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CONTRATO COLECTIVO DE TRABALHO
PORTARIA DE EXTENSÃO
CRÉDITOS LABORAIS
Sumário
i) Sendo a recorrente membro da União das Misericórdias, mas também IPSS, às relações de trabalho que manteve com a recorrida, não sindicalizada, eram aplicáveis as portarias de regulamentação do trabalho publicadas nos BTE n.º 31, de 22 de agosto de 1985, e BTE n.º 15, de 22 de abril de 1996, no que ao direito a diuturnidades diz respeito; ii) todavia, a partir de 29-05-2010, por força da portaria de extensão n.º 278/10, de 24 de maio, o acordo coletivo de trabalho entre a Santa Casa da Misericórdia Local 2 e outras e a FNE – Federação Nacional dos Sindicatos da Educação e outros, publicado no BTE n.º 47, de 22 de dezembro de 2001, alterado em 2010, conforme BTE n.º 3, de 22 de janeiro de 2010 – que estipulou a abolição de diuturnidades – passou a ser aplicável à relação laboral em causa; iii) no âmbito do Código do Trabalho de 2003, o n.º 5 do artigo 125.º estipulava que só haveria crédito de horas “acumuláveis ao longo de três anos, no máximo”, pelo que o trabalhador não pode utilizar os créditos de horas ou vir a reclamar o respetivo pagamento quando excedidos os três anos após o seu vencimento; iv) no âmbito do atual Código do Trabalho, cessando o contrato de trabalho e havendo horas que não foram ministradas pelo empregador, são devidas não só as horas que já se transformaram em crédito – com o limite dos três anos sobre a sua constituição –, como ainda as que se venceram nos últimos dois anos de execução do contrato, em relação aos quais apenas se formou o crédito com a cessação do contrato. (Sumário elaborado pelo relator)
Texto Integral
Proc. n.º 2021/23.6T8EVR.E1
Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Évora[1]: I – Relatório AAintentou a presente ação declarativa comum, emergente de contrato individual de trabalho, contra Santa Casa da Misericórdia Local 1, pedindo a condenação desta a pagar-lhe a quantia de € 18.174,15 (a título de diuturnidades, crédito por formação contínua não ministrada, trabalho suplementar e diferenças salariais por cessação do contrato de trabalho), acrescida de juros de mora, à taxa legal, sobre o vencimento de cada um dos créditos até integral pagamento.
Alegou, para o efeito e em síntese, que a ré é uma Instituição Particular de Solidariedade Social (doravante IPSS), que foi admitida ao serviço da ré em 28-09-1989, como ajudante de lar, mas que a sua verdadeira categoria profissional era de “roupeira”, e que o contrato de trabalho cessou em 25-06-2023, data em que se reformou, sendo que nessa altura auferia de retribuição mensal a quantia de € 760,00, mas que, intui-se, entende que deveria auferir € 833,00.
Acrescentou que ao longo da relação laboral, e aquando da sua cessação, não lhe foram pagas as contrapartidas devidas pelo trabalho que prestou, designadamente tendo em conta os instrumentos de regulamentação coletiva aplicáveis, pelo que concluiu serem-lhe devidas as seguintes quantias parcelares:
(i) € 1.293,05 de créditos por falta de formação profissional;
(ii) € 12.839,21 a título de diuturnidades até 2017;
(iii) € 1.286,61 a título de diferenças salariais no período de 2017 a 2019;
(iv) € 1.544,00 a título de diuturnidades referentes aos anos de 2022 e 2023;
(v) € 872,94 de diferença nos montantes pagos decorrentes da cessação do contrato de trabalho;
(vi) € 195,36 por trabalho suplementar prestado em 2022;
(vii) € 142,98 por trabalho suplementar prestado em 2023.
Tendo-se procedido à audiência de partes, e não se tendo logrado obter o acordo das mesma, contestou a Ré, negando, desde logo, que as portarias de extensão convocadas pela autora na petição inicial sejam aplicáveis ao caso, uma vez que a ré não é uma IPSS, sendo, ao invés, aplicável o acordo Coletivo entre a Santa Casa da Misericórdia Local 2 e outra e a Federação Nacional dos Sindicatos dos Trabalhadores em Funções Publicas e Sociais (publicado no BTE n.º 38, de 15-10-2016).
Mais negou serem devidas à autora as quantias por ela peticionadas por crédito de horas para formação, para além dos três anos anteriores à cessação do contrato de trabalho e, quanto ao restante, não serem devidas as quantias peticionadas, assim concluindo pela improcedência da ação.
No prosseguimento dos autos, e no que ora releva, procedeu-se a audiência de julgamento e em 21-03-2024 foi proferida sentença, que julgou a ação parcialmente procedente, e, em consequência, condenou a ré a pagar à autora: «1. A título de diuturnidade vencidas até 31.05.2023, a quantia de 17.063,10€, acrescida de juros de mora, à taxa legalmente prevista para obrigações civis, vencidos desde o vencimento de cada diuturnidade, e vincendos até integral pagamento; 2. A título de créditos de formação vencidos nos anos de 2007, 2008, 2019 a 2023, a quantia de 1.105,95€, acrescida de juros de mora, à taxa legalmente prevista para obrigações civis, vencidos desde 24.06.2023, e vincendos até integral pagamento; 3. Um crédito de formação de 20 horas em 2004, um crédito de formação de 20 horas em 2005 e um crédito de formação de 35 horas em 2006, acrescida de juros de mora, à taxa legalmente prevista para obrigações civis, vencidos desde 24.06.2023, e vincendos até integral pagamento, a liquidar posteriormente; 4. A quantia de 575,76€ a título de renumeração de trabalho suplementar prestado nos anos de 2022 e 2023, acrescida de juros de mora, à taxa legalmente prevista para obrigações civis, vencidos desde o vencimento de cada prestação, e vincendos até integral pagamento e 5. O montante de 739,39€ a título de remanescente da retribuição devida no mês de junho de 2023 e créditos salariais vencidos com a cessação do contrato, acrescida juros de mora à taxa supletiva legal, vencidos desde 24.06.2023 e vincendos até integral pagamento».
Inconformada com o assim decidido, a ré interpôs recurso para este tribunal, tendo nas alegações apresentadas formulado as conclusões que se transcrevem: «1 - O presente recurso vem interposto da douta sentença proferida nos autos que condenou a Recorrente a pagar à Recorrida, trabalho suplementar, diuturnidades, créditos de formação e créditos salariais e juros. 2 - Diz-se, na douta sentença recorrida a págs. 10 que “Por outro lado, não resultou provado que a Ré tivesse aderido ao (…) Acordo coletivo entre a Santa Casa da Misericórdia Local 2 e outras e a Federação Nacional dos Sindicatos dos Trabalhadores em Funções Públicas e Sociais e outros em 29 de agosto de 2017, publicado no Boletim do Trabalho e Emprego, n.º 32 de 29/8/2017, pelo que não lhe é o mesmo aplicável, pelo que não tem repercussão nos vencimentos dos anos de 2017 a 2019. Refira-se que a Portaria de extensão do contrato coletivo entre a União das Misericórdias Portuguesas– UMP e a FNE - Federação Nacional da Educação e outros, cfr. BTE n.º 21 de 8 de Junho de 2023, não é aplicável às relações laborais pois não resulta alegado ou provado que a ré seja filiada na União das Misericórdias Portuguesa, conforme previsto no art. 1.º do referido diploma. 3 - Na contestação da Recorrente no artigo 29, consta. expressamente que: A Ré é associada da União Misericórdias e a A. não é sindicalizada, e estes factos não constam do elenco dos factos provados nem não provados. 4 - Resulta do Compromisso da Recorrente, junto aos autos com a sua contestação, mormente do disposto no artigo 2º nº 5 que a Recorrente é membro da União das Misericórdias Portuguesas com todos os direitos inerentes a essa condição. 5 - Assim, deverá ser alterada a matéria de facto e ser dado como provado que a Recorrente é membro da União das Misericórdias Portuguesas. 6 - Diz-se, ainda, “que não resultou provado que a ré tivesse aderido ao Adesão da Ré ao Acordo coletivo entre a Santa Casa da Misericórdia Local 2 e outras e a Federação Nacional dos Sindicatos dos Trabalhadores em Funções Públicas e Sociais e outros em 29 de agosto de 2017, publicado no Boletim do Trabalho e Emprego, n.º 32 de 29/8/2017, pelo que não lhe é o mesmo aplicável.” 7 - Tal facto, a Adesão da Ré ao Acordo coletivo entre a Santa Casa da Misericórdia Local 2 e outras e a Federação Nacional dos Sindicatos dos Trabalhadores em Funções Públicas e Sociais e outros em 29 de agosto de 2017, resulta provado por constar de ato publicado no Boletim do Trabalho e Emprego, n.º 32 de 29/8/2017. 8 - Este acordo de adesão foi assinado pelo senhor Dr. BB, presidente do Secretariado Nacional da União das Misericórdias Portuguesas, mandatário com poderes para o ato, em representação da Recorrente. 9 - Pelo que deverá ser alterada a matéria de facto e ser dado como provado que a Recorrente em 20 de Julho de 2017 aderiu ao Acordo Coletivo Santa Casa da Misericórdia Local 2 e outras e as associações sindicais, publicado publicada no Boletim do Trabalho e Emprego, n.º 38, de 15 de outubro de 2016. 10 - Os factos não provados na sentença sobre o número V, e seguintes, resultam provados através dos documentos juntos aos autos em audiência, recibos de vencimento e mapas de horário de trabalho. 11 - A Recorrente juntou os documentos em audiência e os mesmos foram admitidos e não pode ser, a parte, “sancionada” com a desvalorização dessa prova, por a lei processual civil não o admitir. 12 - A não junção de um documento, que não a junção tardia, apenas pode ter por efeito a inversão do ónus da prova nada mais e, ainda assim, com determinados requisitos. 