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DESERÇÃO DA INSTÂNCIA
SUSPENSÃO DA INSTÂNCIA
VENDA
AGENTE DE EXECUÇÃO
Sumário
SUMÁRIO (artigo 663.º, n.º 7, do CPCivil): I. Enquanto causa de extinção da instância, a deserção decorre da suspensão da instância por tempo superior a seis meses em razão de descuido ou incúria da parte em promover o seu andamento. II. A deserção funda-se no princípio da autorresponsabilidade das partes. III. A instância não se extingue por deserção se a execução estiver na fase da venda e o AE não a impulsione durante mais de seis meses.
Texto Integral
Acordam na 2.ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa
I. RELATÓRIO.
Fundada em duas livranças, em 04.03.2020 a Exequente, A …, SA., deduziu processo comum de execução para pagamento de quantia certa contra os Executados, B …, C …, D …, E … e F ….
Os Executados foram citados.
Com data de 22.02.2022 mostra-se penhorado o direito de usufruto sobre o prédio rústico sito em Santa …, descrito na Conservatória do Registo Predial de Santa Cruz das Flores com o n.º …, e inscrito na matriz sob o artigo ….º.
Com data de 01.07.2022 mostra-se registada a penhora do usufruto sobre o prédio urbano sito em Alcabideche, Cascais, descrito na 2.ª Conservatória do Registo Predial de Cascais com o …/… e inscrito na respetiva matriz sob o artigo ….º.
Em 29.06.2022 foi expedida carta registada a G …, notificando-o de que «se encontra penhorado à ordem dos presentes autos, o direito de usufruto que a executada D …, NIF nº …, detém sobre o prédio urbano sito na freguesia de Santa …, concelho de Santa Cruz das Flores, descrito na CRP de Santa Cruz das Flores sob o nº … e inscrito na matriz sob o artigo … e sobre o prédio urbano sito na freguesia de Alcabideche, concelho de Cascais, descrito na 2ª CRP de Cascais sob o nº …, e inscrito na matriz sob o artigo …» (negrito da autoria dos aqui subscritores).
Aberto o concurso de credores, em 05.07.2022 o Senhor Agente de Execução determinou a venda do referido direito de usufruto sobre o prédio rústico, descrito com o n.º …, através de leilão eletrónico, com o valor base de €40.000,00 e o valor mínimo de €34.000,00.
Em 14.07.2022 procedeu-se à penhora do crédito de €977,19 referente a Reembolso de IRS do ano de 2021.
Os Executados E … e F … deduziram oposição à execução, a qual foi julgada improcedente, conforme Apenso A.
Os credores foram citados para a execução e foi proferida sentença de reconhecimento e graduação de créditos, conforme Apenso B.
G … deduziu embargos de terceiro relativamente aos referidos prédios urbanos, sendo que em 09.09.2022 foi determinada a suspensão da execução quanto a tais prédios e por sentença de 14.12.2022, transitada em julgado, os embargos de terceiro foram julgados procedentes e a Exequente, bem como os Executados foram condenados «a reconhecerem o imediato levantamento das penhoras registadas sobre o usufruto nas fichas n.ºs …/… e …/…, bem como o cancelamento dos respetivos registos» (negrito da autoria dos aqui subscritores), conforme Apenso C.
Aquela sentença foi notificada ao Senhor Agente de Execução em 15.12.2022.
Em 01.03.2023 o Senhor Agente de Execução juntou aos autos print de consulta do Registo Predial referente a referido prédio urbano sito na freguesia de Alcabideche, Cascais, descrito com o nº ….
Em 01.02.2024 o Senhor Agente de Execução juntou aos autos print de consulta do Registo Predial do prédio urbano, sito em Alcantarilha, Silves, descrito na Conservatória do Registo Predial de Silves com o n.º …/…, inscrito na respetiva matriz sob o artigo ….º, o qual mostra-se registado a favor de pessoas diversas dos aqui Executados.
Em 20.06.2024 o Juízo Central Cível e Criminal de Angra do Heroísmo proferiu a seguinte decisão:
«Visto.
Compulsados os autos verifico que a execução se encontra parada desde pelo menos 01.03.2023, data em que o Sr. AE junta um print de consulta de registo predial, conforme refª. ….
Depois disso, o processo não avançou de modo algum, com quaisquer diligências que fossem requeridas pela exequente ou desenvolvida pelo Sr. AE.
Pelo que, vem o Sr. AE pelas refª. … datada agora de 01.02.2024, repetir aquela consulta de registo predial.
