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AÇÃO EXECUTIVA
RECLAMAÇÃO DE CRÉDITO
INTERRUPÇÃO DA PRESCRIÇÃO
OBRIGAÇÃO SOLIDÁRIA PASSIVA
Sumário
I - A reclamação de créditos no processo executivo onde foi penhorado o imóvel sobre o qual fora constituída hipoteca para garantia do crédito é um ato que exprime diretamente a intenção de exercer o direito de crédito, na medida em que a reclamação serve precisamente para o credor obter pagamento do seu crédito dotado de garantia real no processo onde a reclamação é deduzida. Por isso, a notificação do reclamado para impugnar a reclamação produz a interrupção do prazo de prescrição, nos termos do disposto no artigo 323º do Código Civil. II - Por regra, a interrupção apenas produz efeitos em relação a quem respeite diretamente, embora em determinadas situações se admita a extensão do efeito interruptivo. III - No caso das obrigações solidárias passivas, em que existe uma relação de subordinação entre os vínculos dos devedores solidários (passivos), o prazo de prescrição deverá correr ao mesmo tempo, subordinando-se o seu decurso temporal à obrigação solidária principal (não subordinada) - verificando-se, pois, nesse caso uma situação em que o efeito interruptivo produzido na relação principal se estende à relação subordinada. IV - Já no caso das obrigações solidárias passivas em que os vínculos entre os devedores são autónomos os prazos de prescrição podem correr em tempos distintos. V - Por isso, o eventual efeito interruptivo operado em relação a um mutuário, em resultado da reclamação de créditos efetuada num processo de execução não se estende à aqui Embargante.
Texto Integral
Processo nº 1966/23.8T8VLG-A.P1
Tribunal Judicial da Comarca do Porto
Juízo de Execução de Valongo – Juiz 2
Relatora: Juíza Desembargadora Teresa Pinto da Silva
1ª Adjunta: Juíza Desembargadora Carla Fraga Torres
2º Adjunto: Juiz Desembargador Nuno Marcelo de Nóbrega dos Santos de Freitas Araújo
Acordam na 5ª Secção do Tribunal da Relação do Porto:
I – RELATÓRIO
1. Em 23.05.2023, A..., S.A. intentou execução, sob a forma sumária, contra AA, para pagamento da quantia de €110.090,82.
Alegou, para tanto, que em 30.12.1999, a Banco 1..., S.A., celebrou com BB e mulher AA, aqui executada, um contrato de mútuo com hipoteca, pelo montante de Esc. 17.550.000,00, correspondente a €87.539,03 (oitenta e sete mil quinhentos e trinta e nove euros e três cêntimos), quantia que receberam e de que se confessaram devedores.
Por contrato de cessão de créditos, celebrado em 20/12/2019, a Banco 1..., S.A. vendeu à Exequente o crédito identificado, que detinha sobre a Executada AA e BB e todas as garantias acessórias inerentes ao crédito cedido, designadamente a hipoteca constituída sobre a fração autónoma designada pela letra “I” do prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial de Valongo sob o número ... da freguesia ..., e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ..., da referida freguesia, registada sob a Ap. ..., de 23/11/1999, encontrando-se efetuado o respetivo registo de transmissão junto da Conservatória do Registo Predial de Valongo, sob a Ap. ..., de 26/08/2020, o que faz com que a aqui Exequente seja a atual titular do crédito sub judice.
O mencionado empréstimo foi concedido pelo prazo de 30 (trinta) anos, a reembolsar em 360 (trezentas e sessenta) prestações mensais constantes, de capital e juros, e nas demais condições constantes do documento complementar anexo à escritura pública de aquisição da fração supra mencionada.
Sucede que, apesar de instados para o respetivo cumprimento, os mutuários faltaram ao pagamento das prestações contratadas e devidas, não tendo pago as prestações que se venceram a partir de fevereiro de 2011, pelo que o Banco mutuante, ao abrigo do disposto nas cláusula 16.ª do documento complementar anexo à escritura, considerou o crédito vencido.
Assim são devidas à Exequente, por efeito do mencionado contrato, as seguintes quantias:
Capital .........................................82.478,09 €
Total ...........................................110.090,82 €
A este valor, acrescem os juros de mora vincendos até efetivo e integral pagamento, calculados sobre o correspondente capital em dívida, à taxa de 2,30%.
O crédito, respetivos juros vencidos e vincendos e despesas, está consubstanciado em título executivo, de harmonia com o disposto no art.º 703.º do Código de Processo Civil e goza de garantia real sobre o bem imóvel supra identificado, nos termos previstos nos artigos 686.º e seguintes do Código Civil.
O mutuário BB foi declarado insolvente por sentença proferida no âmbito do processo n.º 1796/22.4T8STS, que corre termos no Juiz 4 do Juízo de Comércio de Santo Tirso da Comarca do Porto.
2. A Executada foi citada nos termos do disposto no artigo 856º, do Código de Processo Civil, e deduziu oposição, mediante embargos, em 13 de setembro de 2023, invocando a prescrição do crédito exequendo bem como dos juros peticionados por apelo ao disposto no artº. 310º als d) e e) do Código Civil e, subsidiariamente, a falta de título quanto às despesas peticionadas. Requereu ainda, a suspensão da execução, face à alegação da inexigibilidade da obrigação, pugnando pelo levantamento imediato da penhora efetuada.
