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CONTRATO DE MEDIAÇÃO IMOBILIÁRIA
REGIME DE EXCLUSIVIDADE
REMUNERAÇÃO
Sumário
I - A atribuição da remuneração prevista no art. 19º nº 2 da Lei nº 15/2013, de 8.02 exige que o contrato de mediação imobiliária tenha sido celebrado em regime de exclusividade, e que a mediadora prove a efectiva obtenção de um interessado pronto a celebrar o contrato visado pelo contrato de mediação. II - Para que ocorra a situação excepcional prevista no art. 19º nº2 do referido diploma legal, será necessária a verificação cumulativa de duas condições, cujo ónus de prova compete à mediadora: i - que o contrato de mediação tenha sido celebrado em regime de exclusividade; ii - que o negócio visado de venda só não se concretize por causa imputável à cliente proprietária do imóvel objecto do contrato de mediação.
Texto Integral
Processo n.º 1608/23.1T8OVR.P1- APELAÇÃO
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Sumário (elaborado pela Relatora):
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I. RELATÓRIO:
1.A..., Lda intentou ação declarativa de condenação, sob processo comum, contra AA peticionando a condenação da Ré a pagar-lhe a quantia de €7.380,00 (sete mil, trezentos e oitenta euros), acrescida dos juros vincendos à taxa anual de 7%, desde a citação até integral e efectivo pagamento.
Como fundamento da referida pretensão alegou em síntese que celebrou com a Ré em 19 de Abril de 2022 um contrato de mediação imobiliária, pelo período de 12 meses, em regime de exclusividade, pelo qual se obrigou a diligenciar no sentido de conseguir interessado na compra do imóvel sito na Rua ..., em ..., pelo preço de €62.500,00 (sessenta e dois mil e quinhentos euros), mediante o pagamento de uma remuneração correspondente de 6% do valor da venda, acrescida de IVA à taxa legal em vigor, mas nunca uma remuneração inferior a de €6.000,00 (seis mil euros), acrescido de IVA, e que após a assinatura do contrato de mediação levou a cabo diligências de promoção do imóvel, divulgando-a na internet, em cartazes e folhetos, recebeu chamadas, manteve contactos e mostrou o imóvel a interessados, efectuando deslocações ao imóvel para esse efeito, tendo comunicado à Ré que tinha promitente adquirente interessado na aquisição do imóvel, pelo preço de €75.000,00 (setenta e cinco mil euros), ou seja, por valor superior ao por ela indicado para a venda do imóvel e superior ao que consta no contrato de medição imobiliária, porém a Ré negou-se a assinar o contrato promessa e posteriormente deixou de atender os telefonemas e comunicações da Autora, reclamando da Ré nesta acção a remuneração acordada no contrato porque o negócio formalizado não se concretizou por incumprimento da Ré, que desistiu da venda do imóvel.
2. A Ré deduziu contestação, tendo alegado que o verdadeiro e original contrato de mediação imobiliária foi assinado pelas partes em 17 de Fevereiro de 2022, e que em Abril de 2022 deslocou-se aos escritórios da A. sitos na Rua ..., em ... e informou os funcionários que ali se encontravam que estava com dúvidas se queria ou não vender o imóvel, tendo-lhe sido dito que não se preocupasse, porque só vendia se quisesse, sem que com isso fosse penalizada e que a imobiliária apenas precisava de documentos para poder de forma legal e legítima encontrar um possível comprador, sem que isso constituísse qualquer obrigação para ela, tendo os colaboradores da A. pedido que assinasse vários documentos para o efeito, o que a R. fez, confiando na A. e seus representantes, sendo agora confrontada com a existência de um outro contrato, datado de 19 de Abril de 2022, junto com a petição inicial, sem que tenha tido percepção que estava a assinar um novo contrato de mediação precisamente com as mesmas clausulas do que acabara de cessar, sendo que ambos os contratos de mediação imobiliária estavam já preenchidos pela A. e continham cláusulas pré-elaboradas, sem que nunca lhe tenha sido explicado o conteúdo de tais cláusulas, concluindo que lhe é aplicável o regime jurídico das cláusulas contratuais gerais constante do DL n.º 446/85, de 25 de Outubro com a sua redação actual, pelo que as cláusulas do contrato em causa que dizem respeito à exclusividade, retribuição e prazo são nulas e não produzem efeitos.
Mais impugnou os factos alegados pela Autora, sustentando que a A. não encontrou qualquer verdadeiro comprador para o imóvel, nunca lhe foi apresentada qualquer proposta real, não sabe quem é o alegado interessado comprador e nunca lhe foi apresentado qualquer contrato promessa, não sendo devida qualquer retribuição.