13 - A prova dos factos cuja alteração se requer resulta de documentos juntos aos autos ou publicados no DRE e/ou no BTE, sendo os factos resultam provados através de documentos junto aos autos, pelo dever-se-á, nos termos do disposto nos 639.º, n.º 1 e 640.º, nºs 1 e 2 e 662º nº 1 Código de Processo Civil, alterar-se a matéria de facto. 14 - Na douta sentença recorrida aplicou-se à relação laboral entre a Recorrente e a Recorrida no que tange à obrigatoriedade de pagar diuturnidade, as portarias de regulamentação do trabalho publicada nos idos de 1985 e 1996, assim como as convenções coletivas em que foi outorgante a Confederação Nacional da Instituições de Solidariedade Social. 15 - As Irmandades da Misericórdia ou Santas Casas da Misericórdia são associações reconhecidas na ordem jurídica canónica, com o objetivo de satisfazer carências sociais e de praticar atos de culto católico, de harmonia com o seu espírito tradicional, informado pelos princípios de doutrina e moral cristãs. (Artigo 68 do Decreto-Lei n.º 172-A/2014). 16 - As Misericórdias são instituições canónicas que se regem por normas próprias e cuja natureza jurídica é distinta das IPSS mas cujo estatuto na ordem civil é equiparado a uma instituição particular de solidariedade social. 17 - A Recorrente tem os fins estabelecidos no seu Compromisso e também se dedica a assistência social a idosos a através de um lar residencial que gira sob o nome de Lar 1. 18 - A Recorrente é membro da União das Misericórdias Portuguesa, não é nem nunca foi, membro da Confederação Nacional da Instituições de Solidariedade Social 19 - Os créditos de formação a serem devidos, apenas se reporta aos últimos três anos de vigência do contrato de trabalho nos termos do disposto no artigo 132º do Código do Trabalho e não ao abrigo de uma noma revogada como a do artigo 169.º do Regulamento do Código do Trabalho de 2003, aprovado pela Lei n.º 35/2004, de 29 de Julho. pela Lei nº 7/2009, de 12 de Fevereiro que aprovou o Código do Trabalho e que estabelece a caducidade do direito a créditos de formação. 20- A caducidade deste direito aplica-se mesmo a créditos vencidos e não reclamados, na vigência de lei revogada, por efeito do disposto no artigo 299 do Código Civil. 21- Acresce que “ resulta inequívoco, da redação conjugada dos ns.º 3, 4 e 5 do art.º 125.º do CT de 2003, com o art.º 169.º do Regulamento ao Código do Trabalho – Lei n.º 35/2004 de 29/07, que o crédito por horas de formação certificada, não proporcionada pelo empregador por motivo que lhe seja imputável, apenas são acumuláveis ao longo de 3 anos no máximo, a receber como retribuição, aquando da cessação do contrato.” In Acórdão da Relação de Guimarães, de 10/18/2018 consultável em https://www.dgsi.pt/jtrg.nsf/86c25a698e4e7cb7802579ec004d3832/32e0b2ed802a4d74802583530033b039. 22- Não são devidos à Recorrida os créditos de formação anteriores a 2020, pois que o crédito de horas de formação de há mais de três anos, além de prescrito, caducou o direito de o peticionar. 23 - Seria abuso de direito, a Recorrida receber credito horas de formação de há 20 anos, com o valor de remuneração horária que lhe era paga à data da cessação do contrato. 24 - As diuturnidades são um valor devido ao trabalhador, em caso de permanência numa categoria profissional, sem promoção, durante um determinado número de anos, e que são devidas apenas, se previstas em convenção coletiva não constituindo um direito estabelecido no Código do Trabalho. 25 - Entendeu-se na douta sentença que a Recorrida tinha direito a receber diuturnidades partir de “outubro de 1994, (inclusive) a autora passou a ter direito ao pagamento de uma diuturnidade, que até dezembro de 1996 foi de 1.100$00 (5,49€), e a partir de janeiro de 1996 (cfr. art. 26.º, n.º 2 da Portaria de Regulamentação de Trabalho publicada no BTE de 22 de abril de 1996, quanto à respetiva entrada em vigor) até setembro 1999 foi de 2.700$00 (13,47€). Tem assim direito a autora ao pagamento da quantia total de 799,26€ (5,49€ x 18meses (incluindo o subsídio de natal de 1994 e de 1995 e o subsídio de férias de 1995) + 13,47€ x 52 meses (contabilizado subsídios de férias e de natal.” 26 - Contudo esta portaria apenas previa o pagamento de diuturnidade a trabalhadores das IPSS e não incluía os trabalhadores das Misericórdias. 27 - As Portarias de extensão referidas não se aplicavam às Irmandades das Misericórdias mas apenas às IPSS filiadas na UIPSS( União das Instituições Particulares de Solidariedade Social). 28 - Por outro lado cabe referir que a Recorrida não é sindicalizada e a Recorrente é associada da União das Misericórdias Portuguesas e Segundo o principio da dupla filiação, um acordo negocial coletivo só produz efeitos entre as partes contratantes (ou por estas representadas, em associações de empregadores e/ou sindicais), ou que nelas se venham a filiar. 29 - A Santa Casa da Misericórdia Local 2 e outras e a FNE — Federação Nacional dos Sindicatos da Educação e outros, publicado no Boletim do Trabalho e Emprego, n.º 47, de 22 de Dezembro de 2001, celebraram um Acordo Coletivo de Trabalho que na sua cláusula 58 abolia todas e quaisquer diuturnidades , esta convenção foi alterada e as respetivas alterações, publicadas no Boletim do Trabalho e Emprego, n.º 3, de 22 de Janeiro de 2010. 30 - Pela portaria 278/2010 de 24 de Maio, portaria de extensão publicada no Diário da República 1.ª série — N.º 100 — 24 de Maio de 2010, estes instrumentos de regulamentação coletiva passaram a aplicar-se, com efeitos retroativos, no território do continente: a) Às relações de trabalho entre Santas Casas da Misericórdia não outorgantes que prossigam as atividades reguladas pela convenção e trabalhadores ao seu serviço, das profissões e categorias profissionais neles previstas; b) Às relações de trabalho entre Santas Casas da Misericórdia outorgantes que prossigam as atividades nela reguladas e trabalhadores ao seu serviço, das referidas profissões e categorias profissionais, não representados pelas associações sindicais outorgantes. - À relação laboral entre a Recorrente e a Recorrida não aplicavam quaisquer diuturnidades. 32 - Em Lisboa a 20 de julho de 2017 a Recorrente celebrou acordo de adesão à convenção coletiva em vigor entre a Santa Casa da Misericórdia Local 2 e outras e a Federação Nacional dos Sindicatos dos Trabalhadores em Funções Públicas e Sociais - FNSTFPS e outros, publicada no Boletim do Trabalho e Emprego, n.º 38, de 15 de outubro de 2016. 33 - Neste instrumento de regulamentação coletiva foi reafirmada a revogação das diuturnidades aplicáveis aos trabalhadores abrangidos pela convenção, e acordado que os mesmos perdiam o direito as diuturnidades vencidas e o valor das mesmas foi incluído nos montante das remunerações mínimas no vencimento base/escalão correspondente à sua antiguidade (clausula 72º do ACT da Misericórdia de Local 2 publicada no BTE nº 38 de 15/10/2016). 34 - O que significa não só que deixaram de ser exigíveis as diuturnidades vencidas e não pagas como o valor destas foi incluído na remuneração constante da tabela anexa ao CCT. 35 - Pelo que, além de não serem devidas à data quaisquer diuturnidades, como não existia à face do disposto no ACT da Misericórdia de Local 2 publicada no BTE nº 38 de 15/10/2016 qualquer obrigação de adicionar à remuneração dos trabalhadores das Santas Casas da Misericórdia as diuturnidades. 36 - Pelo que ao declarar-se na douta sentença recorrida o direito da Recorrente as diuturnidades, violou-se por erro de interpretação e aplicação as normas da contratação coletiva aplicável à relação laboral entre Recorrente e Recorrida e supra identificadas. 37 - O dito ACT continuou em vigor até que foi substituído pelo Contrato Coletivo entre a União das Misericórdias Portuguesas - UMP e a FNE - Federação Nacional da Educação e outros publicado no BTE de 14 de abril de 2023 que mais uma vez declara a abolição das diuturnidades que foi objeto de portaria de extensão publicada no Boletim do Trabalho e Emprego 21, de 8 junho 2023. 38 - Não sendo devidas diuturnidades à Recorrida, como não são, também não são devidos quaisquer valores acrescidos nas remunerações pagas à Recorrida aquando da cessação do contrato de trabalho, não sendo devido à Recorrida qualquer valor adicional, como erradamente foi decidido na douta sentença recorrida. 39 - Acresce que, de acordo com a o artigo 48º do Acordo de Local 2, o trabalho em dia feriado de trabalhador que, sendo indispensável para a continuidade do serviço, presta trabalho normal em dia feriado em equipamento não obrigado a suspender o funcionamento nesse dia tem direito a ser remunerado de acordo com as normas legais em vigor a cada momento não sendo considerado como suplementar o trabalho prestado nas condições referidas no número anterior. 40 - A Recorrente prestava serviço na lavandaria do Lar da Santa Casa que não fecha e que precisa ter os utentes cuidados todos dias. 41 - Pelo tendo recebido a sua remuneração e tendo tido um descanso compensatório, não tem a Recorrida direito a qualquer remuneração acrescida pelo trabalho prestado em dia feriado. 42 - Pelo que não são devidas à Recorrida as quantias fixadas na douta sentença recorrida a titulo de diuturnidade e juros, a titulo de créditos de formação ou trabalho suplementar e créditos salariais. 43 - Termos em que deve ser julgado procedente o presente recurso e em consequência revogar-se a douta sentença Recorrida, julgando-se a ação improcedente e absolver-se a Recorrida do pedido».