3. Liminarmente recebidos os embargos foi a Exequente notificada para os contestar, o que fez a 25 de outubro de 2023, tendo alegado que a divida exequenda está incorporada em título executivo – escritura pública – sendo-lhe aplicável o prazo ordinário de prescrição, nos termos do 311.º, n.º 1 do Código Civil. Mais alegou que a fração autónoma dada em garantia do crédito exequendo foi penhorada no âmbito do processo executivo n.º 2788/11.4TBGDM, que correu termos no Juiz 3 do Juízo de Execução do Porto, no âmbito do qual foi apresentada reclamação de créditos para cobrança do crédito dos autos em 18/12/2013, tendo sido proferidas sentenças, em 29/10/2015 e 14/02/2019 a verificar e reconhecer o identificado crédito, vindo esse processo executivo a extinguir-se em 03/11/2022, mantendo-se a penhora.
Tendo o incumprimento ocorrido em 2011 e a reclamação de créditos sido apresentada em 2013, interrompeu-se a prescrição, não tendo decorrido 5 (cinco) anos desde a data da extinção da execução, em 2022, até ao quinto dia posterior à data de entrada da presente execução. Acresce que também desde 2015 e 2019 até ao quinto dia posterior à data de entrada da execução em causa não decorreu o prazo ordinário de prescrição de 20 (vinte) anos.
Mais alega que, para cobrança do contrato sub judice, foi ainda apresentada reclamação de créditos no processo de execução fiscal n.º ..., concluindo que não ocorreu a prescrição, nem quanto à dívida exequenda, nem quanto a quaisquer juros.
Quanto às despesas diz que as mesmas respeitam a comissões que se encontram identificadas na nota de débito constante do documento 3. junto com o requerimento executivo, exigíveis nos termos das cláusulas 12.ª e 17ª. do documento complementar anexo à escritura.
Conclui pela improcedência da oposição por embargos, por não provada, prosseguindo a execução os seus termos até final, opondo-se à suspensão da execução.
4. Em 2 de novembro de 2023 a Embargante pronunciou-se sobre a invocada interrupção da prescrição, alegando que não é nem nunca foi executada nos processos executivos identificados pela Embargada nem neles foi citada ou notificada como tal. Termos em que conclui, tal como nos embargos deduzidos, pela procedência da exceção perentória da prescrição invocada.
5. Por despacho de 17 de novembro de 2023, o Tribunal a quo indeferiu a suspensão da execução requerida pela Embargante e convidou a Embargada a juntar aos autos duas certidões, sendo uma comprovativa da data da citação para reclamar créditos no processo 2788/11.4TBGDM do Juízo de Execução do Porto, J.3, da notificação ao(s) reclamado(s) da reclamação apresentada e da data da consolidação da decisão de extinção da execução e a outra comprovativa da data da citação para reclamar créditos no processo de execução fiscal ..., da notificação ao(s) reclamado(s) da reclamação apresentada e da data e motivo da extinção da execução.
Após diligências tendentes à junção aos autos dos identificados documentos e informações, o Tribunal de 1ª instância, em 29 de abril de 2024, proferiu despacho considerando que os autos reuniam as condições para prolação de decisão de mérito, tendo concedido prazo às partes para se pronunciarem quanto à dispensa da realização de audiência prévia, apenas se tendo pronunciado a Embargante, em 2 de maio de 2024, manifestando a sua não oposição à dispensa de realização daquela audiência, que não veio a realizar-se.
Em 4 de junho de 2024, o Tribunal a quo proferiu saneador-sentença nos termos do qual, julgando os embargos de executado deduzidos por AA procedentes, determinou a extinção dos autos principais de execução.
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Inconformado com esta decisão, veio a Embargada/Apelante A..., S.A., em 10 de julho de 2024, dela interpor o presente recurso, pugnando pela improcedência dos embargos, culminando as suas alegações com as seguintes conclusões:
«A. No passado dia 5 de Junho de 2024 decidiu o tribunal de primeira instância que a divida peticionada nos presentes autos se considerava prescrita.
B. Com efeito,
C. Não podia a ora recorrente estar mais em desacordo, pois:
D. O imóvel que serve de garantia ao contrato em execução nos presentes autos – fração autónoma designada pela letra “I” do prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial de Valongo sob o n.º ... da freguesia ... – foi penhorado no âmbito do processo executivo n.º 2788/11.4TBGDM.
E. Para cobrança do contrato sub judice, foi então apresentada reclamação de créditos em 18/12/2013, no âmbito da ação executiva n.º 2788/11.4TBGDM.
F. Tendo sido proferidas sentenças, em 29/10/2015 e 14/02/2019.
G. O processo executivo 2788/11.4TBGDM extinguiu-se em 03/11/2022.
H. O incumprimento ocorreu em 2011 e a reclamação de créditos foi apresentada em 2013, pelo que, desde a data do incumprimento até à data que em que ocorreu a interrupção da prescrição nos termos dos n.ºs 1 e 2 do artigo 323.º do CC, não ocorreram 5 (cinco) anos.
I. Também, desde a data da extinção da execução, em 2022, até ao quinto dia posterior à data de entrada da presente execução, ou seja, até 2023, não ocorreram 5 (cinco) anos.
J. Para cobrança do contrato sub judice, foi ainda apresentada reclamação de créditos no processo de execução fiscal n.º ... e Aps.