3. Foi realizada audiência prévia, com elaboração de despacho saneador, com fixação do objecto do litígio e temas de prova. 4. Realizada a audiência de julgamento, foi proferida sentença em 22.02.2024,Ref Citius 131645919, com o seguinte dispositivo: “Pelo exposto, decido julgar improcedente, por não provada, a presente acção instaurada por A..., LDA. contra AA e, em consequência, absolvo a ré AA de todos os pedidos formulados pela autora A..., LDA.. Custas a cargo da autora. Notifique. Registe.” 5. Inconformada, a Autora interpôs recurso de apelação da sentença final, formulando as seguintes CONCLUSÕES 1ª A recorrente intentou ação declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, contra AA, na qual formulou o pedido de condenação da recorrida no pagamento da quantia de €7 380,00 (sete mil, trezentos e oitenta euros), acrescida dos juros de mora à taxa de 7% desde a citação até efectivo e integral pagamento, alegando em síntese que a recorrida incumpriu o contrato de medição imobiliária, celebrado no dia 19 de Abril de 2022, ao recusar-se a vender e assinar o contrato promessa de compra e venda do imóvel sito na Rua ..., em ..., pelo preço de €75 000,00 (setenta e cinco mil euros), preço este superior ao acordado pelas partes o âmbito do contrato de medição imobiliária. 2ª O tribunal a quo deu como provado que a recorrente dedica-se à actividade de mediação imobiliária de imóveis e no exercício da sua actividade comercial, a recorrente e recorrida, em 19 de Abril de 2022, subscreveram um documento denominado por “contrato de mediação imobiliária”. 3ª O tribunal a quo também deu como provado que no âmbito do contrato de mediação imobiliária, a recorrente e a recorrida acordaram que a recorrente obrigava-se, em regime de exclusividade, a diligenciar por encontrar um interessado que quisesse comprar o imóvel sito na Rua ..., em ..., pelo preço de €62.500,00 (sessenta e dois mil e quinhentos euros), mediante o pagamento de remuneração por parte da ré correspondente de 6% do valor da venda, acrescida de IVA à taxa legal em vigor, mas nunca uma remuneração inferior a de €6.000,00 (seis mil euros), acrescido de IVA e que acordo teria o período de 12 meses, com renovação automática, por iguais e sucessivos períodos, caso não fosse denunciado com a antecedência mínima de 10 dias em relação ao seu termo, através de carta registada com aviso de recepção. 4ª O tribunal a quo deveria ter dado como provado que a recorrente conseguiu encontrar interessado para comprar o imóvel sito na Rua ..., em ..., pelo preço de €62.500,00 (sessenta e dois mil e quinhentos euros) e/ou valor superior que a recorrente levou a cabo diligências de promoção do imóvel, divulgando-o na internet, em cartazes e folhetos, recebeu chamadas, manteve contactos e mostrou o imóvel a interessados, efectuando deslocações ao imóvel para esse efeito e encontrou um promitente adquirente interessado na aquisição do imóvel, pelo preço de €75.000,00 (setenta e cinco mil euros), por valor superior ao indicado para a venda do imóvel, no contrato de medição imobiliária e comunicou à recorrida e nesse seguimento, esta negou-se a assinar o contrato promessa e posteriormente deixou de receber os telefonemas e comunicações da recorrente. 5ª E tais factos deveriam ter sido dados como provados pelas declarações do sócio gerente da recorrente- BB, do depoimento das testemunhas da recorrente- CC e DD e ainda da testemunha da recorrente e recorrida- EE, corroborados com os documentos juntos aos autos, nomeadamente o contrato de mediação, datado de 19/04/2022, de fls 9 verso a 11 verso, cópia da missiva de 05/06/2023 enviada pela recorrente à recorrida de fls 11 verso e 12, cópia da notificação judicial avulsa de fls 12 verso a 15 e fls 26 e do contrato promessa de compra e venda. 6ª O contrato de mediação imobiliária constitui uma modalidade do contrato de prestação de serviços definido no artigo 1154.º do Código Civil e cujo regime jurídico se encontra regulado pela Lei nº 15/2013, de 8 de Fevereiro, que estabelece o regime jurídico a que fica sujeito o acesso e o exercício da atividade de mediação imobiliária. 7ª O contrato de mediação é o “Contrato pelo qual uma das partes se obriga a promover, de modo imparcial, a aproximação de duas ou mais pessoas, com vista à celebração de certo negócio, mediante retribuição” - Carlos Lacerda Barata, no estudo “Contrato de Mediação”, publicado no volume I da obra “Estudos do Instituto de Direito do Consumo” – Julho de 2002 – pág. 192. 8ª A atividade de mediação imobiliária, segundo o art. 2.º, n.º1 do regime jurídico aplicavél, consiste na procura, por parte das empresas, em nome dos seus clientes, de destinatários para a realização de negócios que visem a constituição ou aquisição de direitos reais sobre bens imóveis, bem como a permuta, o trespasse ou o arrendamento dos mesmos ou a cessão de posições em contratos que tenham por objeto bens imóveis. Explana, seguidamente, o n.º 2 da citada norma que a atividade de mediação imobiliária consubstancia-se também no desenvolvimento das seguintes ações: a) Prospeção e recolha de informações que visem encontrar os bens imóveis pretendidos pelos clientes; b) Promoção dos bens imóveis sobre os quais os clientes pretendam realizar negócios jurídicos, designadamente através da sua divulgação ou publicitação, ou da realização de leilões. Impõe o seu art. 3.º que atividade de mediação imobiliária só possa ser exercida em território nacional por empresas de mediação imobiliária e mediante contrato. 9ª Nos termos do art. 19.º da Lei n.º 15/2013 de 08/02, que respeita à “Remuneração da empresa” e que se aplica-se apenas a contratos sujeitos à lei portuguesa (n.º5): 1 - A remuneração da empresa é devida com a conclusão e perfeição do negócio visado pelo exercício da mediação ou, se tiver sido celebrado contrato-promessa e no contrato de mediação imobiliária estiver prevista uma remuneração à empresa nessa fase, é a mesma devida logo que tal celebração ocorra. 2 - É igualmente devida à empresa a remuneração acordada nos casos em que o negócio visado no contrato de mediação tenha sido celebrado em regime de exclusividade e não se concretize por causa imputável ao cliente proprietário ou arrendatário trespassante do bem imóvel. 10ª No caso concreto, resulta dos factos provados que as partes celebraram um contrato de mediação imobiliária, em 19/04/2022, em regime de exclusividade. Mais decorre de tal factualidade, que a recorrente obrigava-se a diligenciar por encontrar um interessado que quisesse comprar o imóvel sito na Rua ..., ... pelo preço de €62 500,00 (sessenta e dois mil e quinhentos euros) mediante o pagamento de uma remuneração por parte da recorrida de 6% do valor da venda, acrescida de IVA à taxa legal em vigor, mas nunca uma remuneração inferior a €6 000,00 (seis mil euros), acrescido de IVA. 11ª Pela alteração da matéria de facto, resultará como provado que a recorrente encontrou um promitente adquirente interessado na aquisição do imóvel, pelo preço de €75.000,00 (setenta e cinco mil euros), valor superior ao indicado para a venda do imóvel e ao que consta no contrato de medição imobiliária, tendo comunicado tal facto à recorrida e, nesse seguimento, esta negou-se a vender o imóvel e assinar o contrato promessa e posteriormente deixou de receber os telefonemas e comunicações da recorrente. 12ª Como a recorrente angariou o promitente-comprador do imóvel sito na Rua ..., ..., e a recorrida recusou-se a vender e assinar o contrato promessa, é devida por esta a remuneração acordada, ao abrigo do artigo 19º n.º 2 da Lei n.º 15/2013 de 08/02. Concluiu, pedindo que seja proferido Acórdão que revogue a sentença do tribunal a quo e condene a recorrida a pagar à recorrente a quantia de €7 380,00 (sete mil, trezentos e oitenta euros), relativo à comissão acordada no contrato de mediação, assinado em regime de exclusividade em 19/04/2022. 6. A Ré ofereceu contra-alegações, pugnando pela confirmação do julgado. 7. Foram observados os vistos legais.
