TRANSFERÊNCIA COLETIVA E DEFINITIVA PREVISTA NO ARTIGO 194.º
N.º 1
ALÍNEA A)
DO CÓDIGO DO TRABALHO
REQUISITO DO PREJUÍZO SÉRIO
RESOLUÇÃO DO CONTRATO DE TRABALHO
Sumário

I - Analisando o corpo e as conclusões do recurso de apelação, verifica-se que a Recorrente indica os pontos de facto que considera incorretamente julgados bem como a decisão que deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
II - A Recorrente impugna a factualidade em três blocos, a saber: i) Os pontos k), m) e n), da matéria de facto dada por provada, os quais devem ser dados por não provados; ii) deve-se incluir nos factos dados por provados o que consta na conclusão VI; iii) por último, deve-se incluir nos factos não provados, o que consta na conclusão XIV.
III - A alegação de temporalidade feita pela Ré na ordem de transferência, contradiz a razão alegada para a transferência, ou seja, o encerramento definitivo do estabelecimento no Porto.
IV - Na situação de transferência coletiva e definitiva prevista no artigo 194.º, n.º 1, alínea a), do Código do Trabalho, o requisito do prejuízo sério contido no n.º 5, do artigo 194.º, configura um requisito para a resolução do contrato de trabalho e não um requisito da modificação do local de trabalho e por isso, face à regra do artigo 342.º do Código Civil, caberá ao trabalhador o ónus de alegar e provar os factos que integram esse prejuízo sério, a fim de poder invocar o direito à resolução com direito à compensação do artigo 366.º.
V - A transferência do local de trabalho do Porto para Amarante (com a apanha do transporte público pelas 07H34, e o regresso a casa depois das 21H) é suscetível de gerar um impacto significativo na vida pessoal, familiar, e social do trabalhador, limitando o seu tempo livre, no convívio em atividades lúdicas e de lazer, e comprometendo as suas responsabilidades familiares, como o cuidado com as filhas menores.
VI - A manutenção do contrato de trabalho nessas condições, seria excessivamente onerosa para o trabalhador (não se trata de um mero incómodo ou transtorno suportável), pelo que, não lhe era exigível a perduração do vínculo laboral.

Texto Integral

Processo n.º 5071/23.9T8MAI.P1

(secção social)

Relatora: Juíza Desembargadora Sílvia Gil Saraiva

Adjuntas: Juíza Desembargadora Germana Ferreira Lopes

Juíza Desembargadora Teresa Sá Lopes


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Recorrente: “A..., S.A.”

Recorrido: AA


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Sumário:

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(Sumário do acórdão elaborado pela sua relatora nos termos do disposto no artigo 663.º, n.º 7, do Código de Processo Civil)


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Acordam as Juízas subscritoras deste acórdão da quarta secção, social, do Tribunal da Relação do Porto:


I. RELATÓRIO[1]:

AA (Autor) instaurou contra “A..., S.A.” (Ré), a presente ação declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, pedindo que a Ré seja condenada a pagar-lhe a quantia global de € 9.120,00[2] a título de compensação pela resolução do contrato de trabalho; a quantia de € 1.520,00 descontada pela Ré nas prestações pecuniárias a que se refere o recibo de abril de 2023; a quantia de € 478,80 a título de formação profissional não prestada; juros de mora, à taxa legal, desde a data da cessação do contrato de trabalho.

Para sustentar a sua pretensão, o Autor alegou, em suma, a existência de uma ordem de transferência temporária do seu local de trabalho do Porto para Amarante, por um período de seis meses.

No entanto, o estabelecimento onde o Autor exercia funções no ..., no Porto, encerrou definitivamente no dia 31 de março de 2023.

Assim, no dia 05 de abril de 2023, o Autor enviou à Ré uma missiva a comunicar a resolução do contrato de trabalho, ao abrigo do disposto no n.º 5, do artigo 194.º do Código do Trabalho, invocando a existência de prejuízo sério.

Adicionalmente, o Autor peticiona a devolução da quantia de € 1.520,00 que foi descontada pela Ré nas prestações pecuniárias referidas no recibo de vencimento do mês de abril de 2023 (sem qualquer justificação), bem como a quantia de € 478,80 a título de formação profissional não prestada nos últimos três anos.

A Ré contestou, sustentando que a transferência tinha um caráter temporário e que, por ser de natureza temporária, não confere ao trabalhador a possibilidade de resolver o contrato de trabalho com base na verificação de um prejuízo sério. A Ré defende também a inexistência de tal prejuízo sério.

Mais alega que o Autor denunciou o contrato de trabalho sem cumprir o aviso prévio exigido pelo artigo 401.º do Código do Trabalho, sendo este o montante que foi deduzido no recibo de vencimento referente ao mês de abril de 2023. Quanto ao pagamento de horas de formação, a Ré argumenta que todas as horas foram devidamente ministradas não havendo, portanto, lugar a tal pagamento.

Foi proferido despacho saneador no qual a Meritíssima Juíza a quo fixou o valor da ação em € 6.458,00.

A enunciação do objeto do litígio e dos temas da prova foi dispensada.

Após a realização da audiência final, veio a ser proferida sentença datada de 04.06.2024, que terminou com o seguinte dispositivo:

«Nos termos e fundamentos expostos, julga-se parcialmente procedente, por parcialmente provada a ação e, nesta sequência

- condena-se a Ré a pagar ao Autor a quantia de € 10.640,00 (dez mil e seiscentos e quarenta euros), acrescida de juros de mora à taxa legalmente fixada para os juros civis em cada momento devidos, desde a data de 31/03/2023 até integral pagamento;

- absolve-se a Ré do demais peticionado.

Valor da ação: atenta a retificação do pedido formulado, também se retifica o valor da ação para € 11.118,80.

Custas pelas partes na proporção do respetivo decaimento, nos termos do artigo 527.º do Código de Processo Civil.

Notifique e registe.» (Fim da transcrição)

Desta sentença interpôs a Recorrente recurso de apelação visando a sua revogação.

Termina as suas alegações com as seguintes conclusões:

«I- (…)

II- Os factos k), m) e n), dados como provados, devem, face à prova testemunhal produzida, dar-se como não provados.

III- Devendo o ponto k) ser dado como não provado uma vez que em momento algum foi feita prova quanto ao horário da esposa do Autor, não podendo o Tribunal com clareza afirmar que a mesma se encontra impedida no horário de levar as menores aos respetivos restabelecimentos escolares.

IV- O ponto m) e n) por sua vez, devem considerar-se como não provados uma vez que o Tribunal a quo considerou apenas o trajeto efetuado com transportes públicos, tendo dado como provado que era essa a única rotina e deslocação diária que o Autor se via obrigado a fazer, tendo descurado a possibilidade de o Autor se deslocar em veículo próprio.

V- Ficou apenas e tão só provado, que no caso de optar por transporte público, o trajeto seria aquele.

VI- Por outro lado, a panóplia de factos dados como provados revela-se, em contraposição com a prova produzida, escassa e incompleta, devendo, contrariamente ao a Mma Juíza decidiu, incluir-se nos factos dados como provados os seguintes factos:

q) O trabalhador teve conhecimento do conteúdo segunda carta antes de enviar a carta de resolução;

r) A transferência tinha carater temporário;

s) Inexiste prejuízo na relação com as filhas menores;

t) Que o trabalhar trabalhava por turnos rotativos já trabalhando dois a três dias por semana até as 22 horas.

u) Inexiste prejuízo sério com o acréscimo de tempo nas deslocações;

v) Inexiste prejuízo sério com o acréscimo de custos nas deslocações.

VII- O facto q) deve dar-se como provado com base nas declarações de parte do Autor que refere expressamente que terá recebeu email da Entidade Empregadora antes de enviar a carta do dia 5 no qual demonstrava a intenção de resolver o contrato com fundamento em prejuízo sério.

VIII- O facto r) deve dar-se como provado com base na prova documental junta ao processo, nomeadamente a carta datada de 11 de março, no qual expressamente refere a entidade empregadora que a transferência é temporária, pelo período máximo de 6 meses.

IX -Por sua vez, o facto s) deve dar-se como provado na exata medida em que ficou esclarecido que os estabelecimentos de ensino têm acolhimento em horário anterior ao início das funções quer do trabalhador quer da esposa, uma vez que ambos iniciam funções pelo menos as 07:00 h, acrescendo a este facto ainda que o Autor, quando trabalhava no turno da noite já terminava às suas funções às 22:00h, dias nos quais pela mesma linha de raciocínio já não encontrava as menores acordadas.

X- Mais tendo sido esclarecido que com a transferência temporária para Amarante passaria o Autor a dispor de mais tempo com as menores aos fins de semana, não causando a transferência prejuízo na sua vida familiar.

XI- O facto t) na exata medida em que informou a Ré atempadamente que as deslocações se encontravam incluídas no horário de trabalho.

XII- Bem como pelo facto de a doutrina e jurisprudência entenderem que o gasto de 2 horas em deslocações para o local de trabalho temporário, no contexto de vida urbana atual, não configura mais de que um mero incómodo que afeta a maioria dos trabalhadores das grandes cidades, entendimento com o qual inteiramente concordamos.

XIII- Por fim, deve o facto u), depois de reapreciada a prova, ser dado como provado, na exata medida em que da análise da primeira carta, decorre clara e indubitavelmente que a Entidade Empregadora custeava todo o qualquer acréscimo patrimonial decorrente do acréscimo nas deslocações, tendo deixado deviamente esclarecido que nem prejuízo patrimonial seria decorrente da referida transferência.

XIV- No sentido inverso, carecem de ser incluídos nos factos dados como não provados os seguintes:

- Impossibilidade de a Entidade custear antecipadamente os custos das deslocações;

- Impossibilidade de o Empregador custear as despesas decorrentes de transporte em veículo próprio;

XV- Ambos os factos devem ser dados como não provados uma vez que nenhuma prova documental ou testemunhal carreada para o processo comprovou os mesmos.

XVI- Assim, não se tendo verificado, tampouco provado a existência de prejuízo sério para o Autor, impunha-se que a decisão proferida absolve-se a Ré do pagamento de compensação prevista no artigo 366.º do Código do Trabalho.