Sendo que, nada mais foi requerido e esta execução encontra-se literalmente sem impulso processual há mais de seis meses por manifesta negligência da exequente.
Por conseguinte, julgo deserta a presente instância nos termos do artigo 281º/5 do CPC.
Custas pelo exequente.
Registe e notifique».
(Negrito da autoria dos aqui subscritores).
Notificado daquela decisão, em 24.06.2024 o Senhor Agente de Execução veio dizer e requerer o seguinte:
«- Em 22/02/2022 foi efectuado o registo de penhora do direito de usufruto que a executada D … detém no prédio rústico sito na freguesia de Santa Cruz das Flores, concelho de Santa Cruz das Flores, descrito na CRP de Santa Cruz das Flores sob o nº …, e inscrito na matriz sob o artigo …;
- Foi a executada notificada, na qualidade de fiel depositária do bem, para vir indicar a localização do mesmo, bem como o seu Ilustre Mandatário, contudo os mesmos não ofereceram resposta;
- Ao fim de algumas insistências, o Mandatário da executada responde em Setembro de 2022, dizendo que a sua constituinte reside em Moçambique com a família, e tencionava deslocar-se à ilha em Dezembro daquele ano para passar a quadra natalícia, contudo o AE não tinha disponibilidade de se deslocar à ilha naquela altura, nem conseguiu arranjar ninguém que lá fosse por se tratar daquela quadra;
- A fim de melhor localizar o bem, começou o aqui Agente de Execução as diligências necessárias junto das entidades competentes, nomeadamente junta de Freguesia, Câmara Municipal, CTT, gerente da CGD da Ilha das Flores (dado que o prédio tem uma hipoteca da CGD, a fim de verificar nos documentos a localização do mesmo), os Serviços Florestais e do Ambiente;
- Todas essas diligências se mostraram frustradas porque, ou o organismo não dispunha de qualquer informação pertinente, ou os que tinham, remetiam todos para um prédio urbano com uma moradia edificada.
Face ao exposto, requer-se a V. Exa. que a instância não seja considerada deserta, uma vez que o aqui Agente de Execução, pese embora não fosse comunicando aos autos as diligências que estava a fazer extrajudicialmente para localizar o prédio, facto que desde já se penitencia, o mesmo esteve sempre em constante tentativa de localizar o mesmo.
Para tanto,
Requer-se a V. Exa. que este vá aos autos para os devidos efeitos».
(Negrito da autoria dos aqui subscritores).
Em 26.06.2024 o Juízo Central Cível e Criminal de Angra do Heroísmo proferiu a seguinte decisão:
«Visto.
Requerimento com a refª. …, datado de 24.06.2024 e proveniente do Sr. AE -
Não obstante a pertinência do ali exposto, a verdade é que primeiro, nem se percebe bem como um prédio rústico que se encontra descrito na CRP de Santa Cruz das Flores e descrito na matriz das Finanças de Santa Cruz das Flores, o qual deve possuir o cadastro geolocalizado do prédio em questão, tudo de acordo com a respetiva ficha matricial, é assim tão difícil de encontrar numa das ilhas mais pequenas dos Açores, de modo a que pelo menos dois (2) anos demorou e ainda não sabe, onde fica este prédio!
Em segundo lugar, ainda que não existisse nenhum Agente de Execução disponível na quadra natalícia que a Executada foi às Flores, o que não concebemos sequer porque também se trabalha na quadra natalícia tal como faz o tribunal, o Sr. AE poderia e deveria por exemplo ter solicitado ao próprio tribunal que o auxiliasse nessa localização designadamente, através dos bons ofícios da PSP local a fim de que se soubesse dessa localização concreta.
O que nunca nos foi pedido e muito menos sequer, informado, que estava em causa a localização deste prédio rústico!
Em terceiro lugar, a quantia exequenda nestes autos ultrapassa os 2.000.000,00 € (dois milhões de euros) e em quatro anos de tramitação do processo apenas foram penhorados cerca de 900€ de IRS e este usufruto que foi avaliado pelo Sr. AE em 40.000,00 € quando o que afirma na sua decisão de venda datada de 05.07.2022, o seu valor é de pelo menos 64.239,00€!
Ou seja, não existem mais bens eventualmente penhoráveis de todo aos executados de modo a tornar viável a presente execução, dado que consultados todo o histórico do Citius destes autos de execução pode alcançar-se que pelo menos já se repetiram por três vezes as buscas de bens eventualmente penhoráveis, o que não se encontrou de todo!