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II. DELIMITAÇÃO do OBJECTO do RECURSO:
O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso - cfr. artigos 635º, nº 3, e 639º, n.ºs 1 e 2, do CPC.
Por outro lado, ainda, sem prejuízo das matérias de conhecimento oficioso, o tribunal de recurso não pode conhecer de questões não antes suscitadas pelas partes perante o Tribunal de 1ª instância, sendo que a instância recursiva, tal como configurada no nosso sistema de recursos, não se destina à prolação de novas decisões, mas à reapreciação pela instância hierarquicamente superior das decisões proferidas pelas instâncias. [1]
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As questões a decidir no presente recurso são as seguintes: 1ª Questão- se a decisão sobre a matéria de facto deve ser alterada; 2ª Questão- se é devida pela Apelada à Apelante a remuneração acordada no contrato de mediação imobiliária.
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III. FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO: 1. O Tribunal de 1ª instância julgou provados os seguintes factos:
1. A autora dedica-se à actividade de mediação imobiliária de imóveis.
2. No exercício da sua actividade comercial, a autora e ré, em 19 de Abril de 2022, subscreveram um documento denominado por “contrato de mediação imobiliária”.
3. No âmbito do referido documento, a autora e a ré acordaram que a autora obrigava-se, em regime de exclusividade, a diligenciar por encontrar um interessado que quisesse comprar o imóvel sito na Rua ..., em ..., pelo preço de €62.500,00 (sessenta e dois mil e quinhentos euros), mediante o pagamento de remuneração por parte da ré correspondente de 6% do valor da venda, acrescida de IVA à taxa legal em vigor, mas nunca uma remuneração inferior a de €6.000,00 (seis mil euros), acrescido de IVA.
4. No âmbito do referido documento, a autora e a ré acordaram que o referido acordo teria o período de 12 meses, com renovação automática, por iguais e sucessivos períodos, caso não fosse denunciado com a antecedência mínima de 10 dias em relação ao seu termo, através de carta registada com aviso de recepção.
5. No dia 05.06.2023, a autora enviou carta à ré a solicitar o pagamento da quantia devida a titulo de comissão, ou seja, o montante de €7.380,00 (sete mil, trezentos e oitenta euros).
6. No dia 16.06.2023, a autora intentou, neste Tribunal, uma notificação judicial avulsa com vista à notificação da ré para proceder ao pagamento à autora, no prazo máximo de 5 dias após a notificação, do valor de €7.380,00 (sete mil, trezentos e oitenta euros), na conta com o IBAN ...05.
7. No exercício da sua actividade comercial, a autora celebrou com a ré, em 17 de fevereiro de 2022, um contrato de mediação imobiliária.
8. A autora não conseguiu encontrar interessado para comprar o imóvel sito na Rua ..., em ..., pelo preço de €62.500,00 (sessenta e dois mil e quinhentos euros) e/ou valor superior.
9. A autora nunca mostrou o imóvel a ninguém, nem comunicou à ré a existência de qualquer interessado antes de Junho de 2023.
10. A autora nunca teve as chaves nem acesso ao referido imóvel.
2.O Tribunal de 1ª instância julgou não provados os seguintes factos:
a. A ré procedeu ao pagamento da quantia de €7.380,00 (sete mil, trezentos e oitenta euros).
b. A autora, após a assinatura do documento a que se alude no facto provado n.º2, levou a cabo diligências de promoção do imóvel, divulgando-o na internet, em cartazes e folhetos, recebeu chamadas, manteve contactos e mostrou o imóvel a interessados, efectuando deslocações ao imóvel para esse efeito.
c. A autora encontrou um promitente adquirente interessado na aquisição do imóvel, pelo preço de €75.000,00 (setenta e cinco mil euros), por valor superior ao indicado para a venda do imóvel e ao que consta no documento a que se alude no facto provado n.º2 e comunicou à ré e, nesse seguimento, a ré negou-se a assinar o contrato promessa e posteriormente deixou de receber os telefonemas e comunicações da autora.
d. No mês de abril de 2022, a ré deslocou-se aos escritórios da autora, sitos na Rua ..., em ..., e informou os trabalhadores da ré que ali se encontravam que estava com dúvidas se queria ou não vender o imóvel.
e. Os referidos trabalhadores da ré que ali se encontravam disseram à ré que não se preocupasse, porque só vendia se quisesse, sem que com isso fosse penalizada e que a autora apenas precisava de documentos para poder de forma legal e legítima encontrar um possível comprador, sem que isso constituísse qualquer obrigação para a ré.
f. Nessa altura, os trabalhadores da autora, que ali se encontravam, pediram à ré que assinasse vários documentos para o efeito, o que a ré fez, confiando na autora e seus representantes.
g. Foi entregue à ré um documento de onde resulta que o original e verdadeiro contrato de mediação imobiliária havia sido dado sem efeito.
h. A ré foi convencida a assinar tal documento, quando assinou o documento que fez cessar o contrato inicial, sem ter percepção que estava a assinar um novo contrato de mediação precisamente com as mesmas cláusulas do que acabara de cessar.
i. Os referidos contratos de mediação imobiliária estavam já preenchidos pela autora e continham cláusulas pré-elaboradas.
j. Nunca foi explicado o conteúdo de tais cláusulas à ré.