XVII- Isto porque, prevê o artigo 194.º do Código de Trabalho que a compensação só é devida em casa da transferência definitiva e se, da mesma resulte prejuízo sério para o trabalhador.

XVIII- (…)

XIX- Pelo que, ao Autor impunha-se, que não concordando com a ordem de transferência, denuncia-se o contrato.

XX- O que de facto o fez, tendo, contudo, tentado camuflar esta denuncia numa alegada resolução por justa causa, que em momento algum existiu, com a intenção única de receber uma compensação que não lhe era devida.

XXI- Não tendo sequer cumprido o tempo de pré-aviso … tamanha a relutância em ir para Amarante.

XXII- Não podendo a Ré compactuar ou aceitar a resolução, o fundamento para a mesma invocado, tampouco que tivesse considerado a mesma com carater definitivo.

XXIII- (…)

XXIV- Assim terá de se concluir pela decisão em termos diversos do que fez a sentença recorrida, considerando provado factos suficientes para declinar a existência de qualquer prejuízo sério, bem como considerando como provado que a transferência sempre foi meramente temporária, até que a Entidade Empregadora encontrasse vaga que o trabalhador pudesse exercer as suas funções num local mais próximo do antigo local.

XXV- Sendo que sempre e em qualquer circunstância deverá considerar que o prejuízo a existir não pode ser considerado sério nos termos e para os efeitos que permitiriam uma resolução do contrato pelo trabalhador com justa causa, considerando assim que estamos in casu, perante uma denuncia unilateral do contrato, operada pelo Autor, sem cumprimento do aviso prévio, com as consequências decorrentes do disposto no art. 401º do CT.» (Fim da transcrição)

O Recorrido contra-alegou opondo-se à procedência do recurso.


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A Sr.ª Juíza a quo admitiu o recurso interposto como de apelação, com subida imediata, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.

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Recebidos os autos o Exmo. Procurador-Geral-Adjunto pronunciou-se, em douto parecer, referindo inexistir interesses de ordem pública ou social inerentes à jurisdição laboral que imponham a pronúncia do Ministério Público, tanto mais que se considera bem fundamentada a decisão recorrida, tanto ao nível da matéria de facto, como na subsunção do Direito aos factos.

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Admitido o recurso neste tribunal e colhidos os vistos, cumpre decidir.

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II - Questões a decidir:

O objeto do recurso é definido pelas conclusões do recorrente [artigos 635.º, n.º3 e 4, e 639.º, n.ºs 1 e 3, ambos do Código de Processo Civil, ex vi, artigo 1.º, n.º 2, alínea b), do Código de Processo do Trabalho], por ordem lógica e sem prejuízo da apreciação de questões de conhecimento oficioso e da indagação, interpretação e aplicação das regras de direito (artigo 5.º, n.º 3, do Código de Processo Civil), observado que seja, quando necessário, o disposto no artigo 3.º, n.º 3, do Código de Processo Civil.

As questões a decidir consistem em saber:

- Da impugnação da matéria de facto dada como provada [reapreciação e alteração dos pontos k), m) e n), dos factos dados por provados para não provados; incluir nos factos dados por provados os pontos q) a v) que a Recorrente transcreve na conclusão VI; e considerar como não provado os pontos que indica na sua conclusão XIV];

- Do erro na aplicação do direito: a ordem de transferência do local de trabalho é temporária; mesmo que tal não seja a transferência não provoca ao Autor um prejuízo sério.


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III- FUNDAMENTOS DE FACTO:

Matéria de facto dada como provada em primeira instância[3]


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a) O Autor foi admitido ao serviço da Ré (artigo 1.º da petição inicial).

b) Uma sociedade comercial que se dedica ao comércio a retalho de equipamento de telecomunicações, em estabelecimentos especializados (artigo 2.º da petição inicial).

c) Por força de um contrato de trabalho celebrado em 11 de fevereiro de 20005 (artigo 3.º da petição inicial).

d) Na data de 14/03/2023 o Autor exercia a sua atividade profissional remunerada por conta e sob a direção e fiscalização da referida sociedade comercial, num estabelecimento que esta detinha no ..., no Porto (artigo 4.º da petição inicial).

e) O Autor estava classificado profissionalmente pela Ré como caixeiro, exercendo as funções correspondentes a essa categoria (artigo 5.º da petição inicial).

f) O Autor auferia a retribuição base mensal de € 760,00, acrescido do subsídio de alimentação no valor diário de € 4,46 (artigo 6.º da petição inicial).

g) A Ré remeteu ao Autor a carta datada de 14/03/2023, com os seguintes dizeres:

Guimarães, 14 de março de 2023

ASSUNTO: Alteração temporária do local de trabalho

Exmo. Sr. AA,

A..., S.A., vem pela presente, formalmente, comunicar a V. Exa, nos termos do artigo 196.º, n.º 1 e 194.º, n.º 1, al. a) e b) do Código de Trabalho, e com a antecedência aí prevista, a transferência de local de trabalho, previsto no Contrato de Trabalho celebrado entre ambos no dia 11.02.2005.

A presente transferência de local de trabalho terá caráter temporário e durará pelo período de 6 meses.

A partir de dia 01 de abril de 2023, a prestação laboral de V/Exa. passará a ser exercida na A... – Loja ..., sita na rua ..., ... Amarante, sendo que a Entidade Empregadora, aqui signatária, expressamente declara que irá custear o acréscimo de despesas de deslocação comprovadas decorrentes da transferência do local de trabalho.

A transferência temporária do local de trabalho é motivada pelo facto do estabelecimento comercial onde o Trabalhador presta atualmente as suas funções, sito no ..., ... Porto, vir a ser alvo de extinção/encerramento no final do presente mês.

Posto isto, a partir do dia 01 de abril de 2023 deverá apresentar-se ao Trabalho na Loja ..., sita na rua ..., ... Amarante.

Sem outro assunto,

Com os melhores cumprimentos,” (artigos 7.º, 8.º e 9.º da petição inicial e artigos 17.º, 18.º, 19.º e 23.º da contestação).

h) No dia 31 de março de 2023 a Ré encerrou o estabelecimento onde o Autor prestava serviço no ..., no Porto (artigo 10.º da petição inicial).

i) O Autor remeteu à Ré a carta datada de 05/04/2023, com os seguintes dizeres:

Maia, 05 de abril de 2023.

Exmos. Senhores, Acuso a receção da vossa carta, datada de 14 de março de 2023, na qual me comunicam a transferência do meu local de trabalho para a vossa loja sita na rua ..., em Amarante.

Conquanto digam nessa carta que a transferência terá um caráter temporário, o certo é que o motivo invocado para minha transferência foi o encerramento definitivo do estabelecimento onde eu prestava serviço, sito ao ..., na cidade do Porto.

Estou, por isso, perante uma transferência definitiva, já que o estabelecimento onde prestava serviço encerrou definitivamente.

Por tal razão, e ao abrigo do disposto no n.º 5, do art.º 194.º, do Código do Trabalho, sou a resolver o contrato de trabalho que celebrei com V. Exas. em 10 de fevereiro de 2005, porquanto a transferência de local de trabalho que me impuseram me causa os mais sérios prejuízos à minha vida pessoal, familiar e social.

Com efeito, e V. Exas. muito bem sabem, resido em ... – Maia.

Tenho dois filhos, de 7 anos e de 18 meses, cabendo-me a mim levá-los à Escola ... – Maia, e ao Infantário, igualmente na Maia, já que a minha mulher, esteticista de profissão, inicial a sua prestação de trabalho, na Maia, às 08:30 horas.

Por isso, ela está impossibilitada de levar os filhos aos estabelecimentos escolares que frequentam, já que a atividade destes apenas se inicia às 09:00 horas.

Acresce ainda que, morando perto do local de trabalho onde prestava serviço, tinha um tempo de deslocação muito diminuto, o que, além do mais, me permita, a maior parte das vezes, deslocar-me a casa para almoçar.

A deslocação para Amarante causar-me-ia as maiores dificuldades para me deslocar, quer na ida, quer na vinda.

Com efeito teria de apanhar um autocarro às 07:34 horas para ir de casa até ao Hospital .../Porto; aí apanharia uma camioneta no ..., às 08:30 horas, chegando a Amarante cerca das 09:10 horas; depois teria de fazer uma caminhada a pé, de não menos 20 minutos.

No regresso apenas poderia ter transporte de Amarante, despois da caminhada a pé, às 19h:30 horas, chegando ao Porto às 20:15 horas, e tendo de aguardar por autocarro do B....

Tal faria com que chegasse a casa bem depois das 21:00 horas, e encontrasse os meus filhos já deitados, e a dormir.

Para além de pôr em causa a minha vivência com os meus filhos, tal alteração provocaria uma sobrecarga enorme à minha mulher, já que teria de ser ela, em exclusivo, a suportar toda a logística e assistência aos nossos filhos.

De salientar que V. Exas., na carta que me enviaram, apenas referem custear as despesas de deslocação, resultantes da transferência do local de trabalho, nada dizendo quanto à compensação que me seria devida pelo substancial aumento de tempo de disponibilidade minha para com a empresa.

Acresce ainda que esta alteração do local de trabalho traria insuperáveis dificuldades de coordenação da minha vida social e familiar, já que deixaria de poder prestar apoio ao meu agregado familiar, e desorganizaria, ou melhor, destruiria toda a minha vida social, desde sempre centrada em ... – Maia.

Não me resta, por isso, resolver o contrato de trabalho que celebrei com V. Exas., porque os prejuízos decorrentes dessa alteração do local de trabalho me provocariam os prejuízos sérios, e inultrapassáveis, acima apontados.