Pelo que, inclusive, o processo já deveria ter sido extinto pelo próprio Sr. AE nos termos do artigo 750º / 1 e 2 do CPC, devendo ter sido cumprido o respectivo formalismo legal.
Em quarto e último lugar, a inércia não foi só proveniente do Sr. AE como dissemos no nosso despacho de deserção de instância datado de 20.06.2024.
Fomos muito claros: a inércia foi proveniente e sobretudo da Exequente, que é quem deve impulsionar os autos, desde que tal seja possível!
Isto é, desde que a execução seja viável!
O que manifestamente, não é!
Pelo que, mantemos o nosso despacho de deserção, ainda reforçado com tudo o que acima acabamos de dar conta.
Notifique.
D. N».
Inconformado com as referidas decisões judiciais, o Exequente interpôs dela recurso, apresentando as seguintes conclusões:
«I – O recurso tem por objecto a douta sentença de 20/6/2024, que julgou deserta a instância executiva, nos termos do artigo 281º/5 do CPC, e, bem assim, o douto despacho subsequente, de 26/06/2024, que complementou/reforçou a referida sentença;
II - Com a prolação da sentença de 20/06/2024, que julgou deserta a instância, e sendo esta recorrível, esgotou-se imediatamente o poder jurisdicional do juiz quanto à matéria da causa, pelo que estava vedado ao Tribunal “a quo” voltar a pronunciar-se sobre a referida matéria, nomeadamente, aclarar, complementar, modificar ou reforçar os fundamentos da sua anterior decisão, como fez com o despacho de 26/06/2024, o qual padece, por isso, de invalidade ou ineficácia processual.
III – Para a extinção da instância executiva - por falta de impulso processual -, necessário se torna que se conclua pela existência de revelada incúria de modo que as partes possam verificar, inequivocamente, que ocorreu no processo este desleixo na acção e que a parte a quem se atribui este descuido merece a punição prescrita na lei.
III- O preenchimento desta causa de extinção da instância executiva assenta e pressupõe que os autos estejam a aguardar um impulso processual cuja iniciativa caiba ao exequente e que este esteja ciente da necessidade de tal iniciativa, sendo que, fora desse duplo condicionalismo, não é possível concluir pela inércia do exequente, legitimadora do preenchimento da presunção de desinteresse e abandono da instância, subjacente a este normativo.
IV – Assim, nos termos do artigo 837º do CPC e 4º do despacho n.º 12624/2015 – D. R. n.º 219/2015, Série II de 2015-11-09, sendo “da exclusiva responsabilidade do agente de execução a colocação de bens em leilão eletrónico, bem como a informação introduzida na plataforma, nos termos legais e regulamentares aplicáveis”, após ser proferida a decisão da modalidade e valor base da venda dos bens penhorados, a exequente não tem de dar qualquer impulso para que tal ocorra, pelo que não lhe pode ser assacada qualquer responsabilidade por causa da aparente inércia.
V – Os actos e decisões do agente de execução, no âmbito da acção executiva, são actos e decisões materialmente administrativos, cabendo-lhe a ele a efectivação de todas as diligências do processo executivo que não estejam atribuídas à secretaria, pelo que, fazendo-se uma interpretação extensiva do disposto no artigo 157º do CPC, a recorrente não pode ser prejudicada pelos eventuais erros e omissões dos actos praticados pelo agente de execução ou pela sua inércia processual.
VI- Apesar de, aparentemente, o processo executivo tenha ficado parado por mais de seis meses, as omissões imputáveis ao Agente de Execução não se repercutem na esfera jurídica da exequente, pelo que, estando demonstrada/confessada apenas a inércia do agente de execução, esta não é causa de extinção da instância, por deserção, pois não são as omissões ou a inércia daquele, mas da exequente, que se pretende sancionar com a deserção da instância executiva, nos termos do nº 5, do artigo 281º do CPC.
Sem conceder, e subsidiariamente
VII - Sendo pressupostos para que a deserção da instância executiva possa ser declarada (i) que o processo se encontre parado, a aguardar impulso processual das partes, há mais de 6 (seis) meses; e que (ii) essa paragem do processo, por falta de impulso processual, se fique a dever à negligência das partes; a declaração de deserção da instância não é automática, logo que decorridos os seis meses de paragem do processo, antes se impõe previamente à prolação do despacho que o tribunal aprecie e valore o comportamento processual das partes, por forma a concluir se a referida paragem de processo, por falta de impulso processual, é ou não devida à negligência daquelas.