k. A ré confiou na palavra dos trabalhadores da autora que ali se encontravam e assinou os documentos que lhe foram apresentados.
l. O contrato de medição celebrado em 17.02.2022 foi cancelado no dia 02.03.2022, porque a ré desistiu da venda da fracção, alegando que por motivos da guerra que estava a decorrer entre a Rússia e Ucrânia, os imóveis iriam baixar de preço.
m. A ré voltou às instalações da autora e referiu à autora que já tinha interesse novamente na venda da fração, alegando que a guerra não interferiu no valor das fracções.
n. Após, foi preenchido, lido e explicado o conteúdo do contrato celebrado em 19.04.2022 e pela ré assinado, tendo levado um exemplar consigo no momento da sua assinatura.
o. A autora preencheu o nome dos proprietários, do preço, prazo do contrato, regime, existência ou não de ónus.
p. Posteriormente, foram efectuadas visitas à fracção, na presença da ré, negando-se esta a assinar a ficha de visita com a comercial da autora, alegando pretender mais dinheiro pela venda da fração.
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IV. FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA.
Impugnação da decisão sobre a matéria de facto
Perante as exigências estabelecidas no art. 640º do CPC, constituem ónus a cargo do recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto, a seguinte especificação:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
“Quer isto dizer que recai sobre a parte Recorrente um triplo ónus:
Primeiro: circunscrever ou delimitar o âmbito do recurso, indicando claramente os segmentos da decisão que considera viciados por erro de julgamento;
Segundo: fundamentar, em termos concludentes, as razões da sua discordância, concretizando e apreciando criticamente os meios probatórios constantes dos autos ou da gravação que, no seu entender, impliquem uma decisão diversa;
Terceiro: enunciar qual a decisão que, em seu entender, deve ter lugar relativamente às questões de facto impugnadas.
Ónus tripartido que encontra nos princípios estruturantes da cooperação, da lealdade e boa fé processuais a sua ratio e que visa garantir, em última análise, a seriedade do próprio recurso instaurado, arredando eventuais manobras dilatórias de protelamento do trânsito em julgado da decisão.”[2]
São as conclusões das alegações de recurso que estabelecem os limites do objecto da apelação e, consequentemente, do poder de cognição do Tribunal de 2ª instância, de modo que na impugnação da decisão sobre a matéria de facto devem constar das conclusões de recurso necessariamente os concretos pontos de facto impugnados,enquanto que a decisão alternativa que o recorrente propõe para cada um dos factos impugnados (AUJ nº 12/2023 de 14.11), bem como a análise pormenorizada dos concretos meios probatórios pode constar apenas do corpo das alegações ou motivação propriamente dita, tal como as concretas passagens das gravações ou transcrições dos depoimentos de que o recorrente se socorra.
Analisadas as conclusões deste recurso concluímos que tais ónus de impugnação da decisão sobre a matéria de facto foram suficientemente cumpridos pela Apelante, pois embora não tenha concretizado nas conclusões de recurso o número dos factos provados ou a alínea dos factos não provados que impugnava, como se lhe impunha, acabou por reproduzir o teor dos mesmos de forma que nos permite com alguma segurança identificar a matéria de facto concretamente impugnada, tendo feito ainda menção à decisão alternativa e aos concretos meios de prova- testemunhal e por declarações de parte-, que em seu entender sustentam a pretendida alteração da decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados, fazendo referência aos exactos segmentos da gravação dos depoimentos invocados no corpo das alegações.
Segundo o disposto no art. 662º nº 1 do CPC, “A Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa”.
Ora, no âmbito do recurso de impugnação da decisão de facto, o Tribunal da Relação pode e deve realizar uma efectiva reapreciação da prova produzida, levando em consideração, não só os meios de prova indicados no recurso, como outros que relevem para a decisão relativa aos pontos da matéria de facto impugnada, com vista a formar a sua própria convicção, aferindo se da fundamentação vertida na sentença recorrida resulta evidente algum erro de apreciação dos factos controvertidos à luz das regras de experiência ou de prova vinculada.
Para podermos reapreciar a decisão proferida pelo tribunal a quo, em função dos meios probatórios produzidos perante ele e, formarmos a nossa própria convicção, de molde a podermos decidir se se impunha decisão diferente da que foi tomada, socorremo-nos da audição completa e integral da prova gravada e da análise da parca documentação junta aos autos, prova essa devidamente articulada entre si e analisada à luz das regras de experiência.
Feitas estas considerações, importa aferir se foi produzida prova cabal e consistente que imponha decisão diferente da que foi tomada pelo tribunal a quo, sobre os factos mencionados pela Apelante na Conclusão 4ª.
Uma vez que, como supra já mencionamos, a Apelante limitou-se a reproduzir o texto dos pontos de facto impugnados, num texto corrido e que engloba vários factos autónomos, impõe-se fazer a respectiva correspondência com os pontos de facto elencados na sentença recorrida que contêm tal matéria de facto, para melhor percepção.
A Conclusão 4ª tem a seguinte redação:
“O tribunal a quo deveria ter dado como provado que a recorrente conseguiu encontrar interessado para comprar o imóvel sito na Rua ..., em ..., pelo preço de €62.500,00 (sessenta e dois mil e quinhentos euros) e/ou valor superior que a recorrente levou a cabo diligências de promoção do imóvel, divulgando-o na internet, em cartazes e folhetos, recebeu chamadas, manteve contactos e mostrou o imóvel a interessados, efectuando deslocações ao imóvel para esse efeito e encontrou um promitente adquirente interessado na aquisição do imóvel, pelo preço de €75.000,00 (setenta e cinco mil euros), por valor superior ao indicado para a venda do imóvel, no contrato de medição imobiliária e comunicou à recorrida e nesse seguimento, esta negou-se a assinar o contrato promessa e posteriormente deixou de receber os telefonemas e comunicações da recorrente.”