Com os melhores cumprimentos,” (artigo 11.º da petição inicial e artigo 53.º da contestação).

j) O Autor reside em ... (artigo 13.º da petição inicial).

k) O Autor tem duas filhas de 7 anos e de 18 meses, cabendo-lhe levá-los à escola e ao infantário ambos na Maia, já que a sua mulher iniciava a sua prestação de trabalho de esteticista, na Maia às 8h30m (artigo 13.º da petição inicial).

l) O Autor desloca-se amiúde a casa para almoçar (artigo 13.º da petição inicial).

m) Para se deslocar de ... para o novo local de trabalho em Amarante o Autor teria de apanhar um autocarro às 7h 34m, para se deslocar ao Hospital .../Porto; aí apanharia uma camioneta no ... às 8h30m, chegando a Amarante cerca das 9h10m, depois teria de fazer uma caminhada a pé, de cerca de 20 minutos (artigo 13.º da petição inicial).

n) No regresso a casa após a caminhada de 20 minutos teria a camioneta às 19h 30m, chegando ao Porto às 20h 15m e após aguardaria pelo autocarro do B... até ..., chegando a casa depois das 21h, encontrando os filhos a dormir (artigo 13.º da petição inicial).

o) A Ré descontou a quantia de € 1.520,00 na retribuição do Autor no recibo de abril de 2023 (artigo 17.º da petição inicial).

p) A Ré remeteu ao Autor a carta datada de 11 de abril de 2023, com os seguintes dizeres:

Guimarães, 11 de abril 2023

Por correio eletrónico e por carta registada

ASSUNTO: Resposta à S/Missiva de 05 de abril de 2023 – não aceitação da resolução do contrato

Exmo. Sr. AA, vimos pela presente acusar a receção da S/Missiva datada de 05 de abril de 2023 em que veio resolver o contrato ao abrigo do disposto no artigo 194.º, n.º 5 do Código de Trabalho.

Sucede que, não pode a Entidade Empregadora, aqui signatária, aceitar tal resolução do contrato de trabalho.

Veja-se, desde logo, que nos termos do artigo 194.º, n.º 5 do Código do Trabalho, tal faculdade ao dispor do trabalhador, apenas se verifica quando se trata de uma transferência de local de trabalho definitiva, o que não sucede neste caso.

A transferência de local de trabalho de V/Exa. é efetivamente temporária.

Conforme se constata, a loja onde V/Exa. exerce funções irá, de facto, encerrar definitivamente, contudo não é pretensão da Entidade Empregadora deslocá-lo definitivamente para Amarante, atenta a distância entre os dois locais de trabalho e possíveis transtornos que tal poderá acarretar.

A intenção da entidade empregadora, tal como já fora comunicado a V/Exa., é que a transferência e exercício de funções em Amarante ocorra de forma temporária até que a Entidade Empregadora encontre uma loja mais próxima do local de residência de V/Exa. e, nesse momento, operar a transferência definitiva para esse no local de trabalho.

Motivo pelo qual, desde já se informa V/Exa. que a Entidade Empregadora não aceita a resolução do contrato de trabalho ao abrigo do disposto no artigo 194.º, n.º 5 do CT, por não se verificarem os respetivos pressupostos.

Ademais, desde já se diga que é pressuposto essencial para a respetiva resolução do contrato que se verifique um prejuízo sério nessa transferência, O que no presente também não se verifica.

Desde logo porque, salvo melhor entendimento, a Entidade Empregadora, sendo sensível à situação em apreço, tem vindo a fazer de tudo para que esta transferência temporária cause o menos transtorno possível na vida do trabalhador.

E tal se verifica ao custear todo o acréscimo de despesas decorrentes da transferência de local de trabalho e, com maior importância e de forma voluntária (uma vez que tal flexibilização não decorre de obrigação legal), ao permitir que, de modo a evitar qualquer prejuízo na organização da vida familiar/social de V/Exa., que o acréscimo de tempo despendido com a deslocação para o local de trabalho temporário seja incluído no horário de trabalho.

O que permite inferir que, em termos práticos, não ocorre qualquer prejuízo a V/Exa. visto que o acréscimo de custos e tempo de deslocação estão a ser assegurados a expensas da Entidade Empregadora, podendo continuar a ter os horários que sempre teve no seu local de trabalho habitual.

Posto isto, e atento o supra exposto, desde já se informa V/Exa. a não aceitação da resolução do contrato. Reitera-se também que a transferência para Amarante é meramente temporária até que a Entidade Empregadora encontre vaga para que V/Exa. possa exercer as suas funções num local mais próximo do antigo local de trabalho. Pelo que, deverá V/Exa. cumprir com o exercício das funções no novo local temporariamente designado, sendo que assim que for alocado a novo local definitivo, tal situação será prontamente comunicada a V/Exa. nos termos e para os legais efeitos.

Sem outro assunto,

Com os melhores cumprimentos,” (artigos 24.º, 25.º, 74.º e 77.º da contestação).


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Matéria de facto dada como não provada em primeira instância

Da instrução da causa não resultaram provados os seguintes factos:

1) O Autor exerceu a sua atividade profissional remunerada no estabelecimento da Ré no ..., no Porto desde 11/02/2005 (artigo 4.º da petição inicial).

2) Os estabelecimentos escolares que os filhos do Autor frequentam apenas iniciam a sua atividade às 9h (artigo 13.º da petição inicial).

3) A Ré nos últimos três anos não prestou ao Autor qualquer formação profissional (artigo 20.º da petição inicial).


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Da impugnação da decisão de facto

[reapreciação e alteração dos pontos k), m) e n), dos factos dados por provados para não provados; incluir nos factos dados por provados os pontos q) a v) que a Recorrente transcreve na conclusão VI; e considerar como não provado os pontos que indica na sua conclusão XIV]:

Como é sabido nos termos do disposto pelo, n.º 1, do artigo 640º, do Código de Processo Civil, incumbe ao Recorrente, em primeiro lugar, circunscrever o âmbito do recurso, indicando claramente os segmentos da decisão que considerados viciados por erro de julgamento, com indicação da decisão que a seu ver deveria ter sido proferida [alíneas a) e c) do n.º 1] e, em segundo lugar, fundamentar, em termos concludentes, as razões da sua discordância, concretizando e apreciando criticamente os meios probatórios constantes dos autos ou da gravação que, no seu entender, impliquem uma decisão diversa [alínea b), do n.º 1].

Na verdade se ao Tribunal é atribuído o dever de fundamentação e de motivação crítica da sua decisão em matéria de facto (artigo 607.º, n.º 4, do Código de Processo Civil), facilmente se compreende que, em contraponto, o legislador tenha imposto à parte que pretende impugnar a decisão sobre a matéria de facto o respetivo ónus de impugnação, ou seja o ónus de expor, em termos claros e suficientes, os argumentos que, extraídos da sua própria apreciação crítica dos meios de prova produzidos, determinem, em seu entender, um resultado diverso do decidido pelo Tribunal a quo.

Conforme é observado por António Abrantes Geraldes[4], quando o recurso verse a impugnação da decisão da matéria de facto deve o recorrente observar as seguintes regras:

«a) Em quaisquer circunstâncias, o recorrente deve indicar sempre os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados, com enunciação na motivação do recurso e síntese nas conclusões; (negrito nosso)[5]

b) Deve ainda especificar, na motivação, os meios de prova constantes do processo ou que nele tenham sido registados que, no seu entender, determinam uma decisão diversa quanto a cada um dos factos; (negrito nosso)

c) Relativamente a pontos de facto cuja impugnação se funde, no todo ou em parte, em prova gravada, para além da especificação obrigatória dos meios de prova em que o recorrente se baseia, cumpre-lhe indicar com exatidão, na motivação, as passagens da gravação relevantes e proceder, se assim o entender, à transcrição dos excertos que considere oportunos; (negrito nosso)

(…)

e) O recorrente deixará expressa, na motivação, a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas, tendo em conta a apreciação crítica dos meios de prova produzidos, exigência que vem na linha do reforço do ónus de alegação, por forma a obviar a interposição de recursos de pendor genérico ou inconsequente. (negrito nosso)

(…).» (Fim da transcrição)

Não obstante este conjunto de exigências reporta-se especificamente à fundamentação do recurso, não se impondo ao recorrente que, nas suas conclusões, reproduza tudo o que alegou acerca dos requisitos enunciados no artigo 640.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil.

Versando o recurso sobre a impugnação da decisão relativa à matéria de facto, importa que nas conclusões se proceda à indicação dos pontos de facto incorretamente julgados e que se pretende ver modificados.[6]

Conforme salientam, Abrantes Geraldes. Paulo Pimenta, e Luís Filipe Pires de Sousa[7]: «(…) O Supremo tem vindo a sedimentar como predominante o entendimento de que as conclusões não têm de reproduzir (obviamente) todos os elementos do corpo das alegações e, mais concretamente, que a especificação dos meios de prova, a indicação das passagens das gravações e mesmo as respostas pretendidas não têm de constar das conclusões, diversamente do que sucede, por razões de objetividade e de certeza, com os concretos pontos de facto sobre que incide a impugnação (STJ 9-6-16, 6617/07, STJ 31-5-16, 1572/12, Supremo Tribunal de Justiça 28-4-16, 1006/12, Supremo Tribunal de Justiça 11-4-16, 449/410, Supremo Tribunal de Justiça 19-2-15, 299/05 e STJ27-1-15, 1060/07).» (Fim da transcrição)

Sublinham tais autores que, o Supremo Tribunal de Justiça tem afirmado que, na verificação do cumprimento dos ónus de alegação previstos no artigo 640.º, os aspetos de ordem formal devem ser modelados em função dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade[8]. (negrito nosso)

Sem embargo a impugnação da decisão de facto não se basta com a afirmação pelo recorrente da sua discordância face ao decidido, sustentada em referências imprecisas, genéricas ou descontextualizadas, ou a mera reprodução parcial de um outro segmento parcial e descontextualizado de algum ou alguns dos depoimentos, sendo certo que é o apelante que impugna a decisão da matéria de facto quem está em melhores condições para apontar, fundadamente, os eventuais erros de julgamento existentes ao nível da decisão de facto.

Aliás conforme é mencionado por Ana Luísa Geraldes[9] a prova de um facto não resulta, regra geral, de um só depoimento ou de parte dele, mas da conjugação de todos os meios de prova produzidos, através da sua análise global, devidamente ponderada, em termos críticos, segundo as regras da lógica, da experiência e das regras da ciência, eventualmente convocáveis no caso concreto.

