto relativamente a essa questão, mas a verdade é que o valor de € 20.000,00 para o qual foi reduzida a cláusula penal permite acautelar essa situação e os danos a ressarcir com a formação ministrada ao R. resultante dos factos apurados.
Tal como entendeu a sentença sob recurso, considera-se manifestamente desadequada e desproporcional ao prejuízo a ressarcir e mesmo contrário à boa fé, a cláusula penal de € 60.000,00 estabelecida no contrato, correspondendo a três vezes o capital social da A. e a mais do que aquilo que o R. auferiu a trabalhar para a A. durante cerca de 13 meses, dela resultando uma desequilibrada repartição dos direitos e deveres das partes, sem razão atendível que o justifique, ao impor ao agente aquele valor de ressarcimento pela violação de uma obrigação de não concorrência que foi estabelecida sem qualquer contrapartida, ficando a A. desonerada da compensação que a lei impõe como contrapartida, em manifesto desequilíbrio das prestações, como se apenas existisse uma obrigação do R.
Resta concluir que não existe qualquer fundamento válido para aplicar o valor da cláusula penal fixada no contrato, mantendo-se a sentença proferida quando reduz o seu valor para € 20.000,00, ao abrigo do disposto no art.º 812.º do C.Civil.
V. Decisão:
Em face do exposto, julga-se totalmente improcedente o recurso interposto pela A., confirmando-se a decisão recorrida.
Custas pela Recorrente que ficou vencida – art.º 527.º n.º 1 e 2 do CPC.
Notifique.
*
Lisboa, 19 de dezembro de 2024
Inês Moura
Laurinda Gemas
João Paulo Raposo