K. Assim, não se vislumbra como pode o crédito peticionado no âmbito dos presentes autos considerar-se prescrito.
L. Se, em suma: o crédito foi incumprido em 2011, reclamado em 2013 num processo que apenas findou em 2022, tendo a ação ora em crise sido interposta em 2023.
M. Mais, ainda que tivesse sido interposta antes, a mesma seria sustada por penhora prévia.
N. Pelo que, não pode o exequente, e aqui recorrente se ver privado de exercer o seu direito durante o período em que durou o processo 2788/11.4TBGDM, por um lado, o que sucedeu até 2022, e, posteriormente, nesta sede, lhe ser vedado o direito de passado um ano do final dessa mesma ação, executar esse mesmo direito!
O. Pelo que se requerer a nulidade da sentença, considerando-se os embargos improcedentes.
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Na resposta às alegações, a Embargante sustentou a improcedência do recurso interposto e a manutenção da decisão recorrida, apresentando as seguintes conclusões:
A. A decisão ora posta em crise pela Recorrente deverá ser mantida qua tale,
B. até porque, decidir-se em sentido contrário será repudiar - o que não se concebe - a uniformização da jurisprudência emanada pelo Supremo Tribunal de Justiça, através do Acórdão Uniformizador de Jurisprudência n.º 6/2022 (doravante, abreviadamente AUJ).
C. É que a Embargada, ao contrário do que pretende fazer crer, nunca, em momento algum anterior à interposição em juízo da presente lide, praticou qualquer acto - dirigido à aqui Recorrida - que exprimisse directa ou indirectamente a intenção de exercer o seu direito,
D. Sendo que, ao contrário do que alega, nem legal nem processualmente estaria impedida de o fazer.
E. Ou seja, podendo fazê-lo, nunca a Recorrente praticou qualquer acto - dirigido à Recorrida - através do qual pudesse, em abstracto, interromper-se o prazo prescricional,
F. prazo esse que é de cinco anos com base no disposto na al. e) do art. 310.º do Código Civil e com arrimo no AUJ supra mencionado.
G. Ora, como decorre da Douta Sentença, o crédito exequendo venceu-se em 28/02/2011, data a partir da qual o credor encontrar-se-ia em condições de exercer o seu direito.
H. Assim, é, no mínimo, falaciosa a argumentação de que a Recorrente lança mão, ao alegar que antes de 2022 estar-lhe-ia vedada a execução do seu direito.
I. Com efeito, a Recorrente escuda-se no processo executivo n.º 2788/11.4TBGDM, onde foram reclamados e reconhecidos créditos.
J. Porém, omite que a Recorrente não foi parte nesses autos nem teve intervenção na mencionada acção de verificação e graduação de créditos,
K. sendo que o objecto de tal acção ".., não é tanto a pretensão de reconhecimento do direito de crédito como a de reconhecimento do direito real que o garante”, sendo o reconhecimento do crédito apenas um pressuposto da decisão e “como tal não abrangido pelo caso julgado” que se forma apenas relativamente à graduação." (nesse sentido, vide Lebre de Freitas, A Acção Executiva, 2º. Ed. Pág. 265).
L. Ademais, como salienta a decisão recorrida, "a sentença proferida no apenso da reclamação de créditos que correu por apenso aos autos de execução nº. 2788/11.4TBGDM não constitui uma sentença condenatória – cfr. artº. 703º. nº. 1 al. al. a) do CPC -, não sendo título executivo suscetível de fundar uma ação executiva e muito menos contra a aqui embargante que na mesma não é parte."
M. Destarte, tendo a Recorrida sido citada mais de 12 anos volvidos desde o vencimento da obrigação, à luz da melhor (e uniformizada) Jurisprudência, o crédito exequendo encontra-se prescrito, o que faz decair o recurso interposto e, consequentemente, será de manter qua tale a decisão proferida pelo Tribunal a quo.
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Recebido o processo nesta Relação, emitiu-se despacho que teve o recurso como próprio, tempestivamente interposto e admitido com efeito e modo de subida adequados.
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
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Delimitação do objeto do recurso
O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões vertidas pela Recorrente nas suas alegações (artigos 635º, nºs 4 e 5 e 639º, nºs 1 e 2, do Código de Processo Civil), não podendo o Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso (artigo 608.º, n.º 2, in fine, aplicável ex vi do artigo 663.º, n.º 2, in fine, ambos do Código de Processo Civil).
Não pode igualmente o Tribunal conhecer de questões novas (que não tenham sido objeto de apreciação na decisão recorrida), uma vez que os recursos são meios de impugnação de decisões judiciais prévias, destinando-se à apreciação de questões já levantadas e decididas no processo e não à prolação de decisões sobre questões que não foram nem submetidas ao contraditório nem decididas pelo Tribunal recorrido.
Mercê do exposto, da análise das conclusões apresentadas pela Recorrente nas suas alegações decorre que no presente recurso deverão ser apreciadas, por ordem lógica, as seguintes questões:
1ª Se o saneador-sentença recorrido padece de nulidade.
2ª Se o crédito exequendo se encontra ou não prescrito.