Contra-alegou a recorrida, a pugnar pela improcedência do recurso, assim concluindo: «1. O Tribunal a quo bem conclui ao decidir pela procedência da Acção. Pois, 2. Face à factualidade provada em juízo e ao Direito aplicável, a procedência da acção nos termos da decisão recorrida é a decisão adequada para o caso sub judice. 3. Os diversos instrumentos de regulamentação colectiva aplicáveis à relação de trabalho da Recorrente e Recorrida são aplicáveis por força do alargamento do âmbito de aplicação dessas Convenções por meio de Portarias de Extensão. 4. A aplicação aos Autos dos Instrumentos de Regulação Colectiva extravasa o âmbito pessoal das Convenções no momento da sua subscrição, tendo o seu efeito alargado por via das respectivas Portarias de Extensão. 5. Durante todos os anos ao serviço da Recorrente, nunca foram pagas quaisquer diuturnidades, nem os acréscimos salariais a que a Recorrida tinha direito, por força da aplicação das Portarias de Extensão à respectiva relação de trabalho. 6. A Recorrente violou durante o processo o princípio da concentração da defesa e bem assim protelou e não juntou documentos que o douto Tribunal havia ordenado juntar, sem qualquer fundamento ou justificação plausível para tal. 7. A Recorrente é uma Misericórdia e cumulativamente uma Instituição Particular de Solidariedade Social, tal como decorre da prova documental e testemunhal produzida nos Autos. 8. Em todos os anos ao serviço da Recorrente, nunca a Recorrida beneficiou de qualquer acção de formação, pelo que, em consequência, são-lhe devidos os respectivos créditos, como doutamente decidiu o Tribunal a quo. 9. Os créditos de formação já vencidos antes da entrada em vigor do Código do Trabalho de 2009, mantêm-se em dívida e não caducaram, devendo ser pagos os vencidos anteriores a 2009, e os posteriores não caducados, conforme determinado na sentença recorrida. 10. Bem concluiu o douto Tribunal ao considerar devidas à Recorrida as diuturnidades em cujo pagamento a Recorrente foi condenada, desde logo porque as mesmas decorrem da Contratação Colectiva aplicável à relação de trabalho das partes, mas também, porque o argumento usado quanto à sua abolição não deve ter vencimento. 11. Pois, sendo os IRCT que instituem as diuturnidades anteriores àqueles que preveem a sua abolição e integração, e estando em dívida já montantes referentes a tais direitos inalienáveis da trabalhadora, não poderão os mesmos beneficiar de qualquer presunção de integração no vencimento base, como a Recorrente quis fazer crer. 12. Pelo que deverão ser pagas à Recorrida, não só as diuturnidades, como os acréscimos salariais de que não beneficiou ao longo dos anos que trabalhou para a Recorrente. 13. No que concerne ao trabalho suplementar, não se poderá confundir o eventual gozo do descanso compensatório, com o pagamento efectivo do acréscimo devido por ser prestado trabalho em dia feriado. 14. Logo, pese embora o argumento de que o funcionamento da Recorrente nunca seria interrompido em domingos feriados ou outros dias festivos, tal não faz desaparecer o direito dos trabalhadores ao descanso compensatório cumulado com o acréscimo do pagamento por essa prestação de trabalho. 15. Tendo resultado provado à saciedade o não pagamento do legal acréscimo por banda da Recorrente, deverá concluir-se como na sentença recorrida condenando a mesma no pagamento desses valores à A. 16. Bem andou o Tribunal recorrido, devendo ser negado provimento ao recurso apresentado e mantendo-se na íntegra a decisão recorrida».
Admitido o recurso na 1.ª instância – como de apelação, com subida imediata, mas nada se referindo, ao menos expressamente, quanto ao efeito do recurso.
Ora, considerando que a recorrente prestou caução, o recurso tem efeito suspensivo, como, de resto, se consignou no despacho liminar proferido pelo relator.
Neste tribunal, a exma. senhora procuradora-geral adjunta emitiu douto parecer, que não foi objeto de resposta, no qual se pronunciou pela improcedência do recurso.
Entretanto, as partes foram notificadas para se pronunciarem/esclarecerem sobre a última retribuição que entendem que a autora/recorrida devia auferir.
Elaborado projeto de acórdão, colhidos os vistos legais e realizada a conferência, cumpre apreciar e decidir.
II – Objeto do recurso
Tendo em conta que o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das respetivas alegações (cfr. artigo 635.º, n.º 4 e artigo 639.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil, aplicável ex vi do artigo 87.º, n.º 1, ambos do Código de Processo do Trabalho), salvo as questões de conhecimento oficioso, que aqui não se colocam, são as seguintes as questões essenciais a decidir:
1. da impugnação da matéria de facto;
2. do(s) instrumento(s) de regulamentação coletiva aplicável(eis) ao caso em apreço;
3. das quantias fixadas a título de diuturnidades, créditos por formação contínua não ministrada, trabalho suplementar e créditos salariais decorrentes da cessação do contrato de trabalho.
III – Factos
A) A sentença recorrida deu como provada a seguinte factualidade:
1. A ré é uma misericórdia e dedica-se à atividade de assistência social a idosos, nomeadamente no seu Lar 1 (este facto é alterado infra).
2. Constando do respetivo compromisso, além do mais: “Art. 1.º (Denominação, fim e natureza jurídica)
(…) 3 – A Santa Casa da Misericórdia tem, também, reconhecida a sua personalidade jurídica civil, com estatuto de Instituição Particular de Solidariedade Social, pelo que é considerada uma entidade da economia social, nos termos da respetiva Lei de Bases, e natureza de Pessoa Coletiva de Utilidade Pública, com o NIF ...20”.
3. A autora foi admitida ao serviço da ré em 28.09.1989, com a categoria de “Ajudante de Lar”, para exercer as funções na lavandaria do Lar 1.
4. Em data não concretamente apurada, mas há mais de 29 anos, a autora passou a desempenhar funções na lavandaria.
5. Situação que se manteve até 25.06.2023, data em que se reformou, tendo a ré procedido ao pagamento das seguintes quantias:
- 633€, a título de vencimento;
- 76,32€, referentes a 16 dias de subsídio de alimentação;
- 28,33€, a título de subsídio de antiguidade;
- 70,80€, referentes a dois feriados;
- 760€, a título de férias vencidas em 01.01.2023 e não gozadas;
- 760€, a título de subsídio de férias vencidas em 01.01.2023;
- 380€, referentes a proporcionais de subsídio de férias e
- 380€, referentes a proporcionais de subsídio de natal.
6. Em 25.06.2023, auferia a retribuição mensal base de 760€ e subsídio de antiguidade no valor de 33€.
7. Em 2017 a retribuição base da autora ascendia a 557€.
8. Em 2018 a retribuição base da autora ascendia a 580€.
9. Em 2019 a retribuição base da autora ascendia a 600€.
10. A partir do mês de janeiro de 2021 a autora auferiu retribuição mensal base de 705€ e subsídio de antiguidade no valor de 33€.
11. Durante o período de execução do contrato de trabalho a ré não prestou formação à autora.
12. No ano de 2022 a autora trabalhou nos dias 10 de junho, 16 de junho, 15 de agosto, 5 de outubro, 1 e 8 de dezembro.
13. No ano de 2023 a autora trabalhou nos dias 2 de fevereiro, 7 e 25 de abril e 1 de maio.
14. Em 2007 a retribuição base da autora ascendia a 509,33€.
15. Em 2008 a retribuição base da autora ascendia a 519,52€.
B) A 1.ª instância deu como não provada a seguinte factualidade:
I. A ré aderiu ao Acordo coletivo entre a Santa Casa da Misericórdia e outras e a FNE- FNE- Federação Nacional de Sindicatos da Educação e outros, publicada no BTE, 1ª série, nº 47, de 22-12-2001.
II. A ré aderiu ao Acordo coletivo entre a Santa Casa da Misericórdia Local 2 e outras e a FNE — Federação Nacional dos Sindicatos da Educação e outros — Alterações salariais e outras publicada no BTE, nº 3, de 22-10-2010.
III. A ré aderiu ao Acordo coletivo entre a Santa Casa da Misericórdia Local 2 e outras e a Federação Nacional dos Sindicatos dos Trabalhadores em Funções Públicas e Sociais e outro publicado no BTE nº 38 de 15 de outubro de 2016 (este facto é eliminado infra).
IV. A ré aderiu ao Acordo coletivo entre a Santa Casa da Misericórdia Local 2 e outras e a Federação Nacional dos Sindicatos dos Trabalhadores em Funções Públicas e Sociais e outros em 29 de agosto de 2017, publicado no Boletim do Trabalho e Emprego, n.º 32 de 29/8/2017 (este facto é eliminado infra).
V. A autora procedeu ao pagamento dos dias 10 e 16 de junho de 2022.
VI. A autora procedeu ao pagamento do dia 15 de agosto de 2022.
VII. A autora procedeu ao pagamento do dia 5 de outubro de 2022.
VIII. A autora procedeu ao pagamento dos dias 1 e 8 de dezembro de 2022
IX. A autora procedeu ao pagamento do dia 2 de fevereiro de 2023
X. A autora procedeu ao pagamento dos dias 7 e 25 de abril de 2023
XI. A autora procedeu ao pagamento do dia 1 de maio de 2023
IV – Fundamentação
Delimitadas supra, sob o n.º II, as questões essenciais a decidir, é o momento de analisar e decidir, de per se, cada uma delas.