VIII – Assim, não tendo a exequente sido notificada para qualquer termo ou acto do processo, posterior à decisão da modalidade da venda, que lhe impusesse o impulso processual necessário ao regular andamento dos autos, num juízo prudencial e também em obediência ao dever de observância do princípio do contraditório plasmado no artº. 3º, nº. 3, do CPC, impunha-se ao tribunal “a quo” ter, previamente, dado oportunidade às partes de se pronunciarem a esse respeito, pelo que, não o fazendo, o tribunal incorreu em nulidade processual, geradora, na conjugação dos artºs. 3º, nº. 3, e 195º, nºs. 1 e 2, da nulidade da sentença recorrida.
IX - Afirmar, como faz, a douta sentença recorrida, que a execução não é viável porque “apenas foram penhorados cerca de 900 € de IRS e este usufruto que foi avaliado pelo Sr. AE em 40.000,00 €”, e consequentemente, o senhor Agente de Execução deveria, já ter extinguido a execução, nos termos do artigo 750º / 1 e 2 do CPC, devendo ter sido cumprido o respectivo formalismo legal, apenas serve ou é útil para realçar a inércia do sr. Agente de Execução e não da exequente.
X – A douta sentença recorrida ao decidir, como decidiu, violou ou aplicou mal o nº 5, do artigo 281º do CPC, e, bem assim, o disposto nos artigos 837º do CPC e 4º do despacho n.º 12624/2015 – D. R. n.º 219/2015, Série II de 2015-11-09.
XI – Termos em que, deverá o recurso ser julgado procedente, revogando-se, em consequência, a douta sentença recorrida, como é de JUSTIÇA».
Não houve contra-alegações.
Colhidos os vistos, cumpre ora apreciar a decidir. II. OBJETO DO RECURSO.
Atento o disposto nos artigos 608.º, n.º 2, 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1 e 2, todos do CPCivil, as conclusões do recorrente delimitam o objeto do recurso, sem prejuízo do conhecimento de questões que devam oficiosamente ser apreciadas e decididas por este Tribunal da Relação.
Nestes termos, atentas as conclusões deduzidas pelo Recorrente, não havendo questões de conhecimento oficioso a dilucidar, está em causa apreciar e decidir tão-só se deve ou não ser mantida a decisão de deserção da instância proferida pelo Tribunal recorrido.
Assim. III. FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO.
A factualidade a considerar na presente decisão é a que consta do relatório deste acórdão que a aqui se dá por integralmente reproduzida. IV. FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO.
1. Segundo o disposto no artigo 277.º, alínea c), do CPCivil, «[a] instância extingue-se com a deserção».
Nos termos do artigo 281.º, n.ºs 1 e 5, do CPCivil, «(…) considera-se deserta a instância quando, por negligência das partes, o processo se encontre a aguardar impulso processual há mais de seis meses», sendo que «[n]o processo de execução, considera-se deserta a instância, independentemente de qualquer decisão judicial, quando, por negligência das partes, o processo se encontre a aguardar impulso processual há mais de seis meses».
Ou seja, enquanto causa de extinção da instância, a deserção decorre da suspensão da instância por tempo superior a seis meses em razão de descuido ou incúria da parte em promover o seu andamento.
Dito de outro modo, a deserção emerge da verificação cumulativa de dois requisitos:
- Um de natureza objetiva, expresso na falta de impulso processual das partes por período de tempo superior a seis meses;
- Outro de índole subjetiva, fundado na circunstância daquela descontinuidade da instância decorrer exclusivamente do descuido da parte em promover o andamento do processo, constituindo tal promoção um ónus da parte.
Como se refere no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 24.05.2022, processo n.º 31/13.0TVLSB.L1.S1, «a deserção da instância, tal como prevista no artº 281º nº 1 CPCiv pressupõe a verificação cumulativa de duas exigências: uma de natureza objectiva (falta de impulso processual das partes maxime do autor, para o prosseguimento da instância) e outra de natureza subjectiva (inércia causada por negligência)».
Assim considerada, a deserção funda-se no princípio da autorresponsabilidade das partes, num propósito de uma Justiça pronta e colaborada pelas partes.
Como se refere no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 14.05.2019, processo n.º 3422/15.9T8LSB.L1.S2, a deserção «radica no princípio da auto-responsabilidade das partes, encontrando a sua razão de ser no facto de não ser desejável, numa justiça que se pretende célere e cooperada, que os processos se eternizem em tribunal, quando a parte se desinteressa da lide ou negligencia a sua atuação, não promovendo o andamento do processo quando lhe compete fazê-lo».