Assim sendo neste contexto de apreciação global e crítica da prova produzida: «mostra-se facilmente compreensível que se reclame da parte do recorrente a explicitação da sua discordância fundada nos concretos meios probatórios ou pontos de facto que considera incorretamente julgados, ónus que não se compadece com a mera alusão a depoimentos parcelares e sincopados, sem indicação concreta das insuficiências, discrepâncias ou deficiências da apreciação da prova produzida, em confronto com o resultado que pelo Tribunal foi declarado.» (Fim da transcrição)

Exige-se, pois, o confronto desses elementos com os restantes que serviram de suporte à formulação da convicção do Tribunal (e que ficaram expressos na motivação da decisão), com recurso, se necessário, às restantes provas produzidas e registadas, apontando eventuais disparidades, contradições ou incorreções que afetem a decisão recorrida.

É hoje pacífico que o objetivo do 2.º grau de jurisdição na apreciação de facto não é a simples repetição do julgamento, mas a deteção e correção de concretos, pontuais e claramente apontados e fundamentados erros de julgamento.

Com efeito decorre do n.º 1, do artigo 662.º, do Código de Processo Civil, que: «A Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa.»

Sendo igualmente indiscutível que, sem prejuízo da correção, mesmo a título oficioso, de determinadas patologias que afetam a decisão de facto e também sem prejuízo do ónus de impugnação que recai sobre o recorrente, quando esteja em causa a impugnação de determinados factos cuja prova tenha sido sustentada em meios de prova sujeitos à livre apreciação do julgador, a Relação deve alterar a decisão da matéria de facto sempre que, no seu juízo autónomo, sujeito às mesmas regras de direito probatório material que são aplicáveis em 1.ª instância, os elementos de prova que se mostrem acessíveis imponham uma solução diversa da antes acolhida.

Logo afasta-se a tese que a modificação da decisão de facto só pode ter lugar em casos de erro manifesto de apreciação dos meios probatórios ou, ainda, que a Relação, atentos os princípios da imediação e da oralidade, não pode contrariar o juízo formulado em 1.ª instância relativamente a meios de prova que foram objeto de livre apreciação.

Todavia se o recorrente impugna determinados pontos da matéria de facto, mas não impugna outros pontos da mesma matéria, estes não poderão ser alterados, sob pena de a decisão da Relação ficar a padecer de nulidade, nos termos do artigo 615.º, n.º 1, alínea d), 2.ª parte, do Código de Processo Civil

É assim dentro destes limites objetivos que o artigo 662.º do Código de Processo Civil, atribui à Relação competências vinculadas de exercício oficioso quanto aos termos em que pode ser feita a alteração da matéria de facto, o mesmo é dizer, quanto ao modus operandi de tal alteração.

Conforme sublinha António Abrantes Geraldes[10]:

«(…) quando esteja em causa a impugnação de determinados factos cuja prova tenha sido sustentada em meios de prova submetidos a livre apreciação, a Relação deve alterar a decisão da matéria de facto sempre que, no seu juízo autónomo, os elementos de prova que se mostrem acessíveis determinem uma solução diversa, designadamente em resultado da reponderação dos documentos, depoimentos e relatórios periciais, complementadas ou não pelas regras de experiência.» (Fim da transcrição)

Ademais no nosso ordenamento jurídico vigora o princípio da liberdade de julgamento, ou da livre convicção, face ao qual o Tribunal aprecia livremente as provas sem qualquer grau de hierarquização e fixa a matéria de facto em sintonia com a convicção firmada acerca de cada facto controvertido.

Anote-se ainda o princípio a observar em casos de dúvida, consagrado no artigo 414.º do Código de Processo Civil, segundo o qual: «a dúvida sobre a realidade de um facto e sobre a repartição do ónus da prova resolve-se contra a parte a quem o facto aproveita.»

Sem prejuízo do relevo de tais princípios e sem escamotear que o Juiz em 1.ª instância se encontra, por via do imediato contacto com a produção da prova, em particulares condições para efeito de julgamento da matéria de facto (condições que, por regra, não são repetíveis em sede de julgamento na Relação), dúvidas não existem que o pensamento legislativo consagrado no citado artigo 662.º, n.º 1 [e, ainda, no n.º 2 alíneas a) e b) do mesmo preceito legal] aponta no sentido de a Relação se assumir:

«(…) Como verdadeiro tribunal de instância e, por isso, desde que, dentro dos seus poderes de livre apreciação dos meios de prova, encontre motivo para tal, deve introduzir as modificações que se justificarem (…), fica claro que a Relação tem autonomia decisória competindo-lhe formar e formular a sua própria convicção, mediante a reapreciação dos meios de prova indicados pelas partes ou daqueles que se mostrem acessíveis e com observância do princípio do dispositivo no que concerne à identificação dos pontos de discórdia.»[11] (Fim da transcrição e negrito nosso)

Reiterando as sábias palavras de António Abrantes Geraldes [12] os objetivos projetados pelo legislador no que concerne ao duplo grau de jurisdição determinam o seguinte:
a) «Reapreciação dos meios de prova especificados pelo recorrente através da audição das gravações e/ou da leitura das transcrições que porventura sejam apresentadas.
b) Conjugação desses meios de prova com outros indicados pelo recorrido ou que se mostrem acessíveis, por constarem dos autos (v.g. documentos, relatórios periciais, atas de inspeção judicial ou relatórios de verificações não judiciais qualificadas) ou da gravação (v.g. depoimentos ou declarações de parte, depoimentos de testemunhas ou esclarecimentos verbais prestados por peritos).
c) Renovação de algum ou alguns depoimentos cuja audição suscite dúvidas sérias sobre a credibilidade do depoente ou mesmo produção de novos meios de prova que potenciem a superação das dúvidas sérias sobre a prova anteriormente produzida. (negrito nosso).
d) Formação da convicção autónoma em relação à matéria de facto impugnada, introduzindo na decisão as modificações que forem consideradas pertinentes (negrito nosso).
e) Sem embargo da ponderação das circunstâncias que rodeiam o julgamento da matéria de facto, a Relação goza no exercício desta função dos mesmos poderes atribuídos ao tribunal a quo, sem exclusão dos que decorrem do princípio da livre apreciação genericamente consagrado no art. 607.º, n.º 5, e a que especificamente se alude nos arts. 396.º (prova testemunhal), 359.º (presunções judiciais), 351.º (reconhecimento não confessório), 376.º, n.º 3 (certos documentos), 391.º (prova pericial), todos do CC, e arts. 466.º, n.º 3 (declarações de parte), e 494.º, n.º 2, do CPC (verificações não judiciais qualificadas).
f) Consequentemente está afastada, em definitivo, a defesa de que a modificação na decisão da matéria de facto apenas deve operar em casos de “erros manifestos”, assim como é insuficiente que na apreciação do recurso de apelação, na parte que envolva a decisão da matéria de facto, a Relação se limite a aludir a eventuais dificuldades decorrentes dos princípios da imediação, da oralidade e da livre apreciação das provas, sem efetiva ponderação dos meios de prova que foram produzidos e que se mostrem acessíveis. Sem embargo dos naturais condicionalismos que rodeiam a tarefa de reapreciação da decisão sobre a matéria de facto, desde que a Relação, no quadro da aplicação do art. 662.º, acabe por formar uma diversa convicção sobre os pontos de facto impugnados, deve refletir em nova decisão esse resultado[13](Fim da transcrição e negrito nosso).

De todo o modo, isto é, sem prejuízo dos aludidos poderes da Relação, ao nível da reapreciação dos meios de prova produzidos em 1ª instância e formação da sua própria e autónoma convicção, a alteração da decisão de facto deve ser efetuada com segurança e rodeada da imprescindível prudência e cautela, centrando-se nas desconformidades encontradas entre a prova produzida em audiência, após a efetiva audição dos respetivos depoimentos, e os fundamentos indicados pelo julgador da 1.ª instância e nos quais baseou as suas respostas, e que habilitem a Relação, em conjunto com outros elementos probatórios disponíveis, a concluir em sentido diverso, quanto aos concretos pontos de facto impugnados especificadamente pelo recorrente.

Com efeito conforme é sublinhado por Ana Luísa Geraldes[14], em «caso de dúvida, face a depoimentos contraditórios entre si e à fragilidade da prova produzida[15], deverá prevalecer a decisão proferida pela 1.ª instância, em observância dos princípios da imediação, da oralidade e da livre apreciação da prova, com a consequente improcedência do recurso nesta parte.» (Fim da transcrição)

Mais à frente remata: «O que o controlo de facto em sede de recurso não pode fazer é, sem mais, e infundadamente, aniquilar a livre apreciação da prova do julgador construída dialeticamente na base dos referidos princípios da imediação e da oralidade.» (Fim da transcrição)

Quer isto dizer que na reapreciação da prova pela 2.ª instância, não se procura obter uma nova (e diversa) convicção a todo o custo, mas verificar se a convicção expressa pelo Tribunal a quo tem suporte razoável, à luz das regras da experiência e da lógica, atendendo aos elementos probatórios que constam dos autos, e aferir, assim, nestes termos, se houve erro de julgamento na apreciação da prova e na decisão da matéria de facto, sendo necessário, de qualquer forma, que os elementos de prova se revelem inequívocos no sentido pretendido pelo recorrente, impondo, pois, decisão diversa da proferida pelo tribunal recorrido – artigo 640º, n.º 1 alínea b), parte final, do Código de Processo Civil.

Assim competirá ao Tribunal da Relação reapreciar as provas em que assentou a parte impugnada da decisão, tendo em atenção o conteúdo das alegações do recorrente e recorrido, sem prejuízo de oficiosamente atender a quaisquer outros elementos probatórios que hajam servido de fundamento à decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados.

Sem embargo apesar de se garantir um duplo grau de jurisdição, tal deve ser enquadrado com o princípio da livre apreciação da prova pelo julgador, previsto no artigo 607.º, n.º 5, do Código de Processo Civil, sendo certo que decorrendo a produção de prova perante o juiz de 1.ª instância, este beneficia dos princípios da oralidade e da mediação, a que o tribunal de recurso não pode já recorrer.