1. Da impugnação da matéria de facto
1.1. Importa antes de mais ter presente que, como estabelece o artigo 640.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente especificar, sob pela de rejeição, os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados [alínea a)], os concretos meios probatórios constates do processo que impunham decisão diversa sobre a matéria impugnada [alínea b)], e a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre os factos impugnados [alínea c)].
1.2. Analisemos os factos impugnados pela recorrente
1.2.1. Desde logo sustenta que alegou no artigo 29.º da contestação que “A Ré é associada da União Misericórdias e a A. não é sindicalizada”, que do documento que juntou, “Compromisso da Santa Casa da Misericórdia que de Local 1”, consta no seu artigo 2.º, n.º 5 que a ré é membro da União das Misericórdias Portuguesas, “com todos os direitos e deveres inerentes a tal condição”.
Além disso, acrescentou, a recorridanão fez prova de ser sindicalizada, pelo que deverá dar-se como provado que não é sindicalizada.
Vejamos.
Efetivamente, do documento referido consta que “[a] Santa Casa da Misericórdia [de Local 1] é membro da União das Misericórdias Portuguesas, com todos os direitos e deveres inerentes a tal condição».
Não se localiza que tal matéria tenha sido impugnada pela autora: o que esta sustenta é que, para além da ré ser membro da União das Misericórdias é também IPSS.
O n.º 1 da matéria de facto já contém a referência de a ré ser uma misericórdia.
Contudo, de forma a precisar tal factualidade, altera-se o referido n.º 1: e como do mesmo constam dois factos distintos, passarão a consignar-se esses factos separadamente, sob os n.º 1 e n.º 1-A.
Assim, o facto n.º 1 passará a ter a seguinte redação: «1. De acordo com o artigo 2.º, n.º 5 do “Compromisso da Santa Casa da Misericórdia de Local 1”, esta é membro da União das Misericórdias Portuguesas, “com todos os direitos e deveres inerentes a tal condição”». 1-A. A ré dedica-se à atividade de assistência social a idosos, nomeadamente no seu Lar 1».
Já quanto à indicação na matéria de facto de que a autora não é sindicalizada, tendo em conta que o relevante, nesta sede, seria provar que a autora era sindicalizada – o que de acordo com o ónus da prova não fez –, entende-se nada haver a acrescentar; ou seja, de acordo com as regras processuais, o facto a constar seria, caso se provasse, pela positiva: porém, não se provando, não se apresenta conforme à melhor técnica jurídica fazê-lo constar pela negativa.
Naturalmente que não resultando da matéria de facto que a autora era sindicalizada, isso poderá relevar em sede de subsunção jurídica, mas aí é já matéria de direito e não de facto.
1.2.2. No n.º III. dos factos não provados consta que (não se provou) que “A ré aderiu ao Acordo coletivo entre a Santa Casa da Misericórdia Local 2 e outras e a Federação Nacional dos Sindicatos dos Trabalhadores em Funções Públicas e Sociais e outro publicado no BTE nº 38 de 15 de outubro de 2016”.
E no n.º IV dos factos não provados consta que (não se provou) que «A ré aderiu ao Acordo coletivo entre a Santa Casa da Misericórdia Local 2 e outras e a Federação Nacional dos Sindicatos dos Trabalhadores em Funções Públicas e Sociais e outros em 29 de agosto de 2017, publicado no Boletim do Trabalho e Emprego, n.º 32 de 29/8/2017».
A recorrente pretende que seja dado como provado que «em 20 de Julho de 2017 aderiu ao Acordo Coletivo Santa Casa da Misericórdia Local 2 e outras e as mesmas associações sindicais publicado publicada no Boletim do Trabalho e Emprego, n.º 38, de 15 de outubro de 2016».
Efetivamente, foi outorgado um acordo coletivo de trabalho entre a Santa Casa da Misericórdia Local 2 e outras e a Federação Nacional dos Sindicatos dos Trabalhadores em Funções Públicas e Sociais e outros, publicado no Boletim de Trabalho e Emprego (BTE) n.º 38, de 15-10-2016.
E a Santa Casa da Misericórdia Local 1, entre outras, veio a aderir a tal acordo, conforme publicação no BTE n.º 32, de 29-08-2017.
Com efeito, consta do ponto 1 desse acordo de adesão, «[a]o abrigo do artigo 504.º do Código do Trabalho revisto é celebrado o presente acordo de adesão à convenção coletiva em vigor entre a Santa Casa da Misericórdia Local 2 e outras e a Federação Nacional dos Sindicatos dos Trabalhadores em Funções Públicas e Sociais - FNSTFPS e outros, publicada no Boletim do Trabalho e Emprego, n.º 38, de 15 de outubro de 2016».
E no referido acordo de adesão consta expressamente como interveniente no acordo a aqui recorrente, sendo o mesmo assinado, entre outros, pelo “presidente do Secretariado Nacional da União das Misericórdias Portugueses, mandatário com poderes para o ato”.
Por isso, afigura-se que só por manifesto lapso o tribunal recorrido deu como “não provado” os referidos n.ºs III. e IV.
Por consequência, eliminam-se os n.ºs III e IV. dos factos não provados, e acrescenta-se à matéria de facto provada um facto, sob o n.º 16, com o seguinte teor: «Conforme publicação no BTE n.º 32, de 29-08-2017, entre outras, a Santa Casa da Misericórdia Local 1 aderiu à convenção coletiva em vigor entre a Santa Casa da Misericórdia Local 2 e outras e a Federação Nacional dos Sindicatos dos Trabalhadores em Funções Públicas e Sociais – FNSTFPS e outros, publicado no Boletim do Trabalho e Emprego, n.º 38, de 15 de outubro de 2016».
1.2.3. Sustenta também a recorrente que devem ser eliminados os factos não provados sob os n.ºs V. a XI., tendo em conta que resultam provados através dos documentos – recibos de vencimento e mapas de horário de trabalho – juntos aos autos em audiência.
Não se anui a tal entendimento.
Estão em causa documentos emitidos pela aqui recorrente, que não se mostram assinados pela recorrida, pelo que, tratando-se de documentos particulares, apenas certificam a declaração, mas não a veracidade do seu conteúdo (cfr. artigo 376.º do Código Civil).
Além disso, e mais relevante – como também se assinalou na motivação da resposta da 1.ª instância a esses factos não provados – não extraímos dos documentos, maxime dos recibos de vencimento, que tenha sido pago o trabalho prestado cujo pagamento é concretamente peticionado: em observância a alguma certeza e segurança, não se lobriga que este tribunal possa dar como provados os factos em causa com base apenas em tais documentos, sem concretização quanto aos dias a que se referem os pagamentos neles mencionados, pelo que, no dizer do artigo 640.º, n.º 1, alínea b) do Código de Processo Civil, a prova produzida “não impõe” uma resposta diferente a esta matéria de facto impugnada.
1.2.4. Assim, em conclusão quanto à matéria de facto:
(i) o facto n.º 1. é alterado, passando a constar sob os n.ºs 1. e 1-A. com o conteúdo referido;
(ii) são eliminados os n.ºs III. e IV. dos factos não provados, adiantando-se à matéria de facto provada o n.º 16, com o conteúdo referido;
(iii) mantém-se o n.º V. e seguintes dos factos não provados.
2. Dos instrumentos de regulamentação coletiva aplicáveis ao caso
A 1.ª instância considerou – no que merece o aplauso da recorrida, bem como da exma. procuradora-geral adjunta – que ao caso são aplicáveis as Portarias de Regulamentação publicada no BTE n.º 31, de 22 de agosto de 1985 e no BTE n.º 15, de 22 de abril de 1996, n.º 15.
Mais considerou que a partir de 01-01-2022, por força da portaria de extensão n.º 259/2022, de 27-10, retificada pela portaria de extensão n.º 270/2022, de 09-11, passou a ser aplicável o Contrato Coletivo de Trabalho entre a Confederação Nacional das Instituições de Solidariedade – CNIS e a FEPCES – Federação Portuguesa dos Sindicatos do Comércio, Escritórios e Serviços e outros publicada no BTE n.º 41, de 8 de novembro de 2019.
Diversamente, no entendimento da recorrente, sendo membro da União das Misericórdias Portuguesas e nunca tendo sido membro da Confederação Nacional das Instituições de Solidariedade Social, não lhe podem ser aplicáveis instrumentos de regulamentação coletiva que se destinem ou visem estas.
Analisemos.
Antes de mais, face à matéria de facto fixada, maxime sob o n.º 1, tem-se por incontroverso que a recorrente é membro da União das Misericórdias Portuguesas.
Mas face à mesma matéria de facto, agora concretamente o seu n.º 2, a recorrente tem também o estatuto de IPSS – Instituição Particular de Solidariedade Social.
Por sua vez, não resulta da matéria de facto que a recorrida seja sócia de qualquer sindicato.
Será balizados por este quadro fáctico que temos que nos mover em sede de aplicação ou não de qualquer instrumento de regulamentação coletiva.
Numa aproximação à resolução do caso concreto, importa também fazer uma referência genérica, necessariamente breve, quanto a regras e princípios em matéria de aplicação de instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho.
Assim, como decorre do artigo 496.º do Código do Trabalho atual – anteriormente artigos 552.º, 553.º e 554.º, n.º 1 do Código do Trabalho de 2003, e, ainda anteriormente, artigos 7.º e 8.º do Decreto-Lei n.º 519-C1/79, de 29 de dezembro –, tendo em conta o princípio da dupla filiação, a convenção coletiva obriga o empregador que a subscreve ou filiado em associação de empregadores celebrante, bem como os trabalhadores ao seu serviço que sejam membros da associação sindical celebrante.