Essa matéria de facto está contemplada nos seguintes pontos de facto elencados na sentença- pontos 8 e 9 dos factos provados e alíneas b) e c) dos factos não provados- cuja redação é a seguinte: “8. A autora não conseguiu encontrar interessado para comprar o imóvel sito na Rua ..., em ..., pelo preço de €62.500,00 (sessenta e dois mil e quinhentos euros) e/ou valor superior. 9. A autora nunca mostrou o imóvel a ninguém, nem comunicou à ré a existência de qualquer interessado antes de Junho de 2023. b. A autora, após a assinatura do documento a que se alude no facto provado n.º2, levou a cabo diligências de promoção do imóvel, divulgando-o na internet, em cartazes e folhetos, recebeu chamadas, manteve contactos e mostrou o imóvel a interessados, efectuando deslocações ao imóvel para esse efeito. c. A autora encontrou um promitente adquirente interessado na aquisição do imóvel, pelo preço de €75.000,00 (setenta e cinco mil euros), por valor superior ao indicado para a venda do imóvel e ao que consta no documento a que se alude no facto provado n.º2 e comunicou à ré e, nesse seguimento, a ré negou-se a assinar o contrato promessa e posteriormente deixou de receber os telefonemas e comunicações da autora.”
Em bom rigor afigura-se-nos que os pontos 8 e 9 dos factos provados tal como se mostram redigidos contrariam as regras do ónus da prova, uma vez que era à Apelante que competia provar, enquanto facto constitutivo do direito à remuneração reclamada da Apelada, que havia promovido a divulgação do imóvel objecto do contrato de mediação imobiliária e que em função dessa sua actividade havia conseguido um interessado na compra do imóvel e que o contrato só não se concretizara por facto imputável à Apelada, como melhor abordaremos em sede de enquadramento jurídico.
Desse modo, bastaria para a decisão da causa a correcta versão daquela matéria de facto vertida nas alíneas b) e c) dos factos não provados, e como tal tornar-se-ia desnecessária a análise pela negativa da mesmíssima matéria de facto.
Não obstante, independentemente do ónus de prova, estando impugnada a matéria vertida na Conclusão 4ª que contende também com os pontos 8 e 9 dos factos dados como provados, faremos uma abordagem conjunta dos pontos impugnados bem como dos meios de prova convocados pela Apelante, tendo presente a motivação exarada na sentença recorrida a propósito dessa matéria e a nossa convicção resultante da audição da totalidade da prova gravada.
Vejamos.
Defende a Apelante que o tribunal a quo deveria ter dado como provado que a recorrente conseguiu encontrar interessado para comprar o imóvel sito na Rua ..., em ..., pelo preço de €62.500,00 (sessenta e dois mil e quinhentos euros) e/ou valor superior- matéria de facto que foi vertida na negativa no ponto 8 dos factos provados-, assim como deveria ter dado como provado que a recorrente encontrou um promitente adquirente interessado na aquisição do imóvel, pelo preço de €75.000,00 (setenta e cinco mil euros), por valor superior ao indicado para a venda do imóvel, no contrato de medição imobiliária e comunicou à recorrida e nesse seguimento, esta negou-se a assinar o contrato promessa e posteriormente deixou de receber os telefonemas e comunicações da recorrente- matéria de facto que foi dada como não provada sob a alínea c) dos factos não provados.
Para a pretendida alteração da decisão sobre tal matéria de facto a Apelante socorreu-se das declarações de parte do seu legal representante- BB- e das testemunhas CC, DD e EE, porém, para além de tais depoimentos não permitirem, de todo, dar tal matéria de facto como provada, impõe-se dizer que desses depoimentos, mormente do depoimento da testemunha EE, resulta de forma segura precisamente o contrário, isto é, que a Apelante não conseguiu encontrar interessado que quisesse comprar o imóvel objecto do contrato de mediação imobiliária celebrado com a Apelada, nem pelo preço mencionado nesse contrato, nem muito menos por valor superior.
A Apelante sempre que fez referência ao alegado “interessado em comprar” não identificou mais ninguém que não fosse a testemunha EE.
Assim o identificaram as testemunhas CC e DD, as quais apesar de terem admitido não o conhecerem, nem terem tido intervenção ou estado presentes em qualquer negociação com aquele e com a Apelada, ter-lhes-á sido referido pela comercial FF (identificada no contrato de mediação junto com a petição inicial) que aquela pessoa havia feito uma oferta de compra por 75.000,00 mas que a Apelada havia recusado assinar o contrato promessa, sendo desde logo de estranhar que a Apelante se tenha socorrido de depoimentos indirectos e não tenha arrolado como testemunha a funcionária FF que terá sido quem efectivamente angariou o imóvel e quem estabeleceu os contactos pelo menos com a Apelada, ou mesmo a funcionária GG que terá sido quem foi mostrar o imóvel ao alegado interessado.
Inclusivamente o legal representante da Apelante em declarações de parte confirmou que nunca falou com o alegado interessado, que apenas teve uma conversa com as duas funcionárias envolvidas- FF e GG- tendo-lhe sido dito pela comercial que estava a tentar fechar uma reserva mas que a senhora se estava a negar porque queria mais dinheiro, tratando-se mais uma vez de um depoimento indirecto quando a parte podia ter apresentado aquelas suas funcionárias como testemunhas para que viessem esclarecer que negociações foram estabelecidas e a que resultados conduziram e porquê.
Sendo meros depoimentos indirectos e não tendo sido corroborados por quem deles teria conhecimento pessoal e directo, de nada relevam para prova daquela matéria de facto e muito menos impõem decisão diversa da proferida pelo tribunal a quo, como exige o art. 662º do CPC.
Como se não bastasse, aqueles depoimentos ainda foram infirmados de forma clara e contundente pela testemunha EE, que tendo sido apontado como sendo o alegado “interessado em comprar” o referido imóvel, pôs a nu a falácia alegada pela Apelante a esse respeito uma vez que afirmou de forma segura e convincente, que só foi visitar aquele imóvel porque a funcionária da Apelante de nome GG lhe pediu para o ir ver já que lhe ia mostrar outros, que nunca esteve nele interessado, que não fez qualquer proposta de compra (o espaço nem era o que procurava porque só tinha uma sala e ele procurava um escritório maior), sendo sintomático desse desinteresse o facto de a testemunha nem sequer se lembrar bem se o imóvel estava para vender ou arrendar e não ter sabido dizer qual era o valor anunciado.