De acordo com Miguel Teixeira de Sousa[16]: «Algumas das provas que permitem o julgamento da matéria de facto controvertida e a generalidade daquelas que são produzidas na audiência final (…), estão sujeitas à livre apreciação do Tribunal (…). Esta apreciação baseia-se na prudente convicção do Tribunal sobre a prova produzida (art.º 655.º, n. º1), ou seja, as regras da ciência e do raciocínio e em máximas da experiência”.» (Fim da transcrição)

Assim para que a decisão da 1.ª instância seja alterada haverá que averiguar se algo de “anormal” se passou na formação dessa apontada “convicção”, ou seja, ter-se-á que demonstrar que na formação da convicção do julgador de 1.ª instância, retratada nas respostas que se deram aos factos, foram violadas regras que lhe deviam ter estado subjacentes, nomeadamente face às regras da experiência, da ciência e da lógica, da sua conformidade com os meios probatórios produzidos, ou com outros factos que deu como assentes.

Não obstante e apesar da apreciação em primeira instância ser construída com recurso à imediação e oralidade, tal não impede à «Relação de formar a sua própria convicção, no gozo pleno do princípio da livre apreciação das provas, tal como a 1.ª instância, sem estar de modo algum limitada pela convicção que serviu de base à decisão recorrida (…). Dito de outra forma, impõe-se à Relação que analise criticamente as provas indicadas em fundamento da impugnação, de modo a apreciar a sua convicção autónoma, que deve ser devidamente fundamentada.»[17] (Fim da transcrição)

Contudo, importa dizê-lo, no contexto do julgamento da matéria de facto, seja ao nível da 1.ª instância, seja ao nível da sua reapreciação no Tribunal de 2.ª instância, a reconstrução histórica do material fáctico não persegue uma verdade absoluta ou uma certeza naturalística (própria de outros ramos das ciências), mas um grau de certeza empírica e histórica, baseada num alto grau de probabilidade.

Como salienta Manuel de Andrade: «a prova não é certeza lógica, mas tão-só um alto grau de probabilidade, suficiente para as necessidades práticas da vida (certeza histórico-empírica).»[18] (Fim da transcrição)

Feito este enquadramento haverá que aferir quais os pontos concretos que devem ser apreciados por este Tribunal:

O Recorrente impugna os pontos k), m) e n) dos factos dados por provados, pugnando que os mesmos sejam dados por não provados.

Os pontos de facto impugnados têm o seguinte teor:

«k) O Autor tem duas filhas de 7 anos e de 18 meses, cabendo-lhe levá-los à escola e ao infantário ambos na Maia, já que a sua mulher iniciava a sua prestação de trabalho de esteticista, na Maia às 8h30m (artigo 13.º da petição inicial).

(…)

m) Para se deslocar de ... para o novo local de trabalho em Amarante o Autor teria de apanhar um autocarro às 7h 34m, para se deslocar ao Hospital .../Porto; aí apanharia uma camioneta no ... às 8h30m, chegando a Amarante cerca das 9h10m, depois teria de fazer uma caminhada a pé, de cerca de 20 minutos (artigo 13.º da petição inicial).

n) No regresso a casa após a caminhada de 20 minutos teria a camioneta às 19h 30m, chegando ao Porto às 20h 15m e após aguardaria pelo autocarro do B... até ..., chegando a casa depois das 21h, encontrando os filhos a dormir (artigo 13.º da petição inicial).» (Fim da transcrição)

O Tribunal recorrido motivou os pontos de facto impugnados da forma que se segue:

«(…)

Os factos provados j), k), l), m) e n) resultam das declarações de parte do Autor que explicou onde reside; as filhas e respetivas idades; a possibilidade que tinha de almoçar em casa e o percurso que teria de fazer para Amarante.

As declarações de parte do Autor mereceram a credibilidade do Tribunal pois foram prestadas de forma franca e espontânea, não se tendo escusado o Autor a responder ao Tribunal mesmo quando as perguntas eram incómodas.

Acresce que as declarações de parte do Autor foram corroboradas pelas testemunhas BB e CC, colegas de trabalho do Autor na loja que foi encerrada.

A testemunha BB esclareceu o Tribunal que trabalhava com o Autor na loja ..., que sabia que o Autor residia em ... que era próximo do local de trabalho. Estava lá há bastante tempo, o Autor é casado, tem duas filhas, uma com 7 anos e a outra com 2 anos. Esclareceu que a DD andava na escola e a mais pequena no infantário, ambos na Maia. A mulher do Autor é esteticista, tem o estabelecimento na Maia, entrava de manhã e era o Autor quem levava as filhas à escola e ao infantário. Acrescentou que o Autor umas vezes almoçava no trabalho e outras ia a casa. Esta testemunha que estava na mesma posição que o Autor referiu que não iria para Amarante, seria longe e, por isso, chegou a acordo com a Ré.

O depoimento desta testemunha mereceu a credibilidade do Tribunal pois prestou um depoimento franco e circunstanciado, próprio de quem toma conhecimento dos factos pelos anos de convivência em que vai vendo e conversando com o seu colega de trabalho sobre as suas condições de vida.

A testemunha CC, esclareceu o Tribunal que foi colega do Autor na loja que fechou, na qual o Autor trabalhava há muitos anos. Também esclareceu que o Autor morava na Maia que era perto do trabalho, o Autor é casado tem duas filhas que andam as duas na escola na Maia, quem as levava era o Autor; a mulher dele trabalha, acha que começava a trabalhar às 8h. Sabe que o Autor deixava as meninas às 9h, o Autor por vezes almoçava em casa. Esta testemunha referiu igualmente que nem sequer considerou a ida para Amarante tendo em consideração que teria de ir de comboio para Amarante e o tempo que perderia nas viagens.

O depoimento desta testemunha mereceu a credibilidade do Tribunal pelos mesmos motivos que a anterior testemunha.

O depoimento destas testemunhas foi fundamental para estabelecer estes factos pois resulta da normalidade da vida em que os colegas de trabalho vão conhecendo as rotinas um dos outros ao longo de anos de convivência no mesmo local de trabalho.» (Fim da transcrição)

Cumpre apreciar e decidir:

Verifica-se que a Recorrente observou cabalmente os ónus que recaem sobre aquele que impugna a decisão da matéria de facto, impõe-se, portando, reexaminar os pontos de facto impugnados.

Após a audição e análise dos depoimentos colhidos na audiência final, constata-se que a sentença recorrida, de forma clara e detalhada, sintetizou os aspetos relevantes da prova oral.

Não há elementos novos a acrescentar à motivação feita pela Sr.ª Juíza a quo.

Considerando o conjunto probatório, conclui-se inexistir erro de julgamento na apreciação da prova e na decisão da matéria de facto.

A versão dos factos trazida a juízo e dada como provada nos pontos k), m) e n), encontram amparo nos depoimentos das testemunhas BB e CC, assim como nas declarações de parte do Autor, conforme a fundamentação que consta na decisão recorrida.

Por esses motivos, mantém-se inalterados os referidos pontos fácticos.

Vejamos agora a ampliação da decisão da matéria de facto pretendida pela Recorrente com o aditamento da matéria por esta indicada na sua conclusão VI, e considerar como não provada o que consta na sua conclusão XIV, a saber:

Conclusão VI

«q) O trabalhador teve conhecimento do conteúdo segunda carta antes de enviar a carta de resolução;

r) A transferência tinha carater temporário;

s) Inexiste prejuízo na relação com as filhas menores;

t) Que o trabalhar trabalhava por turnos rotativos já trabalhando dois a três dias por semana até as 22 horas.

u) Inexiste prejuízo sério com o acréscimo de tempo nas deslocações;

v) Inexiste prejuízo sério com o acréscimo de custos nas deslocações.» (Fim da transcrição)

Conclusão XIV

«- Impossibilidade de a Entidade custear antecipadamente os custos das deslocações;

- Impossibilidade de o Empregador custear as despesas decorrentes de transporte em veículo próprio.» (Fim da transcrição)

Perfilha-se aqui o raciocínio subjacente ao Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 20.05.2024, relator: Carlos Gil, Processo n.º 4929/21.0T8MTS-G.P1[19], quando nele se diz:

«(…), antes ainda de entrar no conhecimento da pretendida impugnação da decisão da matéria de facto, importa aferir se o seu conhecimento se reveste de utilidade, pois que é proibida a prática no processo de atos inúteis (artigo 130º do Código de Processo Civil).

Na verdade, a reapreciação da matéria de facto não é um exercício dirigido a todo o custo ao apuramento da verdade afirmada pelo recorrente mas antes e apenas um meio do recorrente poder reverter a seu favor uma decisão jurídica fundada numa certa realidade de facto que lhe é desfavorável e que o recorrente pretende ver reapreciada de modo a que a realidade factual por si sustentada seja acolhida judicialmente.

Logo que faleça a possibilidade de uma qualquer alteração da decisão factual poder ter alguma projeção na decisão da matéria de direito em sentido favorável ao recorrente, deixa de ter justificação a reapreciação requerida, constituindo antes a prática de um ato inútil e, por isso, proibido (veja-se o já citado artigo 130º do Código de Processo Civil).

Importa ainda verificar se toda a matéria cuja impugnação foi requerida pela recorrente se reveste das condições necessárias para poder ser objeto de um juízo probatório, ou seja, se está em causa matéria de facto passível de prova, ou pelo contrário, se na impugnação requerida pela recorrente se inclui matéria conclusiva ou puramente valorativa.

Na nossa perspetiva, é matéria conclusiva toda aquela que não consiste na perceção de uma ocorrência da vida real, trate-se de um facto externo ou interno, mas antes constitui um juízo acerca de certa realidade factual.

Dentro desta matéria conclusiva, devem em nosso entender, distinguir-se os juízos de facto periciais, dos juízos de facto comuns passíveis de serem emitidos por qualquer pessoa com base nos seus conhecimentos.

Os juízos de facto passíveis de ser emitidos por qualquer pessoa com base nos seus próprios conhecimentos devem ser emitidos pelo julgador, no momento em que valora a globalidade da factualidade provada, pois que as testemunhas são chamadas a depor sobre factos e não a emitir opiniões ou juízos.

Esta distinção justifica-se, em nosso entender, porque pode ser objeto de prova pericial a apreciação de factos, quando para tanto sejam necessários conhecimentos especiais que os julgadores não possuam, ou quando os factos, relativos a pessoas, não devam ser objeto de inspeção judicial (artigo 388º do Código Civil).