Mas, por acordo entre a entidade interessada e aquela ou aquelas que se contraporiam na negociação da convenção, através de adesão, a associação sindical, associação de empregadores ou o empregador podem aderir a uma convenção coletiva em vigor – artigo 504.º do Código atual, artigo 563.º do Código do Trabalho 2003 e artigo 28.º do Decreto-Lei n.º 519-C1/79.
E através de ato administrativo e ponderando circunstâncias económicas e sociais que o justifiquem, a convenção coletiva pode se aplicada, no todo ou em parte, por portaria de extensão a empregadores e a trabalhadores integrados no âmbito do setor de atividade e profissional da convenção – artigo 514.º do Código do Trabalho atual, 573.º do Código do Trabalho de 2023 (aí denominado regulamento de extensão) e artigos 27.º e 29.º, do Decreto-Lei n.º 519-C1/79.
Mas pode também, na falta de instrumento de regulamentação coletiva de trabalho negocial e quando circunstâncias sociais e económicas o justifiquem, não exista associação sindical ou de empregadores nem seja possível a portaria de extensão, ser emitido um regulamento coletivo de trabalho não negocial, a portaria de condições do trabalho – artigo 517.º do Código do Trabalho atual, artigo 578.º do Código do Trabalho de 2003, onde era designado de regulamento de condições mínimas, e artigo 36.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 519-C1, de 29 de dezembro.
Como decorre do descrito, e foi acentuado no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 29-09-2021 (Proc. n.º 7814/18.3T8VNG.P1.S1), «[a]s portarias de condições do trabalho têm uma natureza residual prevalecendo relativamente a estas, as portarias de extensão e, relativamente a estas, os instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho negociais, como decorre do artigo 3.º, n. º 2 do Código do Trabalho».
E acrescentou-se: «[o] objetivo deste tipo de portarias é o de estabelecer a regulamentação laboral coletiva em áreas económicas ou setores de atividade vedados à contratação coletiva ou em situações em que podendo haver contratação coletiva, não há associações sindicais ou de empregadores».
É altura de regressarmos ao caso que nos ocupa.
O instrumento de regulamentação coletiva de trabalho mais antigo que a recorrente convoca e que, se bem se interpreta, entende ser aplicável ao caso, é o acordo coletivo de trabalho outorgado entre a Santa Casa da Misericórdia Local 2 e outras e a FNE – Federação Nacional dos Sindicatos de Educação e outros, publicado no BTE n.º 47, de 22 de dezembro de 2001.
Assim, afigura-se incontroverso que até essa data não existia qualquer instrumento de regulamentação coletiva de trabalho aplicável ao caso, seja por a recorrente não o ter celebrado, ser por adesão ou por portaria de extensão.
Porém, pergunta-se: e poderá ser aplicável portaria de condições de trabalho?
Recorde-se que a sentença recorrida entendeu serem aplicáveis as portarias de regulamentação do trabalho publicadas nos BTE n.º 31, de 22 de agosto de 1985, e BTE n.º 15, de 22 de abril de 1996, contra o que a recorrente se rebela.
A primeira, sob a epígrafe “PRT para os trabalhadores ao serviço das instituições particulares de solidariedade social”, determina na sua Base II que regula as relações de trabalho estabelecidas entre as instituições particulares de solidariedade social e os trabalhadores ao seu serviço.
E, no que ora releva, na Base XLIX, n.º 1, determina que os trabalhadores que estejam a prestar serviço com carácter de permanência e em regime de tempo completo têm direito a uma diuturnidade de 1.100$00 por cada 5 anos de serviço, até ao limite de 5 diuturnidades.
Entretanto, no BTE n.º 15, de 22-04-1996 foi publicado novo “PRT nas instituições particulares de solidariedade social”.
Sublinhe-se que no seu preâmbulo se escreveu, designadamente, continuar a verificar-se falta de enquadramento associativo patronal, o que tem justificado o recurso à regulamentação administrativa, tendo-se procedido a estudos preparatórios de revisão da portaria de 1985.
E a seguir explicitou-se: «Participaram nesses estudos assessores designados por várias associações sindicais e pela União das Instituições Particulares de Solidariedade Social e esteve presente ainda a União das Misericórdias Portuguesas, que, entretanto, encetara autonomamente um processo de negociação.
(…) Futuramente, logo que seja superada a falta de enquadramento associativo patronal, as condições de trabalho no sector poderão ser reguladas por convenção colectiva».
Ora, resultando da matéria de facto que a recorrente é uma IPSS, não pode deixar de concluir-se que as referidas PRT lhe eram aplicáveis; e essa conclusão sai ainda mais reforçada pela circunstância de, como resulta do citado preâmbulo, a própria União das Misericórdias Portuguesas ter participado nos estudos tendentes à revisão da portaria.
É certo que, como aí se diz, entretanto esta encetou autonomamente um processo de negociação: e de acordo com a alínea b) do n.º 2 do artigo 1.º são excluídas da portaria as misericórdias que, na data do seu início da vigência, sejam partes de processo negociais para a celebração de convenções coletivas de trabalho.
Todavia, nada se extrai dos autos no sentido de que a 27-04-1996 a aqui recorrente fosse “parte” em processo negocial para celebração de convenção coletiva de trabalho, pelo que as PRT em referência são aplicáveis à relação laboral em apreciação (no sentido também da aplicação das referidas PRT a uma outra Santa Casa da Misericórdia veja-se o acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 23-11-2023, proc. n.º 3672/22.1T8BRG.G1).
E de acordo com artigo 21.º, n.º 1, da PRT/96, o trabalhador tem direito a uma diuturnidade de 2.700$00 por cada cinco anos de serviço, até ao limite de cinco diuturnidades.
Assim, tendo a autora/recorrida sido admitida ao serviço da ré/recorrente em 28-09-1989, em 28-09-1994 adquiriu o direito a uma diuturnidade, no valor de 1.100$00, que a partir de janeiro de 1996 passou a ser de passou a ser de 2.700$00.
Posteriormente veio a ser publicado, no BTE n.º 47, de 22 de dezembro de 2001, o acordo coletivo de trabalho entre a Santa Casa da Misericórdia Local 2 e outras e a FNE – Federação Nacional dos Sindicatos da Educação e outros, que abolia “todas e quaisquer diuturnidades”, e que a recorrente convoca para os presentes autos.
Mas da leitura desse acordo coletivo não se retira que a recorrente dele tivesse sido subscritora ou associada em associação celebrante, assim como não sendo a recorrida membro de associação sindical celebrante, não pode o mesmo ser aplicável aos autos; ou seja, por não se verificar o requisito da dupla filiação não pode o acordo coletivo de trabalho em referência ser aqui diretamente aplicável.
Contudo, este veio a ser alterado em 2010, conforme BTE n.º 3, de 22 de janeiro de 2010.
E pela portaria de extensão n.º 278/10, de 17 de maio (publicada no DR., 1.ª série, n.º 100, de 24-05-2010), esse acordo passou a aplicar-se: «a) Às relações de trabalho entre santas casas da misericórdia não outorgantes que prossigam as actividades reguladas pela convenção e trabalhadores ao seu serviço, das profissões e categoriais profissionais neles previstas; b) Às relações de trabalho entre santas casas da misericórdia outorgantes que prossigam as actividades nela reguladas e trabalhadores ao seu serviço, das referidas profissões e categorias profissionais, não representadas pelas associações sindicais outorgante».
Atente-se que o n.º 2 do artigo 1.º expressamente exclui a aplicabilidade da portaria às relações de trabalho entre santas casas da misericórdia filiadas na CNIS – Confederação Nacional das Instituições de Solidariedade e trabalhadores ao seu serviço, bem como a trabalhadores filiados em sindicatos associados na FEPCES – Federação Portuguesa dos Sindicatos do Comércio, Escritório e Serviços.
Assim, a partir de 29-05-2010 (considerando que nos termos do artigo 2.º, n.º 1 da portaria, esta entrou em vigor no 5.º dia após a sua publicação no Diário da República), por força da referida portaria de extensão e tendo presente que, como resulta do já afirmado, esta prevalece sobre as PRT – ou, dito de outra forma, a portaria de condições de trabalho é subsidiária da portaria de extensão (cfr. artigo 517.º, n.º 1 do Código Trabalho) –, a relação de trabalho deixou de ser regulada pelo PRT/96 e passou a ser regulada pelo acordo coletivo de 2001, alterado em 2010.
Ora, nesse acordo de 2001 consta a cláusula 58.ª, que tem o seguinte teor:
«Diuturnidades
1 — Foram abolidas as diuturnidades de todos os trabalhadores abrangidos pela presente convenção. 2 — Os trabalhadores referidos no número anterior perdem o direito às diuturnidades já vencidas, tendo o respectivo valor sido incluído no vencimento base/escalão. (…).
Tal significa que a partir da referida data a autora/recorrida deixou de ter direito ao pagamento das referidas diuturnidades.
Prosseguindo temporalmente, verifica-se que, conforme publicação no BTE n.º 32, de 29-08-2017, a Santa Casa da Misericórdia Local 1, entre outras, aderiu à convenção coletiva em vigor entre a Santa Casa da Misericórdia Local 2 e outras e a Federação Nacional dos Sindicatos dos Trabalhadores em Funções Públicas e Sociais – FNSTFPS e outros, publicado no Boletim do Trabalho e Emprego, n.º 38, de 15 de outubro de 2016.
Nesta última convenção coletiva consta a cláusula 72.ª, com o seguinte teor, na parte relevante:
«Diuturnidades
1- Foram abolidas as diuturnidades de todos os trabalhadores abrangidos pela presente convenção coletiva, sem prejuízo do disposto no número 4. 2- Os trabalhadores referidos no número anterior perdem o direito às diuturnidades já vencidas, tendo o respetivo valor sido incluído no vencimento base/escalão correspondente à sua antiguidade na instituição.