«E foi precisamente tendo em vista a celeridade processual, a maior auto-responsabilização das partes e a diminuição da pendência processual, que o novo Código de Processo Civil veio alterar o regime que até então vigorava em matéria de deserção da instância, o que se traduziu não só num significativo encurtamento do prazo considerado relevante para esse efeito, mas também na eliminação da fase intermédia de interrupção da instância».
Atentos os apontados pressupostos objetivo e subjetivo da deserção da instância, a declaração desta pressupõe a prévia ponderação do caso, do circunstancialismo concreto deste, em ordem a concluir quanto a ocorrência ou não nele daqueles requisitos.
Como referem Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Pires de Sousa, Código de Processo Civil Anotado, volume I, edição 2020, página 348, «[a]tenta a diversidade dos factos que colidem com o regular andamento da causa, na apreciação do condicionalismo da deserção de instância é importante que se ponderem globalmente as diversas circunstâncias, quer as de ordem legal, quer as que se ligam ao comportamento da parte onerada com a iniciativa de dinamizar a instância».
2. Conforme indicado em I.,
· Em 22.02.2022 foi penhorado direito de usufruto sobre o prédio rústico sito em Santa Maria das Flores, descrito na respetiva Conservatória com o n.º …, inscrito na matriz sob o artigo …º;
· Em 05.07.2022 o Senhor Agente de Execução determinou a venda daquele direito, através de leilão eletrónico, com o valor base de €40.000,00 e o valor mínimo de €34.000,00;
· Em 14.07.2022 procedeu-se à penhora do crédito de €977,19 referente a Reembolso de IRS do ano de 2021;
· Em 09.09.2022 foi judicialmente determinada a suspensão da execução quanto a dois prédios urbanos anteriormente penhorados;
· Em 14.12.2022, por sentença proferida em embargos de terceiro, foi determinado o levantamento de penhoras relativas àqueles prédios urbanos;
· Em 01.03.2023 o Senhor Agente de Execução juntou print de consulta do Registo Predial referente a uma daqueles prédios urbanos;
· Em 01.02.2024 o Senhor Agente de Execução juntou aos autos print de consulta do Registo Predial do prédio urbano, sito em Alcantarilha, Silves, o qual mostra-se registado a favor de pessoas diversas dos aqui Executados.
Perante um tal circunstancialismo é manifesto que os autos não tiveram o andamento desejável, o processamento normal que se impunha.
Mais, pelo menos de 01.03.2023 a 20.06.2024 a execução não registou qualquer andamento processual, sendo que em 01.02.2024 foi junto aos autos pelo Senhor Agente de Execução um documento cuja pertinência não se vislumbra.
É certo que o Senhor Agente de Execução veio em 26.06.2024, já depois da decisão recorrida, dar conta de diligências que havia feito para localizar o imóvel relativamente ao qual incide o direito de usufruto penhorado.
Deveria, contudo, tê-lo feito de uma forma mais precisa, concretizando no tempo as diligências feitas e explicitando estas, e atempadamente, informando os autos à medida que ia procedendo a tais diligências.
A apontada inércia processual não pode ser assacada à Exequente, não existindo negligência desta na promoção dos autos.
A venda do direito de usufruto encontrava-se pendente, sendo que dos autos não consta que o Exequente tenha sido expressamente notificado para indicar bens à penhora, conforme artigo 750.º, n.º 1, do CPCivil.
Nestes termos, uma vez que não decorre dos autos uma situação de negligência da Exequente na promoção dos seus termos, e muito menos por lapso superior a seis meses, carece de fundamento a deserção declarada na decisão recorrida, termos em que esta deve ser revogada, procedendo, pois, o recurso.
*
Quanto às custas do recurso.
Segundo o disposto nos artigos 527.º, n.ºs 1 e 2, do CPCivil e 1.º, n.º 2, do Regulamento das Custas Processuais, o recurso é considerado um «processo autónomo» para efeito de custas processuais, sendo que a decisão que julgue o recurso «condena em custas a parte que a elas houver dado causa», entendendo-se «que dá causa às custas do processo a parte vencida, na proporção que o for».
Ora, in casu procede a pretensão da Recorrente.
Na relação jurídico-processual recursiva os Executados/Recorridos configuram-se como parte vencida, pois a procedência do recurso é-lhe desfavorável.
Nestes termos, as custas do recurso devem ser suportadas pelos Executados/Recorridos.
V. DECISÃO
Pelo exposto, julga-se procedente o presente recurso, revogando-se, pois, a sentença recorrida.
Custas pelos Executados/Recorridos.
Lisboa, 19 de dezembro de 2024
Paulo Fernandes da Silva
Inês Moura
João Vaz Gomes