Também não é despiciendo salientar que esta testemunha afirmou de forma peremptória que na única visita que fez ao imóvel a pedido da funcionária da Apelante e com a Apelada presente, limitou-se apenas a assistir à conversa entre a funcionária e a Apelada, tendo a funcionária tentado fazer negócio mas tendo a Apelada dado a entender que não estava interessada em vender, sem que ele alguma vez tenha dito algo, atitude que diz bem do desinteresse no negócio pois que de acordo com as regras da experiência comum caso estivesse eventualmente interessado em comprar tentaria prolongar as negociações no sentido de convencer a proprietária a vender, coisa que não fez, tendo afirmado que “disse que não estava interessado na venda e ficou por ali.”
Em reforço desta gritante ausência de prova testemunhal, alia-se a total ausência de prova documental, pois se como afirmou a testemunha CC- director comercial da Apelante-arranjaram um comprador (referindo-se expressamente a EE) que chegou a apresentar proposta por escrito (o que foi rotundamente negado pela testemunha EE) e se como também afirmou há sempre uma ficha de reserva que é assinada conjuntamente com a entrega de um cheque caução e só quando têm essa segurança vão falar com a vendedora, ao não ter a Apelante junto qualquer desses documentos que de acordo com os seus procedimentos deveriam existir para comprovar a proposta de compra, permite-nos inferir que se não os juntou aos autos é porque não existem e se não existem é porque efectivamente a Apelante nenhum interessado conseguiu encontrar para comprar aquele imóvel, pois que a testemunha EE não se mostrou interessado e ninguém mais foi indicado pela Apelante como tendo estado interessado na compra daquele imóvel.
Tudo para concluir que não existe um mínimo de prova de que a Apelante alguma vez tenha conseguido encontrar um efectivo interessado para comprar o imóvel objecto do contrato de mediação imobiliária celebrado com a Apelada, muito menos um promitente comprador e, como tal é totalmente despiciendo apurar se a Apelada se negou a assinar qualquer contrato-promessa se inexistia promitente comprador.
Quanto à restante matéria de facto impugnada que a Apelante pretende que seja dada como provada- de que a recorrente levou a cabo diligências de promoção do imóvel, divulgando-o na internet, em cartazes e folhetos, recebeu chamadas, manteve contactos e mostrou o imóvel a interessados, efectuando deslocações ao imóvel para esse efeito- reitera-se que nenhuma prova segura e consistente foi produzida quanto a qualquer actividade de divulgação deste imóvel, uma vez que as testemunhas convocadas pela Apelante não fizeram qualquer divulgação, nem tratavam das chamadas ou contactos com potenciais interessados porque não eram comerciais, e as comerciais encarregues dessas tarefas não foram indicadas como testemunhas, assim como a prova documental que nos dizem as regras da experiência ser normal existir, neste caso não existe, não há um único panfleto, folheto, cartaz, folha de revista, print da internet, o que seja que demonstre ter havido um mínimo de divulgação.
Relativamente a visitas ao imóvel foi produzida prova de que as chaves sempre estiveram na posse da Apelada (tal como está dado como provado no ponto 10 dos factos provados e não foi impugnado), porém foi relatada em julgamento que houve a visita em que esteve presente a testemunha EE e a testemunha HH- ex-marido da Apelada que a acompanhou nessa visita- promovida pela funcionária da Apelante de nome GG, visita essa que terá sido a única demonstrada já que a Apelante não produziu qualquer prova de que tenha mostrado o imóvel a outros interessados e tenha efectuado deslocações ao imóvel para esse efeito.
Uma vez que sobre aquela visita foi produzida prova bastante de que a mesma ocorreu, pelo depoimento das referidas testemunhas EE e HH, que a confirmaram de forma espontânea e coerente, embora a alteração não importe qualquer efeito útil para a decisão da causa como veremos de seguida, por uma questão de rigor decide-se eliminar a parte inicial do ponto 9 dos factos provados, retirando-se a expressão “a autora nunca mostrou o imóvel a ninguém”, assim como eliminar a parte final da alínea b) dos factos não provados retirando-se a expressão “mostrou o imóvel a interessados, efectuando deslocações ao imóvel para esse efeito”, aditando-se o ponto 11 aos factos provados com o seguinte teor:
11. A Apelante deslocou-se ao imóvel uma vez para o mostrar a um potencial interessado.
Deste modo, com excepção da alteração efectuada supra, mantém-se a decisão sobre a matéria de facto. Exigibilidade da remuneração acordada no contrato de mediação imobiliária celebrado entre as partes
Em sede deste recurso, sustenta a Apelante que como angariou promitente-comprador do imóvel sito na Rua ..., ..., e a Apelada recusou-se a vender e assinar o contrato promessa, é devida por esta a remuneração acordada, ao abrigo do artigo 19º n.º 2 da Lei n.º 15/2013 de 08/02.
Tal como a Apelante/autora alegara, ficou provado nos presentes autos que entre ela e a Apelada/ré foi celebrado um acordo em 19 de Abril de 2022, que reduziram a escrito e intitularam de “Contrato de Mediação Imobiliária”, no âmbito do qual a Apelante se obrigou, em regime de exclusividade, a diligenciar por encontrar um interessado que quisesse comprar o imóvel sito na Rua ..., em ..., pelo preço de €62.500,00 (sessenta e dois mil e quinhentos euros), mediante o pagamento de remuneração por parte da ré correspondente de 6% do valor da venda, acrescida de IVA à taxa legal em vigor, mas nunca uma remuneração inferior a de €6.000,00 (seis mil euros), acrescido de IVA.
Por princípio a remuneração (vulgo comissão) a que a mediadora tem direito depende sempre da efectiva concretização do negócio visado com o contrato de mediação, que neste caso era a compra e venda do imóvel nele identificado pertencente à Apelada.