(…)».
Ou seja, também nesta CCT a que a aqui recorrente aderiu se manteve a abolição de diuturnidades.
Face ao princípio da dupla filiação (artigo 496.º do Código do Trabalho), não sendo a autora filiada em qualquer associação sindical subscritora da convenção, poderia questionar-se se a CCT era aplicável à relação em apreço.
Todavia, como se extrai da petição inicial – artigos 21.º e 22 – é a própria autora que confessa/aceita ser-lhe aplicável.
Entretanto, por força da portaria de extensão n.º 259/2022, de 27-10, retificada pela portaria de extensão n.º 270/2022, de 9 de novembro, a partir de 01-01-2022, passou a ser aplicável à relação em apreço o CCT entre a Confederação Nacional das Instituições de Solidariedade – CNIS e a FEPCES – Federação Portuguesa dos Sindicatos do Comércio, Escritórios e outros (publicada no BTE n.º 41, de 8 de novembro de 2019), que na sua cláusula 70.ª previa o direito do trabalhador a uma diuturnidade de € 21,00 por cada cinco anos de serviço, até ao limite de cinco diuturnidades.
Aquela portaria de extensão estabelece no artigo 3.º, n.º 2, que a tabela salarial e as cláusulas de natureza pecuniária previstas na convenção produzem efeitos a partir de 1 de dezembro de 2021.
Contudo, essa PE foi retificada pela PE n.º 270/2022, de 9 de novembro, que no seu artigo 3.º, n.º 3, determina que «[o] disposto no número anterior não é aplicável às instituições particulares de solidariedade social filiadas na União das Misericórdias Portuguesas - UMP».
Esta PE (270/2022) – de acordo com o seu artigo 2.º – entrou em vigor no dia seguinte ao da sua publicação e produziu efeitos à data da entrada em vigor da portaria n.º 259/2022, de 27 de outubro, ou seja, a 1 de novembro de 2022 (artigo 3.º, n.º 1, desta portaria).
Ora, sendo a ré/recorrente filiada na União das Misericórdias Portuguesas (cfr. facto n.º 1), tal significa que as alterações das cláusulas de natureza pecuniária, rectius diuturnidades, não operam a partir de 1 de dezembro de 2021, mas sim a partir de 1 de novembro de 2022, data da entrada em vigor da PE n.º 259/2022.
Todavia, no BTE n.º 14, de 15-04-2023, foi publicado o contrato coletivo de trabalho entre a União das Misericórdias Portuguesas – UMP e a FNE – Federação Nacional da Educação e outros.
A cláusula 1.ª, n.º 3, é do seguinte teor: «A presente convenção coletiva revoga, no que às partes outorgantes respeita, o acordo coletivo de trabalho publicado no Boletim do Trabalho e Emprego, n.º 47, de 22 de dezembro de 2001, cujas atualizações salariais posteriores foram publicadas no Boletim do Trabalho e Emprego, n.º 3, de 22 de janeiro de 2010».
E com eventual relevância para o caso, na cláusula 72.ª, sob a epígrafe diuturnidades, consta: «1- Foram abolidas as diuturnidades de todos os trabalhadores abrangidos pela presente convenção coletiva, sem prejuízo do disposto no número 4. 2- Os trabalhadores referidos no número anterior perdem o direito às diuturnidades já vencidas, tendo o respetivo valor sido incluído no vencimento base/escalão correspondente à sua antiguidade na instituição.
(…)».
O referido CCT foi objeto de portaria de extensão, publicada no BTE n.º 21, de 8 de junho de 2023, cujo artigo 1.º, n.º 1 (aquele que aqui releva) estabelece: «As condições de trabalho constantes do contrato coletivo entre a União das Misericórdias Portuguesas - UMP e a FNE - Federação Nacional da Educação e outros, publicado no Boletim do Trabalho e Emprego, n.º 14, de 15 de abril de 2023, são estendidas no território do Continente às relações de trabalho entre as Santas Casas da Misericórdia filiadas na União das Misericórdias Portuguesas - UMP e trabalhadores ao seu serviço, das profissões e categorias profissionais previstas na convenção, não representados pelas associações sindicais outorgantes».
Daqui decorre que o contrato coletivo de trabalho entre a União das Misericórdias Portuguesas e a Federação Nacional de Educação e outros, publicado no BTE n.º 14, de 15 de abril de 2023, revogou o acordo coletivo de trabalho publicado no Boletim do Trabalho e Emprego, n.º 47, de 22 de dezembro de 2001, cujas atualizações salariais posteriores foram publicadas no Boletim do Trabalho e Emprego, n.º 3, de 22 de janeiro de 2010, tendo aquele contrato coletivo de trabalho sido objeto de portaria de extensão, publicada no BTE n.º 21, de 8 de junho de 2023.
E destes contratos/acordos coletivos consta a abolição das diuturnidades.
Assim, e em jeito de conclusão:
(i) à autora/recorrida são devidas diuturnidades, por força das PRT de 1985 e de 1996, até 29-05-2010, não sendo devidas diuturnidades a partir desta última data;
(ii) posteriormente, por força da PE n.º 279/22, retificada pela PE n.º 270/22, passaram novamente a ser-lhe devidas diuturnidades, com efeitos a 1 de novembro de 2022 e até 30 de abril de 2023, pois a partir desta data, por força da PE publicada no BTE n.º 21, de 8 de junho de 2023 (com as cláusulas de natureza pecuniária a produzirem efeitos a partir de 1 de maio de 2023 - artigo 2.º, n.º 2, da PE), foram abolidas as diuturnidades.
3. Dos créditos salariais 3.1. A título de diuturnidades
Sobre esta matéria, importa atentar que a autora pediu a condenação da ré no pagamento da quantia de € 16.542,76, a título de diuturnidades e acréscimos salariais, mas na sentença recorrida condenou-se a ré, só a título de diuturnidades, no pagamento da quantia de € 17.063,10.
Para tanto sustentou-se que «(…) não está o Tribunal adstrito ao princípio do pedido, na medida em que vigora em processo de trabalho a possibilidade de condenação extra vel ultra petitum – cfr. art. 74.º do CPT (…)».
Não se acompanha esse entendimento.
Expliquemos porquê.
Estipula o artigo 74.º, do Código de Processo do Trabalho, que o juiz deve condenar em quantidade superior ao pedido ou em objeto diverso dele quando isso resulte da aplicação à matéria provada, ou aos factos de que possa servir-se, nos termos do artigo 412.º, do Código de Processo Civil, de preceitos inderrogáveis de leis ou instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho.
Como resulta daquele preceito legal, para haver lugar à referida condenação é necessária a verificação cumulativa de dois pressupostos:
(i) que isso resulte da aplicação à matéria provada ou aos factos de que possa servir-se, mantendo-se, embora, a mesma causa de pedir;
(ii) que estejam em causa preceitos inderrogáveis de leis ou instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho.
Com a referida norma o legislador adotou uma orientação diferente da que vigora no direito processual civil, justificada, como escreve Leite Ferreira (Código de Processo do Trabalho Anotado, 4.ª Edição, Coimbra Editora, pág. 352; a anotação refere-se ao artigo 69.º do Código de Processo do Trabalho de 1981, que corresponde ao artigo 74.º do Código de Processo do Trabalho aqui aplicável), com a necessidade de «(…) protecção do trabalhador e a harmonia social dos factores de produção [que são] de interesse e ordem pública. Ao lado do interesse individual de determinado trabalhador na satisfação efectiva do seu direito, há ainda e também o interesse mais vasto, de natureza social, em que os direitos dos trabalhadores em geral obtenham, de facto, uma realização integral. Aquelas normas são, pois, imperativas e indisponíveis, e, como tais, não podem ser afastadas por livre determinação da vontade das partes».
Contudo, como se explicita no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 13-05-1998 (Revista n.º 53/98 – 4.ª Secção), o regime excecional do art.º 69, do CPT de 1981 (a que corresponde o artigo 74.º do atual Código de Processo do Trabalho), que impõe ao juiz o dever de condenar em quantia superior ao pedido ou em objeto diverso dele, só tem cabimento nos casos de direitos de existência e exercício necessários, como é o direito a indemnização por acidente de trabalho (neste sentido, veja-se também o acórdão do mesmo tribunal de 31-10-2007, Recurso n.º 2091/07, disponível em www.dgsi.pt).
Perante um direito de existência necessária (que não pode ser afastado no plano jurídico, mas sim no plano prático da vontade das partes), como é o caso, por exemplo, do pagamento de diferenças retributivas após a cessação do contrato de trabalho, ou férias, subsídio de férias e de Natal, diuturnidades ou subsídio de alimentação, não estando os mesmo contidos (parcial ou integralmente) nos pedidos, não se justifica a aplicação daquele preceito legal.
Como se escreveu no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 27-04-2005 (Recurso n.º 4565/01 – 4.ª Secção) a indisponibilidade dos direitos de natureza pecuniária emergentes do contrato de trabalho apenas se mantém durante a vigência do contrato, a fim de obstar a que o estado de subordinação jurídica e económica relativamente à entidade empregadora possa afetar o exercício desses direitos pelo trabalhador. Mas aquela indisponibilidade deixa de vigorar após a cessação do contrato de trabalho, pois cessando igualmente aquele estado de subordinação não há qualquer impedimento legal a que o trabalhador disponha livremente do seu direito às retribuições.