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II – FUNDAMENTAÇÃO Fundamentação de facto
No saneador-sentença recorrido consideraram-se, com interesse para a decisão, os seguintes: Factos provados
1 – Em 23 de maio de 2023 a exequente interpôs a ação executiva de que estes são apenso dando à execução o contrato de mútuo com hipoteca celebrado em 30 de dezembro de 1999 entre a executada e BB e a Banco 1..., S.A., alegando que o mencionado empréstimo, no valor de € 87.539,03 foi concedido pelo prazo de 30 (trinta) anos, sendo reembolsado em 360 (trezentas e sessenta) prestações mensais constantes, de capital e juros, e nas demais condições constantes do documento complementar anexo à escritura e que em garantia do mesmo foi constituída a favor da Banco 1..., hipoteca sobre a fração autónoma designada pela letra “I” do prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial de Valongo sob o número ... da freguesia ..., e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ..., da referida freguesia, registada sob a Ap. ..., de 23/11/1999, que os mutuários não pagaram as prestações que se venceram a partir de fevereiro de 2011, pelo que o Banco mutuante, ao abrigo do disposto nas cláusula 16.ª do documento complementar anexo à escritura, considerou o crédito vencido.
2 – O requerimento executivo veio acompanhado de cópia:
a) - do contrato de cessão de créditos celebrado entre a Banco 1... e a exequente em 20 de dezembro de 2019.
b)- do contrato de compra e venda e mútuo com hipoteca e fiança celebrado com a Banco 1..., S.A. em 30 de dezembro 1999.
c) da certidão permanente da fração I do prédio descrito sob o nº. ... de ....
3 – A exequente pagou a quantia a que alude o artº. 724º. nº. 6 al. a) do CPC em 24 de maio de 2023.
4 – A executada foi citada para os termos da execução de que estes são apenso em 29 de julho de 2023.
5 - Nos termos da cláusula nona, número 1, do documento complementar anexo à escritura referida em 2 b) a primeira prestação de reembolso do empréstimo vencia-se no correspondente dia do mês seguinte ao da celebração do contrato e as seguintes em iguais dias dos meses subsequentes.
6 – Nos termos da cláusula décima segunda do referido documento complementar anexo seriam da responsabilidade dos mutuários todas as despesas relacionadas com a segurança e cobrança do empréstimo, designadamente, honorários de Advogada e solicitadores e “as derivadas da celebração deste contrato e seu distrate, do registo da hipoteca e seu cancelamento ou renúncia”, dispondo a cláusula décima sétima que “o extracto da conta do empréstimo e os documentos de débito emitidos pela Caixa e por ela relacionados com este empréstimo serão havidos, para todos os efeitos legais e, designadamente, para efeitos do disposto no artigo cinquenta do Código de Processo Civil, como documentos suficientes para prova e determinação dos montantes em dívida, tendo em vista a exigência, justificação ou reclamação judicial dos créditos que dele resultarem, em qualquer processo”.
7 – Nos termos da cláusula décima sexta do referido documento complementar ficou reconhecido à credora o direito de “considerar vencido o empréstimo … se a parte devedora deixar de cumprir alguma obrigação decorrente deste contrato”. 8 - Em 28 de setembro de 2012 foi penhorada a fração I do prédio descrito sob o nº. ... de ... no âmbito do processo de execução que correu termos sob o nº. 2788/11.4TBGDM movido por CC contra BB e outros (que não a aqui executada).
9 – Em 4 de dezembro de 2013 a Banco 1..., S.A foi citada para reclamar créditos no âmbito do processo executivo atrás identificado.
10 – Em 18 de dezembro de 2013 a Banco 1..., S.A. apresentou, por apenso à ação executiva atrás identificada, reclamação de créditos invocando a celebração do contrato de mútuo referido em 2 b), alegando estar em dívida as prestações vencidas desde 30 de janeiro de 2011 e pedindo o reconhecimento do seu crédito no valor de €91.950,79.
11 – Em 20 de janeiro de 2014 foi enviada ao mandatário do reclamado BB, notificação nos termos e para os efeitos do disposto o artº. 789º. do CPC.
12 - Em 29 de outubro de 2015 foi proferida sentença a reconhecer e graduar em primeiro lugar o crédito reclamado pela Banco 1....
13 – Em 14 de fevereiro de 2019 foi reconhecido no processo atrás referido o crédito da Banco 2... no valor de € 11.562,05, reclamado com base na penhora da fração I efetuada posteriormente à efetuada à ordem do processo 2788/11.4TBGDM.
14 – Em 3 de novembro de 2022 foi a execução 2788/11.4TBGDM declarada extinta por se mostrar paga a quantia exequenda.
15 – Em 20 de janeiro de 2012 a Banco 1..., S.A. foi citada para reclamar créditos no âmbito do processo de execução fiscal nº. ..., movido contra BB.
16 – O processo executivo atrás referido foi extinto por pagamento em 3 de maio de 2012 e notificada a extinção à Banco 1..., S.A. em 8 de maio de 2012, não tendo o executado BB sido notificado da reclamação de créditos apresentada pela Banco 1..., S.A.
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Fundamentação de direito 1) Se o saneador-sentença recorrido padece de nulidade
A Recorrente, na alínea O) das suas conclusões de recurso, requer a nulidade da sentença proferida, considerando-se os embargos improcedentes.
Escalpelizadas as suas alegações, não se vislumbra qual o fundamento concreto que invoca para sustentar tal nulidade, quiçá pela clarividente inexistência do mesmo.