Assim, é a própria lei substantiva a determinar que a prova pericial pode consistir na emissão de juízos de valor sobre certos factos. Desta configuração substantiva da prova pericial há que, salvo melhor opinião, retirar as necessárias consequências do ponto de vista processual, nomeadamente, no que tange a delimitação do objeto da prova que, em consonância, no que respeita tal meio de prova, não se poderá restringir aos “factos necessitados de prova” (parte final do artigo 410º do Código de Processo Civil), devendo também abarcar a apreciação de factos por peritos, dada a vocação instrumental do direito adjetivo. A não se proceder assim, não se perceberia qual a utilidade probatória da emissão de juízos de valor pelos peritos.» (Fim da transcrição)

Vejamos, então, se, no que tange à matéria impugnada pelo Recorrente, se verifica algum dos obstáculos que acabamos de identificar.

Os pontos q), r), s), u), v), constantes da conclusão VI, bem como o que se encontra na conclusão XIV das alegações de recurso da apelante, contêm um juízo meramente conclusivo.

Com efeito, não consistem na perceção de um acontecimento da vida real, mas antes consubstanciam um juízo acerca de determinada realidade factual.

Como refere Helena Cabrita[20]:

«Os factos conclusivos são aqueles que encerram um juízo ou conclusão, contendo desde logo em si mesmos a decisão da própria causa ou, visto de outro modo, se tais factos fossem considerados provados ou não provados toda a ação seria resolvida (em termos de procedência ou improcedência) como base nessa única resposta». (Fim da transcrição)

Desde logo, a menção à “inexistência de prejuízo sério” e ao “carácter temporário da transferência” [pontos r), s), u) e v)] possui uma inequívoca qualificação jurídica que não é passível de prova, podendo operar apenas em sede de fundamentação jurídica, desde que estejam provados factos concretos que permitam tal qualificação.

Ademais, quanto ao ponto q), deve-se excluir essa matéria dos fundamentos de facto, uma vez que não se trata de matéria suscetível de prova; ao invés, contém matéria genérica e conclusiva.

Como se sabe, apenas pode ser produzida prova sobre os factos concretos que permitem a extração da conclusão nela vertida e, sendo o caso, sobre os factos que concretizam a factualidade genérica alegada.

Finalmente, quanto ao que é pretendido pela Recorrente na conclusão XIV, a que acima se fez referência, além de ser genérico e conclusivo, é totalmente inócuo para o desfecho desta ação.

Isso é suficiente, para que não deva ser objeto de cognição por este Tribunal de recurso em sede de impugnação da decisão da matéria de facto, sob pena de, ao não proceder assim, se praticar uma atividade inútil, legalmente proibida (artigo 130.º do Código de Processo Civil).

Resta, então, apreciar se deve ser aditado ou não à matéria de facto provada o que consta no ponto t), da conclusão VI da Recorrente.

Nos termos do disposto na alínea c), do n.º 2, do artigo 662.º do Código de Processo Civil, a Relação deve, ainda, mesmo oficiosamente, anular a decisão proferida na 1ª instância, quando, não constando do processo todos os elementos que, nos termos do número anterior, permitam a alteração da decisão proferida sobre a matéria de facto, repute deficiente, obscura ou contraditória a decisão sobre pontos determinados da matéria de facto, ou quando considere indispensável a ampliação desta.

Deste modo, o Tribunal ad quem deve proceder à ampliação da matéria de facto sempre que conclua que, à luz das diversas soluções plausíveis das questões de direito, existe matéria de facto alegada que não foi apreciada pelo Tribunal recorrido, emitindo um juízo de provado ou não provado, desde que se trate de matéria indispensável à dilucidação das referidas soluções plausíveis.

A ampliação da decisão da matéria de facto pode ainda decorrer de factualidade complementar ou concretizadora da alegada pelas partes e que se tenha revelado no decurso da instrução da causa, tal como previsto na alínea b), do nº 2, do artigo 5º do Código de Processo Civil, ou ainda quando estejam em causa factos notórios ou conhecidos do Tribunal em virtude do exercício das suas funções, nos termos da alínea c), do n.º 2, do artigo 5.º do Código de Processo Civil.

Por último, a ampliação da decisão sobre a matéria de facto, quando necessária, processar-se-á no tribunal ad quem, desde que para tanto constem do processo todos os elementos que permitam essa ampliação, pressupondo que sobre a matéria em causa foi produzida prova, com a devida observância do contraditório.

Posto isto, lendo atentamente o articulado de contestação apresentado pela Recorrente, verifica-se que nada foi alegado por esta quanto a tal matéria, e também não se vislumbra que o solicitado em sede recursiva seja um facto complementar ou concretizador de factos por si alegados aquando da sua contestação.

Cumpre acrescentar que, embora o Autor tenha mencionado, durante a Audiência Final, um horário de trabalho por turno nas suas declarações, fê-lo de forma vaga e imprecisa, sem apresentar os devidos detalhes e minúcias.

Esta falta de concretização é manifestamente insuficiente para que se considere provada a alegação constante do ponto t) da conclusão IV das alegações de recurso da Recorrente.

Em conclusão, a impugnação da decisão da matéria de facto improcede na sua totalidade, pelos motivos supra expostos.


*

IV - FUNDAMENTOS DE DIREITO:

A sentença sob recurso assenta o decidido num processo de raciocínio estruturado a partir da análise de duas matérias, a seguir identificadas:

A – A ordem de transferência do local de trabalho é temporária ou definitiva.

B – Caso a ordem de transferência do local de trabalho seja definitiva, da existência ou não do prejuízo sério para a resolução do contrato de trabalho pelo Autor.

Deste modo, o Tribunal explana o seu raciocínio, nos seguintes termos.

I – O ato inicial que deu a ordem de transferência do local de trabalho pela Ré/empregadora ao Autor/trabalhador está integralmente descrito no facto provado g).

II - É com esta declaração negocial recebida pelo trabalhador que este terá de decidir o que fazer, se aceitar a ordem de transferência, se reagir a ela, como por ex. com a resolução do contrato de trabalho aqui em causa.

III - A Ré comunica a transferência do local de trabalho nos termos do artigo 194.º, n.º 1, alínea a) e alínea b) do Código do Trabalho, e aqui começa a confusão com a indicação das duas alíneas.

IV - O declaratário médio colocado na posição do Autor lê a ordem de transferência para Amarante por causa da extinção/encerramento do estabelecimento comercial onde prestava trabalho, e só pode concluir que se trata de uma transferência definitiva.

V - A ordem dada pela Ré ao Autor é a da se apresentar em Amarante, por causa da extinção do estabelecimento comercial, sem qualquer outra explicação, seja o que se seguirá a Amarante ainda que de forma genérica e, a razão pela qual prevê o limite máximo previsto na lei e não prevê outro qualquer período.

VI - O Autor recebe o salário de € 760,00, com o subsídio de alimentação de € 4,46¸ irá do município ... para o município ..., num percurso de 60,7 km de autoestrada (... e ... ou ...) e de volta, em veículo próprio e a pagar portagens diárias de 23,38 (€ 11,69 + € 11,69), ora € 23,38 x 22 dias do mês = € 514,36.

VII - Para ir de transportes públicos como não existe um autocarro direto entre a Maia e Amarante, o Autor teria de apanhar um autocarro desde a Maia até ao Porto e um outro desde o Porto a Amarante, cuja viagem de ida é de € 11,00, de volta igual, sem contar com o pagamento do bilhete de ida e volta do autocarro da maia para o Porto, temos o autocarro para Amarante a um custo diário de € 22,00 x 22 dias = € 484,00.

VIII - A Ré não podia afirmar singelamente que “irá custear o acréscimo de despesas de deslocação comprovadas decorrentes da transferência do local de trabalho”, tinha de apresentar uma solução, ainda que a mais barata que é sempre exageradamente cara face ao salário do Autor, e oferecer o adiantamento dos custos. Ao invés de exigir do Autor despesas de deslocação comprovadas.

IX - Na carta datada de 14 de março de 2023 a Ré violou o dever de informação do Autor, não tendo cumprido o disposto no artigo 196.º do Código do Trabalho: a ordem escrita de transferência (leia-se a carta datada de 14 de março de 2023) é que decide a natureza e os contornos da transferência, pois é com esta comunicação que o trabalhador decide o que fazer.

X - A carta datada de 11/04/2023 (facto provado p)) que a Ré envia ao Trabalhador após a resolução do contrato demonstra essa violação e, mostra-se inócua pois a Ré apenas informa após a resolução do contrato.

XI – Saindo o Autor de casa de autocarro às 7h34, certamente não poderia levar as filhas a lado nenhum e, chegando a casa todos os dias após as 21h veria as filhas a dormir, não poderia exercer as responsabilidades parentais que ficariam integralmente a cargo da mãe.

XII - O que implicaria uma modificação substancial da vida do trabalhador em consequência desta transferência, deixaria de ser pai, pelo que, considera inequívoco o prejuízo sério para o Autor e, nesta conformidade, pela licitude da resolução do Contrato de trabalho nos termos do artigo 194.º, n.º 5, do Código do Trabalho.


*

Trata-se de uma sentença que utiliza uma fundamentação de facto e de direito, assertiva, clara e compreensível.

Importa aquilatar se as soluções são as acertadas.

Defende a Recorrente existir erro na aplicação do direito, desde logo, por entender que a transferência era meramente temporária e não definitiva (seria até ao momento em que a entidade empregadora encontrasse vaga em que o trabalhador pudesse exercer as suas funções num local mais próximo do antigo local), e sempre e em qualquer circunstância deverá considerar-se que o prejuízo a existir não pode ser considerado como sério.

Esta é a divergência fundamental que nos vem colocada em sede recursiva, a de saber se a ordem de transferência do local de trabalho era temporária ou definitiva.

Na eventualidade da transferência do local de trabalho ser definitiva, se se verifica ou não o prejuízo sério pressuposto para a resolução do contrato de trabalho, nos termos previstos pelo artigo 194.º, n.º 5, do Código do Trabalho (2009)[21].

Vejamos:

Conforme o artigo 193.º, n.º 1, o local de trabalho é, em regra, aquele definido contratualmente para o exercício da atividade laboral.