De resto, a jurisprudência, ao que se conhece uniforme, do Supremo Tribunal de Justiça tem sido nesse mesmo sentido, ou seja, de que a indisponibilidade dos direitos de natureza pecuniária emergentes do contrato de trabalho apenas existe durante a sua vigência pelo que, findo o contrato, pode o trabalhador renunciar (expressa ou tacitamente) a eles [vide, entre outros, os acórdãos de 18-06-2003 (Recurso n.º 836/03), de 03-03-2005 (Recurso n.º 3154/04, e o já referido acórdão de 31-10-2007), de 19-12-2018 (Proc. n.º 620/16.1T8LMG.C1.S1) e, mais recentemente, o acórdão de 12-04-2024 (Proc. n.º 13358/20.6T8LSB.L1.S1).
Ora, no caso, constitui facto incontroverso que o contrato que vigorou entre as partes cessou em 25-06-2023, por reforma da trabalhadora (facto n.º 5); por isso, face a tal cessação, quando a autora intentou a ação (em 13-11-2023) podia dispor livremente dos direitos de natureza pecuniária emergentes do contrato de trabalho.
Por consequência, não é aqui aplicável o disposto no artigo 74.º do Código do Processo do Trabalho, não podendo condenar-se a ré, pelo título indicado, além do pedido.
Deixada esta nota prévia, avancemos.
Concluiu-se anteriormente, em 2., que à autora/recorrida eram/são devidas diuturnidades até 29-05-2010 e, posteriormente, entre 1 de novembro de 2022 até 30 de abril de 2023.
Assim, considerando que foi admitida ao serviço a ré/recorrente em 28-09-1989, em 28-09-1994, venceu-se uma diuturnidade, em 28-09-1999 outra diuturnidade, outra em 28-09-2004 e, finalmente, outra em 28-09-2009.
Neste enquadramento, tem direito até setembro de 1999, a título de diuturnidades, à quantia de € 799,26 nos termos apurados na sentença recorrida, que não vêm em concreto postos em causa.
E, também como apurado na 1.ª instância, que não vem posto em causa, a partir de outubro de 1999 até setembro de 2004 a autora passou a ter direito a duas diuturnidades de € 13,47 o que perfaz um total em dívida de € 1.885,80.
A partir de outubro de 2004 até setembro de 2009, como apurado na sentença recorrida, a autora passou a ter direito a três diuturnidades de € 13,47, o que perfaz um total em dívida de € 2.828,70.
E de outubro de 2009 a maio de 2010, tem direito a quatro diuturnidades de € 13,47 cada uma, o que perfaz a quantia de € 494,22 (€ 53,88 x 9, aqui se incluindo o subsídio de Natal de 2009).
Finalmente, de novembro de 2022 a 30 de abril de 2023 tem direito a cinco diuturnidades, de € 21,00 cada, o que perfaz a quantia de € 735,00 (€ 105,00 x 7, aqui se incluindo o subsídio de Natal de 2022).
A este propósito realça-se que, não obstante anteriormente se ter interrompido o pagamento das diuturnidades, tendo presente os regimes decorrentes de IRCT mais favoráveis que as aboliram, para efeitos de contabilização e face a posterior reposição, terá que ser contabilizado todo o tempo de trabalho prestado ao serviço da empregadora.
Registe-se ainda que pese embora a autora no artigo 25.º da p.i. aceitar que a ré lhe pagou a importância de € 358,00 em 2022 e de € 198,00 em 2023, que aí parece imputar a título de diuturnidades, não é possível deduzir tais importâncias no valor alcançado, pois não só estão em causa períodos temporais não totalmente coincidentes com os constantes da petição inicial, como também face à posição assumida pela mesma autora no referido articulado não resulta claro se aqueles pagamentos o foram a título de diuturnidades ou a qualquer outro título, maxime por diferenças salariais.
Assim, no total é devido à autora/recorrente, a título de diuturnidades, a quantia de € 6.742,98 (€ 799,26 + € 1.885,80 + € 2.828,70 + € 494,22 + € 735,00).
Procedem, por isso, nesta parte e parcialmente, as conclusões das alegações de recurso.
3.2.Quanto a créditos por formação contínua não ministrada
A este título a sentença recorrida condenou a ré/recorrente a pagar à autora recorrida:
«(…) A título de créditos de formação vencidos nos anos de 2007, 2008, 2019 a 2023, a quantia de 1.105,95€, acrescida de juros de mora, à taxa legalmente prevista para obrigações civis, vencidos desde 24.06.2023, e vincendos até integral pagamento;
(…) Um crédito de formação de 20 horas em 2004, um crédito de formação de 20 horas em 2005 e um crédito de formação de 35 horas em 2006, acrescida de juros de mora, à taxa legalmente prevista para obrigações civis, vencidos desde 24.06.2023, e vincendos até integral pagamento, a liquidar posteriormente».
A recorrente rebela-se contra tal condenação, argumentando, ao fim e ao resto, que só são devidos os créditos por falta de formação desde 2020, uma vez que quanto aos outros anos caducou o direito da autora/recorrida.
Vejamos.
Os artigos 125.º e 137.º do Código do Trabalho de 2003 (Lei n.º 99/2003, de 27 de agosto), estabeleciam o crédito por formação contínua.
Especificamente o n.º 5 daquele artigo prescrevia que «[a]s horas de formação certificada a que se referem os n.os 3 e 4 que não foram organizadas sob a responsabilidade do empregador por motivo que lhe seja imputável são transformadas em créditos acumuláveis ao longo de três anos, no máximo».
Por sua vez, o artigo 169.º do Regulamento do Código do Trabalho (aprovado pela Lei n.º 35/2004, de 29 de julho” dispunha que «(…) cessando o contrato de trabalho, o trabalhador tem direito a receber a retribuição correspondente ao crédito de horas para formação que não lhe tenha sido proporcionado».
Já no atual Código do Trabalho, o artigo 134.º estipula que cessando o contrato de trabalho, o trabalhador tem direito a receber a retribuição correspondente ao número mínimo anual de horas de formação que não lhe tenha sido proporcionado, ou ao crédito de horas para formação de que seja titular à data da cessação.
E de acordo com o n.º 6 do artigo 132.º do mesmo compêndio legal, «[o] crédito de horas para formação que não seja utilizado cessa passados três anos sobre a sua constituição».
Assim, ao contrário do Código do Trabalho de 2003, que não estabelecia explicitamente qualquer prazo quanto ao pagamento dos créditos de horas de formação não ministradas, no Código atual o trabalhador tem direito ao pagamento do «(…) crédito de horas de formação não ministrada já vencidas, até ao limite de três anos, daquelas cujo crédito que ainda não se venceu e das relativas ao ano da cessação do contrato» (cfr. acórdão deste tribunal de 26-05-2022, proc. n.º 584/20.7T8BJA.E1).
Mas será que no Código do Trabalho de 2003 não existia prazo para o exercício do crédito de horas de formação não ministrada?
Recorde-se que o n.º 5 do artigo 125.º estipulava que só haveria crédito de horas “acumuláveis ao longo de três anos, no máximo”, o que se afigura ser um limite temporal ao exercício do crédito de horas de formação não ministrada.
Ora, como de modo assertivo se escreveu no acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 18-02-2021 (proc. 586/19.6T8VRL.G1), «(…) já no domínio do CT/03, embora não de forma tão explicita como na lei actual, era vedado ao trabalhador, quer utilizar os créditos de horas, quer reclamar a respectiva retribuição quando excedidos os 3 anos após o seu vencimento. Outra não pode ser a interpretação da lei, quando estabelece um tecto máximo de 3 anos para utilizar os créditos (125º, 5, CT/03) ou para, em caso de cessação do contrato, em alternativa reclamar a correspondente retribuição (169 RCT). O contrário seria esvaziar de sentido a norma. A retribuição só é devida se o direito ao crédito de horas subsistir na titularidade do trabalhador. Faz parte do pressuposto da norma. A interpretação sistemática e coordenada entre os referidos normativos do CT/03 e do seu regulamento (RCT) também aponta nesse sentido – vd. acórdão da RG de 18-102018, proc. 867/16.0T8BGC.G1, www.dgsi.pt.».
Acompanhamos integralmente este entendimento, pelo que a autora apenas tem direito, por horas de formação não ministrada já vencidas, com o limite de 3 anos (artigos 132.º, n.º 6, e 134.º do Código do Trabalho), ao crédito de horas que ainda não se venceu, incluindo do ano de cessação do contrato, e que se venceram com a cessação do contrato de trabalho.
Atente-se que as horas de formação que não sejam asseguradas até ao termo dos dois anos posteriores ao seu vencimento, transformam-se em crédito de horas (artigo 132.º, n.º 1), sendo que não sendo utilizado cessa passados três anos sobre a sua constituição.
Ou seja, e dito de outro modo: cessando o contrato de trabalho e havendo horas que não foram ministradas pelo empregador, são devidas não só as horas que já se transformaram em crédito – com o limite dos três anos sobre a sua constituição –, como ainda as que se venceram nos últimos dois anos de execução do contrato, em relação aos quais apenas se formou o crédito com a cessação do contrato.
Neste âmbito, a autora peticionou o crédito referente aos anos de 2019, 2020, 2021, 2022 e 2023, que quantificou no total de 200 horas (40horas x 5 anos).
E a 1.ª instância quantificou o total de horas em 180, sendo 40 por cada um dos anos de 2019 a 2022 e 20 relativos a 2023, visto que o contrato cessou em meados deste último ano, mais concretamente em 25 de junho.
Acompanha-se o entendimento da 1.ª instância.
Com efeito, tendo em conta as regras supra enunciadas – de liquidação quer das horas que se haviam transformado em crédito, quer das referentes aos últimos dois anos de execução do contrato que apenas se converterem em crédito com a cessação do contrato – temos as horas já convertidas em crédito dos anos de 2019, 2020 e 2021, e vencidas dos dois últimos dois anos que ainda não se tinham convertido em crédito – o que ocorreu apenas por virtude da cessação do contrato – , o que totaliza as 180 horas fixadas na 1.ª instância.