As nulidades da sentença encontram-se tipificadas no artigo 615º, do Código de Processo Civil, sendo vícios formais, reportando-se à estrutura, à inteligibilidade e aos limites da decisão, não podendo ser confundidas com erros de julgamento de facto nem com erros de aplicação das normas jurídicas aos factos. Nos erros de julgamento assiste-se a uma deficiente análise crítica das provas produzidas e/ou a uma deficiente enunciação e/ou interpretação dos institutos jurídicos aplicados ao caso concreto. Esses erros, por não respeitarem já a defeitos que afetam a própria estrutura da sentença, antes ao mérito da relação material controvertida, nela apreciada, não a inquinam de invalidade.
As nulidades previstas no artigo 615º, do Código de Processo Civil são aquelas que “afetam formalmente a sentença e provocam a dúvida sobre a sua autenticidade, como é o caso da falta de assinatura do juiz, ou a ininteligibilidade do discurso decisório por ausência total de explicação da razão por que se decide de determinada maneira (falta de fundamentação), quer por essa explicação conduzir logicamente a resultado oposto do adotado (contradição entre os fundamentos e a decisão), ou uso ilegítimo do poder jurisdicional em virtude de pretender resolver questões de que não podia conhecer (excesso de pronúncia) ou não tratar de questões que deveria conhecer (omissão de pronúncia)”[1] ou condenar ultra petitum, tendo o julgador de limitar a condenação ao que, concretamente, vem peticionado, em obediência ao princípio do dispositivo.
Os referidos vícios respeitam à “estrutura ou aos limites da sentença. Respeitam à estrutura da sentença os fundamentos das alíneas b) (falta de fundamentação) e c) (oposição entre os fundamentos e a decisão). Respeitam aos seus limites os das alíneas d) (omissão ou excesso de pronúncia) e e) (pronúncia ultra petitum)”[2].
No caso concreto, analisada a decisão recorrida, conclui-se claramente que a mesma não padece dos invocados vícios, mostrando-se fundamentada quer de facto, quer de direito, consequente com os fundamentos e não contendo qualquer ambiguidade ou obscuridade que a torne ininteligível.
Saliente-se, a respeito desta questão, que a Recorrente parece incorrer numa confusão quando invoca aquela nulidade.
Aliás, a propósito da invocação de nulidades em sede de recurso e como evidencia, com inteira propriedade, António Santos Abrantes Geraldes[3], “É frequente a enunciação nas alegações de recurso de nulidades da sentença, numa tendência que se instalou (e que a racionalidade não consegue explicar), desviando-se o verdadeiro objeto do recurso que deve ser centrado nos aspetos de ordem substancial. Com não menos frequência, a arguição de nulidades da sentença ou do acórdão da Relação acaba por ser indeferida, e com toda a justeza, dado que é corrente confundir-se o inconformismo quanto ao teor da sentença com algum dos vícios que determinam tais nulidades, previstas no artigo 615º, nº1”.
É justamente o que sucede no caso concreto com a alegação da Recorrente, que confunde a invocação da nulidade com a arguição da existência de erro de julgamento, revelando-se, por conseguinte, a arguição daquela absolutamente infundada.
O saneador-sentença proferido contém a enunciação dos factos provados e, bem assim, dos fundamentos de direito que conduzem à decisão final proferida, indicando, interpretando e aplicando as normas jurídicas correspondentes e concluindo no sentido da procedência da oposição à execução.
O que a Recorrente vem manifestar, em concreto, é a sua discordância quanto ao decidido no saneador-sentença apelado, mas esse inconformismo não conduz à sua nulidade, nada tendo a ver com as nulidades previstas no artigo 615º, do Código de Processo Civil.
Termos em que improcedem as conclusões da alegação de recurso no que respeita à questão da nulidade da decisão recorrida.
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2) Se o crédito exequendo se encontra ou não prescrito
Verdadeira questão central neste recurso é a de determinar se o crédito exequendo se encontra prescrito, tal como concluiu a decisão recorrida ou se, diversamente, haverá que reconhecer razão à Recorrente ao sustentar que ainda não decorreu o prazo de prescrição aplicável.
A prescrição, tal como escreve Ana Filipa Morais Antunes, in Estudos de Homenagem ao Prof. Sérvulo Correia, vol. III, pág. 39, «justifica-se em homenagem ao valor da segurança jurídica e da certeza do direito, mas, também, em nome do interesse particular do devedor, funcionando como reacção à inércia do titular do direito, fundada num imperativo de justiça (.). Na verdade, a prescrição é um instituto que se funda em interesses multifacetados. (.). Os seus principais fundamentos são: i) a probabilidade de ter sido feito o pagamento; ii) a presunção de renúncia do credor; iii) a sanção da negligência do credor; iv) a consolidação de situações de facto; v) a protecção do devedor contra a dificuldade de prova do pagamento; vi) a necessidade social de segurança jurídica e certeza dos direitos; vii) o imperativo de sanear a vida jurídica de direitos praticamente caducos; viii) a exigência de promover o exercício oportuno dos direitos.»
A Recorrente não coloca em causa o entendimento perfilhado pelo Tribunal de 1ª Instância ao aplicar ao caso em análise a doutrina fixada pelo Acórdão Uniformizador de Jurisprudência de 30-06-2022, publicado no Diário da República de 22-09-2022, do seguinte teor:
«I – No caso de quotas de amortização do capital mutuado pagável com juros, a prescrição opera no prazo de cinco anos, nos termos do art.º 310.º al. e) do Código Civil, em relação ao vencimento de cada prestação.