Traduz-se na parametrização geográfica da atividade contratual. É o espaço físico/geográfico no qual deve ser realizada a prestação do trabalhador por força contratual: o trabalhador só está obrigado a cumprir num determinado espaço geográfico e só cumpre a sua obrigação se realizar a prestação no seu local de trabalho

Assim, o local de trabalho é, em princípio, o centro estável onde o trabalhador presta a sua atividade (oficina, escritório, estabelecimento comercial, etc.), excetuando certas atividades instáveis por natureza (condutor de veículos, caixeiro viajante, inspetor, etc.), por força contratual (n.º 2, do artigo 193.º).

Com arrimo na factualidade acima dada por provada, não restam dúvidas que o local de trabalho do Recorrido se situava no ..., no Porto [ponto provado em d)] – a execução contratual leva-nos a tal conclusão.

Não se provou a existência de qualquer cláusula de mobilidade geográfica.

O local de trabalho tem um papel central na proteção da dignidade do trabalhador e na garantia de condições de trabalho justas e equitativas.

Com efeito, a liberdade de conformação conferida às partes, é temperada pela tutela constitucional da esfera jurídica do trabalhador relacionada com a organização das condições de trabalho em condições que facultam a respetiva realização pessoal e permitam a conciliação da atividade profissional com a vida familiar [artigo 59.º, n.º 1, alínea b), da Constituição da República Portuguesa, e artigos 127.º, n.º 3 e 212.º, n.º 2, alínea b)], e o repouso e o lazer [artigo 59.º, n.º 1, alínea d), da Constituição da República Portuguesa].

O local de trabalho é de relevância decisiva para o trabalhador porque será a partir daí que, regra geral, irá estabelecer o centro do seu universo e a vivência familiar e social, existirão, assim, limites de razões de ordem pública (artigo 280.º, n.º 2, do Código Civil).

Também é, de igual modo, relevante para a sua contraparte contratual, visto estabelecer os limites geográficos dentro dos quais o empregador pode exercer o seu poder de direção (artigo 97.º).

Ora, como se sabe, o artigo 129.º, n.º 1, alínea f), consagra o denominado princípio/garantia da inamovibilidade.

Com efeito, o local de trabalho só pode ser alterado (mobilidade geográfica):

> Por acordo,

> Nas situações previstas em sede de instrumento de regulamentação coletiva,

> Unilateralmente, pelo empregador no exercício do seu poder de direção (artigo 97.º), nas situações previstas no artigo 194.º,

> Potestativamente, a pedido do trabalhador – artigo 195.º.

Cumpre apreciar da licitude/ilicitude da ordem de transferência do local de trabalho pela empregadora.

A missiva de 14 de março de 2023 evidencia que a transferência do trabalhador para Amarante foi consequência direta do encerramento definitivo do estabelecimento no …, no Porto, em 31 de março.

Destarte, estamos perante uma transferência coletiva [artigo 194.º, n.º 1, alínea a)], por decisão unilateral imposta pelo empregador.

Nas situações previstas no artigo 194.º, n.º 1, alínea a), basta para que a ordem de transferência se possa considerar lícita que, ocorra uma mudança ou extinção, total ou parcial, do estabelecimento onde o trabalhador presta serviço (v.g., o interesse da empresa funda-se na mudança do estabelecimento).

Nos termos do n.º 3, do artigo 194.º, a transferência temporária não pode exceder seis meses, salvo por exigências imperiosas do funcionamento da empresa, mas a ordem deve ser expressa no sentido da temporalidade da deslocação, e da sua duração máxima previsível.

Na transferência temporária (ao contrário da definitiva) não se preveem os direitos de resolução e indemnização, pois devido ao curto espaço de tempo normalmente não chega a existir um prejuízo particularmente sério ou relevante.

A missiva inicial [v.g. o ponto g) da factualidade acima identificada] indicava, aparentemente, uma transferência temporária de seis meses, o prazo máximo legal (por regra).

Todavia, a factualidade apurada no seu todo desmente tal asserção. É que tudo aponta para uma transferência a título definitivo.

A decisão recorrida conclui corretamente que, diante do encerramento do estabelecimento no Porto, um trabalhador, ao ser transferido para Amarante, entenderia naturalmente que a mudança era definitiva.

A alegação de temporalidade feita pela Ré na ordem de transferência, contradiz, no entanto, a razão alegada para a transferência, ou seja, o encerramento definitivo do estabelecimento no Porto.

A alegação de que a transferência seria temporária, até que fosse encontrada uma vaga mais próxima, surgiu apenas posteriormente, em 11 de abril de 2023, contradizendo a comunicação inicial [vide, o ponto p)].

Nos termos do artigo 194.º, n.º 4, quer na transferência definitiva, quer na transferência temporária: “O empregador deve custear as despesas do trabalhador decorrentes do acréscimo dos custos de deslocação e da mudança de residência ou, em caso de transferência temporária, de alojamento”.

A jurisprudência tem vindo a afirmar que é devida a compensação não pela distância percorrida entre a residência do trabalhador e o seu novo posto de trabalho e o custo a suportar por essa deslocação, mas sim a diferença entre aquela distância (e respetivo custo de deslocação) e a outra que o trabalhador já percorria para o seu originário posto de trabalho (e correspondente custo)[22].

E que não estando provada a impraticabilidade do transporte público, o empregador deve custear as despesas do trabalhador com a utilização daqueles transportes[23].

Entende-se também que os custos das despesas de deslocação não abrangem os elementos difusos, por exemplo, o agravamento do custo de vida no novo local de trabalho, e que o tempo de deslocação superior não é considerado como tempo de trabalho apenas podendo ser ponderado como prejuízo sério[24].

A sentença recorrida acertadamente observa que a Recorrente, ao ordenar a transferência, limitou-se a invocar o artigo 194.º, n.º 4, omitindo qualquer proposta concreta para suportar os custos adicionais impostos ao trabalhador.

Em vez disso, exigiu que este comprovasse, a priori, despesas que ainda não havia realizado ou, que só iriam ser pagas a posteriori mediante comprovativo de despesas efetuadas.

Por outro lado, o artigo 196.º estabelece o procedimento que o empregador deve cumprir quando unilateralmente decida alterar o local de trabalho.

A procedimentalização é uma técnica de controlo (e até certo ponto de limitação) dos poderes do empregador.

A ordem de transferência tem de ser dada com uma certa antecedência, com oito dias de antecedência no caso de transferência temporária ou de trinta dias no caso de transferência definitiva, por escrito, e “devidamente fundamentada”.

Esse dever de fundamentação visa garantir à montante a sindicância da conformidade da decisão do empregador com os limites impostos pela lei

Os fundamentos a apresentar pelo empregador estão relacionados com a justificação do interesse da empresa na transferência do trabalhador e estes devem adequar-se, no caso da transferência temporária, ao tempo pelo qual o trabalhador vai ser transferido.

No caso sub judice a ordem de transferência, emitida por escrito, alegou caráter temporário, justificando-se pela extinção do estabelecimento onde o trabalhador prestava serviços.

Reitera-se, a duração de seis meses nela indicada (duração máxima, em regra, permitida para a transferência temporária), não corresponde à realidade.

Com efeito, a alegação de temporalidade contradiz a justificativa da transferência, qual seja, o encerramento definitivo do estabelecimento.

Conclui-se, portanto, que a transferência foi, na prática, definitiva, e nesse pressuposto, verifica-se que a antecedência de 30 dias prevista no citado artigo 196.º, não foi acautelada [remissão para o ponto g) da factualidade dada por provada].

Sem embargo, como meio de reação a tal ordem o Recorrido optou pela resolução do contrato de trabalho, nos termos do artigo 194.º, n.º 5, com direito à compensação prevista no artigo 366.º.

Como vimos, verifica-se o fundamento legal para a transferência definitiva do local de trabalho, nos termos do artigo 194.º, n.º 1, alínea a).

Nesta situação, o requisito do prejuízo sério contido no n.º 5, do artigo 194.º, configura um requisito para a resolução do contrato de trabalho e não um requisito da modificação do local de trabalho e por isso, face à regra do artigo 342.º do Código Civil, caberá ao trabalhador o ónus de alegar e provar os factos que integram esse prejuízo sério, a fim de poder invocar o direito à resolução com direito à compensação do artigo 366.º.

O prejuízo sério situa-se fora e para além dos custos de deslocação, bem como das resultantes da mudança de residência, uma vez que estas são suportadas pelo empregador

E tem como parâmetro a boa fé (artigo 126.º), não se pode reduzir à pequena dimensão de um “incómodo” ou de um “transtorno” suportáveis (ideia de seriedade do prejuízo)

A jurisprudência acentua que o prejuízo sério tem de consubstanciar uma modificação substancial no “plano de vida” pessoal e profissional, do trabalhador[25], a valorar casuisticamente em face das circunstâncias envolventes por se tratar de um conceito indeterminado.

Ou seja, requisito a verificar, no caso concreto, assente na exigência de uma modificação significativa na vida do trabalhador em razão da mudança do local de trabalho, e afere-se na consideração de elementos factuais concretos da organização da vida pessoal e familiar do trabalhador.

Acresce que o prejuízo apurado é apenas um prejuízo hipotético ou virtual.

Têm sido apontados como fatores a avaliar:

> a nível pessoal o tempo despendido em deslocações a realizar para o novo local de trabalho, e a impossibilidade da prática de outras atividades profissionais ou extralaborais, etc.;

> a nível familiar, o local de trabalho do cônjuge, o local da escola dos filhos, a necessidade de assistência a pessoas de família, etc.

Do cotejo da factualidade acima provada, temos que o Recorrido auferia a retribuição base mensal de € 760,00, acrescido do subsídio de refeição no valor diário de € 4,46.

Residia em ..., e tem duas filhas menores, cabendo-a ele levá-las à escola e ao infantário ambos na Maia, já que a sua esposa iniciava a sua prestação de trabalho de esteticista, na Maia às 08H30.

Deslocava-se amiúde a casa para almoçar.

Para se deslocar de ... para o novo local de trabalho em Amarante o Autor teria de apanhar um autocarro às 7h34m, para se deslocar ao Hospital .../Porto; aí apanharia uma camioneta no ... às 8h30m, chegando a Amarante cerca das 9h10m, depois teria de fazer uma caminhada a pé, de cerca de 20 minutos.

E no regresso a casa após a caminhada de 20 minutos teria a camioneta às 19h 30m, chegando ao Porto às 20h15m e após aguardaria pelo autocarro do B... até ..., chegando a casa depois das 21h, encontrando as filhas a dormir.