Tendo em conta o disposto no artigo 271.º do Código do Trabalho e que a remuneração mensal a atender, conforme melhor se analisará infra, é de € 833,00 – correspondente à última remuneração, por face ao disposto no artigo 134.º do Código do Trabalho relevar a vigente à data da cessação do contrato – , temos o valor hora assim apurado: € 833,00 x 12 : 52 x 40 = € 4,81 hora.
Considerando que estão em causa 180 horas, é devida a tal título a importância de € 865,80.
Em relação aos restantes anos objeto de condenação, como se expôs supra, verifica-se a caducidade do crédito de horas, pelo que não pode ser exigido à ré/recorrente.
Procedem, por isso, parcialmente e nesta parte, as conclusões das alegações de recurso.
3.3. Quanto ao pagamento do trabalho suplementar
A pretensão da recorrente nesta matéria era tributária da pretendida alteração da matéria de facto: não tendo obtido êxito quanto a esta, maxime quanto aos n.ºs V a XIII dos factos não provados, forçosamente terá que se manter a condenação.
Acrescente-se que, se bem se interpretam as conclusões (n.ºs 39 a 41), a recorrente parece ancorar-se também na circunstância de trabalhar por turnos e de o trabalho prestado pela recorrida nos dias em causa o ter sido no horário normal de trabalho.
Ora, tal argumentação não tem qualquer respaldo na matéria de facto provada, sendo certo, volta-se a sublinhar, que dos documentos emitidos e juntos por aquela não resulta, com o mínimo de certeza e segurança, que tenha procedido ao pagamento do peticionado trabalho prestado em feriados e dias de descanso.
Improcedem, consequentemente, nesta parte, as conclusões das alegações de recurso.
3.4. Dos créditos decorrentes da cessação do contrato de trabalho
A sentença recorrida condenou a ré/recorrente a pagar à autora/recorrida, a tal título, a quantia de € 739,39.
Fê-lo, se bem se intui, no pressuposto de que para além da retribuição base de € 760,00 a autora devia também auferir a quantia de € 105,00 a título de diuturnidades.
E desenvolveu para tanto a seguinte argumentação: «A retribuição do mês de junho ascendia a 760€ de salário base e 105€, o que perfaz um total de 875€. Conforme resulta da factualidade provada, a autora trabalho até 24.06.2023, passando à situação de reformada no dia 25.06.2023. Assim, dever-lhe-iam ter sido liquidados os seguintes créditos: - Vencimento e diuturnidades do mês de junho de 2023– 692€ ( [875€/30] x 24) – pelo que tendo sido paga a quantia de 661,33€ (633€ + 28,33€), está em falta o montante de 30,67€; - Diuturnidade do subsídio de férias e férias vencidas em 01.01.2023 – 210€ (105€ x 2); - Proporcionais de subsídio de férias referentes ao ano de 2023 (art. 264.º do CT) – 419,60€ ( [875€ / 22 dias] x 10,55 dias [175 dias de trabalho x 22 / 365]) – pelo que tendo sido paga a quantia de 380€, está em falta o montante de 39,60€; - Proporcionais de subsídio de Natal do ano da cessação (art. 263.º, n.º 1 e 2, alíneas a) e b), CT) - 419,52 € ( [875€ / 365 dias] x 175 dias de trabalho), pelo que tendo sido paga a quantia de 380€, está em falta o montante de 39,52€; - Proporcionais de férias não gozadas referentes ao ano da cessação (245.º, n.º 1, alínea a), CT) - 419,60€ ( [875€ / 22 dias] x 10,55 dias [175 dias de trabalho x 22 / 365]) sendo que, nenhuma quantia foi paga, está em falta o montante de 419,60€. O montante em falta ascende ao total de 739,39€, sobre o qual acrescem juros de mora à taxa supletiva legal, vencidos desde 24.06.2023 e vincendos até integral pagamento».
Ora, por um lado, como já se analisou, à autora deixaram de ser devidas diuturnidades a partir de 30 de abril de 2023, pelo que não pode atender-se às mesmas no cômputo dos valores devidos pela cessação do contrato de trabalho; por outro, a própria recorrente parece reconhecer no n.º 37 das conclusões das alegações de recurso – ainda que a propósito da questão das diuturnidades – a aplicação às partes do contrato coletivo de trabalho entre a União das Misericórdias Portuguesas - UMP e a FNE - Federação Nacional da Educação e outros, publicado no BTE n.º 14, de 15 de abril de 2023, por força da portaria de extensão publicada no Boletim do Trabalho e Emprego n.º 21, de 8 de junho 2023, que determinou que eram estendidas no território do Continente as condições de trabalho do referido, às relações de trabalho entre as Santas Casas da Misericórdia filiadas na UMP e trabalhadores ao seu serviço, não representados pelas associações sindicais outorgantes.
Por isso, não deixa de surpreender que na sequência da audição das partes – determinada por este tribunal, face ao que se considerou matéria algo confusa constante dos autos sobre esta questão – venha agora alegar que o referido CCT só se aplica aos autos, maxime para efeitos de tabelas salariais, após a portaria de extensão n.º 311/2023, de 16 de outubro.
No entanto, ressalvado o devido respeito por diferente interpretação, não vislumbramos qualquer fundamento, nem é identificado pelas partes, para afastar a aplicação do CTT em causa, por força da portaria de extensão n.º 21, de 8 de junho de 2023.
E de acordo com a mesma (artigo 2.º, n.º 2), as tabelas salariais e cláusulas de natureza pecuniária previstas na convenção produzem efeitos a partir de 1 de maio de 2023.
Dos autos resulta que a autora foi admitida ao serviço da ré em 28-09-1989, com a categoria de “Ajudante de Lar”, para exercer as funções na lavandaria do Lar 1 e que há mais de 29 anos desempenhava funções na lavandaria (n.ºs 3 e 4 da matéria de facto).
Assim sendo, e tendo presente o disposto no artigo 118.º do Código do Trabalho, parece legítimo concluir-se que a autora deveria possuir a categoria profissional de “operador de lavandaria” constante do CCT.
Por sua vez, no anexo II consta, quanto a carreira profissional, que se verifica a passagem do nível I para o nível II a prestação de cinco anos de bom e efetivo serviço.
Já de acordo com o anexo V, a progressão nos escalões horizontais efetua-se de 5 em 5 anos.
Assim, tendo em conta este circunstancialismo, maxime o constante do anexo V do CCT, entende-se que a autora trabalhadora se insere no nível XVI, escalão 7, a que correspondia a retribuição mínima em junho de 2023 de € 833,00.
Nesta sequência, é devido à autora, a título de diferenças salariais e por virtude da cessação do contrato de trabalho:
(i) referente à retribuição desse mês seria devido € 666,38 (€ 833,00:30 x 24), mas como a ré pagou € 661,33, é devida a diferença de € 5,05 (€ 661,38 – 661,33);
(ii) quanto a proporcionais de subsídio de férias era devido o montante de € 399,35 (€ 833,00: 365x175), mas como foi pago € 380,00, é devida a diferença de € 19,35;
(iii) igual importância é devida a título de proporcionais de subsídio de Natal, ou seja, € 19,35, nos termos explanados na referência anterior;
(iv) já quanto a proporcionais de férias referentes a esse ano, é devido o valor de € 399,35 (€ 833,00:30 x24), uma vez que, a esse título, nenhum valor foi pago à autora.
Assim, por cessação do contrato de trabalho e quanto a retribuição de junho de 2023, proporcionais de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal, é devida à autora a importância total de € 448,15 (€ 5,05+€ 19,35+€ 19,35+€ 399,35).
Sobre esta quantia são devidos juros de mora, à taxa legal, desde 24-06-2023 até integral pagamento.
Procedem, por isso, parcialmente, nesta parte, as conclusões das alegações de recurso.
4. A recorrente e a recorrida ficaram parcialmente vencidas no recurso.
Por isso, tendo presente o disposto no artigo 527.º do Código de Processo Civil, deverão ser condenadas nas custas do recurso, na proporção do respetivo decaimento.
V – Decisão
Face ao exposto, acordam os juízes da Secção Social do Tribunal da Relação de Évora em julgar parcialmente procedente o recurso interposto por Santa Casa da Misericórdia Local 1, e, em consequência:
1. revoga-se o n.º 1 da parte decisória da sentença recorrida, que se substitui pela condenação da aqui recorrente a pagar à recorrida a quantia de € 6.742,98, a título de diuturnidades, acrescida de juros de mora desde o vencimento de cada uma das diuturnidades até integral pagamento;
2. revoga-se o n.º 2 da parte decisória da sentença recorrida, que se substitui pela condenação da recorrente a pagar à recorrida, a título de créditos por falta de formação contínua dos anos de 2019 a 2023, a quantia de € 865,80, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde 24-06-2023 até integral pagamento;
3. revoga-se o n.º 3 da parte decisória da sentença recorrida, dele se absolvendo a recorrente;
4. confirma-se o n.º 4 da parte decisória da sentença recorrida, mantendo-se, por consequência, a condenação da recorrente;
5. revoga-se o n.º 5 da parte decisória da sentença recorrida, que se substitui pela condenação da recorrente a pagar à recorrida, a título de retribuição de junho de 2023, proporcional de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal decorrentes da cessação do contrato de trabalho, a quantia de € 448,15, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde 24-06-2023 até integral pagamento.
Custas pelo recorrente e pela recorrida, na proporção do respetivo decaimento.
Évora, 16 de dezembro de 2024 João Luís Nunes (relator) Mário Branco Coelho Paula do Paço
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[1] Relator: João Nunes; Adjuntos: (1) Mário Branco Coelho, (2) Paula do Paço.