II – Ocorrendo o seu vencimento antecipado, designadamente nos termos do art.º 781.º daquele mesmo diploma, o prazo de prescrição mantém-se, incidindo o seu termo “a quo” na data desse vencimento e em relação a todas as quotas assim vencidas.»
Ou seja, decorre do entendimento perfilhado no referido Acórdão Uniformizador de Jurisprudência que o direito de crédito da Recorrente está sujeito ao prazo de prescrição de 5 anos, previsto na alínea e), do artigo 310º, do Código Civil, e ainda que o vencimento antecipado das prestações acordadas para pagamento do mútuo não altera esse prazo de prescrição aplicável.
Analisado o substrato factual apurado, provou-se que o crédito foi contraído pela Embargante e BB em 30 de dezembro de 1999, no montante de €87.539,03, pelo prazo de 30 (trinta) anos, a ser reembolsado em trezentas e sessenta prestações mensais, constantes e sucessivas de capital e juros.
A obrigação assumida pela mutuária executada constitui, assim, uma obrigação de valor predeterminado cujo cumprimento, por acordo das partes, foi fracionado num número fixo de prestações mensais; ou seja, em bom rigor, não estamos perante uma pluralidade de obrigações que se vão constituindo ao longo do tempo, como é típico das prestações periodicamente renováveis, mas perante uma obrigação unitária, de montante predeterminado, cujo pagamento foi parcelado ou fracionado em prestações.
Esse plano de pagamento obedece a um propósito de agilização do reembolso do crédito, facilitando a respetiva liquidação em prestações autónomas, de montante mais reduzido.
Mas, por outro lado, visa-se estimular a cobrança pontual dos montantes fracionados pelo credor, evitando o diferimento do exercício do direito de crédito para o termo do contrato, tendo por objeto a totalidade do montante em dívida.
Como tal, também entendemos que as prestações fixadas no contrato de mútuo para reembolso do capital mutuado, juros remuneratórios e encargos encontram-se sujeitas ao prazo prescricional mais curto, de cinco anos, a que alude a alínea e), do artigo 310º, do Código Civil.
Não vemos nos presentes autos qualquer razão que justifique um desvio à regra de aplicação do Acórdão Uniformizador de Jurisprudência referido, a cuja fundamentação aderimos, por com ela concordarmos.
Nenhuma circunstância superveniente à publicação do mesmo impõe uma nova interpretação do disposto no artigo 310º, e) do Código Civil.
Recorrendo aos ensinamentos de Júlio Gomes, in Comentário ao Código Civil: parte geral / [coord. de Luís Carvalho Fernandes, José Brandão Proença] – Lisboa: Universidade Católica Editora, 2014, página 755, diremos que «A ratio normalmente apontada para a existência destes prazos mais curtos de prescrição consiste em evitar que a inércia do credor conduza a um acumular de prestações, normalmente pecuniárias, cuja exigência poderia revelar-se extremamente onerosa para o devedor. Nas palavras sugestivas de Ana Filipa Morais Antunes (2008: 79), trata-se de “evitar a ruína do devedor pela acumulação das pensões, rendas, alugueres, juros ou outras prestações periódicas” (p. 79)».
Por isso, parafraseando Pais de Vasconcelos, in Teoria Geral do Direito Civil, 5.ª Edição, Almedina, pág. 380, é legítimo afirmar que «a prescrição é um efeito jurídico da inércia prolongada do titular do direito no seu exercício, e traduz-se em o direito prescrito sofrer na sua eficácia um enfraquecimento consistente em a pessoa vinculada poder recusar o cumprimento ou a conduta a que esteja adstrita. Se o credor, ou o titular do direito, deixar de o exercer durante certo tempo, fixado na lei, o devedor, ou a pessoa vinculada, pode recusar o cumprimento, invocando a prescrição.»
O artigo 304.º do Código Civil estabelece que uma vez “completada a prescrição, tem o beneficiário a faculdade de recusar o cumprimento da prestação ou de se opor, por qualquer modo, ao exercício do direito prescrito”. A prescrição é, portanto, uma exceção que não extingue o direito de crédito, apenas permitindo ao devedor recusar o seu cumprimento e, com isso, impedir o exercício do direito de crédito pelo credor.
Foi precisamente isso que a Embargante fez ao deduzir os embargos de executado.
Não obstante, se é certo que a Recorrente não questiona que o prazo de prescrição a aplicar ao crédito exequendo é de cinco anos, nos termos da alínea e) do artigo 310º, do Código Civil, e não o prazo ordinário de prescrição de 20 anos previsto no artigo 309º, do citado diploma fundamental, o mesmo já não sucede quanto à forma de contagem desse prazo por parte do Tribunal de 1ª Instância, uma vez que sustenta que o prazo de prescrição em causa teve interrupções que não foram tidas em consideração na decisão recorrida.
Como decorre do disposto no artigo 306º do Código Civil, o prazo de prescrição começa a correr a partir do momento em que o direito podia ser exercido.
Mas, em certas circunstâncias, a prescrição pode ser interrompida (artigos 323º a 327º do Código Civil), sendo certo que, em consequência da interrupção, o tempo decorrido fica inutilizado, começando o prazo integral a correr de novo a partir do ato interruptivo (artigo 326º do Código Civil).
Em tal caso, todo o tempo decorrido até à interrupção é perdido, iniciando-se a contagem do novo prazo caso desapareça a interrupção da prescrição.