A obrigação do mediador é a de encontrar um terceiro com quem o negócio visado pelo contrato de mediação venha a ser celebrado, aproximando duas pessoas de modo que entre elas se estabeleçam negociações que possam conduzir à celebração de um negócio definitivo (neste sentido Prof. Menezes Cordeiro, Do Contrato de Mediação, Revista O Direito, Ano 139º, 2007, III, p. 516 ss), logo, só se e quando esse negócio for concluído- e concluído por força da actividade desenvolvida pelo angariado- é que o mediador tem direito à remuneração acordada.
Sendo assim, a obrigação do mediador consubstancia-se em proporcionar ao comitente um certo resultado da sua actividade (art. 1154º CC), resultado esse que é a obtenção ou concretização de um negócio atinente a um determinado bem imóvel e, só no momento da concretização desse negócio com o terceiro por ele angariado é que o mediador cumpre o fim da mediação e apenas nesse momento lhe assiste o direito à remuneração contratada.
A concretização do negócio visado não se confunde com o cumprimento do mesmo, necessário é apenas que a escritura de venda se conclua, se concretize, pois que o cumprimento ou incumprimento de alguma das obrigações do comprador ou vendedor já em nada interferirá com o direito da mediadora a fazer seu o valor da comissão acordada.
Em regra, a remuneração da mediadora é independente das vicissitudes futuras do contrato de compra e venda estabelecido entre vendedor e comprador, mas já não o é da concretização desse negócio de compra e venda, porquanto depende da sua celebração.
Este tipo de contrato- mediação imobiliária- assume natureza aleatória, tal como escreve Maria de Fátima Ribeiro, “pois o direito à remuneração depende da verificação de um facto eventual: ele depende não apenas do facto de o mediador conseguir interessar um terceiro no negócio pretendido, mas também da vontade do comitente de celebrar o contrato proposto ou indicado pelo mediador, pelo que este corre o risco de não ser remunerado pela actividade desenvolvida- aliás, este risco é característico do contrato de mediação e é ele que justifica, economicamente, os elevados montantes fixados como remuneração na generalidade dos contratos”.[3]
De forma mais clara defende Carlos Lacerda Barata, que “o direito à retribuição depende da celebração do contrato promovido, embora seja independente do cumprimento do mesmo. Só com a verificação de um resultado útil- a realização do negócio- da actuação do mediador, este ganha o direito à retribuição. Está em causa mais do que a mera exigibilidade; é da própria constituição do direito que se trata. Pode-se, assim, afirmar que o direito à retribuição está sujeito a condição suspensiva: a celebração do negócio.”
Também Menezes Cordeiro defende que, “ a mediação pressupõe, por parte do obrigado, uma actuação material, não implica a prática de actos jurídicos por conta do mandante como ocorre no mandato. Além disso, configura-se como um contrato aleatório, só dando azo a retribuição quando tenha êxito.”[4]
Tal como decorre expressamente do art. 19º nº 1 da Lei nº 15/2013 de 8/2 “a remuneração da empresa é devida com a conclusão e perfeição do negócio visado pelo exercício da mediação” e, neste caso concreto o negócio visado pelo exercício da mediação era a venda do imóvel, negócio que não foi concluído.
Na jurisprudência tem sido esse o entendimento consolidado do Supremo Tribunal de Justiça, de que “o comitente só fica constituído na obrigação de remunerar o mediador se o negócio tido em vista pelo incumbente for concretizado em virtude da actividade do mediador, ou seja, a obrigação de meios que lhe incumbe há-se desembocar no resultado pretendido- a celebração do negócio para que foi mandatado o mediador- sob pena de se considerar que o contrato não almejou a perfeição e, não surtindo efeito útil a actividade do mediador- o risco, a álea negocial- não há lugar à remuneração (comissão), nem ao pagamento de despesas.”[5]
Em regra, a contraprestação a pagar pelo comitente ao mediador depende sempre da conclusão e perfeição do negócio a celebrar entre aquele e o terceiro, como consequência adequada da intervenção desenvolvida pelo intermediário. O mediador, no contrato de mediação imobiliária, só tem direito à remuneração convencionada com o comitente/cliente se o negócio visado vier a ser concluído/concretizado.
Não obstante, há um caso excepcional, em que a lei admite que remuneração seja devida mesmo que o negócio visado não se concretize, a qual está expressamente prevista no nº 2 do art. 19º da Lei nº 15/2013[6],, tendo sido essa a remuneração reclamada nestes autos pela Apelante
Segundo o referido preceito legal, “é igualmente devida à empresa a remuneração acordada nos casos em que o negócio visado no contrato de mediação tenha sido celebrado em regime de exclusividade e não se concretize por causa imputável ao cliente proprietário ou arrendatário trespassante do bem imóvel.”
Tal como esclarece Fernando Baptista de Oliveira, “a obrigação principal do cliente é proceder ao pagamento da comissão sempre que o trabalho do mediador conduza à celebração do contrato visado (salvo acordo expresso noutro sentido- sendo que casos há em que a remuneração é devida independentemente da consumação ou realização efectiva desse negócio: a sabida situação em que, sendo clausulada exclusividade, o negócio visado se não realizou por facto imputável ao cliente).
(…) Adiante-se, desde já, que a regra exposta, no tocante à prestação do cliente, não afasta a possibilidade de as partes, querendo, poderem acordar em sentido contrário, designadamente prevendo uma indemnização mesmo na eventualidade de o negócio não se chegar a concretizar.”[7]
Sobre esta temática permitimo-nos também realçar o Ac STJ de 21/4/2023, que para o que aqui nos interessa, afirma que “ (…) o contrato de mediação, ainda que autónomo, é acessório ou preparatório de um outro contrato, a ser concluído entre o comitente (que contratou previamente com o mediador) e terceiro interessado (identificado e aproximado pelo mediador ao comitente).