Diante dos factos apresentados, conclui-se que a transferência imposta ao trabalhador acarretava uma mudança significativa e gravosa da sua rotina, constituindo um prejuízo sério, mesmo com o pagamento das despesas de deslocação.

A Recorrente, em momento posterior [v.g. do ponto p)], menciona que o acréscimo de tempo despendido com a deslocação seria incluído no horário de trabalho. No entanto, essa declaração além de tardia é vaga, não especifica sequer como essa compensação no horário de trabalho seria realizada.

Assim, operando um juízo antecipado de adequação causal, a transferência é suscetível de gerar um impacto significativo na vida pessoal, familiar, e social do trabalhador, limitando o seu tempo livre, no convívio em atividades lúdicas e de lazer, e comprometendo as suas responsabilidades familiares, como o cuidado com as filhas menores.

Neste conspecto, a manutenção do contrato de trabalho nessas condições, seria excessivamente onerosa para o trabalhador (não se trata de um mero incómodo ou transtorno suportável), pelo que, não lhe era exigível a perduração do vínculo laboral.

Consequentemente, improcedem as conclusões do recurso, devendo ser confirmada a decisão recorrida.


*

V. DECISÃO:

*

Pelo exposto, acordam as juízas desembargadoras da Secção Social do Tribunal da Relação do Porto:
I) Em julgar totalmente improcedente a impugnação da matéria de facto.
II) Em julgar no mais improcedente o recurso interposto pela Ré e, em consequência, confirmar a decisão recorrida.

Custas pela Recorrente, com taxa de justiça conforme tabela I-B anexa ao Regulamento Custas Processuais (cfr. artigo 7.º, n.º 2 do Regulamento Custas Processuais).

Valor do recurso: o da ação (artigo 12.º, n.º 2 do Regulamento Custas Processuais).

Notifique e registe.


Porto, 11/12/2024
Sílvia Saraiva
Germana Ferreira Lopes
Teresa Sá Lopes
_________________
[1] Segue-se, com ligeiras alterações, o relatório da decisão recorrida.
[2] Em sede de ata de audiência final de 17.05.2024, foi autorizado pela Sr.ª Juíza a quo a retificação do erro de cálculo do valor da compensação inicialmente indicado pelo Autor na petição inicial.
[3] Objeto de transcrição - os factos postos em causa pela Recorrente estão destacados a negrito (e os não provado em itálico).
[4] GERALDES, António Santos Abrantes, in “Recursos em Processo Civil”, 7.º Edição; Edições Almedina, S.A. p. 197-199.
[5] Nota: A apresentação das transcrições globais dos depoimentos das testemunhas não satisfaz a exigência determinada pela al. a), do n.º 2, do artigo 640.º do Código de Processo Civil, neste sentido, veja-se, os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 19.02.2015, (relator: Tomé Gomes), Processo n.º 299/05.6TBMGD.P2.S1; (relatora: Maria dos Prazeres Pizarro Beleza). Processo n.º 405/09.1TMCBR.C1.S1, ambos disponíveis in www.dgsi.pt. Veja-se, todavia, sobre a admissibilidade da impugnação de factos em bloco, desde que interligados, os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 14.07.2021, Processo n.º 1006/11 (relator: Júlio Gomes), e de 19.05.2021, Processo n.º 4925/17 (relator: Chambel Mourisco), ambos disponíveis em www.dgsi.pt.
[6] Vide, neste sentido, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 03.12.2015 (relator: Melo Lima), Processo n.º 3217/12.12.1TTLSB.L1.S1, disponível in www.dgsi.pt, e o recente Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça n.º 12/2023 (relatora: Ana Resende), Processo n.º 8344/17.6T8STB.E1-A.S1 (Recurso para Uniformização de Jurisprudência), publicado no Diário da República n.º 220/2023, I Série, de 13-11-2023, pp. 44.º a 65.º, com a declaração de retificação n.º 35/2023, publicado no Diário da República, I Série, de 28.11.2023, que uniformizou a jurisprudência nos seguintes moldes: «Nos termos da alínea c) do n.º 1 do artigo 640.º do Código de Processo Civil, o Recorrente que impugna a decisão sobre a matéria de facto não está vinculado a indicar nas conclusões a decisão alternativa pretendida, desde que a mesma resulte, de forma inequívoca, das alegações.». O certo é que da leitura da sua fundamentação extrai-se que para cumprir os ónus legais, o Recorrente sempre terá de alegar e levar para as conclusões sob pena de rejeição do recurso, a indicação dos concretos pontos facto que considera incorretamente julgados, conforme o estabelecido na alínea a), do n-º 1, do artigo 640.º do Código de Processo Civil.
[7] GERALDES, António Abrantes; PIMENTA, Paulo, e SOUSA, Luís Filipe Pires de, in “Código de Processo Civil Anotado”, Vol. I (parte geral e processo de declaração), 3.ª Ed. Edições Almedina, S.A., p. 832.º.
[8] Vide, neste sentido, por todos. GERALDES, António Abrantes, PIMENTA, Paulo, e SOUSA, Luís Filipe Pires de, op. citada, p. 822.º, e ainda os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça nele mencionados: de 18.01.2022, Processo n.º 701/19 (relatora: Maria João Vaz Tomé); de 06.05.2021, Processo n.º 618/18 (relator: Nuno Pinto Oliveira); de 11.02.2021, Processo n.º 4279/17 (relatora: Maria da Graça Trigo); de 12.07.2018, Processo n.º 167/11 (relator: Ferreira Pinto) e de 21.03.2018, Processo n.º 5074/15 (relator: Ferreira Pinto), todos disponíveis in www.dgsi.pt.
[9] GERALDES, Ana Luísa, “Impugnação e Reapreciação da Decisão da Matéria de Facto”, in “Estudos em Homenagem ao Professor Doutor José Lebre de Freitas”, I volume, pág. 589 e sgs.
[10] Vide, neste sentido, por todos. GERALDES, António Abrantes, op. citada, p. 333.º.
[11] Vide, neste sentido, por todos, GERALDES, António Abrantes, op. cit., pág. 334; e, ainda, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 24.09.2013, Processo n.º 1965/04.TBSTB.E1.S1 (relator: Azevedo Ramos), disponível in www.dgsi.pt, comentado por SOUSA, Teixeira, nos Cad. De Direito Privado, n.º 44, pp. 29.º e sgs. ou, ainda, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 18.05.2017, Processo n.º 5164/07.0TLSB-B.L1.S1 (relatora: Ana Luísa Geraldes), também disponível in www.dgsi.pt.
[12] Vide, neste sentido, por todos, GERALDES, António Abrantes, op. cit., pp. 352.º e 353.º; e ainda o Acórdão Supremo Tribunal de Justiça, de 07.09.2017, Processo n.º 959/09 (relator: Tomé Gomes), disponível in www.dgsi.pt.
[13] Vide, neste sentido, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 16.12.2021, Processo n.º 513/19 (relator: Vieira e Cunha), disponível in www.dgsi.pt
[14] Vide, neste sentido, por todos, GERALDES, Ana Luísa, op. cit. Pp. 509.º e 610.º.
[15] Nota: a qual tem de ser reanalisada pela Relação mediante a audição dos respetivos registos fonográficos.
[16] SOUSA, Miguel Teixeira, in “Estudos sobre o novo Código de Processo Civil”, Edições Almedina, S.A, p. 347.º
[17] Vide, neste sentido, SOUSA, Luís Filipe, “Prova Testemunhal”, Edições Almedina, S.A, p. 389.º
[18] ANDRADE, Manuel, in “Noções Elementares de Processo Civil”, 1979, pág. 192; no mesmo sentido, vide, ainda, VARELA, Antunes, in “Manual de Processo Civil”, 2ª edição, pág. 435-436. Dizendo este último Professor: «A prova visa apenas, de acordo com os critérios de razoabilidade essenciais à aplicação prática do Direito, criar no espírito do julgador um estado de convicção, assente na certeza relativa do facto» (Fim da transcrição)
[19] Disponível in www.dgsi.pt.
[20] Veja-se, por todos, CABRITA, Helena, A fundamentação de Facto e de Direito da Decisão Cível, Coimbra Editora, Coimbra, 2015, pp. 106-107, citado no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 14.07.2021 (relator: Júlio Vieira Gomes), Processo n.º 19035/17, disponível in www.dgsi.pt.
[21] Diploma legal a que iremos fazendo referência, sem menção diversa – vide, o artigo 7.º, n.º 1, do diploma preambular da Lei n.º 07/2009, de 12 de fevereiro.
[22] Veja-se, por todos, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 16.09.2015 (relatora: Ana Luísa Geraldes), Processo n.º 34/13.5TTCLD.S1, disponível in www.dgsi.pt.
[23] Veja-se, por todos, os Acórdãos do Tribunal da Relação de Coimbra de 07.04.2016 (relator: Jorge Loureiro), Processo n.º 2750/14.5T8MAI.P1, e do Tribunal da Relação do Porto de 04.04.2022 (relatora: Paula Leal de Carvalho), Processo n.º 11/21.2T8VLG.P1, ambos disponíveis in www.dgsi.pt.
[24] Veja-se, por todos, o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 21.09.2015 (relator: Eduardo Petersen Silva), Processo n.º 409/12.7TTMTS.P1, disponível in www.dgsi.pt.
[25] Veja-se, por todos, entre outros, os Acórdãos do Tribunal da Relação de Guimarães de 20.02.2020 (relatora: Maria Leonor Chaves dos Santos Barroso), Processo n.º 6982/18.9T8VNF.G1; e do Tribunal da Relação do Porto de 10.12.2019 (relator: Domingos Morais), Processo n.º 1770/19.8T8AVR-A.P1, de 22.03.2021 (relator: Jerónimo Freitas), Processo n.º 5235/19.0T8MTS.P1 e de 28.11.2012 (relator: Ferreira Costa), Processo n.º 155/09.9TTVRL.P1; do Tribunal da Relação de Lisboa de 20.04.2016 (relatora: Filomena Manso), Processo n.º 107/13.4TTBRR-A.L1-4, todos disponíveis in www.dgsi.pt.