Sendo a interrupção determinada por atos que tanto podem resultar de uma iniciativa do titular do direito (credor), a qual terá lugar sempre que se dê conhecimento ao devedor, através de citação, notificação judicial ou outro meio judicial da intenção de se exercitar o direito (artigo 323º do Código Civil), como por atos do beneficiário da prescrição, ou seja, do devedor (artigo 325º do Código Civil).
Analisada a factualidade provada, resulta da mesma, com interesse para a decisão da questão em apreço, que: - Em 28 de setembro de 2012 foi penhorada a fração I do prédio descrito sob o nº. ... de ... no âmbito do processo de execução que correu termos sob o nº. 2788/11.4TBGDM movido por CC contra BB e outros (que não a aqui executada).
– Em 4 de dezembro de 2013 a Banco 1..., S.A foi citada para reclamar créditos no âmbito do processo executivo atrás identificado.
– Em 18 de dezembro de 2013 a Banco 1..., S.A. apresentou, por apenso à ação executiva atrás identificada, reclamação de créditos invocando a celebração do contrato de mútuo referido em 2 b), alegando estar em dívida as prestações vencidas desde 30 de janeiro de 2011 e pedindo o reconhecimento do seu crédito no valor de €91.950,79.
– Em 20 de janeiro de 2014 foi enviada ao mandatário do reclamado BB, notificação nos termos e para os efeitos do disposto o artº. 789º. do CPC.
- Em 29 de outubro de 2015 foi proferida sentença a reconhecer e graduar em primeiro lugar o crédito reclamado pela Banco 1....
– Em 14 de fevereiro de 2019 foi reconhecido no processo atrás referido o crédito da Banco 2... no valor de € 11.562,05, reclamado com base na penhora da fração I efetuada posteriormente à efetuada à ordem do processo 2788/11.4TBGDM.
– Em 3 de novembro de 2022 foi a execução 2788/11.4TBGDM declarada extinta por se mostrar paga a quantia exequenda.
– Em 20 de janeiro de 2012 a Banco 1..., S.A. foi citada para reclamar créditos no âmbito do processo de execução fiscal nº. ..., movido contra BB.
– O processo executivo atrás referido foi extinto por pagamento em 3 de maio de 2012 e notificada a extinção à Banco 1..., S.A. em 8 de maio de 2012, não tendo o executado BB sido notificado da reclamação de créditos apresentada pela Banco 1..., S.A..
Importa, assim, analisar se a reclamação do crédito exequendo pela cedente Banco 1... em duas ações executivas tem influência na contagem do prazo de prescrição relativamente à Embargante.
E, antecipando a conclusão, adiantámos desde já que não tem, porquanto desde logo a aqui Executada não foi parte naqueles processos.
Resulta dos factos provados que o processo de execução nº 2788/11.4TBGDM foi movido por CC contra BB e outros (que não a aqui executada) e o processo de execução fiscal nº. ... foi movido contra BB.
Se é certo que em ambos os processos executivos a Banco 1... reclamou o crédito exequendo, em nenhum desses processos a Embargante foi parte e, nessa medida, não pode a Recorrente pretender estender os efeitos dessas reclamações à aqui Executada, por forma a considerar-se que através daquelas ocorreu uma interrupção do prazo de prescrição em curso quanto à Embargante.
Nos termos do artigo 323.º do Código Civil a prescrição interrompe-se pela citação ou notificação judicial de qualquer ato que exprima, direta ou indiretamente, a intenção de exercer o direito, seja qual for o processo a que o ato pertence e ainda que o Tribunal seja incompetente.
A citação (ou notificação) judicial da contraparte visa comunicar-lhe o exercício judicial do direito pelo titular, uma vez que não se afigura razoável que o devedor fique sujeito à interrupção do prazo prescricional sem o seu conhecimento.
A ideia que preside a esta forma de interrupção da prescrição – a prevista no artigo 323º do Código Civil - é dupla:
(i) por um lado, o credor exerce o seu direito ou exprime a intenção de o fazer;
(ii) por outro, tem o devedor conhecimento daquele exercício ou desta intenção.
Por outro lado, importa atentar que constituindo a interrupção da prescrição facto impeditivo da paralisação do exercício do direito a respetiva alegação e prova incumbirá ao credor.
A reclamação de créditos no processo executivo onde foi penhorado o imóvel sobre o qual fora constituída hipoteca para garantia do crédito é um ato que exprime diretamente a intenção de exercer o direito de crédito, na medida em que a reclamação serve precisamente para o credor obter pagamento do seu crédito dotado de garantia real no processo onde a reclamação é deduzida.
Por isso, admitimos, em abstrato, que a notificação do reclamado para impugnar a reclamação produz, nos termos do citado preceito, a interrupção do prazo de prescrição.
No entanto, no caso sub judice, não resultou provado que a aqui Embargante tenha sido notificada dessas reclamações e, nessa medida, não logrou a Embargada provar que a aqui Recorrente teve conhecimento oficial do exercício daquele direito.
Note-se que, por regra, a interrupção apenas produz efeitos em relação a quem respeite diretamente, embora em determinadas situações se admita a extensão do efeito interruptivo.
No caso das obrigações solidárias passivas, o artigo 521º do Código Civil considera possível que os prazos de prescrição corram “…em tempos distintos relativamente a cada um dos devedores solidários, sem, no entanto, o impor (nº 1). Pressupõe-se, assim, que no caso de os vínculos entre os devedores solidários serem autónomos, os prazos de prescrição possam correr em tempos distintos.