Na vigência do DL nº 285/92 de 25/9, havia dúvidas sobre o momento em que emerge a obrigação de o cliente remunerar o mediador, e a jurisprudência sustentava ser necessário uma relação de causa/efeito entre a actividade do mediador e o negócio realizado, exigindo-se que o negócio se concluísse como consequência adequada da actividade do mediador. Por isso, o DL nº 77/99, entre cujas motivações esteve- como se afirma no Preâmbulo- a de clarificar o momento e estabelecer as condições em que é devida a remuneração pela actividade de imediação imobiliária” plasmou no seu art. 19º, nº 1, que a “remuneração só é devida com a conclusão e perfeição do negócio visado pelo exercício da mediação”, e que passou para o art. 18º nº 1 do DL nº 211/2004 de 20/10 e agora para a norma do art. 19º nº 1 da Lei nº 15/2013.
Sendo assim, é hoje incontroversa a exigência do nexo causal entre a actividade do mediador e a conclusão do negócio.
(…) o direito de remuneração do mediador no âmbito de um contrato de mediação imobiliária com cláusula de exclusividade em que o contrato visado não se concluiu pressupõe que a causa da não conclusão seja imputável ao comitente”, realçando que “não tem direito à remuneração a mediadora que angariou um interessado para a compra e venda de um prédio urbano, pertencente ao proprietário/comitente, demonstrando-se que o negócio não se realizou por perda de interesse do terceiro”.[8]
A este propósito, Fernando Baptista de Oliveira, escreve ainda que, “(…) quanto à remuneração no caso de inserção de cláusula de exclusividade, reza o art. 19º/2(…)
Isto é, aqui, não se celebrando o contrato visado por causa imputável ao cliente, a remuneração da mediadora depende apenas do cumprimento da sua obrigação e do sucesso desta.”[9]
Também Higina Castelo perfilha o entendimento de que, “a grande diferença entre o contrato de mediação simples e o contrato de mediação com cláusula de exclusividade reside neste particular: enquanto no contrato de mediação simples, a remuneração do mediador é condicionada pela celebração do contrato visado, evento que está na disponibilidade do cliente e de um terceiro; no contrato de mediação com cláusula de exclusividade, a remuneração do mediador, não se celebrando o contrato visado por causa imputável ao cliente, depende apenas do cumprimento bem sucedido da sua obrigação.
De enfatizar que a aplicação da norma contida no art. 19º nº 2 do RJAMI implica, mais que a prova do cumprimento da obrigação do mediador- diligências no sentido da obtenção de um interessado-, a prova do sucesso desse cumprimento que satisfaz o interesse do credor-efectiva obtenção de um interessado, genuinamente interessado e pronto a celebrar o contrato nos moldes em que foi concebido no âmbito do contrato de mediação. Provando a mediadora que efectuou com sucesso a sua prestação, poderá o cliente eximir-se à remuneração mediante a prova de que o contrato não se concretizou por causa que não lhe é imputável.”[10]
Mas para que ocorra aquela situação excepcional prevista no art. 19º nº2 será pois necessária a verificação cumulativa de duas condições, cujo ónus de prova compete à mediadora:
i. que o contrato de mediação tenha sido celebrado em regime de exclusividade, tendo-o sido no caso em apreço;
ii. que o negócio visado de venda não se concretize por causa imputável ao cliente proprietário, condição esta que no caso em apreço não ficou demonstrada.
No caso sub judice a Apelante nem logrou provar que efectuou com sucesso a sua prestação, que efectuou diligências no sentido da efectiva obtenção de um interessado, nem que conseguiu pessoa genuinamente interessada e pronta a celebrar o contrato nos moldes em que foi concebido no âmbito do contrato de mediação, falhando um dos pressupostos exigido por lei para que de forma excepcional fosse devida a comissão apesar de o contrato ter sido celebrado sob o regime de exclusividade.
Por conseguinte, não se tendo concretizado ou concluído o negócio visado com a mediação- que era a celebração do contrato de compra e venda do imóvel – nem estando demonstrado que o contrato visado só não foi celebrado por causa imputável à Apelada, não tem a Apelante direito à remuneração acordada no contrato de mediação imobiliária.
Em jeito de conclusão, concordando inteiramente com os argumentos invocados na sentença recorrida, os quais têm total sustentação no substracto factual dado como provado, bem como estão em consonância com as regras sobre a remuneração decorrentes do regime jurídico implementado pela Lei nº 15/2013 de 8/2, vai a mesma confirmada.
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V. DECISÃO: Em razão do antes exposto, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação do Porto, em julgar improcedente o recurso de apelação interposto pela Apelante, confirmando-se a sentença recorrida.
Custas a cargo da Apelante, que ficou vencida.
Notifique.
Porto, 11.12.2024
Maria da Luz Teles Meneses de Seabra
(Relatora)
Anabela Dias da Silva
(1ª Adjunta)
Maria Eiró
(2ª Adjunta)
(O presente acórdão não segue na sua redação o Novo Acordo Ortográfico)
___________________________________ [1] F. Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos em Processo Civil, 8ª edição, pág. 147 e A. Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 2ª edição, pág. 92-93. [2] Cadernos Temáticos De Jurisprudência Cível Da Relação, Impugnação da decisão sobre a matéria de facto, consultável no site do Tribunal da Relação do Porto, Jurisprudência [3] O Contrato de Mediação e o direito do mediador à remuneração, Scientia Iuridica, Janeiro-Abril 2013, Tomo LXII, Número 331, pág. 93/99 [4] Do Contrato de Mediação, Revista O Direito, Ano 139º, 2007, III, p. 516 ss [5] Ac STJ de 28/4/2009, www.dgsi/pt [6] Ac RP de 30/6/2022, Proc. Nº12308/21.7T8PRT.P1, www.dgsi.pt [7] Manual da Mediação Imobiliária, pág. 115 e 119 [8] Proc. Nº 11768/19.0T8LSB.L1.S1, www.dgsi.pt [9] Direito dos Contratos, Contrato de Mediação Imobiliária na Prática Judicial, Uma abordagem jurisprudencial, CEJ, Outubro de 2016, p. 78, www.cej.mj.pt., p. 70 [10] O Contrato de Mediação p.431/432