Já se existir alguma relação de subordinação entre os vínculos dos devedores solidários (passivos), o prazo de prescrição deverá correr ao mesmo tempo, subordinando-se o seu decurso temporal à obrigação solidária principal (não subordinada) - verificando-se, pois, nesse caso uma situação em que o efeito interruptivo produzido na relação principal se estende à relação subordinada.
Ora, no caso concreto, não se verifica esta situação, pois que não existe qualquer relação de subordinação entre as obrigações assumidas pelos mutuários.
Por conseguinte, não podemos deixar de concluir que o eventual efeito interruptivo operado em relação ao mutuário BB em resultado da reclamação de créditos efetuada pela Banco 1... no âmbito do processo de execução o nº. 2788/11.4TBGDM não se estende à aqui Embargante.
Isso decorre também do citado artigo 521º do Código Civil, onde se estabelece que:
“1. Se, por efeito da suspensão ou interrupção da prescrição, ou de outra causa, a obrigação de um dos devedores se mantiver, apesar de prescritas as obrigações dos outros, e aquele for obrigado a cumprir, cabe-lhe o direito de regresso contra os seus condevedores.
2. O devedor que não haja invocado a prescrição não goza do direito de regresso contra os condevedores cujas obrigações tenham prescrito, desde que estes aleguem a prescrição”.
Como esclarece Ana Afonso em anotação a este preceito legal, pág. 445 (Comentário ao CC”, Vol. I) “o decurso do prazo prescricional, assim como a suspensão ou interrupção da prescrição podem afectar globalmente a prestação ou ter carácter pessoal, isto é, serem relativos a cada um dos condevedores. Na primeira hipótese, se a obrigação prescrever em relação a todos, cada um poderá invocar a vantagem daí resultante, opondo-se ao cumprimento da obrigação (…). Para a segunda hipótese, a solução legislativa plasmada neste preceito é a de que o prazo de prescrição corre autonomamente para cada um dos obrigados. Assim o benefício da prescrição da obrigação em relação a um dos obrigados solidários não se estende aos restantes que se mantêm obrigados ao cumprimento da obrigação, no plano das relações externas, com o que se tutela a confiança do credor no cumprimento integral da prestação. No plano das relações internas, a prescrição não exonera o beneficiário da prescrição contra o qual pode ser exercido o direito de regresso por aquele ou aqueles que cumpriram a obrigação. A prescrição pode ser invocada por aquele a quem aproveita como meio de defesa pessoal em relação ao credor, mas nenhuma vantagem traz ao beneficiário ao nível das relações internas visto que este continua a ser um obrigado de regresso. Em contrapartida, a interrupção ou suspensão da prescrição em relação a um dos devedores tem por efeito que este se mantém vinculado ao cumprimento integral da prestação, mas isso não o prejudica no plano interno uma vez que não fica impedido de accionar em via de regresso os restantes obrigados”.
Em resultado da forma como acabam de ser apreciadas as questões jurídicas atinentes à prescrição, o recurso tem de improceder.
Tendo ficado demonstrado que a mutuária AA, aqui Embargante, entrou em situação de incumprimento contratual a partir de Fevereiro de novembro de 2011, não mais procedendo ao pagamento de qualquer prestação, quando a Exequente dá entrada da execução de que estes embargos constituem apenso – 23 de maio de 2023 – tinham já decorrido mais de 11 anos sobre o vencimento da obrigação.
Ou seja, já há muito havia decorrido o prazo de cinco anos desde a data do vencimento da obrigação a que alude o artigo 306º do Código Civil, não tendo a Exequente/Embargada logrado demonstrar qualquer facto interruptivo ou suspensivo da prescrição.
Consequentemente a tese sufragada pela Apelante não merece acolhimento, pois quando veio cobrar judicialmente o montante do capital (e juros), a título de vencimento antecipado, já todas as prestações dos empréstimos se encontravam prescritas pelo decurso do aludido prazo quinquenal.
É, assim de manter a decisão recorrida.
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Nos termos dos n.ºs 1 e 2 do artigo 527º do Código de Processo Civil, a decisão que julgue o recurso condena em custas a parte que lhes tiver dado causa, presumindo-se que lhes deu causa a parte vencida, na respetiva proporção.
Como a apelação foi julgada improcedente, mercê do princípio da causalidade, as custas serão da responsabilidade da Apelante/Embargada.
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Síntese conclusiva (da exclusiva responsabilidade da Relatora – artigo 663º, nº7, do Código de Processo Civil)
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III – DECISÃO
Pelo exposto, acordam os juízes subscritores deste acórdão da 5ª Secção do Tribunal da Relação do Porto em julgar a apelação improcedente, confirmando integralmente a decisão recorrida.
Custas pela Recorrente.
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Porto, 11 de dezembro de 2024
Teresa Pinto da Silva
Carla Fraga Torres
Nuno Marcelo de Nóbrega dos Santos de Freitas Araújo
___________________ [1] Abílio Neto, Novo Código de Processo Civil Anotado, 2ª ed., janeiro/2014, pág. 734. [2] José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, Código de Processo Civil Anotado, volume 2º, 3ª Edição Almedina, pág. 735. [3] António Santos Abrantes Geraldes, Recursos em Processo Civil, 7ª edição, Coimbra, Almedina, 2022, p. 214.